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REVOLUÇÃO INDUSTRAL: ANTECEDENTES

A Revolução Industrial foi a transição para novos processos de produção


no período do século XVIII e XIX. Esta transformação caracteriza-se pela
troca de métodos artesanais pela produção em série, feita por máquinas.
Existem divergências sobre o que se acredita ser a principal explicação para
este fenómeno, e muitas são as causas apontadas. A primeira é o
crescimento demográfico ocorrido principalmente no século XVIII, e
sentido na Europa inteira, e provocado pela descida das taxas de
mortalidade. A mortalidade vai descer maioritariamente devido aos
progressos realizados no âmbito da higiene: construção de esgotos,
pavimentação das ruas, aduções de água, melhoria na alimentação
(aumenta-se o consumo de carne fresca), e secagem de pântanos. Para além
disto verifica-se uma melhoria na medicina, que se torna mais rigorosa e
eficiente. Todo este progresso vai obviamente diminuir as doenças e por
isso reforça a capacidade de trabalho da população.
Neste século verificam-se também grandes movimentos migratórios, tanto
para a Europa como para o resto do mundo. Países como os EUA, o
Canadá, o Brasil, a Argentina, a Nova Zelândia, a Austrália e a África do
Sul mostram-se muito atrativos. Na Europa, os polacos, judeus e eslavos
vão se dirigir para países no ocidente como a Alemanha; os italianos,
espanhóis, suíços e belgas preferem o território francês; e a Inglaterra irá
receber imigrantes de todo o lado, embora tenha sido das ilhas britânicas
donde saíram mais migrantes. A população emigrava maioritariamente por
motivos económicos, embora houvesse casos em que fugiam de
perseguição e opressão política/religiosa.
O crescimento da população europeia irá provocar uma crescente
urbanização, com a expansão das cidades. Estas cidades, muito atrativas,
vão receber não só imigrantes estrangeiros como migrantes das zonas
rurais. Podemos dizer que a urbanização irá acompanhar o crescimento
demográfico.
O que não podemos afirmar é que o crescimento demográfico é a
explicação para o rebentar da Revolução Industrial, visto que temos como
exemplo o facto da Rússia, a nação menos desenvolvida na Europa, com
taxas de crescimento maiores que a Inglaterra e Alemanha (as duas nações
mais industrializadas na Europa), e do que a França (não só outra nação
muito industrializada, como também a que tinha a maior população na
Europa). Podemos, no entanto, dizer que o crescimento demográfico
aplicou pressão na produção para tentar manter o equilíbrio entre
mantimentos e população.
A produção agrícola vai aumentar bastante devido aos progressos que vai
conhecer: abandonam-se métodos de cultivo improdutivos; dá-se a abolição
do pousio; os baixos custos do ferro vão promover o uso e surgimento de
ferramentas de cultivo mais eficazes e resistentes; começa-se a utilizar
fertilizantes; alarga-se a área de cultivo e introduz-se maquinaria como o
ceifador mecânico.
O crescimento demográfico teve efeitos positivos e negativos.
Primeiramente tonou o trabalho mais abundante, o que fez diminuir os
salários para se aumentar lucros. Neste caso, a condição favorável á
Revolução Industrial é a concentração de uma força-de-trabalho barata que
permitisse desenvolver a indústria, aumentar lucros e investimentos. O
efeito negativo reside no facto de que muita mão-de-obra significava
atrasos na inovação e na mecanização.
Para alguns historiadores, o crescimento demográfico foi positivo pois
fornecia mercado para a agricultura e para a indústria. Boserup explica que
a pressão demográfica ajudava a acelerar a passagem para uma agricultura
mais intensiva e permitia aumentar a produção, diminuir preços e abrir
caminho para a industrialização.
Segundo Komlos, as crises malthusianas (quando a procura alimentar
superava a oferta) não impediam a Europa de acumular capital. A pressão
demográfica que ocorria depois de um colapso malthusiano era sempre
acompanhada de progressos, e por isso a Europa era já capaz de superar a
armadilha malthusiana.
Philippe Aries ressalta a mudança das mentalidades, principalmente em
matéria da infância e família, que ocorre devido ao crescimento
populacional e o aumento da esperança média de vida. Explica como a
descida da mortalidade infantil leva às famílias a escolher ter ou não uma
criança, verificando-se a propagação de métodos contracetivos. Começa-se
a dar muita mais atenção á educação das crianças e aumenta a preocupação
pelas heranças.
Outros autores ressaltam a revolução do consumo, sentida no frenesim de
compras ocorrido no final do século XVIII. A imprensa e publicidade vão
tiveram um papel muito importante nesta revolução.
Por todos os países europeus vai se sentir uma contração populacional,
sobretudo nas zonas urbanas. Este fenómeno de urbanização vai ser
encabeçado pela Inglaterra, e nota-se que a população dos países
industrializados se concentra mais nas cidades, que por caso eram também
as mais industrializadas. Mas o que leva esta população para as cidades?
Primeiramente tem que se entender que o único impedimento para a
expansão das cidades era a sua incapacidade de fornecer á sua população os
bens que necessitavam. No entanto, com os processos na indústria, esta
limitação abranda. Segundo é necessário perceber que nas sociedades pré-
industriais a maioria da população vivia no campo, mesmo que não
participasse na agricultura, pois era mais barato transportar produtos
manufaturados (têxteis por exemplo) do que transportar matérias-primas ou
alimento para as concentrações de trabalhadores. Porém a situação
invertesse com a introdução da energia a vapor e do sistema fabril, com a
troca do carvão vegetal pelo coque, e com a revolução nos transportes.
Os investimentos nas estradas e canais, no século XVIII, vão diminuir os
custos e a duração do transporte de mercadorias, permitindo a diminuição
dos preços reais, um aumento do consumo e do lucro. Diferentes
transportes tinham diferentes funções: o transporte marítimo era mais
barato, transportava mercadorias volumosas, mas a sua duração era maior;
os transportes por terra eram utilizados para correio e bens de luxo não
volumosos, eram mais caros, mas mais rápidos. Aliás, a força dos
caminhos-de-ferro provém do facto de juntar as vantagens de ser um
transporte barato e rápido, com o facto de que podia transportar todo o tipo
de mercadorias, para além de pessoas. Esta revolução nos transportes
permitiram o melhor funcionamento das redes de comércio, ligando as
cidades entre si, o que ajudou a desenvolver a industrialização, a
urbanização e o comércio. Embora muito importantes, assim como a
revolução agrícola, a revolução dos transportes não explica totalmente a
Revolução Industrial.
Houve também uma revo0lução importante na comunicação, que permitiu
reduzir custos na impressa, ajudou a divulgar imagens visuais e permitiu
ligar países entre si: maquinaria de fabrico de papel; imprensa rotativa;
desenvolvimento da litografia e da fotografia; e a criação do telégrafo
elétrico.
Outro fato para a Revolução Industrial foi o comércio externo, segundo as
explicações tradicionais. Este comércio teve um papel crucial, primeiro
porque a procura estrangeira por produtos manufaturados deu ás industrias
acesso ao mercado mundial o que lhes permitia atingir dimensão suficiente
para promover a especialização, para alcançar mercados de larga escala e
para efetuar descidas de preços. Depois disso, o acesso a matérias-primas
(algodão, madeira, ferro, etc.) garantia a instalação de indústrias de
transformação (refinarias de açúcar, manufaturas de tabaco, indústrias
têxteis, etc.). Permitia também estimular contatos, criar novos hábitos de
consumo e novas técnicas de produção.
Os lucros deste comércio externo eram depois investidos nas
infraestruturas, nas minas e em atividades secundárias. O comércio externo
permitiu o desenvolvimento de serviços financeiros que beneficiavam tanto
a economia, como a indústria.
Estes serviços financeiros surgem com a revolução financeira que teve um
impacto enorme principalmente na Inglaterra. Estes serviços são fornecidos
por bancos que surgem pela iniciativa privada de homens de negócio que se
dedicavam a empréstimos de dinheiro a juros. São estes que colocam
dinheiro a circular até que a população ganha confiança nestas instituições
para guardarem o seu dinheiro. Os mais pobres serão incentivados à
poupança. São estas redes de bancos que irão financiar as inovações
agrícolas, o comércio internacional e a indústria.
INGLATERRA: PRIMAZIA
Porque que arranca a revolução industrial na Inglaterra e não em outro país
mais rico e povoado como a França? No final do século XV a Inglaterra era
um país subdesenvolvido, com poucos habitantes quando comparada com
outros países europeus. No ponto de vista tecnológico e económico, a
Inglaterra encontrava-se extremamente atrasada.
A Inglaterra produzia a melhor lã, e os seus produtos eram normalmente
exportados para os Países Baixos e dai eram espalhados pelo continente.
Tradicionalmente os mercadores alemães abasteciam-se de produtos
italianos, mas devido a vários infortúnios a Itália deixa de ser capaz de
satisfazer as necessidades alemãs, o que obriga os mercados a procurar
produtos na Antuérpia, onde vão ter acesso a produtos ingleses. Começa
assim a era de ouro das exportações inglesas.
Reagindo a carências, a Inglaterra vai procurar utilizar novas técnicas que
lhes permitisse utilizar os seus recursos naturais em quantidades mais
amplas. Concentrou-se no ferro e no carvão, o que provou ter sido uma
decisão essencial para o arranque industrial.
Os imigrantes vão ter um papel muito importante na Inglaterra, Vindos de
todos os lados, trazem consigo técnicas e processos novos que vão
revolucionar industrias como a da relojoaria, do vidro e da seda. Para além
disso têm uma importância no comércio internacional, visto que o comércio
de produtos tropicais garantiu o surgimento de indústrias de transformação
como as refinarias de açúcar.
O desenvolvimento do mercado internacional exigia mais especialização e
sofisticação que o eixo Londres-Antuérpia. Mas foi este mesmo
desenvolvimento que contribuiu para a expansão da procura por produtos
ingleses, deu acesso a matérias-primas que alargaram a variedade e
baixaram os preços do produtos, deu aos países subdesenvolvidos poder de
compra de produto ingleses.
As explicações tradicionais da primazia britânica ressaltam os fatores
ligados ao mercado. A Inglaterra dispunha de um mercado interno rico,
denso e capaz de absorver a produção industrial em crescimento; os seus
rendimentos per capita eram altos; os progressos na agricultura
aumentaram a produção; a sua urbanização era maioríssima e mais rápida
do que na França: e as suas cidades eram mais próximas e ligadas entre si o
que permitia a criação de uma rede favorável para a distribuição de
mercadorias, pessoas e informação.
O aumento populacional que afeta a Inglaterra vai aumentar a pressão de
compra, o que acabará por provocar o abandono do sistema de indústrias
rurais, pelo sistema fabril próximo dos locais de consumo (domestic system
– factory system). O mercado colonial, principalmente com os EUA, vai se
desenvolver cada vez mais, mesmo depois da independência destes.
As outras explicações tradicionais falam de fatores geográficos que
favorecem a Inglaterra. As características especificas do território britânico
travaram tentativas de invasão, o que fez diminuir as despesas militares e as
perdas humanas e materiais, em comparação com outros países europeus. O
território, devido á sua vasta rede de rios, mostrava também ter uma
facilidade natural para o transporte marítimo. Este fácil uso deste transporte
mais barato vai permitir aumentar lucros e acelerar a urbanização e
industrialização. O território por ser mais pequeno que a França, e mais
denso, tinha a terra mais cara o que desviou investimentos fundiário e
concentrou as atenções nos investimentos industriais. Juntando a estas
vantagens, a riqueza natural da Inglaterra em ferro e carvão permitiu que
esta passasse de uma economia orgânica de recursos de seres vivos
(animais e plantas) para uma economia mineral de recursos quase
ilimitados.
Outra explicação tradicional reforça o fator da escassez relativa. O facto da
Grã-Bretanha ser mais pobre que a França em recursos tradicionais fez com
que esta procurasse formas de superar os seus constrangimentos. O declínio
das florestas explica a substituição da madeira pelo coque como
combustível; a falta de mão-de-obra explica a mecanização; a escassez de
terra explica os incentivos ao investimento na industria; a insuficiência de
formas de energia tradicionais (vento e água) explica os esforços na
investigação da energia a vapor; e a possibilidade de importar algodão em
quantidades limitadas favoreceu esta matéria em relação á lã (produto
nacional mas limitado). Podemos dizer que a Rveolução Industrial foi o
resultado a sucessivos esforços da Inglaterra de fazer frente aos obstáculos
que sofria no seu crescimento.
Mais uma explicação ressalta os fatores institucionais. Ao contrário da
França que se via assolada por revoluções, a Inglaterra desfrutava de uma
certa estabilidade política. No âmbito religioso também há diferenças, com
a França a expulsar os huguenotes e a Inglaterra a instaurar uma tolerância
com os seus dissidentes religiosos. Estes indivíduos vão ser responsáveis
por criar comunidades entre si, que defendiam o progresso, o investimento
e o crescimento. Vão ser homens de negócios, banqueiros, investidos,
inovadores e empreendedores.
A sociedade britânica também erguia menos obstáculos entre grupos
sociais, ao contrário da França. A oposição entre aristocracia e burguesia
era menos sentida na Inglaterra, os casamentos mistos e empresas comuns
eram frequentes e os “landlords” (proprietários) viravam-se naturalmente
para a indústria.
Para além disto, os progressos educativos explicam também o avanço
inglês. No século XVI apenas uma pequeníssima percentagem da
população inglesa era alfabetizada. Mas no século XIX já mais de metade
sabia assinar o seu nome. No âmbito da ciência e técnica, nota-se que a
França vai investir na investigação teórica e abstrata, enquanto a Inglaterra
investiu na investigação pragmática e aplicada. A resistência à inovação
parece ter sido maior na França do que na Inglaterra.
A Inglaterra vai também sofrer uma revolução financeira, com o
surgimento de redes de bancos que ajudaram a financiar o mercado
internacional, as inovações agrícolas, industriais e nos transportes. E a
rápida construção dos caminhos-de-ferro ingleses foi também um grande
fator para a sua primazia na industrialização, facilitando a circulação de
todo o tipo de mercadorias.

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