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Infelizmente o doente é incapaz de executar tal pedido, pois inserindo o objeto, distância
do que ele já experimentou outras vezes com seu corpo próprio. Isto é, há uma perda da relação
do corpo próprio com o que era habitual movimentar-se no mundo, ou seja, tocar o nariz ao
invés de mostrar com uma régua. O doente consegue mostrar seu nariz – através do movimento
do braço ao rosto no sentido do nariz –, porque já executou essa ação algumas quantidades de
vezes antes do ferimento, portanto já experimentou no corpo vivido. Merleau-Ponty quer
diferenciar os gestos de mostrar, de tocar e de pegar no seu exemplo, pois o de tocar para o de
mostrar para o corpo é que, um já foi experiência no mundo. Esta forma é o esquema corporal
para a filosofia de Merleau-Ponty que, defende a experiência vivida pelo corpo próprio, um
sujeito vivendo as experiências de seu corpo, Merleau-Ponty completa dizendo que:
O doente tem consciência do espaço corporal como local de sua ação habitual,
mas não como ambiente objetivo, seu corpo está a sua disposição como meio
de inserção em uma circunvizinhança familiar, mas não como meio de
expressão de um pensamento espacial gratuito e livre. Quando lhe ordenam
que execute um movimento concreto, primeiramente ele repete a ordem com
um acento interrogativo, depois seu corpo se instala na posição de conjunto
que é exigida pela tarefa; enfim ele executa o movimento. Observa-se que todo
o corpo colabora para isso e que o doente nunca reduz o movimento, como
faria um sujeito normal, aos traços estritamente indispensáveis. (MERLEAU-
PONTY, 1999, p. 151).
Merleau-Ponty procura entender qual é a forma que o sujeito, através da sua existência
percebe o mundo pelo corpo. A percepção tanto do doente quanto para uma pessoa sadia em
perfeito estado, não pode ser uma percepção do sujeito sobre seu corpo não é uma
representação, mas modo de ser do sujeito. Da mesma forma que, não o doente não entende seu
corpo como uma soma de órgãos, mas como entende-se como sujeito que vive com um corpo
próprio, porque o corpo é uma parte do sujeito. Portanto, o objetivo do filósofo é mostrar que o
corpo não pode ser representado, mas sim o corpo vivido por um fenômeno que é possível de
ser tocado. Por isso, é possível que o sujeito reconheça qualquer parte do seu corpo a tocando,
porque antes houve a experiência de conhece-lo e vivencia-lo, por exemplo, como seu próprio
nariz.
Seu corpo não lhe é dado pelo tocar como um desenho geométrico sobre
o qual cada estímulo viria ocupar uma posição explícita, e a doença de
Schneider consiste justamente em precisar fa zer com que a parte tocada
de seu corpo passe ao estado de figura, para saber onde o tocam. Mas no
normal cada estimulação corporal desperta, em lugar de um movimento atual,
um tipo de ''movimento virtual''; a parte interrogada do corpo sai do
anonimato, anuncia-se por uma tensão particular e como uma certa potência
de ação no quadro do dispositivo anatômico. (MERLEAU-PONTY, 1999, p.
156-157).
Neste momento em que o “corpo sai do anonimato” é possível perceber o papel da
fundamental da percepção para construção das potências de uma ação qualquer que executa
uma tensão particular na anatomia do sujeito. O ver e o tocar, por exemplo, provém
necessariamente de uma relação com o mundo. No qual, mostrar é objetivável, entretanto é
construído pelo espaço dinâmico m que circunscrevem as realizações do corpo em suas
experiências. Portanto, antes da ideia de nariz, há a experiência pré-objetiva de reconhecer o
nariz.
No sujeito normal, o corpo não é mobilizável apenas pelas situações reais que
o atraem a si, ele pode desviar-se do mundo, aplicar sua atividade nos
estímulos que se inscrevem em suas superfícies sensoriais, prestar-se a
experiências e, mais geralmente, situar-se no virtual. É por estar encerrado no
atual que o tocar patológico precisa de movimentos próprios para localizar os
estímulos, e é ainda pela mesma razão que o doente substitui o
reconhecimento e a percepção táteis pela decifração laboriosa dos estímulos e
pela dedução dos objetos. (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 157).
Merleau-Ponty quer dizer acima é que, o corpo normal aplica suas atividades nos
estímulos prestando serviço a experiência. Isto é o que ele chama de corpo atual, onde as
experiências são constituídas pela pré-objetividade das ações do sujeito. Ele defende tal ponto
de vista, com o objetivo de mostrar que o corpo não pode ser tratado com um objeto a ser
estudado pela ciência. Correndo o risco de ser confundido com outras complexidades de corpos
que estão no mundo, como no caso da física. Além disso, para ele parece que o corpo no mundo
como objeto é simplesmente uma representação. Entretanto, só é possível falar do corpo como
uma representação quando comparado ele dentro de um universo, como as ideias de espaço ou
de tempo.
Para que uma chave, por exemplo, apareça como chave em minha experiência
tátil, é necessário um tipo de amplitude do tocar, um campo tátil em que as
impressões locais possam integrar-se em uma configuração, assim como as
notas são apenas os pontos de passagem da melodia; e a mesma viscosidade
dos dados táteis que sujeita o corpo a situações efetivas reduz o objeto a uma
soma de "caracteres" sucessivos, a percepção a uma caracterização abstrata, o
reconhecimento a uma síntese racional, a uma conjectura provável, e retira do
objeto sua presença carnal e sua facticidade. (MERLEAU-PONTY, 1999, p.
157).
O corpo é tomado como sujeito da percepção, pois e ele é o veículo do ser no mundo,
onde o sujeito está alinhado a outros seres vivos, ou seja, que através de suas específicas
complexidades de formas de corpos, os utilizam como um veículo da experiência, em um
mesmo meio definido. O cogitatio de Descartes está no mundo fenomênico para Merleau-Ponty
no sujeito corporificado. Esta de corpo de Merleau-Ponty serve a crítica que objetificação do
corpo. E que é necessário mostrar é que antes da ideia consciente de corpo há a intencionalidade
do corpo que percebe e se comunica.
Só falo de meu corpo em ideia, do universo em ideia, de ideia do espaço e da
ideia de tempo. Forma-se assim um pensamento objetivo (no sentido de
Kierkegaard) – o do senso comum, o da ciência – que finalmente nos faz
perder o contato com a experiência perceptiva da qual todavia ele é o resultado
e a consequência natural. (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 109).
A filosofia de Merleau-Ponty é influenciada pela fenomenologia Husserl, no qual não
acredita que seja possível uma fenomenologia fundada em uma consciência de fatos. Mas em
una ciência eidética, em outras palavras a ciência das essências. Nela procura estabelecer o
conhecimento acerca das essências e não dos fatos. Desse modo, todos os atos conscientes como
reflexão ao que se apresenta a consciência, isto é, “consciência intencional”, o que dá sentido a
todos os atos da consciência. Husserl também a chama como “essência imanente”, onde a
constituição das essências dos fenômenos como são em si mesmas, são em significado. Nessa
fenomenologia não é uma doutrina das essências dos fenômenos, mas a redução transcendental
desses fenômenos. Acompanhe seu pensamento:
A Fenomenologia pura ou transcendental não será fundada como consciência
de fatos, mas como ciência de essências como consciência de essências (como
ciência “eidética”); como uma ciência que pretende estabelecer
exclusivamente conhecimentos de essência e de modo alguns “fatos’. [...]
Nossa fenomenologia não deve ser uma doutrina das essências de fenômenos
reais, mas de fenômenos transcendentalmente reduzidos (HUSSERL, 2006, p.
28).
Está presente, também, a filosofia de Heidegger, onde foge da ideia de “consciência
intencional” e “essência imanente”. No lugar, ele afirma que o fenômeno é de origem ontológica
do ser a partir do Dasein. O objetivo de Heidegger é poder se perguntar “o que é o ser?”, porque
para ele muitas coisas são entes em muitos sentidos possíveis – fala, entendimento,
comportamento, até como se é e como se pode ser. Este ente que é possível questionar é o que
Heidegger define como a “presença” ou Dasein, ou seja, ela é o ponto de partida que auxilia
para chegar na noção pré-conceitual.
Chamamos de ente muitas coisas e em sentidos diversos. Ente de tudo que
falamos, tudo que entendemos, com que nos comportamos dessa ou daquela
maneira, ente, é também o que e como nós somos. [...] Esse ente que cada um
de nós é e, que entre outras, possui a possibilidade questionar, nós o
designamos com o tema presença. (HEIDEGGER, 2005, p. 32-33).
Merleau-Ponty é influenciado pela noção de Heidegger para a sua ideia de abertura do ser. Na
sua fenomenologia desenvolveu seu método de retorno as coisas mesmas para compreender o
mundo pré-reflexivo, ou seja, ele buscava encontrar o mundo originário de todos os entes,
tendendo pensar como é que é o mundo antes da crença. Merleau-Ponty critica o método
cartesiano que separou o corpo e a alma, por uma análise existencial. Ele acredita que este
método perde a motricidade originária do corpo, acaba mecanizado o corpo humano, com o seu
método é possível uma reparação metódica para a ideia do corpo próprio.
Uma teoria mista do membro fantasma, que admitiria as duas séries de
condições15, pode ser válida então enquanto enunciado de fatos conhecidos:
mas ela é fundamentalmente obscura. O membro fantasma não é o simples
efeito de uma causalidade objetiva nem uma cogitatio a mais. Ele só poderia
ser uma mistura dos dois se encontrássemos o meio de articular um ao outro
o "psíquico" e o "fisiológico", o "para si" e o "em si" e de preparar entre eles
um encontro, se os processos em terceira pessoa e os atos pessoais pudessem
ser integrados em um meio que lhes fosse comum. (MERLEAU-PONTY,
1999, p. 116).
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA