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Semiótica, música e ensino do português

Darcilia Simões

Instituto de Letras — Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) –


www.darcilia.simoes.com — darcilia@simoes.com

Abstract. This work presents proposal alternative of education of Portuguese


language with semiotics foundation, with sights to optimizer the lessons of
reading and writing texts in L1. It is about didactic-pedagogical strategy that
explores song music as adequate literal sort to the development of generating
significant learning of linguistic fluency and capacity to infer the literal
iconicidade.
Key-words. Stimulation of sensitivity; diversity; artistic and cultural expression;
domain of languages and codes; song music.
Resumo. Este trabalho apresenta proposta alternativa de ensino de língua
portuguesa com fundamentação semiótica, com vistas a dinamizar as aulas de
leitura e produção de textos em L1. Trata-se de estratégia didático-pedagógica
que explora letras-de-música como gênero textual adequado ao
desenvolvimento de aprendizagem significativa geradora de fluência lingüística
e capacidade de depreender a iconicidade textual.
Palavras-chave. Estimulação da sensibilidade; diversidade; expressão artística
e cultural; domínio de linguagens e códigos; letra-de-música

A música e o ensino da língua portuguesa: um projeto semiótico


Nosso atual projeto visa à construção de estratégias didáticas de base semiótico-
estilística para a implementação de um ensino do idioma a partir da exploração de letras de
música brasileira. Trata-se de estudo voltado para a variação lingüística e para a análise dos
contornos icônicos e expressivos presentes nos textos musicais, os quais informam o estudante
sobre a norma gramatical, a riqueza lexical e a importância da escolha das palavras na
produção textual.
Esta perspectiva contempla um indivíduo dotado de sensibilidade que precisa ser
trabalhada em prol de seu aprimoramento estético, ético, moral e social. Os PCN asseveram
que como expressão do tempo contemporâneo, a estética da sensibilidade vem substituir a
da repetição e padronização, hegemônica na era das revoluções industriais, com vistas a
estimular a criatividade, o espírito inventivo, a curiosidade pelo inusitado, a afetividade,
para facilitar a constituição de identidades capazes de suportar a inquietação, conviver com
o incerto, o imprevisível e o diferente.
A análise de LMB com valor literário vem servindo como base para a demonstração
da competência lingüística de seus autores, tomada como referência para o aperfeiçoamento
vernacular dos estudantes. Para tanto, se impõe a seleção dos objetos textuais e da moldura
teórica, que se mostra fator relevante para nossas considerações, já que vão alicerçar a
orientação de processos de leitura e produção textual, condições para a realização do indivíduo

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como homem integral. À medida que dispomos de uma riqueza maior nos meios de expressão,
tornamos-nos mais livres e felizes.
Na vertente que questiona um ensino lingüístico predominantemente gramaticalista e
propõe uma abordagem funcional interacionista, destacamos a Semiótica e a Estilística como
enquadres obrigatórios para a descrição lingüística. O ensino para a eficiência comunicativa
tem de pautar-se na relatividade dos signos e significados e precisa propiciar a percepção/
interpretação do nexo entre aqueles na dinâmica da semiose. A teoria semiótica gerencia as
oposições e correlações construídas na superfície dos textos e viabiliza interpretações plausíveis,
ainda que não únicas. Ao lado disso, a perspectiva de um ensino multidialetal fundamenta
suas hipóteses em premissas estilísticas, já que cada variedade lingüística não é senão a
manifestação de uma visão de mundo diferenciada e representada em linguagem.
Por isso, optamos pela exploração da letra-de-música em nossas aulas, já que neste
gênero textual reconhecemos as seguintes vantagens: a) possibilidade de se lidar com um
universo textual conhecido, propiciando assim a condução didático-pedagógica na linha da
aprendizagem significativa; b) garantia de abordagem interdisciplinar imediatamente deflagrada
entre literatura e música e c) oportunidade para a discussão das diferenças culturais a partir
dos usos lingüísticos documentados nas letras-de-música.
Atualmente, nossas pesquisas têm explorado, em especial, a obra de Elomar Figueira
Mello (compositor baiano), cujas letras apresentam ampla variedade de usos lingüísticos). É
patente que a música e a literatura produzidas no interior do país apresentam-se como um
manancial quase virgem para a exploração lingüística, daí a nossa opção pela música e alguma
ênfase na produção regional.

A propósito de iconicidade
A despeito da absoluta arbitrariedade apregoada pelos estruturalistas, as bases
funcionalistas vêm fortalecendo passo a passo a existência de iconicidade nas gramáticas das
línguas, demonstrando a existência de uma correlação um-a-um entre forma e interpretação
semântico-pragmática pautada numa motivação funcional imanente aos aspectos estruturais
observados.
Para melhor entender-se tal perspectiva, cumpre explicitar o que é iconicidade. Trata-
se de uma propriedade semiótica fundada na plasticidade — propriedade da matéria de adquirir
formas sensíveis por efeito de uma força exterior (Simões, 2003:42). Tal atributo pode ser
estendido ao plano abstrato, uma vez que a capacidade cognoscitiva humana confere à faculdade
da imaginação a condição de uma fábrica de imagens de entes e seres reais ou fictícios. Nesta
linha de raciocínio, torna-se possível aplicar a iconicidade em níveis concretos e abstratos. No
nível concreto, verificam-se as iconicidade diagramáticas — sintagmáticas e paradigmáticas;
no nível abstrato, observam-se as modalidades imagética e metafórica. As primeiras se nos
dizem concretas uma vez que tomam por baliza os sistemas sígnicos dos quais resultam. No
plano lingüístico, dicionários e gramáticas atuam como reguladores dessa relação concreta. Já
as últimas serão resultantes de operações subjetivas, uma vez que decorrem de interpretações
individuais (mesmo os interpretantes coletivos são individuados em função das culturas que
representam), seja no plano icônico-indicial da imagem seja no plano icônico-simbólico da
metáfora.
Em palavras simples, o ícone é uma representação plástica, modelar (por similaridade),
de uma idéia ou ideologia; ao passo que o índice é um signo vetorial que conduz o raciocínio
a uma interpretação por contigüidade. De sua parte, o símbolo é uma manifestação sígnica
que generaliza uma apreensão-interpretação, transformando o signo em referência ecossistêmica

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e, algumas vezes, pansistêmica (capacidade de sobrepor-se a sistemas diversos). Do ponto de
vista da análise verbal, a iconicidade pode ser observada não só no plano da estruturação
gramatical (Givón, 1995), mas também num plano maior, mais abrangente da trama textual.
É observável: a seleção vocabular como representativa de usos e costumes diversos; a colocação
dos termos nos enunciados como imagem das opções de enfoque ou das posições discursivas;
a eleição do gênero e do tipo textual como indicador da relevância dos itens temáticos e lexicais
contemplados no texto, etc. Também o projeto do texto, sua arquitetura visual, é material
icônico a ser observado.
Nas letras-de-música, a iconicidade transcende o verbal uma vez que o signo-complexo
letra-de-música reúne componentes de códigos distintos: o lingüístico-literário e o musical.
Assim sendo, o exame da iconicidade do texto literário para ser cantado inclui a consideração
do elemento sonoro e do melódico, além de todos os outros ingredientes usualmente
considerados nas análises de textos. Temos que a interpretação verbal de todos os objetos
artísticos valida a perspectiva semiótica, que toma as artes como diferentes tipos de linguagem,
interligados por equivalências estruturais.
Em síntese, a iconicidade neste projeto visa a reforçar a riqueza e a relevância da
análise do objeto letras-de-música tomado como produto capaz de contribuir com a aquisição
de domínio lingüístico e cultural.

Relações entre música e literatura: melopoética.


Apesar de sua longa trajetória, as relações entre música e literatura só vão solidificar-
se a partir do século XVI, com a gradativa afirmação da melopoética. A inauguração da subárea
da Literatura Comparada alarga os espaços de reflexão acerca das relações entre música e
literatura, a partir da inclinação pós-moderna pela fusão dentre os vários objetos artísticos.
Literatura Comparada e Semiótica redimensionam a crítica aos objetos de arte, uma
vez que as homologias aproximam as artes em geral, e literatura e música, em especial. Ezra
Pound (In ABC da Literatura) consideraria a poesia como uma arte mais próxima da música
do que da literatura propriamente dita, tal a diferença substancial, de natureza estrutural,
existente entre poesia e prosa. Arte sinestésica por excelência, a poesia, ensejou estudos que
buscassem base científica para a correlação entre som instrumental e combinações sonoras na
poesia. Mesmo sem o sucesso de tal hipótese, é indiscutível a origem musical da poesia. Da
Literatura Clássica, passando pela Medieval e projetando-se sobre a de Cordel, é incontestável
a fundamentação melódica desses textos. Além disso, a fronteira indelével entre poesia e música
manifesta-se também nas opções temático-formais. Canções, acalantos, sinfonias, sonatas,
baladas, tiranas, cirandas, rondós, etc são estilos musicais transpostos para a poesia. Logo, a
proposta da utilização da letra-de-música como texto-objeto a ser explorado nas aulas de
português intenta trazer para a sala de aula o poder inebriante e de elevação espiritual propiciado
pela música. Veja-se aqui uma tomada estratégica do objeto artístico como “isca” para a
atenção do estudante, na condição de aprendiz da língua em sua variedade.
Convém acrescentar que a variedade rítmica também funcionaria como elemento
icônico na interpretação dos textos; e que a análise que se propõe é transdisciplinar, ainda que
parta do sistema, da norma e dos usos lingüísticos como referências primeiras. Verifica-se
assim a necessária releitura dos sistemas culturais e respectivas produções artísticas, para que
o docente se municie de informação de alta relevância para a interpretação dos textos eleitos
para suas aulas. Falar de objeto artístico inclui conhecimento sócio-histórico que, aliado ao
domínio do sistema lingüístico em foco (no caso, o da língua portuguesa), propiciará recortes
isotópicos ajustados à realidade textual, sem limitar as possibilidades de leitura tampouco

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permitir toda e qualquer leitura indisponível no tecido textual, que é resultante de uma trama
sígnica que, por sua vez, emerge de um ecossistema que regula e é regulado por uma entidade
invisível, mas notória denominada interpretante coletivo.
Quando se fala em significado, verifica-se que há acepções catalogadas nos dicionários
das línguas que servem de referência para o entendimento das mensagens. Contudo, não se
pode perder de vista que, apesar disto, os textos podem inaugurar novos significados (não-
dicionarizados) e que os sentidos muitas vezes extrapolam os significados, uma vez que os
usos figurados parecem ser muito mais freqüentes que os literais. Em decorrência destes fatos,
os estudiosos oferecem ao leitor contemporâneo suporte teórico consistente quanto à produção
de leitura a partir de recortes temáticos (ou isotopias) emergentes dos signos-chave (verbais
ou não-verbais) que se apresentam na superfície dos textos. Segundo Simões (2003b), isotopia
é um recorte temático fundada na identidade de significantes aberta para a pluralidade de
significados e balizada pela rede interna perceptível na trama textual. Nesta ótica voltam à
tona os temas transversais e os objetivos dos PCN para a subárea de Língua Portuguesa, no
eixo da contextualização sócio-cultural: a) considerar a linguagem e suas manifestações como
fontes de legitimação de acordos e condutas sociais, e sua representação simbólica como forma
de expressão de sentidos, emoções e experiências do ser humano na vida social; b) compreender
e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de: organização cognitiva
da realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação; c)
respeitar e preservar as manifestações da linguagem, utilizadas por diferentes grupos sociais,
em suas esferas de socialização; usufruir do patrimônio nacional e internacional, com as suas
diferentes visões de mundo; e construir categorias de diferenciação, apreciação e criação e d)
entender o impacto das tecnologias da comunicação na sua vida, nos processos de produção,
no desenvolvimento do conhecimento e na vida social. A partir destes objetivos, verifica-se a
direta canalização para os ditos temas transversais que deverá abarcar discussões sobre a
expressão de identidade nacional, com vistas ao reconhecimento e a valorização da diversidade
cultural brasileira e das formas de perceber e expressar a realidade própria dos gêneros, das
etnias e das muitas regiões e grupos sociais do País. Tentaremos demonstrar um modelo de
análise na seção seguinte.

Texto-corpus:
Na Estrada das Areias de Ouro: Lá dentro no fundo do sertão / Tem uma estrada / de
areias de ouro / Por onde andaram / Outrora senhores-de-engenho / E de muitas riquezas /
Escravos e Senhoras / Naquelas terras imensas / De Nosso Senhor. / Lá dentro no fundo do
sertão / Lá dentro no fundo do sertão / Tem uma estrada / de areias de ouro / E contam que em
noites / De lua pela estrada encantada / U’a linda sinhazinha / Vestida de princesa / Perdida
sozinha vagueia / Pelas areias / Guardando o ouro / De seu pai, seu senhor / Aquele fidalgo /
que o tempo levou / Pras bandas do mar de pó / E hoje que tudo passou / A linda sinhazinha /
Encantada ficou / Lá dentro no fundo do sertão / Na estrada / das areias de ouro. (CD Elomar...
das barrancas do Rio Gavião, 1973)

Uma demonstração de análise da letra-de-música de Elomar


DADOS SEMIÓTICO-PRAGMÁTICOS: 1ª isotopia: Do tempo — ícones-índices: lá, andaram,
outrora, senhores-de-engenho, riquezas, escravos e senhoras, sinhazinha, (guardiã)
encantada. 2ª isotopia: Dos costumes — ícones-índices: lá, no fundo do sertão, senhores-
de-engenho, riquezas, escravos e senhoras, Nosso Senhor, Sinhazinha/princesa/encantada:
guardiã do ouro e da memória da riqueza de seu pai-seu senhor. 3ª isotopia: Da lenda —
ícones-índices: lá, outrora, areias de ouro, noites de lua, estrada encantada, sinhazinha/

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princesa/encantada.
DADOS SEMÂNTICO-GRAMATICAIS: 1) PASSADO: Lá, outrora = advérbios de lugar/ tempo;
// naquelas = em (prep. localizadora no tempo e no espaço) + aquelas = pronome demonstrativo
(Todas formas referentes à 3ª. pessoa do discurso (distanciamento). 2) PRESENTE HISTÓRICO:
Contam, vagueia = formas verbais do presente do indicativo. // Noites de lua = tempo
semidefinido // Guardando = forma infinita de gerúndio = aspecto durativo-freqüentativo =
ELO entre passado e presente. 3) PRESENTE: Hoje = advérbio de tempo atual // Passou / ficou
= formas verbais de passado perfeito (ação concluída) // Encantada = adjetivo verbal (aspecto
permansivo) // Na estrada (em oposição a UMA estrada) = lugar definido/conhecido
NOTAS ESTILÍSTICAS: A seleção vocabular evoca tempos e lugares longínquos, realçando
seus usos e costumes. Também a seleção vocabular aliada à estruturação diagramática do
texto confere-lhe uma organização narrativo-descritiva que o aproxima, por um lado, das
lendas e dos causos, por outro das informações históricas. A idéia resultante da imagem
produzida por ouro, riquezas, noites de lua, estrada encantada, sinhazinha vestida de
princesa, seu pai, seu senhor, fidalgo, é a de uma cena a um só tempo mágico-lendária e
histórico-autoritária. A permanência da sinhazinha, encantada, guardando o ouro de seu pai,
seu senhor, faz com imaginemos ora uma sacerdotisa clássica ora uma virgem subjugada. O
emprego do vocábulo senhor permite leitura plural: senhor–de-engenho (patrão); Nosso
Senhor (o Criador) e seu senhor (= pai patrão). A mudança do determinante de areias de uma
para na seria a marcação discursivo-textual da pretensa fidelidade da história contada na
letra-de-música. Importante lembrar que apesar de tratar de tema sertânico, o estilo usado é o
padrão.
DADOS MELÓDICOS: Esta canção apresenta uma estrutura melódica assemelhada às
cantigas medievais, onde se percebe claramente um poema para ser cantado. Esta característica
aliada aos dados textuais já apontados constrói um universo muito particular: a cantiga
sertaneja. Este modelo de composição inclui na sua estrutura melódica o ritmo da fala local,
do contador de causos que, em última análise, evoca os menestréis que saíam pelos reinos a
cantar histórias que vinham a compor o imaginário coletivo.
TEMAS TRANSVERSAIS: Podem vir à tona temas como: diferenças culturais, valorização
da diversidade na unidade, inclusão sociocultural, trocas transculturais, riqueza sociocultural
brasileira, música e poesia como expressão cultural, etc.
Conclusão
Esta breve explanação do projeto A música e o ensino da língua portuguesa, aqui
denominado, SEMIÓTICA, MÚSICA E ENSINO DO PORTUGUÊS, pretendia dar uma
idéia compacta do que se tem feito nesta pesquisa. Tentou-se expor, sinteticamente, as bases
teóricas utilizadas e um dos modelos de análise praticado.
A definição das isotopias — primeiro passo para uma leitura madura — vem dialogar
com os dados semântico-gramaticais levantados por intermédio da análise dos itens lexicais
que funcionam como elementos-chave no texto. Estes produzem as trilhas a serem perseguidas
pelos leitores e que podem conduzi-los aos sentidos inscritos no texto pelo enunciador original,
assim como aos que emergirem da experiência leitora do enunciador-leitor.
Na abordagem relativa à descrição do conteúdo semântico-gramatical, verifica-se a
iconicidade no emprego dos tempos e modos verbais como forma de distinguir narração e
comentário através do apuramento de mecanismos de estruturação discursiva de natureza
enunciativa: temporal e aspectual.
Sucintamente, procurou-se apontar no texto-corpus possibilidades de discussão da
iconicidade, considerando componentes não apenas verbais, mas melódicos e contextualizantes,

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tentando dar um tratamento metodológico mais abrangente ao processo de leitura e
compreensão de textos. Cumpre observar que o levantamento dos signos que compõem o
texto (quer objetiva quer subjetivamente) deveria servir de base também na produção de novos
textos.
O componente melódico pode estimular o gosto pela audição, leitura e discussão, a
princípio das LMB, em seguida de outros textos. A partir daí, a sensibilidade para a interpretação
da estrutura textual e a conseqüente produção de sentidos pode tornar-se uma atividade
agradável, além de proficiente.
O que se quer enfatizar é a mudança da forma como se vem descrevendo os fatos e
fenômenos lingüísticos materializados em letras-de-música, com vistas a operar com textos
mais significativos para o aluno (próximos de sua experiência cotidiana) ou mesmo não tão
próximos, mas que retratem usos lingüísticos até então desprestigiados, mas cujo conhecimento
enriquece a linguagem de qualquer falante. Língua é cultura, e diversidade é riqueza. Logo, a
diversidade lingüística e temática só pode vir a engrandecer o repertório do falante. Assim é
possível realizar a aprendizagem significativa, em que a relação entre o dado e o novo se
construam por meio de conclusões produzidas racionalmente pelo estudante, ainda que
orientadas pelo docente. É preciso ressignificar a aprendizagem em geral e a da língua materna,
em especial.
Por fim, é importante frisar que o domínio da variante padrão não elimina a necessidade
de conhecimento das demais variedades lingüísticas, uma vez que cada uma delas é documento
de um modelo de cultura específico. Num país como o Brasil, cujas dimensões territoriais são
continentais, a diversidade sociocultural é máxima, logo, a variação lingüística também o é.
Portanto, ensinar a língua é permitir que o usuário seja capaz de falar e escrever nas mais
variadas formas e estilos, diminuindo assim o insulamento sociocultural, do qual decorrem as
estigmatizações, as marginalizações, os separatismos e os preconceitos: doenças socioculturais
e políticas que atropelam qualquer proposta de democratização real.

Referências bibliográficas:
GIVÓN, T. Functionalism and grammar. Philadelphia: John Benjamins, 1995.
OLIVEIRA, Solange Ribeiro (et al). Literatura e Música. São Paulo: Editora Senac SP/
Instituto Itaú Cultural, 2003.
SIMÕES, Darcilia. Semiótica & Ensino. Reflexões teórico-metodológicas sobre o livro-
sem-legenda e a redação. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2003.
_____. SIMÕES, Darcilia. “Estudos semânticos no 7 - Sobre produção de leitura”. Material
de apoio de aulas ministradas UERJ/ILE, em turmas de graduação e pós-graduação. 2003b.

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