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A Parte Geral do Código Civil Português

Conceito da relação jurídica

Sentido Amplo: pode designar-se por relação jurídica neste sentido toda a situação ou
relação da vida social que é juridicamente relevante, de modo que é disciplinada pelo
Direito. A relação jurídica não abrange, por isso, todas as relações da vida social mas
apenas aquelas que, sendo susceptíveis de regulamentação jurídica, são ordenadas pelo
Direito. Assim, a relação jurídica é a relação da vida social disciplinada pelo Direito,
sendo atribuído a uma pessoa um direito subjectivo e imposta a outra pessoa uma
obrigação correspondente de respeitar aquele direito.

Sentido Restrito: Pode designar-se por relação jurídica toda a relação da vida social
disciplinada pelo Direito, mas só quando esta relação apresenta uma determinada
fisionomia típica. Como sabemos, a ordem jurídica contém para a conformação das
relações jurídicas no âmbito da autonomia privada um numerus clausus de tipos. Desta
maneira, a ordem jurídica condiciona, relativamente à forma e conteúdo, embora em
grau variável, a conformação de relações jurídicas, constituídas no exercício da
autonomia privada.

Direito Subjectivo:

Faculdade ou o poder, reconhecido ou atribuído pela ordem jurídica ao seu titular, de


exigir ou pretender de outrem um determinado comportamento positivo (fazer) ou
negativo (não fazer), ou…

Faculdade, respectivamente o poder, de produzir determinados efeitos jurídicos que se


impõem à outra parte. A produção daqueles efeitos que se impõem à outra parte pode
resultar do exercício de um direito potestativo directamente por meio de um acto de
vontade do próprio titular (com ou sem formalidades) ou indirectamente por decisão
judicial (provocada pela vontade do titular).

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Poder de exigir ou pretender ---- » dever jurídico

Poder de produzir um efeito ------» sujeição

O dever jurídico que corresponde ao direito de exigir chama-se obrigação civil – o seu
cumprimento pode ser obtido judicialmente.

O dever jurídico que respeita a um direito de pretender diz-se obrigação natural – ela
não é exigível em tribunal.

Relação jurídica em sentido abstracto: é uma relação virtual que equivale a determinado
tipo (à sua fisionomia típica) tal como ele está regulamentado na lei, quer dizer,
corresponde ao tipo negocial legal.

Relação jurídica concreta: é uma relação jurídica em que as regras da relação em sentido
abstracto ganham vida num caso concreto mediante a aplicação a este caso concreto do
tipo regulamentado na lei.

Sintetizando, pode dizer-se que a relação jurídica abstracta é uma relação virtual ou em
potência; ao passo que a relação jurídica concreta é uma relação jurídica real ou em
acto.

Relação jurídica simples: quando a um determinado direito subjectivo corresponde


apenas um dever jurídico ou uma sujeição.

Relação jurídica complexa: Se de um dado facto jurídico resultar uma pluralidade de


direitos e/ou obrigações.

A grande maioria das relações jurídicas são relações jurídicas complexas.

Instituto Jurídico: Conjunto dos preceitos legais relativamente às relações jurídicas de


um determinado tipo. Estes preceitos dão-nos assim uma imagem daquilo que todas as

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relações jurídicas deste tipo possuem em comum, ou seja, uma forma-padrão definidora
de todas elas. Exs: o casamento, a propriedade, a compra e venda.

O instituto jurídico diferencia-se do conceito de relação jurídica abstracta: a relação


constitui a matéria ou objecto regulado; o instituto é a própria regulação ou disciplina
jurídica desse objecto, nas normas ou princípios que a integram. Os dois termos
designam, portanto, dois aspectos da mesma realidade.

Os diversos institutos não coexistem de uma maneira desconexa, articulam-se entre si


para constituírem institutos jurídicos mais gerais, os quais se ligam, por sua vez, com
outros institutos jurídicos, formando no último grau a unidade do sistema jurídico.

A estrutura da relação jurídica

Estrutura interna da relação jurídica: designa-se aquilo a que se chama também


conteúdo da relação jurídica, o qual é determinado por todo o conjunto dos elementos
da relação que definem o vínculo jurídico daí resultante. O vínculo é o centro da relação
jurídica, o nexo que se estabelece entre os seus sujeitos, ligando-os. Este vínculo é
caracterizado pela obrigação que corresponde ao respectivo direito subjectivo.

Estrutura externa da relação jurídica: Corresponde aos elementos que, no seu conjunto,
definem o conteúdo da relação jurídica, contribuem todos para o estabelecimento do
vínculo, mas não fazem parte dele, sendo-lhe assim exteriores. Uma coisa é o próprio
vínculo, uma outra são os elementos que concorrem para que este se constitua. Os
elementos, no seu conjunto, representam a estrutura externa da relação jurídica:

- sujeitos;

- objectos;

- factos jurídicos e

- garantia.

Diz Manuel de Andrade, podemos representar a relação jurídica por uma linha recta. Os
pontos terminais dessa linha serão as pessoas entre as quais a relação jurídica se
estabelece. São os sujeitos da relação jurídica. Por outro lado, essa relação jurídica…

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pode incidir sobre determinado objecto… Além disso, ela deriva de determinada
causa… o chamado facto jurídico. Finalmente, para que o poder jurídico, facultado ao
titular do direito subjectivo… tenha sequência… predispõe a ordem jurídica meios
coercitivos adequados, tendentes a que tal poder obtenha… a sua realização efectiva. É
a garantia.

Titular do direito subjectivo = sujeito activo

Titular da obrigação = sujeito passivo

Objecto da relação jurídica: é o direito subjectivo com a correspondente obrigação, os


quais contribuem ambos para determinar o seu conteúdo. Assim, o objecto decompõe-se
nas 2 posições jurídicas em que se encontram os respectivos sujeitos: posição activa = o
direito subjectivo; posição passiva = a obrigação.

Facto jurídico: todo o acontecimento (natural ou acção humana) que desencadeia ou


produz efeitos jurídicos. O facto jurídico é o elemento causal que leva a relação jurídica
abstracta, idealizada como tipo na lei, para o campo da realidade concreta.

Garantia: embora a ordem jurídica conte, em princípio, com o cumprimento espontâneo


das obrigações resultantes de uma relação jurídica, ela não pode limitar-se a esta
posição de confiança. Portanto, é preciso ou reparar a violação de direito ocorrida ou
prevenir contra a ameaça da violação do direito. A garantia destina-se, deste modo, a
dar efectividade aos poderes do titular do direito subjectivo, permitindo àquele titular
fazer valer o seu direito mesmo que o obrigado não queira cumprir espontaneamente.

Direito Subjectivo que se traduz num poder de “exigir” ---» garantia: acção judicial

Direito Subjectivo que confere um “pretender” ----» garantia: o cumprimento do direito


subjectivo não pode ser
conseguida por via judicial.

Mas se o devedor efectuou espontaneamente a sua


prestação, não pode reaver (repetir) o que foi
prestado (art.º 403.º CC)

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Direito Subjectivo potestativo ---» o obrigado não pode furtar-se ao cumprimento, uma
vez que os efeitos se lhe impõem, de modo que fica pura e
simplesmente sujeito a eles. Desta maneira, o direito potestativo é
garantido de modo infalível: a garantia apresenta-nos aqui uma
configuração sui generis (até se podia dizer que os direitos
potestativos não possuem garantia, como elemento distinto deles,
sendo esta já abrangida pelo seu exercício.

Ver esquema no livro do Horster!!

OS ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA

O CONTEÚDO DA PARTE GERAL

As pessoas em sentido jurídico (sujeitos da relação jurídica) e os seus direitos


imanentes

Pessoa em sentido jurídico: Quem possuir personalidade jurídica.

Personalidade jurídica: Consiste na susceptibilidade de ser sujeito (titular) de direitos e


obrigações ou, por outras palavras, na possibilidade de ser sujeito – activo ou passivo –
de relações jurídicas.

Regime das pessoas singulares: art.º 66.º a 156.º CC (simultaneamente com o regime
dos direitos de personalidade (arts, 70.º a 81.º).

Direitos de Personalidade: direitos imanentes ao homem, quase como fazendo parte


dele.

Art.º 66.º, n.º 1: os homens possuem personalidade jurídica por si, sem qualquer
necessidade de uma concessão ou de um reconhecimento ou de uma outra atribuição
expressa pela lei, pois a sua personalidade resulta do simples facto do nascimento com
vida.

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Mas pessoa em sentido jurídico não é apenas a pessoa singular… Também temos as
pessoas colectivas: organizações erigidas pelos homens e às quais a ordem jurídica
atribuiu personalidade. As pessoas colectivas têm fundamentalmente como substrato ou
organizações de pessoas (sociedades, associações) ou conjunto de bens, massas
patrimoniais (fundações, institutos) que se encontram estruturados e organizados em
função de um fim comum a realizar, o qual transcende as potencialidades individuais.

Ao contrário da pessoa singular, que adquire a personalidade pelo nascimento, a pessoa


colectiva não possui esta qualidade sem mais, só por si. Não basta a formação e
organização do respectivo substrato na realidade social: é preciso ainda o
reconhecimento mediante o qual a ordem jurídica concede ou atribui personalidade.

Regime das pessoas colectivas: arts. 156.º a 194.º.

Associações sem personalidade jurídica: arts. 195.º a 201.º

As coisas em sentido jurídico (objectos da relação jurídica)

Os possíveis objectos da relação jurídica em geral

a) O objecto imediato da relação jurídica


É o conjunto “direito subjectivo – vinculação”. É, de facto, sobre as posições jurídicas,
os direitos subjectivos e/ou as correspondentes obrigações, que versam as relações
jurídicas, como nos mostram as mais variadas disposições legais.
Exs.:
- art.º 407.º considera como objectos de certa relação contratual os “direitos sobre a
coisa” (e não a coisa);
- art.º 408.º refere a “transferência de direitos reais sobre a coisa”;
- art.º 420.º contempla uma “transmissão do direito e da obrigação”;
- art.º 424.º, n.º 1 visa a “transmissão da posição contratual”;
- art.º 431.º fala da substituição dos contraentes “nos seus direitos e obrigações”;
- art.º 446.º, n.º 1 refere o “dispor do direito à prestação”;
- art.º 879.º (e o art.º 954.º) regula a transmissão da propriedade da coisa ou da
titularidade do direito;
- arts. 2024.º e 2032.º, n.º1, referem-se à titularidade das relações jurídicas patrimoniais.

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Nos exemplos referidos podemos observar que a lei distingue entre o direito e a
correspondente obrigação, por um lado, e entre aquilo sobre que o próprio direito
subjectivo incide, por outro. Este “aquilo” é o objecto mediato da relação jurídica.

b) O objecto mediato da relação jurídica

Objecto mediato da relação jurídica: apenas pode ser o que é susceptível de estar sujeito
ao domínio do homem e que é susceptível de lhe ser atribuído pela ordem jurídica em
termos tais que a sua vontade é juridicamente decisiva para o objecto assim atribuído. O
objecto do direito é aquilo sobre que recai o poder do sujeito. Objecto mediato é aquilo
sobre que podem incidir os poderes que caracterizam o direito subjectivo.
Exs: uma coisa, um produto intelectual, uma prestação e até um direito… O homem não
pode ser objecto de direito “porque apenas pode fazer parte de uma relação jurídica
conforme a sua condição de sujeito…, não como mero objecto de decisões de outrem.
O protótipo dos objectos de direito, dos objectos mediatos da relação jurídica, são as
coisas.

Coisas corpóreas: quando sobre estas pode recair um poder de domínio (exs: animais,
objectos em sentido comum…)

Coisas incorpóreas: sobre elas recai um poder de utilização exclusiva (exs: patentes,
programas de computadores, software)

As prestações, ou seja, um determinado comportamento, uma acção ou uma omissão


são também objecto mediato das relações jurídicas (exs: art.º 397.º, 398.º, 1152.º, 1154.º
e ss).

De modo igual não existem dúvidas de que um direito pode er objecto de relações
jurídicas [exs: penhor de direitos (arts. 679.º e ss.), compra e venda (art.º 879.º, a), 2.ª
altern.), doação (art.º 954.º, a), 2.ª alter.), usufruto de direitos de crédito (arts. 1439.º,
1446.º, 1463.º e 1464.º), usufruto de acções ou partes sociais (art.º 1467.º) e hipoteca
sobre direitos (art. 668.º, n.º 1, als. D), c) e e).

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As coisas como objectos mediatos da relação jurídica

a) A noção de coisa no sentido do art.º 202.º, n.º 1

Art.º 202.º, n.º 1 – “Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas”.

Críticas:
- Consideram esta definição desnecessária, de tipo manualístico;
- Consideram-na incorrecta por compreender – devido à pretendida equiparação de
“coisa” e “objecto da relação jurídica” – além das coisas propriamente ditas “ainda as
prestações, os direitos e até… pessoas, já que todas estas realidades podem ser objecto
de relações jurídicas.

PÁGS. 202 – 215

OS FACTOS JURÍDICOS E OS NEGÓCIOS (ORIGENS DA RELAÇÃO


JURÍDICA E DA SUA EVOLUÇÃO

Os factos jurídicos em geral

Facto jurídico = todo o acto humano ou todo o acontecimento natural juridicamente


relevante, na medida em que produz efeitos jurídicos.

Factos ajurídicos = actos humanos (comportamentos sociais) ou acontecimentos


naturais sem efeitos jurídicos; têm o seu respectivo significado social ou real, mas
juridicamente sem relevância, uma vez que se verificam no espaço livre de Direito.

O CC fala dos “factos jurídicos” no subtítulo III, do título II da Parte Geral, depois de
tratado “Das coisas”.

Dividido em 3 capítulos:

1) Regime do negócio jurídico (arts. 217.º a 294.º;

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2) Actos jurídicos (art.º 295.º);
3) Normas relativas à repercussão do tempo nas relações jurídicas (arts. 296.º a
333.º).

Assim, o CC não trata de todos os factos jurídicos, pois estão dela excluídos, dentro da
mesma lógica que separa a responsabilidade contratual da extracontratual, os factos
ilícitos e afins e, além disso, certos factos involuntários (legais e naturais), distribuídos
por vários lugares da lei, bem como as consequências (legais) dos actos jurídicos.
Assim, o subtítulo III não dá um tratamento exaustivo dos factos jurídicos.

A relevância da vontade a respeito dos factos jurídicos e da sua classificação; os


actos jurídicos

a) A classificação geral em função da vontade

São os factos jurídicos destinados à realização da autonomia privada, ou seja, os factos


correspondentes a uma actuação de acordo com a vontade da pessoa, aqueles que o
subtítulo III põe em relevo.

Classificação dos factos jurídicos, conforme o seu relacionamento com a vontade


humana:

1) Factos jurídicos voluntários:


- acções humanas;
- todos os actos jurídicos resultantes da vontade, ainda que deficiente, de uma
pessoa.

É a vontade que provoca o próprio facto ao qual se dirige, o que não quer
dizer que a vontade abranja, de modo igual, os seus efeitos (a vontade pode abrangê-los
ou não, ser relevante ou irrelevante para eles) – decisiva para a voluntariedade do facto
jurídico é a vontade a seu respeito (e não a respeitos dos seus efeitos), mesmo que se
trate de uma vontade de algum modo deficiente ou incompleta.

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1.a) Factos lícitos (que estão de acordo com a ordem jurídica); pode acontecer
que um facto lícito seja antecedido ou influenciado por um comportamento ilícito de
outrem (ex: coacção moral, dolo…) – e este comportamento não tira a qualidade de
ilícito à actuação do próprio agente, que está em conformidade com a lei, mas afecta a
sua validade.)

1.b) Factos ilícitos: que são contrários à ordem jurídica; os efeitos jurídicos
produzidos por um facto ilícito traduzem-se numa sanção civil. A sanção civil procura
restabelecer os interesses privados da pessoa ofendida/reparar os danos sofridos ----»
danos patrimoniais: ou por restauração natural (restabelecimento do estado anterior),
ou por restituição por equivalente (indemnização pecuniária quando o restabelecimento
não é possível ou viável); danos morais: a indemnização pecuniária tem carácter
reparatório e de compensação.

2) Factos jurídicos involuntários:


- factos legais;
- factos naturais;
- uma eventual vontade coincidente com um facto legal ou natural é
juridicamente irrelevante.

O próprio facto produz-se independentemente da vontade humana. Exs: o


decurso do tempo, o nascimento, a aquisição da maioridade, a morte, a acessão natural,
o perecimento natural de uma coisa, etc.

b) Os actos jurídicos (em sentido restrito)

Os factos voluntários lícitos também são chamados actos jurídicos em sentido lato,
conceito que compreende:
- os negócios jurídicos (art.º 217.º a 294.º);
- os simples actos jurídicos / actos jurídicos em sentido restrito (art.º 295.º);

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Negócio jurídico: produz os seus efeitos jurídicos porque estes foram queridos pela
vontade; o negócio jurídico é um acto volitivo-final quanto aos efeitos previstos; é um
acto criador a respeito da conformação de relações jurídico-privadas. A origem, o
conteúdo e as consequências de um negócio jurídico são o resultado da vontade, mesmo
que as partes não tenham pensado em todos os feitos possíveis, visto estes poderem ser
reconduzidos à sua origem volitiva.

Acto jurídico em sentido restrito: produz os seus efeitos independentemente da vontade,


embora não raras vezes exista coincidência entre os efeitos produzidos e a vontade do
agente. Mas a esta vontade falta o elemento volitivo-final quanto aos efeitos. Os efeitos
de um acto jurídico produzem-se por lei, em virtude de normas imperativas, sejam os
efeitos abrangidos pela vontade ou não.
Ao ter em conta o alcance e o papel da vontade na produção dos actos jurídicos,
distinguem-se os:
- actos reais (para provocar o acto, é normalmente necessário e suficiente uma
simples vontade natural e agir); ex: achado de um tesouro (art.º 1324.º), a acessão
industrial (arts. 1325.º ss., 1333.º ss)
- e os actos quase-negociais (já é preciso que o agente queira e entenda o acto a
produzir); ex: interpelação do devedor (art.º 805.º), a usucapião (arts. 1287.º, 1289.º,
n.º2).

Aos actos jurídicos aplicam-se as disposições sobre os negócios jurídicos, na medida em


que analogia das situações, ou seja, as razões determinantes dos respectivos preceitos
legais o justifiquem (art.º 295.º). Esta aplicação das disposições sobre os negócios
jurídicos aos actos jurídicos faz-se de acordo com o significado da vontade para uns e
para outros.
Com efeito, os preceitos dispositivos ou supletivos a respeito dos efeitos dos negócios
jurídicos não podem ter aplicação quanto aos efeitos dos actos jurídicos!
Assim, pode dizer-se que o recurso às regras do negócio jurídico é tanto mais necessário
quanto mais decisivo for o alcance da vontade como elemento provocador do acto
jurídico.

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c) O esquema classificativo; distinções complementares

VER ESQUEMA NO LIVRO DO HORSTER

Outras distinções

Factos jurídicos positivos (que, sendo acções e não simples omissões, se traduzem
numa alteração de um estado de coisas ou situação de facto preexistentes) e
Factos jurídicos negativos (que, não sendo acções, consistem na perduração ou
manutenção do estado de coisas anterior;

Factos jurídicos simples (que consistem num só elemento) e


Factos jurídicos complexos (que se compõem de uma pluralidade de elemntos) – podem
ser de formação simultânea (ex: contrato entre presentes) ou de formação sucessiva (ex:
contrato entre não presentes).

Factos jurídicos resultantes de um agir em nome próprio e

Factos jurídicos resultantes de um agir em nome alheio (representação) –


significa agir dentro de vinculações originadas pela autonomia do representado.

O negócio jurídico como facto jurídico voluntário (enunciado geral)

a) O negócio jurídico como produtor de efeitos volitivos ou pretendidos


(efeitos volitivo-finais)

Negócio jurídico pertence aos factos jurídicos voluntários lícitos.

Negócio jurídico é uma declaração de vontade privada que visa a produção de um efeito
jurídico conforme a ordem jurídica por causa de ter sido querido pelas partes.

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O negócio jurídico mais importante é o contrato.

O negócio jurídico é o meio por excelência para a realização e a concretização da


vontade dentro dos princípios da autonomia privada.

Nos negócios jurídicos os efeitos produzem-se em função da vontade do agente ou são


atribuídos ou imputados a esta vontade quando o agente não previu todas as
consequências.

b) As consequências de uma vontade deficiente para os efeitos pretendidos

Validade de um negócio: corresponde à situação normal e regular. Porém, os efeitos de


um negócio jurídico podem vir a ser prejudicados quando ocorrer uma invalidade (uma
“deficiência genética”, ou seja, que a vontade dirigida à formação do negócio jurídico e
à produção dos seus efeitos, é afectada por “imperfeições”).

Em consonância com a gravidade que a deficiência genética apresenta, a lei conhece,


em geral, duas modalidades de invalidade:
- a anulabilidade e a
- nulidade.

Anulabilidade: o negócio jurídico produz, desde logo, todos os seus efeitos


pretendidos, embora de uma maneira provisória, sujeitos à possibilidade da anulação.

Nulidade: o negócio jurídico não produz nenhum dos efeitos jurídicos previstos e
intencionados, podendo, no entanto, dar origem a alguns feitos jurídicos laterais,
estabelecidos na lei, ou certas situações de facto.

Dupla diferença entre as consequências de um negócio anulável e as de um negócio


nulo:
- produção de todos os efeitos pretendidos, por um lado e ausência de efeitos
volitivos, por outro;

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- provisoriedade quanto aos efeitos produzidos, num caso, e certeza quanto aos
efeitos não produzidos, noutro.

Os efeitos do negócio jurídico anulável apenas podem ser destruídos retroactivamente


mediante uma acção de anulação (arts. 285.º, 287.º CC).

No negócio jurídico nulo, o qual nem sequer começou a produzir os seus efeitos
jurídicos pretendidos, não é possível destruir retroactivamente os mesmos, logo, é
apenas proposta uma acção visando a declaração de nulidade do negócio, nos termos
dos arts. 285.º (modifica uma situação jurídica existente) e 286.º (acção essencialmente
declarativa).

Nulidade ---» pode ser invocada por qualquer interessado ou declarada oficiosamente
pelo tribunal.

Anulabilidade ---» Só a pode invocar “as pessoas em cujo interesse a lei a estabelece”.

Art.º 289.º CC ----» referente quer à nulidade, quer à anulabilidade; as consequências


deste artigo não só se referem às partes do negócio, mas abrangem também todos os
terceiros que entretanto hajam adquirido com base no negócio inválido.
O art.º 289.º, n.º 1 destrói as aquisições dos terceiros. Contudo, para atenuar as
consequências resultantes da aplicação das regras desse artigo, em relação a terceiros, o
art.º 291.º, estabelece algumas excepções em que protege o terceiro de boa fé, contra os
efeitos teroactivos e as restituições quando dizem respeitos a coisas sujeitas a registo.
Nessa medida, os efeitos subsequentes do negócio inválido precedente são mantidos.

O tempo e a sua representação nas relações jurídicas

Art.º 296.º a 333.º (prescrição, caducidade e não uso do direito).

Prescrição, caducidade e não uso referem-se a direitos subjectivos e à legitimidade para


os invocar. A sua verificação conduz a um enfraquecimento ou à extinção do direito em
causa.

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Contagem dos prazos: art. 279.º (art.º 296.º)

Prescrição (art.º 298.º, n.º1, 300.º a 327.º): tem como efeito que o beneficiário (o
devedor) tem a faculdade de se opor ao exercício do direito prescrito (art.º 304.º, n.º1)
sem, no entanto, este direito se extinguir (art.º 304.º, n.º 2) – apenas acontece que o
direito de exigir (obrigação civil) fica reduzido a um direito de pretender (obrigação
natural). É uma excepção peremptória (conduz à absolvição do pedido); a prescrição
para ser eficaz tem de ser invocada pelo beneficiário.
Prazo ordinário de prescrição é de vinte anos (art.º 309.º, 311.º, n.º1), mas há prazos
inferiores (art. 310.º, 316.º, 317.º).
Todos os prazos começam a correr a partir do momento em que o direito podia ser
exercido (art.º 306.º).
Suspensão da prescrição (art.º 318.º a 322.º); Interrupção (arts. 323.º a 327.º)
Interrupção = o tempo decorrido fica inutilizado, começando a corre novo prazo
Suspensão = o período durante o qual ela se verifica não é incluído no cálculo da
contagem do prazo da prescrição.

Caducidade (arts. 298.º, n.º2, 328.º a 333.º) – o direito extingue-se a partir do momento
em que expirou o prazo dentro do qual deveria ter sido invocado. É apreciada
oficiosamente pelo tribunal (art.º 333.º, n.º 1), a não ser quando a caducidade está à
disposição das partes (ex: art.º 416.º, n.º 2 e art.º 333.º, n.º 2 e 303.º CC)

Enquanto que o direito continua a existir, o direito caducado perdeu a sua existência.

PÁGS. 308 A 311

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Personalidade, capacidade jurídica, capacidade de agir e incapacidades

A personalidade e a capacidade jurídica

Art,º 66.º, n.º 1 – a aquisição da personalidade dá origem à capacidade jurídica.

Art,.º 67.º - a capacidade jurídica consiste em que as pessoas podem ser sujeitos de
quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário.

Capacidade jurídica: susceptibilidade de uma pessoa ser titular de direitos e obrigações;


é uma qualidade estática.

Ao contrário do conceito de capacidade jurídica, a personalidade jurídica não é


abrangida pela restrição do art.º 67.º “salvo disposição em contrário”.

A personalidade jurídica não é susceptível de quaisquer limitações ou ressalvas, bem


diferente da capacidade jurídica, que pode ser mais ou menos circunscrita.
Capacidade jurídica = dimensão quantitativa

Art.º 67.º = capacidade de gozo; as disposições que impedem o gozo de certos direitos
têm carácter de excepção, e estas ocorrem quando se verificam certas “qualidades
minguantes” na própria pessoa a respeito de determinados direitos estritamente
pessoais. Assim, elas podem surgir em relação ao casamento, à perfilhação e à feitura
do testamento, conforme está expresso na lei.
A capacidade negocial, de gozo e de exercício

Da capacidade jurídica, como capacidade de gozo distingue-se a capacidade negocial


(entendendo-se esta na idoneidade de adquirir ou exercer direitos ou de assumir e
cumprir obrigações por acto próprio e com eficácia jurídica, incluindo a possibilidade
de agir por meio de um representante voluntário).

A capacidade negocial pressupõe a capacidade jurídica. Mas uma pessoa pode ter
capacidade jurídica sem possuir simultaneamente a capacidade negocial.

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Enquanto a capacidade jurídica, como capacidade de gozo, significa a susceptibilidade
de ser sujeito de relações jurídicas ou de ter direitos subjectivos, a capacidade negocial
respeita à idoneidade de se tornar sujeito de relações jurídicas ou titular de direitos
subjectivos.

Capacidade de gozo = elemento estático


Capacidade negocial = elemento dinâmico

Se estes direitos forem de natureza estritamente pessoal, de modo que não podem ser
assumidos por outrem em nome e em vez do titular, a capacidade para se tornar titular
daqueles direitos chama-se capacidade negocial de gozo (art.º 1600.º, 1601.º, 1591.º,
1850.º, 2188.º)

Noutros casos, a capacidade para participar no tráfico jurídico chama-se capacidade de


exercício. Esta capacidade é adquirida quando se atinge a maioridade. Antes da
maioridade, as pessoas carecem em princípio desta capacidade, precisamente por serem
menores. Mas há casos em que também não a possuem, apesar de terem atingido a
maioridade, ou seja, quando há incapacidades que resultam de factores existentes e
situados na própria pessoa do incapaz.

Ao contrário da capacidade negocial (de gozo e de exercício), a capacidade jurídica não


pressupõe discernimento ou a vontade de entender e querer, uma vez que diz respeito à
mera titularidade e não se refere à idoneidade da participação no tráfico jurídico.

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