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Henry Mintzberg é professor na Faculdade de Administração da McGill University, em Montreal,
Canadá. Entre suas atividades estão os inúmeros artigos que tem escrito sobre o gerente e seu trabalho,
dentre os quais se destaca The Manager´s Job: Folklore and Fact, ganhador do McKinsey Award da
Harvard Business Review, de 1975. Foi também professor visitante no Centre d’Étude et de Recherche
sur les Organizations et la Gestion, em Aix-en-Provence, França.
que o executivo queria; nos computadores cobertos de pó, porque os executivos
jamais usaram o sofisticado sistema integrado de informação, que alguns
analistas julgaram que lhes fosse necessário. O mais importante, talvez, é que
nossa ignorância se revela na inabilidade com que as principais empresas
públicas tratam de alguns de seus mais sérios problemas de planejamento.
O certo é que, na corrida em busca da automação, no uso da ciência
administrativa nas áreas de marketing e finanças e na aplicação do conhecimento
dos cientistas do comportamento humano aos problemas da motivação do
trabalhador, o executivo — a pessoa encarregada da organização ou de uma de
suas subunidades — foi esquecido.
A intenção deste artigo é simples: afastar o leitor das palavras de Fayol,
apresentando-lhe uma descrição mais adequada e, em minha opinião, mais útil,
do trabalho administrativo. Tal descrição é resultado do resumo e síntese das
pesquisas disponíveis sobre como alguns executivos empregam seu tempo.
Em alguns estudos, os executivos foram observados atentamente. Em
outros, deixaram diários pormenorizados sobre suas atividades. Em outros, ainda,
suas anotações foram analisadas. Todos os tipos de executivo foram estudados:
chefes de seção, supervisores de fábricas, chefes de departamento, gerente de
vendas, presidentes de empresas e de nações e, até mesmo, chefes de quadrilhas.
Esses "executivos" trabalham nos Estados Unidos, Canadá Suécia e
Inglaterra. Uma síntese dessas descobertas mostra um quadro interessante, tão
diferente da visão clássica quanto uma pintura abstrata cubista de uma pintura
renascentista. De certa forma, este quadro será facilmente reconhecido por todos
aqueles que já passaram um dia na sala de um executivo — em frente ou atrás de
sua escrivaninha. Não obstante, o quadro pode apresentar-se, ao mesmo tempo,
como revolucionário, pelo fato de pôr em dúvida o mito de trabalho do
executivo.
Em primeiro lugar, discuto alguns desses mitos, contrastando-os com
algumas descobertas da pesquisa sistemática: a crua realidade a respeito de como
os executivos utilizam seu tempo. Depois, sintetizo essas descobertas na
descrição de dez papéis que parecem exprimir o conteúdo essencial do trabalho
dos executivos. Concluindo, discuto algumas implicações dessa síntese, para
quem, tanto nas salas de aula como no mundo dos negócios, pretenda alcançar
melhor desempenho administrativo.
Existem quatro mitos sobre o trabalho do executivo que não resistem ao
exame minucioso dos fatos:
1° Mito: O executivo é um planejador sistemático e reflexivo. A
evidência sobre essa questão parece irresistível. No entanto, nada contribui para
comprová-la.
Realidade: Um grande número de estudos prova que os executivos
trabalham num ritmo inexorável e que suas atividades se caracterizam pela
brevidade, variedade e descontinuidade e que eles estão firmemente orientados
para a ação, não apresentando inclinações para atividades de reflexão.
Consideremos as seguintes provas:
Metade das atividades às quais se dedicavam cinco diretores-presidentes, de
um estudo que fiz, durava menos de nove minutos cada e somente dez por cento
excediam uma hora. Um estudo sobre 56 chefes de seção mostrou que eles
executavam, em média, 583 atividades no período de oito horas — média de uma
atividade a cada 48 segundos. O ritmo de trabalho dos presidentes e dos chefes
de seção mostrou-se inexorável. Os diretores-presidentes se vêem bombardeados
por baterias de telefones, visitas e correspondência, do momento em que chegam
ao trabalho até a hora da saída. O tempo reservado para o almoço e para os
cafezinhos estava relacionado com o trabalho e os subordinados, sempre
presentes, pareciam usurpar-lhes qualquer momento livre.
Um estudo dos diários de 160 executivos ingleses de nível médio e alto
mostrou que eles só trabalhavam sem interrupções, durante meia hora ou mais,
uma vez a cada dois dias.
Dos contatos verbais dos executivos de meu estudo, 93% foram realizados
de improviso. Somente 1% do tempo dos executivos foi gasto em visitas de
observação dentro da empresa. Apenas um em cada 368 contatos verbais não se
relacionava com problemas específicos e pôde ser considerado de planejamento
geral. Outros pesquisadores observaram que em nenhum caso o executivo
declarou ter obtido uma importante informação externa de uma simples conversa
ou de contatos pessoais indiretos.
Nenhum estudo constatou a existência de padrões definidos na maneira
como os executivos organizam seu tempo. Eles parecem ocupados com
problemas, respondendo continuamente às solicitações do momento. É esse o
planejador que a visão clássica descreve?
Tudo indica que não. Então, como podemos explicar o seu comportamento?
O executivo está simplesmente respondendo às pressões de seu trabalho.
Constatei que os diretores-presidentes abandonaram muitas de suas próprias
atividades, freqüentemente deixando reuniões antes de seu término, e
interrompiam o trabalho de escritório para convocar subordinados. Um
presidente de empresa não apenas colocou sua escrivaninha em determinado
lugar, de maneira que pudesse ver um longo corredor, como também deixava a
porta aberta quando se encontrava sozinho: um convite para os subordinados
entrarem e interrompê-lo.
Não há dúvida de que tais executivos procuravam encorajar o fluxo de
informações. Mas, o que é mais significativo, pareciam estar condicionados à sua
própria carga de trabalho. Eles apreciavam o custo-oportunidade de seu próprio
tempo e se mostravam permanentemente cientes de suas obrigações:
correspondência a ser respondida, visitantes e telefonemas a serem atendidos, etc.
Parece que o executivo, não importa o que esteja fazendo, é pressionado pelas
possibilidades do que poderia fazer ou precisa fazer.
Quando o executivo precisa planejar, parece fazê-lo implicitamente no
contexto das ações diárias e não por meio de algum processo abstrato reservado
para um período de duas semanas no refúgio das montanhas. Os planos dos
diretores-presidentes que estudei pareciam existir somente em suas próprias
mentes, como intenções flexíveis, mas freqüentemente específicas. Apesar do
que diz a literatura tradicional, o trabalho administrativo não desenvolve
planejadores reflexivos. O executivo está sempre respondendo a estímulos
temporais. É um indivíduo condicionado pelo trabalho á preferir o movimento à
ação retardada.
2.° Mito: O verdadeiro executivo não executa tarefas de rotina. Pede-se
constantemente aos executivos que gastem mais tempo planejando e delegando e
menos encontrando-se com clientes e envolvendo-se em negociações. Estas não
são, na verdade, as verdadeiras tarefas do executivo. Podemos dizer que o bom
executivo, como o bom maestro, orquestra tudo, cuidadosa e antecipadamente,
para depois sentar-se e desfrutar o produto de seu trabalho, enfrentando,
ocasionalmente, situações imprevistas. Mas aqui, outra vez, a agradável
abstração parece, simplesmente, não se ajustar à realidade. Seria melhor verificar
cuidadosamente as atividades nas quais os executivos se sentem inclinados a
envolver-se antes de defini-las arbitrariamente.
Realidade: Além de se ocupar com exceções, o trabalho administrativo
envolve a execução de uma série de deveres rotineiros, incluindo rituais e
cerimônias, negociações e processamento de pequenas informações que ligam a
organização a seu meio ambiente. Consideremos alguns fatos revelados por
nossos estudos:
Uma pesquisa sobre o trabalho do presidente de pequenas empresas
mostrou que ele se ocupa de atividades de rotina, porque suas empresas não têm
possibilidades de empregar pessoal especializado e porque o número de
funcionários é tão pequeno que a simples falta de um deles freqüentemente
requer que o presidente o substitua.
Um estudo sobre gerentes de vendas e outro sobre executivos-chefes
sugerem que é parte natural do trabalho de ambos os grupos, visitar os clientes
importantes, admitindo-se que os executivos queiram manter tais clientes.
Alguém já descreveu o executivo, em tom de gracejo, como sendo a pessoa
que recebe os visitantes a fim de que todos os outros funcionários possam
trabalhar. Em meu estudo observei que certos encargos cerimoniais, tais como
reunir-se com visitas importantes, presentear alguém com um relógio de ouro ou
presidir a festa natalina, são parte intrínseca da tarefa do executivo.
Pa pé is do Ex e c ut ivo
Autoridade formal
e status
Executivos do mesmo
Diretores
nível
7% 16%
1% 25%
Clientes, fornecedores,
Independentes e outros
associados
20% 8%
13% 22%
Executivo-chefe
48%
39%
Subordinados
Obs.: Os números superiores indicam o total de tempo de contato gasto com cada
grupo e os inferiores a proporção de correspondência originária de cada
grupo.
1) Onde e como obtenho informações? Posso fazer melhor uso de meus contatos para
obter informações? Outras pessoas podem pesquisar em meu lugar? Em que setores
meu conhecimento é menos satisfatório, e como poderei encontrar pessoas que
forneçam as informações de que necessito? Tenho modelos de raciocínio claros a
respeito das coisas que preciso entender, dentro e fora da organização?
2) Que informações dissemino em minha organização? Que importância atribuo ao fato
de meus subordinados receberem minhas informações? Estarei guardando demasiada
informação pelo simples fato de que sua difusão consome muito tempo ou é
inconveniente? Como fornecer mais informações aos outros, para que possam tomar
decisões mais acertadas?
3) Estabeleço alguma relação entre as informações colhidas e as ações tomadas? Minha
tendência é agir antes de reunir as informações? Ou, ao contrário, me detenho
excessivamente na coleta de todas as informações, perdendo, em conseqüência, as
oportunidades e tornando-me um empecilho para o bom andamento da empresa?
4) Qual o ritmo de mudança que procuro imprimir à organização? Tal ritmo é
suficientemente dosado, de modo a garantir que as operações não sejam
excessivamente estáticas ou alteradas com muita freqüência? Temos analisado
suficientemente o impacto dessas alterações sobre o futuro da empresa?
5) Estou suficientemente bem informado e, por conseqüência, em condições de julgar as
propostas apresentadas por meus subordinados? É possível confiar aos subordinados
a aprovação final da maioria dessas propostas? Será que temos problemas de
coordenação porque os subordinados estão tomando muitas decisões por conta
própria?
6) O que penso sobre os rumos da organização? Os planos estão na minha cabeça de
forma vaga? Deveria explicitá-los, a fim de orientar melhor a decisão de outras
pessoas na empresa? Ou preciso de flexibilidade para mudá-los à vontade?
7) Qual a reação de meus subordinados ao meu estilo de trabalho? Sou suficientemente
sensível à poderosa influência que minhas ações exercem sobre eles? Compreendo
perfeitamente suas reações às minhas ações? Consigo alcançar um equilíbrio
adequado entre o encorajamento e a pressão? Estaria inibindo suas iniciativas?
8) Que tipo de relacionamento externo mantenho e de que maneira? Gasto demasiado
tempo nesse relacionamento? Há certos tipos de pessoas que deveria conhecer
melhor?
9) Sistematizo minha maneira de organizar o tempo ou simplesmente reajo às pressões
do momento? Procuro contrabalançar adequadamente minhas atividades ou me
inclino a concentrar-me numa função particular ou num determinado tipo de
problema, apenas porque o julgo interessante? Sou mais eficiente em relação a um
determinado tipo de trabalho, num horário especial do dia ou da semana? Meu
horário de trabalho reflete esse fator? Alguém mais — além da minha secretária —
influi na fixação de meu horário e o faz de maneira sistemática?
10) Trabalho em excesso? Qual o efeito da carga de trabalho sobre minha eficiência?
Deveria tirar pequenas folgas no trabalho ou reduzir o ritmo de minhas atividades?
1I) Sou demasiadamente superficial no que faço? Posso, realmente, alterar minha
disposição de ânimo tão rápida e freqüentemente como exigem os métodos de meu
trabalho? Deveria tentar diminuir a fragmentação e interrupção do trabalho?
12) Costumo orientar-me excessivamente em direção a atividades tangíveis e
movimentadas? Sou escravo da ação e do excitamento de meu trabalho, a ponto de
não ser mais capaz de me concentrar nos problemas? Os problemas-chave recebem
a atenção que merecem? Deveria gastar mais tempo lendo e analisando
profundamente certos problemas? Poderia ser mais reflexivo?
13) Uso apropriadamente as diferentes mídias? Sou capaz de aproveitar ao máximo uma
comunicação escrita? Dependo excessivamente da comunicação pessoal colocando,
desse modo, a maioria de meus subordinados numa posição de desvantagem
informacional? Organizo suficientemente minhas reuniões? Gasto o tempo
necessário percorrendo a empresa, a fim de ter uma visão pessoal, sem
intermediários, de sua atividade? Sou demasiadamente desligado do centro de
atividades de minha empresa, vendo as coisas somente de maneira abstrata?
14) Como avalio meus direitos e obrigações? As obrigações consomem todo o meu
tempo? Como poderia livrar-me das obrigações para ter certeza de que estou
levando minha organização para onde quero que ela vá? Seria possível transformar
minhas obrigações em vantagens?
Referência:
Coleção Harvard de Administração
Trabalho do Executivo: O Folclore e o Fato
Henry Mintzberg, Nova Cultural, S.P., 1986.