O POVO DRÁVIDA Certa vez um famoso bailarino improvisou alguns movimentos instintivos, porém, extremamente sofisticados graças ao seu virtuosismo e, por isso mesmo, lindíssimos. Essa linguagem corporal não era propriamente um ballet, mas, inegavelmente, havia sido inspirado na dança.
A arrebatadora beleza da técnica emocionava a
quantos assistiam sua expressividade e as pessoas pediam que o bailarino lhes ensinasse sua arte. Ele assim o fez. No início, o método não tinha nome. Era algo espontâneo, que vinha de dentro, e só encontrava eco no coração daqueles que também haviam nascido com o galardão de uma sensibilidade mais apurada.
Os anos foram-se passando e o grande bailarino
conseguiu transmitir boa parte do seu conhecimento. Até que um dia, muito tempo depois, o Mestre passou para os planos invisíveis. Sua arte, no entanto, não morreu. Os discípulos mais leais preservaram-na intacta e assumiram a missão de retransmiti -la. Os pupilos dessa nova geração compreenderam a importância de tornar-se também instrutores e de não modificar, não alterar nada do ensinamento genial do primeiro Mentor.
Em algum momento da História essa arte ganhou o
nome de integridade, integração, união: em sânscrito, Yoga! Seu fundador ingressou na mitologia com o nome de Shiva e com o título de Natarája, Rei dos Bailarinos.
Esses fatos ocorreram há mais de 5000 anos a
Noroeste da Índia, no Vale do Indo, que era habitada pelo povo drávida. (...)
Tanto o Yoga, quanto o Tantra e o Sámkya foram
desenvolvidos por esse povo admirável. Sua civilização, uma das mais avançadas da antiguidade, ficou perdida e soterrada durante milhares de anos, até que os arqueólogos do século XIX encontraram evidências da sua existência e escavaram dois importantes sítios arqueológicos onde descobriram respectivamente as cidades de Harappá e Mohenjo- Daro. Depois, foram surgindo outras e outras. Hoje já são milhares de sítios, distribuídos por uma área maior que o Egito. Mohenjo-Daro Ficaram impressionados com o que encontraram. Cidades com urbanismo planejado. Ao invés de ruelas tortuosas, largas avenidas de até 14 metros de largura, cortando a cidade no sentido Norte-Sul e Leste- Oeste. Entre elas, ruas de pedestres, nas quais não passavam carros de boi. Nessas, as casas da classe média tinham dois andares, átrio interno, instalações sanitárias dentro de casa, água corrente! Não se esqueça de que estamos falando de uma civilização que floresceu 3000 anos antes de Cristo. Não era só isso. Iluminação nas ruas e esgoto cobertos, brinquedos de crianças em que os carros tinham rodas que giravam, a cabeça dos bois articulada, bonecas com cabelo implantado, imponentes celeiros que possuíam um engenhoso sistema de ventilação, e plataformas elevadas para facilitar a carga e descarga das carroças. Noutras culturas do mesmo período, as construções dos soberanos apresentavam opulentos palácios e majestosos túmulos reais, enquanto o povo subsistia em choupanas insalubres. Na cultura dravídica, ao contrário, o povo vivia bem e a arquitetura da administração pública era simples. “Ficamos verdadeiramente admirados de, nesses tempos profundamente religiosos, não encontrarmos templos ou vestígios da estatuária que os povoaria, como foi regra noutros lugares durante toda a antiguidade, nem sequer estatuetas de adoradores em atitude de oração diante de sua divindade”. Gaston Courtillier no livro Antigas Civilizações. Isso faz sentido quando hoje sabemos que na Índia Antiga, o Sámkya teve seu momento de esplendor. Sua sociedade foi classificada como matriarcal, o que também está coerente com as fontes que afirmam que o Yoga surgiu numa cultura tântrica. Cavando mais, os arqueólogos descobriram outra cidade sob os escombros da primeira. Para sua surpresa, mais abaixo, outra cidade, bem mais antiga. E mais outra. E outra mais. O que chamava a atenção era o fato de que, quanto mais profundamente cavavam, mais avançada era sua tecnologia, tanto de arquitetura quanto de utensílios. Até que deram com um lençol d´água e precisaram parar de cavar mais fundo. O que nos perguntamos é: quantas outras cidades haveria lá por baixo e quão mais evoluídas seriam elas? Bem, foi nessa civilização que o Yoga surgiu. Uma civilização Tântrica (matriarcal) e Sámkya (naturalista). Cerca de 1500 anos depois a Civilização do Vale do Indo foi invadida por um povo sub-bárbaro proveniente da Europa Central, os áryas ou arianos. Consta, na História atual, que estes subjugaram os drávidas, destruíram sua civilização, absorveram parte da sua cultura, exterminaram quase todos os vencidos e escravizaram os poucos sobreviventes. Outros fugiram, migrando para o extremo Sul da Índia e Sri Lanka, onde vivem seus descendentes até hoje, constituindo a etnia Tamil.
O Yoga foi produto de uma civilização não guerreira,
naturalista e matriarcal. A partir de mais ou menos 1500 a.C. foi absorvida por um outro povo que era o seu oposto: guerreiro, místico e patriarcal. Cerca de 1200 anos após a invasão (o que não é pouco), o Yoga foi formalmente arianizado mediante a obra de Patanjali, o Yoga Sutra. É árdua tarefa acompanhar o Yoga ao longo do tempo, já que é certamente muito mais antigo que todos os registros que dele se conhecem. Falar sobre as suas origens é tão difícil quanto tentar explicar a origem do próprio homem. Muitos são os obstáculos encontrados no caminho, considerando a escassez de recursos para a pesquisa: importantes textos foram perdidos para sempre, o perfil de algumas tradições orais é muito difuso e temos uma enorme dificuldade para localizar cronologicamente as grandes personalidades históricas vinculadas ao Yoga. Não sabemos quase nada, até mesmo do próprio Patanjali, fora os escassos registros escritos, que beiram a mitificação, e o prestígio que lhe deu a sua obra. Mas isso não é tudo. A história do Yoga está indissoluvelmente ligada à história da OS DESAFIOS Índia, que foi o berço da civilização urbana e é a mãe criadora de um vasto universo de ciências e elementos que integram a vida DA HISTÓRIA cotidiana de todos nós, humanos. Os primeiros yogis não fizeram mais do que escutar e conhecer a própria natureza. No momento em que surgem condições favoráveis, o indivíduo consegue desenvolver o Yoga de maneira sistemática. Podemos imaginar estes proto- yogis renunciando à segurança que oferecia a vida em aldeias e cidades, internando-se nas profundezas de florestas e montanhas, onde existiam perigos reais como o frio extremo das regiões setentrionais da Índia, avalanches de neve ou a presença de animais selvagens. A sede de conhecer-se, no mais profundo e absoluto sentido da palavra, transcendia qualquer perigo. A recompensa, Moska, a liberdade suprema, bem valia o risco. Esta praxis nasce do inconformismo, da sede de transcender a miséria existencial inerente a todo ser humano, e de eliminar os intermediários entre si próprio e o sagrado. Se diz que o ócio é a mãe da filosofia. O Yoga pode ter surgido a partir de certas perguntas essenciais: é o homem quem determina seu próprio destino? Pode ele guiar ou transformar esse destino, tornando a própria existência um ato de criatividade? A introspeção decorrente destas reflexões levou os primeiros ascetas a descobrir as forças latentes em si próprios, Purusha e Prakriti, o Ser e a Natureza. Purusha representa a força cognitiva. Prakriti, a energia manifestada. Yoga, significa união, é a prática que nos permite desvendar o estado interior em que estas duas forças, também chamadas Shiva e Shakti, se unificam. Como método, o Yoga se baseia na autodescoberta e na auto superação, o que tem, por sua vez, repercussões sociais. Vemos surgir o Yoga bastante antes das filosofias especulativas que se utilizaram para fundamentá-lo. Primeiramente existiu o Yoga; depois, seus apoios filosóficos. Porque, quando o Rishi parte para a floresta e renuncia à vida profana, faz uma série de descobertas sobre si próprio, mas o essencial continua sendo a prática. Houve no início, alguém que fez isto por intuição, karma ou simples necessidade. A fundamentação do Yoga aparece junto com a necessidade que os primeiros yogins tiveram de explicar a sua vivência à próxima geração. Nesse mesmo instante, surge também o sistema de transmissão do conhecimento ou sucessão discipular, chamado paramparā. E foi assim que o Yoga, originalmente uma técnica de ascese (tapas = ‘tornar-se irradiante’) e contemplação, que pode não ter incluído técnicas fisiológicas sofisticadas, começou a atravessar o tempo. Durante esse processo foram acrescentando-se novas técnicas, experiências e constatações das sucessivas gerações de Rishis, que por momentos o enriquecem e refinam com novos achados. A mensagem do primeiro yogin foi válida para seus discípulos e os discípulos dos seus discípulos e, atravessando as gerações, continua válida para nós, homens do século XXI. UM MITO Diz a tradição que Parvati convenceu Shiva a inventar o Yoga por compaixão. A vida é dura. A felicidade geralmente é esquiva. Nós adoecemos, ficamos velhos e morremos. Nós nos tornamos vítimas da ilusão de que isto é tudo o que existe. Ao compreender como é difícil manter a perspectiva, Parvati pediu a Shiva que inventasse um sistema que ajudasse as pessoas a lidar com o inevitável sofrimento inerente à vida de um ser humano, e ele fez isso. Portanto, ele é honrado como o primeiro professor de Yoga, e ela como a primeira aluna. Na condição de professor universal Dakshinamurti, ele se senta no monte Kailash, no ponto mais setentrional da Índia, de frente para o sul (dakshina, em sânscrito) olhando para baixo para o mundo inteiro, uma das mãos erguidas no gesto que significa: “Não tenho medo”. Considera-se que Shiva inventou 84 asanas básicos para ajudar as pessoas a purificar o corpo e prepará-lo para a meditação. Esse tipo de Yoga é chamado de Hatha Yoga, que significa um Yoga que envolve energia e determinação, onde a disciplina física, nos prepara para a disciplina mental e espiritual da meditação, o Raja (real) Yoga. O livro Shiva Samhita é o que contêm todos os ensinamentos do Mestre à sua esposa. Contêm 645 versos. RAMOS CLÁSSICOS DO YOGA
Há diferentes tipos de Yoga que se
adaptam a diferentes tipos de personalidade. Historicamente, o mais significativo ramo do Yoga é o Sistema Clássico de Patanjali. O tipo de Yoga atualmente mais praticado no Ocidente é o Hatha Yoga.
• Hatha Yoga: a via do aperfeiçoamento
do corpo psicofísico • Raja Yoga: a via do domínio amplo da mente • Karma Yoga: a via da ação desapegada • Bhakti Yoga: a via da devoção, amor altruísta, para os religiosos • Jnana Yoga: a via do conhecimento, para o intelectual • Tantra Yoga: a via do controle das energias sutis, para a realização do conhecimento puro • Mantra Yoga: a via do controle da mente pelo domínio dos sons (interiores e exteriores) • Yantra Yoga: estuda formas geométricas e símbolos • Yoga Criktsa: yoga terapêutica • Kundalini Yoga: yoga do poder do fogo ígneo • Kryia Yoga: yoga da purificação TANTRA Pode-se constatar que o Tantra impregna todas as formas culturais da civilização indiana. O Tantrismo tem suas origens na civilização do Vale do Indo, que floresceu há cerca de 15.000 anos atrás. Essa civilização, que habitou regiões que hoje correspondem à atual Índia e ao atual Paquistão, era constituída por variados povos, conhecidos como dravidianos ou drávidas. O forte de sua economia era o comércio e, por isso, criaram cidades à beira de rios, construindo portos, voltados para este fim. Além de comerciantes e agricultores, eram povos que cultivavam a arte a saúde. Tinham a busca de integração com a natureza e buscavam seu desenvolvimento em harmonia com o meio, sendo povos pacíficos, não militaristas e, possivelmente vegetarianos. A ação do Tantra é dar consciência ao ser humano. Demonstrar que somos um microcosmo dentro de um macrocosmo. O tantra trabalha com a questão das responsabilidades que temos sobre nossas ações: o ser humano é livre para fazer suas escolhas, mas ele não é livre para fugir das consequências dessas escolhas. Aprofundaremos neste estudo em um módulo mais à frente.
Ensino esotérico do Tantra Tibetano (Traduzido): Incluindo sete rituais de iniciação e os seis yogas de Nāropā no comentário de Tsong-Kha-Pa, traduzido por Chang Chen Chi