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Porto, 2017
Sara Miriam Cruz Sousa
Porto, 2017
Sara Miriam Cruz Sousa
___________________________________
ABSTRATO
I
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
ABSTRACT
II
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
AGRADECIMENTOS
Agradeço, em primeiro lugar, à minha família por todo o apoio e sacrifício que fizeram
por mim ao longo da minha vida académica, em particular à minha mãe, ao meu pai e à
minha irmã por todo o carinho e amor que me ofereceram nos bons e maus momentos.
Agradeço, ao meu namorado, que foi sem dúvida um dos meus maiores pilares para a
concretização deste sonho e por estar sempre disponível para me ajudar.
Agradeço, aos meus amigos, por toda amizade e apoio ao longo deste percurso, por
estarem sempre presentes comigo em todos os níveis, nunca esquecerei tudo o que
fizeram por mim e a verdade é que os amigos da faculdade são amigos para a vida.
Por último, mas sem menor importância, agradeço à minha orientadora, a Doutora
Maria Gil Ribeiro, por todo o apoio demonstrado na realização deste trabalho, pela
forma incansável com que me auxiliou que, sem dúvida, foi indispensável para a
realização deste trabalho.
III
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
ÍNDICE
Abstrato…………………………………………………………………...................I
Abstract………………………………………………………………….………….II
Agradecimentos……………………………………………………………………III
Índice de figuras.......................................................................................................VI
Índice de tabelas....................................................................................................VIII
Lista de abreviaturas.................................................................................................IX
I. Introdução………………………………………………………………........1
II. Esfingolípidos……………………………………………………………......2
1. Classificação e estrutura……………………………………………........2
3. Função……………………………………………………………...........7
III. Ceramidas…………………………………………………………………..11
1. Diversidade estrutural…………………………………………....……..11
3. Fisiopatologia da ceramida/ceramidase…………………..…………....17
IV
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
i. Dermatite atópica……………………………………………....26
ii. Psoríase……………………………………….....…….......…...35
VI. Bibliografia...………………………………………………….….…..........46
V
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
ÍNDICE DE FIGURAS
VI
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
VII
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
ÍNDICE DE TABELAS
VIII
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
LISTA DE ABREVIATURAS
CDase - Ceramidase
IX
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
ELOVL - Elongases of very long chain fatty acids / Elongases de ácidos gordos de
cadeia muito longa
X
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
PC - Phosphatidylcholine / Fosfatidilcolina
XI
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
SL - Sphingolipid / Esfingolípido
SM - Sphingomyelin / Esfingomielina
XII
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
TGase - Transglutaminase
XIII
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
I. INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, tornou-se evidente que SLs tais como a esfingomielina (SM),
esfingosina (Sph), esfingosina-1-fosfato (S1P), ceramida (Cer), ceramida-1-fosfato
(C1P) e glicoesfingolípidos (GSLs) desempenham um papel fundamental na sinalização
celular. O facto de a sinalização estar implicada em eventos celulares muito distintos,
tais como apoptose, diferenciação, inflamação, angiogénese, entre outros, tem
dificultado a identificação do papel exato dos SLs na fisiopatologia celular (Kihara,
2016; Kolter, 2011; Merrill, 2011; Merrill e Carman, 2015; Young et al., 2012). Mais
recentemente, moléculas esfingolípidicas específicas têm sido implicadas na
manutenção da barreira epidérmica representando, simultaneamente, potenciais fatores
causais e terapêuticos das doenças crónicas da pele (Meckfessel e Brandt, 2014; Uchida,
2014; van Smeden et al., 2014).
1
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
II. ESFINGOLÍPIDOS
1. Classificação e estrutura
Os SLs constituem uma classe de lípidos caracterizados pela presença de uma cadeia
aminoálcool de 18 átomos de carbono. Modificações a nível desta estrutura permitem
criar uma vasta família de SLs. Genericamente, os SLs são constituídos por 3 elementos
fundamentais: uma base esfingóide, um ácido gordo e um grupo polar característico do
tipo de SL (Merrill, 2011; Uchida, 2014; Young et al., 2012).
C D
2
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
A Cer é formada por uma Sph modificada por N-acilação a nível do C2, tal como é
ilustrado na Figura 2 (Kolter, 2011; Merrill e Carman, 2015; Uchida, 2014; Young et
al., 2012).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
4
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
5
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Tal como referido anteriormente, a Cer atua como precursor biossintético de moléculas
esfingolipídicas mais complexas. A presença de várias enzimas em diferentes
compartimentos celulares possibilita que a Cer origine SM, cerebrosídeos ou
gangliosídeos. A Cer pode, ainda, ser diretamente fosforilada por ação da ceramida
cinase (CerK) para formar a C1P (Don et al., 2014; Gault et al., 2010; Young et al.,
2012).
6
Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
3. Função
Os SLs são uma das maiores famílias de lípidos presentes nas membranas biológicas de
eucariotas. Encontram-se principalmente na parte externa do folheto da PM, na face
luminal da membrana de organelos intracelulares e em algumas lipoproteínas (Kihara,
2016; Merrill, 2011; Young et al., 2012). Tal como anteriormente mencionado, os SLs
representam uma classe heterogénea de lípidos que compreende moléculas tipicamente
anfipáticas, os GSLs. Os GSLs são constituídos por segmentos de glicanos que
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Os SLs têm um papel ativo em processos importantes para a homeostasia das células e
dos organismos, tais como a apoptose, diferenciação, sinalização celular, inflamação,
angiogénese, endocitose e senescência celular (Gault et al., 2010; Merrill, 2011; Young
et al., 2012).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
As saposinas (SAPs) são proteínas não enzimáticas que auxiliam a degradação dos
GSLs. Tal como ilustrado na Figura 6, as SAPs compreendem cinco proteínas
ativadoras: Sap-A, Sap-B, Sap-C, Sap-D e GM2-AP (proteína ativadora do GM2). A
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
III. CERAMIDAS
1. Diversidade Estrutural
A diversidade das ceramidas tem especial relevância na epiderme humana. Neste tecido
humano as ceramidas são constituídas por em 3 tipos de ácidos gordos: ácido não-
hidroxilado, ácido α-hidroxilado e ácido esterificado e ω-hidroxilados. Até à data, foram
identificadas na epiderme pelo menos 12 classes de ceramidas (Tabela 1) (Kihara, 2016;
Sahle et al., 2015; Tessema et al., 2017).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Acil-Cers
Não- Esterificado ω-
FAs α-hidroxilado
hidroxilado hidroxilado
LCBs (A)
(N) (EO)
Dihidroesfingosina
NDS ADS EODS
(DS)
Esfingosina
NS AS EOS
(S)
Fitoesfingosina
NP AP EOP
(P)
6-
hidroxiesfingosina NH AH EOH
(H)
1
Tabela adaptada de Kihara, 2016.
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Tal como anteriormente referido, a Cer pode ser produzida através de três vias
metabólicas, designadamente a síntese de novo, a via catabólica e a via de reciclagem.
Existe uma quarta via metabólica conhecida por ciclo da esfingomielina (Figura 5) que
decorre na PM. No ciclo da esfingomielina participam duas famílias de enzimas, as
esfingomielinases e as ceramidases, que também atuam num outro compartimento
celular, o sistema endossomal-lisossomal (Don et al., 2014; Gault et al., 2010; Young et
al., 2012).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
1 2,3,4
Informação retirada de Adada et al., 2016; Airola e Hannun, 2013; Informação
retirada de GeneCards.
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
3. Fisiopatologia da ceramida/ceramidase
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Localização
Ceramidase Gene Cromossoma pH
celular
aCDase ASAH1 8 4,5 Lisossoma
nCDase ASAH2 10 7,0 PM
AlkCDase1 ASAH3 19 8,5 ER
AlkCDase2 ASAH3L 9 9,0 GC
AlkCDase3 PHCA 11 9,5 GC/ER
1
Adaptado de Coant et al., 2017; Mao, 2008.
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Adaptado de Coant et al., 2017; 2 Resultados de Northern Blot em extratos de
tecidos humanos (Li et al., 1999); 3 Atividade enzimática em extratos de estrato
córneo (Jin et al., 1994).
Esta família de enzimas participa na regulação de vários processos biológicos, tais como
proliferação celular, diferenciação celular, apoptose e autofagia. Mutações nos genes
que codificam estas enzimas têm sido associadas a diversas doenças inflamatórias,
neurodegenerativas e tumorais (Tabela 4) (Coant et al., 2017; Don et al., 2014; Gault et
al., 2010). A implicação das CDases em processos fisiopatológicos tão diversos é
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
explicada, pelo menos em parte, pelo seu envolvimento no reóstato Cer/S1P. A Cer e
S1P participam de forma distinta na sinalização celular: a Cer é pró-apoptótica enquanto
que a S1P é anti-apóptótica. Este mecanismo é regulado de forma coordenada através de
enzimas responsáveis pela inter-conversão entre Cer e S1P e essa regulação visa
controlar o destino das células (apoptose ou proliferação celular). A degradação da Cer
através da ação enzimática de CDases origina a produção de Sph que, por sua vez, pode
ser convertida em S1P pela ação enzimática da SPHK. No entanto, a S1P pode ser
degradada através da ação enzimática da S1P liase (processo irreversível) ou ser
desfosforilada através da ação de esfingosina-1-fosfato fosfatases (SGPP1) e 2 (SGPP2)
originado a formação de Sph. A Sph proveniente da ação direta das CDases ou da
hidrólise de S1P pode ser acilada produzindo Cer. Se a atividade enzimática da S1P
liase estiver aumentada, o nível intracelular de S1P diminui e, inversamente, se a
atividade enzimática da S1P liase estiver inibida, o nível de S1P aumenta. Do mesmo
modo, um défice ou excesso de CDases pode estar associado a um excesso ou défice de
ceramidas, respetivamente, ou seja, à doença de Farber ou ao cancro (Japtok et al.,
2014; Newton et al., 2015).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
granulosa, camada espinhosa e camada basal (Figura 10). A maioria das células são
queratinócitos que produzem a queratina e conferem resistência e permeabilidade à
epiderme. Outros tipos celulares, presentes em minoria, são as células de Langerhans,
células de Merkel e os melanócitos (Seeley et al., 2003).
A camada córnea (ou estrato córneo, SC) é a camada mais externa da epiderme. Esta
camada é composta por cerca de vinte e cinco camadas de células queratinócitas
cornificadas que se designam por corneócitos. O desenvolvimento destas células
termina com a descamação cutânea que é dependente da ação de enzimas específicas
(proteases) localizadas no espaço extracelular. Os desmossomas que unem os
corneócitos passam a designar-se por corneodesmossomas devido à incorporação da
enzima corneodesmosina. Estes são responsáveis pela coesão entre os corneócitos
(Coderch et al., 2003; Elias, 2008; Seeley et al., 2003).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
plantar dos pés). É uma camada fina e quase transparente devido à querato-hialina se
encontrar dispersa em torno das fibras de queratina (Seeley et al., 2003).
A derme é constituída por uma camada de tecido conjuntivo de suporte à epiderme. Este
tecido é composto por elementos celulares, tais como fibroblastos, células adiposas e
macrófagos. A derme compreende duas camadas: a camada reticular com tecido
conjuntivo denso não modelado e a camada papilar que corresponde às papilas dérmicas
com tecido conjuntivo frouxo. O tecido conjuntivo contém componentes essenciais para
a pele, designadamente ácido hialurónico e proteínas, tais como o colagénio, a elastina e
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
a FLG, que conferem resistência, firmeza e flexibilidade à pele. São também observadas
glândulas sudoríparas e glândulas sebáceas, vasos sanguíneos e linfáticos, terminações
nervosas e os músculos eretores do pêlo. Esta camada é altamente vascularizada
tornando-se responsável pela nutrição e termorregulação da pele (Seeley et al., 2003).
A constituição da pele está adaptada à sua atuação como primeira linha de defesa contra
agressões internas e externas. A sua função depende do equilíbrio dinâmico que se
estabelece entre as suas propriedades físicas, químicas e mecânicas, e que se refletem na
sua capacidade de resposta a processos inflamatórios, imunitários e metabólicos. A
integridade da barreira cutânea é essencial para a manutenção de uma permeabilidade
adequada que evite não só a perda de água e de eletrólitos pela derme, mas também que
impeça a entrada de substâncias ativas ou de microrganismos que possam ser
prejudiciais à saúde humana. Modificações a nível da constituição da pele podem, por
isso, originar o aparecimento de alterações cutâneas que, eventualmente, poderão
conduzir a doenças da pele (Li et al., 2016; Sahle et al., 2015).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
A nível das moléculas lípidicas, os queratinócitos produzem pela via da síntese de novo
grandes quantidades de glucocerebrosídeos e SM. Estas moléculas lípidicas são
secretadas na camada córnea onde são convertidas em várias espécies de ceramidas.
Estas moléculas de Cer, ou seus derivados, participam em processos diversos, tais como
proliferação, diferenciação e/ou apoptose, e são responsáveis pela manutenção da
integridade da barreira cutânea e pela redução de TEWL (Feingold e Elias, 2014). De
facto, a Cer é responsável por regular não só as funções dos queratinócitos, mas também
a função das células do sistema imunitário da pele uma vez que tem impacto no reóstato
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Cer/S1P. Deste ponto de vista, a redução desta razão induz a diferenciação dos
queratinócitos o que está de acordo com as suas propriedades anti-apoptóticas, atuando
de forma antagonista às ceramidas (Japtok et al., 2014). A S1P desempenha, ainda, um
papel fundamental na homeostasia das células dendríticas (células apresentadoras do
antigénio aos linfócitos T após o seu processamento intracelular) por modelar diversas
funções desde a apresentação dos antigénios à interação com os linfócitos T (Japtok et
al., 2014).
i. Dermatite atópica
Características clínicas
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
no controlo da sintomatologia e, desse modo, atenuar os sintomas até à fase adulta (Li et
al., 2016).
Mecanismos patogénicos
Até à data, muitos são os estudos que sugerem que a patogenia da AD possa estar
associada a fatores genéticos, imunológicos ou metabólicos. A complexidade dos
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
O nível reduzido de ceramidas no SC de doentes com AD pode ser explicado por uma
atividade elevada da enzima esfingomielina desacilase que é responsável pela
desacilação da SM em esfingosilfosforilcolina. O mesmo se verifica em relação à
GlcCer que ao ser degradada pela respetiva desacilase origina a glucosilesfingosina. Os
SLs desacilados são conhecidos por lisoesfingolípidos. Consequentemente, estes
produtos resultantes da ação das desacilases, isto é os lisoesfingolípidos, também estão
aumentados, o que poderá explicar a diminuição de Cer e Sph (efeito da competição de
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
2 enzimas para o mesmo substrato) (Borodzicz et al., 2016; Holleran et al., 2006).
Adicionalmente, também as atividades enzimáticas da aSMase e nSMase encontram-se
significativamente reduzidas, podendo este efeito ser explicado por uma deficiência na
prosaposina. Esta diminuição também conduz a um défice de Cer. A AlkCDase é
altamente expressa na epiderme mas o seu nível de expressão não está
significativamente alterado em doentes com AD. Curiosamente, a atividade enzimática
da aCDase está diminuída e esta observação é consistente com a redução do nível de
Sph (Holleran et al., 2006). Outros autores referem, ainda, que a atividade aumentada da
enzima S1P liase, com concomitante diminuição da concentração de S1P, também pode
estar associada à AD (Japtok et al., 2014).
A nível das alterações no metabolismo da Cer, a redução do nível de Sph tem sido
associada a alterações na permeabilidade cutânea. Como a Sph apresenta propriedades
antimicrobianas, a diminuição do nível de Sph aumentam a probabilidade não só de
colonização bacteriana, mas também de desenvolvimento de infeções bacterianas,
principalmente por Staphylococcus aureus, resultando no agravamento do fenótipo
clínico. O facto desta bactéria secretar a enzima esfingosina desacetilase (responsável
pela conversão da Sph no respetivo lisoesfingolípido) contribui, adicionalmente, para a
redução do nível de Sph (Elias, 2008; Lyons et al., 2015; Sawada et al., 2012;
Yamazaki et al., 2017).
Tratamento
Apesar dos avanços científicos registados a nível do conhecimento sobre a AD, ainda
não estão completamente bem estabelecidas as suas causas, assim como a sequência dos
eventos que desencadeia o aparecimento dos sinais e sintomas desta doença. Em virtude
disso, presentemente não existe cura para a AD (Sawada et al., 2012; Tessema et al.,
2017).
Muitas das estratégias para o tratamento da AD têm por objetivo diminuir e/ou controlar
os sintomas da doença. A xerose, um dos sintomas mais prevalentes na AD, e a irritação
cutânea provocam uma rutura na barreira cutânea levando ao aumento da TEWL e,
consequentemente, à inflamação. Assim, o uso de hidratantes tópicos, sobretudo sob a
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
forma de pomadas permite não só uma melhor absorção do fármaco como a formação
de uma camada oclusiva na pele (de Bruin Weller et al., 2013; Hon et al., 2013; Lyons
et al., 2015; Sugiura et al., 2014). Estes hidratantes apresentam três propriedades
fundamentais: emoliente, humectante e oclusivo (Hon et al., 2013). Em casos mais
severos e quando o uso de hidratantes é insuficiente, recorre-se à utilização de
corticosteróides tópicos que podem ser administrados de forma isolada ou em
associação com outras substâncias anti-inflamatórias. Apesar dos corticosteróides serem
reconhecidos como terapia anti-inflamatória de primeira linha, é evidente que quanto
maior a sua potência maior o risco de efeitos adversos. Esses efeitos adversos incluem
erupções acneicas, telangiectasias, atrofia cutânea, taquifilaxia e estrias, bem como
eventuais efeitos sistémicos (atraso no crescimento das crianças e supressão da glândula
supra-renal) devido ao uso prolongado e/ou inadequado. Para prevenir estes efeitos, o
seu uso deve ser restringido às zonas de pele lesada e por um curto período de tempo (5-
7 dias) (Berke et al., 2012; Lyons et al., 2015; Plotz et al., 2014).
No caso dos hidratantes, vários são os ingredientes ativos usados no tratamento da pele
atópica. Uma vez que o presente trabalho explora especificamente as ceramidas e o
défice destas moléculas lípidicas se encontra fortemente relacionado com disfunções da
barreira cutânea e com o aumento da TEWL (Hon et al., 2013), a análise dos
ingredientes dos hidratantes será essencialmente focada no potencial terapêutico das
ceramidas.
As ceramidas encontram-se em quantidades muito baixas na natureza pelo que o seu uso
na indústria farmacêutica era, inicialmente, muito limitado. Para ultrapassar esta
limitação foram, então, desenvolvidas pseudoceramidas. As pseudoceramidas são
estruturalmente idênticas às diversas classes de ceramidas presentes na natureza,
diferindo apenas na ausência de base esfingóide e/ou na presença de uma amina
terciária, tal como é mostrado na Figura 15. Na epiderme, elas são capazes de formar
lamelas estruturais iguais às das ceramidas endógenas e poderão substituir ou diminuir a
utilização de corticóides tópicos (Meckfessel e Brandt, 2014).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Atualmente, muitas são as gamas cosméticas que introduzem nas suas formulações
ceramidas, estando clinicamente comprovado que têm um papel fundamental na
reparação da barreira cutânea e na sua hidratação. Além disso, já foi evidenciado em
modelos animais que o tratamento tópico com S1P produz um efeito anti-inflamatório.
À medida que os estudos forem avançando, a possibilidade de incorporar este SL em
protocolos de tratamento tópico proporcionará uma nova dinâmica na indústria
farmacêutica, possibilitando a formulação de produtos específicos para cuidados
diferenciados de pele, quer para doenças cutâneas quer para outras condições
específicas (Meckfessel e Brandt, 2014).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
ii. Psoríase
Características clínicas
O quadro clínico da psoríase manifesta-se pela presença de lesões com placas em áreas
extensas que evoluem para uma lesão sem placa, descamação, eritema, pústulas
assépticas (raro) e, eventualmente, pela presença de prurido. Geralmente, as lesões são
observadas em zonas mais queratinizadas da pele, tais como os joelhos, cotovelos e
couro cabeludo. A Figura 17 é representativa de uma lesão psoriática com placa (Di
Meglio et al., 2014).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Figura 17. Aspeto clínico de uma lesão psoriática com placa (Retirado de Di Meglio et
al., 2014).
Mecanismos patogénicos
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
cadeias muito longas de ácidos gordos representando, por isso, um possível fator causal
da redução deste tipo de ceramidas (Borodzicz et al., 2016; Sano, 2015).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Tratamento
Atualmente não existe cura para a psoríase. Por isso, o objetivo do tratamento visa
aumentar o tempo de remissão, controlando as lesões no sentido da sua diminuição e/ou
desaparecimento. O tratamento da psoríase é definido pelo protocolo conhecido por
“índice de PASI” (Psoriasis area severity índex). Este protocolo classifica os tipos de
psoríase com base na avaliação do número de lesões e da sua extensão. Quando a
psoríase é de grau suave, o tratamento consiste, geralmente, no uso de emolientes,
corticóides tópicos, vitamina D3 (calcitriol) e análogos da vitamina D (calcipotriol e
tacalcitol). No caso de se tratar da forma severa, recorre-se ao uso de tratamentos
sistémicos (psoríase eritrodérmica), fototerapia e tratamento oral com
imunossupressores (Di Meglio et al., 2014; Pasch, 2016).
Tal como referido anteriormente na AD, a aplicação de emolientes permite formar uma
camada lípidica oclusiva sobre a pele que facilita a entrada de lípidos no SC reduzindo,
subsequentemente, a TEWL que é um dos fatores patogénicos mais evidenciados,
também nesta patologia. Estes emolientes têm, normalmente, na sua composição NMFs
e ceramidas que, em conjunto, aumentam a hidratação do SC, justificando o seu uso
regular. Agentes queratolíticos, tais como o ácido salicílico e a ureia, promovem a
dissolução das placas de queratina e agentes queratoplásticos, tal como o ditranol,
permitem a regeneração do SC, conferindo, desta forma, eficácia no tratamento das
lesões psoriáticas com placa. Estes agentes, em associação com corticóides, reduzem os
eritemas, prurido e descamação (Chang et al., 2017; Sugiura et al., 2014; Torsekar e
Gautam, 2017).
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
destacam: Eucerin® UreaRepair PLUS Loção 10% Ureia e Eucerin® UreaRepair PLUS
Creme de Mãos 5% Ureia (Beiersdorf, 2017; Di Meglio et al., 2014).
A síndrome de Netherton (NS, OMIM 256500) é uma doença genética rara da pele com
um padrão de transmissão autossómico recessivo. Estima-se que em cerca de 20% dos
indivíduos afetados com esta síndrome ocorra morte prematura (Bingol et al., 2011).
Características clínicas
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Figura 19. Eritrodermia generalizada num bebé com Síndrome de Netherton (Retirado
de Nevet et al., 2017).
Mecanismos patogénicos
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Tratamento
Tal como as outras doenças cutâneas abordadas anteriormente, a NS não tem cura. O
tratamento para esta patologia é adaptado às manifestações clínicas do doente. Mais
uma vez o uso de emolientes hidratantes que contenham Cer na sua composição é
essencial para formar uma camada oclusiva por forma a promover a hidratação da pele e
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
Paralelamente, ao longo das últimas décadas tem sido evidenciado o papel de moléculas
esfingolípidicas específicas na patogénese de diversas doenças, incluindo as doenças
crónicas da pele. Simultaneamente, o aumento da prevalência das patologias atópicas ao
longo dos anos tem vindo a intensificar a sua investigação, nomeadamente quanto ao
papel dos SLs nestas doenças.
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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Papel das ceramidas na fisiopatologia da pele
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