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Leandro Carvalho de Almeida Gouveia e Josevaldo da Silva do Lago

(Organizadores).

Adsson José Rodrigues Luz


Alexandra Quadro Siqueira
David Estevão dos Santos Júnior
Décio Leite Miranda Júnior
Flávio Alves Oliveira
Jerisnaldo Matos Lopes
José Cláudio Rocha
Leandro Carvalho de Almeida Gouveia
Luiz Carlos dos Santos
Luiz Carlos Rocha
Márcio Santos Sampaio
Naira Souza Moura
Nágila Barros Santos
Odacyr Roberth Moura da Silva
Rafael Messias Teixeira
Samuel Correa Duarte
Sarah Katherine de Oliveira Silva
Silvia Almeida Lima
Stéfanny Karinny Souza França
Temístocles Damasceno Silva
Vinícus Jesus Souza

SABERES MULTIDISCIPLINARES

Vol. 7

Salvador – Bahia

2015.
Leandro Carvalho de Almeida Gouveia e Josevaldo da Silva do Lago (Organizadores)

SABERES MULTIDISCIPLINARES

Vol. 7

Salvador – Bahia
2015
Leandro Carvalho de Almeida Gouveia e Josevaldo da Silva do Lago (Organizadores).

Adsson José Rodrigues Luz


Alexandra Quadro Siqueira
David Estevão dos Santos Júnior
Décio Leite Miranda Júnior
Flávio Alves Oliveira
Jerisnaldo Matos Lopes
José Cláudio Rocha
Leandro Carvalho de Almeida Gouveia
Luiz Carlos dos Santos
Luiz Carlos Rocha
Márcio Santos Sampaio
Naira Souza Moura
Nágila Barros Santos
Odacyr Roberth Moura da Silva
Rafael Messias Teixeira
Samuel Correa Duarte
Sarah Katherine de Oliveira Silva
Silvia Almeida Lima
Stéfanny Karinny Souza França
Temístocles Damasceno Silva
Vinícus Jesus Souza

SABERES MULTIDISCIPLINARES

Vol. 7

Salvador – Bahia
2015.
Todos os direitos autorais deste material são de propriedade dos autores Qualquer parte
desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. O conteúdo de cada
artigo é de inteira responsabilidade do(s) autor(es).
Livro aprovado pelo Conselho Editorial da Revista Acadêmico Mundo (ISSN 2318-
1494).

Revisão de Originais e Revisão de Provas


Leandro Carvalho de Almeida Gouveia

Capa
Josevaldo da Silva do Lago (Revista Acadêmico Mundo)

Editoração Eletrônica
Josevaldo da Silva do Lago
(site. http://www.academicomundo.com.br/revista.html)

Impressão e Acabamentos
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP).
Catalogação na Fonte

GOUVEIA, Leandro Carvalho de Almeida. LAGO, Josevaldo da Silva do.

G719 Saberes multidisciplinares V.7/Leandro Carvalho de Almeida Gouveia; Josevaldo da Silva do

Lago (Org). Salvador: JM Gráfica, 2015.

200p.

1.Educação 2. Ciência 3. Tecnologia 4. Inovação 5. Direito 6. Reprovação Escolar

7. Trabalho Escravo 8. Geografia I. Leandro Carvalho de Almeida Gouveia II. Josevaldo da Silva do
Lago.

III. Título

CDD: 370.242

ISBN 978-85-60753-98-7

JM GÁFICA E EDITORA LTDA. CNPJ: 00.149.796/0001-49


Rua Vital Rego, 13, Barbalho, Salvador, Bahia, CEP 40301-090
e-mail: contato@jmgrafica.com.br

Rua Vital Rego, 13, Barbalho, Salvador, Bahia, CEP 40301-090


e-mail: contato@jmgrafica.com.br
Brasil em novembro de 2015 pela JM Editora
CNPJ: 00.149.796/0001-49
e-mail: contato@jmgrafica.com.br
Tiragem: exemplares.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 06

RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NO GRAU SUPERIOR: A DISCUSSÃO DIDÁTICO-


PEDAGÓGICA
Luiz Carlos dos Santos 09

A IMPORTÂNCIA DO IMPAIRMENT TEST PARA A EVIDENCIAÇÃO DA


REALIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA DAS ORGANIZAÇÕES: UM ESTUDO DOS
INDICADORES DE DESEMPENHO DA PETROBRAS NO QUADRIÊNIO 2011-2014
Márcio Santos Sampaio
Naira Souza Moura
Vinícius Jesus Souza
16

PROBLEMATIZANDO A REPROVAÇÃO ESCOLAR NA MUDANÇA DE CICLOS E


OS FATORES EMOCIONAIS ASSOCIADOS
Odacyr Roberth Moura da Silva 30

DE ESTUDANTE A EGRESSO: UMA ITINERÂNCIA A (PER)CORRER


Alexandra Quadro Siqueira
David Estevão dos Santos Júnior 47

REFLEXÕES TEÓRICOS DA RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL


Jerisnaldo Matos Lopes 67

TERRITÓRIO GEOGRÁFICO E TURISMO


Leandro Carvalho de Almeida Gouveia 81

A EMENDA CONSTITUCIONAL N˚ 81/2014: UM IMPORTANTE INSTRUMENTO


PARA A ERRADICAÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL
Adsson José Rodrigues Luz
Samuel CorreaDuarte
StéfannyKarinny Souza França 91

A INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NO TEMPO DE LAZER


Nágila Barros Santos
Sarah Katherine de Oliveira Silva
Rafael Messias Teixeira
Flávio Alves Oliveira
Temístocles Damasceno Silva
Silvia Almeida Lima 106

SERÁ QUE AS TÉCNICAS DE ENSINO AJUDAM NO APRENDIZADO DA


MATEMÁTICA EM SALA DE AULA?
Décio Leite Miranda Júnior
Alexandra Quadro Siqueira
Leandro Carvalho de Almeida Gouveia 119

ESPAÇO GEOGRAFICO
Leandro Carvalho de Almeida Gouveia 129
CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NOVOS RUMOS PARA O
DIREITO NO BRASIL
José Cláudio Rocha
Luiz Carlos Rocha 136
6

APRESENTAÇÃO

O Volume VII da Coletânea Saberes Multidisciplinares apresenta trabalhos de 11


pesquisadores, em diferentes áreas do conhecimento, fruto de pesquisas relevantes para o
mundo acadêmico e toda a sociedade.
Luiz Carlos no seu artigo de revisão, apoiando em pesquisas bibliográfica,
documental e eletrônica, portanto, de natureza exploratória, retoma a antiga discussão
sobre a relação professor-aluno, daqueles que estão atuando no labor do magistério
superior, mas sem o domínio de aspectos teórico-epistemológico e didático-pedagógico,
imprescindíveis na docência no grau superior. Ante a vasta literatura na área, entende-se
que a falta da formação pedagógica dos profissionais técnicos pode influir na qualidade
do ensino e, consequentemente, na excelência acadêmica. Enquanto solução para a
problemática em foco, as Instituições de Educação Superior (IES) devem implantar e
implementar uma efetiva Política de Formação Pedagógica Continuada nos Projetos
Pedagógicos Institucionais (PPI) e nos Projetos Pedagógicos de Cursos (PPC).
Já Márcio Sampaio, Naira Moura e Vinícius Souza abordam um fato importante
para o processo de convergência às normas internacionais de Contabilidade, a realização
do Impairment test, procedimento adotado para verificar uma possível redução do valor
recuperável dos ativos evidenciados pelas organizações e que foi institucionalizado no
Brasil pela Lei 11.638/07 e pelo CPC 01. O objetivo deste trabalho consistiu justamente
em verificar a importância do Impairment test para qualidade da informação produzida
pela Contabilidade e apresentação da realidade econômico-financeira das organizações.
Odacyr Silva, discute as altas taxas de fracasso escolar nas escolas públicas
brasileiras, especialmente nas primeiras séries do ensino fundamental, problematizando
esta questão a nível individual, familiar e social. O problema norteador deste estudo
baseia-se nos seguintes termos: Quais efeitos emocionais acometem os alunos que vivem
a transição do primeiro para o segundo ciclo do ensino fundamental nas escolas públicas?
O autor não pretende responder a esta questão, mas situá-la histórica e socialmente e
problematizá-la, instigando a realização de futuras investigações. Pretende-se fornecer
subsídios para o avanço de discussões teóricas tanto das disciplinas científicas quanto das
práticas profissionais que, atuando de forma interdisciplinar, elaboram saberes acerca do
fracasso escolar em decorrência da mudança de ciclo.
Alexandra Quadro e David Estevão no artigo propõe uma investigação que busca
estudar possibilidades para, num estágio mais avançado da pesquisa, criar uma
metodologia de análise de inserção de egressos no mundo do trabalho, a fim de contribuir
para a avaliação das políticas públicas educacionais implementadas pelo Instituto Federal
de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia - IFBA, a partir do estudo de caso do curso
de Administração. A análise de inserção de egressos, tema de suma importância em
instituições de ensino, também se justifica devido à necessidade de acompanhamento e
desenvolvimento continuado do ex-aluno, de maneira a avaliar as condições de trabalho,
a sua renda e o impacto que a vivência educacional causou em sua vida. A abordagem
metodológica, por ora, será a quali-quantitativa, valendo-se a princípio de revisão de
literatura e, a posteriori, de pesquisa empírica com o uso de técnicas, tais quais a aplicação
7

de questionários e de dinâmicas com grupos focais com egressos formados entre os anos
de 2010 à 2015 do curso de Administração.
Jerisnaldo Lopes, discute o novo cenário econômico mundial trouxe mudanças
expressivas para o comportamento humano. A complexidade dos valores associados ao
consumismo impulsiona as empresas que querem “manter sua porção” e ampliar o seu
negócio a discutir e pensar sobre a responsabilidade social. Desde o ano de 2000, o perfil
dos consumidores vem mudando, conforme a informação vai se disseminando. Devemos
isso à internet e aos meios de comunicação de massa. A educação tem um papel essencial
nessa nova transformação. Aquele modelo de empresa que possui a doutrina da pós-
revolução industrial – embora permaneça até hoje, em que as empresas ambicionam muito
mais vantagens do que obrigações – está fadado ao fracasso. Lógico que isso demanda
tempo, investimento e posturas dos empresários, diante desse novo perfil de um
consumidor mais consciente e exigente. Quando nos remetemos à história e seus
filósofos, percebemos que há alguns equívocos em relação ao capital e à mão de obra.
Leandro Gouveia pretende refletir acerca do Território Geográfico Turístico e
Estado e do Território. A abordagem econômica e ambiental tem como base a ideia de
que o turismo tenha um desenvolvimento de uma maneira muito semelhante aos padrões
históricos e da dependência econômica. Por meio dessa visão, a indústria é tão fortemente
governada por determinantes políticos e econômicos que pouca atenção é direcionada aos
outros aspectos.
Adsson Luz, Samuel Duarte e Stéfanny França, abordam o resultado de análises
bibliográficas e quantitativas, a partir da análise de estatísticas produzidas pela Comissão
Pastoral da Terra (CPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e tem como
objetivo a análise de questões relativas trabalho escravo no campo, com ênfase para a
análise das politicas publicas de enfrentamento ao trabalho escravo no Brasil, com ênfase
á análise dos efeitos da Emenda Constitucional N˚81/2014, apelidada de “P.E.C DO
TRABALHO ESCRAVO” e sua relação com as Leis Penais e processuais Penais
Brasileiras.
Os autores Temistocles Damasceno, Nágila Santos, Sarah Katherine Silva, Rafael
Teixeira, Flávio Oliveira, Silvia Lima buscam descrever por meio de uma revisão de
literatura a influência da religião no tempo de lazer de seus seguidores através da
categorização das ações da igreja frente aos conteúdos culturais do lazer, em especial ao
físico-desportivo, artístico e turístico.
Décio Miranda, Alexandra Quadro e Leandro Gouveia, discutem as dificuldades
entre saber o conteúdo de determinadas disciplinas e, adequar à maneira de transmitir
essas informações, fixa um longo caminho de pensamentos estruturais e estratégicos. A
classe educadora que analisa as técnicas e prepara estratégias para envolver a parte
receptora do conhecimento, sem dúvida alguma precisa de estímulos, nos quais,
influenciará diretamente na construção dessas personalidades. O objetivo desse estudo é
avaliar, demonstrar e escolher uma das possibilidades de ensino, analisando métodos que
já deram certo em escolas fora do perímetro brasileiro.
Leandro Gouveia tem como desejo realizar uma releitura a partir de diversos
autores de diversas correntes e escolas do pensamento geográfico. A Geografia enfrenta
problemas epistemológicos e conceituais. É o caso da definição do seu objeto de estudo:
8

o espaço geográfico. Apesar dos avanços das últimas décadas, ainda há discordâncias
teóricas a esse respeito. Assim, esse artigo tem por objetivo comentar alguns esforços de
definição do conceito de espaço geográfico e ao final propomos o nosso próprio conceito.
Entendemos que o espaço geográfico é o resultado contínuo das relações sócio-espaciais
e tais relações são econômicas, políticas e simbólico-culturais.
José Cláudio no seu artigo defende a ideia de que as novas tecnologia de
comunicação e informação estão mudando o comportamento da sociedade
contemporânea em direção a sociedade do conhecimento. Essas mudanças estão
ocorrendo em todas as áreas de conhecimento humano, não sendo diferente com o direito
que está em processo de mudança para facilitar a pesquisa e a inovação no país. Descreve
as principais mudanças legislativas e aponta a necessidade de adequação do sistema
jurídico nacional e dos estados ao novo regulamento jurídico. Opina pelo surgimento de
um novo ramo do direito: o direito a ciência, tecnologia e inovação, com o objetivo de
popularizar a ciência, criar uma cultura empreendedora e inovadora no país, fortalecer a
produtividade e desenvolvimento nacional.
9

RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO NO GRAU SUPERIOR: A


DISCUSSÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA
Luiz Carlos dos Santos1

Quanto mais analisarmos as relações educador-educandos [...] em qualquer de seus


níveis, parece que mais nos podemos convencer de que estas relações apresentam
um caráter especial e marcante. Nesta relação, o educador aparece como seu
indiscutível agente, como seu real sujeito, cuja tarefa indeclinável é “encher” os
educandos dos conteúdos de sua narração.
(FREIRE, 2005, p. 65)

RESUMO

Este artigo de revisão, apoiando em pesquisas bibliográfica, documental e eletrônica,


portanto, de natureza exploratória, retoma a antiga discussão sobre a relação professor-aluno,
daqueles que estão atuando no labor do magistério superior, mas sem o domínio de aspectos
teórico-epistemológico e didático-pedagógico, imprescindíveis na docência no grau superior.
Ante a vasta literatura na área, entende-se que a falta da formação pedagógica dos
profissionais técnicos pode influir na qualidade do ensino e, consequentemente, na excelência
acadêmica. Enquanto solução para a problemática em foco, as Instituições de Educação
Superior (IES) devem implantar e implementar uma efetiva Política de Formação Pedagógica
Continuada nos Projetos Pedagógicos Institucionais (PPI) e nos Projetos Pedagógicos de
Cursos (PPC).

Palavras-chave: Relação Professor-Aluno. Ensino Superior. Domínio de Conteúdo


Específico. Formação Pedagógica.

ABSTRACT

This review article, relying on bibliographical, documentary and electronic research therefore
exploratory, takes up the old discussion about the teacher-student relationship, those who are
working in university teaching of labor, but without the domain of theoretical and
epistemological aspects and didactic-pedagogic, essential in teaching in higher degree. Faced
with the vast literature in the area, it is understood that the lack of pedagogical training of
technical professionals can influence the quality of teaching and, consequently, on academic
excellence. While solution to the problem in focus, the Higher Education Institutions (HEIs)
should establish and implement an effective policy for Continuing Teacher Training in
Pedagogical Projects Institutional (PPI) and courses of Pedagogical Projects (PPP).

Keywords: Student-Teacher Relationship. Higher education. Specific content area. Teacher


Training.

1
Professor da Universidade do Estado da Bahia; Mestre em Educação; Doutor em Ciências
Empresariais; Doutor em Desenvolvimento Regional e Urbano. www.lcsantos.pro.br /
lcsantos@superig.com.br.
10

1. INTRODUÇÃO

Neste artigo de revisão, retoma-se a uma das questões que muito têm causado
polêmicas no campo do ensino superior: a relação professor-aluno. Isso por conta de que
muitos estão na condição de professor sem ter a formação didático-pedagógica.
São profissionais de várias áreas - médico, odontólogo, engenheiro, arquiteto,
advogado, administrador, contador, economista etc.
Cabe, de pronto, registrar que a culpa não é deles. Afinal, a legislação vigente não
exige que estes profissionais de áreas eminentemente técnicas, possuam formação para o
magistério superior - basta o certificado de especialista para ingressar na docência superior,
principalmente nas Instituições privadas. O fato é que há uma premente necessidade de
capacitação didático-pedagógica daqueles profissionais técnicos, mas que estão atuando
enquanto professor.
Numa demonstração de inconformismo com essa realidade, Demo (2004, p. 12)
enfatiza que
Os alunos não comparecem para participar do processo de reconstrução do
conhecimento, mas literalmente escutar aulas, tomar nota, memorizar e regurgitar
nas provas. Em entidades privadas a pressão é ainda maior: muitos alunos dizem na
cara do professor que é pago para dar aula e que o aluno quer aula e ser aprovado.
Precisamos entender urgentemente o quanto isto é procedimento imbecilizante, fútil
e inútil. Não se trata de acabar com a aula, mas de colocá-la no seu lugar; é didática
auxiliar, supletiva, da ordem de informação e motivação. Aula não implica
necessariamente aprendizagem [...] confundiu-se, totalmente, aula com
aprendizagem.

Nos relatórios de auto avaliação, exigência legal, uma das reclamações quase que
constante é a falta do domínio didático-pedagógico dos professores. Portanto, as Instituições
de Educação Superior (Faculdades, Centros Universitários e Universidades) precisam
repensar a sua missão quanto à formação de seus alunos. Necessitam repensar de que forma
está se dando a relação professor-aluno no interior da sala de aula. E quão é importante se
refletir sobre essa relação. A propósito, assevera Rangel (2005, p. 85):

[...] quanto melhor, mais clara, mais “didática”, mais explícita, mais
objetiva e mais orientadora for a comunicação, mais efetiva será a
metodologia, ou seja, existe uma relação direta entre qualidade da
comunicação e resultado do processo metodológico.

Ressalte-se que a produção do conhecimento, sendo uma das finalidades das


Instituições de Educação Superior (IES), é dinamizada por meio do processo de ensino-
11

aprendizagem que, como tal, se realiza em situação social, pois tanto a informação e o
conhecimento são construídos socialmente, como os processos metodológicos são
estabelecidos na relação dialógica entre os sujeitos envolventes do conhecimento: o professor
e o aluno.
Na contemporaneidade, a educação valoriza-se três tipos de saber: o saber dizer
relacionado à aprendizagem de conceitos, informações; o saber fazer relacionado à
aprendizagem de procedimentos; e o saber conviver relacionado à aprendizagem de valores,
normas e atitudes. Esta última aprendizagem tem sua relevância, tendo em vista a função do
desafio que é o de se conviver com as diferenças na sociedade.
No seio acadêmico, saber conviver é querer incluir e incluir-se na relação professor-
aluno, na relação professor-coordenador, na relação coordenador-alunos e na relação alunos-
alunos e entre esses sujeitos e a sociedade. É poder conviver com o jogo das diferenças
expressas na lógica da inclusão. O professor no grau superior tem uma proposta pedagógica,
os alunos têm outra, o coordenador pensa de outro modo ainda, e acima de todas essas
“confluências” existe a proposta pedagógica do ensino superior da instituição em que atuam
esses sujeitos. E aí? Como encontrar um denominador comum que expresse a missão desta
instituição? Como encontrar razão comum em tempos em que as pessoas têm direitos de
expressar seus pontos de vistas, seus pensamentos, seus interesses?
Portanto, há um desafio que demanda uma série de sentimentos, valores, atitudes e
habilidades. O professor nesta perspectiva deve se valer da tridimensionalidade da didática:
ter um domínio técnico da sua área de conhecimento; valorizar as características humanas de
sua prática; e, o processo de comunicação com qualidade. Já dizia Paulo Freire (2005, p. 96)
“sem diálogo não há comunicação e sem esta não há verdadeira educação”.
Na relação professor-aluno na educação superior as possibilidades da comunicação na
dinamização da sala de aula das IES e de como esse processo atinge diretamente as opções
metodológicas do professor devem ser objeto de estudo de forma continuada, já que nem
todas as áreas do conhecimento existem as licenciaturas. Também não se cogita forçar um
bacharel a fazer uma licenciatura. Aliás, repita-se inexiste este tipo de formação em todas as
áreas.
O que se deseja é que cada IES tenha no seu Projeto Pedagógico Institucional (PDI),
uma política efetiva de formação pedagógica para os docentes que atuam nos diversos cursos,
principalmente aqueles que não possuem a titulação de professor (licenciatura). E a referida
política, pode ser materializada sob várias formas, a exemplo de: Semana Semestral
12

Pedagógica; Palestras de expoentes na docência superior; cursos de curta duração, porém de


maneira continuada; curso de especialização em docência superior, dentre outras.
Cabe ressaltar que nem sempre os professores com titulação de mestre têm o domínio
didático-pedagógico, na medida em que os programas de pós-graduação stricto sensu em
nível de mestrado, no país, não incluem, na sua maioria, conteúdos voltados para o
planejamento e avaliação de curso, unidade e aula, bem assim técnicas apropriadas para as
diversas temáticas constantes dos ementários constantes no Projeto Pedagógico do Curso
(PPC); falta base relacionada à psicologia da aprendizagem, dentre outros aspectos.
Portanto, nem sempre ter domínio de conteúdo em determinada área significa estar
qualificado para o labor do magistério.

2. COMUNICAÇÃO, DOCÊNCIA SUPERIOR E PROCESSO METODOLÓGICO

Saliente-se que na educação superior, como também na educação básica, a


dinamização essencial e o essencial da dinamização da sala de aula estão intrinsecamente
dirigidas, na relação insubstituível, entre pessoas que se comunicam e comunicam o
conhecimento. Assim, para que o processo de ensino e aprendizagem aconteça, o fator
comunicação prescinde de fatores metodológicos - assumir-se enquanto um ser político
inserido no cenário de contradições sociais em que é permeada a sociedade vigente.
Cabe ao professor universitário a coordenação do processo ensino-aprendizagem. Ele
deve assumir-se no papel de sujeito histórico de transformação da realidade universitária,
articulando à realidade social mais ampla. Nunca é demais relembrar que este ser professor
não está pronto, mas em permanente construção. Como já alertava o filósofo Sócrates, um dos
grandes inimigos da verdade é arrogância daqueles que não reconhecem sua necessidade de
saber mais.
Nesse terreno das diferenças, no locus universitário tem-se: alunos com seus saberes e
experiências e os professores que, além dos saberes da própria experiência de vida, tem
também (ou deveria ter), o domínio do saber organizado e sistematizado, sob a forma
acadêmica e em virtude dela, na cultura e nas ciências. Desta forma, de acordo com Marques
(1995) confrontam-se, assim, em relação criadora, os saberes dos professores com a situação
problematizadora dos alunos, uma força ativa interrogante.
13

3. O DOCENTE COM O ALUNO E O ALUNO COM O DOCENTE

Acredita-se que essa é a principal necessidade que a relação professor-aluno deve ter,
ou seja, o professor não deve trabalhar para o aluno e nem o aluno abdicar dessa relação
inevitável é o “com”, isto é, o professor trabalha com os alunos e estes trabalham com o
professor.
Em outras palavras, o professor deve ver o aluno como um sujeito de aprendizagens,
pois o processo de ensino começa quando o professor aprende com o aluno, quando este
mesmo professor valoriza na sua prática de sala de aula aquilo no qual o aluno aprendeu, cuja
aprendizagem é permeada de interesses, experiência de vida e de posturas comportamentais,
ideológicas e características pessoais que necessitam ser conhecidas, respeitadas e
valorizadas.
Se estabelecer na docência superior é buscar uma permanente autorreflexão da sua
práxis pedagógica. Frise-se que a docência competente somente configura-se na prática
persistentemente inquirida pela reflexão pessoal e pelo discurso argumentativo na
comunidade da profissão de maneira a tornar-se práxis da vida. A ideia é que o professor na
lide universitária perceba que essa práxis somente se legitima se nela transversar o princípio
da pesquisa, ou seja, perceber a ligação profunda entre o saber pensar e a cidadania. “A glória
do professor é o aluno que sabe pensar para melhor intervir”. (DEMO, 2004, p. 13).
Enfatize-se que a compreensão da docência e a necessidade de uma práxis pedagógica
somente terão legitimidade se fizer referência e articulação à aprendizagem dos alunos, por
isso que na relação professor-aluno é evidenciado muito mais o processo de aprendizagem dos
sujeitos cognoscentes (educador-educandos), transformando essa formação em expectativas
com aprender a conviver com outros. Tais habilidades que ultrapassam as exigências do
mercado de trabalho.
Um outro ponto para que haja produção de conhecimento entre esses sujeitos
cognoscentes está ligado na variável dialogicidade, ou seja, o professor não ensina senão na
medida em que os alunos aprendem. Não há docência sem discência, as duas se explicam e
seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem â condição de objeto, um
do outro. (FREIRE, 2002). Corroborando nessa discussão, Marques (1995, p. 39) entende que
“[...] não há de fato, docência, ela não é cumprida, sem a efetiva aprendizagem por parte dos
alunos; mais ainda, sem que por meio dela também o professor aprenda na relação dialogal
com o outro [...]”.
14

Então, quem ensina, prende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender, porém isto
só terá valor prático se o sujeito professor interiorizar um valor necessário à sua profissão: a
paixão pela educação do homem. Ver no aluno um sujeito em potencial, com capacidades de
transformar sua realidade social.
Assente-se que o docente universitário tem o talento de transformar os saberes dos
alunos em saberes ressignificados, pois segundo Fazenda (1994, p. 67) “[...] se estamos ou
queremos viver hoje na educação um momento de alteridade (como construção/produção de
conhecimento) é fundamental que o professor seja mestre, ou seja, aquele que sabe aprender
com os mais novos [...]”. O professor nunca sabe o que vai encontrar na sala de aula. Ele terá
um papel fundamental na relação com o aluno para poder desenvolver uma educação que
deseja problematizadora e libertadora. E na melhor nas suas opções metodológicas, o
professor deve sempre lembrar que está formando pessoas para o mercado de trabalho e para
o mundo em permanente processo de transformação social, econômica, política e cultural.
Pergunta-se, então, um profissional que está professor, oriundo de uma área técnica, sem o
conhecimento teórico-epistemológico e didático-pedagógico que lastreia a pedagogia, pode
agregar valor à qualidade do ensino e, por consequência, contribuir para a excelência
acadêmica de uma IES?

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como visto, a efetiva relação professor-aluno vai muito mais que o domínio do
instrumental didático-pedagógico (este, muitos não têm) porque são técnicos (profissionais de
várias áreas do conhecimento) - dominam o conteúdo específico, mais desconhecem as
diversas técnicas de ensino, a didática, a psicologia da aprendizagem, a questão da avaliação
nas suas diferentes acepções. Além disso, devem gestar cidadãos capazes de mudar a
sociedade em nome do bem comum, com qualidade formal, política e ética.
Ante o exposto, para o professor, nesse processo de construção de conhecimento e a
busca pela autonomia, é apontado duas rédeas estratégicas para a vida dos alunos: dar aulas e
formar profissionais para uma sociedade conservadora, burocrática e eficientista; ou formar
pessoas com habilidades para reconstruir conhecimentos com autonomia, em nome da e para
autonomia.
15

REFERÊNCIAS

DEMO, Pedro. Universidade, aprendizagem e avaliação: horizontes reconstrutivos. Porto


Alegre: Mediação, 2004.

FAZENDA, I. C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. 11. ed. Campinas, SP:


Papirus, 1994.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 24 ed.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

_________. Pedagogia do Oprimido. 41. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

MARQUES, M. O. Escola, aprendizagem e docência: imaginário social e intencionalidade


política. In: VEIGA, I. A. Projeto Político Pedagógico da Escola: uma construção possível.
SP: Papirus, 1995.

RANGEL, M. Métodos de ensino para a aprendizagem e a dinamização das aulas.


Campinas, SP: Papirus, 2005.

SANTOS, Luiz Carlos dos. Tópicos sobre educação [...]. Salvador: Quarteto, 2007.
16

A IMPORTÂNCIA DO IMPAIRMENT TEST PARA A EVIDENCIAÇÃO


DA REALIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA DAS ORGANIZAÇÕES:
UM ESTUDO DOS INDICADORES DE DESEMPENHO DA
PETROBRAS NO QUADRIÊNIO 2011-2014

Márcio Santos Sampaio1


Naira Souza Moura2
Vinícius Jesus Souza3

RESUMO

Em uma situação de convergência às normas internacionais de Contabilidade, é importante


analisar a contribuição de elementos que estão inseridos nesse processo para as práticas
Contábeis adotadas no país. O Impairment test é um procedimento adotado para verificar uma
possível redução do valor recuperável de ativos e foi institucionalizado no Brasil pela Lei
11.638/07 e pelo CPC 01. O objetivo deste trabalho consistiu justamente em verificar a
importância do Impairment test para qualidade da informação produzida pela Contabilidade e
apresentação da realidade econômico-financeira das organizações. Para isso, foram analisados
os balanços patrimoniais e as demonstrações do resultado, ambos consolidados, além das
notas explicativas da Petrobras nos últimos 04 anos e identificadas as variações percentuais do
ativo total, patrimônio líquido, resultado do exercício e dos índices de endividamento geral e
margem líquida após a retirada do efeito da perda reconhecida por Impairment. Observou-se
que após essa retirada ocorreram variações relevantes, principalmente no exercício de 2014,
quando a empresa divulgou um montante alto em perda. Pode-se afirmar que isso sugere
deficiências na gestão e planejamento da companhia, tendo em vista que grandes reduções do
valor recuperável dos ativos podem simbolizar falhas no processo de tomada de decisão.
Notou-se, também, que o teste proporciona uma melhora a nível informacional das
demonstrações, pois traz maior confiabilidade sobre a mensuração dos ativos que estão
evidenciados, o que confirma a hipótese de que o Impairment test contribui para evidenciação
da realidade econômico-financeira das organizações. Identificou-se, também, que em virtude
do reconhecimento da perda por desvalorização ou da sua reversão, a organização poderá
alterar o seu planejamento e executar novas ações durante a sua gestão. Sob esta perspectiva,
estudos posteriores poderiam verificar em que proporção as informações divulgadas sobre o
Impairment podem alterar o curso das ações da empresa no que diz respeito à estruturação do
ativo e estabelecer resultados que dialoguem com os apresentados por este trabalho e
estabeleçam novos aspectos que agreguem à análise já realizada.

Palavras-chave: Impairment test; Petrobras; Informação contábil; econômico-financeira.

1Graduação em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB, pós-graduado


em Metodologia do Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação pela Universidade do Estado da
Bahia - UNEB. Mestre em Contabilidade pela Universidade Federal da Bahia – UFBA.

22Graduação em Ciências Contábeis pela Fundação Visconde de Cairu (1990), mestranda em


Desenvolvimento Regional e Urbano pela Universidade do Salvador - Unifacs

3 Graduando em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado da Bahia - UNEB


17

1. INTRODUÇÃO

A Contabilidade é uma Ciência que se destina a estudar o patrimônio no seu sentido


mais amplo, produzindo informações que são de fundamental importância para a gestão
organizacional. As informações produzidas pela Contabilidade, através das suas
demonstrações e relatórios, podem ser utilizadas para diversas finalidades, todas elas
envolvendo um processo de tomada de decisão a ser realizado. Isso implica afirmar que para a
continuidade ou descontinuidade de um negócio, para a realização ou não de um investimento
e para outras diversas ações, os agentes envolvidos no processo recorrem à Contabilidade para
avaliar a viabilidade da decisão que estão prestes a tomar.
Em razão de circunstâncias históricas, como a própria globalização da economia, as
relações empresariais elevaram o seu grau de complexidade, exigindo do profissional
Contábil informações cada vez mais íntegras e uma linguagem mais uniforme que pudesse ser
compreendida em diversos locais do mundo.
Sob esta perspectiva e em virtude do crescimento econômico do país, do
desenvolvimento do mercado de capitais e do sistema financeiro nacional, surge para a
Contabilidade brasileira a necessidade de se adequar a normas e procedimentos
internacionais, adotando, assim, uma postura mais coerente com a utilizada pelo mundo.
Diversos fatos simbolizam esse processo de convergência no Brasil, destaque para a
criação do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) em 2005 pela resolução 1.055/05 do
Conselho Federal de Contabilidade e a promulgação das leis 11.638/07 e 11.941/09, que
promoveram alterações na lei 6.404/76.
Muitas mudanças significativas para o sistema contábil brasileiro foram realizadas
pelo processo de adoção do IFRS (International Financial Reporting Standards) - Normas
Internacionais de Contabilidade instituídas pelo IASB (International Accounting Standards
Board), comitê constituído em 1973 para estudar, elaborar e emitir normas referentes aos
padrões internacionais de Contabilidade. O IASB é composto por diversas entidades de todo o
mundo, inclusive do Brasil, representado pelo IBRACON (Instituto Brasileiro de Contadores)
e o CFC (Conselho Federal de Contabilidade). Dentre as normas institucionalizadas é
destacado, para o desenvolvimento deste trabalho, a realização do Impairment test ou teste de
recuperabilidade em determinados ativos das organizações, para avaliar uma possível redução
do respectivo valor recuperável.
Justifica-se este trabalho pela necessidade em avaliar a relevância das mudanças
trazidas pelas normas internacionais de Contabilidade para os procedimentos brasileiros,
18

através da análise de um item importante nesse contexto, o Impairment test, pois um possível
reconhecimento de redução do valor recuperável de um item do patrimônio resultará em
alterações no total do ativo, de subgrupos do ativo, do resultado do exercício, do patrimônio
líquido e em alguns índices utilizados para análise da situação econômico-financeira das
entidades. Dessa forma, considera-se a hipótese de que tal reconhecimento impacta
positivamente na retratação da real situação econômico-financeira das organizações.
Objetiva-se através deste trabalho avaliar se tais alterações são relevantes ou não, se
contribuem ou não contribuem, para a qualidade das informações produzidas pela
Contabilidade através dos seus demonstrativos, cujo objetivo é divulgar a realidade de cunho
econômico e financeiro das entidades. Para, assim, atestar a veracidade ou inveracidade da
hipótese levantada.
Para atingir o objetivo proposto será analisado o balanço patrimonial, a demonstração
do resultado e as notas explicativas da Petrobras no quadriênio 2011-2014 e serão avaliados
os devidos impactos deste reconhecimento sobre as variáveis supracitadas. Justifica-se
escolha por esta empresa nacional em virtude da evidenciação da redução ao valor
recuperável de alguns dos seus ativos nos exercícios mencionados e a divulgação, inclusive
em veículos de imprensa, de uma perda expressiva por Impairment no ano de 2014, além da
acessibilidade dos dados.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

O Impairment test nasceu nos Estados Unidos com o intuito de elevar a confiabilidade
dos relatórios financeiros através do registro fidedigno dos ativos que estão sob a posse das
organizações. O objetivo do teste, segundo Santos (2003), é verificar a possível redução ao
valor recuperável dos ativos, e caso uma irrecuperabilidade seja encontrada, a empresa deverá
reconhecer uma perda por Impairment em suas demonstrações contábeis.
Martins apud Ferrarezzi (2008) aponta que o Impairment test é um evento que possui
mais de dois séculos, no entanto, necessitava de normas que institucionalizassem a sua prática
no Brasil, que só ocorreu a partir da publicação do CPC 01 e da lei 11.638/07, que trouxe
normatização e obrigatoriedade para as sociedades de grande porte.
A necessidade da realização do teste de recuperabilidade é acentuada pelas
características do ativo e a possibilidade de perda em relação ao retorno que pode
proporcionar a entidade que o controla. Ativo, portanto, é definido por Araújo (2009) como
19

um conjunto de valores econômicos, normalmente expressos em bem e direitos, onde estão


aplicados os recursos da entidade fornecidos por proprietários ou por terceiros.
Iudícibus (2010b) destaca que uma das características do ativo é a sua possibilidade de
gerar benefícios futuros. Isso permite inferir que os mesmos deverão estar evidenciados no
balanço pelo valor de fluxos de caixa que poderão proporcionar a organização que os detêm.
O teste de recuperabilidade surge exatamente nesse contexto, para contribuir para a
integridade da informação e proporcionar maior segurança para analises e decisões.
Devido à convergência das práticas contábeis no Brasil com as normas internacionais
de Contabilidade, foi publicado o CPC 01 – Redução ao valor recuperável de ativos,
atualizado em 2010 com o objetivo de estabelecer procedimentos para que as entidades não
registrem contabilmente seus ativos por um valor que exceda o seu potencial de recuperação.
Conforme o próprio pronunciamento, CPC 01 (R1) (2010), o teste deverá ser aplicado
na verificação de possíveis perdas por desvalorização de todos os ativos, exceto os referentes
a estoques, ativos advindos de contratos de construção, ativos fiscais diferidos, ativos
advindos de planos de benefícios a empregados, ativos financeiros que sejam disciplinados
por outros pronunciamentos técnicos, propriedade para investimento que seja mensurada a
valor justo, ativos biológicos relacionados à atividade agrícola que sejam mensurados a valor
justo líquido de despesas de venda, custos de aquisição diferidos e ativos intangíveis
provenientes de direitos contratuais de companhia de seguros contidos em contratos de
seguros a alcance do CPC 11 e ativo não circulante mantido para venda em consonância com
o CPC 31.
A lei 6.404/76, através da nova redação dada pela lei 11.638/07, traz em seu corpo,
mais precisamente no Art. 183, § 3º, a orientação de que a análise sobre a recuperabilidade
deverá ser feitas sobre os ativos que compõem o imobilizado e o intangível. Iudícibus (2010a)
afirma que a mesma lei já se referia desde 1976 aos recebíveis, aos estoques, aos
investimentos e até ao extinto diferido. Dessa forma, não há disparidades entre o CPC e a lei,
como destaca o referido autor:
[...] Não há qualquer incoerência entre a lei e o CPC 01 o princípio que está
orientando esta prática é o de que nenhum ativo pode estar reconhecido no balanço
por valor que não seja recuperável, seja por meio do fluxo de caixa proporcionado
pela venda ou por meio do fluxo de caixa decorrente do seu emprego nas atividades
da entidade.

A análise sobre a recuperabilidade de um ativo deve ser feita no nível do próprio ativo
individual ou, quando não houver essa possibilidade, no menor grupo de ativos identificáveis
que gerem fluxo de caixa em conjunto e separadamente de outros ativos ou grupos de ativos.
20

Esse agrupamento de ativos chama-se unidade geradora de caixa, UGC. (IAS 36 apud LIMA
2010).
A identificação de uma unidade geradora de caixa envolve julgamento, ou seja, se o
valor recuperável não puder ser determinado a um ativo individual, a entidade deve verificar o
menor grupo de ativos que gerem entradas de caixa em grande parte independentes. As UGCs
devem ser identificadas de maneira consistente a cada período para o mesmo ativo ou tipo de
ativo, a não ser quando haja evidência que justifique a alteração (CPC 01 (R1)).
De acordo com o CPC 01 (R1) (2010) a entidade, ao avaliar que um ativo ou UGC
possa ter sofrido desvalorização, deve considerar, no mínimo, algumas fontes de informação
que refletem indícios que o valor recuperável possa ter reduzido. Os indícios apontados pelo
pronunciamento refletem circunstâncias internas e externas à organização. Destaca ainda que
o teste deve ser realizado no mínimo anualmente para ativos ou UGC caracterizados como
intangíveis de vida útil indefinida, intangíveis ainda não disponíveis para uso ou ágio por
expectativa de rentabilidade futura (goodwill) em combinação de negócios.

Ao final de cada período de reporte:

Existem indicadores
internos ou externos de Sim
Ativos cobertos pelo Estimar o valor
que o ativo ou a UGC
IAS 36 recuperável do ativo
não seja recuperável?
ou da UGC

Não

Testar apenas a recuperabilidade de:

1 – Goodwill;

2 - Ativos intangíveis sem vida útil definida;

3 – Ativos intangíveis ainda não disponíveis


para uso.

Figura 01: Periodicidade do teste


Extraído de Lima (2010).

Para que seja verificado se houve uma possível desvalorização de um ativo é


necessário conhecer o seu valor contábil, representado pelo valor em que o ativo está
registrado no balanço patrimonial. O CPC 01 (R1) (2010) destaca que o valor contábil é o
21

montante pelo qual o ativo está registrado após a dedução da respectiva depreciação,
amortização ou exaustão acumulada e ajustes para perdas. No entanto, pode haver dificuldade
em estabelecer o valor contábil a uma unidade geradora de caixa. Iudícibus (2010a) destaca
que o valor contábil de uma UGC compreende os seguintes elementos:
I – O valor contábil dos ativos que podem ser alocados em base razoável e
consistente a unidade geradora de caixa e que gerarão fluxos de caixa futuros
utilizados para determinação do valor em uso da referida UGC. II – ágio ou deságio
decorrente e relativo ao ativo pertencente à unidade geradora de caixa proveniente
de uma aquisição ou subscrição, cujo fundamento esteja na diferença entre o valor
de mercado do referido ativo e do seu valor contábil. III – Não inclui o valor
contábil de qualquer passivo reconhecido, exceto se o valor contábil da unidade
geradora de caixa não puder ser determinado sem considerar esse passivo.

Como já destacado, objetivo do Impairment test é assegurar que o valor contábil do


ativo ou UGC não seja superior ao seu potencial de recuperação. Sendo assim, ao ser
realizado o teste, a busca inicial deve ser pelo seu valor recuperável, definido por Carvalho,
Lemes e Costa (2005) como o maior valor entre o valor justo líquido dos custos de venda e o
valor em uso do ativo ou da UGC.
O valor em uso é o valor presente dos fluxos de caixa futuros esperados, descontados a
valor presente, advindo de um ativo ou UGC. Para se estimar o valor em uso devem-se
considerar futuras entradas e saídas de caixa derivadas do uso contínuo do ativo e de sua
baixa final e aplicar a taxa de desconto apropriada para estes fluxos de caixa futuros. (ERNST
& YOUNG, FIPECAFI, 2010) (CPC 01 (R1), 2010).
A mensuração do valor em uso de um ativo ou de uma unidade geradora de caixa é um
processo complexo e que exige alto nível de julgamento profissional. Para que o cálculo seja
realizado é necessário identificar a UGC e valor contábil dos ativos que a compõem, incluindo
critérios de alocação dos ativos corporativos e goodwill, estimar o fluxo de caixa futuro,
determinar a taxa de desconto apropriada, que deverá refletir o valor do dinheiro no tempo e
considerar os riscos específicos dos ativos, comparar o valor em uso do ativo e registrar a
perda por Impairment, se necessário. (ERNST & YOUNG, FIPECAFI, 2010).
Ernst & Young e Fipecafi (2010) definem valor líquido de venda como o valor que se
pode obter com a venda de um ativo ou UGC, líquidos dos custos envolvidos no processo e
que deve considerar uma transação entre partes independentes, em condições usuais de
mercado.
A melhor evidência de um valor líquido é um contrato de venda firmado entre partes
independentes, menos os custos diretos atribuídos à venda, caso não exista um contrato de
venda firmado, mas exista um mercado em funcionamento para um ativo determinado, pode-
se utilizar o resultado recente da venda de ativos similares e, caso não exista um contrato
22

firmado nem um mercado ativo, o valor líquido de venda pode ser determinado através da
melhor estimativa da administração na data do balanço e deve considerar o resultado de
transações recentes com ativos similares no mesmo ramo de negócios. (ERNST & YOUNG,
FIPECAFI, 2010).
O CPC 01 (R1) (2010) destaca que nem sempre é necessário determinar o valor
líquido de venda e o valor em uso de um ativo, pois se qualquer um dos montantes exceder o
valor contábil do ativo ou da UGC, estes não tem desvalorização e, portanto, não é necessário
estimar o outro valor.
Vale destacar que se for possível determinar o valor líquido de venda de um ativo e se
não houver evidências de que o valor em uso o exceda materialmente, não se faz necessário o
calculo do valor em uso do ativo e o seu valor líquido de venda pode ser considerado como
valor recuperável. (ERNST & YOUNG, FIPECAFI, 2010) (CPC 01 (R1), 2010).
Basicamente o teste de recuperabilidade visa a verificação de uma possível redução ao
valor recuperável de um ativo ou unidade geradora de caixa, para isso, de forma resumida, é
necessário encontrar o valor de recuperação de um ativo ou UGC e compará-lo ao seu valor
contábil, conforme figura 02.

Valor contábil

Comparado com

Valor recuperável

O maior
entre

Valor líquido de venda e Valor em uso

Figura 02: O Impairment test


Adaptado de Ernst & Young. FIPECAFI (2010).

Segundo o CPC 01 (R1) (2010), o valor contábil de um ativo ou UGC deverá ser
reduzido ao seu valor recuperável somente se o próprio valor contábil for superior ao valor
recuperável, esta redução constitui uma perda por desvalorização que deverá ser reconhecida
de forma imediata na demonstração do resultado ou na respectiva reserva de reavaliação, em
caso de ativos reavaliados. Destaca ainda que após o reconhecimento da perda as despesas
23

com depreciação, amortização e exaustão deverão ser ajustadas em períodos futuros para
alocar o valor contábil já revisado.
Em caso de reconhecimento de perda, conforme IAS 36, ela poderá ser revertida em
períodos futuros até no máximo o valor contábil anterior a redução somente se tiver ocorrido
mudanças na estimativa usada para determinar o valor recuperável desde o reconhecimento da
última redução por desvalorização, com exceção do goodwill, onde nenhuma reversão poderá
ser feita.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para a execução da pesquisa, foram coletadas a demonstrações contábeis da Petrobras


no quadriênio 2011-2014. A escolha pela empresa é justificada pela acessibilidade dos dados,
bem como pela dimensão das perdas por não recuperabilidade de ativos evidenciadas nos
últimos exercícios, principalmente em 2014, fato que contribui para atingir os objetivos da
pesquisa.
Com a disponibilidade das demonstrações contábeis, foi extraído da demonstração do
resultado e das descrições das notas explicativas o montante de Impairment evidenciado em
cada exercício. A Petrobras classificou a perda pela não recuperabilidade de ativos, de 2011 a
2013 no subgrupo “Outras receitas e despesas operacionais, líquidas”, no ano de 2014 a
mesma perda pode ser diretamente identificada na demonstração do resultado e não está
associada a outro subgrupo da mesma.
A Petrobrás afirma que, em virtude das particularidades dos seus ativos, adota
geralmente como valor recuperável o valor em uso, estimado pelos fluxos de caixa futuros de
ativos ou UGC, ajustados aos riscos específicos e que utilizam taxas de desconto pré-imposto,
que derivam do custo médio ponderado de capital pós-imposto. Os Fluxos de caixa possuem
como premissas os preços baseados no último plano estratégico divulgado, curvas de
produção associadas aos projetos existentes no portfólio da Companhia, custos operacionais
de mercado e investimentos necessários para realização dos projetos.
Após a constatação da perda, foi realizada a retirada do seu efeito sobre ativo total,
patrimônio líquido e no resultado do exercício em cada ano e verificada a variação percentual
proporcionada. Foi calculado também os índices de endividamento geral e margem líquida
tendo como base os valores evidenciados nas demonstrações e, depois, sem o efeito do
reconhecimento da perda por desvalorização. O primeiro índice reflete a dependência do ativo
24

da companhia em relação ao capital de terceiros e o segundo demonstra qual o lucro líquido


para cada unidade de venda realizada.
A partir desses procedimentos, foram obtidos resultados que permitiram um
posicionamento sobre a hipótese levantada e o alcance dos objetivos propostos. A
metodologia da pesquisa é considerada exploratória, definida por Beuren (2006) como um
estudo que busca conhecer com maior profundidade o assunto, para torna-lo mais claro ou
construir questões importantes para o direcionamento da pesquisa.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Serão apresentados aqui os resultados obtidos na pesquisa em função das variações


provocadas pela retirada do efeito da perda pela a não recuperabilidade de ativos sobre os
indicadores mencionados que envolvem a Petrobras. Os resultados serão apresentados em
gráfico e tabelas, além de serem organizados de acordo com os exercícios analisados.
Verificou-se que nos dois últimos exercícios houve um crescimento da perda por
Impairment, sendo que em 2014 este crescimento foi ainda maior, o que representa uma
elevação de aproximadamente 3.505,49% em relação ao ano anterior. Pode-se afirmar que a
grande variação do montante de Impairment registrado representa um grave caso de má gestão
da companhia no que tange as suas decisões de investimentos e ao seu planejamento
estratégico, além disso, circunstâncias do mercado internacional, que provocaram a queda do
preço do petróleo e afetaram a perspectiva de geração de fluxos de caixa futuros para
determinados ativos, contribuíram para este processo.
No gráfico 01 pode ser verificado o montante de Impairment evidenciado em cada
ano, bem como a sua variação.
25

Gráfico 01 - Perda pela não recuperabilidade de ativos reconhecidas pela


Petrobras no quadriênio 2011-2014
(em bilhões R$)
1900ral 1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral
1900ral 1900ral 1900ral
1900ral
1905ral 1905ral 1905ral 1905ral
Fonte: Elaboração própria.

Em 2011, a variação percentual dos indicadores mencionadas na pesquisa, após a


retirada do efeito da perda pela não recuperabilidade de ativos, não foi alta, no entanto, o
montante de Impairment é considerado relevante em virtude da expressividade do valor
absoluto que foi reconhecido, R$ 664 milhões. O lucro líquido da Companhia seria 2% maior,
caso a perda por redução ao valor recuperável não tivesse sido evidenciada. Assim como a
margem líquida, que cresceria em torno de 0,27%, o índice de endividamento seria reduzido
em 0,05%, o ativo total cresceria 0,11% e o patrimônio líquido 0,20%. As respectivas
variações podem ser observadas na tabela 01.

Variação Percentual dos indicadores analisados após a retirada do efeito do Impairment test (ano 2011)

Variáveis Variação percentual Valor evidenciado Valor sem Impairment

Ativo Total 0,11% 599.150 milhões 599.814 milhões

Patrimônio Líquido 0,20% 332.224 milhões 332.888 milhões

Resultado do Exercício 2,00% 33.110 milhões 33.774 milhões

Endividamento Geral -0,05% 44,55% 44,50%

Margem Líquida 0,27% 13,56% 13,83%


Fonte: Elaboração própria.

No ano de 2012 houve uma queda no montante da perda evidenciada em 57,68% onde
o valor absoluto corresponde a R$ 281 milhões. Mais uma vez, notou-se uma variação
percentual relativamente pequena, resultado da própria dimensão dos números da empresa,
que apresentou um resultado sólido e possui uma estrutura de ativos e patrimônio líquido
expressivos em aspectos quantitativos.
26

Após a retirada do efeito da perda por redução ao valor recuperável, o destaque é dado
ao lucro líquido da companhia que cresceu 1,34%, as demais variáveis tiveram uma variação
inferior a 1%, como pode ser visto na tabela 02:

Variação Percentual dos indicadores analisados após a retirada do efeito do Impairment test (ano 2012)
Variáveis Variação percentual Valor evidenciado Valor sem Impairment
Ativo Total 0,04% 677.716 milhões 677.997 milhões
Patrimônio Líquido 0,08% 345.433 milhões 345.714 milhões
Resultado do Exercício 1,34% 20.959 milhões 21.240 milhões
Endividamento Geral -0,02% 49,03% 49,01%
Margem Líquida 0,10% 7,45% 7,55%
Fonte: Elaboração própria.

No exercício 2013, houve um crescimento do montante de Impairment de 340,57%,


resultando em R$ 1,238 bilhão em perda. Isto provocou variações mais expressivas sobre os
indicadores analisados, a exemplo do lucro líquido do exercício que cresceu 5,38% após a
retirada do efeito do Impairment.
O crescimento da perda já aponta para possíveis erros de planejamento e gestão, tendo
em vista o volume de capital identificado e a sua elevação em relação ao exercício anterior.
Na tabela 03 as variações sobre todos os indicadores podem ser observadas.

Variação Percentual dos indicadores analisados após a retirada do efeito do Impairment test (ano 2013)
Variáveis Variação percentual Valor evidenciado Valor sem Impairment
Ativo Total 0,16% 752.967 milhões 754.205 milhões
Patrimônio Líquido 0,35% 349.334 milhões 350.572 milhões
Resultado do Exercício 5,38% 23.007 milhões 24.245 milhões
Endividamento Geral -0,08% 53,60% 53,52%
Margem Líquida 0,40% 7,55% 7,95%
Fonte: Elaboração própria.

Em 2014 o valor da perda pela redução ao valor recuperável dos ativos alcançou um
patamar elevado, R$ 44,636 bilhões, o que resultou em um grande impacto sobre as contas e
destacou que há problemas no processo de tomada de decisão dentro da empresa no que se
refere as decisões de investimento e a própria gestão. A companhia divulgou informações
acerca das áreas de negócio mais afetadas com a desvalorização de ativos no ano de 2014 que
podem ser analisados na tabela 04.
27

Impairment por área de negócio em bilhões (R$)

Área Impairment

Exploração e produção 5,665

Abastecimento 33,954

Gás e Energia 0,26

Internacional 4,757

Total 44,636

Fonte: Elaboração própria

As variações percentuais dos indicadores analisados, em 2014, também foram mais


expressivas, em relação aos exercícios anteriores. Destaque para o resultado do exercício que,
após a retirada do efeito do Impairment, saiu de uma posição de prejuízo para uma posição de
lucro, resultando em uma variação de 203,60%. Além disso, a margem líquida variou 13,23%
e o patrimônio líquido 14,36%. Os dados podem ser observados na tabela 05.

Variação Percentual dos indicadores analisados após a retirada do efeito do Impairment test (ano 2014)
Variáveis Variação percentual Valor evidenciado Valor sem Impairment

Ativo Total 5,63% 793.375 milhões 838.011 milhões

Patrimônio Líquido 14,36% 310.722 milhões 355.358 milhões

Resultado do Exercício 203,60% -21.924 milhões 22.712 milhões

Endividamento Geral -3,24% 60,83% 57,59%

Margem Líquida 13,23% -6,50% 6,73%


Fonte: Elaboração própria

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos resultados obtidos e da ótica proporcionada sobre os indicadores da


empresa pode-se considerar que o Impairment test contribui para a qualidade da informação
produzida pela Contabilidade, tendo em vista que objetiva evitar o registro de ativos por um
valor que exceda o seu potencial de gerar benefícios futuros para a entidade os detêm. Notou-
se que o reconhecimento da perda contribuiu para a qualidade da informação contábil inerente
à Petrobras e elevou a sua confiabilidade, pois demonstrou que o registro dos seus ativos não
era compatível com a real situação dos investimentos da companhia. Dessa forma, pode-se
afirmar, também, que o Impairment test é importante para evidenciar a situação econômico-
28

financeira das organizações, em virtude da maior segurança proporcionada à divulgação dos


aspectos quantitativos do ativo, do patrimônio líquido e do resultado do exercício.
Os resultados demonstram que a perda pela não recuperabilidade de ativos
reconhecida no resultado do exercício da Petrobras variou significativamente nos últimos
quatro anos, vide a variação entre exercícios 2013 e 2014. Vale ressaltar, que nos dois
primeiros exercícios analisados, as perdas, em termos absolutos, representaram um montante
significativo, no entanto, a variação percentual dos indicadores analisados em função da
retirada do efeito do Impairment não foi alta, devido a dimensão das contas da empresa. Nos
dois últimos exercícios a variação se tornou mais expressiva, em função do volume da perda
que foi evidenciada. Destaque para o exercício de 2014, onde a perda provocou uma alteração
substancial no resultado do exercício e alterações mais expressivas nos demais indicadores.
O alto índice de perda por Impairment registrado pela Petrobras, principalmente no
ano de 2014, aponta para falhas na sua gestão e planejamento, pois um alto grau de
desvalorização de ativos, que resulta em perdas nas proporções identificadas, demonstra,
principalmente, que as decisões de investimento não foram adequadas. Cabe à organização
utilizar as informações evidenciadas em seu relatório, no tocante a desvalorização de ativos,
para reorganizar os seus processos de investimento e atribuir maior eficiência a eles. Neste
aspecto são destacadas algumas funções que justificam a importância do teste de
recuperabilidade: a utilização do Impairment como instrumento de diagnóstico, gestão e
planejamento.
Desta forma a institucionalização do Impairment no Brasil representa um avanço para
a Contabilidade nacional por proporcionar uma elevação na confiabilidade dos relatórios
produzidos e, consequentemente, contribuir para uma gestão mais eficiente. No entanto, a
possibilidade de executar a reversão posteriormente pode reforçar o entendimento de que
determinados ativos possuem uma grande sensibilidade às circunstâncias de mercado e o seu
valor recuperável pode variar e alterar o direcionamento de algumas decisões.
Sob esta perspectiva recomenda-se como estudo posterior a investigação sobre a
proporção em que os fatores de mercado provocam a reversão da perda por desvalorização,
bem como atestar a hipótese de que o reconhecimento da perda por desvalorização de certos
ativos, ou a reversão posterior, pode alterar o curso das ações desenvolvidas pela empresa
durante a sua gestão.
29

REFERÊNCIAS

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conformidade com a lei n. 11.638/2007. – 3ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Internacional: aplicação da IFRS 2005. – 1. Ed. São Paulo: Atlas, 2011.

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30

PROBLEMATIZANDO A REPROVAÇÃO ESCOLAR NA MUDANÇA


DE CICLOS E OS FATORES EMOCIONAIS ASSOCIADOS

Odacyr Roberth Moura da Silva1

RESUMO

As altas taxas de fracasso escolar, especialmente nas primeiras séries do ensino fundamental
ao longo de décadas foram consideradas o principal obstáculo do sistema educacional
brasileiro. Atualmente, esta questão ainda configura-se como um problema a nível individual,
familiar e social. Nesta perspectiva, o problema norteador deste estudo baseia-se nos
seguintes termos: Quais efeitos emocionais acometem os alunos que vivem a transição do
primeiro para o segundo ciclo do ensino fundamental nas escolas públicas? Este trabalho não
pretende responder a esta questão, mas situá-la histórica e socialmente e problematizá-la,
instigando a realização de futuras investigações. Pretende-se fornecer subsídios para o avanço
de discussões teóricas tanto das disciplinas científicas quanto das práticas profissionais que,
atuando de forma interdisciplinar, elaboram saberes acerca do fracasso escolar em decorrência
da mudança de ciclo.

PALAVRAS-CHAVE: Reprovação. Mudança de ciclo. Fracasso escolar.

1. INTRODUÇÃO

Grande parte dos estudos sobre os determinantes do desempenho escolar dá ênfase à


interação das esferas familiar, escolar e comunitária para a produção do sucesso ou fracasso
acadêmico do sujeito, indicando que estas produções são multicausais e não podem ser
analisadas em uma relação direta de causa-efeito.
As variáveis da esfera familiar indicam a importância do grau de escolaridade dos
pais, as condições econômicas da família, a estrutura ocupacional dentre outros fatores
intervenientes relacionados aos aspectos socioeconômicos na circunscrição do sucesso ou
fracasso escolar do filho. As variáveis existentes nas esferas da comunidade e da escola
assinala a relevância do contexto social para a interação e alteração do papel da condição
socioeconômica da família sobre o desempenho escolar do aluno (RIOS-NETO; CÉSAR;
RIANI, 2002).

1
Mestrando em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo - UFES. Bolsista do CNPQ.
Psicólogo pela Universidade Vale do Rio Doce - UNIVALE. Pedagogo pela Universidade de Uberaba
- UNIUBE. Endereço institucional: Av. Fernando Ferrari, 514, Programa de Pós-Graduação em
Psicologia (Prédio Prof. Lídio de Souza), Goiabeiras, Vitória - ES. E-mail: odacyrroberth@gmail.com.
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Em um mundo onde a demanda da escola, a demanda dos pais e, de uma maneira mais
abrangente, a demanda social como um todo exige cada vez mais a obtenção de sucesso dos
indivíduos, se tornar um “fracassado” pode ser considerado o maior pesadelo de um
indivíduo. A criança então, desde muito nova, percebe que tem que responder a uma
expectativa de ser bem sucedida em coisas que outros propõem que ela faça. A escola é o
espaço onde isto se torna mais nítido: através das suas boas notas e seu bom currículo ela
poderá se tornar o objeto de satisfação dos seus pais (CORDIÉ, 1996).
Quando uma criança fracassa, de fato, o que acontece é a abertura do leque das
múltiplas possibilidades de atribuição de culpa do fracasso. Seria o sistema falho? O fracasso
estaria na educação feita pelos pais? Seria esta uma criança relapsa e desatenta? Várias
respostas são possíveis para o problema do fracasso escolar. Angelucci et al. (2004) pontua
que o fracasso deve ser compreendido de maneira mais global e dinâmica. Mesmo assim,
existem pesquisas que atribuem fracasso escolar tanto à relação aluno-professor quanto à
estrutura que há por trás do sistema de ensino, como por exemplo, a má formação docente, o
que inclui o uso de técnicas inadequadas pelo profissional da educação.
Boruchovitch (1999) chama a atenção para investigações contraditoriamente curiosas.
Segundo a autora há pesquisas que indicam que os educadores atribuem como características
de alunos com fracasso escolar baixo QI, imaturidade, subnutrição, abandono ou negligência
dos pais, problemas emocionais diversos, hipossuficiência econômica, desorganização
familiar, dentre outros. Por outro lado, existem estudos que derrubam o mito das deficiências
físicas, do retardo intelectual, da falta de prontidão e da desintegração dos lares como os
responsáveis pela reprovação e destacam que não há provas científicas que o mau
desempenho escolar possa ser atribuído a problemas biológicos, psicológicos ou físicos.
Todos os estudos concordam, entretanto, que a postura dos profissionais da educação
que se relacionam com os alunos é um fator de fundamental importância, especialmente
quando estes indivíduos estão atravessando a fase da infância para a adolescência e passando
por expressivas mudanças em todos os aspectos da sua existência.
Quando a criança não consegue dar conta da demanda que recai sobre ela e o processo
de ensino-aprendizagem não se efetiva, não raras vezes, ela sente-se culpada pelo que
aconteceu. Em sua tese “O cotidiano escolar patologizado”, Collares (1995) relata que o aluno
buscando as causas do seu fracasso escolar, começa a acreditar que fracassou porque ele não
aprendeu o que tinha que aprender ou que não se esforçou o suficiente. A autoestima deste
sujeito pode ficar de tal maneira destruída que, o conceito que ele carregará de si próprio
poderá gerar prejuízos psicológicos que poderão ser generalizados para todas as áreas da sua
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vida. Os pensamentos negativos provocados pela baixa autoestima oriunda do fracasso


escolar podem, por sua vez, fazer com que o aluno desenvolva mecanismos de defesa que o
levarão a distanciar-se cada vez mais do seu próprio processo de aprender, fazendo com que
ele entre em um ciclo de sucessivas reprovações.
Santos (2006) constatou que os alunos que saem do 5º ano (antiga 4ª série), ao
chegarem no 6º ano (antiga 5ª série e o primeiro ano do segundo ciclo) ainda estão muito
presos à figura do professor e encontram muitas dificuldades para adaptarem-se neste novo
ciclo, pois agora o nível de exigência é muito maior e a independência que lhes é solicitada
neste espaço não foi ensinada no ano anterior. A autora chega à conclusão que “as diferentes
modalidades de interação observadas nessa passagem não favorecem o desenvolvimento da
autonomia do aluno em relação às novas exigências e situações de ensino-aprendizagem
apresentadas na 5ª série” (SANTOS, 2006, p. 12).
Diante deste panorama, a questão norteadora deste estudo baseia-se nos seguintes
termos: Quais efeitos emocionais acometem os alunos que vivem a transição do primeiro para
o segundo ciclo do ensino fundamental nas escolas públicas? Este trabalho não pretende
responder a esta questão, mas situá-la histórica e socialmente e problematizá-la, instigando a
realização de futuras investigações.

2. A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MODERNA

Antes de começar a traçar o percurso histórico da educação pública no mundo, faz-se


necessário conceituar alguns termos que serão utilizados ao longo deste trabalho. Em alguns
discursos na literatura é possível notar a existência de equívocos em relação à conceituação de
educação pública e educação estatal. Sanfelice (2005) chama atenção para este detalhe,
elucubrando que a escola pública é a instituição onde o Estado é educado pelo povo. Segundo
ele, a escola pública, de fato, não existe na história do país. O que existe é a escola estatal,
mantida pelo Estado com a função de civilizar as massas. Neste trabalho, o termo educação
pública não será utilizado no sentido sócio-histórico proposto por Sanfelice (2005), mas na
perspectiva de “público” que se opõe ao “privado”.
No século XIX, com o advento da industrialização, os países europeus perceberam a
necessidade de se criar mão de obra qualificada. A escola pública, então, surge como uma
exigência dos interesses sociais do período, com a função de preparar o indivíduo das
camadas menos favorecidas para o mercado de trabalho. Este projeto de instrução pública
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objetivava o progresso material, intelectual e moral dos homens, e evidenciava as


transformações da visão de mundo provocadas pela Revolução Industrial (PEREIRA;
FELIPE; FRANÇA, 2012).
O pensamento de laicização da educação e a intenção de torná-la pública derivam,
contudo, dos ideais da Revolução Francesa, ocorrida no ano de 1789 na França, bem antes da
eclosão da Revolução Industrial. Segundo este discurso liberal, fazia-se necessário construir
o mais depressa possível um novo sistema de ensino que atendesse às demandas da formação
do novo homem. A burguesia manifestava-se contra o absolutismo no ensejo de criar
condições físicas propícias para o desenvolvimento das relações capitalistas (SILVA, 2007).
A partir do final do século XVIII, a sociedade capitalista propunha uma educação
voltada às necessidades econômicas que acompanhavam as transformações da sociedade da
época. Entretanto, no final do século XIX, concomitantemente ao boom da Revolução
Industrial, observa-se o movimento de reinvindicação de igualdade de bens iniciado pela
classe operária. À este movimento associa-se a elaboração do socialismo utópico e do
socialismo científico. Em 1848, no ápice do movimento revolucionário, a burguesia garante a
vitória (SILVA, 2007).
Pensamentos burgueses contrários à implementação e ao avanço de uma escola
acessível a todas as camadas sociais são expressos nos ditos de Mandeville, datados do século
XVIII, em 1723, tal como é transcrito a seguir:

Para fazer feliz a sociedade e manter as pessoas contentes, mesmo nas circunstâncias
mais humildes, é indispensável que o maior número delas seja, ao mesmo tempo que
pobres, também totalmente ignorantes. O saber amplia e multiplica os nossos
desejos, e quanto menos coisas um homem ambicione, tanto mais facilmente se lhe
poderão satisfazer as necessidades. Portanto, o bem-estar e a felicidade de todo
Estado ou Reino exigem que os conhecimentos da classe pobre trabalhadora se
limitem à esfera de suas ocupações e que nunca se estendam (no que se refere às
coisas visíveis) para além do que se relaciona com a sua profissão. Quanto mais
conhecimento do mundo e das coisas alheias ao seu trabalho ou emprego tenha um
pastor, um lavrador ou qualquer outro camponês, tanto mais difícil lhe será suportar
com alegria e satisfação as fadigas e as dificuldades de seu ofício. (MANDEVILLE,
2001, p. 190)

Pouco tempo depois, Adam Smith – contraditoriamente às teorias de Mandeville, que


acreditava que para manter a ordem era necessário manter o povo ignorante – faz um
manifesto favorável à intervenção do Estado na promoção da educação. A educação sugerida
por Smith, contudo, deveria ser aplicada em doses homeopáticas para não desequilibrar o
sistema social (FERRARO, 2009).
Marquês de Condorcet, segundo estudo publicado por Ferraro (2009) foi o último
filósofo das luzes e o principal teórico da educação republicana. Condorcet acreditava que
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deveria se instruir o homem com tudo aquilo que ele deveria saber, pois desta maneira seria
possível corrigir a desigualdade natural das faculdades, tal como expressa nos ditos abaixo:

Mostraremos que, por uma escolha feliz, tanto dos próprios conhecimentos quanto
dos métodos de ensiná-los, pode-se instruir a massa inteira de um povo com tudo
aquilo que cada homem precisa saber para a economia doméstica, para a
administração de seus negócios, para o livre desenvolvimento de sua indústria e de
suas faculdades; para conhecer seus direitos e exercê-los; para ser instruído sobre
seus deveres, para poder cumpri-los bem; para julgar suas ações e aquelas dos outros
segundo suas próprias luzes, e não ser alheio a nenhum dos sentimentos elevados ou
delicados que honram a natureza humana; para não depender cegamente daqueles a
quem é obrigado a confiar o cuidado de seus negócios ou o exercício de seus
direitos, para estar em condições de escolhê-los e vigiá-los, para não ser mais a
vítima desses erros populares que atormentam a vida com temores supersticiosos e
esperanças quiméricas; para defender-se contra os prejuízos exclusivamente com as
forças da razão, para escapar do prestígio do charlatanismo, que estenderia
armadilhas à sua fortuna, à sua saúde, à liberdade de suas opiniões e de sua
consciência, sob pretexto de enriquecê-lo, de curá-lo ou de salvá-lo"
(CONDORCET, 1993, p. 184-185).

Desse modo, a educação teria o poder de libertar o homem da ignorância,


descativando-o da dependência cega, tornando-o um ser consciente e autônomo.
Em sua obra Rapport et Project, Condorcet (1792) deixa claro que o que ele propõe é
a criação de uma instrução que fosse universal, nacional e pública, assumida pelo Estado
como um dever e ancorada no princípio da igualdade, livre de qualquer tipo de discriminação.
O esboço da escola, tal como a conhecemos hoje foi proposto em 1790 por Condorcet. Ele
distinguia cinco níveis de instrução, todos, exceto o último, de natureza totalmente gratuita:
escola primária, escola secundária, institutos, liceus e sociedade nacional das ciências e artes.
Da formulação das ideias de Condorcet até sua implementação, quase um século se passou
(FERRARO, 2009).

3. A EDUCAÇÃO PÚBLICA NO BRASIL

Os jesuítas chegaram no Brasil colonial com o objetivo inicial de converter os índios


ao catolicismo. Posteriormente, dedicaram-se também à educação em geral, chegando a
dominá-la em sua totalidade até a segunda metade do século dezoito, quando o Marquês de
Pombal expulsou a Companhia de Jesus do país. O Estado português assume, então, este lugar
vazio deixado pelos jesuítas, ao menos no que tange à administração e controle do sistema
escolar. Sistema escolar, este, que servia a poucos brasileiros, em sua maioria, filhos das elites
coloniais que ainda estavam em sua fase embrionária (GALLO, 2012).
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Com o advento da independência e posteriormente a queda do império, a educação


pública pouco avança e se resume quase que apenas ao ensino superior. Percebe-se que o
rumo da história da educação está intrinsecamente ligado aos interesses do capital e das
classes que dele se beneficiam. A influência do positivismo também não pode ser
negligenciada, especialmente no que tange ao estabelecimento da educação pública no Brasil.
A Constituição de 1824 já mencionava um sistema nacional de educação. Todavia esta
educação resumia-se à instrução elementar, que era ler, escrever e contar. Segue fragmento da
Constituição, em sua versão original:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros,
que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida
pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.(....) XXXII. A Instrucção
primaria, e gratuita a todos os Cidadãos. (BRASIL, 1824)

Segundo Hilsdorf (2005), os signatários do Manifesto Republicano (1870)


acreditavam que a educação poderia fazer o Brasil desenvolver-se até chegar aos mesmos
patamares de desenvolvimento da Europa. Eles instituíram a educação pelo voto e pela escola
como um instrumento de transformação evolutiva da nossa sociedade. Deste modo,
estabeleceram que o que faria com que os indivíduos se tornassem cidadãos ativos seria a
execução do ato de votar pelos alfabetizados. Para que o indivíduo se alfabetizasse ele teria,
que frequentar a escola, tornando-se assim um “homem progressista adequado aos tempos
modernos” (HILSDORF, 2005, p. 60).
Embora a educação pública tivesse o objetivo de atingir as massas, não estendia o
ensino a toda sociedade, pois a escola oferecida deveria se encaixar nos moldes das elites
cafeicultoras preponderantes à época (HILSDORF, 2005). Somente na reforma paulista de
1920 é que as massas populares puderam ter acesso ao ensino. Este ensino era formado por
grupos escolares compostos por turma seriadas e possuíam a particularidade de se estabelecer
apenas em território urbano (SAVIANI, 2006).

4. TENDÊNCIAS EDUCACIONAIS NO BRASIL

Segundo Luckesi (2005), várias tendências influenciaram a educação no Brasil. As


tendências mudavam à medida que se alterava o modo de ver a função que a educação deveria
exercer. A tendência liberal intencionava preparar o indivíduo para executar determinado
papel social. Neste sentido, a educação funcionava como uma modeladora de
comportamentos, levando o indivíduo a adaptar-se às normas e valores vigentes na sociedade.
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Com o passar do tempo surge a tendência progressista, que, além de visar a transformação do
homem, possuía um viés mais crítico. Esta tendência propunha um questionamento da
realidade das relações dos homens entre si e com a natureza. Já a tendência crítico-social dos
conteúdos visava a escola como um local para a apropriação do saber, preparando a criança
para o mundo adulto. Para isto, far-se-ia necessário transmitir ao indivíduo o máximo de
conteúdo possível, com a possibilidade de questionamento e participação ativa na
democratização e organização da sociedade.
Já, de acordo com o Ministério da Educação (MEC, 1997), é possível identificar
quatro grandes tendências na tradição pedagógica brasileira: a tradicional, a renovada, a
tecnicista e a tendência marcada por uma pluralidade de tendências voltadas a preocupações
políticas e sociais.
Na tendência tradicional o professor exerce a função de mero transmissor de conteúdo,
além de ter que vigiar, controlar e punir, se necessário, o comportamento dos alunos. Também
recai sobre o professor a responsabilidade de único condutor do processo educativo. O
método utilizado é a memorização através da repetição e a exposição oral do conteúdo
predomina. Muitas vezes, o conteúdo ensinado e os procedimentos utilizados para ensinar
divergiam completamente do cotidiano e da realidade social dos alunos (LIBÂNEO, 1994).
Luckesi (2005) acrescenta ainda que neste modelo o professor transmite o conteúdo como
uma verdade a ser absorvida, sem abertura para questionamentos ou reflexões. Até castigo
físico era usado para conseguir manter a disciplina.
A tendência tecnicista, por sua vez, deveu-se por um lado à intensa industrialização
pela qual o país passava neste período e é o resultado histórico de uma educação capitalista.
Ela caracterizava-se por circunscrever os problemas sociais levados para a escola à questões
administrativas, transformando os problemas de educação em problemas de técnicas de
gerenciamento e em problemas de mercado. Assim, a educação transforma o indivíduo em
produto para servir de mercadoria, objetivando criar e qualificar mão-de-obra para o mercado
de trabalho (MARRACH, 2002).
Pereira (2003) acredita que além do processo de industrialização, a tendência
tecnicista também advém de influências da psicologia comportamental de Skinner, onde a
escola assume o papel de modelar o comportamento com o auxílio de técnicas específicas
através da organização do processo de aquisição de habilidades, conhecimentos e atitudes
específicos. O objetivo era produzir indivíduos tecnicamente competentes para o mercado de
trabalho, integrando-os ao sistema social vigente.
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Em contrapartida, a chamada “pedagogia renovada” conecta-se a várias correntes


direta ou indiretamente ligadas ao movimento da Escola Nova ou Escola Ativa. Apesar de
apresentarem algumas diferenças, estas correntes possuem como denominador comum a
valorização do indivíduo como ser livre, ativo e social. Ao contrário da escola tradicional, o
cerne da atividade escolar é o aluno como ser criativo e curioso, onde o que mais interessa
não é o ensino em si, mas como se dá o processo de aprendizagem. Tudo isso com o objetivo
de propiciar mais autonomia ao aluno, possibilitando a ele tornar-se um indivíduo crítico e
consciente (MEC, 2007).

5. MUDANÇAS OCORRIDAS NOS ÚLTIMOS ANOS

Como pode-se perceber, a escola pública, obrigatória e gratuita é uma criação recente,
datada do final do século XIX, com objetivo de regular a população. Ela diferencia-se de
quaisquer modos de educação esboçados ao longo da história. E embora sua história seja
recente, a escola pública passou por diversos formatos até atingir os contornos como
enxergamos hoje. No Brasil, a partir de 1980, a universalização do ensino se deu mediante o
ensino seriado que:

(...) para todos implicava numa rígida organização que as escolas unitárias com base
no ensino individualizado não conheciam. A reunião de várias escolas em grandes
edifícios escolares, a divisão dos alunos em classes, a existência de um professor
para cada sala, o ensino simultâneo, a introdução de horários rígidos estabelecendo o
início e o fim das atividades escolares, a obrigatoriedade do ensino, tudo isso era
novidade na época (TIGGEMANN, 2010, p. 31)
.
No modelo de ensino seriado a reprovação era utilizada como instrumento disciplinar
tanto para garantir a homogeneidade “intelectual” das classes, quanto para impedir que
hábitos nocivos se propagassem, utilizando-se para isso a normalização de condutas.
Tiggemann (2010) acredita que a retenção, além de produzir prejuízos financeiros e
organizacionais do sistema de ensino, cria obstáculos ao processo de aprendizagem dos
alunos.
O Brasil apresentava, por volta da metade do século XX, os índices mais altos de
retenção da América Latina, o que significava um acréscimo estrondoso no orçamento dos
sistemas de ensino. A solução indicada por muitos profissionais do magistério da época foi a
adoção do regime de promoção automática. Todavia, as vozes discordantes, que não foram
poucas, temiam que este regime pudesse tornar ainda mais caótica a situação educacional no
país. O caminho apontado por eles foi a criação de uma política de inovação progressista, que
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fosse capaz de reformular os programas existentes, renovar as técnicas pedagógicas testadas


em situação experimental, treinar professores, elaborar material didático e, principalmente,
desenvolver no magistério uma atitude mais receptiva às novas práticas educacionais
(BARRETO; MITRULIS, 2001).
Em diversas partes do país os estados, ao longo das décadas de 1960 e 1970,
promoveram a reorganização do currículo escolar na tentativa de diminuir os índices de
reprovação. O estado de Santa Catarina foi o que obteve maior êxito na mudança para a
progressão continuada, instituindo obrigatoriedade de 8 anos de escolaridade (antes eram
apenas 4) na rede estadual. Para os alunos que não conseguiam alcançar as metas
estabelecidas para o desenvolvimento adequado no processo de aprendizagem foram
instituídas classes de recuperação ao final das 4ª e 8ª séries. A escola procurava harmonizar
seu ensino ao ritmo do aluno, buscando conseguir rendimento segundo as possibilidades do
mesmo (BARRETO; MITRULIS, 2001).
Diversos Municípios e Estados na década de 1980, visando a redução da repetência e
evasão escolar, reestruturaram o ensino fundamental a partir das séries iniciais através da
flexibilização da seriação. A transformação das séries em ciclos possibilitava trabalhar o
currículo por um período maior de tempo, o que permitiria a garantia do respeito aos
diferentes ritmos de aprendizagem apresentados pelos alunos. Apesar do modelo escolar por
ciclos apresentar necessidades de ajustes e alguns problemas estruturais, as experiências
mostram que ele contribui significativamente para a superação dos problemas do
desenvolvimento escolar (MEC, 1997).
Barreto e Mitrulis (2001) conceituam os ciclos como períodos de escolarização de
duração variada que ultrapassam as séries anuais. Esta variação pode atingir, inclusive a
totalidade dos anos previstas para determinado nível de ensino (um ciclo pode, por exemplo,
abarcar todos anos do ensino fundamental). Os ciclos são uma tentativa de superar a
fragmentação curricular decorrente do regime seriado.
A adoção do regime de ciclos, no qual a educação brasileira atualmente está inserida
“pela flexibilidade que permite, possibilita trabalhar melhor com as diferenças e está
plenamente coerente com os fundamentos psicopedagógicos, com a concepção de
conhecimento e da função da escola.” (MEC, 1997, p. 43). Com a implantação desta mudança
espera-se que o aluno não se sinta um fracassado no sistema educacional e que todos saiam
ganhando.
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6. A REPROVAÇÃO NAS ESCOLAS PÚBLICAS DO BRASIL

Estatísticas indicam que o Brasil apresentou melhorias educacionais significativas na


década de 1990, dentre elas a permanência dos alunos na escola por maior tempo e o declínio
do índice de repetências (indicadores de cobertura e fluxo escolar) quando comparada com as
décadas anteriores. Como exemplo, pode-se mencionar os dados da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE) que apontam que as crianças brasileiras de 10 anos de
idade possuíam em 1982, em média, 1,32 anos completos de estudo. Neste mesmo período, os
indivíduos de 14 anos possuíam, em média, 3,54 anos completos de estudo. Em 1992 as
crianças de 10 anos possuíam 1,75 de estudo concluído e 2,24 anos em 1999. A alta é
perceptível ao longo dos anos. Já a média de escolaridade dos sujeitos de 14 anos em 1992 era
4,13 anos completos de estudo e em 1999, 4,99 (FERNANDES; NATENZON, 2003).
Apesar da melhora apresentada pelo quadro educacional a taxa de reprovação ainda
continua sendo alta no Brasil. Segundo Ortigão e Aguiar (2013) da década de 1990 até os dias
atuais a taxa de reprovação no Brasil caiu de 30% para 18,7%. Embora a queda possa parecer
grande, o Brasil está em 1º lugar no ranking entre os 41 países da América Latina e Caribe
que mais reprova na educação básica. As taxas de reprovação, conforme dados do INEP:

Figura 1: Taxas de reprovação


Fonte: MEC/INEP/DTDIE
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De acordo com a figura percebe-se que os anos finais do ensino fundamental (ou seja,
o que era chamado de 5ª a 8ª séries) apresentam uma taxa consideravelmente superior no
percentual de alunos reprovados em relação aos anos iniciais (antigas 1ª a 4ª séries) do ensino
fundamental em todas as regiões do país. Seria esse um reflexo da mudança de ciclos? Esta é
uma pergunta que ainda gera muitas discussões, pois não se pode negligenciar que o fracasso
escolar está diretamente relacionado com as políticas educacionais vigentes no sistema de
ensino, e consequentemente a teoria e a prática das mesmas.
Ortigão e Aguiar (2013), a partir dos resultados da Prova Brasil, fazem uma
investigação da reprovação no primeiro ciclo do ensino fundamental e também questionam se
os níveis de reprovação no Brasil possuíam ligação com a organização dos níveis de
escolaridade em ciclos, já que esta política tem sido apontada como uma das responsáveis
pela transferência dos percentuais mais elevados de repetência para os anos finais do ensino
fundamental.
Para demonstrar quantitativamente mais explicitamente a situação atual do fracasso e
aprovação escolar no Brasil, segue abaixo uma tabela detalhada com as taxas de aprovação,
taxas de abandono, taxas de reprovação e taxas de distorção idade-série do ano de 2012:

Tabela 1 – Taxas de aprovação, abandono, evasão, promoção, repetência, reprovação e distorção idade-
série de 2012
Ensino Fundamental - anos Ensino Fundamental - anos
iniciais finais
Taxa de aprovação (2012) 91,70% 84,10%
Região Norte (2012) 87,20% 81,20%
Região Nordeste (2012) 88,00% 78,50%
Região Sudeste (2012) 95,00% 88,60%
Região Sul (2012) 94,30% 83,50%
Região Centro-oeste (2012) 93,30% 86,50%
Taxa de abandono (2012) 1,40% 4,10%
Região Norte (2012) 3,00% 6,40%
Região Nordeste (2012) 2,60% 6,80%
Região Sudeste (2012) 0,50% 2,20%
Região Sul (2012) 0,30% 2,50%
Região Centro-oeste (2012) 0,80% 3,50%
Taxa de reprovação (2012) 6,90% 11,80%
Região Norte (2012) 9,80% 12,40%
Região Nordeste (2012) 9,40% 14,70%
Região Sudeste (2012) 4,50% 9,20%
Região Sul (2012) 5,40% 14,00%
Região Centro-oeste (2012) 5,90% 10,00%
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Taxa de distorção idade-série


(2012) 16,60% 28,20%
Região Norte (2012) 27,40% 40,50%
Região Nordeste (2012) 23,50% 38,60%
Região Sudeste (2012) 9,90% 19,60%
Região Sul (2012) 11,30% 22,80%
Região Centro-oeste (2012) 13,50% 26,50%
Fontes: MEC/INEP/DTDIE

Cordié (1996), em seu livro Os atrasados não existem – psicanálise de crianças com
fracasso escolar, considera o fracasso escolar como uma patologia do nosso tempo. Para ela,
as exigências da sociedade moderna, a supervalorização do dinheiro e do sucesso social são
tidos como fatores desencadeantes para distúrbios psicológicos. Ou seja, “a pressão social
serve de agente de cristalização para um distúrbio que se inscreve de forma singular na
história de cada um.” (p. 17).
Segundo Ortigão e Aguiar (2013), a repetência já foi considerada uma prática positiva,
contudo,

(...) é atualmente questionada pelas pesquisas e políticas educacionais,


principalmente em função de suas consequências sociais negativas. É reconhecida
como um fenômeno social complexo em cuja produção interagem características das
escolas e das práticas e políticas escolares, dos alunos e de suas famílias
(ORTIGÃO; AGUIAR, 2013, p. 367).

7. O FRACASSO ESCOLAR E O DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL

Um dos maiores desafios para os educadores realmente comprometidos com a


construção de uma sociedade, de fato, democrática, tem sido pensar, e, sobretudo, fazer uma
escola pública de qualidade que abranja as classes populares (ESTEBAN, 2001). Não se pode
negar a influência das variáveis socioeconômicas na determinação do desempenho escolar,
especialmente no que tange à realização de exames padronizados aplicados em território
nacional pelo sistema de ensino (FERNANDES; NATENZON, 2003).
Tentativas de abrandar os processos de exclusão escolar causados pela reprovação e
evasão já foram citadas anteriormente tais como a organização do ensino em ciclos e a
progressão continuada. Essas tentativas, contudo, têm funcionado apenas em parte, pois os
interesses políticos e econômicos por trás das políticas educacionais, de modo geral, não vêm
concebendo a educação como direito, limitando os investimentos financeiros necessários à
democratização do acesso à aprendizagem (JACOMINI, 2009).
42

Além das limitações existentes no âmbito político, associam-se muitas vezes ao


fracasso escolar a falta de apoio da família, a desvalorização da educação que gera professores
desmotivados e sem recursos para investir no aperfeiçoamento de sua prática, deficiências no
processo de ensino-aprendizagem tais como a não preparação dos professores para a mudança
seriada para ciclo, dentre outras.
Faz-se necessário destacar que o fracasso escolar é um processo que envolve uma
gama de variáveis e não pode nem deve ser deitada sobre o aluno toda a responsabilidade por
não conseguir apreender determinado conteúdo específico. Para Esteban (2001) o fracasso do
aluno é determinado pela dinâmica avaliativa utilizada pelo professor. Quando o professor
utiliza a avaliação como instrumento de segregação, a avaliação se transforma em uma
ferramenta de punição. Entretanto, quando ele a utiliza como alternativa de construção e não
de classificação, ele toma posse do seu lugar de mediador do processo ensino-aprendizagem e
promove uma educação continuada inclusiva, onde o fracasso não ocupa lugar de destaque.
Já de acordo com Prata (2005) se a escola opta por adotar o sistema de reprovação é
porque ela reproduz um modelo determinado pela parcela da sociedade que detém o poder de
decisão. Contudo, a relação que o sistema escolar mantém com a sociedade é uma via de mão
dupla, pois se por um lado a escola funciona guiada pelos valores preponderantes na
sociedade, “por outro, pelos impasses enfrentados em sala de aula, ela também participa da
transformação desses valores, pois é um lugar fundamental na produção de sujeitos, sejam
professores ou alunos.” (PRATA, 2005, p. 114)
E o aluno? Como ele introjeta o sucesso escolar? E como ele reage ao fracasso?
Para Bento (2007) para se formar uma escola que produza alunos de sucesso é
necessário proporcionar segurança física e emocional, instigar as capacidades sociais e
acadêmicas e trabalhar com as expectativas pessoais, visando assim, englobar a criança em
sua totalidade.
Cordié (1996) entende o fracasso como um julgamento de valor. Segundo a autora,
cada criança irá representá-lo e vivenciá-lo à sua maneira, tendo em vista que os ideais de
cada um são construídos no decorrer da existência. Contudo, existem muitos pontos em
comum nos ideais construídos dentro de determinada cultura e, embora não haja
homogeneidade, pode-se dizer que a forma de sentir o fracasso seja mais ou menos parecida
em indivíduos que partilham uma mesma cultura. A família também pode ser a responsável
pela construção dos ideais do indivíduo e a maneira como ela os impõe pode vir a ser fator
43

preponderante no desencadeamento dos sentimentos do sujeito frente ao sucesso ou ao


fracasso.
A cultura imputa a ideia que ser bem sucedido na escola significa ter um futuro
brilhante, ser alguém na vida, ter acesso aos bens de consumo. Em outras palavras, ser bem
sucedido na escola significa possuir dinheiro e poder, mesmo que em uma perspectiva bem
remota. O fracasso escolar significa a renúncia forçada a tudo isso. A criança pode pensar, a
partir de então, que não será ninguém na vida e que pode até tornar-se mendiga! Em muitas
crianças é perceptível o sentimento de angústia e rejeição, sendo que várias outras situações
conflitantes podem emergir diante do fracasso advindo (CORDIÉ, 1996, p. 21). Investigações
no sentido de identificar estes sentimentos frente ao fracasso escolar fazem-se necessárias.
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O fracasso escolar na atualidade configura-se como um problema a nível individual,


familiar e social. Faz-se necessário examinar os efeitos das práticas que constituem a
subjetividade destes indivíduos. Como corrobora Rangel (2001), os conflitos existentes na
transição da unidocência para a pluridocência também não podem ser ignorados como
problemas socioadaptativos e que trazem em maior ou menor grau sofrimento psíquico para o
sujeito. Pratti e Eirizikk (2006) enfatizam que essa passagem se caracteriza como um
momento no qual novos elementos entram em cena, tornado complexas das práticas adotadas
tanto pelos professores quanto pelos pais e alunos. Essa é uma fase onde transformações e
desafios serão impostos especialmente ao aluno, pois a mudança de ciclo provoca sentimentos
ambivalentes: “ao mesmo tempo em que simboliza o desejo de crescer, de lutar por uma nova
identidade e expectativa social, faz com que o aluno tenha que lidar com a dor que esse
crescimento pode trazer” (p. 295).
As altas taxas de fracasso escolar especialmente nas primeiras séries do ensino
fundamental, ao longo de décadas, foram consideradas o principal obstáculo do sistema
educacional brasileiro. Uma das preocupações do poder público constitui exatamente na
criação e implementação de políticas que visem o combate do fracasso na escola
(FERNANDES; NATENZON, 2003).
Segundo Bento (2007), as taxas de abandono, insignificantes no 1º ciclo, tornam-se
cada vez mais nítidas nos anos do que seguem à passagem do ciclo. Ele ainda salienta que o
abandono está muito mais relacionado à idade do aluno do que com o ano escolar em que ele
está e que frequentemente o abandono é precedido de um repertório de insucesso escolar
44

reincidente. Para ele, os anos de escolaridade mais delicados para a retenção dos alunos são os
que se sucedem a mudança de ciclo.
A importância de se discutir o tema consiste em tanto para a sociedade de maneira
geral no que diz respeito ao processo educacional, quanto à comunidade científica, em
especial aos profissionais da psicologia e pedagogia, no que tange à reflexão sobre a
construção da subjetividade diante do fracasso escolar advindo da mudança de ciclos.
Este trabalho pretendeu fornecer subsídios para o avanço de discussões teóricas tanto
das disciplinas científicas quanto das práticas profissionais que, atuando de forma
interdisciplinar, elaboram saberes acerca do fracasso escolar em decorrência da mudança de
ciclo. De forma alguma pretendeu-se esgotar o conhecimento acerca do entendimento do
fenômeno pesquisado. Por isto, é necessário reforçar que faz-se necessário a realização de
pesquisas neste sentido.

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47

DE ESTUDANTE A EGRESSO: UMA ITINERÂNCIA A (PER)CORRER

Alexandra Quadro Siqueira1


David Estevão dos Santos Júnior2

RESUMO

Este artigo propõe uma investigação que busca estudar possibilidades para, num estágio mais
avançado da pesquisa, criar uma metodologia de análise de inserção de egressos no mundo do
trabalho, a fim de contribuir para a avaliação das políticas públicas educacionais
implementadas pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia - IFBA, a
partir do estudo de caso do curso de Administração. A análise de inserção de egressos, tema
de suma importância em instituições de ensino, também se justifica devido à necessidade de
acompanhamento e desenvolvimento continuado do ex-aluno, de maneira a avaliar as
condições de trabalho, a sua renda e o impacto que a vivência educacional causou em sua
vida. A abordagem metodológica, por ora, será a quali-quantitativa, valendo-se a princípio de
revisão de literatura e, a posteriori, de pesquisa empírica com o uso de técnicas, tais quais a
aplicação de questionários e de dinâmicas com grupos focais com egressos formados entre os
anos de 2010 à 2015 do curso de Administração. Visa-se com isso conhecer a
empregabilidade, a compatibilidade da formação recebida com as demandas do Mundo do
Trabalho, a identificação de necessidades de ajustes nas matrizes curriculares, as expectativas
quanto à educação continuada e às demandas pedagógicas passiveis de serem ofertadas pela
instituição, e o aspectos institucionais que careçam de melhoria.

Palavras-chaves: Estruturação Curricular; Egressos; Avaliação de Políticas Públicas.

1. POR INÍCIO DE UM DIÁLOGO...

O presente trabalho se destina a discutir, de forma ainda bastante incipiente, as


possibilidades para viabilizar o estudo de um dos eixos de análise do Observatório do
Trabalho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia - IFBA que é o
egresso – seu objeto. Esta pesquisa tem como objetivo geral criar uma metodologia de análise
de inserção de egressos, a fim de contribuir para a avaliação das políticas públicas

1
Mestra em Educação (UFBA); Especialista em Auditoria Fiscal (UNEB); Bacharel em Ciências Econômicas
(FACCEBA); Coordenadora Didático-Pedagógica do curso Multimeios Didáticos do Profuncionário (IFBA);
Professora Substituta de Organização, Normas e Qualidade (IFBA); Professora de Economia (UNIESP) e
Professora de Filosofia (SOLEDADE).
alexandraquadro@ifba.edu.br
2
Pós-graduando em Administração Pública (UCAM); Bacharel em Administração de Empresas (IFBA);
Especialista em Serviços de Navegação Aérea (ICEA); Controlador de Tráfego Aéreo (ICEA); Coordenador de
Observação do Mundo do Trabalho (IFBA); Especialista em Navegação Aérea (INFRAERO); Administrador
(CORREIOS); Controlador de Tráfego Aéreo (INFRAERO).
david.estevao@ifba.edu.br
48

educacionais implementadas pela instituição, a partir do estudo de caso do curso de


Administração. A análise de inserção de egressos, tema de suma importância em instituições
de ensino, se justifica devido à necessidade de acompanhamento e desenvolvimento
continuado do ex-aluno, de maneira a avaliar as condições de trabalho, a sua renda e o
impacto que a vivência educacional causou em sua vida, nas diversas dimensões do mundo do
trabalho.
O acompanhamento e o desenvolvimento do egresso são ainda objetivos e dimensões
operativas da extensão tecnológica contidos no Plano de Desenvolvimento Institucional e no
Projeto Pedagógico Institucional do IFBA. Além disso, para o Plano de Desenvolvimento
Institucional, o acompanhamento do egresso é também Política de Gestão e integra a sua
Política de Atendimento aos Discentes, que possui como objetivos:

“...
- Criar e disseminar a cultura do acompanhamento de egresso junto ao aluno;
- Realizar pesquisa qualitativa da laboralidade, por amostragem simples;
- Incentivar a participação do egresso em curso de educação continuada;
- Dar subsídios a avaliação dos currículos, programas e conteúdos desenvolvidos
pela escola, objetivando a elevação da qualidade do ensino e da sintonia entre a
escola e a comunidade;
- Cadastrar os egressos do IFBA, mantendo dados atualizados, a fim de
disponibilizar informações atualizadas aos ex-alunos, objetivando informá-los sobre
eventos, cursos e oportunidades oferecidas pela instituição;
- Promover encontros periódicos objetivando a coleta de informações que propiciem
subsídios para a avaliação e adequação dos currículos dos cursos por meio de
informações obtidas por ex-alunos;
- Avaliaçaõ da eficácia dos cursos quanta a inserção e permanência dos egressos no
mercado de trabalho ...”

Consoante a esses desígnios, e como mencionado acima, a análise de inserção de


egressos proporciona subsídios para a tomada de decisões concernentes a verificação e/ou
adequação das matrizes curriculares às demandas do mundo do trabalho, contribuindo assim,
por conseguinte, para a avaliação do atendimento de suas finalidades legais de:

“... I - ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e


modalidades, formando e qualificando cidadãos com vistas na atuação profissional
nos diversos setores da economia, com ênfase no desenvolvimento socioeconômico
local, regional e nacional;
II - desenvolver a educação profissional e tecnológica como processo educativo e
investigativo de geração e adaptação de soluções técnicas e tecnológicas às
demandas sociais e peculiaridades regionais;

IV - orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos
arranjos produtivos, sociais e culturais locais, identificados com base no
mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural no
âmbito de atuação do Instituto Federal” (Art. 6º da Lei nº 11.892/2008).
49

No que toca às atribuições regimentais, mais especificamente, e como uma derivação


dessas finalidades legais, a análise de inserção de egressos é um dos encargos do
Departamento de Relações Empresariais da Pró-Reitoria de Extensão juntamente com a Pró-
Reitoria de Ensino do IFBA, que realizam ações em parceria para a manutenção ou alteração
de matrizes curriculares. Isto é, além de instrumento de acompanhamento e desenvolvimento
do ex-aluno, e de balizador de estruturas curriculares de cursos, uma metodologia de análise
de inserção de egressos dever ser encarada pelo IFBA como um mandamento regimental, que
contribui sobremaneira com o controle interno Institucional, bem como para a prestação de
contas à Sociedade. Ademais, a metodologia que se busca implementar com esse projeto
servirá como um modelo para o estudo dos egressos dos demais cursos oferecidos pela
instituição.
Por conseguinte, a análise do egresso contribuirá com a avaliação de aspectos relativos
à avaliação institucional, conforme demandas contidas no Projeto Pedagógico Institucional do
IFBA e na autoavaliação a ser implementada pela Comissão Própria de Avaliação (CPA)
citada no Plano de Desenvolvimento Institucional do IFBA.
Esperamos também implementar numa fase mais avançada da metodologia a
contemplação de mecanismos que promovam a manutenção de laços com alunos e a
recuperação desses com ex-alunos, fortalecendo, dessa forma, a sensação de pertencimento
destes com a instituição, além de viabilizar um ambiente de cooperação e troca de
experiências.
Em resumo, através dos seguintes objetivos específicos, esperamos compor este
trabalho que apenas se inicia: diferenciar mercado de trabalho e mundo de trabalho; comparar
o perfil socioeconômico do egresso do curso de Administração do IFBA na condição de
estudante e de egresso; identificar aspectos positivos e negativos das matrizes curriculares do
curso, existentes entre os anos de 2010 à 2015, a partir da formação acadêmico-profissional
recebida e da atuação dos egressos no mundo do trabalho; propor modificações, incrementos
ou supressões na matriz curricular do curso com base nos aspectos estudados; avaliar a
empregabilidade dos egressos; verificar o nível de atuação empreendedora do egresso no
mundo do trabalho; analisar o grau de compatibilidade entre a formação do egresso e as
demandas da sociedade requeridas pelo mundo do trabalho; identificar demandas pedagógicas
orientadas ao desenvolvimento profissional; sugerir a criação de cursos de formação
profissional continuada ao egresso a partir do levantamento dos aspectos estudados; e apoiar a
avaliação do desempenho institucional através da pesquisa de satisfação do egresso.
50

A pergunta de partida será: Como o estudo do egresso do curso de Administração do


IFBA poderá contribuir para a avaliação das políticas públicas educacionais implementadas
pela referida instituição?
Como referencial teórico, serão utilizados o estado da arte sobre estruturação
curricular, egressos e abordagens metodológicas de avaliação de políticas públicas. Com isso,
almejar-se-á identificar as respostas oferecidas e as limitações existentes na metodologia de
análise de inserção de egressos proposta com esse trabalho.
Entretanto, isto ainda não determinou todas as inquietações para que o problema fosse
aqui pensado como objeto de reflexão. Para os autores, muito além das contribuições que a
participação em tal estudo possibilite em torno de suas discussões que ocorrerão, os espaços
de discussão, contradição, reflexão e, sobretudo, inquietação, o problema ainda vêm sendo
questionados com o foco nos conceitos e preconceitos apresentados, por vezes postos e
impostos, a partir de um discurso empoderado, arraigado por diversos olhares que falam de
lugares diferentes.
Nesse contexto, o que se deseja nesta reflexão é apenas amadurecer e correlacionar um
estudo ainda embrionário sobre egressos com o mundo do trabalho, mostrando claramente
que, difere do mercado de trabalho, para que os possíveis desdobramentos permitam uma
maior compreensão sobre como é possível construir e instituir uma gestão de egressos no
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, para que esta não esteja à margem da
realidade destes participantes da referida pesquisa, sujeitos com voz ativa e autoral.

2. ENTREOLHARES EPISTEMOLÓGICOS NO CAMPO DA POLÍTICA DOS


EGRESSOS

O interesse e o debate sobre os processos formativos, suas imbricações com as


ciências, as artes e o cotidiano, com o ditame do capital e sua importância no mundo do
trabalho, como temas/desafios para o campo da educação é algo que salta aos nossos olhos.
Entretanto, são vários os autores de ponta da educação nacional e internacional que nos
alertam para o despreparo compreensivo e propositivo de nós, educador-pesquisadores e
técnico-pesquisadores educacionais, e de nossas instituições para enfrentarem esse
tema/desafio na contemporaneidade, apesar das contribuições importantes que já fazem parte
dos cenários reflexivos e práticos em termos educacionais. Tendo como marca da sua opção
epistemológica, metodológica e heurística o campo dos processos formativos na educação e
seus objetos mais realçados, a investigação em pauta aponta para a problematização da forma
51

como o conhecimento é constituído desde a modernidade e suas implicações na produção do


perfil do administrador que vem sendo requerido pelo mundo do trabalho.
Por essa perspectiva, Chiavenato (2000b) explica que o desenvolvimento da
administração acompanha o contexto histórico de cada época. Nas próximas décadas, as
tarefas administrativas serão cada vez mais incertas e desafiadoras, visto que passará por
inúmeras transformações e mudanças, como: crescimento das organizações, concorrência
mais acirrada, sofisticação da tecnologia, globalização da economia, internacionalização dos
negócios, inflação mais elevada e maior visibilidade das organizações.

2.1. O DESAFIO DO ESTUDO DOS EGRESSOS E SUAS FRONTEIRAS


ONTOLÓGICAS, EPISTEMOLÓGICAS E POLÍTICAS

Nos dias de hoje, uma das possibilidades, para se fazer uma crítica aos limites e a
fixidez dos processos de significações é tomar como instrumento a crítica cultural e entrelaçá-
la com estudos dos processos formativos. Seguindo esta tendência, os processos formativos
do administrador não podem ser encerrados com uma finalidade em si, em nenhuma filiação
de um campo específico, nem pensados enquanto processos subalternos, tendo que ser
compreendidos como campo autônomo e interdisciplinar por natureza, pois, assim, temos
maiores condições de saber quais são as forças que nos constituem e nos findam em nossa
própria atualidade; desobstruindo o trabalho das significações e abrindo-as para novas
perspectivas.
Destarte, estamos imersos num mundo globalizado que vem desenhando um cenário
de muitas transformações, as empresas se encontram diante de um grande desafio de
competitividade necessitando para isso desvendar uma rede de conhecimento, formando um
ambiente tecnológico propício à inovação, novos conhecimentos e novas ideias. Os estudos
realizados indicam cada vez mais que:

Nos países desenvolvidos, a interação entre o setor de pesquisa e o setor empresarial


faz parte da estratégia das empresas na gestão de seu conhecimento
(VASCONCELOS e FERREIRA, 2000, p.169).

Assim, pode-se afirmar que o conhecimento tem sido historicamente uma mola
propulsora que, de um lado, impulsiona as mudanças econômicas e sociais e as empresas
precisam desse conhecimento para aperfeiçoar, aprimorar, ampliar seus produtos, processos,
práticas e serviços, capacitando-as no enfrentamento desse mundo de mudanças. E, de outro
lado, alavanca as transformações no meio educacional/acadêmico a fim de nos possibilitar
52

compreender e acompanhar a invenção do cotidiano que se apresenta de forma dinâmica nos


diversos tempos e espaços que convivemos.
Pois, pensar tais transformações no meio educacional / acadêmico, certamente, nos
remete a pensar no tocante aos atos de currículo, à formação e à formatividade, em outras
palavras, é refletir acerca da multiplicidade em que se forma um campo de saberes que não
possuem neutralidade, pois é necessário atentar para a profusão de prerrogativas que
permeiam a definição de um determinado currículo, enxergando e delimitando a existência de
um imanente campo político-econômico, que bebe das dinâmicas histórico-ideológicas do
poder. É mediante esta esfera de poder que serão definidos os critérios de seleção dos saberes
que comporão determinado documento curricular. Até os saberes eleitos como formativos
obedecem a uma dada concepção de formação que lhe é própria e apropriada. Neste sentido,

vincular a educação e, particularmente, o currículo, a relações de poder tem sido


central para o projeto educacional crítico. Pensar o currículo como ato político
consiste precisamente em destacar seu envolvimento em relações de poder [...] Os
efeitos de sentido, como efeitos de poder, não funcionariam, entretanto, se não
contribuíssem para fixar posições de sujeito específicas (SILVA, 2006, p. 24-25).

Uma vez que os parâmetros, as diretrizes e as ações curriculares se desdobram


inexoravelmente nas ações cotidianas destes sujeitos, configurando-se em um pré-
determinado modelo de formação, eleito e instituído de forma arbitrária, porém, política e
historicamente orientada, o currículo contemporâneo dos cursos de Administração das
Instituições de Ensino Superior - IES brasileiras, e até mesmo as mundiais, ainda possui suas
raízes fortemente atreladas na perspectiva formativa de atender meramente ao ditame do
mercado de trabalho. A necessidade em se acolher demandas que apontam para a profunda
valorização da razão, do processo de fragmentação e tecnicização dos saberes, e a
disciplinarização e especialização dos espaços formativos, configura a exigência de um
currículo que ajusta uma verdadeira “formatação” das identidades, subjetividades sociais e do
modus-operandi da realização técnica da função propriamente dita executada pelo
administrador, contendo-as no ritmo do contexto histórico-social ora posto.
Deste modo, o currículo não apenas lança mão de uma qualificação técnica e
profissional, ele atua também no âmbito ontológico-formativo dos sujeitos, veiculando assim
uma formação pessoal. Ao refletir esta problemática a pesquisa se insere no debate político-
econômico-epistemológico relativo aos limites do conhecimento em relação com o processo
de colonização dos saberes por parte de projetos curriculares que tensionam as relações entre
poder saber acerca do saber e poder.
53

Logo, a opção da abordagem será dialogar e repensar os processos formativos e a


constituição dos saberes em uma dimensão ontológica e cultural da existência humana, pois
entendemos o currículo enquanto um campo dinâmico e operativo. Neste sentido, o currículo
pode ser compreendido como um fazer em que se fazendo acaba formando, onde se torna
extremamente pertinente pensar a noção de atos de currículo de Macedo (2008, p. 38), ou
seja, “todas as atividades que se organizam e se envolvem visando uma determinada
formação, operacionalizada via seleção, organização, formulação, implementação,
institucionalização e avaliação de saberes”. Esta formulação demonstra o grau de imbricação
entre as questões centrais aqui desenvolvidas: as políticas públicas educacionais a partir dos
egressos do curso de administração do IFBA, os atos de currículo, a formatividade e suas
implicações na formação de administradores. O currículo tensiona a formação do sujeito na
medida em que se faz presente nas ações e definições institucionais e não institucionais da
vida escolar. Basta investigá-lo em seu atuar, em seu fazer-se ubíquo dentro da perspectiva
dos “atos de currículo” para perceber que seus efeitos permeiam e orientam o comportamento
dos atores educacionais em seus diversos espaços formativos. De modo que, os atos de
currículo operacionalizam as atividades que se instituem em torno do mesmo, dinamizando e
atualizando-o dentro da prática dos sujeitos educacionais. Além disso,

a potência práxica do conceito de atos de currículo vinculado a formação é, ao


mesmo tempo, uma maneira de resolução epistemológica para compreendermos a
relação profundamente implicada entre currículo e formação, bem como um modo
de empoderar o processo de democratização do currículo, como uma experiência
que pode ser singularizada e como um bem comum socialmente referenciado.
(MACEDO, 2007, p. 35)

Este ponto de vista traz novas possibilidades, ainda que embrionárias, para se pensar a
própria constituição das subjetividades, e nos permite compreender melhor os discursos e
práticas presentes no processo educativo. É o que nos diz Guattari (1986), quando em seu
estudo relativo à cartografia do desejo, nos fala sobre os dois principais mecanismos de
produção de subjetividade, atuantes nas sociedades atuais. Um centrado nas técnicas de
dominação e exclusão, típicos do capitalismo, e um outro, aquilo que poderíamos chamar de
‘processos de singularização’: uma maneira de recusar todos esses modos de encodificação
preestabelecidos, todos esses modos de manipulação e de telecomando, recusá-los para
construir, de certa forma, modos de sensibilidade, modos de relação com o outro, modos de
produção, modos de criatividade que produzam uma subjetividade singular. Uma
singularização existencial que coincida com um desejo, com um gosto de viver, com uma
54

vontade de construir o mundo no qual nos encontramos, com a instauração de dispositivos


para mudar os tipos de sociedade, os tipos de valores que não são os nossos. (Ibid, p. 16-17)
Ao estudarmos a dimensão cultural, peculiar à condição humana, veremos que a
mesma se forma e segue se produzindo e reproduzindo por uma lógica simbólica fortemente
imbricada na doxa, legada pela tradicional metafísica ocidental. Uma das características
principais desta tradição, é a busca desenfreada pela unidade do ser, que pode ser traduzida
por uma descomedida reverência identidária que, ao fim e a cabo, pretende nos reduzir, como
nos diz Derrida (2005) em uma metafísica da presença. Por isso, os processos formativos que
compõem as dinâmicas ontoculturais[1], são enviesados e limitados em processos
constitutivos de identificações, reforçando e dando forma assim aos códigos e às significações
dominantes. Quanto a isso, Silva (2006) entende que este processo acaba gerando um curto-
circuito no trabalho de significação, encerrando-as no movimento da mercadoria, onde a
identidade pública da esfera da cidadania se confunde com a identidade privada do consumo.
O que leva a um empobrecimento do raio de ação dos processos formativos, e os faz coincidir
com a criação da identidade profissional (HONORÉ, 1980).
Vale ressaltar mais uma vez que, nos dias de hoje, um dos caminhos para se fazer a
crítica aos limites e fixidez dos processos de significações é tomar como instrumento a crítica
cultural e entrelaçá-la com estudos dos processos formativos e curriculares. Seguindo este
viés, eles não podem mais ser rematados em nenhuma filiação de um território específico,
nem pensados enquanto procedimentos subordinados, necessitando ser compreendidos como
campo autônomo, inventivo, inter e transdisciplinar. Nestes termos, o alcance formativo e
propositivo do currículo suscita a uma compreensão mais complexa e abrangente de sua
constituição e atuação diante dos espaços e sujeitos nele implicados voltados para o mundo do
trabalho.
Pois, assim, temos maiores condições de saber quais são as forças que nos constituem
e nos condiz em nossa própria atualidade; desobstruindo o trabalho das significações e
abrindo-as para novas possibilidades. Remetendo o que Paulo Freire (1987, p. 11) chama de
descodificação, ou seja, “análise e consequente reconstituição da situação vivida: reflexo,
reflexão e abertura de possibilidades concretas de ultrapassagem”, e o que Honoré (1980, p.
126), entende por formatividade, i. e., “el ‘campo’, cujo reconocimento se deriva de la
reflexión sobre la experiencia de actividades que sondel ordem de la formación”, ou ainda o
que Pareyson (1993, p. 20) entende por “estética da forma”: um certo modo de “fazer” que,
enquanto faz, vai inventando o “modo” de fazer: produção que é, ao mesmo tempo e
indissoluvelmente, invenção. Todos os aspectos da operatividade humana, desde os mais
55

simples aos mais articulados, têm um caráter, ineliminável e essencial, de formatividade. As


atividades humanas não podem ser exercidas a não ser concretizando-se em operações, i. é,
em movimentos destinados a culminar em obra. Mas só fazendo-se forma é que a obra chega
a ser tal, em sua indivídua e irrepetível realidade, enfim separada de seu autor e vivendo vida
própria, concluída na indivisível unidade de sua coerência, aberta ao reconhecimento de seu
valor e capaz de exigi-lo e obtê-lo. Nenhuma atividade é operar se não for também formar, e
não há obra acabada que não seja forma.
Portanto, a discussão sobre a relação da constituição das identidades, seu rebatimento
para o campo dos processos formativos e a formação de competências e habilidades voltadas
para operacionalização do perfil esperado pelo administrador no mundo do trabalho hoje,
poderia se alargar para muitos outros níveis de reflexão, todavia, estaremos preocupados aqui
em abordar a questão da formação do administrador de estudante a egresso, de maneira
singular, em sua imbricação com a constituição da identidade do graduando em administração
e do papel desempenhado enquanto egresso, inserido e atuante no mundo do trabalho, o que
difere do mercado de trabalho:

A formação dos trabalhadores numa perspectiva de desenvolver a liderança,


polivalência, tornando-os flexíveis e criativos, fica subordinada à lógica do mercado,
do capital, portanto, da degradação, da segmentação e da exclusão. Reduz a
educação ao atendimento às necessidades do mercado de trabalho e à lógica
empresarial.
A educação do trabalhador para o processo capitalista, para o trabalho alienado, se
dá, portanto, através de formas de organização e controle do trabalho dividido, de
estratégias administrativas, tais como rotatividade interna, alargamento de tarefas e
nível baixo de participação nas decisões, treinamento para a execução do trabalho,
política salarial, política de benefícios, formas de supervisão, instruções de
segurança e saúde, e assim por diante. O seu objetivo central é a constituição de um
trabalhador que combine a posse de um conjunto de habilidades técnicas necessárias
– e não mais do que isso – a um conjunto de condutas convenientes, de modo a
assumir, o mais espontaneamente possível, sua função de trabalhador alienado, ao
mesmo tempo em que assegure as condições necessárias à sua própria reprodução.
(KUENZER, 1989, p. 77-78).
A educação do trabalhador para o processo capitalista, para o trabalho alienado, se
dá, portanto, através de formas de organização e controle do trabalho dividido, de
estratégias administrativas, tais como rotatividade interna, alargamento de tarefas e
nível baixo de participação nas decisões, treinamento para a execução do trabalho,
política salarial, política de benefícios, formas de supervisão, instruções de
segurança e saúde, e assim por diante. O seu objetivo central é a constituição de um
trabalhador que combine a posse de um conjunto de habilidades técnicas necessárias
– e não mais do que isso – a um conjunto de condutas convenientes, de modo a
assumir, o mais espontaneamente possível, sua função de trabalhador alienado, ao
mesmo tempo em que assegure as condições necessárias à sua própria reprodução.
(KUENZER, 1989, p. 77-78).

Tornam-se então necessárias políticas do setor público, privado e educacional que


possam atuar como agentes na disseminação do conhecimento, contribuindo para a
56

aprendizagem das empresas e das IES em saber como formar o estudante-cidadão para o
mundo do trabalho e, não apenas, para atender a visão mecanicista, simplória da lógica
capitalista do mercado de trabalho. Cassiolato (1999) afirma que se consolida, assim, o
conhecimento como sendo o recurso principal que deve estar na base das novas políticas de
promoção ao desenvolvimento industrial e tecnológico e o aprendizado como processo central
desse desenvolvimento. Contudo, vale a formação de competências e habilidades necessárias
sem perder de vista o posicionamento crítico-reflexivo frente ao ditame do capital.
Pressupõe-se assim que, a cooperação entre a academia e o setor empresarial deve ser
um “caminho de mão dupla”, onde a academia se beneficia do conhecimento prático das
empresas oferecidas como um campo de estágio e de desenvolvimento de pesquisa. As
empresas se beneficiam com a capacitação de seus recursos humanos, constituição de projetos
que atendam às suas especificidades, da produção de novos saberes e processos que possam
potencializar a busca de excelência tanto das empresas como das IES. Pesquisas sinalizam
que:

As relações universidade / empresa não se podem resumir a simples trocas de


serviços ou equipamentos, por isso o seu real objetivo deve ser o aumento da base de
conhecimento das duas instituições. Tais relações podem assumir varias formas,
desde uma simples consultoria até a construção de estruturas especiais e complexas.
(VASCONCELOS e FERREIRA, 2000, p. 172).

No entanto, percebe-se um conjunto de situações problemáticas na constituição dessa


parceria uma vez que, o tempo dessas organizações é diferente. Estrutura acadêmica mais
lenta tendo em vista a necessidade de aprofundamento científico e o meio empresarial ágil,
frente ao dinamismo e às necessidades da empresa e do mercado. É por questões como essas,
de caráter determinista e mecanicista, que a educação vem sendo caracterizada como mais um
campo de disputa hegemônica, cujo papel social é repleto de conflitos, contradições e
antagonismos. Por ora, vale compreender mais uma vez que a formação acadêmica preza
atender, além da demanda mercadológica, a formação humana do estudante-cidadão, que se
insere numa perspectiva de formação para o mundo do trabalho:

não há nenhuma atividade da qual se possa excluir qualquer intervenção intelectual


– o Homo Faber não pode ser separado do Homo sapiens. Além disso, fora do
trabalho, todo homem desenvolve alguma atividade intelectual; ele é, em outras
palavras, um “filósofo”, um artista, um homem com sensibilidade; ele partilha uma
concepção do mundo, em uma linha consciente de conduta moral, e portanto
contribui para manter ou mudar a concepção do mundo, isto é, para estimular novas
formas de pensamento. (GRAMSCI, 1957, p. 121).
57

Para as universidades, essa interação trará a prática para dentro das salas de aula, já
que o aluno ampliará os conhecimentos agregando ao aprendizado acadêmico um diálogo
com a prática, além das possibilidades de melhorias na infraestrutura, montagem de
laboratórios, construção de centros tecnológicos, aquisição de novas tecnologias, dentre
outros. Em relação às empresas, essa interação tem como objetivo a capacitação dos
profissionais, aquisição de novos saberes provenientes da pesquisa, novas ferramentas
gerenciais e de produção tecnológica.

Hoje não se discute mais a educação somente para o trabalho, mas a educação
integral do homem para o trabalho e para a cidade. À medida que o conhecimento
passa a ser o elemento-chave do novo paradigma produtivo, a transformação
educacional torna-se um fator fundamental no desenvolvimento dos seus requisitos
básicos: capacidade inovadora, criatividade, integração e solidariedade. Uma nova
abordagem para a educação traz implícita a necessidade de uma nova organização
institucional, ou de uma reformulação de papéis dos atores envolvidos no processo
da educação. (RIBEIRO, 2003, p. 227).

O ponto de partida dessa qualificação é o pressuposto de que o indivíduo é um agente


ativo e não pode reagir mecanicamente às situações do seu entorno. A realidade não está
pronta e acabada; é construída ou criada pelos sujeitos a partir de suas ideias, modelos,
estruturas que organizam o seu conhecimento desta realidade. É necessário um constante
estranhamento daquilo que nos cerca, do que está posto nos meios de comunicação, nas
propostas políticas, nas relações de trabalho, nos pacotes econômicos; é preciso estabelecer
fatos e dados que nos tornem mais políticos e “incômodos”. É nas pequenas ações do dia a
dia, na educação dos filhos, nas relações interpessoais, que selecionamos o que nos serve.

O papel dos processos educativos, mormente a formação técnico-profissional,


qualificação e requalificação, neste contexto, é de produzir cidadão que não lutem
por seus direitos e pela desalienação do e no trabalho, mas cidadão “participativos,
não mais trabalhadores, mas colaboradores e adeptos ao consenso passivo e, na
expressão de Antunes (1996:10), a tornarem-se déspotas de si mesmos.
(FRIGOTTO, 1998, p. 48).

Nestes termos, a avaliação de cursos, de programas, de políticas públicas educacionais


não diz respeito ao simples fato de localizar e indicar se resultados previstos foram ou não
alcançados, mas envolvem muito mais indicadores, envolve um juízo de valor da própria
natureza do programa, o contexto que se insere e ação dos atores envolvidos. Desta maneira, a
pesquisa com egressos tem se mostrado um recurso metodológico extremamente rico, mesmo
que complexo e repleto de dificuldades específicas (DUARTE, 2009). Os estudos com
egressos é, por definição, uma estratégia que tem como meta conhecer como os participantes
(SILVEIRA, 2009), efetivamente se apropriam das informações, habilidades e ferramentas
58

supostamente oferecidas pelo programa educativo. Esse talvez seja o mais poderoso e
informativo meio para entender a eficácia de um programa: como, afinal, a vida, as práticas e
os valores dos sujeitos foram realmente influenciados? O que mudou no modo de pensar, nos
valores, na inserção social, na participação no universo do trabalho e da cultura que está
diretamente associado à participação do sujeito naquele programa? Além disso, perpassa
também pelo próprio perfil socioeconômico: o que mudou de estudante a egresso?

2.2. AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E EGRESSOS: LIMITAÇÕES


METODOLÓGICAS E DESAFIOS

Egressos de cursos, programas e políticas sociais são sujeitos especialmente


interessantes para compreendermos como esses cursos, programas e políticas se articulam
com a sociedade. Eles são uma fonte privilegiada de informações que permitem compreender
o alcance, efeitos e consequências de uma ação educativa. Mas, vale aqui ressaltar que,
segundo Lordelo et al (2012), a literatura sobre egressos é limitada e muito recente; ainda não
dispõe de uma epistemologia consolidada. Isso reflete a escassez de estudos avaliativos,
particularmente aqueles que têm como foco os egressos de programas. Nessa perspectiva,
ainda que pouco explorada, as políticas públicas, enquanto campo de conhecimento abrange
por um lado, os estudos voltados para subsidiar processos decisórios e, por outro, os estudos
para avaliação do mérito da ação governamental.
Dessa maneira, a despeito da escassez de estudos sobre egressos, e debruçando-se
sobre a avaliação do mérito da ação governamental, são encontradas na literatura de políticas
públicas duas abordagens metodológicas que são utilizadas pela maioria dos estudiosos no
assunto: a positivista, que aplica princípios da economia política, principalmente a do bem-
estar, aos problemas públicos; e a pospositivista, que aplica filosofias e métodos sociais mais
abrangentes como a teoria crítica, o pós-estruturalismo e o pós-modernismo.
A corrente positivista, segundo Howlett et al (2013), tem por base a ideia de que os
indivíduos tomam a maioria das decisões por meio de mecanismos de mercado e que o Estado
deve agir apenas de maneira subsidiária para sanar suas falhas. Ela se faz valer do método
dedutivo, estabelecendo pressupostos, conceitos ou princípios gerais a fenômenos específicos
sem levar em conta os contextos sociais; e de estudos empíricos, análises quantitativas e da
separação objetiva de fatos e valores.
Como pode ser aduzido, a ênfase quase exclusiva na evidência empírica pode estar
seriamente desnorteada tanto em termos metodológicos quanto éticos por essa perspectiva, já
59

que as políticas raramente têm objetivos livres de ambiguidades e seus implementadores


podem não escolher por vária razões os meios mais “eficientes” para alcançá-los. Assim
sendo, esse é um viés que promove uma forma tecnocrática de governança caracterizada pelo
desdém à política. Alguns seguidores dessa corrente chegam ao ponto de argumentar que se
deve rearranjar o próprio sistema político para que ele se adapte melhor aos “requisitos” de
análise da política (Howlett, 2013).
A abordagem pospositivista, por seu turno, é caracterizada por congregar estudiosos
com o propósito comum de produzir avaliações de processos e resultados de políticas públicas
com base na análise social e política dos problemas públicos. Em outros termos, eles buscam
métodos que tragam respostas em face da realidade da política pluralista e dos interesses
concorrentes na ação governamental; e não possuem a ideia de que exista entendimento
“objetivo” ou inquestionável dos problemas políticos. Em vez disso, procuram operar dentro
de um claro arcabouço de valor que promova maior equidade social e política, mesmo quando
usam instrumentos empíricos em suas análises (Howlett, 2013).
Os estudos feitos pelos analistas pospositivistas abarcam, em geral, abordagens
multiníveis e multidisciplinares e tratam sobre as escolhas individuais, a análise de classes, o
pluralismo político, o corporativismo, o institucionalismo, o neoinstituicionalismo e o
estatismo. Dessa maneira, a distribuição do poder na sociedade, os arranjos burocráticos do
Estado e a participação social nos ciclos de políticas púbicas são temas de suma importância.
Sendo assim, o estudo de egressos em uma instituição pública, além de possuir embates
próprios ligados à seara educacional, tais como as definições de diretrizes curriculares,
enfrenta, também, os conflitos complexos e próprios da dinâmica das políticas públicas.
No que tange à avaliação dos processos decisórios, e relativizando o processo de
participação dos grupos de interesses da sociedade, em virtude das limitações próprias do
sistema político representativo e do princípio majoritário, Aquino (2002) afirma que o mais
adequado, nesse contexto, para identificar se as autoridades governamentais levam em
consideração os interesses da população, é examinar os interesses e as ideias que foram
atendidos e não propriamente avaliar os resultados das políticas públicas implementadas.
Para conhecer o que balizou o processo decisório, por essa ótica, o referido autor
afirma que se deve especular se a ação derivou de uma atitude racional do Estado, que tem,
em tese, plena consciência da implementação da política; do processo organizacional, onde o
governo tem limitadas suas opções pelos conflitos com os órgãos executantes; ou das políticas
palacianas, quando as decisões resultam de compromissos e conflitos políticos.
60

Ainda no que toca à participação social, e contribuindo para a explicação das


limitações impostas pelo sistema representativo e pelo princípio majoritário, Leal (2006)
explica que existem razões ideológicas que dificultam o controle social, que são traduzidos
por argumentos endógenos e exógenos à gestão da coisa pública. Os argumentos endógenos
trabalham a ideia de que o tema “Administração Pública” possui um grau de complexidade e
especificidade que vai da sua dimensão linguistica à sua operacionalização, o que imputa um
papel restrito de avaliação de resultados para a sociedade, cabendo à burocracia civil a
concepção e a eleição das ações e políticas. Os argumentos exógenos afirmam que a
participação social encontra limites cognitivos e institucionais por não haver,
respectivamente, discernimento pleno dos temas e organicidade política e institucional da
comunidade.
Nessa esteira,

O caráter de uma política pública, isto é, o tipo de intervenção do Estado na


realidade social, o tipo de impacto que ela provoca nessa realidade, os benefícios
que ela produz e a quem ela beneficia, é construído durante o todo de sua trajetória,
desde o momento da elaboração, até a sua operacionalização, assumindo
importância decisiva na formação desse caráter a correlação de forças sociais
envolvidas. [...] Isso significa dizer que não se trata de pensar as políticas públicas
sob uma ótica dicotômica da sua horizontalidade ou da sua verticalidade,
dependendo da participação ou não da população na sua elaboração e
operacionalização como analisam alguns pensadores. Pensar as políticas públicas
sob essa ótica é considerar o Estado separado da sociedade civil. (BONETI, 2006, p.
91-92)

Logo, resguardadas as diversas perspectivas oriundas da análise social e política, a


avaliação é um processo transversal a toda a política, que implica a definição da finalidade,
metodologia e como o processo de análise pode produzir informações válidas sobre o
desempenho da política e consequente tomada de decisão com relação a possíveis
modificações, continuidade ou exclusão de uma política ou programa público. Tendo ainda a
particularidade que permite aos governantes aprender sobre as consequências de suas ações
para poder decidir sobre determinada política, ajudando também a administração pública a
melhorar ou modificar a formulação, concepção e implementação das políticas (Dias et al,
2012).
Assim, pode-se afirmar que a avaliação de políticas públicas é uma fonte de
conhecimento, o que tem sido historicamente um fator que promove mudanças econômicas e
sociais, fazendo com que as empresas, as IES e a gestão pública necessitem desse para se
aperfeiçoar, aprimorar, ampliar seus produtos, processos, práticas e serviços, capacitando-as
no enfrentamento num mundo de mudanças.
61

Destarte, apesar de as políticas públicas serem um resultado da correlação de forças


sociais, partindo da premissa que nascem no cerne ou no contexto da sociedade civil, e ainda
que a participação dessa seja restrita, sabemos também que, em pleno no século XXI, o
Estado, as empresas e demais entidades da sociedade civil devem repensar seus valores,
custos, qualidade, produtividade, geração de novos conhecimentos, investimento em pesquisa
e tecnologia e isso os obrigam a estreitar relacionamentos, o que vem crescendo a cada ano no
Brasil, além de ser uma demanda social.
Sendo assim, a avaliação sistemática e contínua de cursos e de programas utilizando
egressos pode ser um instrumento fundamental para se alcançar melhores resultados e
proporcionar uma melhor utilização e controle dos recursos neles aplicados, além de fornecer
aos formuladores de políticas públicas educacionais e sociais e aos gestores dados importantes
para o desenho de políticas mais consistentes e para uma gestão pública mais eficaz.

[1] Termo cunhado para tratar sobre a relação da Ontologia com a cultura.

3. EXPECTATIVAS DE RESULTADOS ESPERADOS:

● Atendimento da finalidade legal de análise dos egressos;


● Adequação da matriz curricular às potencialidades locais, na medida do possível,
contribuindo para o desenvolvimento nacional;
● Criação de um canal para novas demandas pedagógicas: cursos, ações extensivas e/ou
pesquisas;
● Promoção do desenvolvimento pessoal e profissional do egresso;
● Criação de um ambiente de interação e troca de experiências entre instituição, alunos,
ex-alunos, empresas e sociedade;
● Subsidiar estudos para gerar empregabilidade aos futuros trabalhadores, egressos do
curso de Administração do IFBA;
● Identificação do perfil profissional demandado pelo mercado;
● Criação de uma ferramenta de apoio para estudar o cenário do mercado de trabalho da
Administração na Bahia;
● Compreensão do vínculo de pertencimento dos egressos recentes e antigos do curso de
Administração com o IFBA à partir das duas diferentes metodologias propostas a
serem aplicadas na pesquisa;
● Criar ações para manter o contato contínuo com os egressos (gestão de egressos).
62

4. POR UMA CONCLUSÃO (IN)CONCLUSIVA

Ao remetermos por uma conclusão (in)conclusiva, não negamos aqui a necessidade de


finalizar, de definir um caminho, uma pesquisa, um método, um arcabouço teórico bem
fundamentado e estruturado pois, é indispensável para todo estudo ter uma epistemologia e
um método, um percurso, não no sentido de um modelo pronto, mas um método aberto
respaldado em uma epistemologia fundante e com fundamentos próprios, autônomos,
criativos, com passos definidos que se define na própria caminhada. Caminhos decididos sim,
escolhidos, pensados, optados, mas não uma via de mão única, não com uma única opção,
pois passaria a ser imposição; contudo, definidos, submetidos a várias opções e,
principalmente, por vários sujeitos. É mister em toda pesquisa um diálogo constante entre
o(a)s teóricos escolhidos e os atores/autores sociais envolvidos, no nosso caso: os egressos do
IFBA do curso de Adminstração, acrescidos de questões que ofereçam uma investigação
rigorosa (fecunda, coerente e coesa com cada realidade) e uma praiésis bem definida a partir
desta inquirição.
No entanto, esta proposta epistemológica-metodológica-política-ética baseada no
estudo de egressos que abraça, a princípio, traçarmos a diferença entre mercado de trabalho e
mundo de trabalho, delimitando as suas nuances limítrofes a fim de conceber uma postura de
um autorizar-se, de um imaginar, de um inventar, de um criar novos dispositivos de pesquisa
para embasar tal investigação rigorosa, a fim de propor e dispor novas possibilidades do fazer
conhecimento pois, se de um lado nos deparamos, nos confrontamos com todas as incertezas
da realidade dentro e fora dos muros das institucionais educacionais (as incongruências, os
paradoxos, as ambivalências, as ambiguidades, as opacidades, as impurezas, as transgressões,
as traições...), do outro lado, nos vemos pressionados por um sistema organizacional
mercadológico que nos impõe um ditame das nossas ações, valores, modos operandi de
trabalho perpassando pelo nosso modo de ser (subjetividade humana) quase que, de forma,
inquestionável, inabalável e, o pior, nos compreendemos impossibilitados diante da
incapacidade que temos nesta “briga de braço”.
Ademais, almejamos que o dispositivo do estudo dos egressos do curso de
Administração se constitua como um excelente marcador teórico-metodológico para viabilizar
a criação de uma gestão de egressos no instituto, podendo ainda ressignificar o currículo do
curso desde os componentes curriculares até à inovação das estratégias de ensino ao permitir
que sejam traçadas políticas públicas para atender às demandas contemporâneas.
63

Por ora, apenas, buscamos ser coerentes com o momento que, ainda, estamos
vivenciando na pesquisa. Mas, principalmente, por compreendermos que, sempre, estamos e
somos inacabados, sempre, estamos em processo, em devir,... Então, como buscar uma
formação que atenda às demandas atuais do mundo do trabalho, se as matrizes curriculares
ainda vêm sendo propostas sob orientações para atender ao que o mercado de trabalho impõe
enquanto perfil do administrador esperado, delimitando o ensino, a escolarização à ampliar
novos horizontes para uma formação cidadã, crítica-reflexiva?
Como buscar legitimar tal formação requerida pelo mundo do trabalho? A lógica
educacional vem buscando, vem gritando para ser invertida no processo a fim de atender não
mais meramente competências e habilidades tecnicistas e mecanicistas, então, será que o
instituído tornar-se-á instituinte? Como transpor tal inversão do real na cultura mercadológica
brasileira dentro das IES brasileiras e vice-versa?

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67

REFLEXÕES TEÓRICOS DA RESPONSABILIDADE SOCIAL


EMPRESARIAL

Jerisnaldo Matos Lopes1

RESUMO

O novo cenário econômico mundial trouxe mudanças expressivas para o comportamento


humano. A complexidade dos valores associados ao consumismo impulsiona as empresas que
querem “manter sua porção” e ampliar o seu negócio a discutir e pensar sobre a
responsabilidade social. Desde o ano de 2000, o perfil dos consumidores vem mudando,
conforme a informação vai se disseminando. Devemos isso à internet e aos meios de
comunicação de massa. A educação tem um papel essencial nessa nova transformação.
Aquele modelo de empresa que possui a doutrina da pós-revolução industrial – embora
permaneça até hoje, em que as empresas ambicionam muito mais vantagens do que
obrigações – está fadado ao fracasso. Lógico que isso demanda tempo, investimento e
posturas dos empresários, diante desse novo perfil de um consumidor mais consciente e
exigente. Quando nos remetemos à história e seus filósofos, percebemos que há alguns
equívocos em relação ao capital e à mão de obra. O capital, por si, não consegue produzir
riqueza sem uma mão de obra qualificada para gerir. E uma mão de obra sem investimentos
(capital) não consegue ser produtiva e próspera. Ao meu juízo, então há um consenso: capital
mal gerido gera perdas, e uma mão de obra mal empregada gera desperdício. A associação
(nova configuração) então é a gestão do conhecimento: produzir mais com menos recursos
(eficiência) e, por consequência dos meus atos, poluir menos (eficácia).

Palavras Chave: Reflexões e Teorias; Tendências; Responsabilidade Empresarial e Social

RESUME

The new global economic scenario brought significant changes to human behavior. The
complexity of the values associated with consumerism drives companies who want to "keep
your portion" and expand your business to discuss and think about social responsibility. Since
the year 2000, the profile of consumers is changing, as the information will be disseminated.
We owe it to the Internet and the mass media. Education plays an essential role in this new
transformation. That business model that has the doctrine of post-industrial revolution -
though it remains to this day, in which companies aspire much more advantages than
liabilities - is doomed to failure. Of course it takes time, investment and attitudes of
entrepreneurs, faced with this new profile of a more aware and demanding consumer. When
we refer to history and its philosophers, we realize that there are some misunderstandings in
relation to capital and labor. The capital, by itself, can not produce wealth without a skilled
labor to manage. And an investment without labor (capital) can not be productive and

1Doutorando em Desenvolvimento Regional e Urbano; Mestre com Linha de Pesquisa em Ética e


Gestão; Pós Graduado em Gestão de Pessoas (Especialista); Bacharel em Administração de
Empresas com Habilitação em Marketing; Licenciado em Pedagogia; Professor do Mestrado
Profissional em Bioenergia, e Professor do Curso de Administração da FTC.
CV:http://lattes.cnpq.br/5299026831471496 jerislopes@hotmail.com
68

prosperous. To my mind, then there is a consensus: poorly managed capital generates losses,
and a poorly manpower employed wasteful. The association (new setting) then it is
knowledge management: produce more with fewer resources (efficiency) and, as a result of
my actions, pollute less (effectiveness).

Keywords: Thoughts and Theories; Trends; Corporate and Social Responsibility

1. CONCEITOS E TENDÊNCIAS

A Responsabilidade Social, segundo Friedman, é composta por um esquema de ação


estratégica que assume beneficiar outros sujeitos que não são os acionistas, seria um tipo de
antimaximização de lucros, na qual se objetiva uma interação inteligente com o meio social
em que está localizada a empresa.2 Thomas Zenisek argumenta que o conceito é amplo e não
se restringe a uma única definição. Segundo este autor, a responsabilidade conflui em uma
polissemia de interpretações:

Para uns é tomada como uma responsabilidade legal ou obrigação social; para
outros, é o comportamento socialmente responsável em que se observa a ética, e
para outros, ainda, não passa de contribuições de caridade que a empresa deve fazer.
Há também, os que admitam que a responsabilidade social seja, exclusivamente, a
responsabilidade de pagar bem aos empregados e dar-lhes bom tratamento.
Logicamente, responsabilidade social das empresas é tudo isto, muito embora não
sejam, somente, estes itens isoladamente.3

OBJETIVOS ESTRATÉGICOS APLICADOS A GRUPOS DE INTERESSE - STAKEHOLDER


Sociedade
•Aumentar o nível de emprego
•Aumentar o bem-estar da comunidade
•Proteger produtos sustentáveis
•Garantir um meio ambiente limpo
Fornecedores
•Continuar o negócio Consumidores
•Desenvolver capacidade de •Especificação apropriada
fornecimento do produto ou serviço
•Fornecer informação de •Qualidade consistente
transparente Empresa •Entrega rápida
•Entrega confiável
•Flexibilidade
Acionistas •Preço aceitável
•Valor econômico: retorno
sobre o investimento Empregados
•Valor ético: retorno sobre Governos
•Locais, Estatais, Nacional; •Continuidade de emprego
o investimento •Pagamento justo
•Sindicatos;
•Associações empresariais; •Boas condições de trabalho
•Grupos Normativos; •Desenvolvimento pessoal
•ONGs;
•Concorrentes.
Figura 1: Esquema dos objetivos estratégicos

2 FRIEDMAN apud VIEIRA, Roberto Fonseca. A iniciativa privada no contexto social: exercício de
cidadania e responsabilidade social. RP em Revista, Salvador, ano 5, n. 22, maio 2007. p. 28.
Disponível em: <http://www.rp
bahia.com.br/rpemrevista/edicao23/a_iniciativa_privada_no_contexto_social3.pdf>. Acesso em: 10
out. 2010.
3 ZENISEK apud OLIVEIRA, José Arimatés de. Responsabilidade social em pequenas e médias

empresas. Revista de Administração de Empresas, v. 24, n. 204, out./dez. 1984.


69

Quando falamos sobre responsabilidade social nas empresas, estamos falando de uma
reunião de esforços, que implica a união de vários stakeholders.4 As instâncias interessadas
no negócio, ao mesmo tempo em que influenciam a sociedade e, direta ou indiretamente, as
direções dos negócios, também são influenciadas pelo sucesso ou não da empresa, a qual está
ligada ao contexto em que atua. Quando indicamos que esse grupo sofre o impacto pela
atuação de uma empresa, sendo alvo de preocupação da responsabilidade social, estamos
dizendo que ele é composto por pessoas que estão associadas à organização e que sofrem seus
efeitos, direta ou indiretamente.
O cliente é determinante crítico do sucesso da empresa, os stakeholders internos
devem estar permanentemente engajados no processo de servir ao cliente e atender suas
necessidades. Vale ressaltar que a quantidade e a denominação das partes interessadas podem
variar em função do perfil da organização, se ela é por produto ou por serviço.
Em uma pesquisa acerca dos mais assertivos comentários sobre os stakeholders, o
professor Roberto Fonseca Vieira indica cinco pontos de vista sobre o tema, em relação aos
públicos junto aos quais as empresas têm determinada responsabilidade social: os
empregados, os acionistas, os fornecedores e distribuidores, os consumidores e a
comunidade.5
Os empregados, por constituírem um dos fatores de produção mais importantes, e por
serem ainda um dos melhores portadores de “mensagens preferenciais” da empresa,
transformam-se em um dos elementos-chave para o sucesso dos empreendimentos da
iniciativa privada. O reconhecimento da importância deste público fez com que a empresa se
conscientizasse da necessidade de fornecer boas condições e ambiente agradável de trabalho,
salários justos, bem como mecanismos de incentivo e desenvolvimento de pessoal.
Os acionistas, que indiretamente financiam grande parte das atividades desenvolvidas
pela empresa, desejam, por este mesmo motivo, o pagamento dos dividendos que provêm do
capital investido, assim como um amplo esclarecimento sobre as aplicações feitas a partir
deste capital. Trata-se de um compromisso que a empresa não pode deixar de cumprir, não só

4 Segundo o Instituto Ethos, stakeholders é assim definido: “termo em inglês amplamente utilizado
para designar as partes interessadas, ou seja, qualquer indivíduo ou grupo que possa afetar o
negócio, por meio de suas opiniões ou ações, ou ser por ele afetado: público interno, fornecedores,
consumidores, comunidade, governo, acionistas, etc. Há uma tendência cada vez maior em se
considerar stakeholder quem se julgue como tal, e em cada situação a empresa deve procurar fazer
um mapeamento dos stakeholders envolvidos”. INSTITUTO ETHOS. Conferência Internacional 2005:
empresas e responsabilidade social. Disponível em:
<http://www.ethos.org.br/CI/apresentacoes/apresetacoes_10-06/BeatGruninger
GestaoDeDialogos.pdf>. Acesso em: 3 out. 2010.
5 VIEIRA, Roberto Fonseca. Relações públicas: opção pelo cidadão. Rio de Janeiro: Mauad, 2002. p.

30.
70

por questões econômicas – a necessidade de investimentos – mas também e, sobretudo, em


função da consolidação de uma imagem institucional positiva. Da mesma forma, um bom
relacionamento com fornecedores e intermediários é fundamental para que a empresa alcance
seus objetivos mercadológicos e institucionais. Eis porque a organização deve procurar
desenvolver com estes grupos um sistema de verdadeira “parceria”, não descuidando, entre
outras coisas, do fiel cumprimento dos prazos estabelecidos em suas relações comerciais.
Os consumidores, considerados “a razão primeira de todos os esforços da empresa”,
num momento em que se tornam mais esclarecidos e conscientes de seus direitos, tendem a
exigir desta um comportamento cada vez mais ético e responsável. Questões como qualidade
e garantia de produtos, veracidade da propaganda e atenção crescente às necessidades e
desejos do consumidor passam a ser prioritárias na nova mentalidade que o empresariado teve
que assumir. As inúmeras opções de escolha que o indivíduo tem hoje ao seu alcance, face à
diversidade de produtos similares concorrentes, exigiram da empresa uma consciência que
transcende o próprio produto que comercializa, assimilando outras variáveis como
atendimento, imagem corporativa e maior sensibilidade às necessidades latentes e “reais”
deste público.
A comunidade consiste em um dos grupos de maior poder de influência sobre as
atividades da iniciativa privada. O resultado é uma atenção cada vez maior que as empresas
vêm dando às reivindicações comunitárias. Enquanto “cidadã”, a empresa passa a ter um
compromisso com o desenvolvimento da coletividade, não podendo prescindir desta
preocupação com o bem-estar social para priorizar sua lucratividade.

Conservação do meio-ambiente, adequação das tecnologias até então usadas às


condições de tolerância ambiental, construções de unidades de tratamento dos
efluentes industriais, melhores condições de trabalho para os funcionários da
empresa e uma maior participação na vida da comunidade são apenas algumas das
inúmeras reivindicações que este grupo vem fazendo à empresa privada.6

2. A PARTIR DESSES INDICADORES, A MAIS PROVÁVEL CONSIDERAÇÃO


SOBRE A ORIGEM DA RESPONSABILIDADE SOCIAL NAS EMPRESAS SE
ALINHA COM O QUE AFIRMA ARREBOLA:

A responsabilidade social foi introduzida nos Estados Unidos na década de 30, mas
somente na década de 60 as grandes empresas começaram a apresentar relatórios
anuais o que chamamos de balanço social, que continham um resumo dos resultados
obtidos através sua política social e quem se beneficiava. A partir dessa idéia Ashley
(2003) definiu a responsabilidade social, em 1953, como sendo “a obrigação do

6 VIEIRA, 2007, p. 33.


71

homem de negócios de adotar orientações, tomar decisões e seguir linhas de ação


que sejam compatíveis com os fins e valores da sociedade”.7

É óbvio que, por consequência do próprio desenvolvimento da cadeia produtiva, esse


conceito evoluiu no que tange ao papel da empresa, pois Srour considera que as organizações
devem assumir um papel mais amplo dentro da sociedade, levando em conta a constituição de
uma cidadania organizacional no âmbito do ambiente interno e a implementação de direitos
sociais, no âmbito externo.8
Quando feita uma analise mais aprofundada, percebemos que para alguns empresários
a responsabilidade social cai como uma coação legal, que atribui às empresas uma conduta
mais distinta. Luca diz que a empresa, além de um agente econômico com a missão de
produzir riqueza, também é um agente social, um componente da sociedade que deve prestar
contas aos demais.9 Sendo assim, as organizações não podem apenas buscar o lucro, mas
devem também se atentar às obrigações inerentes ao seu convívio com a sociedade, tais como
a preservação ambiental, a criação e manutenção de empregos, a contribuição para a formação
profissional, a qualidade dos bens e serviços, entre outras atividades que não estão legalmente
assumidas, mas que são importantíssimas para a continuidade da empresa.
Segundo as pesquisas realizadas, os públicos beneficiados são: sociedade,
consumidores, empregados, governos, acionistas, fornecedores e outros com os quais a
empresa mantém relações. Como essa base, Melo Neto e Froes dizem que “a responsabilidade
social engloba o público interno e externo, além de preservação ambiental, sem
necessariamente privilegiar uma categoria em particular”.10
Nas interpretações de Thomas Zenisek, como já citado, o conceito de responsabilidade
social fica entendido, segundo alguns, como uma necessidade de responsabilizar um
determinado grupo empresarial de forma legal, ou de implicá-la em obrigações sociais; já para
outros, trata-se de um comportamento social e culturalmente responsável, no qual está
presente a observação da ética; para outros ainda, a responsabilidade social é entendida como
nada além do que contribuições caritativas que uma determinada empresa faz, ou deveria
fazer. Há também aqueles que interpretam que a responsabilidade social seja, acima de
qualquer coisa, a obrigação patronal para com aos empregados de lhes fornecer as condições

7 ARREBOLA, Marcelo Correia. Responsabilidade social corporativa: competitividade e


desenvolvimento social: a prática do setor supermercadista. In: IV SEMEAD. Estudo de caso: gestão
ambiental. Disponível em:
<http://www.ead.fea.usp.br/semead/7semead/paginas/artigos%20recebidos/Socioambiental/SA27_Re
sp_Social_Corporativa_Competivividade.PDF>. Acesso em: 2 dez. 2010.
8 SROUR, Robert H. Poder, cultura e ética nas organizações. Rio de Janeiro: Campus, 1998. p. 43.
9 LUCA apud ARREBOLA, 2010.
10 NETO; FROES apud ARREBOLA, 2010.
72

mais dignas de tratamento. Com efeito, a responsabilidade social de empresas socialmente


envolvidas com a sociedade implica tudo isso sem, no entanto, restringirem-se a estes itens de
maneira isolada.11

3. TENDÊNCIAS

As organizações na década de 1930, nos Estados Unidos, perceberam que a ideia da


responsabilidade social era de grande valia, mas só a partir da década de 1960 as empresas
começaram a apresentar seu balanço social, que consistia em uma síntese dos resultados
obtidos através de sua política social. Harold Koontz e Cyril O’Donnell dizem que
responsabilidade social é:

Uma obrigação pessoal de cada um de quando age em seu próprio interesse, garantir
que os direitos e legítimos interesses dos outros não sejam prejudicados [...]. O
indivíduo, certamente, tem direito de agir e falar em seu próprio interesse, mas
precisa sempre ter o devido cuidado para que esta liberdade não impeça os outros de
fazerem à mesma coisa.12

Ashley define a responsabilidade social como sendo “a obrigação do homem de


negócios de adotar orientações, tomar decisões e seguir linhas de ação que sejam compatíveis
com os fins e valores da sociedade”.13 Apoiado neste conceito, Srour considera que as
organizações devem assumir um papel mais amplo dentro da sociedade, levando em conta a
constituição de uma cidadania organizacional no âmbito do ambiente interno e a
implementação de direitos sociais, no âmbito externo,14 tendo uma influência direta no modo
de agir de seus funcionários e sociedade.
A organização legal, responsabilidade, ou mesmo uma obrigação fiduciário, que
atribui às empresas uma conduta mais distinta. Por outro lado, há os que percebem como
exercício ou função social da empresa. Porém, há a interpretação como sendo este
comportamento eticamente responsável ou filantrópico. Vários autores deixam explícito ou
concordam que as empresas, além de um agente econômico com a missão de produzir
riqueza, também são agentes sociais.
Richard Eells e Clarence Walton dizem que a responsabilidade social está ligada a
questões e princípios éticos adotados pela empresa no que diz respeito aos problemas de

11 ZENISEK apud OLIVEIRA, 1984, p. 33.


12 KOONTZ; O’DONNELL apud OLIVEIRA, 1984, p. 28.
13 ASHLEY apud BOWEN, Howard R. Responsabilidades sociais dos homens de negócios. Rio de

Janeiro: Civilização Brasileira, 1957. p. 6.


14 SROUR, 1998, p. 43.
73

ordem social que enfrenta. Surge a ideia de empresa como elo entre sociedade, indivíduos e
governo, enquanto instrumento capaz de melhorar a qualidade de vida via desenvolvimento
econômico.15
Na visão de Ferrel, a filantropia pode melhorar a rentabilidade geral da empresa. Com
isso, muitas empresas adotam a filantropia estratégica, que é o ato de vincular doações
filantrópicas aos objetivos estratégicos da organização. Um bom exemplo disso é a estratégia
adotada pela Avon através programa Avon’s Breast Cancer Awareness Crusade (Cruzada
Avon de Conscientização do Câncer de Mama) que ocupa o primeiro lugar na ajuda de
empresas à luta contra o câncer. Ferrel cita ainda o exemplo da Intel que, em um único ano,
contribuiu com mais de 96 milhões de dólares para estudos de ciências, matemática e
tecnologia.16
O pano de fundo dessa estratégia “filantrópica” ajusta-se bem à estratégia empresarial
da Intel, quando ela passa a se utilizar dos conhecimentos produzidos nestes estudos. Jogo de
interesses, mas que a comunidade passa a se beneficiar dos investimentos. Trata-se de uma
estratégia empresarial apropriada para gerar lucratividade à empresa.
Com a conscientização pelo consumo responsável, a empresa foi obrigada a repensar
alguns de seus valores, no sentido de constituir mais do que uma realidade econômica, foi
sendo incorporado à sua filosofia um contexto social, dentro do qual se estabeleceram
responsabilidades. Existem alguns “princípios que apontam ou definem se uma empresa é
socialmente responsável. Vamos citar os mandamentos da ONG norte-americana, Business
for Social Responsability – BSR”.17 Segundo ela, uma empresa socialmente responsável, tem
que ter os seguintes atributos:

1) ECOLÓGICA: usa papel reciclado em produtos e embalagens;


2) FILANTRÓPICA: permite que os funcionários reservem parte do horário de serviço para
a prestação de trabalho voluntário;
3) FLEXÍVEL: deixa que os funcionários ajustem sua jornada de trabalho às necessidades
pessoais;
4) INTERESSADA: faz pesquisas entre os funcionários para conhecer seus problemas e
tentar ajudá-los;

15 EELLS; WALTON apud OLIVEIRA, 1984. p. 34.


16 FERREL apud ARREBOLA, 2010.
17 ALEXANDRE, Maria Duque Caçador. O papel do profissional de responsabilidade social
empresarial: seus referenciais e desafios. 2008. 284 f. Dissertação (Mestrado em Administração) –
Programa de Pós-Graduação em Administração, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo,
2008.
74

5) SAUDÁVEL: dá incentivos para funcionários que alcançam metas de saúde como


redução de peso e colesterol baixo;
6) EDUCATIVA: permite que grupos de estudantes visitem as suas dependências;
7) COMUNITÁRIA: cede as suas instalações esportivas para campeonatos de escolas das
redondezas;
8) ÍNTEGRA: não lança mão de propaganda enganosa, vendas casadas e outras práticas de
marketing desonestas.

Um pouco utópica, mas que nos indica que, apesar de não fazer parte da cultura
brasileira, percebe-se uma preocupação em transformar a “cultura da mais valia” ou da
lucratividade acima de qualquer coisa, em valores que possam ser refletidos. E mostra a
responsabilidade social como algo bem mais complexo do que se costuma pensar, reunindo,
portanto, uma série de variáveis. Compreender esse novo aspecto da empresa é perceber a
(co)participação na mudança de postura socialmente saudável, como consequência das
mudanças nas estruturas organizacionais.
Archie Carrol diz que esta responsabilidade deve ter necessariamente um respaldo
econômico, legal e ético, concentrando-se, em princípio, na questão dos custos:

[...] no envolvimento social da empresa, seja com os empregados, com as pessoas


que estão ligadas tecnicamente à empresa ou com a sociedade, a grande questão é
mesmo quanto custa à adoção de comportamentos socialmente responsáveis e não o
simples fato de adotar tais comportamentos. 18

4. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A problemática relativa às relações entre empresas, ética e sociedade, como podemos


ver, emergiu no início da década de 1960. Segundo Maria Priscilla Kreitlon, a produção
acadêmica nesse campo cindiu-se em três tipos de abordagens, ou escolas de pensamento,
bastante distintas: a Business Ethics, matriz e precursora de todas elas, identificável por sua
natureza normativa; a Business & Society, de orientação sociopolítica e contratual; e a Social
Issues Management, abordagem de cunho instrumental, voltada para a gestão estratégica das
questões éticas e sociais.19

18 CARROL apud VACCARIN, Graciela. Responsabilidade social empresarial: o caso da WEG. 2009.
83 f. Monografia (Bacharelado em Administração de Empresas) – Centro Universitário Balneário
Camboriú, Universidade do Vale do Itajaí, Balneário Camboriú, 2009. p. 31.
19 KREITLON, Maria Priscilla. A Ética nas Relações entre Empresas e Sociedade: fundamentos

teóricos da responsabilidade social empresarial. Disponível em:


<http://contemporanea2008.wikispaces.com/file/view/ANPAD+2004+-+Priscilla+Kreitlon.pdf>. Acesso
em: 17 dez. 2010.
75

Vê-se nas escolas citadas acima que as perspectivas partem de campos distintos de
abordagens quanto aos aspectos relacionados à ética e ao compromisso social que são
desenvolvidos em âmbito empresarial. A perspectiva conhecida como ética empresarial
(Business Ethics) no que diz respeito às suas aplicações específicas, comporta um elemento
filosófico normativo, o qual se centra em questões valorativas e em análises morais. Já a
corrente conhecida como mercado e sociedade (Business & Society) compreende um viés
sociopolítico que implica uma abordagem contratual dos problemas surgidos entre
determinadas empresas e certos setores da sociedade. Por sua vez, o ramo designado como
escola da Gestão de Questões Sociais (Social Issues Management) caminha pelo utilitarismo,
e considera as questões sociais como variáveis que devem ser entendidas dentro das
aplicações de gestão e estratégia.
O conhecido ditado, colocado na boca de Benjamin Franklin, “tempo é dinheiro”,
tornou-se corrente no século XIX com o taylorismo. A produção foi elevada à fonte máxima
de lucratividade. Ainda que discutível, segundo nossa leitura, a produção em massa e a
atividade comercial apresentam-se em condições peculiares e sua dinâmica parece algo que
mutável e, ao mesmo tempo, resistente às barreiras, criando, concomitantemente, novos
padrões de comportamentos sociais.
Na modernidade, a proposta industrial desencadeou uma ética utilitarista, efetivando a
total e absoluta normatização de trabalhadores eficientes para a formação do “processo
civilizador”, ou seja, da sociedade de produção em massa. O taylorismo implica a ocupação
trabalhista com registro cronometrado, estipulando, assim, a otimização na execução
produtiva na obtenção de metas. 20
O taylorismo representa no século XIX o tipo de organização patronal de controle
gerencial com intensificação da produtividade individual, tanto em termos qualitativos quanto
em termos quantitativos. Isso significava, de maneira prática, o aproveitamento máximo e
acelerado do ritmo dos processos de trabalho na fábrica e, consequentemente, a redução do
tempo “morto”, isto é, produção máxima e aproveitamento amplo da capacidade de ação de
um trabalhador. Como analisou Marx em sua obra máxima, O Capital, a produção exigia a
aproveitamento completo da força e do vigor das pessoas empregadas, do pai, da mãe e dos
filhos.21 Eram carne, sangue e nervos aproveitados até a sua obsolescência funcional.

20 BÉLENS, Jussara Natália Moreira; MACHADO, José Charliton. Formação profissional feminina em
uma nova configuração ético-social em Campina Grande-PB (1960-1970). Disponível em:
<www.histedbr.fae.unicamp.br/acer_histedbr/.../lQpZKQRK.doc>. Acesso em: 20 nov. 2010.
21 MARX, Karl. O capital: livro primeiro: o processo de produção do capital. 7. ed. São Paulo: Difel,

1982.
76

De outra maneira, o fordismo se caracterizava pela aceleração da cadência e o


aproveitamento do tempo de trabalho, em termos de coletivo, uma vez que as tarefas eram
agora divididas. A estratégia fordista se concentrava na racionalização dos processos de
produção. O tipo de divisão era feito de maneira a tornar cada etapa o mais simples possível,
visando com isso rapidez na consecução de um conglomerado inter-relacionado pela
consequente linearidade dos processos de industrialização. A divisão do trabalho conquistou
com o fordismo uma etapa revolucionária, pois com a racionalização do trabalho e a divisão
como fator estratégico fundamental, a produção em massa conduziu a fase de estranhamento
realizada pelo trabalhador ante os processos na fábrica ao limite máximo, ou seja, o fordismo
conseguiu realizar de modo espetacular o processo de alienação dos trabalhadores. A linha de
montagem retirou do trabalhador os últimos resquícios de entendimento de que a coisa
produzida era resultante da sua força de trabalho. A alienação agravada produziu
consequências catastróficas, em sentido ético, na percepção das pessoas que se envolviam nos
processos de produção. Deu-se então a entrada no período conhecido como cultura das
massas, em que todas as coisas passaram a ser avaliadas a partir da noção de mercadoria.
Percebe-se que nas visões tecnicistas e utilitaristas do ser humano, as quais
condicionam os comportamentos pelo campo do que funciona e do que vende, a ética e a
moral contemplam o entendimento das ações ou dos costumes de determinada época social
sob a perspectiva da realização e da racionalização dos objetivos. Tudo acaba por ser reduzido
epistemologicamente à normatização da compra e da venda, da mercantilização e da
mistificação dos espaços de convivência. A determinação de um tipo de comportamento
social e a gestão de pessoas, dentro desta esfera, condiciona o entendimento dos
comportamentos na direção dos problemas elencados nas problemáticas das organizações
como lugares, eminentemente, gestacionais. O ser humano/trabalhador orienta suas decisões
dimensionando “liberdade”, “consciência”, “bem”, “valor”, etc, com os problemas de ética
profissional, ética política, ética social ou dos grupos sociais nas organizações. Trata-se de
perscrutar as implicações sociais sob um olhar da lógica gestacional.
As práticas filantrópicas e de responsabilidade social efetuadas por empresas, na
atualidade, são desenvolvidas pela ótica da gestão. Isso significa literalmente que as ações
sociais praticadas por empresas desenlaçam os nós efetivados pelas situações contraditórias
que este tipo de empresa traz consigo - aí poderíamos ressaltar as empresas como as que
fazem grandes empreendimentos provocando grandes impactos ambientas e de mobilidade
urbana. As questões levantadas pelos grupos da “sociedade civil” e consideradas
problemáticas, como o desmatamento, a poluição, a parasitação social – exploração da mão de
77

obra em um determinado contexto com a isenção fiscal e auxílios vários de origem


governamental – e a insalubridade, entre outras coisas, são enfrentadas a partir do viés da
gestão administrativa de empresas. Considera-se como responsabilidade social aquele
comportamento “antimaximização de lucros” que uma empresa assume para, supostamente,
beneficiar pessoas que fazem parte da comunidade e não “diretamente” os acionistas de uma
determinada empresa. Essa tradução do que seja responsabilidade social é racionalista e,
acima de qualquer coisa, funcional. É uma contradição em si imaginar que de alguma forma
uma empresa abrirá mão de parte, por pequena que seja, de seus lucros.
Trata-se de lucrar também com uma propaganda social e politicamente correta. A
maximização não é elevada aos últimos níveis, sendo deixada parte de determinados lucros
para o investimento em projetos sociais que beneficiem a sociedade como um todo e
diretamente a comunidade na qual está localizada a empresa. O que está em evidência é a
estratégia de boa convivência com o meio social em que funciona uma determinada empresa.
A ética nestes parâmetros fica à deriva e as circunstâncias geopolíticas e sociais moldam os
contornos da atuação. Realiza-se um jogo de atuações em que a empresa, a sociedade e o
Estado se relacionam de forma a manter a dinâmica sociometabólica entre as instâncias
político-culturais de consciência populacional – a moral estabelecida e vigente entre as
pessoas de uma determinada localidade – e as relações de interesse que surgem nos muitos
âmbitos, desde a gerência da empresa e do grupo político-partidário no poder do Governo
Federal, nos Estados e municípios até às formas mais simples de empreendimentos –
prestadores de serviços – atrelados aos processos de propaganda e realização. É uma cadeia de
situações e de empresas – grandes, médias e pequenas – sem falar nos prestadores de serviços
autônomos, que é envolvida.
A ética em gestão se configura em uma dinâmica social que não pode ser restringida a
um aspecto somente da problematização das questões de gestão de empresas (ressalto: pública
ou privada). A cada situação vivenciada novas configurações se delineiam e perpassam as
muitas situações que são sistêmicas, ou seja, envolvem um número muito grande de atores
que estão relacionados em forma de rede e a cada situação corresponde, em grande parte dos
casos, a subsistemas que possuem lógicas muito específicas. Na área de gestão de empresas,
não é possível compreender uma atuação ética a partir de um único modelo e de um único
viés. As situações são cambiantes e se tornam sujeitos dos processos atores diretos e indiretos,
sendo enviesadas todas as percepções ingênuas e puritanas de ética.
A responsabilidade social empresarial, por si só, nos dá uma sensação de apelo de
ética em gestão, que para nosso tempo atual (contemporâneo) ainda esta pautada no modelo
78

de processo industrial dominante do século XX, o fordismo, onde não pode deixar de
considerar em momento algum a fator decisório. A decisão se torna, neste processo, um
veículo imprescindível na manutenção do sistema, ou seja, decisões precisam ser tomadas; e
sempre alguém acaba sofrendo as consequências destas decisões. A empresa fordista e, depois
toda e qualquer empresa baseada no sistema de produção e reprodução da vida, é constituída
em processos decisórios. A vida diária de uma empresa é marcada pelas decisões de comprar,
vender, fornecer, contratar, despedir, processar, incentivar, otimizar, etc. A decisão é
fundamental.
A responsabilidade social empresarial, cumpre o fardo da otimização de pessoal que
percorre critérios estabelecidos pela legislação e pela lógica de mercado, ficando a dinâmica
da boa gestão à porosidade sociocultural necessária que cabe a uma empresa socialmente
responsável, e politicamente correta.

REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Maria Duque Caçador. O papel do profissional de


responsabilidade social empresarial: seus referenciais e desafios. 2008. 284 f.
Dissertação (Mestrado em Administração) – Programa de Pós-Graduação em
Administração, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2008.

ARREBOLA, Marcelo Correia. Responsabilidade social corporativa: competitividade e


desenvolvimento social: a prática do setor supermercadista. In: IV SEMEAD. Estudo de caso:
gestão ambiental. Disponível em:
<http://www.ead.fea.usp.br/semead/7semead/paginas/artigos%20recebidos/Socioambiental/S
A27_Resp_Social_Corporativa_Competivividade.PDF>. Acesso em: 2 dez. 2010.

ÁVILA, F. B. de. Pequena enciclopédia de moral e civismo. Rio de Janeiro: MEC, 1967.

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81

TERRITÓRIO GEOGRÁFICO E TURISMO

Leandro Carvalho de Almeida Gouveia1

RESUMO

Esse artigo pretende refletir acerca do Território Geográfico Turístico e Estado e do


Território. A abordagem econômica e ambiental tem como base a ideia de que o
turismo tenha um desenvolvimento de uma maneira muito semelhante aos padrões
históricos e da dependência econômica. Por meio dessa visão, a indústria é tão
fortemente governada por determinantes políticos e econômicos que pouca atenção é
direcionada aos outros aspectos.
O ser humano presente no mundo, e que forma sociedades, habita um território e é
desejoso de divulgar o desenvolvimento, que requer um planejamento para orientar
de forma correta as ações que serão empreendidas, com a participação das esferas
privada e pública. Tais ações devem buscar obter uma sustentabilidade em termos
sociais, com a participação de todos numa gestão integrada, inclusive dos atores locais,
de modo a que as ações também correspondam às expectativas da população nativa.

Palavras-chave: Estado. Território Geográfico Turístico. Estado

1
Doutorando em Desenvolvimento Regional e Urbano pela Universidade Salvador
(UNIFACS); Mestre em Desenvolvimento Humano e Responsabilidade Social pela
Fundação Visconde de Cairu. Pesquisador pela (UNIFACS). Tem experiência na área
de Turismo, Desenvolvimento Regional e Urbano, Desenvolvimento Humano e
Responsabilidade Social, Geografia com ênfase em Turismo.
leandrocgouveia@gmail.com

1. INTRODUÇÃO

Este artigo versa acerca do Território Geográfico turístico e Estado. Essa análise
leva em conta os diversos fatores que atuam modificando o território, tais como:
naturais, artificiais, pessoas, empresas, governo e turistas. Esses agentes, juntos aos
nativos em contato com o território, alteram o espaço.
O escopo teórico central está embasado em Guerreiro Ramos (1996), Milton Santos
(1986, 1994, 1997, 2000, 2001) e Carlos Beni (2003, 2006), estruturado em temáticas
de fundo: a sustentabilidade, as interações no território e o novo paradigma, um
conceito de território, dinâmico e agregador.
82

Vários são os aspectos agindo no território, entre eles o econômico, pois não se
pode fugir da força do sistema de mercado. É preciso compreender que o mundo vem
passando por transformações que se manifestam no desenvolvimento regional.
O Brasil se insere nesse contexto quando reestrutura a sua economia e seu modelo
produtivo nos anos de 1990, com medidas inauguradas ainda no fim dos anos de 1980,
com a nova Constituição, seguidas pela abertura comercial do governo Fernando
Collor. Seguem-se as reformas do papel do Estado e o plano de estabilização
econômica, desenvolvidos nos governos de Itamar Franco e Fernando Henrique
Cardoso (SILVA, 2007). Somente compreendendo o sistema produtivo nacional é que
podem ser desenvolvidas as políticas sociais aplicáveis e possíveis de serem alcançadas
com sucesso no território.
Nesse início de milênio, observa-se que o mundo transforma-se de maneira
dinâmica e também que as teorias e políticas de desenvolvimento regional e local
sofrem profundas transformações, em razão das modificações ocorridas nos processos
produtivos, aliadas ao persistente declínio de regiões fortemente industrializadas e a
rápida ascensão econômica de novas regiões (FONSECA, 2006).
O problema consiste em verificar a atualização e aplicação do conceito de território em
consonância com a contemporaneidade, acrescentando ao território o fundamento
agregador. Em outras palavras, no modelo apresentado por Ramos (1996) o mercado é
regulado e restrito na sua liberdade, coexistindo com outros espaços sociais nos quais
os indivíduos buscam sua realização pessoal e o enriquecimento de suas vidas. Esse
autor entende que esse novo paradigma é necessário por causa das consequências
nocivas que essa hegemonia do sistema de mercado tem acarretado para a saúde
psíquica dos indivíduos, para a vida coletiva como um todo e para a conservação dos
recursos naturais, principalmente, os não renováveis (AZEVEDO; ALBERNAZ, 2004).
Para que o crescimento autossustentável, ou a sustentabilidade, ocorra é
preciso que haja emparelhamento entre o econômico e o social. Na prática, o
desenvolvimento social não ocorre na mesma amplitude que o econômico, pois este
último concentra-se nas empresas externas. Ocorre que, segundo Luzon (2001), o
conceito de desenvolvimento evoluiu a partir da década de 1970, não se vinculando
apenas à economia na medida em que se considera que o processo é econômico,
social, político, ambiental e cultural. Para fazer este estudo, o território foi
compreendido a partir do conceito que privilegia uma amplitude de fatores:
O território não é apenas um conjunto de formas naturais, mas um conjunto de
setores naturais e artificiais, junto com as pessoas, as instituições e as empresas que
abriga, não importa o seu poder. [...] o território deve ser considerado em suas
divisões jurídico-políticas, suas heranças históricas e seu atual conteúdo econômico,
financeiro, fiscal e normativo. (SANTOS, 1997, p. 3).
O mundo passa a ser um território onde acontece de fato a ocorrência de uma
profunda inter-relação entre si, como também o ser humano é visto ao mesmo tempo
83

como um ser no mundo e ser do mundo, inserido no contexto do território agora


globalizado.
Na atualidade, acontece uma grande mudança em várias esferas do
relacionamento humano no mundo dessa modernidade que chegou tarde, e estamos
vendo mudanças importantes nesse processo de transnacionalização do território.
“Mas, assim como antes tudo não era, digamos assim, território ‘estatizado’, hoje tudo
não é estritamente ‘transnacionalizado” (SANTOS, 1994, p. 15). Visto isto, nos lugares
onde o processo de globalização chega de forma cada vez mais correta, os territórios
habitados, por outras tessituras, a partir de novas redes de fortes, colocam uma
imposição no processo de globalização, a sua revanche, isto é, outro convite para um
novo embate.

2. TERRITÓRIO É MAIS QUE ESPAÇO

Para Santos (2000), a compreensão da totalidade epistemológica da geografia


do espaço busca compreender essa situação total de um certo período, ou seja, o
período histórico desde o final da Segunda Guerra Mundial até o período vigente.
Santos (1994) afirma que, neste caso da economia na sua formação e social de certa
forma ajudar na construção de um melhor entendimento da questão do espaço
geográfico. De acordo com esse autor, não se deve falar da lei sem falar da evolução
das formações espaciais, além da criação socioespacial. O espaço não desapareceu
com o crescimento do mundo moderno, mas houve uma pequena mudança na sua
qualificação.
De acordo com Santos (1994), estamos vivendo um grande momento das
nossas durante a história, temos a opção de uma totalidade empírica na qual temos
uma nova situação da natureza. Nesse caso, o mais importante é a criação do homem,
a selva de pedra. Temos as situações das as três unicidades como dados para a
construção desse momento: a convergência dos momentos, a unicidade técnica e a
unicidade do motor.
O autor coloca ainda que vamos encontrar em todos os lugares a dialética.
Claro que temos as divergências e outras opiniões, nesse atual momento global que
vivemos, nem tudo é positivo, o lugar e o espaço mundial existe apenas como
metáfora. Conforme afirma Santos (1994), quanto mais os lugares se globalizam, torna
cada vez parecido no ponto de vista nas questões importantes do território têm em
um determinado lugar, não poderemos ter igual em outro lugar. Podemos ver que, no
atual mundo moderno, temos várias fragmentações.
Santos (1994) faz uma sugestão de revermos alguns pontos que podem ser
importantes para fazer uma divisão regional do país, vendo a realidade de cada lugar
como algo que deve mudar, tendo uma estrutura antiga. Afirma que é importante ter
uma classificação tendo critérios quanto aos impactos que devem acontecer nesse
84

território, já que com a mudança na cidade deveria se pensar de outra forma, com
mais cuidado em todos os pontos e requisitos.

É importante levar em consideração a organização do que é produzido,


normalmente tem sua história da sua população de onde vive. Santos (1994) sugere
dividirmos em três grandes regiões, mostrando o conceito de Região Concentrada.
Nesse caso, acontecem as inovações, que foi mais veloz e complexa, tendo uma
sequência de renovação das forças de produção além do território, que representa
uma enorme rapidez para as coisas que precisam efetuar na parte da sua economia, de
acordo com as Regiões Sudeste, Sul e partes da região Centro-Oeste.
Temos as questões dos conceitos de circuitos espaciais da produção, que
constroem um par dialético com estes círculos na sua cooperação, e o da Região
Concentrada.
Santos (2001 apud MÜLLER, 2006) enfatiza que a ideologia capitalista é
concretizada e consolidada por meio de empresas transnacionais, que, de posse da
tecnologia da informação, puderam extrapolar as fronteiras de seus países de origem e
passaram a atuar no espaço internacional. Os motivos que levaram essas empresas
transnacionais a ampliarem suas áreas de atuação estão relacionados à crise que o
capitalismo enfrentou na década de 1970, e que provocou a queda do lucro. Para
manter a perpetuação da acumulação, essas empresas precisaram baixar o custo da
produção e conquistar novos mercados consumidores para seus produtos. Isso só foi
possível porque elas passaram a descentralizar o processo de produção e foram
produzir em lugares que ofereciam melhores condições que seus países de origem,
como, por exemplo, a utilização de mão de obra mais barata.
Podemos ver nesse caso que o conceito de circuito espacial da produção foi
abordado por Santos (1986): está claro que “os circuitos espaciais da produção nos dão
a situação relativa dos lugares, isto é, a definição, num dado momento, da respectiva
fração de espaço em função da divisão do trabalho sobre o espaço total de um país”.
Nesse caso, podemos ver as relações de produção social, as relações sociais de
produção, que acontecem entre as firmas e entre as relações de produção do passado,
tendo sua continuação no presente, mantidas pelas pessoas do lugar.
O equilíbrio pretendido entre a atividade humana e o desenvolvimento e a
proteção do ambiente exige uma repartição de responsabilidades equitativas e
claramente definidas com relação ao consumo e ao comportamento face aos recursos
naturais. Isso implica a integração de considerações ambientais na formulação e
implementação das políticas econômicas e setoriais, nas decisões das autoridades
públicas, na operação e desenvolvimento dos processos de produção e nos
comportamentos e escolhas individuais. Implica igualmente a existência de um diálogo
real e a pactuação de ações de parceiros que podem ter prioridades de curto prazo
diferentes; tal diálogo terá de ser apoiado por informação objetiva e crível.
85

3. A INTERVENÇÃO SUSTENTÁVEL É IMPOSITIVA

Beni (2006) entende que as ações antrópicas, no caso dos impactos negativos nos
ecossistemas, mudaram a situação, e atualmente não temos limites geofísicos e
socioculturais, mas praticamente temos em toda a humanidade.
Em relação ao assunto ecologia, que começou o terreno para o exame dessas inter-
relações, o que podemos ver na atualidade como destaque e relevância é o turismo
sustentável. Nesse caso, abriga desde infindos posicionamentos políticos e
geoestratégicos até interesses imediatos para navegar nesse tema, que é muito
importante, e fluido em seus aspectos práticos na questão da segunda maior indústria
do mundo, que é o turismo.
Podemos perceber que na questão do equilíbrio pretendido entre a atividade humana
e o desenvolvimento e a proteção do ambiente deve haver participação de todos na
questão das responsabilidades, que devem ser bem definidas com relação ao consumo
e ao comportamento face aos recursos da natureza. Para isso acontecer, deve haver
boas políticas econômicas e setoriais nas decisões das autoridades públicas, na
operação e desenvolvimento dos processos de produção e nos comportamentos e
escolhas individuais para participar. Claro que deve haver um diálogo real e as regras
de ações dos colaboradores devem priorizar fazer num pequeno tempo, cada um com
o seu tempo, e esta conversa deverá ser apoiada por informação objetiva.

Cardoso (2005) tem uma opinião em relação ao turismo sustentável:

O conceito de turismo sustentável passou por


uma série de transformações até chegar à
proposta atual em que se crê que todo tipo de
empreendimento pode ter como objetivo a
sustentabilidade. Os empreendimentos
hoteleiros conhecidos como resorts – vistos,
tradicionalmente, como uma forma de
hospedagem insustentável do ponto de vista
social – foram escolhidos como objeto desta
pesquisa que tem como objetivo explorar como
este segmento da indústria hoteleira vem
respondendo à nova proposta inclusiva do
conceito de turismo sustentável.

Cardoso (2005) está correto quando coloca que há várias opiniões, de vários autores, e
a preocupação da rede hoteleira com o meio ambiente.
Visto isso, a palavra sustentabilidade deve refletir uma política e estratégia de
desenvolvimento social e econômico de forma que aconteça sempre não prejudicando
86

o local e a natureza. Dessa qualidade depende a continuação do ser humano, além da


responsabilidade com o crescimento.

Podemos ver claramente a preocupação crescente em relação à sustentabilidade das


atividades turísticas. Levando em consideração a importância da indústria do turismo,
esse tema vem ganhando espaço em pesquisas, seminários e publicações no Brasil e
em todo o mundo.
Beni (2003) destaca que todos os pesquisadores e autores que se dedicam ao estudo
do tema são unânimes na questão da sustentabilidade, de que algo deve ser feito
agora e depois, para as futuras gerações do planeta Terra, que gere valor agregado por
meio de boas leis para a população e para o local, dando a inclusão, além da questão
social, nesse processo, para desenvolver a cidade com uma gestão integrada.
É fundamental ter essa preocupação com o meio ambiente e com as pessoas que
moram no local, na cidade, no estado. Deve sempre haver diálogo com todos, para
preservar e para que as pessoas, no futuro, encontrem um bom lugar para viver.
Vemos o crescimento da parte artificial do nosso meio ambiente, resultando de certa
maneira na tecnoesfera, marcada pela presença de enormes objetos geográficos,
pensados e feitos pelo homem, havendo uma parceria entre ambos, algo muito
importante. Realmente podemos justificar essas técnicas que mostram ser correto
para a explicação do espaço e, de certa maneira, uma direção epistemológica para a
Geografia é pensá-la como Filosofia das Técnicas no atual momento.
Para Beni (2003), podemos perceber que toda sua obra refere-se às formulações sobre
os aspectos e faces da desigualdade nos países mais pobres, além dos impactos e
repercussões sobre o território e o espaço. São características desse momento: os
estudos sobre a estrutura interna da cidade; o processo de urbanização; e o estudo da
rede urbana nos países pobres. O grande destaque é para os países da América Latina,
onde o autor fundamenta as bases de seu trabalho, mas há também exemplos dos
outros continentes subdesenvolvidos, especialmente de países africanos.
O autor está correto quando coloca a estrutura interna da cidade, dando certo
destaque para os países africanos.
Para que o crescimento autossustentável, ou a sustentabilidade, ocorra é preciso que
haja um certo emparelhamento entre a parte social e a econômica. Nesse assunto, a
prática do desenvolvimento social não ocorre na mesma amplitude que o econômico,
pois este último concentra-se nas empresas externas. Ocorre que, segundo Lúzon
(2001), podemos dizer que o conceito de desenvolvimento evoluiu a partir da década
de 1970, não se vinculando apenas à economia, tendo outros fatores para se
considerar, já que o processo é econômico, ambiental, político, cultural e social.
De acordo com Beni (2003), temos que lembrar, de certa forma, a parte da história dos
problemas do meio ambiente, além da sua evolução para os momentos atuais, para
criar o conceito de desenvolvimento sustentável e turismo:
87

• 1972 – Conferência da ONU sobre Meio Ambiente Humano, em Estocolmo:


primeira iniciativa do gênero para examinar a questão de maneira global e coordenada
na busca de soluções para os problemas existentes e definir linhas de ação para a
problemática ambiental.

• 1974 – Ignacy Sachs e sua equipe interdisciplinar, sediada no Centre


International de Recherche sur l’Environnment et le Dévéloppement (CIRED),
reelaboram a questão do ecodesenvolvimento, criada em Estocolmo em 1972,
ampliando e diversificando seus horizontes.

• 1974/1975 – Com a Declaração de Cocoyoc, de 1974, e o Relatório Que Faire,


apresentado no final de 1975 pela Fundação Dag Hammarskjold, por ocasião da 7ª
Conferência Extraordinária das Nações Unidas, reutilizaram-se as ideias de Sachs e sua
equipe, sem utilizar, contudo, o termo ecodesenvolvimento de forma explícita, mas as
expressões “um outro desenvolvimento” e “desenvolvimento sustentado”.

• 1982 – Em Nairóbi, Quênia, sede do Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA), realizou-se reunião comemorativa do 10º aniversário da
Conferência de Estocolmo, quando se procedeu à avaliação dos resultados até então
obtidos e a um exame da mudança de percepção da problemática ambiental.

• 1983 – Em resposta a uma decisão da Assembleia Geral da ONU, foi


estabelecida a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida
pela norueguesa Gro Brundtland. O objetivo amplo foi reexaminar a questão
ambiental, inter-relacionando-a com a questão do desenvolvimento, e propor
programas de ação. Quatro anos depois se elaborou o relatório final da comissão,
intitulado Nosso Futuro Comum, conhecido também como Relatório Brundtland.
Desse relatório surge com mais força a expressão “desenvolvimento sustentável”, com
intenção de despertar a conscientização pública e evidenciar a necessidade de um
melhor gerenciamento do meio ambiente para sustentar o planeta Terra.

• 1992 – Muitas da ideias e percepções do Relatório Brundtland foram discutidas


na Rio-92. Entre as principais destacam-se: a Carta da Terra, uma declaração de
princípios básicos a serem seguidos por todos os povos com respeito ao meio
ambiente e ao desenvolvimento; e a Agenda 21, um plano de ação com as metas
aceitas universalmente para o período pós-1992 e entrando pelo século XXI.

• Em abril de 1995, por iniciativa da ONU, realiza-se a Primeira Conferência sobre


Turismo Sustentável, em Lanzarote, nas Ilhas Canárias. Foi patrocinada pelo Programa
Ambiental dessa mesma organização, pelo Programa sobre o Homem e a Biosfera da
UNESCO e pela OMT.
88

Percebemos a preocupação real nesse momento em relação ao meio ambiente,


como os países devem cuidar da sua preservação e do bem-estar da população.

De acordo com Beni (2003), a partir de Estocolmo até a Rio-92 houve destaque
para a questão do aumento da produção de armas em boa parte do mundo,
produzidas com a riqueza dos países que têm uma indústria forte, países
desenvolvidos no norte, além dos países do terceiro mundo, do Sul. Claro que esses
países estão em desenvolvimento. Foi possível ver nesse evento a introdução de novos
conceitos, surgindo um certificado para o meio ambiente, tendo atuação responsável e
gestão ambiental. Tudo isso procurava ter uma postura reativa, que marcava de certa
maneira uma relação com os empresários, com a parte pública, para ter ordenamento,
normalização, legislação e fiscalização, e as instituições ambientais, notadamente o
terceiro setor, na outra parte.
Conforme nova atitude baseada em relação ao assunto responsabilidade
solidária, que deixa para outro momento as preocupações com multas, que com o
tempo tendem a ser trocadas por um maior cuidado em relação com a imagem da
parte privada, isso faz com que haja uma valorização e reconhecimento de seus
programas em prol do meio ambiente, que sejam bem vistos pelas pessoas.
De acordo com Beni, (2003), na década de 1990 se assiste também a entrada
em vigor das normas britânicas: (BS 7750) Especification for Environmental
Manageman Systems, que serviram de base para a elaboração de um sistema de
normas ambientais em nível mundial. A entrada em vigor dessas normas internacionais
de gestão ambiental, denominadas de série ISO 14000, e sua já anunciada integração
futura com as normas de gestão de qualidade (ISO 9000), constituíram o coroamento
de uma longa caminhada em direção à conservação do meio ambiente e ao
desenvolvimento em base sustentável.
Essas normais elaboradas pelos britânicos foram muito importantes, e ajudaram na
conservação do meio ambiente e na questão do desenvolvimento.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ótica deve ser direcionada para oferecer um planejamento que constitua um


novo modelo para políticas governamentais, com estratégias concretas de intervenção
corretivas, baseadas nos postulados interdependentes de eficiência econômica,
equidade social e prudência ecológica. E um novo critério de racionalidade social,
baseado na crítica ao efeito de externalização de custos socioambientais, exercido pelo
modelo puramente econômico, sobretudo quando este planejamento é participativo,
com atores sociais, agentes e reagentes, com uma visão contratual do meio ambiente.
O planejamento participativo recupera a participação social da sociedade, de modo
que o cidadão contribua na elaboração das ecoestratégias, desde a informação até a
89

execução da ação proposta, transformando a sociedade civil num terceiro sistema, à


medida que toma consciência de si mesma e começa a interpelar-se e a conhecer-se.

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Estadual de Maringá, 2007.
91

A EMENDA CONSTITUCIONAL N˚ 81/2014: UM IMPORTANTE


INSTRUMENTO PARA A ERRADICAÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO NO
BRASIL.

THE CONSTITUTIONAL AMENDMENT N˚ 81/2014: AN IMPORTANT TOOL


FOR SLAVE LABOR OF ELIMINATION IN BRAZIL.

AdssonJosé Rodrigues Luz1.


Samuel Correa Duarte2.
StéfannyKarinny Souza França3.
RESUMO

O presente estudo é o resultado de análises bibliográficas e quantitativas, a partir da análise de estatísticas


produzidas pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e
tem como objetivo a análise de questões relativas trabalho escravo no campo, com ênfase para a análise
das politicas publicas de enfrentamento ao trabalho escravo no Brasil, com ênfase á análise dos efeitos da
Emenda Constitucional N˚81/2014, apelidada de “P.E.C DO TRABALHO ESCRAVO” e sua relação
com as Leis Penais e processuais Penais Brasileiras.

PALAVRAS CHAVE: Trabalho escravo, erradicação, Brasil, Políticas Públicas.

ABSTRACT: This study is the result of a literature review and quantitative analysis, based on the
analysis of the statistics produced by the Pastoral Land Commission (CPT) and the International
LabourOrganisation (ILO) and aims to discuss issues on slave labor field, with emphasis on the analysis
of public policies to deal with slave labor in Brazil, with emphasis will analyze the effects of
Constitutional Amendment N˚81/2014, known as the "SLAVE LABOR P.E.C" and its relation to the
laws and the Brazilian penal criminal proceedings.

KEYWORDS: Slave labor, eradication, Brazil, public policy.

1. INTRODUÇÃO

1 Mestrado em Desenvolvimento e Planejamento Territorial pela Pontifícia Universidade


Católica de Goiás (PUC Goiás); licenciado em Geografia pela Universidade Federal de Goiás
(UFG); Bacharel em direito pela Sociedade Objetivo de Ensino Superior (SOES/IUESO),
professor nas redes pública e privada de ensino e advogado militante nas áreas trabalhista e
criminal. E-mail adssonluz@hotmail.com

2 Mestrado em Desenvolvimento e Planejamento Territorial pela Pontifícia Universidade


Católica de Goiás (PUC Goiás); Mestrado em Ciência Política pela Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) área de concentração Política Internacional e Comparada; licenciado em
Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) área de concentração:
Sociologia; Professor assistente da Fundação Universidade Federal do Tocantins. E-mail
samuelcorrea@mail.uft.edu.br

3 Bacharel em Direito pela Faculdade Cambury; funcionária pública municipal na cidade de


Goiânia-Goiás. E-mail sksf_@hotmail.com
92

A escravidão moderna é o resultado da convergência de dois fatores, o trabalho


degradante e o cerceamento da liberdade.Ambos elementos consistem em fatores pré-
capitalistas que conseguem responder às demandas de um tipo específico de
capitalismo: aquele no qual o desenvolvimento de um mercado interno não é o foco
central da atividade econômica, de modo que a formação de uma classe trabalhadora
assalariada e livre não está em pauta nesses contextos.
O sistema que garante a continuidade do trabalho escravo no Brasil, sobretudo
no campo, apoia-se em duas questões básicas: de um lado certeza da impunidade de
crimes contra os direitos humanos fundamentais, aproveitando-se da vulnerabilidade de
milhares de brasileiros, que para garantir sua sobrevivência, se deixam levar por
promessas fraudulentas de trabalho decente e bem remunerado. De outo lado, a
ganância de empregadores que exploram essa mão-de-obra contando com a
intermediação de aliciadores chamados “gatos” e como o apoio de milícias armadas,
formadas por “jagunços” e outros capangas.
Pouco mais de uma década se passou desde o início das conferências que
culminaram com a criação do Programa Nacional de Direitos Humanos-3 (PNDH-3) em
2009, como meta de universalização dos direitos e garantias fundamentais aos cidadãos
brasileiros, dentre as quais destacamos a luta pela erradicação do trabalho escravo no
país4. Nesse interim, o Brasil tem demonstrado importante liderança na luta contra o
trabalho escravo, sendo, inclusive, considerado como referência mundial a este tipo de
crime.
O presente estudo é o resultado de análises bibliográficas e quantitativas, a partir
da dedadosestatísticos produzidas pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pela
Organização Internacional do Trabalho (OIT) e visa dar continuidade a nossas
pesquisas, que resultaram na elaboração de dois trabalhos: “Aspectos gerais sobre o
tráfico de pessoas” apresentado na Semana de Ciência e Tecnologia da Pontifícia
Universidade Católica de Goiás, realizada em Goiânia os dias 28 e 31 de outubro de
2014 e “Tráfico de seres humanos: a escravidão dos tempos modernos”, publicado no
XV Encuentro de Geógrafos de América Latina, realizado em abril de 2015 na cidade
de Havana, Cuba, contemplando temas como: a conceituação de trabalho escravo, sua

4
O PNDH-3 também discutuiu temáticas como questões relativas à segurança alimentar, educação, saúde,
habitação, igualdade racial, direitos da mulher, juventude, crianças e adolescentes, pessoas com
deficiência, idosos, meio ambiente etc. Seu objetivo é servir de roteiro ao Estado brasileiro na busca pela
efetivação dos direitos humanos. In BRASIL. Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência
da República.Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Brasília: SEDH/PR, 2010. P. 13
93

relação com o tráfico de seres humanos, as dinâmicas territoriais e o modelo econômico


neoliberal, o perfil dos trabalhadores escravizados, as áreas de maior incidência e as
atividades com o maior número de registros de trabalho escravo no Brasil,as políticas
públicas de enfrentamento ao trabalho escravo no Brasil, com ênfaseà análise dos
efeitos da Emenda Constitucional N˚81/2014, apelidada de “PEC do Trabalho Escravo”
e sua relação com as Leis Penais e processuais Penais Brasileiras.

2. CONCEITO DE TRABALHO ESCRAVO NO DIREITO BRASILEIRO

O sistema jurídico brasileiro, baseado no sistema de “freios e contrapesos” dos


instrumentos penais exige uma caracterização clara das ações a fim de delimitar os
limites do exercício do poder punitivo do Estado. Desta forma, delimitar um conceito de
trabalho escravo é de fundamental importância para o controle jurisdicional Estatal.
Entretanto, a tarefa de definir o que consiste ou não a exploração da mão-de obra-
escrava, diferenciando-a das formas legais de exploração do trabalho, não é uma tarefa
das mais simples. Evidentemente, a conceituação de escravidão moderna é bem
diferente das práticas durante a antiguidade ouno período colonial. A atual conceituação
de escravidão considera o aviltamento da dignidade humana, e neste aspecto, várias
práticas hodiernas desrespeitam um amplo espectro dos direitos humanos fundamentais,
referentes à liberdade e ao mundo do trabalho, podendo ser consideradas análogas à
escravidão. A cautela em uma conceituação jurídica bem determinada está justamente
neste ponto, pois o desenvolvimento econômico e social tende a alterar as circunstâncias
em que acontecerá a exploração do trabalhador.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a forma de escravidão
moderna mais comum no Brasil é a servidão ou a “peonagem” por dívida. Nesta
modalidade, o cativo dá em penhor sua própria força de trabalho ou de pessoas sob sua
responsabilidade como garantia de crédito, sem, todavia, que o valor do trabalho, sua
natureza e duração tenham sido claramente determinados, ensejando absurdos variados
que acabam por aprisionar o trabalhador ao pagamento de uma dívida que jamais
conseguirá de livrar.
No Brasil, conforme SAKAMOTO (2007 P.32-33), o termo ‘trabalho escravo’ é
utilizado para enquadrar quaisquer modalidades que configuram aquelas práticas e
instituições análogas à escravidão definidas pelos tratados internacionais. Tais práticas,
94

quer sejam cometidas no país ou em outros lugares do mundo, sempre perpassam por
duas características básicas: 1 - o uso da força; 2- A negação da liberdade. No Brasil, a
caracterização do trabalho escravo se dá pela convergência de duas condutas, o trabalho
degradante e a privação da liberdade ou mesmo a com vigilância constante de milícias
armadas que os impedem de deixar as fazendas onde prestam serviços sob o pretexto de
que primeiro devem adimplir suas dívidas.
Como conceito jurídico para o trabalho escravo no Brasil, tomaremos o art. 149
do Código Penal que estabelece condutas claras para que seja caracterizada a condição
análoga à escravidão. Segundo o referido artigo, comete crime contra a liberdade
pessoal aquele que reduz alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a
trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, condições degradantes de trabalho,
restringindo, por qualquer meio a locomoção em razão de dívida contraída com
empregador ou preposto. Portanto, notamos a existência de quatro pressupostos básicos
na Lei Penal para a caracterizaçãodo trabalho escravo: I - trabalhos forçados; II -
jornadas exaustivas; III -condições degradantes de trabalho; IV- escravidão por dívidas.
Ainda de acordo com o art.149 do Código Penal, também comete o mesmo crime quem
cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador com o fim de retê-
lo no local de trabalho ou ainda que mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou
se apodera de objetos pessoais do trabalhador com o fim de permanência compulsória
no local de trabalho.

3. A QUESTÃO DO TRAFICO DE SERES HUMANOS E O TRABALHO


ESCRAVO NO BRASIL

Aqui há se se apontar a relação entre o trabalho escravo e o tráfico de seres


humanos no Brasil. Pesquisas realizadas pela Comissão Nacional da Terra (CPT) no
interior do Brasilbuscam determinar o perfil dos trabalhadores escravizados. De acordo
com SAKAMOTO&PLASSAT (2008p.14), os trabalhadores mais aliciados são jovens
entre 18 e 44 anos (83,3%), do sexo masculino (95,1%).
95

Perfil médio dos trabalhadores resgatados entre 2003-9/2014 in Síntese estatística em 31/10/2014 CPT
Nacional Campanha “De olho aberto para não virar escravo”.

Raramente alfabetizados, sem–terra, sem qualificação, sem organização e muitas


vezes sem documentos, esses trabalhadores saem de seus locais de origem busca de
trabalho.Submetidos ao mercado informal de trabalho ea condições rudimentares de
relações trabalhistas são altamente vulneráveis e passíveis de aliciamento por “gatos”
(funcionários de propriedades com práticas análogas à escravidão pagos para recrutar
novos trabalhadores) com promessas de ganhos vantajosos em atividade onde existe uso
intensivo de mão de obra braçal (exe. lavoura e pecuária rudimentares, carvoejamento,
produção sulcro-alcooleira, aspectos da construção civil, etc).

Nível médio de instrução dos trabalhadores resgatados entre os anos de 2003-9/2014 in Síntese estatística
em 31/10/2014 CPT Nacional Campanha “De olho aberto para não virar escravo”.

Ainda de acordo com o autor, a estimativa é de que dois terços dos trabalhadores
brasileiros encontrados em situação de trabalho escravo estão localizados nos estados
Pará, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso e sejam vindos de estados da região
Nordeste, como o Piauí e o Maranhão, Bahia e Ceará.
Esses trabalhadores, motivados pelas precárias condições de vida em seus
Estados de origem, constituem uma espécie de alvo ideal para os aliciadores de mão-de-
96

obra que exploram o trabalho escravo, que se deslocam em zonas livres de fiscalização
ou estradas vicinais.

Quantidade de trabalhadores libertados e nos anos de 2013 e 2014 in Síntese estatística em 31/10/2014
CPT Nacional Campanha “De olho aberto para não virar escravo”.

Uma vez localizado o trabalhador que será utilizado como mão-de-obra,


pricipalmenteem atividades variadas, quer seja no campo, quer seja nas cidades, os
“gatos” celebram um contrato verbal de empreita, desprovido da proteção jurídica
esperada por não obedecer asnormslegais. É neste ponto que inicia-se o ciclo que levará
o trabalhador aliciado à situação análoga à escravidão, caracterizada por dívidas do
abono inicial generosamente oferecido pelo intermediário ou o tomador de serviços que
ele representa, dívidas da pensão paga diretamente ao proprietário, dívidas do
transporte, dívidas pelo consumo de alimentos e bebidas, dívidas das ferramentas,
utensílios e remédios, originando um sistema comumente denominado de ‘cativo’.
Essas dívidas serão, em momento oportuno, descontadas de qualquer valor a receber
pelo trabalho fornecido, mantendo o trabalhador sempre em situação de inadimplência
com o empreiteiro. A chantagem da dívida a pagar servirá como meio eficaz para
manter subjugado o trabalhador, negando-lhe o direito de sair do serviço enquanto não
zerar todo o saldo negativo acumulado, o que nunca acontece, pelo contrário, quanto
mais tempo o trabalhador se vê à mercê do explorador de sua força de trabalho, mais
sua dívida aumenta.
Neste sentido, o trabalho escravo é uma das componentes do tráfico de seres
humanos, praticado principalmente nos serviços relacionados á exploração de recursos
naturais e ao agronegócio, em estados como Pará, Mato Grosso, Tocantins, Maranhão,
97

Goiás, Bahia, Mato Grosso do Sul, Rondônia e até no Rio de Janeiro, São Paulo e Rio
Grande do Sul

Média de trabalhadores resgatados por atividade entre os anos de 2003/2014 in Síntese estatística em
31/10/2014 CPT Nacional Campanha “De olho aberto para não virar escravo”.

A corrente do tráfico é formada por um intrincado conjunto de relações que vai


do fazendeiro, geralmente desconhecido dos trabalhadores, envolvendo outras pessoas
como até a dona da pensão, do boteco ou do caminhão, passando pelos “gatos”, até o
gerente e os vigilantes da fazenda. SegundoSAKAMOTO&PLASSAT(2008 p.15), pode
envolver a cumplicidade de muitos outros como a polícia civil ou militar que, mediante
propinas, aceitas para fechar os olhos quando os comboios percorrem as estradas
secundárias, utilizando transportes irregulares, ou mesmo alguns funcionários públicos
cuja manutenção no cargo, com freqüência, depende da compreensão que possam
manifestar para com os interesses das oligarquias de plantão.

4. INDUSTRIALIZAÇÃO, “REVOLUÇÃO VERDE”, ÊXODO RURAL E O


TRABALHO ESCRAVO, AS VARÁVEIS DE UMA PERVERSA RELAÇÃO.

Dentro das discussões sobre as motivicões para trabalho escravo, acreditamos


ser de grande relevância estabelecermos a relação deste fenômeno com o modelo
capitalista.A industrialização, a Revolução Verde, a subtituição dos modelos de
economia componesa simples que resultou na desintegração do campesinato pelo
moderno sistema de plantationinstituido pelo agronegócio provocaram um intenso
êxodo rural principalmente após a décecada de 1960. Essa migração trouxe para as
cidades grandes contingentes populacionais que, acima de tudo, buscavam melhores
98

condições de vida e remunerações, motivadas pelas benesses trazidas pelo trabalho


industrial, o que na esmagadora maioria das vezes não aconteceu.
Além desta situação, as transformações introduzidas no sistema
capitalistaprovocadas pelos avanços da eletônica, informática e alta tecnologia e pela
Revolução Verde tendem a piorar a situação de desemprego observadastanto nas
grandes metrópoles como no campo, causando um treível desequilíbrio entre a
quantidade de trabalhadores e o número de postos de trabalho existentes. Esses
trabalhadores, sobretudo camponeses, muitas vezes sem qualificação profissional,
originam multidões de desempregados. Essas massas começam então a se deslocar de
suas regiões em direção a outras cidades e Estados em busca de um futuro melhor.
As políticas internacionais estimulam modelos neoliberais, com ênfase na
exportação e obediência ao pagamento das dívidas externas, diminuindo os
investimentos dos governos na área social, vulnerabilizando ainda mais a posição dos
trabalhadores, de modo que o atual modelo de capitalismo neoliberal aumenta ainda
mais as diferenças entre os países ou localidadesdesenvolvidas e os países ou
localidades subdesenvolvidodas. Então esse contingente de desempregados se desloca
em direção a zonas de maior prosperidade econômica em busca das condições de
sobrevivência que não encontram em seus localidades de orígem.
Desta forma, notamos que as características do modelo capitalista neoliberal,
como a concentração de renda, urbanização sem planejamento, flexibilização das
relações de trabalho, etc,intensificam os processos migratórios, uma vez que, a maior
parte dos fluxos migratórios possuem motivicãosócioeconômica.Muitas vezes, esses
retirantes, sem as devidas informações sobre seus direitos, acabam se tornando as
vítimas ideais dos grupos de aliciamento de mão-de-obra nas regiões com grande
incidência de casos de trabalho escravo.

5. TRABALHO ESCRAVO: IMPUNIDADE E MISÉRIA:

O trabalho escravo não envolve apenas trabalhos forçados, jornadas exaustivas,


condições degradantes de trabalho ou escravidão por dívidas, como preceituado na Lei
Penal. Também devem ser consideradasas condições que expulsaram o trabalhador de
sua terra, em uma ponta, e a impunidade dos que exploram essas pessoas, em outra.
SAKAMOTO&PLASSAT (2008 p.15-16), salientam que
99

A dificuldade de colocar um escravista atrás das grades em razão de


obstáculos, como a indecisão sobre a esfera competente no julgamento desse
crime, cria nos fazendeiros uma sensação de impunidade, de que o Estado
apóia, através de sua inação, a exploração dessa mão-de-obra.”

Assim, a mão-de-obra que se torna escrava é também fragilizada por causa da


extrema pobreza da sua região de origem. A falta de oportunidades de emprego, de
geração de renda e de terra para plantar, além do ostracismo a que foi condenado pelo
poder público – ausente na garantia dos direitos mais fundamentais, como educação e
saúde – forçam o trabalhador a deixar sua casa e família.
O combate ao trabalho escravo passou a ser feito de forma mais sistemática no
Brasil a partir de 1995, com a criação dos grupos móveis de fiscalização, coordenados
pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Outros aspecto importantes a salientar são os que prevê a fiscalização do
deslocamento de trabalhadores para localidades fora de seu município de origem
(dificultando o aliciamento ilegal) e o que busca diminuir a vulnerabilidade do
trabalhador através de políticas dedesenvolvimento rural.

Quantidade de ações de apoio ao resgate de trabalhadores entre os anos de 2011 e 2014 cativos in Síntese
estatística em 31/10/2014 CPT Nacional Campanha “De olho aberto para não virar escravo”.

Insta ressaltar quenos casos de escravidão contemporânea é raro encontrar uma


estrutura mafiosa em operação. Na maior parte das vezes, são operadores individuais,
trabalhando para proprietários rurais ou para si próprios. A experiência das entidades da
sociedade civil que atuam no combate ao trabalho escravo, como a CPT, mostra que não
há uma organização criminosa com recursos financeiros vultosos e estratégia visando ao
tráfico de escravos para exploração econômica. O que existe são ações pontuais, na
maior parte das vezes, pulverizadas e sem coordenação, oque acaba por dificultar ações
de fiscalização.
100

As condiçoes para a exploração para o trabalho escravo tem inicio sempre com a
situação demiséria das vítimas e a impunidade de seus executores, que devem ser
combatidas. Segundo pesquisas realizadas em conjunto entre a OIT e CPT publicadas
no Trabalho Escravo no Brasil do século XXI em 2007, mais de 90% dos envolvidos
em trabalho escravo nas sul e sudeste do Pará sequer foram denunciados pelo crime.
Conforme ressalta OLIVEIRA (2012 p. 12) pena mínima de dois anos para a
prática do delito, prevista no art. 149 permite a aplicação de vários dispositivos que
permitem abrandar a execução penal, convertendo-a em, por exemplo, prestação de
serviços à comunidade ou distribuição de cestas básicas. SAKAMOTO (2007 p.33)
lembra também que o primeiro condenado criminalmente por trabalho escravo no
Brasil, Antônio Barbosa de Melo, proprietário da fazendo Alvorada, em Água Azul do
Norte, sul do Pará, teve sua pena convertida em pagamento de cestas básicas.
Um outro caso grave de impunidade de pessoas relacionadas ao crime de
trabalho escravo é a “Chacina de Unaí” em Minas Gerais, em 28 de janeiro de 2004,
onde três Auditores Fiscais do Trabalho e um motorista foram executados a tiros por
pistoleiros no momento em que procediam uma fiscalização regular em fazendas de
plantação de feijão no município. OLIVEIRA (2012 p.5) relembra ainda que um dos
indiciados como mentor do crime, o produtor rural AntérioMânica5, tornou-se prefeito
da cidade mineira, ocupando o cargo de 2004 até 2012 sendo que em sua primeira
eleição, no ano de 2004, mesmo preso, o suposto mandante na chacina fora eleito com
72% dos votos6.
Se a qualidade de vida da população rural não aumentar a patamares dignos e os
criminosos não forem julgados e punidos, os princípios e diretrizes lançados na política
irão se tornar absolutamente ineficazes.

6. POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO AO TRÁFICO DE


PESSOAS:

5
Reportagem portal G1- Norberto Mânica, acusado da chacina de Unaí, será julgado em BH, diz
STFhttp://g1.globo.com/minas-gerais/noticia/2015/04/julgamento-do-fazendeiro-norberto-manica-sera-
em-bh-diz-stf.htmlAcesso em 14 de jun. de 15.
6
Reportagem “Dez anos depois, cinco acusados pela chacina de Unaí ainda não foram julgados.”
http://reporterbrasil.org.br/2014/01/dez-anos-depois-cinco-acusados-pela-chacina-de-unai-ainda-nao-
foram-julgados/ Acesso em 14 de jun. de 15.
101

Uma vez problematizada a questão, devemos entender como a criação de


políticas públicas podem ser eficazes no combate do trabalho escravo, para tal
cabecompreender que “as políticas públicas pressupõem o interesse do Estado em
investir por meio de programas e projetos que se revertam para a melhoria de vida da
população” (Hazeu, 2008).
A exploração do trabalho escravo garante o funcionamento de setores
econômicos que lucram e não conseguiriam funcionar com trabalhadores livres, que
exigem a garantia dos seus direitos. Conforme SAKAMOTO (2007 p. 33) “A nova
escravidão é tão vantajosa para os empresários quanto a da época do Brasil Colônia e do
Império, pelo menos do ponto de vista financeiro e operacional.”
Não somente o agronegócio, mas mercado de sexo, o trabalho doméstico, a
confecção de roupas baratas e a construção civil, por exemplo lucram com exploração
de trabalhadores sem direitos e impedidos de ir e vir. Neste aspecto,não podemos
olvidar que o senhor de escravos moderno não se diferencia em nada de outros senhores
exploradores da vantagem econômica advinda de atividades ilícitas, tal como os
senhores da prostituição, os senhores da pedofilía, os senhores do tráfico de armas ou os
senhores do tráfico de entorpecentes.
Neste sentido, há três tipos de políticas que devem ser consideradas quando se
trata de trabalho escravo: políticas econômicas, políticas de migração e políticas
específicas de enfrentamento à escravização de trabalhadores.
As politicas econômicas não apresentam o resultado esperado, pois não
desetimulam os processo migratórios e, por consequência a escravização de
trabalhadores. As políticas migratórias quer sejam em âmbito interno, quer sejam em
escala internacional também mostram pouca eficácia porque favorecem vulnerabilidade,
dos migrantes tanto os regulares, quanto os irregulares. As políticas específicas de
enfrentamento á escravização de trabalhadores, em que peseproblemas como as agendas
confusas e falta de verbas, são,ao nosso ver, a forma mais eficaz de combate ao trabalho
escravo no Brasil, razão pela qual analisaremos os impactos que poderão ser
desencadeados com aprovação daEmenda Constitucional N˚81/2014, que ficou
conhecida como “PEC do Trabalho Escravo”.

7. A EMENDA CONSTITUDIONAL N˚ 81/2014 COMO FORMA DE


ERRADICAÇÃO AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL.
102

A Proposta de Emenda Constitucional n.o 438, mais tarde apelidada de “PEC do


Trabalho Escravo, foi apresentada ao Senado Federal em 1999, sob o número 57/1999.
Na Câmadado Deputados, a matéria foi proposta em 1995, tendo demorado mais de 15
ano, de sua propositura na forma de Proposta de Emenda Constitucional, até sua
aprovação sob a forma da Emenda Constitucional N˚81 em 5 de junho de 2014. A
Emendaaltera a redação do art. 243 da Constituição Federal de 1988, prevendo que
propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas
culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma
da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação
popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções
previstas em lei.
Note-se que aqui que o novo o texto constitucional é bem claro ao especificar
que o proprietário não terá direito a qualquer indenização, podendo ainda responder por
outras sanções previstas em lei. Além das terras, o artigo ainda prevê que todo e
qualquer outro bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas
será confiscado. O parágrafo único do artigo 1˚ da EC N˚81/14 também determina que
os bens de valor econômico apreendidos em decorrência da utilização de trabalho
forçado serão também confiscados e revertidos em proveito do assentamento dos
colonos que foram escravizados e no aparelhamento e custeio das atividades de
fiscalização, controle, prevenção e repressão à escravidão. Enfatizamos que o uso das
expressões confisco ou expropriação, o que significa dizer que nenhuma verba
indenizatória será devida ao proprietário escravocrata.
Entretanto, a EC N˚81/14 sozinha não é suficiente por si só para erradicaro
trabalho escravo, pois este está assentado em questões estruturais que transcendem à
capacidade de intervenção do Direito, questões essas que interpenetram-se em partes
variadas da materialidade econômica, social e política de nossa sociedade. Logo, apenas
um esforço amplo, capaz de intervir em múltiplas facetas da sociedade poderá ser capaz
de erradicar o trabalho escravo.
O Plano Nacional Para Erradicação do Trabalho Escravo foi uma tentativa, ao
propor conjugar e orientar os Poderes Públicos, Instituições e Entidades emuma
açãocoletiva contra a escravidão. Segundo HESSE (1991 p.22-23), “mais uma vez, a
questão problemática central tende então para a esfera da concretização”.Mas
justamente por conta dessa necessidade de concretizar-seé que a alteração da
Constituição trazidapela EC N˚81/2014 é fundamental à erradicação do trabalho escravo
103

porque pode municiar o Poder Judiciário de um poderoso instrumento jurídico de


combate e repressão à prática do ilícito: o confisco, também chamado de expropriação.
Sem duvidas há um forte simbolismo ao redor da expressão de confisco. No
âmbito da EC N˚81/2014. O “Princípio da função social”, assimilada de forma mais
ampla no ordenamento jurídico Brasileiro pela Constituição de 1988, trouxe uma
profunda alteração no sentido de não mais considerar o proprietário como um indivíduo
autonômo e superior à sociedade, como se desta não dependesse e a esta não estivesse
necessaria e vinculado em uma relação complexa de interdependência.
Aceitar que a propriedade pode ser confiscada em razão do descumprimento de
sua função social, aqui especificamente quando for constatada a existência de trabalho
escravo, é dar um importante passo no sentido de edificar uma nova concepção da
própria propriedade, que não mais poderá manter-se se não for benéfica ao conjunto
social.
Ao mesmo tempo, revigora-se a importância da função social da propriedade
agrária, ampliando a noção de que é no meio rural o local que se produzem os bens
fundamentais à existência humana coletiva, não sendo lícito a ninguém desvirtuar tal
vocação e subjulgar a terra aos seus próprios interesses egoístas e mesquinhos. Além
disso, coloca o direito de propriedade em harmonia com o contemporâneo Estado de
Direito, onde a Constituição tem primazia e onde deve-se atender aos anseios do povo
que, dando claros sinais, em razão da gravidade punitiva representada pela medida de
expropriação, que esse Estado não mais irá tolerar a conduta anacrônia, imoral e
largamente ilícita da escravidão.
Por fim, entendemos que, com Constituição de 1988, a propriedade privada rural
que não cumpra, integralmente, sua função social não está protegida pelo Direito. A EC.
N˚81/2014 vem com o objetivo de concretizar esse entendimento e dinamizar a justa
solução para os casos comprovados de exploração de práticas análogas à escravidão.
Erradicar este crime apenas será possível se a Lei proporcionar ao Estado um
intrumento de punibilidade ágil, eficiente e adequado, capaz de descer ao cerne do
problema, inviabilizando economicamente a atividade.
Na expressão de GONÇALVES e CERÉSER (2013 p. 64) temos que:
A Constituição Federal de 198 elevou ao âmbito constitucional o tratamento
da função social da propriedade rural, ao estabelecer em seu art. 186 que a
função social da propriedade rural seria cumprida quando atendidos,
simultaneamente, além dos graus de exigência estabelecidos em lei, os
requisitos a) de aproveitamento racional e adequado; b) de utilização
adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
104

c) de observância das disposições que regulam as relações de trabalho; e


d) de exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos
trabalhadores (grifo nosso).

Como leciona MARÉS (2003 p.126),


A propriedade agrária que não cumpre sua função social na integralidade do
art. 186 é duplamente antissocial, porque omite-se da obrigação de aproveitar
a terra para a produção de bens necessários à reprodução da vida, e viola uma
série de dispositivos legais. Essa dupla violação não pode passar impune ou
livre de qualquer consequência ao titular da lesão.

E ainda, segundo GONÇALVES e CERÉSER (2013 p. 65-67),

O requisito sociológico (art. 186, inciso IV, da Constituição Federal) é


atendido quando a exploração da propriedade rural favorece o bem-estar dos
proprietários e trabalhadores rurais, o que ocorre quando 'objetiva o
atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as
normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no
imóvel'” (§ 5 do art9 da lei 8629/93)

8. CONSIDERAÇÕES

Ainda no século XXI, o trabalho escravo é uma chaga que carece de ser
combatida com toda energia pelo Estado, por privar dos indivíduos cativos o exercício
de seus direitos fundamentais, privando-o, alem da liverdade de ir e vir totalmente de
sua dignidade enquanto ser humano. A escravidão moderna ganha ainda mais
dramaticidade quando impede o exercício de direitos a brasieiros no auge da vida
produtiva.
Sem dúvidas tal conduta é fomentada por se tartar de atividade altamente
rentável para os tomadores de trabalho, ainda mais porque, em que pese o crime do art.
149 do Código Penal, a baixa pena minima permite que os senhores de escravos
modernos possam responder seus porcessos em liberdade ou ter suas penas restritivas de
liberdade convertidas em restritivas de direitos, como ocorrido no caso do fazendeiro
Antônio Barbosa de Melo, proprietário da fazendo Alvorada, em Água Azul do Norte,
Sul do Pará, teve sua pena convertida em pagamento de cestas básicas.
Neste sentido, a hipotese de expropriação introduzida pela Emenda
Constitucional N˚81 em 5 de junho de 2014 é um importante instrument jurídico-social
a ser utilizado na erradicação do trabalho escravo no Brasil, por permitir o ataque direto
ao patrimômio dos modernos escravagistas.
105

Ainda há quesões as esclarecer, como a competênica material para o


processamento das ações de expropriação ou o rito de processamento, mas
indubitavelmente, trata-se de um importante e poderoso meio garantia de justiça Social.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Termo de Cooperação do


Trabalho Escravo. Disponível em http://www.mte.gov.br/trab_escravo/termo.pdf .
Acesso em: 22 maio. 2015.

________. Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.


Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo. Brasília: OIT, 2003

________. Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Brasília: SEDH/PR,


2010.

GONÇALVES, Albenir Itaboraí Querubini; CERESÉR, Cassiano Portella. Função


ambiental da propriedade rural e dos contratos agrários. Editora Leud: São Paulo,
2013.

HAZEU, Marcel. Políticas públicas de enfrentamentoao tráfico de pessoas: a quem


interessa o tráfico de pessoas?. Secretaria Nacional de Justiça, 2ª ed., Brasília: 2008.

HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio


Fabris Editor, 1991.

MARÉS, Carlos Frederico. A função social da terra. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 2003

NUCCI, Guilheme de Souza. Código Penal Comentado. 10ª ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2013.

OLIVEIRA, Igor Lima Goettenauer de. PEC do “Trabalho Escravo” (Nª 438/2001):
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EditoraMalheiros, 2009.
106

A INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NO TEMPO DE LAZER

Nágila Barros Santos1


Sarah Katherine de Oliveira Silva1
Rafael Messias Teixeira1
Flávio Alves Oliveira2
Temístocles Damasceno Silva3
Silvia Almeida Lima4

RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo descrever por meio de uma revisão de literatura, a
influência da religião no tempo de lazer de seus seguidores, através da categorização das
ações da igreja frente aos conteúdos culturais do lazer, em especial ao físico-desportivo,
artístico e turístico. Desta forma, percebeu-se que religião ainda exerce certo domínio sobre o
comportamento de seus seguidores, seja pela forma que se vestem, se tratam e sobretudo,
como convivem em sociedade. Ao mesmo tempo, foi possível ainda que de forma limitada,
compreender um pouco da relação que a religião exerce sobre a prática de atividades no
tempo de lazer de seus fiéis.

Palavras-chave: Lazer. Religião. Conteúdos Culturais.

1. INTRODUÇÃO

As discussões que permeiam o lazer, têm recebido gradativa notoriedade no campo


científico, com destaque para algumas áreas, que vem demonstrando relativos avanços nessa
discussão, como por exemplo, o Turismo, a Antropologia, a Sociologia e a Educação Física,
com o intuito de “compreender sua estruturação, aplicabilidade e funcionalidade social”
(PICCOLO, 2009, p.10).
De acordo Teixeira (2009), as novas demandas do homem moderno, são marcadas por
um intenso processo produtivo, que compõe as estruturas da sociedade contemporânea. Isto é,
a difusão do lazer nessas sociedades “atinge um vasto campo explicativo, cujas justificativas
vão desde a interpretação do lazer como uma prática atrelada a égide do capital [...] até a
valorização do bem-estar social e da saúde coletiva dos indivíduos” (PICCOLO, 2009, p.11).

1
Discentes do curso de Educação Física da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Membro do grupo de
pesquisa Corpo, história e cultura (CORPHORIS).

2
Graduado em Educação física pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

4
Discente do curso de Educação Física da Universidade do Paraná - Unopar

3
Docente do Curso de Educação Física da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
E em relação aos benefícios da prática de atividades físicas no tempo de lazer, existem
alguns estudos que identificaram a associação entre estas práticas regulares e a saúde, como
no estudo de Duarte, Santos e Gonçalves (2002), que destaca, que a prática de atividades
físicas no lazer, contribuí para a melhoria dos componentes fisiológicos e auxilia no combate
ao estresse.
Já em outro estudo, com o objetivo de analisar a prática sistematizada de atividade
física, e os benefícios desta, na qualidade de vida de idosos em seu tempo de lazer. Oliveira,
F. e colaboradores (2015), destacam os inúmeros benefícios da prática destas atividades, no
tempo de lazer dos idosos, e quais os principais cuidados que devem ser tomados para a
prática segura.
Portanto, os resultados positivos esperados, para a melhoria da qualidade de vida,
através das atividades de lazer, em seu sentido social, histórico, cultural e político, dependem
da qualidade sociocultural. O que faz com que o lazer, torne-se um espaço de resistência
contra a exploração e alienação do indivíduo, tendo por intuito desenvolver uma consciência
critico-reflexiva, baseada na possibilidade de uma busca de saídas (GOMES,1998).
Contudo, além de trazer diversos benefícios à saúde e, por conseguinte, uma melhoria
na qualidade de vida dos indivíduos que usufruem de seu tempo, o lazer possibilita “vivências
culturais mais amplas, reflexões e diálogo com outras culturas e áreas de conhecimento;
estimulando reflexões acerca da própria sociedade, buscando a compreensão, a resistência e a
transformação” (SILVA, T. 2011, p. 4).
Dumazedier (2008) afirma que existem alguns fatores que compõem os conteúdos
culturais do lazer, sendo cinco, as principais áreas, são elas: físico-esportiva (desenvolvida
através das atividades físicas de uma forma geral), manual (desenvolvida através do domínio
manipulativo do indivíduo às tarefas realizadas com as mãos), artística (desenvolvida no
plano estético, composto pelas emoções apresentadas pelos indivíduos), intelectual
(desenvolvida através da cognição e da objetividade das informações adquiridas pelos
indivíduos) e por fim, a social (desenvolvida através da relação do indivíduo com os seus
congêneres em sociedade). Além dessas, Camargo (1998) acrescenta os interesses turísticos
(desenvolvido através das atividades turísticas, de viagens e passeios realizados pelos
indivíduos).
Portanto, além de compreender o lazer, enquanto um direito social capaz de ofertar
mudanças nas relações sociais dos indivíduos em sociedade, torna-se necessário reconhecer
também, que este fenômeno, é capaz de promover diversas reflexões. Assim, é extremamente
importante, compreender quais as influências que as instituições sociais (família, estado,
108

escola, igreja, etc) exercem sobre à sua prática, e como estas se tornam decisivas para sua
efetivação.
Dessa forma, o presente capítulo tem como objetivo, descrever por meio de uma
revisão de literatura, a influência da religião no tempo de lazer de seus seguidores, através da
categorização das ações da igreja frente aos conteúdos culturais do lazer, em especial ao
físico-desportivo, artístico e turístico.

2. LAZER E RELIGIÃO: UMA TENSÃO PERMANENTE

O dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, define que o termo religião ou


religiosidade abrange diversas características em seus significados, podendo ser entendida
como:
1. Um culto a Deus ou a uma divindade.
2. Um sentimento consciente de submissão que liga a criatura humana ao criador.
3. Devoção às coisas sagradas, fé, piedade, etc. (FERREIRA, 2010).
Já Côrrea (2004), ressalta que a definição de religiosidade, pode ser entendida como o
estado de essência da espiritualidade do indivíduo (CORRÊA, 2004).
Em relação a compreensão do termo lazer, há vários pesquisadores que o definem em
suma, como o tempo livre, oposto ao tempo dedicado às ocupações do trabalho. Contudo, há
três tendências elencadas por Silva, V. e Farjalla (2007) que analisam a etimologia da palavra
lazer. A primeira caracteriza o lazer como uma atividade permissiva, afastando as proibições,
restrições, censuras e repressões. A segunda caracteriza o lazer como uma atividade realizada
em um tempo livre, com ausência de impedimentos de ordem temporal, restrições e
compromissos. E por fim, a terceira caracteriza o lazer como uma atividade de ordem
subjetiva, constituído de atividades de livre escolha, autônomas e agradáveis, que proporciona
benefícios físicos e psicológicos.
Bramante (1998) por sua vez, define o lazer como uma

Dimensão privilegiada da expressão humana dentro de um tempo conquistado,


materializada através de uma experiência pessoal criativa, de prazer e que não se
repete no tempo/espaço.... Ela é enriquecida pelo seu potencial socializador e
determinada, predominantemente, por uma grande motivação intrínseca e realizada
dentro de um contexto marcado pela percepção de liberdade. Sua vivência está
relacionada diretamente às oportunidades de acesso aos bens culturais, os quais são
determinados, via de regra, por fatores sócio-político-econômico e influenciados por
fatores ambientais.
Historicamente, a busca por um tempo disponível para as atividades de descanso e
divertimento, emerge de uma intensa luta de classes, composta por burgueses e operários,
embate este, propositadamente conveniado aos interesses do capital. Assim, de acordo
Fernandes, Húngaro e Athayde (2011), a necessidade do usufruto dos bens culturais e da
recomposição das energias para o trabalho, fez com que os movimentos sociais daquela
época, reivindicassem por um tempo livre das obrigações laborais, que contemplasse tais
fatores.
Uma vez que, o trabalho exercido durante o processo de industrialização das fábricas
era marcado por horas extenuantes de labor. Conforme, confirma Ré (2014, p.28), “os
trabalhadores das fábricas eram submetidos a péssimas condições de trabalho, em condição
análoga a de escravos, em jornadas extenuantes, que podiam chegar a 16 horas diárias”.

O processo de industrialização tem sido apontado como o motor da urbanização que


provocou uma verdadeira ‘mutação cultural’ que, historicamente, fez o homem
passar do arcaísmo ao modernismo determinando, também, profundas
transformações na esfera das relações principalmente naquelas decorrentes da
própria natureza do trabalho (BUENO, 2008, p.49).

Contudo, contrapondo essa ideia de dependência do lazer para com as atividades do


labor. Isto é, que o lazer só existiria mediante ao tempo desobrigado do trabalho. O lazer é
originário das experiências culturais vivenciadas pelo indivíduo. E desta forma, o lazer, assim
como a cultura, existem independentes ao mundo do trabalho. “Estão concentrados nas férias,
no entretenimento, nos jogos, brincadeiras e cerimônias religiosas. Esses rituais levam ao
afastamento da cultura das atividades rotineiras e tem produzido o centro da crise da
sociedade industrial” (MACCANNEL, 1999, p. 34 apud CHRISTOFFOLI, 2007, p. 47).
Assim, comungamos para a elaboração deste capítulo, da ideia central de lazer,
apresentada pelo antropólogo norte-americano Dean Maccannel citado por Christoffoli
(2007), como um autor que se tornou famoso por considerar o turismo como uma nova forma
de lazer, que vem sofrendo um processo de sacralização, que o tem aproximado do campo
religioso.
De acordo Silva, G. (2010),

É de extrema importância compreender as influências das obrigações sociais como o


trabalho e a religião no lazer, devido a necessidade de intervir com conhecimento
científico, o profissional ainda tem como finalidade não somente viabilizar a
diversão aos sujeitos, mas contribuir para seu desenvolvimento intelectual, cultural,
moral e espiritual.
110

Gabriel e Marcellino (2005, p.2) afirmam que existem infinitas possibilidades de


aproximação entre o lazer e a religião. Principalmente, a partir de uma “análise das relações
estabelecidas entre essas duas temáticas [...], através de religiões específicas, sob a ótica das
ciências sociais. Enfim, abre-se um leque profícuo de investigação no campo acadêmico”.

3. O CRESCIMENTO E O DESENVOLVIMENTO DAS RELIGIÕES PELO MUNDO

Desde o princípio da constituição da sociedade atual, há relatos históricos do


predomínio da religião, nas decisões tomadas pelos indivíduos que seguiam suas doutrinas e
dogmas. Nas mitologias grega e romana, por exemplo, eram os deuses que determinavam os
sentimentos (amor, ódio, medo, etc.) e os fenômenos da natureza (trovão, fogo, água, etc.).
Já no antigo Egito, os deuses eram em sua maioria, uma mescla de animal e ser
humano. E cabia ao faraó o poder supremo, sendo muitas vezes, considerado a representação
desses deuses na Terra. E por acreditarem na vida após a morte, os egípcios mumificavam os
corpos dos faraós mortos, para preservá-los para a ressureição. Análogas aos egípcios, as
civilizações americanas antigas (Incas, Maias e Astecas) também cultuavam vários deuses, e
possuíam similaridade em relação a crença na preservação dos mortos (mumificação), além de
construírem sarcófagos monumentais como as pirâmides do Egito.
Já em relação ao Cristianismo, distintos períodos históricos denotam sua gênese. Na
Idade Média, por exemplo, diversas excursões militares denominadas de cruzadas, tinham por
objetivo a conquista de novos territórios para a igreja católica, com o pretexto de retomada da
Terra Santa, que fora ocupada pelos turcos. Há inúmeros casos em que a Igreja determinava o
modo de agir dos indivíduos em sociedade, basta analisar os diversos contextos históricos que
compõem a sociedade moderna.
Dados recentes levantados pelo Seminário Teológico Gordon Conwell, através do seu
Centro Para Estudo do Cristianismo Global, e publicado no Boletim Internacional de Pesquisa
Missionária (IBMR, sigla em inglês), indicam que a igreja cristã tem ganhado adeptos
gradualmente por toda Europa e América do Norte. Em contrapartida, em alguns países
africanos, asiáticos e sul-americanos, o cristianismo tem apresentado um crescimento
dramático e explosivo.
No continente africano, por exemplo, no ano de 1900, havia cerca de 9 milhões de
cristãos, atualmente esse número já passa de 541 milhões. Somente nos últimos 15 anos, a
Igreja Cristã na África aumentou 51% o seu número de fiéis (GOSPEL PRIME, 2015). O
aumento no número de fiéis das demais denominações religiosas são apresentadas na figura 1.

Figura 1. Relação das religiões em número de adeptos em todo o mundo, comparativo da evolução das
denominações religiosas em ordem cronológica, anos de 1900, 2015 e 2050, Jequié, BA, Brasil 2015.

Fonte: http://noticias.gospelprime.com.br/cristianismo-maior-religiao-mundo/

Conforme descrito na figura 1, apesar do crescimento no número de adeptos em várias


religiões, o cristianismo ainda aponta como a principal denominação religiosa em número de
seguidores, com cerca de 2,4 bilhões de cristãos e com a projeção de aumento de 40% até
2050. Acompanhado do Islamismo com 1,7 bilhões, Hinduísmo com 984,5 milhões e
Judaísmo com 14,5 milhões de seguidores, com uma projeção até o ano de 2050 de
crescimento em 53%, 20%, e 12,5% respectivamente.
Já em relação as denominações religiosas, houve um aumento exorbitante
comparando-se os três recortes temporais, se em 1900 haviam apenas 1.600 por todo o
mundo, no ano de 2015, esse número aumentou em 28 vezes, alcançando a marca de 45.000
denominações religiosas diferentes, sendo esperado um aumento de 56% nesse número até o
ano de 2050.
Segundo dados do censo de 2010 coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), em relação aos grupos de religião no Brasil, o catolicismo ainda ocupa o
primeiro lugar no ranking das principais religiões em número de seguidores no país, com
cerca de 123 milhões de fiéis, o que torna o Brasil a nação com mais católicos em todo o
mundo. Em segundo lugar no número de seguidores aparecem os Evangélicos com 42,2
milhões de fiéis, seguidos pelos espiritas com 3,8 milhões de praticantes, e dos praticantes das
religiões de matrizes africanas Umbanda e Candomblé com 588 mil em todo o território.
112

4. A RELAÇÃO CAUSAL ENTRE A RELIGIÃO E O LAZER

Após essa breve excursão pela história das religiões que constituíram e formam a
civilização moderna, é possível afirmar que a sociedade ininterruptamente permaneceu
atrelada aos desígnios religiosos, que influenciaram, e ainda, continuam exercendo forte
influência sobre o comportamento do homem em sociedade. Dessa forma, ao contextualizar a
religião e o lazer, mostra-se necessário compreender como esta relação de subordinação
tornou-se presente.
Segundo Silva, G. e colaboradores (2010):
A influência exercida pela igreja em muitas épocas não tinha como objetivo somente
organizar cultos religiosos aos finais de semana, mas também organizava festas
tradicionais, conselhos familiares e jogos principalmente em ambientes rurais onde a
religião predominou por mais tempo, sempre visando hegemonia social por meio da
coletividade, pois, durante muito tempo foi a religião que determinou quais os tipos
de lazer a que a comunidade poderia usufruir.

Logo, o lazer aparece nos preceitos religiosos, como uma ferramenta de promoção do
culto continuo à Deus ou aos deuses (dependendo da denominação religiosa), mesmo em seu
tempo de descanso. Neste caso, cabe aos fiéis seguirem com rigorosidade as determinações
pregadas pelos líderes religiosos. É possível afirmar também, até aqui, que devido ao grande
número de fiéis, a maioria dos estudos que tratam da religião e do lazer, relatam
especificamente o cristianismo.
Desse modo, a religiosidade apresenta-se como um meio de propagação da fé, que se
torna aliada e incentivadora da aceitação ou não das práticas de lazer na vida dos fiéis. Assim,
devido ao atual cenário vivenciado na sociedade brasileira de transformações culturais e
religiosas, percebe-se uma grande carência de estudos voltados às diversas possibilidades de
conhecimento das atividades de lazer realizadas pelos religiosos, em especial aos cristãos.
Mello (2008) afirma que o cristianismo é estudado por inúmeros pesquisadores do
lazer, principalmente, por ser uma das religiões com mais adeptos no mundo. Para este
mesmo autor, o cristianismo assume uma visão “funcionalista do lazer, ou seja, o lazer é um
momento de retomada das forças para estar pronto para o trabalho novamente, partindo da
ideia de que foi Deus que impôs o trabalho ao homem como forma de punição à sua
ingratidão ao paraíso”.
Dentre os principais pesquisadores do lazer, sem dúvidas, Camargo é dos mais
conceituados, este autor, afirma que os cristãos, apresentam certa resistência, no que diz
respeito ao lazer, uma vez que, desde o princípio da humanidade, o homem deveria abster-se
do seu próprio trabalho (CAMARGO, 1998).
Carmo e Salomão (2005) destacam que é necessário discutir a influência da religião
(neste exemplo, o cristianismo) sobre as atividades de lazer, a partir do viés dos protagonistas
dessa relação, tanto padres e pastores, quanto dos fiéis e frequentadores dos cultos/missas. “A
questão central reside no fato de procurar entender algumas das razões de hoje, de maneira
enfática, as religiões cristãs, seculares ou pentecostais, estarem se valendo cada vez mais de
atividades ligadas ao mundo do Lazer” (CARMO; SALOMÃO, 2005, p.1).

5. A INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NAS PRÁTICAS DE ATIVIDADES NO TEMPO


DE LAZER: A IGREJA E OS CONTEÚDOS CULTURAIS DO LAZER.

Segundo Mello (2008) dentro do contexto da esfera religiosa, torna-se perceptível a


oferta crescente de atividades de lazer, promovidas pelas instituições cristãs, voltadas tanto
para o público interno da igreja quanto para os simpatizantes, na busca pela conquista de
novos adeptos. A presente seção, tem por objetivo apresentar a relação de influência que a
Igreja mantém sobre as práticas de atividades de lazer dos seus seguidores. Assim, serão
descritos aqui, alguns estudos levantados na revisão que fizemos da literatura.
Em um estudo realizado por Gabriel e Marcellino (2005), por exemplo, foi proposto o
fomento de reflexões sobre as relações entre o lazer e a religião, destacando elementos que
consideraram essenciais para estudos posteriores que procurassem aprofundar os aspectos
específicos de suas relações, isto é, verificando os possíveis vínculos do lazer com a religião.
Estes autores ressalvam que entre as perspectivas da relação entre essas duas temáticas, ficam
evidentes a complexa tarefa de conciliar o prazer possível, presente potencialmente no lazer,
com a religião. Segundo eles, para algumas concepções religiosas, a convivência entre as duas
temáticas é possível com certas restrições; para outras há uma enorme oposição entre ambas,
pois uma ameaça o tempo dedicado à outra; e ainda há a possibilidade da relação plena,
harmônica e necessária entre ambas. Gabriel e Marcellino (2005) destacam que a
aproximação entre a teoria do lazer e a teologia devem buscar uma nova síntese
comprometida com a vida e a serviço da dignidade humana. Eles concluem que a religião age
de maneira determinante na forma como o lazer se concretiza, assim como o lazer pode gerar
valores que questionem ou legitimem determinadas práticas religiosas.
Um trabalho realizado por Carmo e Salomão (2005), objetivou abordar as possíveis
relações interpostas entre os estudos do lazer e as suas aplicações dentro do contexto religioso
do cristianismo. Os autores identificaram que existem elementos na esfera religiosa que
114

frequentemente estão associados as atividades de lazer, o que contrapõe os princípios


dogmáticos do cristianismo, que abnega o corpo, ao prazer e o divertimento.
Já o estudo realizado por Santos (2005), realizado na cidade de Canoas/RS, intitulado
“Mapa do Lazer Juvenil do bairro Guajuviras/Canoas-RS” propôs estabelecer o perfil dos
estudantes que selecionaram como a atividade mais importante realizada no final de semana a
participação em atividades religiosas. A amostra foi composta por 2112 estudantes da 5ª série
do fundamental II ao 3º ano do ensino médio. Os autores encontraram uma variedade de
atividades acontecendo no interior das igrejas que iam para além dos cultos. O que demonstra
que houve uma preocupação em criar espaços que pudessem atender aos interesses dos
jovens. O contexto estudado permitiu identificar que as estudantes são mais sensíveis às
estratégias de cooptação dos jovens, por parte das igrejas, principalmente as evangélicas. Os
autores ressalvam, no entanto que o lazer religioso pode estar sub-representado no estudo,
tendo em vista as novas formas midiáticas de relação com o sagrado. Eles concluem que a
identidade religiosa não pode ser estruturada a partir de uma operação que exclui outras
experiências que fazem parte do cotidiano dos jovens.
Bueno (2008) em seu estudo intitulado “Lazer, Festa e Festejar” relata que a conquista
de um tempo livre das ocupações do trabalho, está além do direito ao descanso, isto é, implica
em uma possibilidade de atividades capazes de distrair ou desenvolver o indivíduo.
O lazer, pela sua extensão e pela infraestrutura que ele supõe, é um fenômeno social
da maior importância. Esse fenômeno vai encorajar a industrialização, o lazer e o
fortalecimento do turismo. Nesse cenário, as festas [...] abrem espaços no interior da
sociedade para uma participação ativa e representa uma forma privilegiada de lazer,
pois, além do clima de descontração, cria um espaço essencial para fortalecer e
nutrir a rede das relações sociais. Representa, também, um poderoso atrativo
turístico (BUENO, 2008).

Oliveira, M., Romera e Marcellino (2011), por sua vez, realizaram um estudo com o
intuito de identificar os aspectos significativos da participação popular oportunizados pela
“Festa de São João” em Tupi (distrito da cidade de Piracicaba, no interior do estado de São
Paulo) e verificar a dimensão de lazer experimentado e proporcionado pelos organizadores e
participantes da festa. Eles identificaram que a referida festa, apresentava forte afinidade com
o lazer. Dessa forma, a descreveram como uma atividade de lazer que apresentava relação
com a religião.
Segundo Carmo e Salomão (2005), as apropriações das igrejas sobre os conteúdos
culturais do lazer são incontáveis, vão desde atividades artísticas como: peças teatrais com
encenações dramáticas ou cômicas que tenham como roteiro, ilustrações de livros que
compõem a bíblia sagrada ou experiências próprias de vida, à cantos instrumentalizados e
coreografias complexas. Podemos acrescentar aqui, os shows gospel que tem crescido
exorbitantemente no Brasil, fazendo com que essa categoria de música, consiga vender
milhões de exemplares de CD’s e DVD’s todos os anos. “Como exemplo, podemos citar o
movimento de música Gospel e seus shows, retiros espirituais, cultos religiosos e vários
produtos de entretenimento litúrgico: CDs, DVDs e canais exclusivos de rádio e TV”
(MELLO, 2008).
O próprio rádio, a televisão e, atualmente, a internet, são meios que estão ocupando
cada vez mais o tempo a atenção do fiel. A partir dessa nova realidade percebe-se
que os líderes religiosos acabaram verificando que não é mais possível se limitar às
práticas tradicionais, concentradas em pregações baseadas apenas na bíblia
convencional (escrita), nos sermões durante os cultos e as missas. É preciso utilizar-
se de novas táticas para alcançar esse novo perfil que se forma na sociedade atual
(ALMEIDA, 2004, p. 3).

Além dessas atividades, as excursões realizadas pelos membros da igreja,


denominadas de ‘Retiros Espirituais’, exibe uma profunda ligação com o lazer turístico, visto
que, essas viagens proporcionam visitas a lugares de referência de acordo a religião, bem
como movimenta os pontos turísticos da cidade que abriga esses espaços.
Exemplos dessas peregrinações, podem ser vistas em Aparecida no interior de São
Paulo, onde todos os anos centenas de católicos vão pagar promessas a padroeira do Brasil.
Ou as romarias feitas em Juazeiro do Norte interior do Ceará para visita e agradecimento à
Padre Cícero, e a romaria feita para Bom Jesus da Lapa na Bahia, onde todos os anos, milhões
de romeiros, arriscam suas vidas em cima de paus de arara, saídos de todas as cidades do
estado, para agradecer as graças alcançadas.
Christoffoli, Pereira e Silva (2012), por exemplo, realizaram uma revisão crítica de
literatura em busca de estudos de pesquisadores brasileiros que associassem o turismo
religioso ao lazer, apontando as transformações nos eventos religiosos, que demostram uma
integração do sagrado com o profano. Os dados indicaram que o profano é entendido pelos
autores analisados como, a venda de produtos e serviços religiosos associados a festas, feiras
e visitas sem conotação religiosa. Christoffoli, Pereira e Silva (2012) concluíram que é
perceptível duas perspectivas de análise e reflexão desses autores: a primeira concentra sua
análise na movimentação física dos devotos e na associação das atividades realizadas nos
santuários com atividades de lazer e socialização. A segunda perspectiva de análise apresenta
argumentos sobre o turismo religioso com enfoque na devoção e na fé. Os resultados
permitem discutir se a associação do lazer diminui o sentimento de fé e devoção intrínseco às
peregrinações e romarias e se o modelo de turismo religioso associado ao lazer torna os
eventos com este tipo de planejamento menos religioso e mais profano.
116

Carmo e Salomão (2005) ressaltam também a importância da utilização de atividades


de caráter físico-desportivas, acentuada pelos torneios anuais que vêm crescendo no meio
cristão, com o objetivo de reunir membros de determinada religião para disputas esportivas, o
que não exime os participantes de jogadas um pouco violentas e desleais, com uma frequência
menor do que as disputas fora do contexto religioso, é verdade, mas não ausente de rispidez.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É incontestável que a religião ainda exerce certo domínio sobre o comportamento de


seus seguidores, seja pela forma que se vestem, se tratam e sobretudo, como convivem em
sociedade. A construção desse estudo, possibilitou um conhecimento impar em relação à
forma como às pessoas respeitam a denominação religiosa de que fazem parte, e como estas
arraigam suas doutrinas.
Enfim, apesar de terem sido encontrados um número incipientes de estudos que
correlacionasse a religião e o lazer, principalmente no contexto da dependência de uma
temática para com a outra, foi possível ainda que de forma limitada, compreender um pouco
da relação que a religião exerce sobre a prática de atividades no tempo de lazer de seus fiéis.
Dessa forma, é preciso pesquisas mais especificas sobre a temática, para que haja um
embasamento mais aprofundado.

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118

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Física. In: Mostra Acadêmica, 8, 2010, Piracicaba – São Paulo. Anais da 8ª Mostra
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SILVA, T. F. Lazer, Escola e Educação Física Escolar: encontros e desencontros. Licere,


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TEIXEIRA, S. Lazer e Escola: espaços de possibilidades. Licere, Belo Horizonte, v.12, n. 2,


p. 1-35, jun. 2009.
119

SERÁ QUE AS TÉCNICAS DE ENSINO AJUDAM NO APRENDIZADO DA


MATEMÁTICA EM SALA DE AULA?

Décio Leite Miranda Júnior1

Alexandra Quadro Siqueira2

Leandro Carvalho de Almeida Gouveia3

O aprender é uma das formas de se construir o conhecimento. Os


conteúdos que os professores passam em aulas chegam aos alunos
como informações que deverão ser transformadas em conhecimentos.
Estes, cada aluno tem que construir o seu. É preciso que ele aprenda
esta construção. A informação que chega precisa ser compreendida,
aceita, assimilada, experimentada e praticada. Assim, ela é
transformada em conhecimento. A prática do conhecimento é a mãe
da sabedoria. (IÇAMI TIBA - 2011)

RESUMO

Podemos sempre criar, inovar e construir um elo entre o ensino-aprendizagem o e suas relações
com o objeto de estudo proposto num plano acadêmico. Hoje, as dificuldades entre saber o
conteúdo de determinadas disciplinas e, adequar à maneira de transmitir essas informações, fixa
um longo caminho de pensamentos estruturais e estratégicos. A classe educadora que analisa as
técnicas e prepara estratégias para envolver a parte receptora do conhecimento, sem dúvida
alguma precisa de estímulos, nos quais, influenciará diretamente na construção dessas
personalidades. O objetivo desse estudo é avaliar, demonstrar e escolher uma das possibilidades
de ensino, analisando métodos que já deram certo em escolas fora do perímetro brasileiro.

Palavras-chave: Técnicas de Ensino. Estratégias de aula. A matemática e suas aplicações.

1Professor de Matemática do Colégio Adventista em Salvador, Professor do Estado da Bahia (REDA),


Pesquisador, Consultor. decio143@hotmail.com
3 Mestra em Educação (UFBA); Especialista em Auditoria Fiscal (UNEB); Bacharel em Ciências
Econômicas (FACCEBA); Coordenadora Didático-Pedagógica do curso Multimeios Didáticos do
Profuncionário (IFBA); Professora Substituta de Organização, Normas e Qualidade (IFBA); Professora
de Economia (UNIESP) e Professora de Filosofia (SOLEDADE). alexandraquadro@ifba.edu.br

2 Doutorando em Desenvolvimento Regional e Urbano pela Universidade Salvador (UNIFACS); Mestre


em Desenvolvimento Humano e Responsabilidade Social pela Fundação Visconde de Cairu; licenciado
em Geografia pela Faculdade de Ciências Educacionais; Especialização em Metodologia do Ensino
Superior pela Faculdades Integradas Olga Mettig; Bacharel em Turismo pela Fundação Visconde de
Cairu; tem experiência na área de Turismo, Desenvolvimento Regional e Urbano, Desenvolvimento
Humano e Responsabilidade Social, Geografia com ênfase em Turismo, atuando principalmente nas
seguintes áreas: Turismo, Desenvolvimento Regional e Urbano, Desenvolvimento Humano e
Responsabilidade Social. leandrocgouveia@gmail.com
120

1. INTRODUZINDO O DIÁLOGO...

Toda aprendizagem, para que realmente aconteça, precisa ser significativa para o
aprendiz, isto é, precisa envolvê-lo como pessoa, como um todo (ideias, sentimentos,
cultura, sociedade) (Abreu & Masetto, 1987). Entretanto, segundo estes autores, a
técnica de ensino quantitativamente mais empregada em nossas escolas superiores e até
vista por alguns como única possível nesse nível de ensino é a expositiva. Ela representa
a educação tradicional, vertical ou “bancária” (Bordenave & Pereira, 1977). Segundo
Freire, (1980), nesta visão de educação, o educador é o que diz a palavra, os educandos,
os que a escutam docilmente.

Neste artigo através de uma revisão bibliográfica, pretendemos abordar técnicas de


ensino que obtiveram sucesso em determinadas escolas da periferia dos Estados Unidos
da América e que também eram usadas no Brasil nas escolas públicas e particulares. A
obra de ensinar depende muito do domínio e da aplicação de habilidades fundamentais,
individualmente apreendidas por meio de estudos diligentes que o educador como
mediador do conhecimento aplica e gera expectativas ao seu sujeito receptor de
informação.

Propomos aqui discorrer, de forma ainda que embrionária, as ferramentas da arte de


ensinar. Mais especificamente, abordaremos os instrumentos necessários para um dos
desafios mais importante do ensino: o trabalho em escolas públicas, especialmente, as
dos bairros periféricos que atendem alunos nascidos na condição social de
vulnerabilidade econômica e, com frequência, diante de uma janela de oportunidade que
se fecha rapidamente. Por isso, o Professor deve utilizar de atividades lúdicas. O Lúdico
na Educação Infantil, de acordo com Arlete Fin (2014):
Jogos, brinquedos e brincadeiras fazem parte do mundo da criança,
pois estão presentes na humanidade desde o seu início. O presente
artigo trata do lúdico como processo educativo, demonstrando que ao
se trabalhar ludicamente não se está abandonando a seriedade e a
importância dos conteúdos a serem apresentados à criança, pois as
atividades lúdicas são indispensáveis para o seu desenvolvimento
sadio e para a apreensão dos conhecimentos, uma vez que possibilitam
o desenvolvimento da percepção, da imaginação, da fantasia e dos
sentimentos.
121

Vale ressaltar então, a importância para o educador utilizar-se das várias ferramentas
para ajudar no aprendizado do aluno, umas das, é a atividade lúdica. O lúdico na sala de
aula pode tornar-se um espaço de reelaboração do conhecimento vivencial e constituído
com o grupo ou individualmente e o aluno passa a ser a protagonista de sua historia
social, o sujeito da construção de sua identidade, buscando uma autoafirmação social,
dando continuidade nas suas ações e atitudes, possibilitando o despertar para o aprender.

Para Lemov (2011), nessas escolas, o preço do fracasso é alto e os desafios são imensos.
Lá, os professores trabalham numa situação limítrofe onde, na maior parte dos casos, os
problemas sociais são gritantes, óbvios e avassaladores. Mas, é também nessas escolas
que pode ocorrer – e ocorre – aquele tipo de alquimia que muda vidas. Infelizmente,
essa alquimia acontece raramente e passa despercebida.

No entanto, está presente de forma consistente, graças a um pequeno número de


professores exemplares e de diretores visionários, que, juntos, conseguem construir
salas de aula e escolas que têm o poder de abrir a janela da oportunidade novamente. Ao
ler este artigo, caso seja um professor que deseja melhorar sua arte, estamos dispostos a
discutir acerca das ferramentas para fazer isso – torna-se um daqueles professores
capazes de destravar o talento e a habilidade latentes em seus alunos e alunas, sem se
preocupar com o fato de que muitos professores ou escolas tentaram fazer isso antes,
sem sucesso.

Sendo assim, de acordo com Lemov (2011), durante toda nossa carreira em escolas
públicas, como professores e formadores, tivemos o privilégio de observar inúmeros
profissionais da educação excelentes, muitas vezes em situações que assoberbariam a
maioria de nós. Esses educadores extraordinários fazem rotineiramente o que mil
programas sociais consideram impossível: eliminar a desvantagem escolar dos pobres,
transformar os alunos em risco de fracassar em bons alunos, que acreditam no estudo,
reescrevendo assim, a equação da oportunidade. E, embora cada um destes seja único,
contudo, sua maneira de ensinar tem certos elementos em comum.

Depois de anos de observação e tendo lido a pesquisa de Jim Collins, autor de Feitas
para Durar e Empresas Feitas para Vencer, dois livros altamente elogiados, começamos
122

a montar uma lista do que é que esses professores fazem, focando particularmente nas
técnicas que diferenciam os excelentes professores não dos ruins, mas, daqueles que são
apenas bons. Como Collins observou, uma lista assim é muito mais relevantes do que
uma que mostre as diferenças entre os excelentes professores e os ruins, ou os
mediadores, já que o resultado da primeira lista provê o mapa da mina da excelência.

Ou seja, o professor pode usar ou não uma das duas técnicas, mas, no conjunto, as que
incluímos neste artigo emergem como as ferramentas que separam excelentes
professores daqueles meramente bons. Sim, existe uma “caixa de ferramentas” para
promover a igualdade no desempenho escolar, e nós tentaremos descrevê-la de forma
breve neste artigo.

2. TÉCNICAS APLICÁVEIS, CONCRETAS, ESPECÍFICAS ?

O autor (Lemov, 2011) diz que, quando era um jovem professor, as pessoas davam
montes de conselhos. Ele ia a cursos de capacitação e saía com a cabeça cheia de
palavras importantes. Eles falavam de tudo que me havia levado a querer ser professor.
“Tenha altas expectativas em relação a seus alunos.” “Espere o máximo dos alunos
todos os dias.” “Ensine crianças, não conteúdos .” Eu ficava inspirado, pronto para
melhorar – até chegar à escola no dia seguinte. Eu me via perguntando: “Bom, e
agora?”. Como faço isso? Que iniciativa devo tomar às 8h25 da manhã para demonstrar
essas altas expectativas?”. Deste modo, notamos a importância de observar o que
aconteceu no passado, para percebermos com mais propriedade as dificuldades do aluno
e tentar ajudá-los para uma melhoria de seu aprendizado na Escola.

Segundo Lemov (20011), no fim, o que realmente nos ajuda a aprender a ensinar é
quando um professor mais competente nos diz algo bem concreto, como isto: “Quando
você quiser que eles obedeçam sua orientação, fique parado. Se você estiver andando
pela classe, distribuindo materiais, parece que a orientação é menos importante do que
todas as outras coisas que você está fazendo. Mostre que sua orientação é importante.
Fique parado. Eles vão responder a isso”. Com o tempo, foi este tipo de conselho
aplicável, específico, concreto, muito mais do que as lembranças de que devíamos ter
altas expectativas, que nos permitiram de fato elevá-las na sala de aula.
123

De certo que, as experiências vivenciadas por um professor-pesquisador ajuda muito na


constatação de novas ideias para um acerto final de como mobilizar as suas aulas. A
maneira como os alunos reagem a uma parada na verbalização dos conteúdos de seu
orientador, pode viabilizar o silêncio em sala facilitando a trajetória das informações
por todos. Neste sentido, a importância da orientação do professor é de grande
relevância, pois, alunos em silêncio, por ora, representa um sinal de que a aula está
sendo bem absorvida por todos. Essa técnica mostra como a aplicação de estratégias
pedagógicas pode dar certo.

Ao refletir essa experiência, tentamos descrever algumas dessas técnicas da maneira


mais aplicável, específica e concreta que permite que qualquer um de nós possa
começar a usá-la amanhã mesmo. Afirmamos aqui “técnicas” e não “estratégias”,
mesmo que a profissão do magistério tenda a usar a última expressão. Para nós isso
difere, pois, uma estratégia é uma abordagem generalizada de problemas, um jeito de
informar decisões. Uma técnica é uma coisa que você pode dizer ou fazer de forma
específica. Se você é um velocista, sua estratégia pode ser simplesmente correr o mais
rápido do que puder do começo até o final da pista; sua técnica pode ser inclinar o corpo
para frente em cerca de cinco graus à medida que move suas pernas para cima e para
frente (MARQUES ,1995).

Um outro ponto para que haja produção de conhecimento entre esses sujeitos
cognoscentes está ligado na variável dialogicidade, ou seja, o professor não ensina
senão na medida em que os alunos aprendem. Não há docência sem discência, as duas
se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem â
condição de objeto, um do outro. (FREIRE, 2002).

Corroborando nessa discussão, Marques (1995, p. 39) entende que “[...] não há de fato,
docência, ela não é cumprida, sem a efetiva aprendizagem por parte dos alunos; mais
ainda, sem que por meio dela também o professor aprenda na relação dialogal com o
outro [...]”. Então, quem ensina, prende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender,
porém, isto só terá valor prático se o sujeito professor interiorizar um valor necessário à
124

sua profissão: a paixão pela educação do homem ao ver no aluno um sujeito em


potencial, com capacidades de transformar sua realidade social.

Sendo assim, definir um caminho, uma pesquisa, um método bem fundamentado e


estruturado sempre trará resultados, pois, é indispensável para todo estudo ter um
método, um percurso, não no sentido de um modelo pronto, mas, um método já
experimentado e consequentemente com fundamentos próprios acertados, para que a
continua aplicação traga resultados favoráveis e positivos.

Silva & Demattê, (1998), sugeriram, então, que o conteúdo desta disciplina fosse
ministrado por meio de outras técnicas que teriam como objetivo retirar da rotina e
estimular os alunos a exercitarem-se por si próprios, às vezes em grupos, ao invés de
permanecerem passivos diante de um professor meramente expositor. Bordenave &
Pereira, (1978) e Abreu & Masetto, (1987) propõem técnicas de ensino denominadas de
Cartazes em Grupo e Grupo de Verbalização “versus” Grupo de Observação (GV x
GO), que se caracterizam pela comunicação e interação multilateral entre os alunos e o
professor.

Segundo os autores, estas técnicas facilitam o alcance dos objetivos da aprendizagem,


pois, os alunos aprendem agindo. Os resultados obtidos na aplicação das técnicas de
ensino são comparados com os obtidos em aulas expositivas aplicadas anteriormente.
Já, para Bordenave & Pereira, (1977): A finalidade da educação é facilitar a
aprendizagem e a mudança. Facilitar a aprendizagem reside em certas qualidades e
atitudes que residem na relação pessoal entre o facilitador e o aprendiz. Por isso, o papel
do educador enquanto mediador deste processo é imprescindível.

3. ALGUMAS TÉCNICAS ESSENCIAIS EM PROL DO ENSINO-


APRENDIZAGEM ...

Ao obter o resultado consistente de uma pesquisa acadêmica, busca-se fundamentos


necessários para o sucesso escolar, mesmo entre aqueles que não têm uma trajetória de
bom desempenho de aprendizagem. Muitos estudos foram feitos para testar, confirmar,
125

ou desmentir a famosa pesquisa entre “Pigmaleão”. Este estudo selecionou


aleatoriamente alunos com desempenho acadêmico semelhante e compôs duas turmas
diferentes. Para uma parte dos professores foi dito que a classe era formada por
excelentes alunos; a outro grupo de professores informou-se que os alunos não estavam
interessados em aprender. As classes dos professores do primeiro grupo tiveram
desempenho melhor que as do segundo. Supõe-se que, o resultado se deva à diferença
nas expectativas dos professores em relação a seus alunos, em uma espécie de profecia
alto realizada (ABREU & MASSETO, 1987).

Um dos problemas com as pesquisas sobre altas expectativas é que, com frequência,
inclui-se nessa definição um amplo leque de ações, crenças e estratégias operacionais.
Por exemplo, um dos estudos inclui na definição de altas expectativas o aumento do
tempo dedicado às tarefas em disciplinas acadêmicas. Isso é certamente uma boa
politica, mas, no caso de um estudo, é difícil separar o efeito de melhor uso do tempo
em sala de aula do conceito em uma ação específica em sala de aula.

Concretamente, o que fazem os professores que obtém resultados excepcionais para


demonstrar altas expectativas em relação aos seus alunos? Aqui, propomos demonstrar
uma das técnicas utilizadas de acordo Lemov (2011) por professores para aumentar as
expectativas e transformar uma boa aula em uma aula excelente.

Técnica 1: SEM ESCAPATÓRIA

Uma coisa é comum entre os professores exemplares: a vigilância para manter a


expectativa de que não tentar é inaceitável. Em uma turma de auto desempenho escolar,
todo mundo aprende. Logo, as expectativas dos professores são altas até para os alunos
que não tem altas expectativas em relação a se mesmos. Um componente – chá – ve da
cultura de uma turma desse tipo é o desenvolvimento, por certos alunos, de um método
para fugir da raia: Murmurar “sei lá” em resposta a uma pergunta ou, talvez,
simplesmente dar de ombros, na esperança de que o professor deixe o aluno em paz. Foi
para esse tipo de situação que nasceu “Sem Escapatória”, que, como muitas outras
técnicas, logo, encontrou uma aplicação adicional como ferramenta para ajudar os
alunos que estão querendo aprender, mas que, de fato, ao serem perguntados, não sabem
126

a resposta. Sem Escapatória ajuda tanto no caso desses últimos como no caso daqueles
que estão tentando fugir da situação de aprendizagem. Na essência dessa técnica está a
crença de que uma sequência que começa com aluno incapaz de responder (ou sem
vontade de responder) devem terminar, sempre que possível, com esse aluno dando a
resposta certa, mesmo que ele apenas repita essa resposta certa. Só então a sequência
estará completa.

Percebemos que, essa técnica que se repete, fazendo com que o aluno, através do ouvir
repetidas vezes, possa memorizar a correta resposta, e simplificando o seu
amprendizado. “A eficácia máxima da aprendizagem não é alcançada senão quando a
mensagem do professor é compreendida pelos alunos.” “A aprendizagem realiza-se
através da conduta ativa dos alunos, que aprendem mediante o que eles fazem e não o
que faz o professor.” Segundo Abreu & Masseto, (1987).

Técnica 2: CERTO É CERTO ?

Muitos professores reagem a respostas quase certas de seus alunos arredondando a


informação. Ou seja, eles vão repetir a resposta da aluna e acrescentar algum detalhe
para torná-la completamente correta, embora a aluna não tenha oferecido (e, talvez, não
reconheça) o fator diferenciador.

É importante um diálogo, muita conversa e fazer com que o aluno venha a buscar novas
soluções, novas ideias para os problemas que venham a ser apresentado pela disciplina
matemática, de uma forma mais simples, lúdica e agradável.

4. PONDERAÇÕES (IN)CONCLUSIVAS...

O engajamento no diálogo matemático é um processo evolutivo. O tom e a qualidade


do nosso diálogo mudam na medida em que nós mudamos e aprendemos dos alunos e
das nossas próprias interações. As conversas matemáticas proporcionam um
instrumento para medir o crescimento no entendimento, permitem aos participantes
127

aprender sobre as construções matemáticas dos outros, e dão aos participantes


oportunidades para refletirem na sua própria compreensão matemática.

A seleção de tarefas apropriadas e técnicas de colocação de perguntas utilizadas pelo


professor são vitais para esta abordagem de diálogo. Além disso, o estabelecimento
físico da turma afeta a qualidade dos diálogos. Logo, almejamos no percurso deste
trabalho acadêmico, apenas, vislumbrar algumas possibilidades de técnicas de ensino da
matemática em prol de subsidiar o ensino-aprendizagem dos alunos.
Esta pesquisa acadêmica sugere que o professor como mediador do conhecimento pode
sim fazer a diferença na igualdade de receptores de informações atingirem a todos,
gerando assim a expectativa de um ensino melhor para as classes menos favorecidas.
Muitas vezes o que faz a diferença é a maneira como se planeja e aborda determinados
assuntos, onde o uso de técnicas favorece a ampla visão do sujeito receptor. Essas
experiências repetidas fazem como o acerto da próxima vez supere o erro vivido
anteriormente, aprimorando cada vez mais os métodos de ensino em sala de aula.

Nossa esperança era detectar e documentar dificuldades e soluções significativas, à luz


da atividade profissional futura, concebendo a formação de professores como um
processo contínuo, que começa com a formação básica e prolonga-se pela Universidade
não tendo fim. A carência de conhecimentos de conteúdos científicos gera uma
interação quase contínua com o livro didático disponível nas escolas, o que limita o
aprofundamento de tais conteúdos. A transferência do conteúdo para a formulação de
projetos da escola é uma alternativa que pode trazer sérios prejuízos aos conteúdos de
botânica no componente curricular de Ciências.

Dessa forma, descobrimos que existe a presença de resistências intensas e multivariadas


para uma mudança, necessidade de uma nova relação entre o professor especialista e o
aprendiz, urgindo assim o surgimento de uma proposta para uma mudança radical.

REFERÊNCIAS
128

ABREU, M.C., MASSETO, M.T. O professor universitário em aula. São Paulo: MG


Editores,1987. 130p.

ANGELINE, A., ALVES, L., DUARTE, W. O mestre ideal. Veja: São Paulo, 1982.

BORDENAVE, J.D., PEREIRA, A.M. Estratégias de ensino-aprendizagem.


Petrópolis: Vozes, 1977. 300p.

FIN, Arlete. O lúdico na Educação Infantil. Disponível no endereço eletrônico:


http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br/2012/05/o-ludico-na-
educacao-infantil-jogar-e.html. Acesso em 23 set. 2015.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1980. P.63-87.

ICAMI. Tiba. Ensinar a aprender. Revista Uol Educação, 2011. Disponível no


endereço eletrônico: http://www.tiba.com.br/artigo.php?id=041. Acesso em: 2 de agos.
2015.

LEMOV, Doug. Aula Nota 10 - 49 Técnicas Para Ser Um Professor Campeão de


Audiência. Editora Livros de Safra Ltda - Selo da Boa Prosa. 2011.
129

ESPAÇO GEOGRAFICO

Leandro Carvalho de Almeida Gouveia1

RESUMO

Este artigo tem como desejo realizar uma releitura a partir de diversos autores de
diversas correntes e escolas do pensamento geográfico. A Geografia enfrenta
problemas epistemológicos e conceituais. É o caso da definição do seu objeto de
estudo: o espaço geográfico. Apesar dos avanços das últimas décadas, ainda há
discordâncias teóricas a esse respeito. Assim, esse artigo tem por objetivo comentar
alguns esforços de definição do conceito de espaço geográfico e ao final propomos o
nosso próprio conceito. Entendemos que o espaço geográfico é o resultado contínuo
das relações sócio-espaciais e tais relações são econômicas, políticas e simbólico-
culturais. Espaço, território, uma boa discursão.

PALAVRAS-CHAVE: Geografia. Relações Espaciais. Espaço Geográfico.

1. INTRODUÇÃO

A citação do geografo e Professor Milton Santos sinalizam a crise


epistemológica da Geografia, que acabou por marginalizar o seu objeto, o
espaço geográfico. É claro que o contexto atual é diferente, muitos avanços
teóricos foram realizados, e a própria obra de Milton Santos é um bom exemplo
disso.

1
Doutorando em Desenvolvimento Regional e Urbano pela Universidade Salvador
(UNIFACS); Mestre em Desenvolvimento Humano e Responsabilidade Social pela
Fundação Visconde de Cairu. licenciado em Geografia pela Faculdade de Ciências
Educacionais; especialização em Metodologia do Ensino Superior pela Faculdades
Integradas Olga Mettig; Bacharel em Turismo pela Fundação Visconde de Cairu.
leandrocgouveia@gmail.com
130

Partimos da premissa de que a Geografia estuda o espaço geográfico e os


trabalhos dos autores aqui referidos versam sobre este que entendemos ser o
objeto da Geografia. O presente artigo tem como objetivo efetuar uma releitura
a partir de autores de diversas correntes do pensamento geográfico e colher
elementos para a construção de um conceito de espaço geográfico. Com isso
temos um propósito duplo: mostrar que a Geografia e o espaço geográfico não
são apenas passíveis de classificação e descrição, mas também podem ser
construídos e modificados, até mesmo (e inclusive) por nós pesquisadores que
fazemos parte dele; e nos permitir fazer uma viagem teórica a fim de conceituar
o espaço geográfico. O ecletismo teórico é fonte de riqueza e auxílio
fundamental para a discussão teórica e não apenas campo para classificações
para determinadas tendências. Contudo, a escolha por um caminho definido é
um imperativo, para que não se caia no perigo de ser “teóricos da moda” ou de
formar uma “colcha de retalhos” (SANTOS, 2002).

Debater e refletir sobre o desenvolvimento histórico da geografia, mesmo que isso já


tenha sido realizado por inúmeros estudiosos, nunca é demais, visto que proporciona
um melhor entendimento sobre o tema. É relevante o resgate e a revisão de
importantes pensamentos e pensadores, pois permite novos olhares sobre essa
dinâmica e importante ciência.

2. O ESPAÇO COMO CATEGORIA DE ANÁLISE

Conceito de espaço como categoria de análise da realidade sócio-espacial em um viés


eminentemente geográfico. Isso como desafio de construir instrumentos analíticos
comprometidos com a interpretação dos fundamentos da realidade sócio-espacial
contemporânea. Nesse sentido, vejamos alguns teóricos sobre a questão. Para Gomes
(2002, p. 172), três características definem o “espaço geográfico”: 1) o espaço é
sempre uma extensão fisicamente constituída, concreta, material, substantiva; 2) o
espaço compõe-se pela dialética entre a disposição das coisas e as ações ou práticas
sociais; 3) a disposição das coisas materiais tem uma lógica ou coerência.

Para esse autor (Ibid., p.290), “[...] a análise espacial deve ser concebida como um
diálogo permanente entre a morfologia e as práticas sociais ou comportamentos”.
Para Milton Santos (1999, p. 18), essa questão, de aporte analítico, pressupõe que “[...]
o espaço seja definido como um conjunto indissociável de sistemas de objetos e de
sistemas de ações”.
131

Gomes afirma que, “[...] as formas são portadoras de significados e sentidos” (1997,
p.38). Santos, por sua vez, define o espaço como um composto de “formas conteúdo”,
ou seja, formas que só existem em relação aos usos e significados, essa relação forma-
conteúdo é a cauda de sua existência. Como o espaço não é algo dado como nos
propõe Soja em seu “espaço em si” (1993), mesmo quando o mesmo tende remediar
e diz que sua organização e sentido são produtos da transformação e experiência
sociais. O espaço é, na realidade, um construto social dialético.

Mesmo sabendo disso, se desvincular de uma visão física do espaço, de algo dado, de
um “espaço em si” é algo bem trabalhoso.

Assim, salientamos que o espaço é um equilíbrio, uma espécie de equação engendrada


pela forma e pelos diferentes sentidos que ela é capaz de suscitar e condicionar.
Equacionados e construídos socialmente, os sentidos e significações da organização do
espaço são sempre advindos de uma perene relação, isto é, o espaço é uma
constituição relacional, relação entre objetos/coisas espacialmente distribuídas, da
relação entre os objetos e suas funções, o que traz os seus sentidos e significados, da
relação entre esses objetos e as vivências, isto é, das práticas sociais.

3. CONCEITO DE NATUREZA

A partir autonomia enquanto ciência, a concepção de natureza veiculada pelos


geógrafos constitui-se como algo externo ao homem. Natureza são os elementos ou o
conjunto dos elementos formadores do planeta Terra, ou seja, ar, água, solos, relevo,
fauna e flora. Esta separação constitui herança, como de resto nas demais ciências, das
idéias de Descartes de separação entre natureza e homem, dessacralização da
natureza, transformando-a em objeto e o homem em sujeito conhecedor e dominador
desta. Mesmo anteriormente à autonomia da Geografia, na introdução de sua obra
Cosmos (1862), Humboldt, diferenciava a análise da Terra sob duas formas: a da Física,
cujo objetivo seria o estudo dos processos físicos reduzidos a princípios abstratos e a
da geografia física, ou o estudo da articulação dos elementos constituintes da
configuração do planeta. (Humboldt, 1862, in Mendoza et al, l982).

De acordo com Suertegaray, a Geografia, mesmo pensada, por vezes, como estudo da
natureza enquanto paisagem natural, portanto algo independente do homem, ao se
tornar autônoma propõe uma concepção conjuntiva. Os fundadores da Geografia, a
exemplo de Ritter, Ratzel e La Blache, entre outros, propõem ainda que sob formas
diferentes, um objeto para a Geografia centrado na relação homem-meio (natureza).
Sob esta perspectiva, resgata a Geografia uma outra categoria analítica: a sociedade.
Nesta articulação em seus primeiros momentos a Geografia trabalhou mais com o
132

conceito de comunidade do que propriamente com o conceito de sociedade, aqui


entendida como expressão da vida humana através das relações sociais
temporalmente estabelecidas

David Harvey (l980) em seu livro Justiça Social e a Cidade, aborda o espaço sob outra
perspectiva. Num contexto dialético, vai conceber o espaço como sendo ao mesmo
tempo, absoluto (com existência material), relativo (como relação entre objetos) e
relacional (espaço que contém e que está contido nos objetos). Explicando, "o objeto
existe somente na medida em que contém e representa dentro de si próprio as
relações com outros objetos". Importa também considerar que, para este autor, o
espaço não é nem um, nem outro em si mesmo, podendo transformar-se em um ou
outro, dependendo das circunstâncias.

Mais recentemente, outras concepções fazem parte da concepção de espaço


geográfico. Milton Santos (1982) vai se referir a esta categoria dizendo: "o espaço é
acumulação desigual de tempos". O que significa conceber espaço como heranças. O
mesmo Milton Santos (1997) vai se referir a espaço–tempo como categorias
indissociáveis, nos permitindo uma reflexão sobre espaço como coexistência de
tempos. Desta forma, num mesmo espaço coabitam tempos diferentes, tempos
tecnológicos diferentes, resultando daí inserções diferentes do lugar no sistema ou na
rede mundial (mundo globalizado), bem como resultando diferentes ritmos e
coexistências nos lugares. Constituindo estas diferentes formas de coexistir,
materializações diversas, por conseqüência espaço(s) geográfico(s) complexo(s) e
carregado(s) de heranças e de novas possibilidades.

4. TERRITÓRIO

Em relação ao conceito de Território, tratamos o espaço geográfico a partir de uma


concepção que privilegia o político ou a dominação-apropriação. Historicamente, o
território na Geografia foi pensado, definido e delimitado a partir de relações de
poder. No passado da Geografia, Ratzel (1899), ao tratar do território, vincula-o ao
solo, enquanto espaço ocupado por uma determinada sociedade. A concepção clássica
de território vincula-se ao domínio de uma determinada área, imprimindo uma
perspectiva de análise centrada na identidade nacional. Afirmava Ratzel (1899),"no
que se refere ao Estado, a Geografia Política está desde a muito tempo habituada a
considerar junto ao tamanho da população, o tamanho do território". Continuando, "a
organização de uma sociedade depende estritamente da natureza de seu solo, de sua
situação, o conhecimento da natureza física do país, suas vantagens e desvantagens
pertence a história política" (Ratzel, 1899).
133

Álvaro Heidrich (1998), ao referir-se à constituição do território, nos diz "a


diferenciação do espaço em âmbito histórico tem início a partir da delimitação do
mesmo, isto é; por sua apropriação como território; em parte determinado pela
necessidade e posse de recursos naturais para a conquista das condições de
sobrevivência, por outra parte, por sua ocupação física como habitat. Neste instante,
na origem, a defesa territorial é exercida diretamente pelos membros da coletividade.
Noutro extremo, como já ocorre desde a criação do Estado, quando há população
fixada territorialmente e socialmente organizada para produção de riquezas, cada
indivíduo não mantém mais uma relação de domínio direto e repartido com o restante
da coletividade sobre o território que habita. Neste momento, a defesa territorial
passa a ser realizada por uma configuração social voltada exclusivamente para a
organização e manutenção do poder".

Sendo o espaço geográfico, como afirma Gomes, “sempre uma extensão


fisicamente constituída”, essa é a dimensão que correspondem aos objetos,
que podem ser, como mencionado a pouco, de ordem natural ou socialmente
construídos, porém, ambos são compostos e mantidos relação com as ações,
sempre de maneira indis-sociável, pois, necessita do outro para existir,
ampliando a discussão sobre essa relação, vemos que “os objetos não têm
realidade filosófica, isto é, não nos permitem o conhecimento, se os vemos
separados dos sistemas de ações. Os sistemas de ações também não se dão
sem os sistemas de ações” (SANTOS, 2012a, p. 63).

A ação de construir envolve uma série de técnicas que podem variar de acordo
com sua situação histórica e sempre necessita de uma realidade geográfica
para existir, ou seja, de um sistema de objetos e de ações. Mesmo nesse
exemplo a construção do martelo não deve ser pensada de maneira isolada do
contexto geográfico de sua existência, pois, pois tanto o martelo quanto e as
ações que envolvem sua construção eutilização estão inseridas numa lógica
sistêmica, sobre esse ponto, Milton Santos (2012a, p.73) reforça que:

o enfoque geográfico supõe a


existência dos objetos como
sistemas e não apenas
coleções: sua utilidade atual,
passada ou futura vem
exatamente do seu uso
combinado pelos grupos
humanos que os criaram ou que
os herdaram das gerações
anteriores. Seu papel pode ser
134

apenas simbólico, mas


geralmente é também funcional.

Está correto Milton Santos na sua afirmação que é também funcional os


objetos.

5. CONCLUSÃO

O sistema capitalista no momento atual procura ajustar os arranjos espaciais


como forma de continuar sua reprodução. Captar, mesmo em linhas gerais
estes processos garante uma visão de totalidade indispensável à análise
geográfica que queira atingir os lugares e sua dinâmica. O espaço geográfico é
o contínuo resultado das relações sócio-espaciais. Tais relações são
econômicas (relação sociedade-espaço mediatizada pelo trabalho), políticas
(relação sociedade-Estado ou entre Estados-Nação) e simbólico-culturais
(relação sociedade-espaço via linguagem e imaginário). Constantemente as
relações sócio-espaciais são contraditórias, pois revelam diferentes projetos
espaciais. No campo econômico, por exemplo, verificamos a exploração do
homem pelo homem, dos detentores dos meios de produção e dos vendedores
de força-de-trabalho.

Foi apresentado, de forma geral, os pontos que se julgou básicos e introdutórios para
as discussões sobre a temática proposta. Para o aprofundamento das discussões e das
reflexões indico a leitura das referências citada.

REFERÊNCIAS

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GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 22, pp. 65 - 72, 2007

GOMES, P. C. da C. Geografia e Modernidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.


HARVEY, D.Espaços
135

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Geografia, nº 23, AGB - Seção Porto Alegre,1998.

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MENDOZA, J. G. ; JIMENEZ, J. M. y CANTERO, N. O.(Orgs.) El pensamiento geográfico.
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Madrid: Alianza Editorial, 1982.

SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço:Técnica e Tempo. Razão e Emoção.


4ed. São Paulo: Edusp, 2012

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SUERTEGARAY, Dirce Maria Antunes. Disponível em:http://www.ub.edu/geocrit/sn-


93.htm. Acesso em: 6 outubro 2015.

RATZEL, F. El Territorio, la sociedad y el Estado. MENDOZA, J. G. ; JIMENEZ,J. M. y


CANTERO, N. O. (Orgs.) El pensamiento geográfico. Estudio Interpretativo y Antologia
de Textos (De Humboldt a las tendencias radicales). Madrid: Alianza Editorial, 1982.

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La globalizacion y la geografia. Homenaje a Milton Santos. Universidad de
Barcelona. Vol. VI, nº 124, 30 de septiembre de 2002.
136

CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NOVOS RUMOS PARA O


DIREITO NO BRASIL

José Cláudio Rocha1


Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
jrocha@uneb.br

Luiz Carlos Rocha2


Professor da Universidade do Estado da Bahia

RESUMO

O presente artigo defende a ideia de que as novas tecnologia de comunicação e


informação estão mudando o comportamento da sociedade contemporânea em direção a
sociedade do conhecimento. Essas mudanças estão ocorrendo em todas as áreas de
conhecimento humano, não sendo diferente com o direito que está em processo de
mudança para facilitar a pesquisa e a inovação no país. Descreve as principais mudanças
legislativas e aponta a necessidade de adequação do sistema jurídico nacional e dos
estados ao novo regulamento jurídico. Opina pelo surgimento de um novo ramo do
direito: o direito a ciência, tecnologia e inovação, com o objetivo de popularizar a
ciência, criar uma cultura empreendedora e inovadora no país, fortalecer a
produtividade e desenvolvimento nacional.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo foi produzido a partir de estudos e pesquisas realizados dentro


do Grupo de Pesquisa CriaAtivos: criando um novo mundo (CriaAtivos/UNEB/CNPq)
sobre os Novos Marcos Legais e as Políticas Públicas de Ciência, Tecnologia e
Inovação (CT&I) no país.
Descreve as características de uma nova legislação que está se formando na
esteira das mudanças provocadas pela chamada sociedade do conhecimento, fruto do
avanço das novas tecnologias de comunicação e informação, que esta mudando
radicalmente a vida das pessoas.

1
Advogado, economista e professor titular da UNEB. É pós-doutor em direito pela Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC), doutor e mestre em educação pela Universidade Federal
da Bahia (UFBA), especialista em administração pública pela UEFS e em Ética, Capital Social
e Desenvolvimento pelo INEAM/OEA. Coordenador do Centro de Pesquisa e Extensão em
Direitos Humanos Nelson Mandela (MADIBA), coordenador do Observatório de Educação e
Direitos humanos (OBEDHUC) e da Incubadora de Economia Solidária e Criativa. Especialista
nas áreas de direitos humanos; políticas públicas; ciência, tecnologia e inovação.
2
Sociólogo e professor de educação física, mestre e doutor em educação pela UFBA e
pesquisador do Grupo de Pesquisa CriaAtivos: criando um novo mundo.
137

Apresenta ao leitor esse novo marco legal presente nas leis: Lei de Inovação (Lei
10.973/2004); Lei do Bem (Lei 11.196/2005); a Lei 12.349/ 2010; Emenda
Constitucional nº 85; e o Projeto de Lei 2.177/2011 que institui o Código Nacional de
Ciência, Tecnologia e Inovação.
Este artigo justifica-se pela necessidade de discutir com a sociedade essas
mudanças e formas de aperfeiçoamento dessa legislação para favorecer a pesquisa e
inovação no país, assim como o desenvolvimento nacional. Conclui pela emergência de
um novo ramo para o direito, o direito à ciência, tecnologia e inovação.

2. NOVO PARADIGMA: SOCIEDADE DO CONHECIMENTO

O início deste século tem sido marcado por um período de transição da


sociedade industrial para uma sociedade pós-industrial que autores como Stiglitz
(1986), Tofler (2000), Manuel Castells (2003) e Domenico di Masi (2001), Rocha
(2008) chamam de sociedade do conhecimento.
Esse novo momento da história humana tem sido propiciado por uma revolução
tecnológica nos meios de informação e comunicação, especialmente, da internet que
tem mudado radicalmente o comportamento das pessoas.
Vivemos de fato uma mudança de paradigmas onde o conhecimento passa a ser
o principal insumo das economias contemporâneas. Quanto mais conhecimento, mais
valioso um produto ou serviço se torna.
Essas mudanças têm provocado repercussões em todas as áreas do
conhecimento humano e com o direito não seria diferente. Enquanto a infraestrutura
econômica avança no ritmo das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação
(TICs), o direito na superestrutura busca acompanhar essa tendência criando ou
adequando normas ao novo momento.
Em nossa “pátria mãe gentil”, pouco a pouco o legislador tem buscado criar um
novo marco legal para a pesquisa, ciência, tecnologia e inovação no país, o que nos
remete a sonhar com um novo direito no Brasil, o direito a ciência, tecnologia e
inovação.

3. UM NOVO MARCO LEGAL PARA O PAÍS NO CAMPO DA CIÊNCIA,


TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

3.1. Lei da Inovação


138

Entendemos que o primeiro passo seguro nesse sentido foi dado com a criação
da Lei de Inovação, Lei 10.973 de 02 de dezembro de 2004. A chamada Lei da inovação
nacional, em conjunto com as leis de inovação estaduais (no caso da Bahia a Lei 11.174
de 09 de dezembro de 2008), estabelece uma série de medidas de incentivo à inovação e
a pesquisa cientifica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à capacitação e
autonomia tecnológica e ao desenvolvimento industrial do país.
Entre as medidas de incentivo, considerando que a inovação é um meio para
transformar conhecimento em riqueza e melhorar a condição humana dos sujeitos
individuais e coletivos, os principais benefícios trazidos por essa legislação foram:

 A constituição de um ambiente propício a parceria estratégica entre Estado,


setor produtivo e universidades, a tríplice hélice de Etzkowitz (2009);
 A formação dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT) nas Instituições de
Ensino Superior (IES);
 O estímulo a participação dos Institutos de Ciência e Tecnologia no processo de
inovação e o estímulo a inovação na empresa.

A Lei da inovação não estimulou só aos estados-membros a criar suas próprias


legislações, as universidade se viram obrigadas a criar uma política acadêmica para a
inovação, incluindo essa categoria nos seus respectivos Planos de Desenvolvimento
Institucional (PDI) e Projetos Pedagógicos de Curso (PPC).
Já se passaram mais de dez anos da lei de inovação e o cenário nacional aponta
para uma revisão da lei. É preciso passar a limpo essa política pública, avaliando seus
entraves e avanços.

3.2. Lei do Bem

Depois da promulgação da Lei de Inovação (10.973/2004) tivemos a


promulgação de uma nova lei que cria incentivos fiscais para pessoas jurídicas que
investem em pesquisa e inovação tecnológica.
A Lei 11.196/05, que passou a ser conhecida como Lei do Bem, foi criada em
novembro de 2005 e regulamentada em junho de 2006, consolidando os incentivos
fiscais que as pessoas jurídicas podem usufruir de forma automática desde que realizem
pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica.
139

O Capítulo III foi editado por determinação da Lei 10.973/2004 – Lei da


Inovação – fortalecendo o novo marco legal para apoio ao desenvolvimento tecnológico
e inovação nas empresas.

3.3. LEGADOS DA COPA DO MUNDO

Na mesma linha a Lei 12.462 de 04 de agosto de 2011 criou o Regime


Diferenciado de Contratações públicas (RDC) para obras que envolvam a inovação
tecnológica, regime amplamente utilizado pelas universidades públicas brasileiras para a
realização de obras nos últimos anos.

3.4. ARTIGO 24 DA LEI DE LICITAÇÕES E CONTATOS

Por seu turno a LEI 12.349 de 15 de dezembro de 2010, altera o artigo 24 da lei
de licitações e contatos, em relação à dispensa de licitação para a aquisição de bens e
insumos destinados exclusivamente à pesquisa científica e tecnológica com recursos
concedidos pela Capes, pela Finep, pelo CNPq ou por outras instituições de fomento a
pesquisa credenciadas pelo CNPq para esse fim específico.
Pode-se perceber até aqui que o legislador brasileiro, preocupado com o
desenvolvimento nacional, vem facilitando a utilização de recursos federais.

3.5. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 85

Em fevereiro de 2015, o sistema de pesquisa e inovação brasileiro tem motivos


para comemorar com a promulgação da Emenda constitucional nº 85 que altera e
adiciona dispositivos na Constituição Federal para atualizar o tratamento das atividades
de ciência, tecnologia e inovação. Essa emenda é apontada pelos especialistas como um
marco na modernização da pesquisa cientifica e tecnológica e de inovação do país. O
texto da emenda atualiza e flexibiliza o texto constitucional para dar mais flexibilidade
ao ambiente de inovação do país.
Com as mudanças, o próprio termo “inovação” passa a figurar no texto
constitucional, complementando a expressão ciência e tecnologia, além de estimular a
cooperação do governo com instituições públicas e privadas. A emenda também amplia
o perfil de entidades que podem receber recursos financeiros do poder público,
140

incluindo também, além das universidades, outras instituições de educação profissional


e tecnológica.

3.6. CÓDIGO NACIONAL DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO

Por fim, a mais recente inovação legislativa em curso no país é o Projeto de Lei
2.177/2011 que institui o Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, alterando
as leis 6.815/1980, 11.540/2007, 12.309/2010, 10.973/2004 e 8.010/1990. Esta Lei, uma
vez aprovada, vai regulamentar os artigos 218 e 219 da Constituição Federal de 1988
favorecendo a capacitação, autonomia tecnológica e desenvolvimento industrial do país.
Essa nova lei estimula a formação de ambientes especializados e cooperativos de
inovação, e fomento poderão estimular e apoiar a constituição de alianças estratégicas e
o desenvolvimento de projetos de cooperação envolvendo empresas nacionais e
internacionais, Entidades de Ciência, Tecnologia e Inovação (ECTI) e organizações de
direito privado voltadas para atividades de formação de recursos humanos altamente
qualificados, pesquisa e desenvolvimento que objetivem a geração de produtos e
processos inovadores.
Entendemos que essa lei inova também ao definir como Entidade de Ciência,
Tecnologia e Inovação (ECTI) órgãos ou entidades do setor público e privado, com ou
sem fins lucrativos, legalmente constituídos, que tenham por missão institucional,
objetivo social ou estatutário, dentre outros, o desenvolvimento de novos produtos ou
processos, com base na aplicação sistemática de conhecimentos científicos e tecológicos
e na utilização de técnicas consideradas avançadas ou pioneiras, ou execute atividades
de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico, tecnológico ou de inovação, que
seja básica ou aplicada de caráter cientifico, tecnológico ou de inovação, que seja
beneficiária do fomento ou financiamento previsto em lei.
Essa legislação, dita aqui de forma breve e resumida, aplicada em conjunto com
outras normas aplicadas a esse campo como a legislação sobre propriedade intelectual; a
Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279 de 14 de maio de 1996); a legislação sobre
direitos do autor; assim como o Marco Civil para a Internet (Lei 12.965 de 23 de abril
de 2014) e o Marco Regulatório das organizações da Sociedade Civil (Lei
13.019/2014),vão formando o que podemos chamar de Marco Legal para a Ciência,
Tecnologia e inovação no país que deve fomentar a Popularização da Ciência e o
141

Empreendedorismo; a formação de ambientes de inovação; e a aceleração do


desenvolvimento econômico e social sustentável de nosso país.

4. CONCLUSÃO

Em síntese, a legislação brasileira nos últimos anos tem sido avaliada pelos
atores do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) como um dos
grandes entraves ao desenvolvimento científico do país. Felizmente essa realidade vem
mudando, parece que o governo brasileiro acordou em relação a necessidade de criação
de um marco legal mais amigável para com a pesquisa cientifica e tecnológica do país,
facilitando a liberação de recursos para essa atividade no país.
As nos leis que estão sendo aprovadas, assis Tribunais de Contas.
As universidades também – enquanto entidades de ciência, tecnolom como a
Emenda que altera o texto constitucional são uma prova disso. Todavia, mudar a lei
somente não vai resolver a questão, será preciso um esforço nacional pela informação e
capacitação das pessoas que operam o direito nessa área como Procuradores de Estado,
Ministério Público e o próprio judiciário, não esquecendo dos órgãos de controle como
ogia e inovação – deverão passar por grandes reformas em seus regulamentos internos
para se adequar a nova realidade, caso contrário ficarão no atraso e com dificuldades
inclusive para obter recursos para a sua sobrevivência. Talvez assim recupere
legitimidade social perdida ao produzir um conhecimento mais sintonizado com as
necessidades sociais.
O Brasil vive um grande risco, o risco da dependência tecnológica, nova
fronteira de exclusão entre as nações. Ou nosso país de adequa aos novos tempos, ou
verá a produtividade e o desenvolvimento nacional patinar frente ao avanço tecnológico
de outras nações. De nossa parte, somos otimistas quando este ponto, acreditamos que
esse novo caminho nos levará a um novo ramo para o direito, o direito à ciência,
tecnologia e inovação.

BIBLIOGRAFIA

BAHIA. a Lei 11.174 de 09 de dezembro de 2008 (Lei de Inovação do Estado da


Bahia). Governo do Estado da Bahia: Salvador, 2015.

BRASIL. Lei 10.973 de 2004 (Lei da Inovação Nacional). Presidência da República:


Brasília, 2015.
142

BRASIL, Lei 11.196 de 2005 (Lei do Bem). Presidência da República: Brasília, 2015.

BRASIL, Lei 12.462 de 04 de agosto de 2011 (Regime Diferenciado de Contratações


públicas - RDC). Presidência da República: Brasília, 2015.

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