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EDUCAÇÃO CORPORATIVA

Uma revolução invisível - EDIÇÃO BRASIL

Cresce a adesão a projetos de treinamento para desenvolver nas pessoas competências críticas ao
negócio e também acelerar grandes mudanças nas organizações.

O atual momento de crescimento econômico do País e de euforia pela futura realização da Copa do
Mundo e das Olimpíadas, em 2014 e 2016, respectivamente, colocam em evidência a extrema
importância de capacitar e educar pessoas, seja para enfrentar a crise internacional, seja para
sustentar o crescimento interno e aproveitar as oportunidades dele decorrentes.

Hoje, todas as empresas que pretendem surfar não apenas na onda do crescimento econômico,
mas também do real desenvolvimento, sabem que isto não será possível sem a formação
permanente de pessoas.

Mas as empresas no Brasil ainda precisam lidar com as falhas de um sistema educacional
(fundamental e médio), que embora tenha melhorado, ainda é um dos piores desempenhos no
PISA (Program for International Student Assessment). Somos a sexta maior economia do mundo,
ou seja, um “trem-bala“ operado por uma “maria-fumaça”. Por isso, do Oiapoque ao Chuí, seja qual
for o setor de atividade da empresa, os desafios relativos à capacitação e formação de pessoas
simplesmente assustam.

Não por acaso, a preocupação com mão de obra (disponibilidade, custo e qualificação) chegou ao
topo da lista de temores dos executivos que comandam grandes empresas brasileiras, seja na
indústria, no varejo ou em serviços.

De modo geral, o saldo do balanço das atividades de educação corporativa é muito positivo e
adquiriu grande relevância na gestão empresarial brasileira nos últimos anos. Portanto, não se trata
apenas de mais um modismo, mas sim de uma real consciência por parte das lideranças

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empresariais da importância da educação como condição para a competitividade.

Os sistemas de educação corporativa terão que intensificar suas atividades e os resultados obtidos
na Pesquisa Nacional de Educação Corporativa 2009 (realizada pela Fundação Instituto de
Administração — FIA), organizados em três categorias de perguntas, podem ajudar nesse sentido:

O que se tem feito?

Os conceitos básicos estão sendo cumpridos, uma vez que as ações educacionais são voltadas
para atendimento da estratégia, busca de vantagem competitiva e disseminação da cultura
organizacional.

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O que há por fazer?

• Ações educacionais mais direcionadas para o desenvolvimento de competências para inovação,


empreendedorismo e sustentabilidade.

• Maior integração entre as práticas de educação corporativa e os processos de gestão de pessoas.

• Adoção mais abrangente de práticas de educação a distância.

• Maior envolvimento dos líderes.

Quais os principais desafios e tendências?

• Valorização da meritocracia.

• Uso contínuo de tecnologia.

• Mensuração dos resultados.

• Extensão dos programas educacionais às partes interessadas.

• Estabelecimento de parcerias ou alianças com outras empresas.

• Educação corporativa para sustentabilidade.

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Tais desafios para implantação e consolidação dos Sistemas de Educação Corporativa (SECs) nas
organizações brasileiras requerem profissionais cada vez mais bem preparados para esta realidade.

Articulando conceitos

Quando uma empresa se interessa em implantar um SEC, deve basicamente responder a três
questões-chave:

Por que fazer? Refere-se ao motivo principal para implantar o SEC, que é elevar o patamar de
competitividade empresarial, por meio da instalação e consolidação de suas competências
empresariais, organizacionais e humanas.

O que fazer? Diz respeito ao que deve ser feito para que o SEC efetivamente aumente a
inteligência da empresa por meio da implantação de um modelo de gestão de pessoas por
competências e da gestão de conhecimento.

Como fazer? Para que um SEC atinja seus propósitos é essencial que a mentalidade de

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aprendizagem contínua permeie de forma alinhada três níveis: empresa, líderes e pessoas. É
crucial a criação de um ambiente e uma cultura empresarial cujos princípios e valores disseminados
sejam propícios a processos de aprendizagem ativa e contínua, que favoreça a formação e atuação
de lideranças exemplares e educadoras que estimulem nas pessoas a postura do
autodesenvolvimento.

Na figura ao lado, são sintetizadas estas ideias sobre as relações entre competências, gestão do
conhecimento, cultura oganizacional e um SEC integrador e articulador desses conceitos.

Prencípios e estrutura

Princípios são os fundamentos filosóficos que devem nortear a elaboração de um plano estratégico
consistente e de qualidade de um SEC bem-sucedido. Para que a estratégia vire realidade é
necessário que sejam feitas escolhas organizacionais integradas sob o ponto de vista da cultura,
estrutura, tecnologia, processos e modelo de gestão empresarial (em especial modelo de gestão de
pessoas por competências), que favoreçam escolhas pessoais que transformem estes princípios
em ações, práticas e hábitos corporativos.

Práticas são as escolhas organizacionais que permitem transformar escolhas estratégicas


(competências organizacionais) em escolhas pessoais (competências humanas).

Na figura acima, propomos sete princípios de sucesso de um SEC.

O fator essencial na concepção do projeto de educação corporativa é que ele atenda ao princípio
fundamental desse novo modelo de aprendizagem: auxiliar as organizações a desenvolver nas
pessoas as competências críticas ao seu negócio. As fases do projeto de educação corporativa são
uma forma didática de mostrar os pontos que devem ser observados para que o resultado esperado
em capacitação seja atingido.

Minha experiência tem demonstrado que um diagnóstico das competências organizacionais,


conduzido com cuidado com a alta administração, pode contribuir de maneira significativa para
definir as necessidades das empresas e, consequentemente, as necessidades das pessoas em
termos de preparação e qualificação.

Como resultado desse diagnóstico das competências organizacionais (que, em síntese, são aquilo
que a empresa sabe fazer melhor — ou deveria saber), devem ser definidos os principais “eixos de
competências” para a empresa, que são as principais vertentes da estratégia competitiva do
negócio.

Em seguida devem ser definidos os principais atributos de competências mapeadas dentro de cada
um dos eixos definidos. Definidos o eixo de competência e seus atributos, é possível identificar os
principais públicos relacionados. Esse alinhamento e integração das competências aqui propostos
são cruciais para fundamentar a elaboração do plano de ação estratégico do sistema de educação
corporativa. O plano permite identificar os públicos que deverão ser atendidos, qual a natureza dos

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principais conteúdos das ações e programas educacionais e o nível de profundidade adequado
para atender cada um desses públicos.

Ao conceber, estruturar e sistematizar intencionalmente todas as ações (formais ou informais) e


programas educacionais do SEC, devem ser contemplados sempre os eixos de competências
definidos. Desta forma, garante-se o alinhamento destes eixos com as estratégias do negócio da
empresa. Sempre que houver um reposicionamento estratégico da empresa, deverão ser
rediscutidos e revistos os eixos de competências empresariais que dão sustentação às principais
escolas do sistema de educação corporativa.

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Fases do projeto

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A primeira fase do projeto é o alinhamento entre os aspectos estratégicos da organização e seu
sistema de educação corporativa. Será necessário inicialmente que a organização deixe claro qual
sua razão de ser (missão), aonde pretende chegar nos próximos anos (visão) e quais valores
nortearão sua estratégia. Também é importante que os principais objetivos estratégicos da
organização sejam definidos e divulgados para que todos os esforços internos estejam em sintonia
com as ações que irão conduzi-la nos próximos anos e que definirão seu posicionamento no
mercado.

O SEC deve começar pela definição das diretrizes estratégicas da organização. É preciso que
estejam claros os alicerces que irão nortear os esforços de desenvolvimento das pessoas para que
o processo de treinamento reativo seja realmente substituído por um sistema que desenvolva as
competências críticas do negócio. A fase de alinhamento estratégico deve ser conduzida pela alta
direção da organização; contudo, quanto mais participativo for o processo, mais rico e abrangente
será. Sugere-se que sejam utilizados grupos de trabalho para a produção do material necessário a
esta fase.

A segunda fase é o mapeamento das competências da organização para que ela atinja seus
objetivos estratégicos, em consonância com sua missão, visão e valores. Uma organização que
pretenda implantar projetos de educação corporativa deverá promover esforços consideráveis para
mapear suas competências críticas, que darão origem aos programas educacionais a serem
oferecidos aos seus diversos públicos.

Não existe SEC consistente sem que as competências da organização estejam mapeadas para
seus diversos públicos. O sistema a ser implantado não irá apenas desenvolver certas habilidades
nas pessoas, mas sim criar as competências necessárias à estratégia do negócio.

As diretrizes definidas na fase anterior, de alinhamento estratégico, deixarão claras quais


competências deverão ser desenvolvidas. O processo de mapeamento das competências deverá
ser feito de forma participativa para que os resultados sejam mais efetivos. Sugere-se que sejam
realizados workshops com as pessoas-chave da organização e, a partir da missão, visão, valores e
dos objetivos estratégicos, sejam definidos quais competências devem ser desenvolvidas para
atender às necessidades estratégicas da organização.

Resumidamente, existem três níveis de competências numa organização:

Empresariais — São aquelas já instaladas que identificam o negócio como um todo, ou que
precisam ser adquiridas para o futuro projetado ser bem-sucedido. Essas competências posicionam
a organização em seu mercado e perante a concorrência. Competências empresariais, que são
difíceis de imitar, dão acesso a novos mercados e são reconhecidas como diferenciais pelos
clientes; são chamadas de core competences, ou competências essenciais.

Organizacionais — Também são empresariais, mas ligadas a determinadas áreas ou processos, e


dão sustentação às competências empresariais.

Humanas — Estão ligadas às capacidades a serem desenvolvidas nas pessoas e são necessárias
para que a organização obtenha suas competências empresariais e organizacionais.

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Os sistemas de educação corporativa trabalham no nível das pessoas. Logo, as competências que
serão desenvolvidas pelos sistemas educacionais das organizações serão as competências
humanas. Quando os colaboradores atingem as competências humanas, as organizações têm
condições de obter suas competências organizacionais e empresariais, porque possuem pessoas
em seu quadro com capacidade de responder às necessidades do negócio.

As competências humanas podem ser divididas em técnicas/funcionais, gerenciais e gerais. As


competências técnicas/funcionais são desenvolvidas pela absorção de técnicas específicas ao tipo
de trabalho realizado. As competências gerenciais representam habilidades comportamentais e
técnicas dos gerentes. As competências gerais estão ligadas aos valores e cultura necessários ao
negócio da organização.

O processo de mapeamento das competências representa o detalhamento estratégico na forma de


“camadas organizacionais”. Isto é, a partir da definição estratégica, que é a missão, visão, valores e
objetivos da organização, é feita uma reflexão sobre quais competências existem ou devem ser
desenvolvidas para que ela atinja suas metas. Nesta fase, não importa em qual estágio a
organização esteja em cada competência definida, pois as lacunas existentes na formação das
pessoas serão tratadas pelo SEC a ser criado.

A terceira fase é a validação estratégica do projeto de educação corporativa e representa um


compromisso da alta direção, fator fundamental para o sucesso do projeto. Nesta fase, serão
definidos: missão, visão, os objetivos gerais e específicos, diretrizes, meios a serem utilizados e
fatores críticos de sucesso para o novo sistema educacional. Esta reflexão é importante para que o
projeto leve em consideração os aspectos que, se não forem atendidos, poderão resultar num
projeto sem legitimação e que não trará as mudanças necessárias aos objetivos estratégicos da
organização.

A quarta fase é o “coração” do sistema de educação corporativa, quando são criadas as escolas.
Uma escola é um conjunto de conteúdos agrupados para atender ao desenvolvimento de
competências específicas destinadas a determinados públicos. Cada escola possui objetivos
específicos e programas educacionais que irão seguir os formatos mais adequados aos seus
propósitos e a seus públicos. Os programas oferecidos são entendidos como produtos do sistema
educacional da organização e, em muitos casos, se tornam fonte de receita, conforme o princípio de
efetividade da educação corporativa. Resumidamente, as escolas ou centros de formação das
universidades corporativas (UCs) são o conjunto de soluções de aprendizagem oferecidas pela
organização com o objetivo de desenvolver nas pessoas as competências humanas exigidas para
sustentar os eixos de competências críticas empresariais.

Grande parte do esforço para a implantação de um projeto de educação corporativa será


concentrada na fase de definição das escolas, mas é fundamental que as organizações não tentem
queimar etapas e partir para esta fase sem anteriormente realizar o alinhamento estratégico e o
mapeamento das competências. Isso significaria seguir com o modelo de centro de treinamento,
que treinava pessoas sem preocupação com a estratégia do negócio. Para que a educação
corporativa não seja apenas um novo rótulo, ela deverá atender a dois propósitos: ser um
diferencial competitivo e um fator de mudança cultural e organizacional.

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Os SECs normalmente são divididos em escolas e estas subdivididas em pilares ou centros, em
função do tipo de formação a ser oferecida e das competências que serão desenvolvidas. Esta fase
é considerada o “coração” do sistema, pois nela serão definidos, além das escolas, os programas
de formação, os formatos e produtos do novo projeto educacional.

A qualidade do sistema de educação corporativa a ser criado, representado pelas suas escolas,
dependerá da qualidade das definições realizadas nas fases anteriores. Caso o mapeamento de
competências tenha sido definido de forma superficial, as escolas irão carecer de informações e
conceitos necessários ao atendimento das necessidades da organização.

Marisa Eboli (meboli@usp.br) é professora do Departamento de Administração da Faculdade de


Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP), onde obteve
os títulos de mestre e doutora em administração. 
Foi uma das coordenadoras do livro Educação
Corporativa: Fundamentos, Evolução e Implantação de Projetos, terceiro lugar do Prêmio Jabuti
2011.


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