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Universidade Veiga de Almeida

Camila Jaciara Silva

Impugnação ao cumprimento de sentença

Rio de Janeiro

2021
A impugnação ao cumprimento de sentença é a defesa conferida ao executado
na fase de cumprimento de sentença. Trata-se de defesa típica e incidental ao
procedimento, de modo que não constitui uma ação autônoma. Está prevista
no artigo 525 do Novo CPC.

Existe uma diferença no tema dos embargos do devedor, outra modalidade de


defesa do executado. Ao passo que a impugnação ao cumprimento de
sentença não perfaz ação autônoma, mas sim incidente processual (já que é
parte da fase de cumprimento de sentença), os embargos do devedor podem
ser opostos em sede de ações autônomas.

A fase de conhecimento, muitas vezes longa, tem por finalidade o


reconhecimento judicial de um direito pleiteado pelo autor. Para que o título
judicial seja formado, as partes são ouvidas, as provas são produzidas e o
direito de defesa é meticulosamente observado.

O contexto mencionado já é capaz de conferir ao Poder Judiciário as condições


necessárias para que seja proferida uma decisão segura, eficaz e acertada.
Ocorre que, mesmo com a cuidadosa formação do título judicial, diversas
obrigações ainda dependem de um comportamento do réu para que o direito
reconhecido seja materializado no mundo dos fatos.

O reconhecimento do direito na fase de conhecimento não satisfaz,


necessariamente, os anseios do autor. Assim, diante da decisão judicial que
determina o cumprimento de uma obrigação por parte do réu, resumidamente,
dois caminhos se abrem: o cumprimento voluntário e a inércia do réu.

O direito fundamental ao acesso à justiça compreende não apenas a decisão


judicial, mas também o seu efetivo cumprimento. Deste modo, o legislador viu-
se obrigado a fornecer meios executivos idôneos à concretização das
determinações judiciais. Nesse contexto, o legislador estabeleceu a fase
processual de cumprimento de sentença.

Antes da reforma legislativa processual ocorrida em 2005 (ainda no âmbito de


vigência do CPC de 1973), as decisões judiciais e os títulos executivos
extrajudiciais eram necessariamente efetivados por meio de ações de
execuções autônomas. Eram necessárias duas ações para a tutela e a
efetividade de um direito. A primeira para o reconhecimento do direito e a
segunda para a efetivação do direito.

Com a reforma, no que toca aos títulos executivos judiciais, o processo tornou-
se sincrético, de modo que o cumprimento de sentença é apenas uma fase
processual da mesma ação cuja fase de conhecimento reconheceu o direito.
Assim sendo, se a obrigação estabelecida na sentença não for cumprida de
forma voluntária, o autor deve informar ao juízo que a decisão judicial não fora
respeitada, dando início à fase de cumprimento de sentença.

Nesse contexto, ainda que a fase de conhecimento seja exaustiva no sentido


de permitir ampla matéria de defesa e profundidade probatória, o executado
tem a possibilidade de elaborar uma defesa incidental à fase de cumprimento
de sentença: a impugnação ao cumprimento de sentença.

Estabelecido o direito para o caso concreto, na hipótese de não haver o


cumprimento voluntário e espontâneo da obrigação delineada, surge a
necessidade do início da fase de cumprimento de sentença.

Conforme os procedimentos estabelecidos, ao ser informado do


descumprimento da decisão judicial, o juízo intimará o réu para que cumpra a
decisão no prazo de 15 dias.

Decorrido este prazo sem que a obrigação seja cumprida, inicia-se,


automaticamente, novo prazo de 15 dias para que o executado apresente
impugnação ao cumprimento de sentença.

O §3º do artigo 525 excepciona o prazo de 15 dias, determinando que seja


concedido em dobro nas hipóteses de existência de mais de um executado,
cada qual representado por advogados distintos e de escritórios de advocacia
distintos. O parágrafo citado aplica o que está disposto no art. 229, que diz:

Art. 229. Os litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, de escritórios


de advocacia distintos, terão prazos contados em dobro para todas as suas
manifestações, em qualquer juízo ou tribunal, independentemente de
requerimento.

§ 1º Cessa a contagem do prazo em dobro se, havendo apenas 2 (dois) réus, é


oferecida defesa por apenas um deles.

§ 2º Não se aplica o disposto no caput aos processos em autos eletrônicos.”

A defesa permitida na fase de cumprimento de sentença funda-se na garantia


do contraditório e da ampla defesa, alicerces do sistema processual civil. No
entanto, como já houve a oportunidade para que as partes se manifestassem
sobre o cerne da discussão, as matérias que podem ser alegadas na
impugnação ao cumprimento de sentença sofrem limitação pelo legislador.

As matérias alegáveis em sede de impugnação ao cumprimento de sentença


estão disciplinadas nos incisos do §1º do artigo 525 do CPC, e são:

Defeito/nulidade/inexistência da citação na fase de conhecimento

Hipótese em que o executado foi revel no curso do processo em decorrência


de equívoco no processamento da citação (que é pressuposto de existência do
processo). É importante destacar que não basta apenas a ausência de
contestação, mas sim de ausência do executado em toda a fase de
conhecimento.

Ilegitimidade de parte

O executado pode alegar que não deve sofrer a execução. É o exemplo típico
do fiador que não foi chamado ao processo no curso da fase de conhecimento
e que é alvejado na fase de cumprimento de sentença.

Defeitos/falhas em relação à penhora ou à avaliação dos bens


penhorados

Caso a penhora recaia, por exemplo, sobre um bem de família (protegido pela
lei nº 8.009/1990), há um defeito que merece ser sanado. Quando a avaliação
do bem é feita de modo a não coincidir com a realidade, é possível que ela seja
discutida na impugnação ao cumprimento de sentença.

Igualmente, é cabível tal alegação quando a penhora recai sobre coisa diversa
da determinada judicialmente, quando a penhora atinge bens em valor superior
ao da execução ou quando há cumulação indevida de execuções.

Inexigibilidade da obrigação ou inexequibilidade do título

Se o título não for exigível, como nos casos de obrigações condicionais não
satisfeitas; ou se o título não for exequível (por falta de certeza, liquidez ou
exigibilidade), a impugnação ao cumprimento de sentença mostra-se como o
momento processual adequado para que o executado afaste a execução.

São consideradas obrigações inexigíveis aquelas que forem baseadas em leis


ou atos normativos considerados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal
Federal. A decisão do STF deve ser anterior ao trânsito em julgado do título
executivo judicial. Caso seja posterior, é cabível ação rescisória, cujo prazo
será contado a partir do trânsito em julgado da decisão do STF que reconheceu
a inconstitucionalidade da norma.
Excesso de execução

Quando o credor extrapola o valor que é devido pelo devedor, o executado


pode buscar reparar o valor que compõe o cumprimento de sentença. É
importante mencionar que a impugnação deve vir acompanhada de uma
memória de cálculo que demonstre quais valores o devedor entende como
devidos. A impugnação genérica, sem o demonstrativo, será rejeitada
liminarmente.

Incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução

O novo CPC teve um claro objetivo de simplificar o procedimento, tornando as


alegações de incompetência facilitadas e possíveis durante as fases do
processo. Ainda assim, ocorre a preclusão caso a incompetência relativa não
seja afirmada na impugnação ao cumprimento de sentença.

Já a incompetência absoluta poderá ser retificada e corrigida, até mesmo de


ofício, em qualquer grau de jurisdição.

Garantia do juízo e efeito suspensivo

Na vigência do CPC de 1973, era necessária a garantia do juízo como requisito


de admissibilidade da impugnação ao cumprimento de sentença. O novo
Código de Processo Civil e sua sistemática afastaram a necessidade de
garantia do juízo para que a impugnação seja apreciada.

Ocorre que, como regra, a impugnação ao cumprimento de sentença não


apresenta o efeito suspensivo. De qualquer modo, o §6º do art. 525 autoriza,
excepcionalmente, a concessão do efeito suspensivo (total ou parcialmente) se
o devedor lograr êxito em reunir 4 requisitos:

Garantia do juízo (caução)

Requerimento expresso

Relevância dos fundamentos (probabilidade do direito alegado)

Risco de dano em decorrência da continuidade da execução

O efeito suspensivo não impede a substituição, o reforço ou a redução da


penhora, assim como a avaliação dos bens. Concedido o efeito suspensivo, o
credor pode requerer o prosseguimento da execução mediante oferecimento de
caução.

Recurso cabível à rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença


Se a impugnação for rejeitada, a decisão proferida é considerada decisão
interlocutória, da qual cabe o recurso de agravo de instrumento. Do mesmo
modo, com o acolhimento parcial a execução prossegue normalmente, de
modo que o recurso cabível é o agravo de instrumento.

Quando o juiz acolher a impugnação ao cumprimento de sentença , extinguindo


a execução, a decisão é finalística. Assim sendo, é considerada uma sentença,
que pode ser reanalisada por meio de recurso de apelação.

Conclusão

Da análise do exposto, pode-se perceber que a impugnação ao cumprimento


de sentença é capaz de alterar os rumos do cumprimento de sentença. Seja
para adequar a obrigação exigida pelo exequente (correção do montante
cobrado, por exemplo). Seja para extinguir a fase processual (nas hipóteses
em que a obrigação não pode ser exigida do executado).

Ainda que o novo CPC não tenha trazido inovações substanciais a respeito da
impugnação ao cumprimento de sentença, é importante ressaltar que o Código
não exige a garantia do juízo para que a impugnação seja apreciada. O que era
diferente no CPC/73.

A limitação de matérias alegáveis deve ser observada com atenção pelos


advogados, já que decorre de lei. Por outro lado, o instituto da impugnação
jamais deve ser desprezado pelos advogados por sua aparente “feição
protelatória”. Isso porque o seu técnico e adequado manuseio são capazes de
reduzir ou até mesmo extinguir o débito demandado por meio do cumprimento
de sentença.

Referências:

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2012.

__________________. Cumprimento da sentença. 3. ed. Rio de Janeiro:


Forense, 2010.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade liquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil. 3. ed. São


Paulo: Saraiva, 2017.

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