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Relatório de Inflação Junho 2001

Evolução da Taxa de Câmbio Real

A taxa nominal de câmbio é um indicador freqüentemente consultado pelos agentes econômicos


em suas decisões, mas, de fato, estas estão condicionadas à evolução da taxa real de câmbio
(TRC). Uma forma comum de calcular esta taxa seria ajustar a taxa nominal de câmbio pela
diferença entre os níveis de preços praticados nos mercados internacional e doméstico. Nesse
sentido, busca-se comparar os custos de produção ou o poder de compra dos consumidores em
ambos os mercados, bem como simplesmente confrontar os incentivos à produção de bens
comercializáveis e não comercializáveis na economia doméstica.

(YROXomRGD7D[DGH&kPELR5HDO%LODWHUDO

250,00

200,00

&kPELRDR
150,00
&RQVXPLGRU

100,00

&kPELRDR
50,00
3URGXWRU

0,00
88

90

92

94

96

98

00
19

19

19

19

19

19

20

Seguindo o supracitado princípio geral, o gráfico acima mostra a evolução de duas medidas de
TCR que, apenas para efeitos de identificação, serão chamadas de câmbio ao produtor e câmbio
ao consumidor1 .

1
As taxa ao produtor e ao consumidor foram, respectivamente, calculadas pelas fórmulas:
(1) qP = E*PPI/IPA-DI [Câmbio ao Produtor]
(2) qC = E*CPI/IPC [Câmbio ao Consumidor], onde
E º valor de venda do dólar dos Estados Unidos ao final de cada mês (PTAX);
PPI º custo ao produtor no mercado norte-americano - Producer Price Index;
IPA-DI º custo ao produtor no mercado brasileiro - Índice de Preços no Atacado, Disponibilidade Interna (IPA-DI) é
utilizado como substituto do índice de preços ao produtor;
CPI º preços ao consumidor no mercado norte-americano - Consumer Price Index;
IPC º preços ao consumidor no mercado brasileiro - Índice de Preços ao Consumidor (IPC-FIPE).

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Em uma perspectiva de longo prazo, o gráfico acima apresenta indícios de que a taxa de câmbio
ao consumidor, ainda que em intervalos de tempo descontínuos, depreciou-se ao longo dos últimos
treze anos, tendo a taxa de câmbio ao produtor seguido caminho inverso. A título de ilustração, a
razão entre o câmbio ao produtor e o câmbio ao consumidor deslocou-se do patamar de 1,00 em
janeiro de 1988, para 0,59 em maio de 2001.

Alternativamente às TCR bilaterais até o momento consideradas, pode-se trabalhar com a noção
de TCR multilateral. Nesta construção, grosso modo, pondera-se pela participação no intercâmbio
comercial com a economia doméstica, o produto da cotação da moeda doméstica em relação a
cada moeda externa considerada, pelo respectivo índice de preços externo. O gráfico abaixo
mostra taxas multilaterais ao produtor e ao consumidor, tendo como vetor de ponderação a
participação nas exportações brasileiras. Ao contrário do gráfico anterior, que utilizou valores do
final do mês, no gráfico abaixo foram utilizadas as médias mensais da taxa de câmbio nominal.

(YROXomRGD7D[DGH&kPELR5HDO0XOWLODWHUDO

150,0
&kPELRDR
120,0
3URGXWRU

90,0

60,0
&kPELRDR
30,0
&RQVXPLGRU

0,0
1988

1995

Este gráfico, assim como seu antecedente, apresenta indícios de que a taxa de câmbio ao
consumidor depreciou-se ao longo dos últimos treze anos, embora se deva admitir que, em termos
absolutos, esse movimento foi praticamente nulo. Mais uma vez, para o câmbio ao produtor as
evidências apontam para a apreciação. A razão entre o câmbio ao produtor e o câmbio ao
consumidor deslocou-se do patamar de 1,10 em janeiro de 1988, para 0,87 em maio de 2001.

Conduzidas com base apenas na evolução do valor absoluto das TCR, embora bastante instrutivas,
as avaliações até o momento implementadas não podem ser tidas como conclusivas, pois a noção
de apreciação ou depreciação da TCR depende do que aconteceu, no mesmo intervalo de tempo,
com os fundamentos da economia.

Desalinhamento

Definir a taxa de câmbio real de equilíbrio (TCRE), uma variável não observável, é o primeiro
passo no processo de avaliação de eventual desalinhamento. Como condição necessária, a TCRE

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deve ser compatível com a sustentabilidade dos equilíbrios interno e externo da economia. Assim,
para ser equilíbrio, de um lado o nível da TCR precisa viabilizar o financiamento do déficit em
conta corrente por um fluxo de capitais sustentável; de outro, deve viabilizar um equilíbrio
sustentável no mercado de bens não comercializáveis. Isso posto, a TCRE deve evoluir em função
do comportamento dos fundamentos da economia, afastando-se das variáveis derivadas
exclusivamente das expectativas dos agentes.

Admitindo que a tendência de longo prazo da TCR, obtida por intermédio da aplicação do Filtro
Hodrick-Prescott, equivalha à TCRE, infere-se que:

(1) entre 1988 e 1996, independente da metodologia de mensuração, a TCRE teria passado por
um processo de redução do seu nível que, entretanto, desde 1996 vem sendo revertido;

(2) independente da metodologia de mensuração, em janeiro de 2001, a taxa de câmbio real


observada estaria apreciada, com o desequilíbrio situando-se entre 3% e 6%;

(3) independente da metodologia de mensuração, em maio de 2001, a taxa de câmbio real


observada estaria depreciada, com o desalinhamento situando-se entre 6% e 9%.

A Recente Bolha

A qualquer momento, uma economia exibe uma TCRE de curto prazo que, em princípio, pode ser
representada pela TCR observada. Esta seria então interpretada como resultante da combinação
das forças que determinam os equilíbrios nos mercados de bens e nos mercados financeiros. Se o
longo prazo é uma soma de curtos prazos, era de se esperar que a TCR observada não se afastasse
muito da taxa de equilíbrio de longo prazo, ou seja, do nível compatível com o equilíbrio sustentável.

Na realidade, porém, a TCR observada eventualmente perde o vínculo com os fundamentos e


passa a ser governada por fatores que afetam a economia somente por intermédio da influência
que exercem sobre as expectativas dos agentes. Esse fenômeno é tratado na literatura como
“bolhas” - fatores especulativos que geram crescimento de preços (no caso, da taxa nominal de
câmbio) de uma maneira auto-realizável.

Ao final de maio de 2001, o valor médio de venda (PTAX) do dólar dos Estados Unidos alcançou
o patamar de R$ 2,36, mas, no dia 20 de junho de 2001, a cotação média já havia atingido o nível
de R$ 2,47. Considerando as evidência anteriormente apresentadas de que, ao final de maio, a
TCR estaria depreciada entre 6% e 9%, é meritória suposição de que esse deslocamento da taxa
nominal de câmbio foi produto precipuamente de fatores especulativos, uma vez que, se existiram,
as mudanças nos fundamentos foram desprezíveis nos vinte dias que separam as duas observações.

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