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EVOLUÇÃO ~A ADMINISTRAÇÃO

DA PRODUÇAO NO BRASIL

• Claude Machline

A evolução da Administração da Produção nas empresas brasileiras nas últimas


décadas constitui autêntica revolução nos conceitos e métodos tradicionais de
gestão industrial.

The evolution of Production and Operations Management in Brazilian companies


in the last decades arnounts to a revolution in the traditional administra tive concepts
and methods of industrial management.

PALAVRAS-CHAVE:
Administração da Produção,
mudanças de métodos de ges-
tão, mudanças na .
da produção, cOfTilDetitlvia'ade.
qualidade e oroalutlVlaat1I!.

• Professor Titular do Departa-


mento de Produçáo, Logística e
Operações Industriais da
EAESP/ FGV

Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 34, n. 3, p. 91-101 Mai./Jun. 1994 91


11m ARTIGO E~
Os objetivos deste artigo são descre- através da produção em massa de um
ver as mudanças ocorridas na Adminis- veículo padronizado.
tração da Produção nas últimas décadas Henri Payol+ formulou os princípios
no país, indicar de que maneira nossas da organização e da administração ao de-
empresas se adaptaram aos novos con- finir as atividades de planejamento, con-
ceitos e métodos de gestão, debater o trole, organização, coordenação e dire-
que o futuro lhes reserva e analisar a ção. Max Weber,5 ao enunciar os concei-
melhor forma de enfrentar os próximos tos de burocratização, formalização e ma-
1. TAYLOR, Frederick W. Shop desafios. nualização, completou as idéias de Fayol.
management. New York: Harper A Administração da Produção é o ge-
& Bros., 1903; Theprincipies of
Denomina-se Escola Clássica ao corpo de
scientific management. New renciamento das operações físicas da pensamentos desses dois autores.
York: Harper & Bros., 1911. empresa. O termo se aplica aos ambien- Em 1930,surgiu a Escola de Relações
Princípios de administração tes de serviços e ao chão da fábrica. A
científica. 7. ed. São Paulo:
Humanas," que adotou posição contrária
Atlas, 1970. preocupação da gestão de operações é
melhorar o desempenho dos recursos
2. SMITH, Adam. An inquiry produtivos - homens, máquinas, mate-
into tne nature of the wealth of
nations. London: A. Strahan & riais, tecnologia, sistemas de administra-
T. Cadell, 1776, The wealth of ção - em qualquer unidade econômica.
nstioos, New York: Penguin Os métodos desenvolvidos na incessante
Books, 1982.
procura de eficiência serão aqui expos-
3. FORO, Henry. My Ufe and tos e suas potencialidades, recordadas.
Work. New York: Doubleday, Na agregação de valor do bem ou ser-
1922.
viço produzido, as palavras-chave, ou fa-
4. FAYOL, Henri. Administration tores de sucesso, são quatro:
índustrielle et générale. Paris:
Dunod, 1925. Administração in-
dustrial e geral, São Paulo: • melhoria da qualidade;
Atlas, 1950. Os dois primeiros • aumento de produtividade;
capítulos da obra de Fayol apa- • redução do custo;
receram em 1916, no Bulletin
de la Société de I'lndustrie Mi-
• diminuição do prazo de entrega.
nérale.
A perseguição simultânea desses qua-
5. WEBER, Max. The theory ot
socíal and economic organiza-
tro objetivos assegurará a razão de ser da
tion. New York: Oxford Univer- empresa, o lucro sobre o investimento. às escolas anteriores a respeito da forma
sity Press, 1947. de dirigir as atividades. Em vez de hie-
6. MAYO, George Elton. Thenu-
OS PRIMÓRDIOS DA ADMINISTRAÇÃO E DA rarquia, sugeria liderança, utilização de
man problems of an industrial INDÚSTRIA NACIONAL grupos, uso de incentivos não monetários
civilization. New York: The Mac- e obtenção de melhoria de resultados
millan Co., 1933; ROETHlIS- A administração de empresas nasceu,
BERGER, Fritz J., DICKSON,
através, primordiaJmente, do maior inte-
Wílliam. A organização e o tra- como doutrina organizada, há cerca de resse pelo ser humano.
balhador. São Paulo: Atlas, um século, com a Escola Científica de Uma profusão de pesquisas e publica-
1971. F.W.Taylor." que enfatizava a procura da ções, nas décadas seguintes, procurou
7. REDDIN, W.J. Effective ma- eficiênciafabril, através da análise do tra- evidenciar a superioridade da maneira
nagement by objectives. New balho, do estudo de tempos e movimen- humana de administrar {Teoria Y) sobre
York: McGraw-Hill, 1971;_. tos, da cronometragem para obtenção do
Eficácia gerencial. São Paulo:
a maneira tayloriana-fayoliana (Teoria
Atlas, 1971. tempo padrão e, em geral, do corpo de X). Nasceram, em conseqüência, muitas
métodos que hoje se denomina Engenha- óticas e escolas de pensamento, tais
8. JAY, Antony. O homem s.A. ria Industrial. A motivação do trabalha-
(Corporation Man). São Paulo:
como, por exemplo, as teorias de lideran-
McGraw-Hill do Brasil, 1976. dor seria obtida por meio de incentivos ça situacional," do uso de pequenos gru-
monetários. A divisão do trabalho, que, pOS,8de administração por objetivos? e
9. DRUCKER, Peter. O gerente segundo Adam Smíth.? aumenta subs- de desenvolvimento organizacional. 10
eficaz. Rio de Janeiro: Zatrar,
1968. tancialmente a produtividade do operá- Após a Segunda Guerra Mundial, com o
rio, encontrou seu coroamento na criação advento do computador, a criação da
10. BENNIS, Warren. Desenvol- da linha de montagem móvel, que Henry pesquisa operacional e o desenvolvimen-
vimento organizacional: sua na-
tureza, origens e perspectivas. Ford 3 implantou em sua fábrica de auto- to da simulação por meío de modelos
São Paulo: Edgard Blücher, móveis, em Detroit, em 1913i reduzindo matemáticos e estatísticos, floresce a Es-
1972. consideravelmente o custo do produto, cola de Sistemas, com SUa ênfase nos

92 © 1994, Revista de Administração de Empresas I EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.


EVOLUÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO NO BRASIL

conceitos de informação, controle, deci- o PERíODO 1957-73


são e quantificação,aos quais Taylor teria
subscrito. O período 1957-73inicia-se com um
No período que acabamos de descre- grande salto tecnológico brasileiro, o ad-
ver, o Brasilimplantou suas primeiras in- vento da indústria automobilística nacio-
dústrias, de nível tecnológico relativa- nal. Nessa fase presenciaram-se o acen-
mente simples. A industrialização nas- tuado desenvolvimento econômico do
cente recebeu forte impulso nos períodos país, a forte expansão do PIB (Produto
1914-19e 1939-45,épocas das duas guer- Interno Bruto) e o uso crescente de técni-
ras mundiais, em que o país se viu priva- cas administrativas consagradas. No
do de seus tradicionais fornecedores e mundo ocidental, o período é marcado
teve que produzir uma série de bens in- por prosperidade generalizada.
dustrializados nos setores alimentício,
têxtil, mecânico, metalúrgico, químico e
outros.
A preocupação dominante da gerência
dessas fábricas pioneiras era a conquista
do mercado, a aquisição de equipamen-
tos, o domínio da tecnologia disponível e
a superação dos recordes de produção.
Engenheiros e químicos recém-saídos
da faculdade, possuidores de alguma
bagagem técnica, mas sem qualquer co-
nhecimento administrativo, eram encar-
regados de dirigir fábricas, com a preo-
cupação dominante de desenvolver a
produção e sem sequer suspeitar da
existência das doutrinas de administra-
ção mencionadas.
Com exceção de algumas empresas
multinacionais instaladas no país e de
um punhado de grandes empresas na-
cionais, que dominavam técnicas especí- Desenvolvimento de fornecedores
ficas de inspeção e manutenção, indis- A indústria automobilística possui
pensáveis para o êxito de sua produção, grandes exigências de qualidade. Os di-
a administração das operações era des- versos componentes de um carro (5.000
conhecida. Os conceitos taylorianos e fa- peças diferentes), ônibus ou caminhão
yolianos, bastante divulgados no mundo (10.000peças distintas), máquina de ter-
e que, em tese, deveriam prevalecer em raplanagem ou agrícola (até 20.000peças
nossas indústrias, não eram aplicados. A diversas), devem ser homogêneos, ajus-
maior parte das empresas era pequena e tar-se bem entre si, não se afastar das di-
rudimentar demais para absorver técni- mensões nominais e ser obtidos a partir
cas de cronometragem, controle de qua- de metais, ligas, plásticos e outros mate-
lidade, planejamento ou engenharia eco- riais de característicasnobres.
nômica. As empresas sobreviviam e se Tendo-se comprometido com a produ-
expandiam razoavelmente sem essas ção de carros nacionalizados, as monta-
ferramentas. doras dedicam-se com êxito ao desenvol-
A criação das primeiras faculdades de vimento de fornecedores de autopeças,
administração no país, no início dos isto é, à procura e ao apoio técnico de
anos 50, indica que a comunidade em- empresas interessadas em produzir com-
presarial identificou a necessidade de ponentes para o setor. O seguimento das
aprendizagem administrativa entre nos- compras (jollow up), a saber, o acompa-
sos dirigentes. Coincidentemente, mar- nhamento do prazo de entrega dos pedi-
cando uma nova época, que se estende- dos colocados junto aos fornecedores, foi
ria até 1973,nasceu a indústria automo- imaginado na ocasião e se estendeu aos
bilística nacional. demais ramos industriais.

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ARTIGO

Controle estatístico de qualidade por absorção total, a fim de determinar o


Os métodos clássicos de controle esta- custo total de cada produto fabricado. O
tístico de qualidade, desenvolvidos e método alemão de rateio dos custos ge-
utilizados nos Estados Unidos desde a rais por cascata, conhecido como RKW
década de 30, são absorvidos pelas mon- (Reichs Kuraiiir für Wirtschaft) é adotado
tadoras e fornecedoras de autopeças. São pela maioria das grandes empresas.
os gráficos de controle estatístico de pro- Chega-se a debater, nas primeiras re-
dução, que consistem em registrar perio- vistas de administração de empresas
dicamente, num cartão apenso à. máqui- lançadas nessa fase da história indus-
na, as variações ocorridas nas caracterís- trial brasileira, a conveniência de utili-
ticas das peças produzidas, de modo a zar, em vez do custeio por absorção dos
tornar visível qualquer anomalia no pro- custos gerais, o método de custeio dire-
cesso. A inspeção por meio de planos de to, em que só os custos
aceitação por amostragem (que permite variáveis (materiais, im-
julgar a qualidade de lotes de peças postos diretos, mão-
através do exame de cerca de 10';1" de-obra direta, comis-
do total da remessa, com uma sões de vendas) são
probabilidade determinada de debitados a cada pro-
acerto na decisão), torna-se duto.P
corriqueira nas em- Planilhas de
presas, Utiliza-se custos são monta-
principalmente a das por empresas
sistemática dos e órgãos governa-
planos de inspeção mentais, para cál-
por amostragem da culo e controle dos
norma norte-ame- preços, em indús-
ricana Military trias e serviços, no
Standard 105, que segmento de transpor-
resultou nas nor- te, notadamente.
mas brasileiras
NBR 5425-30.11 Engenharia econômica
Empresas calcu- A engenharia econômi-
lam a "capabilidade" dos equipamentos, ca, isto é, a análise de viabilidade dos in-
isto é, a sua capacidade de produzir qua- vestimentos, de uso obrigatório desde
lidade. Outras desenvolvem programas muito tempo nas subsidiárias das multi-
de conscientização de qualidade, através nacionais, torna-se corriqueira nas em-
de audiovisuais, cartazes, slogans, jornais presas. O uso dessa técnica, que calcula
internos, cartas circulares, museus de de- o retorno e o tempo de recuperação do
feitos, álbuns de defeitos, palestras, cur- investimento, é compulsório para a
11. ABNT. Coletânea de normas sos de treinamento e outros meios de co- apresentação de solicitação de financia-
de planos de amostragem, nor- municação com os funcionários. mento aos bancos oficiais e outros forne-
mas NB 5425, 5426, 5427,
5428, 5429, 5430, 6531, São Criam-se laboratórios de metrologia, cedores de fundos, o que explica seu
Paulo, 1977. ensaios físicos, controle de areia de fun- grande emprego. 13
dição, testes de fadiga e ensaios não des-
12. SCHOEPS,Wolfgang. O mé-
trutivos, dotados de aparelhos sofistica- Gestão de projetos
todo do custeio direto, Revista
de Administração de Empresas, dos, tais como espetrógrafos, capazes de Nesta fase, implantam-se muitos pro-
São Paulo, v. 1, n. 1, p. 57-75, analisar quantitativamente, em alguns se- jetos industriais, envolvendo cifras de
set./dez. 1961. Republicado no
gundos, as dezenas de metais presentes centenas de milhões de dólares e, mes-
v. 32, n. 3, p. 58-66, julho-
agosto 1992. num aço. Aparelhos de raios X, ultras- mo, megaprojetos, de mais de um bilhão
som, campos magnéticos e radiações atô- de dólares. Além da viabilidade econô-
13. GRANT, Eugene L., IRE- mica e financeira desses investimentos,
SON, W. Grant. Principies of en-
micas, apesar do seu alto preço, multipli-
gineering economy. 5. ed. New cam-se nas fábricas. torna-se necessária a utilização de técni-
York: The Ronald Press, 1970. cas aperfeiçoadas de planejamento e
Controle de custos controle de execução dos projetos. Nas-
14. IH, PERT-CUSTO, Um ma-
nual de instrução programada. Populariza-se, nas empresas, a criação cidas em 1957, nos Estados Unidos.>' as
São Paulo: Pioneira, 1964. de setores de contabilidade de custos técnicas de gestão de projetos, conheci-

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EVOLUÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO NO BRASIL

das pelas siglas CPM (Criticai Path Me- ção de renda das pessoas, segundo a
thod), PERT (Project Evaluation and Re- qual há poucos ricos, alguns remediados
view Technique) e PERT-COST, já esta- e muitos pobres. 16
vam firmemente estabelecidas no Brasil Para controlar fisicamente os esto-
em 1960 nas empresas de engenharia ques, as empresas criaram fichas de pra-
consultiva e civil e nas empreiteiras de teleiras ou utilizaram fichários do tipo
obras. Constituem um avanço em rela- kardex, de gavetas horizontais, que se
ção ao anterior instrumento de planeja- tornaram mobília obrigatória nos almo-
mento de projeto, o cronograma, ou grá- xarifados. Setores de compras e supri-
fico de H. Gantt, idealizado em 1917 por mentos foram montados.
este colaborador de F.W. Taylor. 15
Relações humanas
Gestão e controle de estoques Da maior relevância foi o impacto
As técnicas de gestão e controle de dos ensinamentos da Escola de Relações
estoque, apesar de serem divulgadas em Humanas em nossas empresas. Os seto-
todas as empresas, são bem utilizadas
por poucas. Os conceitos de nível de ser-
viço, giro, estoque de segurança ou esto-
que mínimo, ponto de reposição, lote
econômico de compras e de produção,
embora conhecidos por muitas empre-
sas, não chegam a ser populares, em vis-
ta das intensas flutuações de demanda
no mercado nacional, dos freqüentes
atrasos de fornecimento, das corriquei-
ras crises de abastecimento e da antipa-
tia nativa contra fórmulas importadas e
que não se ajustam bem às seqüências
de euforia e crise que caracterizam a
vida econômica do país. O alto custo do
dinheiro e a inflação são fatores adicio-
nais de rejeição à gestão racional dos es-
toques. Segundo muitos empresários, a
criação de um sistema de administração
dos estoques e a organização de almoxa- res de Pessoal transformaram-se em de-
rifados levaria ao preenchimento das partamentos de Relações Industriais e,
prateleiras e ao aumento dos estoques. em seguida, em diretorias de Recursos
Estes sempre foram considerados inimi- Humanos. Atividades de recrutamento,
gos pelos empresários, que, sem ne- seleção, treinamento, atendimento mé- 15. O método PERT-CPM per-
nhum êxito, tentavam diminuí-los. A si- dico, segurança e higiene e concessão de mite estabelecer o seqüencia-
tuação mais comum era o desequilíbrio benefícios, antes rudimentares, passa- mento entre as atividades de
dos estoques, com excesso de metade um projeto complexo, determi-
ram a constituir tarefas de grande visi- nando o "caminho crítico", isto
dos itens e falta da outra metade. bilidade e prestígio nas empresas de é, a cadeia de atividades que
Tentou-se então, pelo menos, gerir porte. não pode sofrer atraso, sob
eficientemente os itens de maior signifi- pena de atrasar o projeto.
Redigem-se manuais de direitos e de-
cado monetário na empresa, os mate- veres dos empregados, descrições de 16. VORIS, William. Production
riais chamados A, que representam 80% funções, elaboram-se planos de carreira control, text and cases. Home-
do valor do consumo, mas perfazem wood, 111.: Richard D. Irwin,
e procede-se à avaliação de mérito dos
1956.
apenas 5% do total dos itens. O excesso funcionários.
de itens das categorias B e C, de reduzi- Estão em voga desde aqueles anos 17. CARTWRIGHT, Dorwin.
do significado monetário, dificilmente programas de sensibilização de executi- Como mudar as pessoas: algu-
mas aplicações da teo ria da di-
constituiria sério acidente financeiro. A vos, através de métodos de dinâmica de nâmica de grupo. In: BALCÃO,
maioria das empresas começou a usar o grupos. São destinados a preparar os di- Yolanda Ferreira, CORDEIRO,
conceito ABC de estoques, criado nos rigentes para mudanças culturais, me- Laerte Leite (orgs.), O Compor-
tamento Humano na Empresa.
Estados Unidos em 1951, e que é uma lhorar os estilos de chefia e resolver Rio de Janeiro: FGV, Servo Pu-
reedição da Lei de Pareto, de distribui- conflitos. 17 blicações, 1967.

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ARTIGO

Dinâmica de sistemas malizam as estruturas organizacionais,


De pequena monta foi a influência da desenhando organogramas e redigindo
Escola de Sistemas nas empresas nacio- manuais de organização, dos quais cons-
nais. Somente as maiores estatais (de si- tam as tarefas de cada departamento e se-
derurgia, mineração e petróleo) monta- tor. A não ser nos órgãos governamen-
ram equipes de Pesquisa Operacional, tais, nos quais os Regimentos Internos
para utilização de técnicas de simulação são obrigações legais, os manuais de or-
e programação Iinear.!" As Teorias dos ganização e procedimentos sempre foram
18. HILLlER, Frederick S., LlE-
BERMANN, Gerald J. Introduc- Sistemas 1~ e da Dinâmica de Sístemas-? considerados pelos dirigentes meros de-
tion to operations research. San foram apresentadas em salas de aula, veres de casa, e nunca haveres relevan-
Francisco: Holden-Day, 1967. mas seus ricos ensinamentos não foram tes. Muitas vezes, o organograma era vis-
19. BERTALANFFY, Ludwig assimilados pelas empresas, avessas a to como uma coleção de jaulas ou "qua-
Von. Teoria geral dos sistemas. conceitos, à primeira vista abstratos, e dradinhos", que tolhiam a criatividade
Petrópolis: Vozes, 1973. Tradu- ávidas por receitas práticas e lucro rápi- das pessoas e restringiam o trabalho em
ção de General system theory,
1968. do. Todavia, os empresários ouviram equipe.
advertências de que era necessário utili-
20. FORRESTER,Jay W. Indus- zar o raciocínio nas decisões e não o fee- Organização industrial
trial dynamics. Cambridge,
Mass.: M.I.T. Press, 1961. ling, sob pena de os resultados se revela- A organização da Diretoria Industrial
rem "contra-intuitivos", isto é, opostos alterou-se. Funções de assessoria, sobre-
21. LERNER, Walter. Organiza- aos que a intuição imaginava que iriam tudo Pesquisa e Desenvolvimento (Enge-
ção, sistemas e métodos. São
ocorrer. nharia de Produto) e Controle de Quali-
Paulo: Atlas, 1975.
dade, assumiram status e níveis mais al-
22. Além de ligas especiais e Organização e Métodos tos. A área de Compras destacou-se da
materiais leves ("compostos"),
As grandes empresas, sentindo neces- Diretoria Industrial e constituiu uma Di-
a tecnologia de ponta abrange a
química "fina", a mecânica de sidade de simplificar as tarefas burocráti- retoria de Suprimentos própria ou foi
precisão, a microeletrônica, a cas, criam setores de Organização e Mé- deslocada para a Diretoria Administrati-
biogenética, a indústria nuclear
todos." Os OM elaboram fluxogramas e va. As áreas de Custos e de Pessoal
e a geração de energia por fon-
tes alternativas. redigem manuais de procedimentos. For- emanciparam-se da fábrica.
No final desse período, por volta de
1970, o país se preparou para realizar seu
quarto salto tecnológico e ingressar na
era da "tecnologia de ponta" 22 (figura 1).
Níveis de Complexidade Tecnológica nos A mola propulsora era a intenção gover-
namental de produzir no país aeronaves,
Quatro Saltos Industriais no Brasil
foguetes, fragatas, submarinos conven-
Nível de Complexidade Tecnológica cionais e nucleares, blindados e tanques
(escala logarítmica) de batalha e, por conseguinte, seus nu-
Ingresso na merosos componentes. Uma aeronave

1000 r--' -
Tecnologia de Ponta chega a ter 700.000 componentes diferen-
tes; uma fragata, 3 milhões; um submari-
i no, 20 milhões, isso sem falar no arma-
Implantação da indústria mento. Produzir aço, alumínio ou titânio

100 1---'
Automobilí,tica
de qualidade aeronáutica, silício para
chip ou sílica para fibra ótica requer o
I cumprimento de exigências técnicas dez
Implantação de lidústrias

10 I --
de Tecnologia Intermediária
.<
a cem vezes mais rigorosas do que as dos
materiais e componentes da indústria au-
tomobilística.
i Foram homologadas cerca de 200 in-

r---
Implantação de Indúst'ias
de Tecnologia Simpl s dústrias nacionais capacitadas para for-
necimento de produtos aeronáuticos e de
armamentos.
As necessidades de recursos humanos
e financeiros foram, em numerosos ca-
1910 1920 1930 1940 1950 1960 1970 1980 Anos sos, subestimadas, não se atingindo a
"massa crítica" necessária para concreti-

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EVOLUÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO NO BRASIL

zar as realizações desejadas. Falhas ge- avançadas, facultando a obtenção de aço


renciais na conduta dos projetos, alguns superlativo, com o qual fabricaram na-
irreais, e a dispersão dos escassos recur- vios e dominaram rapidamente o merca-
sos, levaram ao desperdício de bilhões do de construção naval. A seguir, invadi-
de dólares. ram e conquistaram os segmentos de bi-
O considerável desenvolvimento eco- cicletas, motocicletas, relógios, rádios
nômico do país no período 1957-73, se portáteis, eletrodomésticos, automóveis,
de um lado foi marcado pela instalação robôs, computadores, especialidades quí-
de apreciável parque manufatureiro e o micas, máquinas e outros setores.
desabrochar da administração profissio- As explanações baseadas em ajuda ex-
nal da produção, de outro, foi compro- terna dos EUA, trabalho escravo, dum-
metido por persistente inflação, brutal ping, pirataria e outras práticas escusas
arrocho salarial, explosão da dívida ex- cederam lugar à constatação de que se es-
terna, extravagâncias governamentais e tava presenciando um novo paradigma
irremediáveis erros de julgamento de de gestão industrial.
autoridades e dirigentes, que, como
pressentia uma minoria de observado-
res, iriam desaguar em graves dificulda-
des no futuro.
A crise econômica deflagrada pela
elevação do preço do petróleo, de US$ 2
para US$ 8 o barril, em fins de 1973, e
de US$ 8 para US$ 32 em 1978, retroce-
dendo para US$ 20 nos anos seguintes,
caracterizou-se, nos países importado-
res de energia, como o Brasil, por au-
mento da inflação e da dívida externa,
desaceleração dos investimentos e redu-
ção do ingresso de capitais e, nas em-
presas, pela necessidade de enfrentar
uma situação nunca antes encontrada,
ou seja, redução da demanda e incerte-
za quanto à validade dos modelos de
gestão praticados.
Círculos de Controle de Qualidade
o ERíooo 1974-94 Uma das inovações japonesas rapida-
mente percebida pelos administradores
Reagindo com maior habilidade e agi- brasileiros foi a participação dos operá-
lidade do que os demais países aos au- rios em pequenos grupos, para solução
mentos de custos provocados pela alta do de problemas de qualidade e produtivi-
petróleo e de todas as demais commodi- dade, os chamados Círculos de Controle
ties, o Japão conseguiu impor seus produ- de Qualidade. 23 Criados em maio de
tos industrializados aos mercados oci- 1971,no ABCe no Vale do Paraíba, espa-
dentais. lharam-se nas indústrias de todo o país, e
Era paradoxal um país importador de atingiram o auge de sua popularidade
todas as matérias-primas produzir vasta em 1980.Naquela época, o Brasil foi con-
gama de bens de melhor qualidade e me- siderado o quarto maior detentor de
nor preço do que os países anteriormente CCQ, longe do Japão e da Coréia do Sul e
detentores da supremacia industrial. Es- próximo dos Estados Unidos. Apesar da
tes reagiram, primeiro com estupefação, feroz resistência dos sindicatos, funciona-
indignação e incredulidade e, depois, vam cerca de 50.000 CCQ em mais de
com admiração e emulação. 5.000 grandes e médias empresas. Uma
Os japoneses tinham seguido uma es- montadora de autoveículos, pioneira nes-
tratégia bem planejada de reerguimento sa atividade desde 1971,possui hoje 484 23. BARROS, Claudius d'Artag-
nan C. Círculos de controle de
industrial. Inicialmente, construíram si- grupos, congregando algo como 10% de qualidade. São Paulo: Nobel,
derúrgicas modernas, tecnologicamente seus empregados, que são em número de 1988.

RAE • v. 34 . n. 3 . Mai./Jun. 1994 97


ARTIGO

Análise de Valor
Importante técnica de redução de cus-
MRP - Material Requirements Planning tos, a Análise de Valor - Engenharia de
Valor24 - começou a ser divulgada em
O MRP-I é um software que permite calcular as quantidades de subconjuntos, 1975 em nossas empresas, atraindo muita
componentes e matérias-primas necessárias para fabricar e montar os produtos finais
atenção e gerando reais economias. 25
que constam do plano mestre de produção da empresa. É preciso elaborar a "estrutu-
ra" do produto, ou seja, a ordenação de suas diversas partes (motor, pistão, biela, Dentro de inúmeros exemplos de apli-
pino e assim por diante), de uma forma hierarquizada, como um organograma do pro- cação desta técnica, citemos a economia
duto ou uma árvore genealógica. O software "explode" a estrutura, multiplicando-a de vários metros de fiação elétrica em
pelo plano mestre, obtendo-se as necessidades dos materiais e componentes. determinado modelo de carro, através de
A partir de 1965, o computador de terceira geração (IBM-série 360), valendo-se mudança de posição dos pontos de luz;
desse software, permite efetuar em poucas horas cálculos que, antes, mobilizavam de alguns metros de tubulação de arrefe-
vários homens durante diversos dias.
cimento num modelo de carro, cuja ver-
Avanços mais decisivos ainda ocorreram a partir de 1970, com a ampliação do
são a álcool fora desenvolvida no país; o
software para a cobertura de toda a área fabril. Fala-se doravante em MRP-II - Ma-
nufacturing Resources Planning -, conjunto dos programas de controle da produ- uso de big bags de lt. no lugar da habi-
ção e realimentação da informação emanada do chão da fábrica. Concretizava-se o tual sacaria de 50 kg no transporte de
sonho dos programadores da fábrica, de dispor de uma ferramenta capaz de priori- açúcar, farinha e produtos químicos sóli-
zar e seqüenciar centenas de ordens de produção a ser conduzidas de um posto de dos; de transporte a granel em vez de
trabalho ao outro, em instalações contendo centenas de máquinas. transporte por sacaria; de uso de plástico
Com o MRP, entrou-se na era dos grandes "pacotes" computacionais, que sin- no lugar de metal; de alumínio em vez
cronizam montagem final com fabricação e compra de componentes, antes disso-
de cobre em condutores elétricos; de áci-
ciadas; permitem eliminar as filas de espera entre máquinas; reduzem os prazos de
entrega e minimizam os estoques de produtos em fabricação, matérias-primas e dos e álcalis mais baratos que os ante-
componentes. * riormente usados, em numerosas aplica-
ções; de gás anidrido sulfuroso sob pres-
* ORLlCKY,Joseph. Material Requirements Planning. New York: McGraw-Hill Book Co., 1975. são em vez de enxofre no branqueamen-
Em 1990, foram criados softwares que integram, não só a fábrica, mas todas as áreas da em- to do caldo de cana; de deformação de
presa, nu seja, contabilidade. folha de pagamento, faturamento, compras. produção e demais
atividades. São os chamados Business Planning and Control Systems - BPCS. Quasetodas metal por estam pagem em vez de fundi-
as nossas indústrias dispõem de pelo menos alguns módulos de MRP-I e MRP-Il. Muitas es- ção ou de usinagem deste metal. A lista é
tão aderindo ao BPCS.
interminável.

50.000. Concorridas convenções de CCQ Campanhas contra o desperdício


24. Consiste em analisar siste-
maticamente as funções de cada realizaram-se nas grandes cidades e den- A década de 80 presenciou o lança-
componente de um produto, ve- tro das fábricas. mento de numerosas campanhas de eli-
rificando a possibilidade de se al- minação de desperdícios." A Federação
terar o desenho, utilizar um ma- Em muitas regiões do país, especial-
terial mais econômico ou mudar mente nos estados sulinos e no interior do das Indústrias do Estado de São Paulo
o processo de fabricação, de for- estado de São Paulo, onde existem condi- patrocinou um programa de divulgação
ma a reduzir o custo, sem prejuí- desse movimento. Após a intensificação
zo da qualidade. A AV-EV efetua- ções propícias à participação dos traba-
se por meio de grupos, que de- lhadores, reinou entusiasmo, que parcial- da crise (de 1981 em diante), a dimensão
senvolvem novas idéias, valendo- mente perdura, com essa forma de contri- da redução de custos teve que substituir
se de processos de criatividade, a da conquista de novos espaços no cen-
sendo a técnica de brainstorming
buição dos empregados. As melhorias de
a mais celebrizada. qualidade, eliminação de desperdícios e tro das preocupações empresariais.
redução de custos foram apreciáveis. O
25. CSILLAG. João Mario. Aná- Desburocratização
relacionamento entre patrão e trabalha-
lise do valor. São Paulo: Atlas,
1985. dor evidenciou significativos progressos. As empresas moveram também cam-
Para exemplificar, citemos alguns ca- panhas contra a burocracia, ou melhor,
26. Existe forte tendência ao des- contra o excesso de burocracia. Este se
sos; trabalhadores de uma fiação de rayon
perdício no ser humano. Esse ir-
resistível pendor manifesta-se observaram que eram refugados potes de faz notar por quantidades imoderadas de
sob forma de comida deixada no celeron, um plástico importado e caro - relatórios não lidos, profusões de formu-
prato; luzes acesas iluminando nos quais são enrolados os fios -, sempre lários, demoras na tramitação de papéis,
salas vazias; torneiras pingando;
válvulas de oxigênio mal fecha- que os potes quebravam. Desenvolveram acúmulo de assinaturas em documentos,
das em hospitais; vapor escapan- uma cola e um processo de conserto dos duplicação de serviços, protocolos inter-
do de tubulações de água quente; potes, poupando vultosa importância. nos, regulamentos rígidos e formalismo
calorias dissipadas por encana-
mentos mal isolados; lixo não re- Mecânicos de manutenção inventaram descabido. A situação que ainda prevale-
ciciado. Esses são exemplos de ferramentas e procedimentos que lhes ce na maioria delas é o excesso de pape-
desperdício autêntico, ou seja, de permitiram sacar polias e desmontar ei- lada sem significado, conjugado com a
uma despesa inútil, que não traz
qualquer vantagem. Outros gas- xos de comando com maior rapidez. escassez de informações relevantes. 27

98 RAE • v. 34 • n. 3 • Mai./Jun. 1994


EVOLUÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO DA PRODUÇÃO NO BRASIL

MRP automação da fábrica e do escritório. Re-


Duas siglas fizeram sua entrada em quer agilidade da área comercial, que
cena e não cessaram mais de repercutir nas transmitirá instantaneamente o pedido do
fábricas: MRP e JIT (ver quadros 1 e 2). cliente à área produtiva, e da área finan-
ceira, que liberará rapidamente o crédito. tos supérfluos beneficiam al-
CAD-CAE-CAM-CIM guém em detrimento de terceiros
ou de uma empresa: telefonemas
O projeto, o desenho e os ensaios téc- Ajuste rápido das máquinas inúteis, viagens desnecessárias,
nicos passam a ser efetuados no compu- Nos equipamentos de "comando nu- escritórios suntuosos. prédios
tador, em estações gráficas dotadas de mérico" e nas linhas computadorizadas, extravagantes, construções fa-
softwares. Esses processos, CAD - Compu- raônicas, mordomias exagera-
o ajuste da máquina, para a troca de um
das. regalias absurdas. Para con-
ter Aided Design - e CAE - Compuier Aided lote de fabricação por outro, é instantâ- seguir resultados permanentes
Engineering -, já são corriqueiros nas em- neo. Mas, na maior parte das situações, o contra desperdícios, é indispen-
presas nacionais. Em algumas, as opera- tempo de ajuste excede a trinta minutos, sável que o exemplo venha de
cima, sob forma de austeridade
ções fabris passam a ser comandadas durante os quais a máquina permanece dos dirigentes.
pelo computador (CAM - Compuier Aided parada. O ajuste rápido do equipamento,
Manufacturing). O número de máquinas na troca do item fabricado, torna-se im- 27. Uma das tarefas mais difíceis
do administrador é determinar a
controladas por computador (CNC - Co- peratívo.s' quantidade correta de burocracia
mando Numérico Computadorizado) Ainda é comum em nossas empresas de que a empresa necessita. A
atinge alguns milhares. Robôs e máqui- preciosos recursos produtivos deixarem diretoria deve decidir quais são
os informes necessários e deter-
nas automatizadas são centenas. A inte- de ser utilizados por deficiências admi- minar seus formatos. Um siste-
gração total pelo computador, denomina- nistrativas, como, por exemplo, paradas ma de alçadas, que faz intervir os
da CIM (Compu ter Integrated Manufactu- na hora do almoço, atrasos nas comuni- níveis hierárquicos mais altos
para as tarefas de importância
ring), alastra-se. Uma dezena de fábricas cações, falta de ferramentas apropriadas, maior e os mais baixos para as
conta com almoxarifados e depósitos falhas de programação ou demoras ex- de menor importância, auxilia na
operando com um mínimo de interven- cessivas no tempo de ajuste (set up). Mas desburocratização da empresa.
ção humana (Automated Storage and Re- a maior parte das indústrias nacionais 28. BOON, Gerard K., GARCIA,
irieoal System - ASRS). está corrigindo essas falhas. Alfonso M. Automatización tlexi-
ble en la industria. Mexico: Limu-
Essas cifras são modestas em compara- sa,1990.
ção com as do mundo industrializado, Sistema de produção Toyota
29. YAMASHINA, Hajime. Jot-
mas revelam uma tendência. O elevado Na década de 80, numerosas empresas, Just On Time. São Paulo: IMC In-
custo dos investimentos e o baixo salário no mundo e no Brasil, adotaram um con- ternacional, 1988.
do operário nacional desestimulam a au-
tomatização total e convidam a efetuá-la
de forma progressiva. Mas os clientes
exigem produtos robot made.
A fábrica totalmente automatizada JIT - Kanban
(manless factory, push-button factory) já é
uma realidade - muito mais freqüente o JIT - Just-ln- Time 1 é expressão muito disseminada ern nossas empresas. É a
filosofia de trabalho estribada numa perfeita orquestração das atividades, de modo
que se possa pensar - no Brasil, nas in- que todos os eventos ocorram no mornento certo, evitando-se assirn forrnação de
dústrias químicas, metalúrgicas, siderúr- estoques ou de filas de espera.
gicas, cerâmicas, de vidro, cimento, e au- O sistema kanban2 é urn método de irnplementação da filosofia JIT. O kanban é
tomobilística. O setor industrial já não uma requisição endereçada ao almoxarifado ou ao fornecedor ou urna ordem de
gera novos empregos. Um novo conceito produção destinada a um posto de trabalho para obtenção de um lote de peças. Por
de fábrica emergirá ao se aproximar o exemplo, numa confecção, urn Kanban, levado pelo solicitante ao almoxarifado,
constitui um pedido de fornecimento de todos os aviamentos (linha, botões, zíperes,
terceiro milênio.
etiquetas, decalques) e das peças cortadas de tecido que são necessários para a
costura de 500 unidades de vestuário. O material é separado pelo almoxarife. Será
Fabricação flexível retirado pelo solicitante no momento exato de sua utilização.
Para se adequar à filosofia de JIT, a em- O JIT obteve nas empresas nacionais a participação entusiasmada do pessoal de
presa tem que ir um passo além e adqui- produção, em contraste com a fria acolhida que caracterizou a implantação do MRP
rir a virtude adicional de flexibilidade. 28 nas fábricas. A redução dos estoques tornou-se uma realidade na quase totalidade
Essa é a aptidão de fabricar vasta gama das nossas empresas.
de produtos, freqüentemente em peque-
nos lotes (menos de 50 peças), para pron- 1. CORRÊA, Henrique L., GIANESI, Irineu G.N. Just in Time, MRP " e OPT São Paulo:
Atlas, 1993.
ta entrega (dois dias úteis). Essa meta foi
2. RIBEIRO, Paulo Décio. Kanban. Rio de Janeiro: COP, 1984: LUBBEN. Richard T. Just-
assimilada pelos nossos meios industrial in-time, uma estratégia avançada de produção. São Paulo: McGraw-Hill, 1989.
e comercial. Tornou-se factível graças à

RAE • v. 34 • n. 3 . Mai./Jun. 1994 99


junto de técnicas de produção japonesas, ção universal de sua doutrina, o TQC -
conhecidas como "sistema de produção Total Quality Control, situa-se no pinácu-
30. MONDEN, Yasuhiro. Produ- Toyota" ou "ohnoísmo" (em homenagem lo de todos os programas de melhoria de
ção sem estoaues-. uma aborda- ao ex-vice-presidente industríal desta resultados administrativos (ver quadro 3).
gem prática ao sistema de pro- companhial." As empresas nacionais embarcaram
dução da Toyota. São Paulo:
IMAM, 1984; SCHONBERGER, Essas técnicas incluem o Andon," pai- com fervor na corrente do TQC Coloca-
Richard J. Técnicas industriais nel que emite sinais luminosos destinado ram-se sob a égide de um ou outro dos
japonesas, novas lições ocultas à melhoria da comunicação na fábrica; o liminares mencionados, efetuando as
sobre a simplicidade. São Paulo:
Poka-vokê," dispositivo automático de adaptações às suas condições específicas.
Pioneira, 1984.
inspeção; o TPM Total Productive b/iain- Algumas das que adotaram o programa
31. CHASE, Richard B., NICHO-
LAS, J. Aquilano. Production and ienance= - que consta do arregimenta- zero-defeito obtiveram rápidos resulta-
operations managemenf. 5. ed. mento do pessoal de produção para efe- dos. A maioria prossegue nos seus
Homewood, 111.: Irwing, 1989. tuar a manutenção; a polivalência do em- esforços.
32. SANDRAS JR., William A.
pregado.>' e a célula de manufatura.
Uma guinada de 180" em direção A ISO-9000
ao JIT!TOC. Rio de Janeiro: Cáte- Células de manufatura Grande número de nossas empresas
dra, 1989. estava entretido com o desenvolvimento
A célula de manufatura é uma unida-
33. SCHONBERGER, Richard J. de de produção constituída de um con- dos seus programas de TQC, quando, em
Fabricação classe universal, as junto de equipamentos que lhe conferem 1987, irrompeu novo paradigma de exce-
lições de simplicidade aplica- lência, mais tangível e atingível que o
autonomia na fabricação de uma família
das. São Paulo: Pioneira, 1988.
de produtos, por exemplo, engrenagens, TQC: as normas ISO-9000/9004.38
34. CORRÊA, Henrique L. Flexi- eixos, jeans. Nas células, as máquinas são As normas foram traduzidas, sob a si-
bilidade nos sistemas de produ- dispostas em semicírculo. A distância en- gla NB-9000/9004 (ABNT), ou NBR-
ção. Revista de Administração
de Empresas - RAE, v. 33, n. 3, tre elas é mínima, de forma a facilitar a 9000/9004 (INMETRO).39
maio/jun. 1993. transferência das peças de uma a outra. 35 Verifica-se uma corrida em nossas em-
A célula é responsável por uma cota ho- presa para obter a certificação ISO-9000.
35. SÉRIO, Luiz Carlos, Tecno-
logia de grupo no planejamento rária ou diária de produção. Algumas centenas já a conseguiram. É
de um sistema produtivo. São Nossas empresas estão competindo na um primeiro degrau a ser galgado na di-
Paulo: ícone, 1990. instalação de células de fabricação. É reção do TQC (ver quadro 4).
36. GOLDRATT, Eliyahu M., ponto de honra para cada fábrica ter suas
COX, Jeff. A meta, um processo células. Bancos e companhias de seguro
de aprimoramento contínuo. 10. usam-nas para processar documentos. As
ed. São Paulo: Educator, 1993;
GOLDRATT, E. M., FOX, Roberl fábricas que aderiram à nova "cultura", Nenhum setor da administração de
E. A corrida pela vantagem marcada por células, participação, poli- empresas tem sofrido nas últimas déca-
competitiva. São Paulo: Educa- valência e autogestão dos funcionários, das tantas e tão profundas mudanças
tor, 1992; GOLDRATT, E. M. A
síndrome do palheiro. São Pau- mostram-se satisfeitas com os resultados quanto a gestão industrial. A exacerba-
lo: Educator, 1992. obtidos; o pessoal declara-se feliz com a ção da concorrência, o advento de no-
nova organização da produção. vas tecnologias e o surgimento de novos
37. BUFFA, Elwood S., MILLER,
Jeffrey G. Production - inven- paradigmas ensinaram às empresas que
tory systems, planning and con- A Teoria das Restrições elas são eminentemente mortais. Reco-
trol. 3. ed. Homewood, 111.: Ri- A Teoria das Restrições " procura ofe- nheceram que é preciso melhorar conti-
chard D. Irwin, 1979.
recer soluções simples para problemas nuamente a qualidade, aumentar a pro-
38. Trata-se de um conjunto de complexos de programação da produção, dutividade, reduzir custos e encurtar os
cinco normas publicadas pela tais como priorização das ordens de fa- prazos de entrega, tanto da produção
International Organization for
bricação. corrente quanto das inovações. Essas
Standardization, que estabele-
ceu requisitos minimos para Em vista de sua abordagem acessível, a palavras-chave constituem os fatores de
que a empresa monte um siste- Teoria das Restrições obteve nas empresas sucesso que lhes assegurarão a sobrevi-
ma de qualidade. Há três níveis
maior ressonância que a extensa literatura vência.
de exigências, desde a ISO
9003, mais branda, à ISO 9001, de cunho técnico " que tratou do assunto. Poucas empresas nacionais ficaram
a mais rigorosa, conforme o Elevado número de empresas nacionais a imunes ao "enxugamento", à reestrutura-
grau de controle de qualidade ção, à reengenharia, à terceirização e à
leva em conta na solução dos seus com-
ou garantia de qualidade que a
empresa se propõe a oferecer plexos problemas de programação. adoção dos muitos programas de melho-
aos seus clientes. ria abordados neste artigo.
39. ABNT - Associação Brasilei-
o Controle Total de Qualidade - CTQ As perspectivas são de recrudesci-
ra de Normas Técnicas, Normas Pela nobreza dos seus propósitos, a mento das dificuldades para as empre-
NB-9000, Rio de Janeiro, 1989. profundeza de sua proposta e a divulga- sas. As tempestades modernizantes não

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EVOLUÇÃODA ADMINISTRAÇÃODA PROD~

TOC - Total Ouality Control


o TOC é um conjunto de conceitos, princípios e métodos destina- • Armand Feigenbaum,5 o criador original da expressão "Controle To-
dos a assegurar que a empresa forneça bens ou serviços satisfatórios tal de Oualidade".
ao cliente. • Genichi Taguchi, G cujas contribuições ao planejamento da qualidade
Através do desenvolvimento e do treinamento contínuos das pes- do produto são relevantes.
soas, a empresa melhorará constantemente o nível planejado de quali-
As diversas visões do TOC conflitam em muitos pontos, mas o deno-
dade e manterá a conformidade dos produtos com esse nível.
minador comum de todas as abordagens é a ênfase na necessidade de:
Entre as principais personalidades que estruturaram e divulgaram
• olhar para o cliente. Ouvir o cliente;
a filosofia do Controle Total de Oualidade, citem-se:
• ter o pleno apoio da diretoria na implantação do TOC;
• procurar continuamente a inovação;
William E. Demtnq;' que resumiu suas concepções num programa
• trabalhar em equipes;
de 14 pontos gerenciais É o maior "guru" do TOC.
• treinar todos os funcionários, sem exceção;
Kaoru lshikawa," criador dos CCO, do celebrado diagrama de causa
• utilizar plenamente as ferramentas estatísticas;
e efeito (espinha de peixe) e do Controle Amplo Empresarial de
• estender a todos os departamentos da empresa a preocupação pela
Oualidade. qualidade
Joseph Juran.' É o "papa" do Controle de Oualidade, sua personali-
dade ecumênica. Na base do TOC deve existir nas pessoas o desejo de melhoria
Philip B. Crosby.' junto com Joseph Halpin, em 1962, lançou o pro- contínua, Kaizen, em japonês," ou auto-realização, nas concepções de
grama de Zero-Defeito, ao qual seu nome está ligado. A. Maslow' e H. McClelland.9

1. DEMING, William E. Oualidade: A revolução da administração. Rio de Janeiro: Marques-Saraiva, 1990; SHERKENBACH, William W. O caminho de Deming para
a qualidade e produtividade. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1990; MANN, Nancy R. Deming, as chaves da excelência. São Paulo: Makron Books, 1992; WAL TON,
Mary. O método Deming de administração. 3. ed. Rio de Janeiro: Marques Saraiva, 1989.
2. ISHIKAWA, Kaoru. TOC - Total Ouality Contrai, estratégia e administração da qualidade. São Paulo: IMC Internacional, 1986.
3. JURAN, Joseph M .. GRYNA, Frank M. Controle de qualidade. Handbook, São Paulo: Makron, 1991; Juran planejando para a qualidade. São Paulo: Pioneira,
1989; Juran na liderança pela qualidade São Paulo: Pioneira, 1990: Managerial breakthrough: a new concept of the managers's job. New York: McGraw Hill,
1984.
4. CROSBY, Philip B. Oualidade é investimento. Rio de Janeiro: José Olympio, 1984;. Ouality without tears. New York: McGraw-Hill Book Co., 1984; Oualidade-
falando sério. São Paulo: McGraw Hill, 1990.
5. FEIGENBAUM. Armand V. Total Ouality Control. 3. ed. New York: McGraw Hill, 1983.
6. TAGUCHI. Genichi. Engenharia de qualidade em sistemas de produção. São Paulo: McGraw Hill, 1990.
7. IMAI, Masaaki. Kaizen, a estratégia para o sucesso competitivo. São Paulo: IMAM, 1988.
8. MASLOW, Abraham H. Motivation and personality. 2. ed. New York: Harper and Row, 1970.
9. McCLELLAND, David C. The achieving society. Princeton, N.J.: D. Van Nostrand Co., 1961.

dão mostras de abrandar. O cliente e a ção, autogestão, polivalência, alargamen-


sociedade serão mais exigentes; os con- to e enriquecimento das tarefas.
correntes, mais ativos; a tecnologia, mais Pontos fracos deverão ser removidos:
revolucionária. inexistência de pesquisa tecnológica; ele-
Nossas empresas têm revelado notável vados custos de transporte, encargos, im-
capacidade de se adaptar a condições ad- postos e burocracia; instabilidade econô-
versas e, ultimamente, de absorver novos mica e a perniciosa inflação, que distorce
estilos de gestão que implicam mudanças os dados estatísticos da empresa, impe-
culturais: trabalho em grupos, participa- dindo-a de ter informações confiáveis so-
bre custos, preços e resultados e, em con-
seqüência, impossibilita a tomada de de-
cisão racional.
O estabelecimento de parâmetros de
produtividade, qualidade e custos e a
As empresas que cumprem os requisitos das comparação dos índices obtidos pela em-
normas podem se candidatar a receber um certifi- presa com os das competidoras tbench-
cado de qualificação por um órgão nacional ou in- marking) é procedimento a ser mais utili-
ternacional de homologação, pelo menos para al- zado em nosso meio.
guns dos seus produtos ou setores.
Reduz-se aceleradamente o tempo dis-
A ISO-9000 representa uma volta aos princípios ponível para que os dirigentes se ajustem
e métodos tradicionais na área de qualidade, tais
ao ritmo crescente das mudanças por vir,
como controle estatístico do processo (CEP), for-
malização dos procedimentos e registro cuidadoso que afetarão intensamente as fortunas
das ocorrências. das empresas, os destinos dos trabalha-
dores e a própria face do país.

Artigo recebido pela Redação da RAE em março/94, avaliado e aprovado para publicação em maio/94. 101

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