Você está na página 1de 8

CAÇA AO SACI

© Gugs Cultural 

Texto: © Fernanda Marsico
Ilustração: Guga Thomé


Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser


vendida, modificada, reproduzida, arquivada em sistema de busca ou transmitida
por fotocópia ou gravação ou outros, sem prévia autorização do detentor dos
direitos.
ou contar para vocês uma história de quando eu era
ainda um menino e vivia lá no sítio de Jaraguaquá.

Lembro que, com os olhos fervendo de raiva, eu peguei a


peneira que a vovó peneirava a farinha e coloquei debaixo
do braço.

"Onde já se viu dar nó na crina do Alazão? Ai, ai, ai! Esse


malandrinho passou dos limites!"

Entrei na cozinha e achei a garrafa.

"Ah! Pelo menos com a garrafa ele não sumiu, né?"

Todos os dias sumia alguma coisa na cozinha... Era a


tampa da panela numa hora, o coador de café na outra....
O sal era derramado quase todas as vezes que a vovó
preparava o almoço... E na lavanderia? Só sobrava um pé
de cada meia no varal. Ah, não! Eu já estava cansado das
travessuras desse danadinho!

Encontrei a rolha debaixo da pia enquanto me lembrava da


vez em que ele deixou a porteira aberta e todos os
cabritinhos fugiram. Ai, ai, ai! Que danação! Lá fui eu,
junto com o Alazão, catar um por um nesse mundaréu
todo, antes que o vovô voltasse da plantação e
descobrisse que os cabritinhos tinham fugido.

Com a cabeça ainda latejando com essa lembrança, peguei


uma faquinha e talhei uma cruz na rolha, bem no topo.

2
Eu não precisava de mais nada!

A peneira...

A garrafa...

A rolha com uma cruz...

Prontinho! Agora era só achar um redemoinho.

O quê? Você ainda não sabe de quem é que eu estou


falando? Ora, pense um pouquinho... Vou te dar algumas
dicas: gorro vermelho, cachimbo na boca e uma perna só...
Adivinhou?

Isso mesmo! O Saci! Esse Pererê danado que só ele!

Com toda essa minha “munição” fui caminhando em direção


à mata. Os pés pesados de tanta chateação da sapequice que
ele fez com o meu melhor amigo, o Alazão. Eu havia tolerado
todo o resto, mas mexer com o meu cavalo? Ah, não! Isso já
era demais!

Eu precisava apenas encontrá-lo para fazer do jeitinho que o


vovô havia me ensinado. Ao encontrar um redemoinho teria a
certeza de que era ele. Então, bastaria jogar a peneira e
arrancar rapidamente o gorro da sua cabeça. Você sabia que
é o gorro que dá a ele os poderes mágicos? Sim! Por isso é
que ele é tão rápido e consegue fazer esse pé de vento com
um pé só.

3
Era só isso, sem o gorro ele perderia os poderes e eu
conseguiria prendê-lo dentro da garrafa. Despois disso,
bastava fechar com a rolha que a cruz garantiria que ele
nunca mais sairia dali.

Eu estava determinado. Entrei na mata e não demorou muito


para eu avistar o redemoinho. Joguei a peneira com vontade.
O vento parou e eu me deparei com um saci muito espantado.
Acho que ele não esperava por aquilo. Antes que ele pudesse
entender o que estava acontecendo... ZÁS... Puxei o gorro da
sua cabeça e ele foi diminuindo, diminuindo... até que eu
consegui colocar ele dentro da garrafa e fechar com a rolha.

Comecei a pular e a gritar de felicidade, comemorando com a


garrafa na mão:

— Capturei o saci! Capturei o saci!

De repente, senti um ventinho na nuca e olhei pra trás...


Então, senti outro ventinho na minha frente... E de um lado e
do outro... Já era quase um vendaval!

Fui ficando até meio tonto. Apertei os olhos para enxergar


melhor e percebi que em volta de mim tinha um monte de
sacis. Tanto, mas tanto, que eu nem conseguia contá-los.

Eles estavam todos atrás das árvores, meio escondidos só


com a cabeça, gorros e cachimbos aparecendo. Todos
olhavam com um olhar muito assustado ora para mim e ora
para a garrafa. Ora para mim, ora para a garrafa. Ora para
mim, ora para a garrafa...

4
Ai! Não aguentei aqueles olhares, sabe? Fiquei com pena.
Olhei para o sacizinho que eu tinha capturado dentro da
garrafa e ele estava apavorado de medo.

Seu olhar me fez lembrar do Alazão quando chegou no


sítio, ainda um potrinho, todo assustado com medo de todo
mundo. Até de mim ele tinha medo no início. Lembrei
também de uma noite em que, ao pé da fogueira, o vovô
contou que as matas do nosso país eram protegidas por
seres mágicos como os sacis, os boitatás e os curupiras que
espantam e enganam caçadores e lenhadores com más
intenções.

Então, respirei fundo e falei para o “bando” de sacis ao meu


redor:

— Olhem só, Sacis-Pererês! Vocês todos prestem bastante


atenção! Eu não sou malvado não. Não sei qual de vocês
veio brincar com a crina do meu amigo Alazão, mas já vou
logo dizendo que eu não vou aceitar mais isso não!

Eles continuavam me olhando, assustados. Continuei:

— Vamos fazer um combinado? Solto esse sacizinho aqui e


deixo todos vocês livres para cuidarem das matas e dos
animais e, em troca, vocês deixam nós do Sítio de
Jaraguaquá em paz. Certo?

Todos os sacis concordaram em uma só balançada de


cabeça enquanto soltavam a fumacinha do cachimbo pelos
olhos.

5
Abri a garrafa, devolvi o gorro para o sacizinho e pude ver
ele crescendo, crescendo... até chegar ao tamanho de antes.
Ele também balançou a cabeça e soltou a mesma fumacinha
que os outros, um sinal de que tinham entendido o meu
recado.

Nesse instante, recomeçou a ventania. Todos os sacis ao


meu redor fizeram seus redemoinhos e, em poucos
segundos, eu estava só no meio da mata com a peneira, a
rolha e a garrafa vazia nas mãos.

Sorri aliviado e resolvi voltar para o sítio antes do anoitecer.

Você deve estar se perguntando se eles cumpriram a


promessa, não é? Ora se você acha mesmo que palavra, ou
melhor, fumaça de saci é confiável, você não entende nada
mesmo desse malandrinho. Opa! Desse malandrinho não!
Desses malandrinhos! Porque tem é um mundaréu de sacis
por esse nosso Brasil.

E você? É, você! É saci também? Deixa eu ver:

Fica de pé.

Agora, tenta pular de um pé só.

Conseguiu? Pronto! Muito bem! Você é um sacizinho


também.

fim

6
Agora que você leu a história do saci, que tal fazer o seu com
dobradura? Pegue um papel quadrado e siga os passos:

7
Sobre a autora
Fernanda
Marsico
Nanda Marsico é escritora com 3 livros publicados: "Corre-
Corre e Voa-Voa", "A menina que gostava de inventar" e "Um
Verdadeiro Tesouro". Livros que são um verdadeiro sucesso
entre leitores de várias idades. Além disso, é autora do e-book
"Cuidado com a Cuca" disponível no Amazon Kindle e de
outros contos publicados em antologias para adultos.

Juntamente com o Guga Thomé, marido e ilustrador de seus


livros, criou o Leitores Brilhantes para se aproximarem ainda
mais dos seus leitores incentivando a leitura, a escrita criativa,
a criatividade, a imaginação e a ilustração.

Possui mais de 21 anos dedicados ao trabalho com a infância


tendo atuando, nos últimos anos, na formação docente com
foco no trabalho com a literatura infantojuvenil em sala de
aula. Desde 2016, atua no mercado literário e vem
intensificando seus estudos em Escrita Criativa e Publicação
de Livros Infantojuvenis.

Siga a autora no Instagram: @nandamarsico


Conheça os livros da autora em: nandaloja.com
Conheça também o e-book Cuidado com a Cuca
8

Você também pode gostar