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Língua Portuguesa:

Linguística Textual
Material Teórico
Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Responsável pelo Conteúdo:


Profa. Ms. Elaine A. Souto Antunes

Revisão Textual:
Profa. Ms. Fátima Furlan
Se apropriando dos gêneros textuais:
Usos e características

• Introdução
• Tipo textual e gênero textual, um só conceito?
• Os gêneros textuais e sua aplicação no ensino e aprendizagem da
leitura e da escrita

··Apropriar-se do conceito de gênero textual, tipo textual e domínio discursivo;


··Entender a relação entre os gêneros textuais e a escola;
··Perceber a importância dos gêneros textuais na organização da sociedade.

Nesta unidade, vamos conversar sobre os gêneros textuais, suas características e os seus usos.
Traçaremos também um panorama histórico a respeito do desenvolvimento do processo de ensino-
aprendizagem de língua portuguesa, com o intuito de mostrar como os gêneros textuais entram
nesse universo e quais são suas contribuições.
Para obter um bom desempenho, você deve começar pela leitura do Conteúdo Teórico. Aqui, você
encontrará o material principal de estudo na forma de texto escrito. Depois, assista à Apresentação
Narrada e à Vídeoaula, que sintetizam questões importantes. Consulte as indicações sugeridas e leia
os textos na íntegra. É importante ir aos textos indicados, pois eles trazem pormenores e curiosidades
a respeito do assunto abordado nesta unidade.

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Contextualização

Fábula – conto – romance – conta de luz – receita – bilhete


e-mail – memorando – artigo de jornal – carta ao leitor – fatura do cartão de crédito
manual do computador – poema – videoconferência – telejornal – novela

Gostaria que você pensasse a respeito das seguintes perguntas:


• O que os textos citados acima têm em comum?
• Existe algum ponto de intersecção que possa ligá-los?
Será justamente sobre as resposta dessas perguntas que vamos tratar nesta unidade. O elo de
intersecção entre esses textos é que eles se constituem como gêneros textuais que circulam na
sociedade para disseminar conhecimentos. E será exatamente sobre os gêneros que conversaremos.
Os gêneros textuais são os modelos de textos que temos a nossa disposição. Eles exercem
uma função comunicativa e possibilitam aos membros da sociedade se organizarem. Todo
gênero se materializa por meio de um texto.
– Vamos, então, aprender um pouco mais sobre as características deles?
Esse é o convite feito nesta unidade.

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Inrodução

Nesta unidade, trataremos dos gêneros textuais, esses, que hoje, são considerados elementos
essenciais no processo de ensino e de aprendizagem das crianças (da leitura e da escrita em
todos os níveis de ensino). Os Parâmetros Nacionais Curriculares (PCNs) abordam a questão
dos gêneros como, sendo eles, o instrumento que deve ser utilizado pelos professores para
mediar o ensino de línguas. Então, faremos aqui um passeio no universo dos gêneros textuais
para nos apropriarmos melhor dos conceitos e ideias que os envolvem.
Para o estudo que vamos empreender, utilizaremos o livro Gêneros Textuais e Ensino,
organizado pelas professoras Angela Paiva Dionísio, Anna Rachel Machado e Maria Auxiliadora
Bezerra. Vamos nos deter em dois capítulos em especial. O primeiro chama-se “Gêneros textuais:
Definição e Funcionalidade”, do Professor Luiz Antônio Marcuschi; e o segundo, “Ensino de
língua portuguesa e contextos teóricos metodológicos”, da Professora Maria Auxiliadora Bezerra.
O primeiro texto, que embasa nosso estudo, começa com um interessante levantamento das
questões sócio-históricas que envolvem os gêneros. Nele, o Prof. Marcuschi salienta que o ser
humano é um sujeito histórico e que vive em sociedade. Portanto, seus valores e conhecimentos
partem do coletivo que se dá por meio de uma cultura e de uma vida social.
Para que os conhecimentos, constituídos nessa vida em sociedade, circulem e se difundam
serão utilizados os textos nas suas mais variadas possibilidades de gêneros.
Logo, o gênero textual está relacionado às atividades comunicativas do dia a dia, organizando-
as e estabilizando padrões de comportamentos que se formam por meio das relações eu com o
outro, uma vez que ninguém vive sozinho. Também é preciso lembrar que os gêneros não são
frutos de um trabalho cognitivo individual de um sujeito único que deseja comunicar-se.
Os gêneros textuais carregam em si uma função sóciodiscursiva com alto poder de difusão de
modelos comportamentais, de conhecimentos culturais e tecnológicos da sociedade.
Os gêneros são, portanto, entidades altamente “maleáveis, dinâmicos e plásticos”. Isso significa
dizer que eles têm alto poder de mutação ao longo do tempo, transformando-se e alterando-se à
medida que a sociedade vai evoluindo. Alguns gêneros desaparecem, outros servem como base
para novos gêneros e outros são criados de acordo com as necessidades impostas pela evolução
humana, como, por exemplo, aqueles que surgem graças aos desenvolvimentos tecnológicos.
O Professor Marcuschi comenta algo interessante sobre o exposto acima. Ele esclarece que os
povos, cuja passagem do conhecimento se dava pela oralidade, possuíam um número limitado de
gêneros; e que no século VII A.C. surge a escrita alfabética, fato que possibilitou o aparecimento
dos gêneros da escrita. A partir do século XV, surgem os registros impressos o que acarreta em
uma grande expansão dos gêneros. No século XVIII, com o processo de industrialização ocorre
outro salto na criação de gêneros com o surgimento dos gêneros relacionados à imprensa, como
os jornais, os folhetins, os romances etc. Hoje, se vive a era da cultura eletrônica com o telefone,
o gravador, o rádio, a tv, o computador e principalmente o celular e a internet que chamam para
si uma necessidade de novos gêneros, orais e escritos, para que possam ser utilizados.

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Esse percurso histórico demarca para além da evolução dos gêneros, a percepção de que eles
são criados por uma necessidade funcional de transmissão do conhecimento e de propagação de
formas comunicativas, caracterizando-se, portanto, por “suas funções comunicativas, cognitivas
e institucionais” em contra ponto com as suas características linguísticas e estruturais.
Isso significa dizer que devemos abordar as questões relativas aos gêneros a partir de uma
perspectiva “sóciopragmática” de seus usos e de suas “práticas sociodiscursivas”.
Ocorreu uma multiplicação rápida dos gêneros nos últimos dois séculos, o que está diretamente
correlacionado aos avanços dos meios de comunicação, pois esses por suas características
extremamente dialógicas fizeram surgir novos gêneros como, por exemplo:- telefonema,
telemensagens, notícias, artigos, reportagens, teleconferências, videoconferências, e-mails, salas de
bate papo, vídeo aulas etc. Esses são alguns exemplos de gêneros que se difundem cada dia mais.
No entanto, Marcuschi lembra-nos que os novos gêneros não são inovações. Ao contrário,
eles são adaptações de gêneros existentes, que se transformam de acordo com as exigências que
os novos suportes impõem.

Suporte é o meio utilizado para veicular ou transmitir cada gênero,


por exemplo, o jornal, o livro, a revista, o computador, o celular etc.

Marcuschi ainda cita o conceito de “transmutação”, desenvolvido por Bakhtin (1997). A


‘transmutação’ dos gêneros é a mudança que acontece com um gênero já existente e a partir
do qual aparece um gênero novo tanto na forma como na função que exercerá na sociedade.
Outro aspecto importante a ressaltar é que os novos gêneros da contemporaneidade
estabeleceram um estreitamento das fronteiras entre oralidade e escrita. Cada vez mais, esses
dois aspectos, escrita e fala se intercambiam dentro dos novos gêneros, como é o caso das
mensagens escritas passadas pelos celulares ou por e-mails, que têm uma estreita ligação com
práticas da fala, pois ocorriam por meio do telefonema, por exemplo. O Professor Marcuschi
salienta que

Esses gêneros, que emergiram no último século no contexto das


mais diversas mídias, criam formas comunicativas próprias com
certo hibridismo que desafia as relações entre oralidade e escrita
e inviabiliza de forma definitiva a velha visão dicotômica ainda
presente em muitos manuais de ensino de língua. Esses gêneros
também permitem observar a maior integração entre os vários
tipos de semioses: signos verbais, sons, imagens e formas em
movimento. A linguagem dos novos gêneros torna-se cada vez
mais plástica, assemelhando-se a uma coreografia e, no caso das
publicidades, por exemplo, nota-se uma tendência a servirem-
se de maneira sistemática dos formatos de gêneros prévios para
objetivos novos.” ( 2010, p. 21)

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Exemplo:
Propaganda Sazon

Fonte: Agência Abracadabra

Nesse exemplo, a propaganda foi criada utilizando usando o poema Quadrilha de Carlos
Drummond de Andrade, veja que ocorre uma apropriação do gênero poema para formar a
propaganda da Sazon. E o que estabelece a ligação entre o produto Sazon e o poema é o tema
do amor.
Os gêneros se definem em grande parte pela sua função e seus aspectos sociocomunicativos,
no entanto, cabe ressaltar que aspectos formais (linguísticos e estruturais) bem como os suportes
e os locais onde determinados gêneros aparecem, também servem como elementos para
classificá-los. Portanto, é bom ser precavido e observar todos os elementos que colaboram para
nomear um texto como pertencente a determinado gênero.

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Tipo textual e gênero textual, um só conceito?

Existe uma confusão entre os conceitos de gênero textual e tipo textual. É comum as pessoas
tratarem os gêneros como tipos de textos, mas isso não está correto. Os gêneros textuais
são modelos de textos que se organizam de acordo com as necessidades de transmissão do
conhecimento de um povo.
Ao tratar dos gêneros textuais, o Prof. Marcuschi fala das práticas sociocomunicativas que
circundam toda e qualquer sociedade. Pois, é inegável que o ser humano se comunica por
meio dos textos, sejam eles orais ou escritos. Por isso, existe um pressuposto básico de que “é
impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível se
comunicar verbalmente a não ser por algum texto. Em outros termos, partimos da ideia de que
a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual.” (Marcuschi, 2010, p. 22).
O posicionamento apresentado acima parte de uma concepção da língua como “atividade
social, histórica e cognitiva” que observa sua “natureza funcional e interativa e não o aspecto
formal e estrutural da língua”. (Marcuschi, 2010, p. 23)
A abordagem, que considera o caráter social da língua, os desenvolvimentos históricos e
os fatores cognitivos, é importante porque nos permite consolidar uma primeira posição, que
consiste em perceber que “a língua não é vista como um espelho da realidade, nem como um
instrumento de representação dos fatos” (Marcuschi, 2010, p. 23). Isso equivale à consideração
de que a língua não serve como decalque ou reflexo da realidade tal como ela é no mundo real.
Ao contrário, não é possível apreender o mundo real, porque ele é recriado sobre diversos
aspectos pela língua. Pois, “a língua é tida como uma forma de ação social e histórica que, ao
dizer, também constitui a realidade, sem, contudo, cair num subjetivismo ou idealismo ingênuo.
(Marcuschi, 2010, p. 23)”
Em outras palavras, a língua nos permite recriar o mundo de acordo com nossos pensamentos.
E esses estão respaldados por valores sociais e históricos. Assim, os gêneros serão os representantes
desse movimento de recriação e organização do mundo.
Ao observar os gêneros, como exposto anteriormente, de uma perspectiva funcional com
relação ao meio de criação e circulação no qual eles se apresentam, surge uma pergunta: -
A estrutura interna de cada gênero deixa de ter importância e necessidade de apreensão?
A resposta é: - Não.
Para apreender os elementos estruturais e composicionais relativos ao gênero criou-se o
conceito de tipologia textual.
A tipologia textual abarca as características linguísticas e composicionais dos textos. Essas
características são definidas pelos estudiosos como alguns poucos tipos de estruturas textuais.
Para compreender a diferença entre gênero textual e tipo textual, vamos citar duas definições,
que está no trabalho do Professor Marcuschi:

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Tipo textual
Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de
sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua
composição (aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações
lógicas). Em geral os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de
categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição,
descrição, injunção.
(Marcuschi, 2010, p. 23)

Gênero textual
Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente
vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa
vida diária e que apresentam características sociocomunicativas
definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição
característica. Se os tipos textuais são apenas meia dúzia, os gêneros
são inúmeros. Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema,
sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem
jornalística, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia jornalística,
horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio
de restaurante, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha,
edital de concurso, piada, conversação espontânea, conferência, carta
eletrônica, bate-papo por computador, aulas virtuais e assim por diante.
(Marcuschi, 2010, p. 23 – 24)

Observe que cada definição baseia-se em critérios diferentes. Para tipo textual considerou-se
a estruturação interna dos elementos que compõem o texto. Enquanto, para gênero textual foi
elencado como fator preponderante sua função sociocomunicativa no dia a dia.
Com o objetivo de melhor visualizar e internalizar as diferenças entre gênero textual e tipo
textual, observe o quadro proposto por Marcuschi (2010, p. 24) e que reproduzimos a seguir:

Tipos Textuais Gêneros Textuais


Constructos teóricos definidos por propriedades Realizações linguísticas concretas definidas por propriedades sociocomunicativas;
1 linguísticas intrínsecas;
Constituem sequências linguísticas ou sequências Constituem textos empiricamente realizados, cumprindo funções em situações
2 de enunciados e não são textos empíricos; comunicativas;
Sua nomeação abrange um conjunto limitado de Sua nomeação abrange um conjunto aberto e praticamente ilimitado de
3 características teóricas determinadas por aspectos designações concretas determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e
lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal; função;
Designações teóricas dos tipos: narração, Exemplo de gêneros: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal,
4 argumentação, descrição, injunção e exposição. romance, bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, reunião
de condomínio, notícia jornalística, horóscopo, receita culinária, bula
de remédio, lista de compras, cardápio de restaurante, instruções de
uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada,
conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo por
computador, aulas virtuais etc.
Fonte: Marcuschi, 2010, 24)

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Outro conceito importante, tratado no trabalho do professor Marcuschi, diz respeito à


expressão “domínio discursivo”. E encontra-se assim definido:

Usamos a expressão domínio discursivo para designar uma esfera


ou uma instância de produção discursiva ou de atividade humana.
Esses domínios não são textos nem discursos, mas propiciam o
surgimento de discursos bastante específicos. Do ponto de vista
dos domínios, falamos em discurso jurídico, discurso jornalístico,
discurso religioso etc., já que as atividades jurídica, jornalística
ou religiosa não abrangem um gênero em particular, mas dão
origem a vários deles. Constituem práticas discursivas dentro das
quais podemos identificar um conjunto de gêneros textuais que, às
vezes, lhe são próprios (em certos casos exclusivos) como práticas
ou rotinas comunicativas institucionalizadas. Ou seja, o domínio
discursivo é uma esfera que comporta diversos gêneros textuais
que dizem respeito a um mesmo tema ou a uma mesma área.
(Marcuschi, 2010, p. 24- 25)

Além dos conceitos apresentados, ainda se faz necessário lembrar a diferença entre texto e
discurso, pois não representam a mesma coisa. O Professor Marcuschi coloca:

... texto é uma entidade concreta realizada materialmente e


corporificada em algum gênero textual. Discurso é aquilo que um
texto produz ao se manifestar em alguma instância discursiva.
Assim, o discurso se realiza nos textos. Em outros termos, os textos
realizam discursos em situações institucionais, históricas, sociais e
ideológicas. Os textos são acontecimentos discursivos para os quais
convergem ações linguísticas, sociais e cognitivas, segundo Robert
de Beaugrande (1997).
(Marcuschi, 2010, p.25)

Veja que existe uma diferença entre texto e discurso. Texto é visto como a estrutura linguística
que organiza o gênero textual, enquanto o discurso é a projeção de valores instaurados dentro
dos textos de acordo com uma intenção comunicativa.
O exposto, até o presente momento, busca deixar claro que não se deve confundir tipos textuais
com gêneros textuais. Os tipos textuais configuram-se por sua ordem linguisticamente estrutural.
Isso é importante porque observamos que ocorre uma confusão ao citar determinados gêneros
como se eles fossem tipos de textos. Por exemplo, quando alguém diz: - O romance é um tipo de
texto muito longo. Nesse caso, o romance não é um tipo de texto, mas um gênero textual.
Também é importante salientar que muitos gêneros comportam na sua formação diversos
tipos textuais que se entrelaçam para formar o texto. Mas, sempre ocorre o predomínio de um
ou dois tipos em relação aos demais.
Como os tipos textuais são limitados, é possível enumerá-los e identificar suas principais
características. Para tanto, tomemos uma formulação feita por Werlich (1973) que se encontra
em Marcuschi:

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Bases Temáticas Exemplos Traços Linguísticos
1. Descritiva “Sobre a mesa havia Esse tipo de enunciado textual tem uma estrutura
milhares de vidros.” simples com um verbo estático no presente ou
imperfeito, um complemento e uma indicação
circunstancial de lugar.

2. Narrativa “Os passageiros Esse tipo de enunciado textual tem um verbo


aterrissaram em Nova de mudança no passado, um circunstancial
York no meio da noite.” de tempo e lugar. Por sua referência temporal
e local, este enunciado é designado como
enunciado indicativo de ação.

3. Expositiva (a) “Uma parte do Em (a), temos uma base textual


cérebro é o córtex.” denominada exposição sintética pelo
processo da composição. Aparece um
(b) “O cérebro tem 10 sujeito, um predicado (no presente) e um
milhões de neurônios.” complemento com um grupo nominal.
Trata-se de um enunciado de identificação
de fenômenos. Em (b), temos uma base
textual denominada de exposição analítica
pelo processo de decomposição. Também
é uma estrutura com um sujeito, um verbo
da família do verbo ter (ou verbos como:
“contém”, “consiste”, “compreende”) e um
complemento que estabelece com o sujeito
uma relação parte-todo. Trata-se de um
enunciado de ligação de fenômenos.

4. Argumentativa “A obsessão com a Tem-se aqui uma forma verbal com o verbo
durabilidade nas artes ser no presente e um complemento (que no
não é permanente.” caso é um adjetivo). Trata-se de um enunciado
de atribuição de qualidade.

5. Injuntiva “Pare!” Vem representada por um verbo no


“Seja razoável.” imperativo. Estes são os enunciados incitadores
à ação. Estes textos podem sofrer certas
modificações significativas na forma e assumir,
por exemplo, a configuração mais longa onde
o imperativo é substituído por um “deve”. Por
exemplo: “Todos os brasileiros na idade de 18
anos de sexo masculino devem comparecer ao
exército para alistarem-se”.
Fonte: Marcuschi, 2010, 29

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Exemplo:

Fábula – A formiga e a cigarra


Num dia quente de verão, uma alegre cigarra estava a cantar e a
tocar o seu violão, com todo o entusiasmo. Ela viu uma formiga a
passar, concentrada na sua grande labuta diária que consistia em
guardar comida para o inverno.
“D. Formiga, venha e cante comigo, em vez de trabalhar tão
arduamente.”, desafiou a cigarra “Vamos-nos divertir.”
“Tenho de guardar comida para o Inverno”, respondeu a formiga,
sem parar, “e aconselho-a a fazer o mesmo.”
“Não se preocupe com o inverno, está ainda muito longe.”, disse
a outra, despreocupada. “Como vê, comida não falta.”
Mas a formiga não quis ouvir e continuou a sua labuta. Os meses
passaram e o tempo arrefeceu cada vez mais, até que toda a Natureza
em redor ficou coberta com um espesso manto branco de neve.
Chegou o inverno. A cigarra, esfomeada e enregelada, foi à casa
da formiga e implorou humildemente por algo para comer.
“Se você tivesse ouvido o meu conselho no Verão, não estaria
agora tão desesperada.”, ralhou a formiga. “Preferiu cantar e tocar
violão! Pois agora dance!”
E dizendo isto, fechou a porta, deixando a cigarra entregue à sua
sorte.
Moral da história:
Não pense só em divertir-te. Trabalha e pensa no futuro.
É melhor estarmos preparados para os dias de necessidade.
Fonte: http://www.escolovar.org/fabula_1pagina_cigarra.formiga.htm - acesso em 11/12/2014

A fábula é um gênero textual, e essa fábula que escolhemos como exemplo é um tipo de texto
predominantemente narrativo que conta que a cigarra cantava enquanto a formiga trabalhava e
o resultado disso com o passar do tempo. No entanto, encontramos em sua estrutura outros tipos
textuais como, por exemplo: a descrição que inicia a história “Num dia quente de verão, uma
alegre cigarra estava a cantar e a tocar o seu violão, com todo o entusiasmo” ou a injuntiva nos
seguintes trechos: “D. Formiga, venha e cante comigo, em vez de trabalhar tão arduamente.”
“Vamo-nos divertir.”
Ao contrário dos tipos textuais, que são definidos por suas formas e possuem um número
limitado, não é possível fazer uma relação dos gêneros que circulam nas sociedades. Alguns
linguistas alemães ao tentar empreender esse trabalho nomearam mais de 4.000 gêneros.
Segundo Bakhtin, os gêneros são ( “eram” dá a ideia de que não são mais) “tipos relativamente
estáveis de enunciados”, vamos então considerar que os gêneros

“São muito mais famílias de textos com uma série de semelhanças.


Eles são eventos linguísticos, mas não se definem por características
linguísticas: caracterizam-se, como já dissemos, enquanto atividades
sociodiscursivas. Sendo os gêneros fenômenos sociohistóricos e
culturalmente sensíveis,...”
(Marcuschi, 2010, p. 31)

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Os gêneros textuais e sua aplicação no ensino e aprendizagem da
leitura e da escrita

Hoje, o ensino de Língua Portuguesa é regulamentado pelos Parâmetros Curriculares


Nacionais (PCNs), documento elaborado entre 1997 e 1998 e que traça as diretrizes para o
ensino de um modo geral, no Brasil.
No caso da Língua Portuguesa, a proposta apresentada volta-se para o tratamento da
Língua não mais de forma mecânica e engessada dentro da tradição de estudos normativos.
Ao contrário, propõe-se uma abordagem comunicativa que terá o texto, nos seus mais diversos
gêneros, como instrumento primordial de trabalho.
Para compreender a nova abordagem no ensino de língua portuguesa, convido você para
conhecer a história do ensino de Língua Portuguesa no Brasil. A Professora Maria Auxiliadora
Bezerra trata justamente dessa questão em seu texto “Ensino de língua portuguesa e contextos
teóricos metodológicos”. Vamos, então, nos reportar a esse trabalho, para traçar um panorama
de como o ensino de português era e como ele deve ser na atualidade.

Sabemos que o ensino de nosso idioma se dava a partir de estudos


dagramática normativa, em sua perspectiva prescritiva (quando se
impõe um conjunto de regras a ser seguido, do tipo concordância
verbal e nominal) e também analítica (quando se identificam as
partes que compõe um todo, com suas respectivas funções, do tipo
funções sintáticas dos termos da oração, elementos mórficos das
palavras).
(Bezerra, 2010. p. 39)

O ensino de português voltado para o estudo das regras gramaticais, segundo um padrão
linguístico tido como “culto” e que não correspondia aos usos efetivos apresentados pelos
falantes do português, foi a maneira como se deu, durante anos, o ensino dentro das escolas.
O modelo de ensino totalmente mecanizado e baseado na utilização de regras da língua
“culta” estava respaldado por dois fatores: um externo ao sistema da língua e outro baseado em
fatores internos de aprendizagem da língua.
Como fator externo nos é apresentado o fato da língua portuguesa só integrar os currículos
escolares brasileiros no final do século XIX, até então, ela só era utilizada para alfabetização
e quem tinha o direito de continuar os estudos eram aqueles que pertenciam às classes mais
elevadas da sociedade. Quando o estudo da língua passa a ser ofertado a todos, ocorre uma
tendência de querer ensinar o padrão daqueles que já conviviam com a língua culta, ou seja, o
objetivo era ensinar a língua “culta” a quem ainda não a dominava.
O fator interno está relacionado ao fato de que o latim, a retórica e a poética formavam o
conjunto de elementos a serem estudados por quem prosseguia seus estudos após a alfabetização
e, sendo o latim abordado numa perspectiva gramatical, usou-se o mesmo modelo para o
ensino do português.

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

As rápidas mudanças na sociedade, nas relações sociais, as novas tecnologias e formas de


produção, além do desenvolvimento de novos estudos sobre língua e linguagem e o surgimento
de novas teorias influenciaram e mudaram o ensino de línguas. A ciência linguística, por exemplo,
propiciou uma reflexão a respeito da língua em uso. Isso mostrou que é necessário muito mais
do que memorizar regras gramaticais para se apropriar da forma tida como “culta”.
Os estudos linguísticos contribuíram para a introdução de uma nova perspectiva para o
ensino de línguas, considerando a relação do eu com o outro, dentro de um contexto histórico
e social em constante transformação. Passou a ser considerado o caráter dialógico dos textos e
suas funções na sociedade.
Também, cabe lembrar, por exemplo,

... a teoria sociointeracionista vygotskyana de aprendizagem, as


de letramento e as de texto/discurso, que possibilitam considerar
aspectos cognitivos, sociopolíticos, enunciativos e linguísticos
envolvidos no processo de ensino/aprendizagem de uma língua.
(Bezerra, 2010, p. 40)

Veja, então, que vários fatores começaram a ser considerados importantes no processo de
ensino/ aprendizagem da língua. As questões linguísticas continuaram sendo consideradas, mas
entraram em cena, também, elementos de outra ordem. As questões relacionadas ao processo
cognitivo passaram a ser pensadas. A questão de o homem ser um sujeito social e histórico
que produz conhecimento entrou na pauta como responsável pelo processo de apropriação
e desenvolvimento da língua. Os fatores funcionais que estão presentes na base dos textos
também foram privilegiados.
Nesse novo contexto, passa a se pensar no importante papel que a escola exerce para a
difusão do conhecimento. Conhecimento produzido e acumulado pela humanidade e que deve
ser repassado de maneira natural e prazerosa de geração em geração por meio da língua. Para
que esse processo de transmissão do conhecimento ocorra devemos nos apropriar dos textos
que circulam na sociedade em forma de gêneros.
Outro fator importante que precisa estar na pauta é o fato de que os alunos já têm um
contato com a língua e já utilizam essa língua de maneira natural. Claro que a maioria usa uma
variante não padrão do português, no entanto, isso não pode e não deve causar nenhum tipo
de problema. Ao contrário, a escola precisa acolher as variantes que os alunos trazem.
Não se nega aqui a importância da língua “padrão”, apenas se busca chamar atenção
para uma emergente necessidade de mediar a relação entre a língua vista como culta e os
conhecimentos que os alunos já possuem sobre a língua que usam no seu cotidiano. Deve-se
tomar como base o que o aluno já sabe da língua e que usa para se comunicar e a partir desse
ponto, transformá-los em sujeitos letrados.
Em outras palavras, a proposta é trabalhar as questões que envolvem a língua a partir de
uma abordagem que propicie ao aluno tornar-se um sujeito letrado. Isso significa ser um sujeito
que reflita sobre sua língua e a linguagem. Para saber usá-las, língua e linguagem, nas mais
diversas situações da vida. A formação desse sujeito não é possível apenas propondo uma
apreensão mecanizada das regras da língua portuguesa.

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Existe uma diferença entre alfabetização e letramento.
Atenção Alfabetização é o processo de ensino dos símbolos da escrita (grafemas)
que organizam uma língua e que permitem aos sujeitos escreverem.
Letramento é o processo de transmissão e apropriação pelos sujeitos dos
conhecimentos históricos, sociais e tecnológicos produzidos pela humanidade
que lhes permite compreender, interpretar, atuar e interagir em sociedade por
meio de textos.

Todo o processo de práticas de leitura e escrita, a partir de textos, desenvolve o letramento


nos sujeitos, em maior ou menor grau. Todas as atividades humanas decorrem da tratativa com
os textos nos seus mais variados gêneros. No entanto, cabe lembrar que

Sendo culturalmente determinados, os gêneros textuais não


são aprendidos e usados igualmente por todos: aqueles que são
rotinizados por grupos sociais influentes não chegam à população
em geral, pois, subjacentes a essas práticas, há os mecanismos
sociopolíticos e ideológicos de controle dos recursos materiais
e simbólicos (Signorini, op.cit.p.10). É o que Street (1984)
denominava letramento ideológico, para explicar o fato de que os
eventos de letramento não são apenas aspectos da cultura, mas
também das estruturas de poder numa sociedade.
(Bezerra, 2010. p. 42)

Perceba que trabalhar com textos a partir das funções que os diversos gêneros exercem na
organização e manutenção dos discursos, que se entrelaçam no seio da sociedade, é preparar
o aluno para uma reflexão sobre seu papel no mundo. Os gêneros textuais são meios de
comunicação que também exercem o papel de difusor ideológico e mecanismo de manutenção
ou mudança dentro de uma sociedade.
Enfim, o trabalho com os gêneros em sala de aula é algo inevitável. Cabe ao professor,
portanto, alterar uma postura arraigada durante anos. Postura essa, de tratar os gêneros
considerando apenas os seus elementos estruturais e formais. É necessária uma abordagem dos
gêneros, como dito anteriormente, focando seus aspectos comunicativos e interacionais. Isso
propiciará aos alunos entenderem que cada gênero encontra-se inserido na sociedade com um
papel e uma função específica.
Nessa nova perspectiva, cabe ao professor também trabalhar com o maior número de gêneros
possíveis. Deve circular nas salas de aula tanto os gêneros literários como os não literários,
assim como, os gêneros que surgem graças às inovações tecnológicas e da comunicação. É
imprescindível que o profissional da educação se atualize, reconheça o novo contingente de
textos que surgem a cada dia para satisfazer exigências dos suportes de comunicação moderna,
como internet, celular, tablete, computador, mesmo TV e rádio, e passe então a trabalhar com
eles no seu cotidiano.

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Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características

Material Complementar

Para aprender mais sobre os conteúdos trabalhados nesta unidade, indicamos os links a seguir:
Vídeos:
Vídeo aula do Prof. Pasquale Cipro Neto, com o título - REDAÇÃO - “Tipos E Gêneros
Textuais” Neste vídeo, o Prof. Pasquale trata das diferenças entre tipos textuais e gêneros
textuais. Último acesso em: 10/11/2014.
https://www.youtube.com/watch?v=w9oR0TncVSM.

Vídeo aula da Professora Rafaela Lobo – Título: Interpretação Texto - Tipologia Textual
e Gênero Textual - Neste vídeo, a Prof.ª Rafaela explica os usos dos gêneros e suas
funções dentro da sociedade. Último acesso em: 14/11/2014
https://www.youtube.com/watch?v=EW3pR4SVeeA.

Este vídeo, chamado “Gêneros Textuais”, mostra uma série de exemplos de gêneros
textuais da mídia impressa. Último acesso: 14/11/2014.
https://www.youtube.com/watch?v=a9seQ4ZjNSI.

Livro:
KAWOSKI, Acir Mario, GAYDECZKA, Beatriz, BRITO, Karin S. (Org.). Gêneros
Textuais: reflexões e ensino. 4ed. São Paulo: Parábola Editoria, 2011.
Neste livro, você encontra uma série de trabalhos, produzidos por vários autores, a
respeito de diversas questões que envolvem os gêneros textuais e o ensino de uma forma
geral. Esses trabalhos contribuem tanto para consolidar o conceito de gênero como para
compreender como os gêneros se articulam.

Não deixe de acessar os links e ler o livro indicado, pois é muito importante sua ação como
protagonista na construção dos seus conhecimentos.

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Referências

BEZERRA, Maria Auxiliadora. Ensino de Língua Portugua e Contextos Teóricos-


metodológicos. In: DIONÍSIO, Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.)
Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.

MARCUSCHI, Luiz Antonio. Gêneros Textuais: Definição e Funcionalidade. In: DIONÍSIO,


Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros textuais e ensino. São
Paulo: Parábola Editorial, 2010.

Referências Bibliográficas: (disponível para consulta)

DIONÍSIO, Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros textuais e
ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.

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Anotações

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