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Psicologia e
Segurança Pública
Diretoria
Presidente | Elisa Zaneratto Rosa
Vice-presidente | Adriana Eiko Matsumoto
Secretário | José Agnaldo Gomes
Tesoureiro | Guilherme Luz Fenerich
Conselheiros
Alacir Villa Valle Cruces, Aristeu Bertelli da Silva, Bruno
Simões Gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario
Henrique Teófilo Schezzi, Gabriela Gramkow, Graça Maria
de Carvalho Camara, Gustavo de Lima Bernardes Sales,
Ilana Mountian, Janaína Leslão Garcia, Joari Aparecido
Soares de Carvalho, Livia Gonsalves Toledo, Luís Fernando
de Oliveira Saraiva, Luiz Eduardo Valiengo Berni, Maria das
Graças Mazarin de Araujo, Maria Ermínia Ciliberti, Marília
Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr
Miniussi Bertolino Neto, Regiane Aparecida Piva, Sandra
Elena Spósito, Sergio Augusto Garcia Junior, Silvio Yasui
Organização do caderno
Adriana Eiko Matsumoto
Patrícia Gomes Ramalho de Oliveira
Maria Carolina Rissoni Andery
Odette Godoy Pinheiro
Revisão ortográfica
Ricardo Ondir
___________________________________________________________________________
C755c Conselho Regional de Psicologia de São Paulo.
Psicologia e Segurança Pública. Conselho Regional de
Psicologia de São Paulo. - São Paulo: CRP SP, 2016.
44p.; 21x28cm. (Cadernos Temáticos CRP SP)
ISBN: 978-85-60405-36-7
07 Apresentação
Maria Carolina Rissoni Andery
09 Coordenação
Adriana Eiko Matsumoto
33 Debates
Apresentação 7
Quero agradecer o convite do Conselho Re- que ainda têm pena de morte legal (só não
gional de Psicologia de São Paulo e cumpri- possuía os dados da China), e verificou-se
mentar a todos da mesa. O tema da Seguran- que em 2011 foram executadas 646 pessoas.
ça Pública cada vez mais tem se aproximado Nesse mesmo ano somente nos estados do
do encontro com profissionais da área de Rio de Janeiro e São Paulo, as polícias mata-
saúde, principalmente no que diz respeito ram mais de 940 pessoas, totalizando um nú-
à questão das drogas, que é o recorte que mero 42% a mais de mortes do que em todos
eu quero fazer; segurança é um tema muito os países com pena de morte no mundo. Isso
mais amplo, evidentemente, mas eu queria é um problema político, porque nós temos
fazer esse recorte, porque é o grande “carro uma Constituição que proíbe a pena de morte
chefe” do processo de criminalização. Hoje no Brasil, só autorizando-a em caso de guer-
no Brasil temos 750.000 presos, é o tercei- ra declarada, sendo que a última guerra do
ro país do mundo que mais encarcera, e só qual o Brasil participou foi a Segunda Guer-
perdemos para os Estados Unidos e para a ra Mundial. Então teoricamente nós vivemos
China (acabamos de passar a Rússia). A ideia em um país que proíbe a pena de morte, mas
de que vivemos em um país da impunidade matamos 42% a mais do que todos os países
é um pouco problematizada pelos números, com pena de morte no mundo.
porque no campo internacional nós despon-
tamos como uma das nações que mais en-
carcera. Se for considerar a relação de preso Importante ressaltar que hoje
por 100.000 habitantes, nós ficamos entre os
seis maiores. E tem outro aspecto ao qual te- vivemos em um dos países que
nho me dedicado também, relacionado com mais encarcera no mundo e
a atividade policial, que é o da letalidade do
sistema de justiça criminal. Em meio às políti- em um dos países no qual as
cas proibicionistas e às políticas de seguran- polícias mais matam no mundo.
ça pública militarizadas efetivadas no Brasil,
nós temos índices elevadíssimos de morte Morrem também, mas matam.
de todos os lados, tanto da polícia, como
também mortes praticadas por policiais con-
tra cidadãos brasileiros. Importante ressaltar Delegado de Polícia é uma figura sui ge-
que hoje vivemos em um dos países que mais neris no mundo policial. Eu tenho conquista-
encarcera no mundo e em um dos países no do muitos inimigos na Polícia Civil do Rio de
qual as polícias mais matam no mundo. Mor- Janeiro, por conta da discussão da localiza-
rem também, mas matam. Vou trazer aqui um ção desse ser “esquisito” no mundo policial,
dado importante, que foi o problema do meu pois uma das funções do Delegado de Polícia
estudo no doutorado. A Anistia Internacional é fazer o controle dos atos da polícia. O pri-
fez uma pesquisa em 2011, com 20 países meiro a controlar os atos da polícia é o dele-
plar o arquivamento desses inquéritos, ou 11
No crime não é muito diferente, seja, policial quando mata alguém, mata em
legítima defesa, própria ou de terceiros. Le-
pois o crime é uma construção vado pela curiosidade, fui pesquisar como se
que se faz também por meio constrói a legítima defesa. Penso que essa é
uma grande aproximação que hoje temos fei-
da linguagem. to entre o saber criminológico e o saber psi.
O Conselho Regional de Psicologia de São crítica não é exatamente o lugar onde isso
Paulo já é um dos grandes aliados da Facul- vai florescer com mais facilidade, é um lugar
dade de Direito do Largo São Francisco, na bastante conservador. Há muita boa vonta-
construção do campo criminológico crítico e de, estudantes extraordinários, com muito
isso muito se deve ao trabalho da Professora interesse, com muita vontade de trabalhar,
Adriana Eiko Matsumoto, que comparece às mas também há resistências, porque está na
nossas reuniões e tem me dado, desde o pri- Faculdade de Direito do Largo São Francisco,
meiro momento em que cheguei a São Paulo, em um lugar onde a elite forma seus quadros,
esse apoio extraordinário. Eu trouxe alguns onde se abastece a burocracia nos seus mais
dos membros do nosso Centro de Pesquisa altos escalões. E eles não têm muita afinida-
e Extensão em Ciências Criminais, o CPECC, de com o campo criminológico crítico, por isso
que recém-fundamos na USP, para fazer às vezes enfrentamos certas resistências,
Criminologia crítica, para assistir ao Orlan- mas que nos encorajam ainda mais. Primei-
do Zaccone, mas agora fico ainda mais feliz, ramente faço um convite a todas(os) as(os)
porque eles puderam ouvir o Pedro Bicalho, psicólogas(os) aqui presentes, especialmen-
que é “nota 10”. A construção do campo cri- te as(os) psicólogas(os) que trabalham com
minológico crítico em São Paulo tem sido uma Segurança Pública, as(os) psicólogas(os) que
jornada áspera, árdua, dura, porque o lugar trabalham “na polícia” e não “da polícia”, que
onde nós entramos para fazer criminologia são psicólogas(os) que não são “da peni-
tenciária”, que são psicólogas(os) “na peni-
tenciária”, psicólogas(os) “no Fórum” e não
passamos por todo Lombroso, psicólogas(os) “do Fórum”, psicólogas(os) que
porque percebemos a permanência possam levar a técnica e a ética, dessa pro-
fissão extraordinária, para dentro desses es-
do estudo lombrosiano, não só paços que normalmente têm freios antiéticos
na produção desses suspeitos, muito fortes. Isso implica saber ocupar es-
nesses estigmas sociais, que ses espaços com essa dignidade, com essa
coragem que vocês acabaram de ver. Quero
determinam metarregras punitivas, convidar as(os) psicólogas(os) que trabalham
mas também porque as pessoas no sistema de justiça criminal para assis-
que saem da nossa faculdade e tir às nossas reuniões. Estamos estudando
Lombroso, na raiz mesmo, lendo página por
de todas as faculdades de Direito, página, capítulo por capítulo: o homem delin-
os Promotores, os Delegados, os quente, o homem criminoso, a trajetória lom-
Juízes, reproduzem essa mesma brosiana, até os devaneios hipnóticos e es-
piritistas que ele teve no final da vida, enfim,
lógica e o suspeito de lá vai virar o passamos por todo Lombroso, porque per-
condenado daqui. cebemos a permanência do estudo lombro-
ia atrás das determinações sócio-históricas 23
A Criminologia que temos construído concretas, não relacionava as formas de pu-
nição concretamente com a crítica econômica
diz respeito ou dialoga com a
e a política. A nossa criminologia crítica, por-
posição das(os) psicólogas(os) no tanto, está muito próxima da crítica à econo-
sistema de justiça criminal, porque mia política, muito próxima da Sociologia e
hoje pretende abrir campos de estudo muito
na Segurança Pública”
Em primeiro lugar, quero agradecer ao Conselho, qual, nos últimos tempos, estou umbilicalmente
cumprimentar o Pedro Paulo Bicalho, de quem ligada, durmo e acordo com a Segurança Pú-
Beatriz Brambilla: Queria dizer que estar pretendo deixar claro que enquanto fala-
na Segurança Pública me fez ver que Se- mos de Segurança Pública como lacuna das
gurança Pública é a lacuna da ausência do políticas de Estado, a continuaremos nessa
Estado. E quando a Lígia coloca ou mesmo lógica. Então quero agradecer ao Conselho
quando o Tenente Coronel pergunta como e a todos vocês que estão aqui hoje e espe-
resolvemos essa questão, para não atuar ro que possamos pensar juntos nessa atu-
de forma repressiva e a companheira fez ação da(o) psicóloga(o), que historicamente
uma posição da ideia de igualdade, fico vem sendo marcada para a reprodução dos
pensando mesmo no contato com os agen- interesses das elites e da classe dominan-
tes públicos de segurança e ouvir a rotina te e estamos dizendo que a Psicologia não
do agente público de segurança me traz está aqui para isso, que a Psicologia está
muito essa ideia de que não estamos falan- em todo lugar, todos os dias para uma so-
do dos policiais, mas sim de uma instituição ciedade mais democrática e igualitária.
e de como ela está se dando sem, claro,
dicotomizar. Mas entendo que quando falo Maurício Dieter: Eu não vou conseguir me
dessa lacuna, quando nada mais deu certo, endereçar a todas as questões e vou co-
que é o que o Tenente Coronel está trazen- mentar apenas aquelas para as quais acho
do, quem é chamado para dar conta de uma que eu tenho alguma contribuição. Primeiro
demanda da sociedade? É a polícia, são as em relação à justiça restaurativa, acho que
forças do Estado. E aí entendo que quando é precisamente isso que criminologia crítica
fazemos este debate sobre Segurança Pú- discute hoje. O legal da justiça restaurativa
blica, enquanto continuarmos falando sobre é que ela não foi feita para os casos que
sistema de justiça criminal, não avançamos. acabam no juizado especial, porque esse
Hoje, eu diria que sou uma psicóloga que tem sido um problema grave da justiça res-
faço todos os “xizinhos” para preencher taurativa no Brasil, a discussão parece ser
qual é a minha atuação no questionário do as composições dos pequenos delitos pa-
CREPOP no campo da Segurança Pública, trimoniais. Nós queremos justiça restaura-
porque dialogamos necessariamente com tiva para as coisas mais graves. É precisa-
os profissionais de outras áreas, inclusive mente ali que o discurso, o famoso discurso
com os agentes públicos de segurança, mas da vitimização, tem que se ressignificar em
fazemos uma política que entende que só forma de emancipação e não contribuir para
será adequada e só será possível, em outro opressão. Tem um trabalho excelente, de
modelo. Enquanto não tivermos assistência um colega meu da Universidade Federal do
social adequada, saúde, uma política urba- Paraná, que defendeu a tese de doutorado
na, políticas públicas integradas que avan- em justiça restaurativa e ele partiu de um
çam para outra dimensão de organização da trabalho de psicólogas(os) no júri do Para-
sociedade civil, certamente continuaremos ná, que partiu de uma frase comum dos fa-
contando vítimas, contando mortos. Então miliares da pessoa que tinha sido morta, e
que diziam sempre, “Eu quero que a justiça tenho pessoas que participaram do exérci- 37
seja feita”. E eles pesquisaram: “Mas o que é to, foram militarizadas e são exemplos de
essa justiça que você quer?”. E eles desco- emancipação humana. Não acho que o mili-
briram que se você problematizasse o fato, tarismo por si só seja um problema, porque
dificilmente essa justiça era a morte do ou- quando você vai ter porte de arma e tiver a
tro, a negação do sujeito, eles queriam en- possibilidade da letalidade no coldre, quero
tender o que tinha acontecido. E veja, o sis- que você tenha hierarquia, controle, acho