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2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS

2.1 A DOENÇA DE PARKINSON

Em 1817, o médico londrino James Parkinson descreveu pela primeira vez


uma doença caracterizada pela tríade de tremor, bradicinesia e instabilidade
postural. Posteriormente foi reconhecido que a rigidez muscular também era um
aspecto fundamental dessa doença. Em homenagem a esse médico a doença
recebeu o seu nome, sendo conhecida como Doença de Parkinson (DP). 7,9
Hoje é sabido que a DP é um transtorno neurodegenerativo, progressivo com
predominância de sintomas motores, porém podem haver ainda concomitantemente
alterações autonômicas, psiquiátricas e cognitivas. 7
A DP é a segunda doença neurodegenerativa mais comum no mundo,
afetando em torno de 1% da população mundial. 6 Sendo, então, uma situação
frequente, que provoca grande impacto na qualidade de vida dos pacientes e
3,7
acarreta elevados custos sociais, familiares e econômicos.

2.1.1 Epidemiologia

Nos EUA, a DP afeta cerca de 750.000 a 1 milhão de pessoas, sendo a


principal doença neurológica em indivíduos com mais de 65 anos. 9 Homens são mais
acometidos pela DP do que as mulheres, a relação é de 3:2 e há um pico de
incidência dos 60-65 anos.3,8 Segundo Barbosa et al, em 2006, no Brasil a
10

prevalência de DP em idosos era de 3,3%. 8 Várias teorias tentam explicar o


mecanismo de surgimento da doença, porém a sua etiologia ainda é incerta. 9,8

2.1.2 Etiologia

Existem diversas hipóteses para o desenvolvimento da DP, as mais descritas


e estudadas atualmente são; o estresse oxidativo pelo acúmulo de radicais livres na
substância negra; a atividade aumentada dos neurotransmissores excitatórios;
disfunção mitocondrial; fatores inflamatórios e gliais; neurotoxinas ambientais
presentes em plantas com agrotóxicos e fatores genéticos. 8
Recentemente, tem-se valorizado a participação de genes e de mutações no
mecanismo de desenvolvimento da DP. Foram identificados mais de 10 genes
relacionados a DP entre eles os Parkin e o gene da alfa-sinucleína.6,8
Provavelmente, uma combinação de fatores descritos acima devam contribuir e ser
determinante para o surgimento da DP.8

2.1.3 Fisiopatologia

A base fisiopatológica da DP é a morte prematura dos neurônios


dopaminérgicos pigmentados na parte compacta da substância negra. Há
degeneração da substância negra, com características inclusões intraneuronais
hialinas eosinofílicas chamadas Corpúsculos de Lewy. Esses neurônios
dopaminérgicos se projetam da substância negra até o estriado, onde fazem
sinapses com vários tipos celulares.6,9. Dentro dos Corpúsculos de Lewy, é
encontrada grande quantidade da proteína chamada alfa-sinucleín, o qual é
responsável pela formação desses agregados e pela disfunção mitocondrial levando
ao estrese oxidativo presente na doença.10
Os núcleos da base funcionam como iniciadores e terminadores dos
movimentos. O disparo inibitório de seu axônio eferente seria um “freio” permanente
de movimentos indesejados, na necessidade de realizar um movimento, esse
disparo inibitório é freado, e os comandos motores corticais são liberados. 6
11

No início da DP, os receptores de dopamina no estriado são supra regulados,


em resposta a diminuição da aferência dopaminérgica pela substância negra.
Progressivamente, essa capacidade compensatória é superada, surgindo assim os
sinais e sintomas clínicos.9 Estimasse que aproximadamente 60 a 80% dos
neurônios dopaminérgicos são perdidos antes do início dos sintomas da DP. 7

2.1.4 Manifestações Clínicas

Tipicamente, os sintomas iniciais da DP são unilaterais (tremor nas mãos,


diminuição do balanço dos membros superiores e micrografia). Os sintomas se
propagam e acometem ambos os lados. Posteriormente, surge a instabilidade
postural.6,9
As características clínicas da DP podem ser divididas em: características
primárias e secundárias. As características primárias são fundamentais para o
diagnóstico da DP, são elas: bradicinesia, tremor em repouso, rigidez, instabilidade
postural e resposta positiva a terapêutica com levodopa. 9
As características secundárias nem sempre estão presentes e não são fundamentais
para o diagnóstico da DP. As características são: expressão facial em máscara
(hipomimia facial), disfagia, hipofonia/palilalia, micrografia, postura curvada, marcha
festinante, hesitação para iniciar movimentos, câimbras distônicas, disfunção
autonômica, hipotensão ortostática, incontinência urinária e constipação. Alterações
comportamentais também são observadas, tais como: depressão, demência,
distúrbio do sono, hipoestesia e parestesias.9 No anexo 7.1 encontra-se descritos no
formato de quadro os sinais e sintomas da doença 32.

2.1.5 Diagnóstico

O diagnóstico da DP é essencialmente clínico e requer o reconhecimento


inicial da sintomatologia característica e exclusão de outras doenças
neurodegenerativas, as quais podem simular os mesmos sintomas, como em outras
síndromes parkinsonianas.8
12

O Banco de Cérebro de Londres propõe critérios diagnósticos


internacionalmente utilizados. Segue em anexo o quadro 7.2 que demonstra quais
são os critérios adotados 32.

2.2 TRATAMENTOS NA DP

2.2.1 Tratamento farmacológico


Não existe cura para a DP, o tratamento medicamentoso vigente tem como
objetivo o controle sintomático da doença. Portanto, o início do tratamento deve ser
guiado pelo impacto dos sintomas na vida do paciente. 3, 8, 17
Nenhuma droga
existente mostrou eficácia em alterar a história natural da DP. 8 Existem uma gama
de drogas antiparkinsonianas, com mecanismos de ação diversos, e a decisão de
qual utilizar, em que momento e em qual dose, vai depender dos sintomas
predominantes, tais como idade do paciente, presença de comorbidades,
intensidade das limitações e principalmente efeitos colaterais. 8 Os fármacos
utilizados atualmente são:
 Levodopa, associada a um inibidor de dopa-descarboxilase periférica como a
carbidopa;
 Agonistas dopaminérgicos: ergotamínicos e não ergotamínicos;
 Inibidores da MAO-B;
 Inibidores da COMT;
 Anticolinérgicos;
 Moduladores do Glutamato;
O medicamento com melhor resposta aos sintomas motores é a levodopa. No
entanto, essa medicação está associada ao aparecimento de complicações motoras
a longo prazo.3,18
13

2.2.1.1 Tratamento com L-Dopa (Levodopa)

Como o problema fundamental da DP é a deficiência de dopamina, o


tratamento com a levodopa é o mais eficaz em virtude da sua conversão para esse
neurotransmissor.8 Existem duas enzimas principais envolvidas na degradação da
levodopa, a dopadexcarboxilase periférica (DDC) e a catecol-0-metiltransferase
(COMT). A inibição dessas enzimas pode reduzir a degradação dessa droga,
otimizando a sua disponibilidade no cérebro. 8,15,22
Não há evidencia de neurotoxicidade causado pela levodopa ou aceleração
da progressão da doença, no entanto o seu uso prolongado é associado ao
desenvolvimento de flutuações motoras e discinesias, o que até justifica o retardo da
sua introdução quando possível.8,23
Com o tempo, os esquemas de tratamento deixam de ser eficazes, ocorrendo
várias formas de flutuações de resposta. A mais comum é o encurtamento da
duração do efeito (wearing off). Outras formas são acinesia matinal ou noturna,
fenômeno on-off (período sob efeito da medicação – on – alternando com períodos
sem efeitos – off), bloqueio motor ou congelamento (freezing).15,16
Quando a dose já é elevada e há curto período de tempo entre elas, deve-se
evitar o aumento da mesma, pois há o risco de ocorrência das discinesias, que são
hipercinesias, movimentos anormais involuntários, coreiformes ou distônicos. 24,25,30

2.2.2 Tratamento multidisciplinar

O paciente com DP, tem um comprometimento progressivo de suas funções


motoras. O tratamento fisioterapêutico pode evitar e minimizar essas disfunções
motoras. O objetivo é reduzir as incapacidades e as limitações geradas pela doença
e melhorar a independência desse paciente, com isso há uma melhora na qualidade
de vida do mesmo. Segundo Goodwin et al., 2008, exercícios terapêuticos se
mostraram eficazes com relação a melhora da força muscular, o equilíbrio, a
8
marcha, redução de quedas e melhora funcional.
14

Muito importante também é a abordagem fonoaudióloga na DP, nos casos de


hipofonia e engasgos pois podem sugerir a possibilidade de disfagia e risco de
aspiração. Outras áreas como terapia ocupacional, neuropsicologia e nutrição fazem
parte das intervenções nesses pacientes de acordo com as necessidades
individuais.8

2.2.3 Tratamento cirúrgico neuroablativo

Desde a década de 50 são conhecidos os efeitos das lesões terapêuticas


talâmicas, no controle de tremores.11 Nessa modalidade cirúrgia, é exercida uma
lesão lítica na área responsável pelos sintomas. Uma lesão no tálamo (talamotomia)
quando o tremor é o sintoma predominante e no globo pálido (palidotomia) quando a
discinesia é o problema principal.8,19 Ao longo do tempo, foram observadas reações
adversas relacionadas a esse tipo de procedimento, entre os mais comuns,
hemiparesias, disestesias, hipotonias, distúrbios cognitivos graves e
permanentes.11,20
Os primeiros ensaios clínicos com o uso da Estimulação Cerebral Profunda
(ECP) iniciaram em 1987, e foi observado que comparativamente as técnicas
neuroablativos, obtinha vantagens, no sentindo de ser reversível, menos invasiva e
21,26
com índice de reações adversas menores.

2.3 ESTIMULAÇÃO CEREBRAL PROFUNDA (ECP)

A ECP do núcleo subtalâmico consiste numa cirurgia estereotáxica, sendo o


objetivo principal uma reorganização do circuito nigro-estriatal dopaminérgico de
modo que seja ajustável e reversível.13,26
Os mecanismos precisos que determinam a melhora motora e o efeito anti-
discinético por parte da ECP ainda continuam desconhecidos. Os estudos mais
recentes defendem que há uma neuromodulação e também um efeito de ativação,
os quais contribuem para a dessincronização dos padrões anormais de
15

despolarização do núcleo subtalâmico, associado um efeito de inibição da produção


e liberação de neurotransmissores e hormônios.12,27,28
A ECP, quando indicada, tem sido considerada o padrão ouro no tratamento da
DP moderada a grave. Sabe-se que a ECP, devido a estimulação continua, diminui
os sintomas cardinais da doença, as discinesias associadas a levodopa e também é
capaz de diminuir a dosagem dessa droga no pós-operatório. 13,29,31

2.3.1 Indicação

A seleção adequada para a ECP, é fundamental para que haja um benefício


real desse procedimento. Na literatura as recomendações mais citadas são:
pacientes com critérios diagnóstico para DP; idade inferior a 70 anos; resposta
aguda ao teste de levodopa superior a 33%; presença de discinesias e flutuações
motoras incapacitantes apesar da terapêutica medicamentosa correta. Os doentes
também devem ter pelo menos 5 anos de evolução da DP para que se considere o
tratamento cirúrgico.12,29 Pacientes com outras doenças neurológicas, alterações na
RMN e alterações cognitivas e/ou psiquiátricas graves serão excluídos do
procedimento.12,31

2.3.2 Efeitos do pós operatório

Existem diversas formas de avaliação dos resultados da ECP. Para os


sintomas motores é usada a escala de UPDRS (Unified Parkinson’s Disease Rating
Scale). Esta consiste em quadro categorias:
 UPDRS I: Avalia atividade mental, comportamento e humor;
 UPDRS II: Avalia atividades da vida diária;
 UPDRS III: Atividade Motora;
 UPDRS IV: Complicações da terapêutica.
Cada categoria possui diversas sub-categorias pontuadas entre 0 e 4, onde 0
é o normal e 4 é o comprometimento severo da atividade, desta forma pontuações
elevadas nessa escala significam sintomas mais graves. A categoria mais utilizada
16

no pós operatório de ECP, é a UPDRS III, em todos estudos mostraram melhoras


evidentes desses parâmetros e que essas melhoras duram um longo período de
tempo. Essa melhora pode ser explicada pela própria estimulação contínua e
também pelo uso de doses mais baixas de levodopa após a cirurgia. 12
Em anexos, a tabela 7.3, exemplifica a aplicação da escala UPDRS III 11.

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