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Acessibilidade urbana do portador de necessidades especiais e a sociedade

Karolinne Sotomayor Azambuja

O presente artigo trata das dificuldades que o portador de necessidades enfrenta no


meio social. O objetivo principal que desencadeou este estudo foi a necessidade de
reintegração social desse indivíduo no contexto social e urbano das cidades, para que seja
aceito como um integrante participativo e ativo na sociedade.
Foi elaborado primeiramente através de pesquisas a conceituação da deficiência
como um fator indispensável para se entender melhor o problema físico que afeta o portador,
em seguida a relação da deficiência com o indivíduo, para compreender o problema psíquico,
depois a relação do portador com a sociedade a fim de possibilitar um entendimento ao
preconceito existente e por último as limitações impostas ao deficiente mostrando o fruto de
uma sociedade despreparada para receber esse indivíduo.
Através das pesquisas realizadas foi-se possível compreender o comportamento da
sociedade e do próprio deficiente em relação ao seu problema, foi-se possível definir de um
modo geral o que é a deficiência e o que ela representa para a pessoa que a adquire.
Analisando também o centro da cidade de Campo Grande em Mato Grosso do Sul,
foi-se possível constatar a criação de barreiras arquitetônicas que impossibilitam a
acessibilidade do portador e o porquê da existência dessas barreiras limitadoras.
Devido toda essa análise, conclui-se que o problema dos portadores não é conviver
somente com suas próprias limitações mas também com as limitações que a sociedade
através de seu preconceito impõe por meio de barreiras tanto atitudinais quanto
arquitetônicas.
Consultando-se um dicionário, a deficiência pode ser definida como uma falha, falta,
defeito. Em seu sentido mais amplo, tratando-se de deficiência no ser humano, é conceituada
como um defeito no corpo, na mente ou no organismo de uma pessoa.
Em 1980, a Organização Mundial de Saúde (OMS), elaborou a Classificação
Internacional de Impedimentos Deficiências e Incapacidades, na qual considera três níveis
de condições, onde o organismo não desempenha satisfatoriamente suas funções. Esses
níveis estão definidos a seguir:

a) IMPEDIMENTO Refere-se a uma alteração psicológica, fisiológica ou anatômica


(dano ou lesão) sofrida pelo indivíduo.

b) DEFICIÊNCIA Sequelas resultantes de um impedimento e, que venha restringir a


execução de uma ou mais atividades consideradas normais às pessoas.

c) INCAPACIDADE Impossibilidade de uma pessoa viver integrada ao seu meio em


virtude de uma deficiência, considerando a idade, sexo, fatores sociais e culturais.
Já, as deficiências, de acordo com sua origem, e a parte do organismo que atingem,
se dividem em quatro grandes grupos, que se definem e se comportam em:

a) DEFICIÊNCIA FÍSICA: É por definição uma deficiência localizada no corpo do


indivíduo. Assim estão classificados a vítima da poliomielite (paralisia infantil), a vítima
de uma lesão medular, os amputados e outros. Geralmente é bem visível e necessita
de aparelhos auxiliares para minorar o problema.

b) DEFICIÊNCIA SENSORIAL: São aquelas localizadas nos órgãos dos sentidos, como
deficiência visual e auditiva.

c) DEFICIÊNCIA MENTAL: Existe neste aspecto todo um grupo de pessoas com déficit
mental como os portadores de Síndrome de Down, incluindo também as vítimas de
desnutrição crônica e da completa falta de estimulação.

d) DEFICIÊNCIA ORGÂNICA: Todas aquelas que atingem um órgão ou função de um


órgão, é a categoria mais difícil de se definir e classificar por ser a menos assumida e
a mais esquecida. O indivíduo que se encaixa nesta categoriakw, sem dúvida alguma,
são os cardíacos. (Moura, 1992).

Um problema que pode-se levantar a respeito destas conceituações é que a


deficiência, se confunde muito com incapacidade, devido às condições encontradas pelos
portadores de necessidades especiais, na sua tentativa de se integrar ao meio.
Porém, a incapacidade não provém de uma deficiência aparente, um indivíduo em
condição de aparente normalidade pode de fato se tornar deficiente se, sentir-se incapaz de
realizar as tarefas do cotidiano. Essa deficiência chama-se imaginária.
Essa deficiência imaginária é fruto do medo do fracasso e não de uma
anormalidade qualquer, é o caso de Marilene que relata: "Eu tenho duas pernas e dois braços
perfeitos e não consigo praticar esporte. É uma deficiência neste campo."
A deficiência poderá deixar de ser considerada como tal na medida que se
conseguir levar a pessoa a se realizar em áreas em que possa desempenhar com
competência. Podemos então concluir que existe uma grande diferença entre ser portador
de uma deficiência e se sentir com deficiência.
O que acontece é que cada pessoa reage de uma maneira diferente em cada
situação, e por falta de uma boa orientação, tende-se mais a padronizar reações negativas
condicionadas por aspectos sociais, do que pelo fato em si, a definição de Moura (1992)
enfatiza esse aspecto:
Assim como toda deficiência é socialmente estigmatizante, o indivíduo portador de
uma deficiência se sente censurado e tende a gerar sentimentos e comportamentos
comprometidos. Assim, uma mínima anormalidade, por falta de um bom trabalho de
reabilitação, pode se tornar um mal incapacitante com prejuízos à pessoa e à coletividade
em geral.
A tendência excessiva tanto da negação quanto da sua dramatização, leva à
distorção da percepção, dificultando uma convivência, digamos pacífica, com um problema
comum, e que poderá transformar uma deficiência real leve em uma deficiência imaginária
muito mais profunda. Enfim, a deficiência – física, sensorial, mental e orgânica – só torna-se
de fato um problema, quando não bem tratada (Ferreira, 1984).

UMA QUESTÃO SOCIAL

A marginalização social em relação a pessoa deficiente se manifesta na


dificuldade que o portador de necessidades especiais tem em participar do processo
produtivo da sociedade, pois não lhe é acessível o direito à educação e à profissionalização.
Essas limitações são impostas pela estrutura social que não reconhece esse
direito e acaba não oferecendo então, acesso a essas oportunidades. O que a sociedade
não percebe é que a deficiência física não é algo que lesa ou incapacita a pessoa, nem a
causa de alguém ter limitações para agir.
O que lesa ou impossibilita a ação é o preconceito em nossa sociedade, que
apesar de alguns avanços, prefere ver o portador de deficiência à distância, segregado em
algumas instituições especializadas ou em sua própria casa. Para enfatizar isso,basta
observar o quanto a arquitetura urbana é despreparada para receber a pessoa portadora de
necessidades especiais.
Isto acaba levando o portador a acreditar que ele é um problema. Nessa situação
a pessoa deficiente nem chega a perceber que a deficiência, pela própria natureza, é um
problema social e não individual, pois não nascemos para ser deficientes, nascemos para ter
liberdade física total.
A única maneira da deficiência passar a ser extremamente suportável é quando o
deficiente encontra todo um meio adequadamente preparado para poder lutar pela nova vida.
Como vencer desafios é uma marca do homem, quando são desafios possíveis de serem
vencidos, ele vai à luta com maior disposição e sempre contando com o apoio e estrutura
que a sua situação sócio-econômica permite (Moura, 1992).
Enquanto para o portador de deficiência, em contato com um meio inadequado,
as perspectivas são as piores possíveis, a possibilidade de se tornar um inválido social é
grande. Portanto um coitadinho.

REABILITAÇÃO E REINTEGRAÇÃO

Na realidade, o que se faz até hoje em reabilitação nada mais é do que seguir o
modelo médico, puramente funcionalista, onde o importante é apenas reabilitar algumas
funções físicas e fisiológicas do cidadão e deixar o resto para a pessoa ou a família resolver.
Como se pode deduzir, isto é apenas uma pequena parte do processo de
reabilitação, uma vez que o ser humano não é um ser isolado. É preciso, de fato, pensar em
um processo global de reintegração social, com todas suas implicações, tirando o indivíduo
portador de uma deficiência da sua potencial condição de marginalizado.
É necessário reabilitar nossa sociedade, para que o portador de necessidades
especiais seja visto como pessoa, como um ser que sente e vive, e não pela sua deficiência.
A reabilitação deve ser um processo global de reintegração social da pessoa com
deficiência que vai desde a reorganização psico-física do indivíduo à uma revisão ampla e
irrestrita de todo o processo educacional da sociedade, propiciando ao portador o
desenvolvimento de todo o deu potencial humano (Botomé, 1984).

BARREIRAS ATITUDINAIS

Chamamos de barreiras tudo aquilo que impede uma pessoa reabilitada de


desempenhar o seu livre direito de ir e vir, em última análise o seu papel de cidadão, com
direitos e deveres comuns a todos. Podemos dividi-las simplesmente em barreiras naturais
e barreiras sociais ou culturais.
Tirando as barreiras naturais que são relativas à topografia e as condições
climáticas naturais do meio ambiente, vamos nos deter nas barreiras sociais, pois estas são
as que mais interferem na vida do portador de deficiência atualmente.
Como barreiras sociais ou culturais, isto é, construídas ou criadas pelo homem na
sua relação com o meio social, temos as barreiras atitudinais e as barreiras arquitetônicas,
sendo esta última em nosso entender, fruto da primeira, uma vez que tendo uma atitude de
“não ver” o portador de deficiência, o homem constrói coisas de acordo com a sua
necessidade e capacidade orgânica: basta olhar a arquitetura das cidades (Moura, 1992).
A conclusão é óbvia são as barreiras atitudinais. O preconceito, o fator maior que
dificulta a completa integração social das pessoas com deficiência. O preconceito ou
barreiras atitudinais são o elemento impeditivo. Estes de maneira geral aparecem
mascarados na forma de excesso de piedade ou na forma de elogio exagerado.
É portanto, o portador de deficiência um coitadinho em potencial com mil e uma
barreira a serem vencidas, todas elas a impedi-lo de ter uma vida normal. Se olharmos com
atenção à nossa volta, poderemos perceber com facilidade as barreiras arquitetônicas. Uma
escada íngreme sem corrimão, ou uma porta estreita demais, um piso escorregadio, enfim
um sem número de elementos arquitetônicos a impedir o livre acesso dos portadores. Se
prestarmos atenção, a diminuição de várias barreiras não teria um custo absurdo e facilitaria
a vida não só da pessoa com deficiência, mas de toda uma população, urbana
principalmente.
A ansiedade e a frustração causada por uma barreira, sejam arquitetônicas ou
atitudinais, é de tal magnitude que na prática determina o início de um processo de
incapacitação da pessoa com deficiência, a partir da própria pessoa, pela introjeção do olhar
público, do preconceito.
O processo de reintegração social só irá de fato acontecer quando a atitude
preconceituosa, tanto da sociedade quanto do portador, deixar de existir, e só acontecerá
quando um programa de conscientização for elaborado com a colaboração de toda a
sociedade civil.
BARREIRAS ARQUITETÔNICAS NOS CENTROS URBANOS

O centro urbano de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, usado neste estudo,
apresenta diversas barreiras que impedem o livre acesso do Portador de necessidades
especiais.
As calçadas do centro até apresentam uma continuidade regular, porém o
comércio em sua maioria possui lojas que compõem degraus em seus acessos principais.
Degraus mínimos que facilmente poderiam ser substituídos por pequenas rampas de acesso.
Em alguns trechos da cidade, nas áreas com aclives ou declives, as calçadas não
apresentam continuidade, a construção e manutenção cabe ao responsável pelo imóvel, que
não tem conscientização de seu uso coletivo. Se não há preocupação em facilitar o acesso
para pessoas sem deficiência, imagine para as pessoas com limitações.
O mobiliário urbano também pode ser considerado uma barreira arquitetônica se
estiver localizado em um espaço urbano específico que não permite um deslocamento
seguro para o portador.
Concluindo, É importante darmos continuidade às calçadas sem criarmos
desníveis muito acentuados, evitarmos plantar espécies vegetais que prejudicam a
circulação e estarmos atentos na eliminação de obstáculos que possam prejudicar a
passagem do portador pela calçada, já, esta deve possuir 1,50m de largura no mínimo.
A inserção social é indispensável para que todo homem seja aceito como um
integrante participativo na sociedade. Ter livre acesso ao espaço urbano é de fundamental
importância para o portador de deficiência física.
Disso depende o seu crescimento pessoal, político e social. A simples constatação
de que existem barreiras arquitetônicas e ambientais já limita por si só, o espaço existencial
do portador de deficiência, que fica sem motivação para sair de casa e integrar-se na vida
de sua comunidade.
Para concluir este artigo, deve-se aprofundar um estudo mais detalhado das
cidades em relação as suas barreiras arquitetônicas a fim de integrar o deficiente em seu
meio, sem impedimentos, e é necessário também uma conscientização geral da sociedade,
mudar o seu modo de pensar, para aceitar a necessária convivência deste cidadão com a
população que o cerca.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Adequação das edificações e do mobiliário urbano à pessoa deficiente. Rio de Janeiro,


CE2065, CB2 1991.
FERREIRA, Rafael C. V. Ser deficiente não é defeito. São Paulo, PBQ.
FERREIRA, Marcos R. BATOMÉ. Silvio P. Deficiência Física e Inserção Social A Formação
dos Recursos Humanos. Caxias do Sul, EDUCS, 1984.
MOURA, Luiz C.M. A Deficiência nossa de cada dia De coitadinho a super-herói. São Paulo,
IGLU.
PAIVA, Marcelo R. Feliz Ano Velho. São Paulo, Brasiliense, 1983.

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