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O caso Ellwanger foi um caso controverso, que teve um longo período de duração nos
tribunais. Primeiramente, o paciente, Siegfried Ellwanger Castan, havia sido condenado pelo
crime de racismo pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, e posteriormente, pelo
Superior Tribunal de Justiça, que confirmou a condenação do último. Como última apelação,
o paciente impetrou com o pedido de habeas corpus ao Supremo Tribunal Federal, onde o
processo foi distribuído à relatoria do ministro Moreira Alves. Após o voto do ministro
relator, concedendo o habeas corpus, o ministro Maurício Corrêa pediu vista do processo e
apresentou seu voto de vista.
Diversas foram as guerras na história que visavam o poder e território, outras ainda
visavam a supremacia de um povo sobre outro, sob a perspectiva de que esses últimos
constituiriam uma raça inferior. Nesse contexto, pode-se se destacar os horrores ocorridos na
Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial, que no caso, ocasionou no extermínio
de milhões de judeus nos campos de concentração de Auschwitz, de Dachau, entre outros.
Adolf Hitler, no capítulo “Povo e Raça” de seu livro “Minha Luta” escreve que “a grandeza e
superioridade da raça ariana/alemã existe em função da oposição à inferioridade da raça não-
ariana, a semita/judaica” e que “para preservar a raça ariana, seria preciso eliminar a anti-
raça”.O professor de Semiótica e Linguística da USP, Izidoro Blikstein, conclui com isso,
que o antissemitismo é uma forma de racismo, pelo fato de contrapor duas raças, uma
superior em relação a outra. E dessa forma, o ministro Maurício Corrêa comenta que mesmo
que fosse “normal” dividir a raça humana segundo os traços físicos, não teria relevância saber
se o povo judeu é ou não, visto que o racismo configuraria do ato de discriminação contra os
mesmos, devido a convicção que os arianos são a raça perfeita e eles a anti-raça.
Visto isso, ao analisar o caso Ellwanger com base na Constituição Federal, conclui-se
que o paciente cometeu sim o ato de racismo, sendo o crime praticado imprescritível. A
Constituição rejeita a definição isolada e tradicional de raça sendo distinta pela cor da pele,
tendo em vista o inciso IV do artigo 3º, que trata cor e raça como conceitos diferentes. Por
isso, a referência a raça deve ter conteúdo mais amplo, sob pena de inaceitável inocuidade no
que tange a cor.
O ministro Maurício Corrêa cita a visão de Cretella Júnior que, ao tratar do inciso VIII
do artigo 4º da Constituição, caracteriza o racismo como “ideologia que defende a
superioridade de um grupo étnico sobre outro (arianos e não arianos)”. Ainda reforça a ideia,
José Afonso da Silva, que apresenta que o texto constitucional “proíbe o preconceito de
origem, cor e raça e condena discriminações com base nesses fatores, consubstancia-se, antes
de tudo, um repúdio à barbárie do tipo nazista que vitimara milhares de pessoas, e consagra a
condenação do apartheid”.
Depois disso, o ministro Maurício Corrêa parte da ideia uma interpretação teleológica
e sistêmica, a fim de conciliar as condições históricas, políticas e sociológicas, para
compreender o sentido da lei para aplicá-la. Os sentidos das palavras raça e racismo não se
tornam suficientes, para se determinar o alcance da norma. Além disso, afirma que limitar o
racismo apenas a simples discriminação de raças, implica na negação do princípio da
igualdade, ou seja, condicionar a discriminação como crime imprescritível apenas aos negros
e não aos judeus é aceitar como desiguais aqueles que na essência são iguais perante tal
garantia.
Conclui o ministro Maurício Corrêa com base nesses fatos que a subdivisão racial da
espécie humana não encontra qualquer tipo de sustentação, tendo sua origem em teorias
racistas que hoje são condenadas pela legislação criminal. E com isso, o preceito do inciso
XLII do artigo 5º da Constituição aplica-se ao paciente configurando crime de racismo. Ante
essas circunstâncias, o mesmo vota pelo indeferimento do habeas corpus.