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GRAHAM, Stephen. Cidades Sitiadas: O novo Urbanismo Militar.

Capítulo 3: O Novo
Urbanismo Militar. Boitempo. São Paulo. p.121-155. 2016.

Temas importantes:
Ideologia militar mais radicais e “sem limites” estão adentrando na vida urbana. O que torna
essa militarização da vida um fenômeno novo são: antagonismo da vida urbana frente um
patriotismo rural e racialmente/culturalmente “puro”; infraestrutura de monitoramento e
controle militar que se funde as estruturas de consumo e comercial, criando o cidadão-soldado-
consumidor; espetacularização da violência, através de diversas mídias, e combinação de
audiência e combate; surto com preocupações de segurança que tomam prioridade das políticas;
atuação transnacional aliado ao discurso de soberania; discurso patriota e anticosmopolita; e
atuação de exceção do Estado para a criação de novos espaços de acumulação.

Destaque aos Autores:


Michael Geyer (1989) define militarização como processo social tenso que a sociedade civil se
organiza para a produção da violência.
Deborah Cowen (2007) trata que as origens dos soldados das forças armadas em geral são
rurais. As áreas rurais assim se tornam locais de militarismo e patriotismo, em contrapartida a
uma visão mais cosmopolita dos centros urbanos.
Gilles Deleuze (1992) “sociedade do controle”, dado o aprofundamento de dispositivos de
monitoramento e controle presentes nas cidades (p.125).
Jordan Crandall (1999) a nova questão da capacidade de inteligência dessas tecnologias é a
criação da “imagem antecipatória” (p.128).
Giorgio Agamben (2002) p.138, descreve como a segurança pública deixa de ser uma das
preocupações da administração pública e passa a ser “único critério de legitimação política”.
Patrick Deer (2007) descreve como o discurso afirma que as empresas ocupam de forma
tranquila e sem atritos os postos na periferia. (p.143)
Kanishka Goonewardena e Stefan Kipfer (2006) firmam o conceito de “urbicído” uma realidade
vivenciada pela “condenados da terra” depois do “fim da história” p.151.
David Harvey. Novo Imperialismo, 2004. Para os conceitos de ‘acumulação por espoliação”

Leitura Corrida:
A militarização urbana não é uma coisa nova, contudo ganha novas traços
contemporâneos, acrescentado de transformações políticas, culturais e econômicas. (p.121).
Michael Geyer (1989) define militarização como processo social tenso que a sociedade
civil se organiza para a produção da violência. Esse processo necessita uma divisão entre nação
e seus amigos, para além de suas fronteiras ou “inimigos locais”. Também envolve a
normalização na sociedade dos paradigmas militares do pensamento Nota: como por exemplo, a
noção que a morte de civis frente aos conflitos que envolvem a polícia ou o exército nas cidades
são vistas como “baixas de guerra”, e não como assassinatos frente a ação de agentes de Estado.
Com essas indagações e os pontos do processo de militarização, o autor discorre o que há de
novo neste processo, que os diferem da Guerra Fria ou das Guerras Totais.

Soldados Rurais, Guerra Urbana p.122


Deborah Cowen (2007) trata que as origens dos soldados das forças armadas em geral
são rurais. As áreas rurais assim se tornam locais de militarismo e patriotismo, em contrapartida
a uma visão mais cosmopolita dos centros urbanos. Também, estes espaços tem um forte caráter
racial, e as cidades ganham um caráter impuro, racialmente e culturalmente Nota: É notável que
essa relação está ligada a formação territorial dos países, está destacado nos EUA, mas aparece
também no resto da América e Europa. A posse a terra foi reservada aos descentes brancos de
Europeus, enquanto os negros e imigrantes tiverem como única possibilidade de vida a ida para
as cidades.
A cidade assim torna-se um lugar de vícios, de impureza social e cultural. Essa questão
conflui para o tratamento do outro estrangeiro baseado nos traços fenótipos das pessoas, em
geral negras e/ou mais escuras. Tanto no exterior quanto no interior do país. O negro e ou árabe
que vive uma grande cidade no país passa a ser visto estão como um agente estrangeiro, e
portanto, passível de se tornar inimigo. Soma-se a isso a forte segregação espacial a qual os
negros e imigrantes estão submetidos, e você tem uma ação localizado no território, pontos nos
grandes centros urbanos que estão sujeitos a ação militar. Nota-se a importância de entender
que os negros e imigrantes não tem acesso à terra, e, portanto, jamais podem fazer comunidades
rurais apartadas como os brancos cristãos costumam fazer, criando territorialidades paralelos
aos Estado no contexto estadunidense.

Monitoramento: cidadão-consumidor-soldado p.124


Uso intenso de tecnológicas Civis e militares de “controle, monitoramento,
comunicação, simulação e mira’ (p.124). Isso se dá tanto pela apropriação do uso industrial e
comercial de tecnologias militares, quanto do uso militar de tecnologias comerciais. Dada a
permeabilidade e vulnerabilidade das cidades contemporâneas, a defesa se faz necessariamente
partir dessas tecnologias.
Gilles Deleuze (1992) “sociedade do controle”, dado o aprofundamento de dispositivos
de monitoramento e controle presentes nas cidades (p.125). Mais do que isso, essas tecnologias
se encontram cada vez dissolvidos na infraestrutura urbana “elas se tornam a cidade” (p.126).
Nota: um movimento que pode ser comparado a da instalação das vias de transito ou rede
elétrica da cidade no século passado, é uma infraestrutura que se torna indistinguível da cidade
como a concebemos atualmente.
Essa difusão de tecnologias de monitoramento fica claro na seguinte passagem:
“Assim, as arquiteturas tecnológicas de consumo e mobilidade se fundem naquelas usadas para
organizar e praticar todo um espectro de violência política, de elaboração de perfils até o
assassinato” (p.126). Mais do isso, o urbanismo militar é a ‘oficina de fundição” na nova gama
de estratégias militares conhecidas como C3I – comando, controle, comunicação e informação.
(p.127). É no urbanismo militar que tecnologias de controle comercial e militar convergem.
Jordan Crandall (1999) a nova questão da capacidade de inteligência dessas tecnologias
é a criação da “imagem antecipatória” (p.128). É assim fundamental para a tomada de ação
preventiva e uso da violência a capacidade de discernimento de diferencias de “alvos” e “não
alvos”.
O uso de todas essas tecnologias, aplica ao discurso do indivíduo consumista, gera uma
noção de “cidadão do bem que consumo” contra um inimigo externo.

Câmera como arma: espetáculos de violência urbana (p.131)


O militarismo urbano é desempenhado e consumido como espetáculo visual e
discursivo. A participação da população dos conflitos não se dá pela ação direta, mas tem-se
acesso a elas “pela televisão, pela internet, por videogame e filmes”. A própria ação terrorista
nessa época, como são todas, é pensada como “espataculavel”. Nota: o autor cita o 11 de
Setembro, mas o importante estender o exemplo a ação de demais extremismos muçulmanos, e
a ação ultraconservadora e supremacista racial. A grande quantidade de produção dessa
violência visualmente e eletronicamente fazem tais informações ficarem “mais e mais diluídas,
a fim que se tornem cada vez mais insignificantes”. Ação dos vídeos games também é destacada
quando entendemos que não há diferença percutível entre a atuação daquele que controle um
drone militar em missão de execução e a partida de um vídeo game (p.132-133).
Temos o termo “rede de entretenimento-mídia-militar-industrial”, mas desenvolvido por
Crandall, ao dizer que tal sistema combinam “espectadores de mídia e combate, audiência e
luta” (p.134).
Contudo, esse grande fluxo de informações sobre a violência praticada na guerra,
espetáculazirada, foi a responsável por “instigar sua desconstrução” (p.137). O seguinte trecho
descreve como uso da tecnologia acabou por fortalecer a capacidade de crítica da atuação da
violência do Estado:
“E enquanto câmeras de vídeo digital têm sido utilizadas para possibilitar canais
baratos da de TV a cabo mostrarem imagem demonizadas dos perigos à espreita no
centro das cidades, essas mesmíssimas tecnologias permitiram que observadores
revelassem as matanças regulares de civis iraquianos pela empresa militar privada
Blackwater” (p.137).
Surto de Segurança (p.137)
Giorgio Agamben (2002) p.138, descreve como a segurança pública deixa de ser uma
das preocupações da administração pública e passa a ser “único critério de legitimação política”.
Cria-se na paisagem um misto de práticas comerciais, militares e de segurança, e “culturas cada
vez mais temerosas de consumo, cidadania e mobilidade civil” (p.138).
Henry Giroux (2006) p.138 “ a presença dos pobres racializados, com suas necessidades
e vulnerabilidades – agora visíveis – se torna insuportável. O que se observa frente aos
momentos de crescimento de pobreza, como o caso das crises econômicas, e o crescente
investimento em empresas de segurança. Estas, aliadas cada vez mais aos governos, muitas
vezes clientes dessas empresas a partir de contratos milionários (p.141). Criam fusões e
alianças, entre institucionalidades civis, militares e comunitárias. Como é destaque ao caso da
União Europeia (p.141) as políticas que envolvem essas empresas atuantes nos governos por
fortes lobbys, focam em como essas empresas podem ganhar maior participação do mercado
global.

Colonizando o urbanismo transnacional (p.141)


A “soberania nacional” é exercida através dos sistemas transnacionais (p.142). Esse
sistema é gerido afim de garantir o funcionamento das “arquiteturas geoeconômicas” (p.142).
Assim, crianças os “enclaves econômicos” na periferia, atraentes para a atuação econômica
central, a qual se estende uma fronteira imaginária. Se estende assim a atuação militar para esses
pontos, protegendo-os contra “as multidões ameaçadoras do lado de fora dos portões urbanos
nacionais ou supranacionais cada vez mais fortificados (p.143). É necessário, contudo, que essa
atuação econômica seja “limpa” por uso da alta tecnologia, e se atrelam ao discurso neoliberal e
fundamentalista de mercado. Patrick Deer (2007) p.143 descreve como o discurso afirma que as
empresas ocupam de forma tranquila e sem atritos os postos na periferia, mas se colocam em
lugares “sujos” como as indústrias de trabalho escravo, favelas e campo de refugiados. Ainda
descreve que os atos da vida cotidiana nesse contexto são considerados guerra, como protestos
ou desobediência civil, organização, que podem assim contar com uma resposta militar.

Cosmopolita e pátria (p.144)


O fenômeno também é marcado pela contradição dos discursos de patriotismo e
valorização das cidades estadunidenses (ou do país em questão), enquanto se faz na atuação de
conexões e vínculos com outros lugares. Contudo, observa que isso é um padrão de vida das
grandes metrópoles, com um pensamento cosmopolita, e que grande parte dos estadunidenses
por exemplo, moram em condições suburbanos. (p.145) Essa população cria uma cidadão
padrão imaginário, que habitam as zonas residenciais abastadas, criando uma noção de interno,
contra o outro externo e perigoso. Assim, o patriotismo pós 11 de Setembro é antilhano e
anticosmopolita (p.146), arregrado a um rural folclórico.
O discurso pós 11 de Setembro, se aliou assim a tese de “choque de civilizações” de
Huntington, colocando a experiência cosmopolita como impossível “inabilidade de conceituar
relações multiculturais e pós-coloniais como qualquer coisa além de risco ontológico e dano
étnico” (p.146). Começou-se um processo de sinalização dos locais multiétnicos nas cidades,
principalmente de imigrantes, marcando “nós e eles”, com forte repressão a essas populações.

Novos espaços estatais de violência (p.150)


Uso da violência do Estado para a reconfiguração espacial, que podem servir para a
segurança urbana e seu discurso, mas também atendem aos interesses da acumulação neoliberal,
principalmente voltadas para a especulação urbana. O Estado consegue através do discurso de
atuação contra inimigos e em prol da segurança, criar regulamentações e ações de exceção. A
“destruição criativas “ (acréscimo meu) encontra o discurso o qual pode ser ancorar para ser
legitimado:
“Dessa forma, estados de emergência sustentam geografias mais amplas de
acumulação pela espoliação, que, apesar de serem tão antigas quanto o colonialismo,
provam ser especialmente úteis para a globalização neoliberal” (p.151).
Kanishka Goonewardena e Stefan Kipfer (2006) firmam o conceito de “urbicído” uma
realidade vivenciada pela “condenados da terra” depois do “fim da história” p.151. Definido
como a violência empregada para “matar” cidades, a partir de experiência como a Palestina ou
Fallujah. Se dá com a “transformação de espaço cosmopolitas em alvos neonacionalistas”,
“destruição sistemática dos meios de subsistência para a vida moderna” ou “aniquilação direta
de povos e lugares demonizados” (p.151).
Assim, a atuação se dá para uma nova forma de “acumulação primitiva” a partir da
destruição militar e apropriação forçada. Aqui ele cita Harvey e a “acumulação por espoliação”.
O autor aponta assim no final para uma reorganização, por meio dos sete pontos levantados, da
geografia e da “experiência de fronteiras e limites”.

Minha pergunta final:


O texto com certeza ne foca muito na experiência estadunidense, sob a perspectiva de
economia central no sistema mundo. Como é possível traduzir o texto para nossa experiência
periférica? Acredito que de duas maneiras:
 A primeira se dá partir do desolamento do discurso e dos processos para a
realidade brasileira, entendendo por exemplo, como explicar o surto de
segurança das elites brasileiras e a ascensão da direita ultraconservadora. Bem
como o discurso aliado a destruição de espaço em prol da acumulação se dá em
espaços empobrecidos, como periferias urbanos, ou reservas indígenas ou
quilombolas.
 O segundo, mais difícil, é entender como os efeitos desses fenômenos
praticados no centro no atinge como periferia externa e, portanto, nos coloca
sob a condições de possível ameaça externa. Como a criação desse discurso,
voltado para nós, nos coloca sob a possibilidade de atuação, desregulamentada
e violenta de empresas estrangeiras.

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