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Rui Flores – Turma 8 – 09/15

GASTROENTEROLOGIA · TEMA 6

HEPATITES VÍRICAS

HEPATITE B

HEPATITE B CONSIDERAÇÕES GERAIS

 O vírus da hepatite B é um vírus de DNA; isto explica o facto do vírus conseguir integrar o
genoma do hospedeiro (vírus cancerígeno porque pode causar mutações a nível do DNA
hospedeiro, tão graves que justificam a passagem de fígado normal a hepatocarcinoma sem
cirrose)! Já o HCV não tem este risco, só indivíduos com fígado cirrótico é que progridem para HCC
 O vírus tem duas formas morfológicas, umas mais ovóides e outras mais circulares; apesar
desta diferença estrutural, todas as estirpes partilham vários componentes:
o HBV DNA (cadeia dupla de DNA)
o Antigénios de superfície (HBs)
o Antigénio do core (exposto quando o vírus ainda é muito imaturo e ainda está a ser
fabricado a nível do fígado; o vírus em circulação é sempre maduro)
 Quando se está a replicar activamente, o vírus liberta prolongamentos deste
antigénio para a circulação, fragmentos designados de antigénios
endoplasmáticos ou HBe
 Assim, em circulação nunca temos
o antigénio do core (só o
detectamos na biópsia hepática
em fases de replicação activa
através da imunocitoquímica), mas
antes o antigénio HBe

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HEPATITE B SEROLOGIA CINÉTICA SEROLÓGICA NA INFECÇÃO POR VÍRUS NATIVO

 Depois de se dar a transmissão, a infecção tem vários estádios de evolução:


o Fase prodrómica ou período de incubação (geralmente mais ou menos 1 mês)
 Síndrome gripal, essencialmente com sintomas constitucionais devido à
libertação fisiológica de uma citoquina anti-viral = INTERFERÃO FISIOLÓGICO
 Febre e mal-estar
 Mialgias e arrepios
 Raramente icterícia
 Do ponto de vista laboratorial, não há marcadores víricos directos
 Podemos ter só um discreto aumento das transamínases por alguma citólise
 No início desta fase, só podemos pesquisar o antigénio HBs porque o vírus ainda
não se está a replicar (logo não há antigénio HBe em circulação)

o Fase aguda de infecção (clínica mais exuberante com icterícia)


 Como as formas imaturas do vírus se encontram a nível hepático, susceptíveis à
perceção do sistema imunológico, então o fígado produz anticorpos anti-HBc,
que podem ser pesquisados
 A subfracção principal de imunoglobulinas é IgM!
 Como o laboratório dá sempre a subfracção IgG quando nenhuma
informação é adicionada, se desconfiarmos de uma infecção aguda por
HBV então temos que a pedir expressamente
 Nesta fase ainda mais fácil será detectar o antigénio HBs porque existe um maior
número de cópias virais em circulação
 Como a replicação viral está activa, podemos encontrar em circulação o
antigénio HBe

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 Resumindo, na fase aguda pode ser importante do ponto de vista laboratorial:


 Anticorpos anti-HBc isoforma IgM
 Antigénio HBs
 Antigénio HBe

QUER NA FASE DE INCUBAÇÃO, QUER NA FASE AGUDA DA DOENÇA TEMOS A POSSIBILIDADE DE PESQUISAR O DNA VIRAL
POR PCR; NO ENTANTO, OS CUSTOS NÃO SÃO COMPORTÁVEIS, PELO QUE NÃO SE FAZ HABITUALMENTE POR ROTINA

o Fase pós-infecção aguda


 Aumento de anticorpos anti-HBe
 Os seus níveis só se tornam mensuráveis pelo laboratório depois do
clearance da infecção: na fase aguda já temos anticorpos anti-HBe; no
entanto, como na forma nativa o antigénio HBe anda em circulação
conjuntamente com o anticorpo, formam-se imunocomplexos que não
podem ser avaliados laboratorialmente
 No entanto, o doente só vai ficar até 2 anos com o anticorpo anti-HBe
em circulação
 Diminuição da fracção IgM anti-HBc e aumento da fracção IgG anti-HBc
 O anticorpo anti-HBc IgM tem uma semivida muito curta e desaparece
rapidamente
 Aumento de anticorpos anti-HBs
 Depois do desaparecimento do vírus, as partículas de HBs deixam de
poder ser medidas a nível do soro mas podemos encontrar o anticorpo
anti-HBs
 Como é considerado o único anticorpo com potencial de neutralizar o
vírus, a vacinação é feita com partículas de HBs!

o Fase pós-infecção
 Diminuição dos anticorpos anti-HBe ao fim de 2 anos
 Restante serologia mantém-se: ↑ anticorpos anti-HBc + ↑ anticorpos anti-HBs
 O indivíduo diz-se imune para toda a vida (não dizemos curado porque mantém
em circulação sempre algumas partículas do vírus)
 Estes parâmetros laboratoriais são importantes para avaliarmos se o doente foi
vacinado ou teve a infecção:
 Depois da infecção, o indivíduo vai ter:
o Anticorpos anti-HBc isoforma IgG
o Anticorpos anti-HBs
o [Anticorpos anti-HBe (+) ou (-) de acordo com a fase em apreço]
 Depois da vacinação, o indivíduo só tem:
o Anticorpos anti-HBs

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 Esta cinética serológica ocorre na maioria dos casos, é a chamada FORMA NATIVA do vírus
o Na esmagadora maioria dos casos (90% dos adultos) a infecção resolve
espontaneamente pela acção do sistema imunológico

HEPATITE B SEROLOGIA CINÉTICA SEROLÓGICA NA INFECÇÃO POR VÍRUS MUTANTE

 Apesar do mais frequente ser de longe a infecção


aguda, o vírus consegue em alguns casos
encontrar forma de se esconder; este mecanismo
depende de um fenómeno conhecido como
mutação do genoma viral, que tem várias
formas clínicas, sendo de destacar:
o MUTANTE ANTI-E (80%)
 Esta mutação previne a libertação de antigénios HBe a partir do HBc (fica preso
no core logo nunca surge na circulação, só seria encontrado através de
imunohistoquímica na biópsia hepática), logo não conseguimos perceber se o
vírus está em replicação pela medição do antigénio HBe
 Assim, logo na fase inicial, além do antigénio HBs positivo, o indivíduo tem
também anticorpos anti-HBe
 Na forma nativa só surgia o anticorpo anti-HBe em circulação quando o
antigénio HBe deixava de estar em circulação (isto é, a infecção ficava
resolvida); aqui, como o antigénio HBe não surge na circulação, temos
anticorpos anti-HBe logo desde início
 A explicação para não termos anticorpos anti-HBe mensuráveis no soro
na forma nativa do vírus (sem mutação) deve-se ao facto do antigénio
HBe formar imunocomplexos com o anticorpo anti-HBe!
 Então qual é o problema? Um indivíduo com anticorpos anti-HBe
positivos pode: 1) Ter uma infecção resolvida espontaneamente e ter
anticorpos que vão ser positivos durante aproximadamente 2 anos; ou 2)
ser um mutante anti-e com infecção activa!

NA SUSPEITA DE INFECÇÃO POR HBV, A PESQUISA DE ANTICORPO ANTI-HBe NÃO TEM VALOR PORQUE NÃO É
CONCLUSIVO QUANTO AO ESTADO DO HOSPEDEIRO!

 Em alternativa, para descobrirmos se a infecção está presente e o vírus


se está a replicar temos que pedir a pesquisa de DNA do vírus (se ele se
está a replicar, há DNA em circulação!) (muito caro, só fazer nestes casos)

 Anti-HBe (+) e DNA viral (-) = INFECÇÃO RESOLVIDA/EM DISSOLUÇÃO


 Anti-HBe (+) e DNA viral (+) = INFECÇÃO ACTIVA POR MUTANTE ANTI-E EM REPLICAÇÃO

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 Sintetizando na fase aguda de uma infecção por a mutante e, a serologia


caracteriza-se por:
 Antigénio HBs (+)
 Antigénio HBe (-)
 Anticorpos anti-HBc (+) (não é anticorpo neutralizante, logo cronifica)
 Anticorpo anti-HBe (+)

 De uma forma geral, esta forma mutante, pelo seu potencial em ocultar o
antigénio HBe do sistema imunológico, está associada a um maior risco de
evolução para a forma crónica da doença (cronifica em 90% dos casos)
 Não é linear que tenhamos uma forma mutante de base; o que ocorre na
maioria dos casos é o indivíduo ser infectado por uma forma nativa que,
com o intuito de escapar aos mecanismos de destruição imunológica,
sofre uma mutação no sentido de esconder o antigénio HBe
 O facto de não ter o antigénio HBe em circulação também
justifica que o vírus seja menos virulento
 Em determinados contextos (tuberculose, imunossupressão iatrogénica,
infecção por HIV, quimioterapia, entre outras), o vírus mutante anti-e
retrocede e volta a ganhar a sua capacidade de libertar o antigénio e,
tornando-se novamente mais agressivo e aumentando a sua taxa de
replicação (retrocedendo à forma mutante quando o sistema
imunológico se restabelece); assim, nestes contextos de
imunossupressão, é importante adicionar alguma terapêutica
farmacológica anti-vírica

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HEPATITE B SEROLOGIA CINÉTICA SEROLÓGICA NA INFECÇÃO CRÓNICA

 Nunca esquecer que o anticorpo anti-HBc isoforma IgM é um marcador da forma aguda!
 Na forma crónica, temos:
o Níveis flutuantes de DNA viral (ora se detectam, ora não)
o Antigénio HBs (continua a prevalecer)
o Antigénio HBe (se for a forma nativa)
o Anticorpo anti-HBc
 As formas crónicas raramente são do vírus nativo, mas antes das formas mutantes anti-e (90%)
 A hepatite crónica mediada pelo vírus HBV sistematiza-se nos seguintes estádios:
1) Fase de Tolerância imunológica (= sistema imunológico inactivo)
 Altos níveis de antigénio HBe (forma nativa)
 Altos níveis de HBV-DNA

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 Baixos níveis de transamínases (porque o vírus está a replicar e ainda não


destrói as células)
2) Fase de Clearance imunológico
 Aumento das transamínases (significa que o sistema imunológico se activou e
está a destruir os hepatócitos ao mesmo tempo que o DNA viral diminui)
 Diminuição do DNA viral
 Diminuição do antigénio HBe
 Se este fenómeno citolítico imuno-mediado for suficiente para acabar com a
infecção, então os antigénios HBe e HBs atingem o valor nulo e começam a subir
os níveis de anticorpo respectivo, bem como ocorre a normalização das
transamínases = INFECÇÃO NÃO CRONIFICA
3) Fase de Replicação nula ou muito baixa
 A partir desta fase, cingimo-nos quase aos casos de mutantes anti-e
 O vírus permanece nos hepatócitos oculto com níveis de DNA viral no soro muito
baixos e com transamínases normais = FORMA DE PORTADOR INACTIVO (não se trata
de uma hepatite porque o vírus está praticamente quiescente e não há aumento
das transamínases)
 Como o antigénio HBs permanece em circulação não há formação de anticorpo
anti-HBs e como se trata de uma forma mutante, temos anticorpos anti-HBe em
circulação
4) Fase de Hepatite crónica reactivada
 Clínica e exames laboratoriais sobreponíveis à hepatite na sua forma aguda
 Trata-se de uma hepatite crónica HBe-negativa na maioria dos casos, como já foi
explicado

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 Assim, em resumo:

HEPATITE B HISTÓRIA NATURAL TRANSMISSÃO E CONTÁGIO

 Os principais meios de transmissão do vírus são:


o Transfusão de sangue ou produtos do sangue
o Fluidos (sangue ou sémen)
o Transplante de órgãos
o Transmissão vertical materno-fetal
o Seringas ou agulhas contaminadas
o Creches e infantários
 Constituem factores de risco para a aquisição de infecção por HBV no ocidente:
o Transfundidos ou recipientes de transplantes (em decréscimo pelas políticas de higiene)

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o Múltiplos parceiros sexuais


o Profissionais de saúde
o Gravidez pós-termo
o Manuseio de drogas endovenosas
o Prisioneiros e outras pessoas institucionalizadas

HEPATITE B DIAGNÓSTICO MARCADORES SEROLÓGICOS

 Marcadores HBV possíveis:


o Antigénio HBs e anticorpos anti-HBs
o Antigénio HBe e anticorpos anti-HBe
o Anticorpos isoforma IgM anti-HBc
o HBV-DNA por PCR

NUMA PRIMEIRA ABORDAGEM, PEDIMOS ANTIGÉNIO HBS, ANTICORPOS ANTI-HBS E ANTICORPOS ANTI-HBC IGM!

Por exemplo, se o HBs é (-), escusamos de pedir o HBe, porque se o vírus não está lá, certamente
não estará a replicar! Já se o HBs for (+), eu tenho que pedir o HBe e o anticorpo anti-HBe para
perceber se está a replicar e se é a forma mutante. Se a partir daqui o anti-HBe for (+), ainda temos
que pedir o HBV-DNA para perceber se o indivíduo está a curar ou é uma forma mutante

O pedido dos anticorpos anti-HBc nesta primeira abordagem serve para percebermos se o indivíduo
foi vacinado ou se foi infectado em contextos de HBs (-) e anti-HBs (+). No vacinado temos anti-HBc
(-), enquanto no infectado temos anti-HBc (+)

 Biópsia hepática (eventualmente)


o Células em ground-glass
o Imunocitoquímica para os antigénios HBs e HBc

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HEPATITE B CLÍNICA MANIFESTAÇÕES NA IDADE ADULTA E NEONATAL

 Infecção neonatal
o Infecção aguda (2%)
 Hepatite subclínica
 Hepatite ictérica
 Hepatite fulminante
o Infecção crónica (98%)
 Hepatite mínima
 Hepatite activa crónica
 Hepatite persistente crónica
 Infecção na infância e idade adulta
o Infecção aguda (90% pelo sistema imunológico mais competente)
 Hepatite subclínica
 Hepatite ictérica
 Hepatite subaguda ou fulminante
o Infecção crónica (10%)
 Hepatite mínima
 Hepatite activa crónica
 Hepatite persistente crónica

HEPATITE B CLÍNICA PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES

 Nunca esquecer que pode haver casos de surgimento de carcinoma hepatocelular sem
background cirrótico porque se tratar de um vírus de DNA (no entanto, na maioria ele surge em
fígados cirróticos)
o Indivíduos jovens com a forma mutante têm que ser vigiados regularmente com
ecografia e medição dos níveis de alfa-fetoproteína (PORTADOR INACTIVO com
transamínases normais)

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HEPATITE B EPIDEMIOLOGIA PREVALÊNCIA DOS PORTADORES

 Portugal tem uma prevalência de 2-8% de portadores do antigénio HBs


 Normalmente a Ásia e a África apresentam valores maiores para infecções víricas no geral
 Fenómeno do iceberg

HEPATITE B CLÍNICA RECAÍDA

 Risco aumentado de recaída se:


o Seroconversão (HBe/anticorpos anti-HBe)
o Reactivação (anticorpos anti-HBe/HBe)
o Superinfecção (HDV/HAV/HNANB)
o Carcinoma hepatocelular (HCC)

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HEPATITE B TRATAMENTO

 O tratamento gold-standard é o interferão recombinante (citoquina anti-vírica)


o De uma forma geral, os indivíduos que não curam espontaneamente a infecção ou que
desenvolvem a infecção crónica não têm o interferão anti-vírico endógeno muito
potente, logo necessitam desta suplementação
o Administrado durante 6 meses até 1 ano
o Função de destruir hepatócitos cheios de vírus (aumentam as transamínases!)
o No final do tratamento, é expectável termos descida do antigénio HBs, subida dos anti-
HBs, anti-HBc (IgG) e anti-HBe (só até 2 anos) e normalização das transamínases
o Este fenómeno acontece em 2% dos casos! Na maioria dos casos, só conseguimos
baixar os níveis virais a um ponto muito baixo, raramente conseguimos erradicar a
infecção: tornam-se PORTADORES INACTIVOS (50%)

 Pelo facto do interferão apresentar muitos efeitos adversos, surgiram novos fármacos:
o LAMIVUDINA (muito raramente usada)
 Transamínases aumentam e o antigénio HBs desce quase a nível zero
 Quando suspendemos, o indivíduo tem uma recaída
 Virostática (não viricida como o interferão)
 Obrigatoriamente tem que ser feita cronicamente
 Os níveis de vírus endógeno têm relação directa com o risco de desenvolvimento
de hepatocarcinoma, pelo que o seu uso é benéfico na redução do risco
 Ineficaz em indivíduos que se tornam resistentes à lamivudina (formas mutantes
YMDD) = ao fim de 5 anos, cerca de 70% desenvolve a forma mutante
o ENTECAVIR E TENOFOVIR (ainda sem mutantes mas o tempo de estudo para já é
reduzido)

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HEPATITE B CO-INFECÇÃO DO VÍRUS DELTA

 Muito pouco frequente entre nós (raro no Porto; em Lisboa há alguns casos)
 As partículas delta são incapazes de parasitar um doente sozinhas, necessitam que o doente já
esteja infectado pelo HBV (requerem as partículas de superfície do HBV para sobreviverem)
 A sua infecção pode ocorrer de duas formas:
o CO-INFECÇÃO (infecção simultânea do vírus da Hepatite B e delta)

o SUPER-INFECÇÃO (mais frequente)


 Infecção prévia pelo HBV (tornando-se portador)
 Mais tarde surge com uma super-infecção pelo vírus delta

 Diagnóstico
o IGM ANTI-DELTA (indicador de infecção aguda)
 No caso particular da co-infecção:
 IgM anti-delta
 IgM anti-HBc
o PCR do delta (muito cara)

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HEPATITE A

HEPATITE A ASPECTOS GERAIS

 Infecção não cronifica nem tem gravidade apesar de muito sintomática (no adulto é
tipicamente muito ictérica, mais aparatosa) ao contrário da infecção por HBV ou HCV
o Torna-se preocupante quando dá uma super-infecção em indivíduos com cirrose ou
uma infecção por HBV
 Transmissão fecal-oral
 IgM anti-HAV (+) na fase aguda (depois IgG)
o O diagnóstico de infecção por HAV nunca é feita pela pesquisa de anticorpos IgG anti-
HAV: mais de 90% da população tem esses anticorpos (+) por ser uma infecção muito
frequente (e indolente) na infância
 Relação com países subdesenvolvidos e más condições higiénicas

HEPATITE A EPIDEMIOLOGIA

 Portugal tem uma prevalência muito baixa


 Em países subdesenvolvidos, a hepatite A é primariamente uma doença de crianças e
aproxima-se a 100% logo aos 5 anos de idade.
 Em países desenvolvidos, a prevalência é baixa em todos os grupos etários com ligeiro aumento
em idades mais avançadas devido em grande parte a HAV contraída por adultos em viagens por
zonas endémicas.

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 Em áreas intermediarias (USA entre elas), a prevalência total permanece pelos 50% mas a
infecção parece ir em aumento em idades + avançadas este fenómeno poderá ser atribuído a
um grupo de doentes mais velhos que terão sido infectados na infância quando a infecção era
ainda mais comum, a melhoria de condições socioeconómicas e sanitárias e um declínio no
tamanho das famílias poderia ser responsável pelo declínio da HAV no presente.
 Há poucos estudos longitudinais da HAV em populações normais
 A prevalência da infecção por HAV varia dramaticamente consoante a região.
 Zonas de alta prevalência incluem a maioria do norte de África e Médio-Oriente.
 Em áreas de prevalência média (América do Centro e Sul, Sudeste africano, e subcontinente
indiano), bem como de alta prevalência, a maioria dos seus nativos (senão todos) são
infectados precocemente na vida, sendo que a doença é incomumente reportada na idade
adulta.
 Viajantes para essas áreas (a partir de áreas de baixa prevalência) têm um risco aumentado de
adquirir a infecção por HAV, pelo que é importante fazer vacinação em doentes hepáticos

HEPATITE A EPIDEMIOLOGIA PADRÕES DE TRANSMISSÃO

 Os principais veículos de transmissão são:


o Fecal-oral

Contacto em casa e por contacto íntimo (30-40%)
 Institucional (10-15%)
 Fontes comuns, como água, comida e pelos moluscos
o Percutânea (muito rara) por transfusão ou inoculação

HEPATITE A CLÍNICA

 Prevalência da icterícia
o Há uma diferença idade dependente na resposta clínica à HAV:
 Nas crianças é geralmente assintomática ou ligeira com apenas uma
percentagem mínima de jovens com icterícia em contraste com a infecção no
adulto, que é sintomática, muitas vezes severa e geralmente ictérica, sendo
incerto o mecanismo subjacente a esta diferença que nitidamente é idade-
dependente

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HEPATITE A CLÍNICA SEQUELAS CLÍNICAS

GERALMENTE CURA COMPLETAMENTE SEM SEQUELAS E NUNCA ORIGINA INFECÇÃO CRÓNICA OU PERSISTENTE

 Raramente pode ser fulminante e até fatal (mais em doentes com problemas hepáticos)
 Há variantes clínicas raras, mas que usualmente curam:
o Hepatite colestática
 Bilirrubina dramaticamente elevada (> 20 mg%)
 Persiste por meses até curar
o Hepatite bifásica ou recidivante
 Exacerbação dos sintomas e das alterações no perfil hepático durante a fase em
que já se observa declínio da fase aguda
o Hepatite prolongada
 Duração de vários meses (mas a cura pode ser antecipada)

HEPATITE E

HEPATITE E CARACTERÍSTICAS DA INFECÇÃO E DO VÍRUS

 HNANB epidémica ou entérica


 Raríssima em Portugal (muito prevalente na Índia)
 Clínica semelhante à infecção ao vírus da hepatite A
o Transmissão fecal-oral
o Sintomatologia de hepatite aguda (icterícia) e severa
o Icterícia quase sempre presente!
o PROGNÓSTICO RESERVADO NA GRAVIDEZ (letalidade em 20% dos casos) para a mãe
o Não evolui para cronicidade
 Vírus do tipo calicivírus, estruturalmente e serologicamente diferente dos vírus de hepatite A, B
eC

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 Impropriamente categorizado
o NANB (ausência de HAV e HBV mas clínica
sobreponível)
o NANB entérico
 Morfologia vírica
o Ácido nucleico ssRNA
o Classificação (supergrupo de vírus de positive-
strand RNA): calicivírus ou alfavírus
o Serótipo único com grande heterogeneidade génica
o Replicação in vivo nos hepatócitos
o Replicação in vitro nas células diploides embrionárias do pulmão humano

HEPATITE E DIAGNÓSTICO

 O período de incubação da hepatite E é


variável dentro de um espaço de 40 dias.
 As partículas de HEV podem aparecer
nas fezes (de forma inconstante) durante o
período prodrómico da doença.
 O processo de shedding fecal ocorre
predominantemente durante a primeira semana
depois da instalação do quadro de icterícia e
não é identificado nas amostras fecais obtidas
8-15 dias depois do início da icterícia.
 IgMs anti-HEV de semivida curta surgem
no soro na fase aguda. Concomitantemente
surge uma IgG anti-HEV mas cujo pico é atingido mais tarde.
 A duração do período de deteção da IgG anti-HEV permance incerto.
 Diagnóstico pela pesquisa da IgM anti-HEV

HEPATITE E CLÍNICA MODOS DE TRANSMISSÃO

 Os principais modos de transmissão da hepatite E são:


o Fecal-oral (a mais frequente)
 Água
 Alimentos
 Moluscos
o Contacto em casa
o Percutâneo (?)

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 O HEV é responsável por surtos de hepatite relacionados com o consumo de água e é a causa
mais comum de hepatite esporádica no adulto jovem nos países subdesenvolvidos.
 Surpreendentemente, a taxa de infecção associada aos contactos em casa é muito baixa
 Nos EUA são vistos casos exclusivamente importados de países com alta incidência da infecção.

HEPATITE E CLÍNICA SEQUELAS CLÍNICAS

 Nenhuma forma de doença hepática crónica foi


atribuída ao vírus da hepatite E!
 Apesar da maioria das infecções agudas serem auto-
limitadas, nas grávidas uma proporção muito
considerável pode desenvolver hepatite fulminante
(10-20%)
 O processo patogénico subjacente à maior virulência
do agente no terceiro trimestre de gravidez
permanece incerto.

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HEPATITE C

HEPATITE C CARACTERÍSTICAS DA INFECÇÃO E DO VÍRUS

 O virião do HCV tem um invólucro lipídico que contém várias glicoproteínas e uma
nucleocápside que contém no seu interior ssRNA (logo não se integra no DNA do hospedeiro!)
 Do ponto de vista organizacional, temos:
o Vírus ssRNA (+)
o 9400 nucleótidos

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o NCR (região não-codificante) altamente conservada no extremo 5’


o Domínios altamente variáveis nas proteínas do invólucro (E1 e E2)
o Existem muitas variações genotípicas do vírus
 Genótipo 1 é o que prevalece entre nós, sendo o de pior prognóstico do ponto
de vista de resposta ao tratamento
 Subtipos 1a e 1b
 Genótipo 2 tem óptimo prognóstico porque cura em 100% (raro)
 Genótipo 3 tem óptimo prognóstico porque cura em 90%
 Genótipo 4 surge em doentes hemofílicos, que viajaram por Marrocos ou pelo
Egipto ou toxicodependentes (semelhante ao 1 mas mais raro)
 Genótipos 5 e 6 muito raros
o Do melhor para o pior prognóstico, temos: 2 – 3 – 4 – 1

HEPATITE C EPIDEMIOLOGIA

 Prevalência em Portugal ronda os 2-5% actualmente


 Vírus mal documentado na Ásia (endémico)

HEPATITE C CLÍNICA MODOS DE TRANSMISSÃO

 Os principais modos de transmissão são:


o Idiopática (43%)
o Abuso de drogas (35%)
o Contacto domiciliário (8%)
o Actividade heterossexual (7%, ligeiramente inflacionado)
o Transfusão (5%) = importante medidas de autotransfusão em cirurgias agendadas
o Estabelecimentos de saúde (2%)

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HEPATITE C CLÍNICA CARACTERIZAÇÃO VÍRICA

 Existem dois grandes grupos de doentes (associados a dois grandes grupos de HCV)
o SVR (Sustained Virologic Responders)
o NR (Nonresponders)
 A principal modalidade de tratamento é o interferão!

HEPATITE C DIAGNÓSTICO

 O diagnóstico de infecção por vírus da hepatite C assenta nos seguintes critérios:


o Clínica
o Níveis de ALT séricos elevados por mais de 6 meses
o Teste anti-HCV positivo (prova terapêutica)
 Não existe forma laboratorial de medir o anticorpo IgM
 Não é o anticorpo neutralizante!
 Anti-HCV (+) pode significar que o indivíduo teve ou tem a infecção, não
especifica o estado do doente; assim, nestes casos, é importante pedirmos o
RNA do vírus
o Confirmação de doença hepática crónica por biópsia hepática (raramente)
 Corpos acidófilos
 Degeneração vacuolar (microvesicular)
 Portite e lesões dos dúctulos
 Hiperplasia das células de Kuppfer
 Substituído pelo fibroscan (avalia a fibrose hepática)

HEPATITE C RESPOSTAS SEROLÓGICAS

 Notar um atraso de 3-4 meses antes da possibilidade de detectarmos os anticorpos anti-HCV

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 Não há vacinação ou imunoglobulinas a usar no período de janela


 Durante este período poderá haver uma elevação variável nas transamínases séricas e o RNA
vírico pode ser detectado por técnicas de PCR (mas é muito dispendioso)
 Num contexto agudo, é quase impossível (sem recorrer ao PCR) perceber se o indivíduo
adquiriu a infecção; algumas medidas profilácticas podem incluir: 1) introduzir o local de
possível entrada em lixívia (o vírus é muito lábil) ou 2) entrar em piscinas com cloro

HEPATITE C DIAGNÓSTICO 1 HISTÓRIA NATURAL/MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

 CLÍNICA
o Hepatite aguda benigna
 Assintomática (raramente fulminante) ao contrário das hepatites A e B
 Anictérica em 75% dos casos
 Raras manifestações extra-hepáticas
 O sintoma mais frequente é a astenia (característico mas não muito frequente)
 Cronifica em 90% dos casos
o Associação a anemia aplástica (?)
 Antecedentes de PHT são frequentes
 28% pós-OLP por HNANB (hepatite fulminante)
o Hepatite crónica silenciosa (transamínases inclusivamente normais)
o Cirrose muito indolente (sem clínica e com pouca actividade inflamatória)

 TRANSAMÍNASES FLUTUANTES OU ONDULANTES


o Hepatite em pingue-pongue
o Às vezes demoram até 3 meses para começarem a aumentar (à semelhança do
anticorpo anti-HCV); o RNA do vírus é o primeiro sinal de infecção, mas como não
desconfiamos dela [transamínases (-) + anticorpo anti-HCV (-)], não o pedimos
o 3 padrões básicos com prognósticos muito diferentes (↑ TGP)

POLIFÁSICO (87% HC) MONOFÁSICO (42% HC) EM PLATEAU (95% HC E DE EVOLUÇÃO


MAIS RÁPIDA)
Pico único (difícil saber se o doente
Picos recorrentes que realmente recuperou da HNANB,
Aumento moderado
diminuem com o tempo sendo útil avaliar os anticorpos
anti-HCV)

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 HISTOLOGIA

HEPATITE C COMPLICAÇÕES

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HEPATITE C EPIDEMIOLOGIA

 Aumento da prevalência com a idade pelo adquirir de comportamentos de risco


 Quanto maior o tempo de infecção, maior o risco de termos complicações
 A maioria dos doentes cai na categoria de slow fibroser ou fibrosadores lento, em que a
infecção só complica em cirrose ao final de 30 anos de evolução
o O único factor conhecido que converte os fibrosadores lentos em rápidos é o álcool
(basta um copo por refeição; na hepatite B a influência do álcool não é tão drástica)
o A partir de indivíduos com cirrose, 3% evolui para hepatocarcinoma (muito relevante
tendo por base a alta prevalência de indivíduos cirróticos)

HEPATITE C COMPLICAÇÕES

HEPATITE C TRATAMENTO

 O tratamento de eleição é o INTERFERÃO


o Normaliza as transamínases
o Diminui os valores de RNA viral: só dizemos que o indivíduo está curado quando o
RNA negativiza até ao final de 1 ano e se mantém nulo durante 6 meses após
tratamento = RESPONDEDOR SUSTENTADO

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o Alguns doentes ou não respondem (NÃO-RESPONDEDORES) ou recidivam após o


tratamento (RESPONDEDORES RECIDIVANTES)

 Contam-se como vantagens do uso de interferão:


o Diminuição das transamínases
o Diminuição ou anulamento do RNA-HCV
o DIMINUIÇÃO DA INFLAMAÇÃO HEPÁTICA
 Sabemos que mesmo doentes que não respondem do ponto de vista do RNA
vírico têm resposta do ponto de vista histológico com atraso na evolução
hepática para cirrose

 Factores preditivos de sucesso


o FACTORES DO HOSPEDEIRO
 Sexo feminino

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 Idade < 40 anos (sistema imunológico mais potente)


 Peso (doentes com menos peso)
o DOENÇA HEPÁTICA
 Severidade histológica (doente sem HCP ou cirrose hepática)
 Duração inferior a 10 anos
o FACTORES VÍRICOS
 Viremia menos altas
 Genótipo envolvido
 Genótipo 1 com 40% de resposta
 Genótipos 2 e 3 respondem na esmagadora maioria dos casos
 Homogeneidade
o Outros
 Sobrecarga hepática de ferro confere pior prognóstico porque interfere com a
função hepática (por exemplo, na hemocromatose)
 Imunossupressão [HIV (+)] tem relação directa com pobre outcome
 Álcool interfere com a boa resposta e está associado a maior viremia

ASSIM, MESMO QUE SEJA EXPECTÁVEL QUE O DOENTE NÃO RESPONDA, DEVEMOS TRATAR NO
SENTIDO DE DIMINUIRMOS O RISCO DE EVOLUÇÃO PARA CIRROSE HEPÁTICA!

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 Resultados de alguns estudos:


o Apesar de termos sucesso a reduzir a inflamação hepática com o tratamento com
interferão, os indivíduos não-respondedores naturalmente têm um maior risco de
progressão para cirrose e hepatocarcinoma do que indivíduos respondedores
sustentados ou mesmo os respondedores recidivantes
o O benefício do tratamento com interferão em indivíduos não-respondedores (além do
impacto na inflamação hepática) também se repercute a nível da sobrevida

ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS

 INTERFERÃO PEGUILADO (interferão associado à ribavirina)


o O mais usado
o Administração 1x/semana
o Evita que haja períodos em que o interferão não esteja em circulação
o Decréscimo da clearance renal e hepática
o Maior tempo de circulação (possível incremento ou duração da actividade)
o Decréscimo da antigenicidade
o Introduzido em 1998, levou a um aumento das taxas de resposta de 16% para 33% (hoje
temos respostas na ordem dos 60%)

 INTERFERÃO PEGUILADO ASSOCIADO A ANTI-RETROVÍRICOS (ainda não usados hoje)


o TELEBRAVIR OU BOCAVIR
 Eficácia de 75-80%
 Muitos efeitos laterais durante um ano
 SOFOSBOVIR
o 1 comprimido por dia
o Sem associação ao IFN ou ribavirina
o Muito caro (não utilizado em Portugal)
o Sem efeitos laterais e com eficácia perto de 99%
 Outras terapêuticas usadas mais antigamente incluem: tenofovir, adenovir, entecavir e a lamivudina

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HEPATITE C TRATAMENTO OBJECTIVOS

 Objectivos do tratamento
o Doença inicial/doença mínima = TERAPIA DE ERRADICAÇÃO
 Remover o risco de progressão
 Abolir infecciosidade
 Restaurar a qualidade de vida
o Estadios pré-cirróticos/cirrose = TERAPIA SUPRESSIVA
 Atrasar a progressão da doença
 Reduzir as complicações
 Aumentar a sobrevida

HEPATITE C TRATAMENTO COMPLICAÇÕES DO TRATAMENTO COM IFN

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