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CAPACIDADE JURÍDICA: DIFERENÇA DA TEORIA

CONCEPCIONISTA DA CONDICIONADA

Artur de Morais Cavalcante¹; Dinorá Melo Ximenes Martins²;


Francisco Iuan de Albuquerque¹;

¹Graduando em Direito – UVA; ²Graduanda em Direito – UVA

1. Introdução
A capacidade, medida da personalidade, é pode ser entendida no
sentido de um mero reflexo da personalidade – estar-se-ia referindo à
capacidade de gozo ou de direito –, ou como a aptidão para exercer os atos da
vida cível. Nesse sentido, a importância do entendimento do conceito de
capacidade adere muita importância para a resolução de dilemas no âmbito do
direito civil.
Isso posto, o nítido entendimento das teorias concepcionista e
condicionada revela-se como mais uma prerrogativa para o delineamento da
base do direito civil. Tal visão é justificada na tese de que essas teorias
apresentarão qual perspectiva é adotada para o surgimento da personalidade e
para a aquisição de direitos patrimoniais. Portanto, deve o jurista ter em mente
a correta noção desses fundamentos para exercer a posterior aplicação
concreta do direito civil.

2. Metodologia

Este trabalho caracteriza-se por possuir objetivo descritivo, pois busca


explorar diversas facetas dos conceitos supracitados, bem como possui base
de procedimento bibliográfica, haja vista o embasamento fornecido por
doutrinas e pelo Código Civil de 2002.
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3. Desenvolvimento
A capacidade é entendida como a medida da personalidade. Toda
pessoa, segundo o art. 1º do Código Civil de 2002, é capaz de direitos e
deveres na ordem civil, sem distinção alguma de sexo, idade, credo e raça, tal
como disposto por Maria Helena Diniz. A mesma autora salienta o fato de que
a palavra “pessoa”, nesse artigo, adquire o sentido de pessoa natural. Sob
esse viés, entende-se que a capacidade – isto é, a capacidade de gozo ou de
direito – de contrair deveres e direitos é intrínseca a todo ser humano; em
outras palavras, o mero reflexo da personalidade. No entanto, a capacidade
pode adquirir uma feição relacionada com a competência de exercer os atos da
vida cível, a qual pode sofrer limitações legais. Denomina-se esse último tipo
como capacidade de fato ou de exercício.

. O art. 3º do Código Civil de 2002 (lei nº 10.406 de 2002 dispõe que são
“absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os
menores de 16 (dezesseis) anos”, atribuindo, portanto, a restrição do tempo
como um dos limites da capacidade. Essa mesma restrição é retomada no
inciso I do artigo seguinte, o qual explana que os maiores de dezesseis e
menores de dezoito anos são incapazes, relativamente a certos atos ou à
maneira de os exercer. Os incisos que o seguem adicionam novas restrições,
de modo a englobar na relativa incapacidade os ébrios habituais e os viciados
em tóxico (inc. II), bem como aqueles que, por causa transitória ou
permanente, não puderem exprimir sua vontade (inc. III) e, por fim, os pródigos
(inc. IV). Desse modo, a incapacidade é suprida mediante a representação, no
caso de absoluta incapacidade, e assistência, quando se tratar de
incapacidade relativa. Outrossim, é importante ressaltar que “a capacidade é a
regra e a incapacidade a exceção” (DINIZ, 2018, p. 169).

Art. 3º - São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os


atos da vida civil:
I - os menores de dezesseis anos;
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o
necessário discernimento para a prática desses atos;
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua
vontade.
Art. 4º - São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de
os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
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II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por


deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os pródigos.
Parágrafo único - A capacidade dos índios será regulada por
legislação especial.
Portanto, a incapacidade é vista como um mecanismo do qual se dispõe o
Estado para garantir a isonomia entre os indivíduos, tendo em perspectiva a
necessidade de auxiliar aqueles que têm a aptidão para exercer atos da vida
cível afetada, seja por fatores objetivos como a idade, seja por fatores
subjetivos como a possível existência de enfermidades ou alteração do estado
de consciência por substâncias psicoativas. Nesse sentido, os incapacitados
serão protegidos por institutos como o poder familiar, a tutela, a curatela ou a
tomada de decisão apoiada. Por fim, a incapacidade cessará tão logo
tornarem-se ausentes as causas da incapacidade. São três as dimensões da
cessação da incapacidade, sendo a primeira etária – ou seja, quando o menor
atingir a idade de dezoito anos, ele será dito como capaz de exercer atos da
vida cível –, a segunda psíquica e a última dar-se-á por intermédio da
emancipação, a qual pode ser realizada de forma voluntária, judicial e legal
para os relativamente incapazes devido o fator objetivo da idade – isto é, a
emancipação não pode ser realizada para menores de 16 anos.

Art 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a


pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro,
mediante instrumento público, independentemente de homologação
judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver
dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV -pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de
relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com
dezesseis anos completos tenha economia própria.

A questão da incapacidade é tangente aos portadores de deficiência física,


uma vez que esses foram considerados relativamente incapazes em textos
legislativos anteriores. Destarte, deve-se apontar para as novas formulações
quanto à problemática em pauta, mediante o texto do Estatuto da Pessoa com
Deficiência (Lei nº 13.146, de 2015).

Art. 6º  A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa,


inclusive para:
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I - casar-se e constituir união estável;


II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;
III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter
acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento
familiar;
IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização
compulsória;
V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e
VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como
adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as
demais pessoas.
[...] Art. 84.  A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao
exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as
demais pessoas.
§ 1o  Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à
curatela, conforme a lei.
§ 2o  É facultado à pessoa com deficiência a adoção de processo de
tomada de decisão apoiada.
§ 3o  A definição de curatela de pessoa com deficiência constitui
medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às
circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível.
§ 4o  Os curadores são obrigados a prestar, anualmente, contas de
sua administração ao juiz, apresentando o balanço do respectivo ano.
Nesse prisma, a capacidade não deve ser confundida com a legitimação,
uma vez que esta consiste em averiguar a aptidão que uma pessoa tem de
realizar determinada relação jurídica. Segundo Carnelutti, “a capacidade de
gozo é relativa ao modo de ser da pessoa, e a legitimação, à sua posição em
relação às outras” (DINIZ, 2018, p. 171), ou seja, é a aptidão para ser titular de
relações jurídicas. No caso de negócios jurídicos em que uma das partes é
composta por um indivíduo absolutamente incapaz, tal negócio tornar-se-á
nulo, ao passo que o realizado por um ente relativamente capaz será passível
de anulação, segundo a incapacidade formal. No que diz respeito à capacidade
plena, essa existirá tão logo o indivíduo possuir ambas as capacidades, isto é,
tanto a capacidade de direito quanto a capacidade de fato ou de exercício.

Com o pressuposto de que a capacidade significa a concretização da


personalidade, de modo que todas as pessoas possuem personalidade e por
isso possuem capacidade de direito ao mesmo tempo que nem todos possuem
capacidade de fato para concretizar todos os atos jurídicos (CHAVES, 2018), a
teoria concepcionista atribui personalidade, e por isso capacidade, ao nascituro
desde sua concepção.

A distinção entre capacidade de fato e de direito vale para a construção


da ideia de capacidade jurídica, uma vez que só é possível tê-la com o
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reconhecimento do indivíduo como sujeito de direitos bem como com sua


capacidade real de executar atos jurídicos da vida cotidiana. Desse modo,

[...] enquanto a capacidade de direito exprime a ideia genérica e


potencial de ser sujeito de direitos (reconhecida a todas as pessoas
humanas e estendida aos agrupamentos morais), a capacidade jurídica
é a possibilidade de preticar pessoalmente os atos da vida civil
(CHAVES, 2018, p. 356).

Diante disso, a capacidade atribuída ao nascituro pela teoria


concepcionista é apenas de direito e relativa somente aos direitos da
personalidade, de modo que não lhe é assegurado nenhum direito patrimonial.
Direitos patrimoniais são garantidos ao indivíduo apenas após seu nascimento
com vida. Tal relação está bem clara no art. 2º do Código Civil de
2002.Destaca-se a exceção à dita regra sobre os direitos patrimoniais do
nascituro na Lei nº 11.804/2008, a qual reconhece os alimentos gravídicos com
direitos ao nascituro desde sua concepção.

Vale ressaltar que o Supremo Tribunal de Justiça, a pesar de não definir


posição explícita, possui decisões que favorecem essa teoria. A exemplo disso
cita-se o Recurso Especial nº 399.028/SP, no qual o nascituro pôde reclamar
danos morais pela morte do seu pai, mesmo que com diminuição do valor da
indenização por não ter conhecido o pai.

Além dos direitos do nascituro, a teoria concepcionista pressupõe


direitos da personalidade também ao natimorto, indivíduo que nasce sem vida
(CHAVES, 2018), como no exposto pelo Enunciado nº 1 da I Jornada de Direito
Civil realizada pelo Concelho da Justiça Federal, “a proteção que o Código
defere ao nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da
personalidade, tais como: nome, imagem e sepultura”.

Em suma, a teoria concepcionista concede direitos da personalidade ao


nascituro desde a sua concepção e assegura seus direitos patrimoniais para
depois de seu nascimento com vida, salvo os casos que envolvem alimentos
gravídicos. Além disso, a dita teoria concede direitos da personalidade ao
indivíduo que nasce sem vida, a exemplo da preservação de sua sepultura.
Reafirma-se também que pelo entendimento do STJ acima exposto, bem como
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pela própria redação do art. 2º do Código Civil, a teoria concepcionista é a


vigente no ordenamento jurídico brasileiro.

O enfoque na Pessoa Natural nos diz que essa é descrita no art. 1º


como “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. Ou seja, a
Pessoa, no conceito jurídico, refere-se a um sujeito de direitos e deveres. A
pessoa pode ser tanto a pessoa natural como a pessoa jurídica; ambas são
Sujeitos de Direitos e Obrigações, dotadas de Personalidade Jurídica.

Conforme o art. 2º “a personalidade civil da pessoa começa do


nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do
nascituro”. Assim o ordenamento brasileiro determina o nascimento como início
da personalidade civil, entretanto, reconhece os direitos do nascituro.
Proporcionando assim uma resguarda jurídica daquele que pode vir a nascer.

A Personalidade Civil é um atributo jurídico no qual, uma vez adquirido,


marca o momento que o Estado irá reconhecer e tutelar os sujeitos de direitos
personificado, isto é, tanto a pessoa natural como a pessoa jurídica, direitos e
deveres na ordem civil; ao se adquirir a personalidade jurídica, pode-se, por
exemplo, titularizar relações jurídicas, consideradas imprescindíveis no que
tange os atos da vida civil.

Numa visão de direito civil clássico, personalidade jurídica é ligada a


aptidão para titularizar relações jurídicas (capacidade de direito). Todavia,
numa visão contemporânea constitucionalizada, personalidade se torna um
valor inerente à pessoa humana, a base de sustentação da condição humana,
visto que o fundamento do Estado brasileiro é a dignidade da pessoa humana.

Pessoa é uma concepção jurídica e ser humano uma concepção natural.


Nesse sentido, para o olhar contemporâneo não é coerente deixar o ser
humano sem personalidade, ainda que, em uma perspectiva formal, não seja
pessoa, ou seja, existirá personalidade quando houver ser humano (ex:
Nascituro; para os formalistas o nascituro é sujeito de direito sem
personalidade).

Um ponto a ser observado é o de que existem entes despersonalizados


que possuem direitos e deveres, como o espólio patrimônio, herança ou a
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massa falida (patrimônio de empresa falida). Outra questão relevante é a


diferenciação do Nascimento do Nascimento com Vida.

Nascimento é o momento em que ocorre a ruptura do ventre materno;


quando a mãe e o filho passam a constituir corpos autônomos, mesmo que
ainda ligados pelo cordão umbilical. Nascimento com vida é o momento em que
ocorre a respiração do ar, ou seja, quando tem-se a ruptura do ventre materno
e a constituição de corpos autônomos, acontece a inalação de ar nos pulmões
do recém-nascido, mesmo que ele venha a morrer. A “docimásia hidrostática
pulmonar de galeno”, que atesta se nasceu com vida.

Não se exige a viabilidade da vida, ou seja, mesmo que o recém-nascido


venha falecer logo após a inalação de ar nos pulmões, este já adquiriu
personalidade jurídica e, consequentemente, passou a ter direitos e deveres
patrimoniais na ordem civil, ou seja, já possui a capacidade de transmitir
herança para os seus parentes.

Nesse sentido, a doutrina traz algumas teorias a acerca do inicio da


personalidade jurídica. Na Teoria Natalista, a personalidade jurídica só inicia
com o nascimento com vida, antes disso só existe a mera expectativa de
Direito. Teoria adotada pelo Código Civil Brasileiro; porém o ordenamento tem
se desvencilhado dessa visão.

Na Teoria Concepcionista, como apresentado, a personalidade jurídica é


adquirida desde a concepção uterina do nascituro, essa concede personalidade
mesmo ao nascido morto; porém propõe uma divisão entre personalidade
jurídica formal e material, e reconhece ao nascituro a formal. A material será
concretizada com o nascimento com vida.

Assim a Personalidade Jurídica Formal é compreendida como os direitos


da personalidade, aspecto existencial, direitos existenciais. E a Personalidade
Jurídica Material é entendida como os direitos patrimoniais.

Na Teoria Condicionada a personalidade do nascituro começa com o


nascimento com vida, mas, desde a concepção, esse é titular de direitos da
personalidade. A personalidade acha-se sob a dependência de condição
suspensiva.

4. Conclusão
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Em síntese a Teoria Natalista está ligada à concepção clássica e a


Concepcionista, à contemporânea. Essa associação permite ao estudante de
direito perceber como se deu a evolução do pensamento da doutrina a respeito
do início da personalidade jurídica.

Por meio de uma análise crítica da Teoria Condicionada pode-se


destacar que a mesma condiciona a própria personalidade, ou seja, dentro da
realidade constitucional, condiciona o ser humano; pois o nascituro, que não
tem personalidade pelo que diz a própria teoria, iria titularizar direitos da
personalidade.

Traçando uma relação entre Condicionada e Concepcionista, é


percebido que a primeira condiciona a própria personalidade (contrário a visão
constitucionalizada em que a personalidade é valor intrínseco e fundamental à
natureza humana), enquanto a da concepção propõem uma restrição quanto a
aquisição de direitos patrimoniais, mas o nascituro já possui personalidade.

5. Referências

BRASIL, Código Civil. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o


Código Civil, 2002.

CHAVES, Cristiano. Curso de Direito Civil: Parte Geral e LINDB. 16. ed.
Salvador: Jus Podivm, 2018.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral do


Direito Civil. 35. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

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