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DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PSICOLOGIA SOCIAL I
Ribeirão Preto
2021
Introdução
dirigido por Aaron Hann e Mario Miscione e estreado em 2015. O filme mostra, em um corte
entre si. Logo de início vê-se o cenário: um grande círculo composto por essas pessoas, sendo
que cada uma delas se encontrava de pé dentro de uma pequena circunferência vermelha no
chão; ao centro, encontra-se algo como uma fonte de energia, que liberava raios, e ao redor
atordoados e sem saber quem eram aquelas pessoas e onde estavam de fato. Alguns
integrantes arriscavam tentar fugir, mas eram atingidos por um raio que aniquilava-os
raios atingiam as pessoas escolhidas pela maioria do grupo, através da rotação das mãos para
a esquerda ou para a direita. Fechar os punhos, por sua vez, seria a confirmação da escolha. A
cada dois minutos um participante do grupo era eliminado, situação que fez com que os
outros integrantes fossem estabelecendo táticas para continuarem sobrevivendo àquilo. Essas
eram, porquanto, decisões tomadas coletivamente que deveriam ajudar tanto no entendimento
lógico do jogo quanto na permanência de pessoas que eram colocadas sob determinados
julgamentos.
sociedades ocidentais, os quais tendem a valorizar padrões de bem e mal consolidados. Com
isso, pouco a pouco o grupo ficava menor e os participantes deduzem que apenas um pode
sobreviver, pois era possível votar em outros membros, mas não em si mesmo. Então, parte
do grupo se divide na busca por garantir que a participante grávida ou a criança seja uma das
últimas sobreviventes, em contraposição aos outros que buscavam eliminar o outro grupo.
Esse cenário se agrava até o fim da trama, quando Eric, um personagem que se
apresentava como adepto ao grupo de defesa da grávida e da criança, engana as duas últimas
participantes que restaram e as eliminam. Ao término do jogo, Eric retorna ao solo e vê que
tudo aquilo tinha se decorrido no interior de grandes naves extraterrestres. Ele então se
depara com um grupo de pessoas, também a olharem as naves, o que deixa subentendido que
O filme escolhido retrata importantes aspectos das relações sociais, sendo possível
analisar diversos discursos, que são reproduzidos e tem sua origem na própria sociedade na
qual pertencem todos os personagens. Dessa forma, as interações que nele ocorrem nos
permite, através de apenas um grupo da sociedade, observar vários de seus valores e suas
passam nesse cenário único. Paralelamente, como são disputados interesses durante todo o
filme, cada personagem, ao reproduzir discursos, emitir opiniões e executar ações a favor ou
interesse.
Dessa forma, o filme trabalha um complexo emaranhado de discursos que podem
contribuir para compreensão das dinâmicas da sociedade. Por meio deste breve ensaio,
social. De igual modo, pretende-se discutir a influência do indivíduo, no que tange suas
crenças e moralidade, na manutenção da teia social em que ele está inserido, ampliando esse
Discussão
A priori, é notório que a maior riqueza do filme “Circle” está relacionada à forma
suas relações intergrupais, como estas são relações de disputa de poder. Nesse caso, a forma
de poder mais concreta da situação envolve escolher quem é o indivíduo que merece viver
entre um grupo tão grande de pessoas que irão morrer. Os sujeitos do experimento estão em
uma situação extrema, em que precisam escolher periodicamente um dentre eles para ser
sacrificado. É a partir disso que cada um expressa suas opiniões, discutem valores e se
comportam tentando atingir um determinado fim, eliminando aqueles que julgam que
A relevância das relações grupais que se desenrolam no espaço do filme para o estudo
da sociedade é muito bem resumido em uma fala de um dos personagens, próximo do fim da
obra. Quando os últimos três sobreviventes se questionam, não pela primeira vez, sobre o
motivo daquela situação, um rapaz diz que os supostos alienígenas devem querer descobrir
mais sobre os seres humanos nesse experimento social. Então uma mulher questiona como
fariam isso forçando-os a matar uns aos outros e o rapaz coloca então que “quando matamos
alguém estamos julgando e dizendo que há algo de errado com essa pessoa”. É esta a essência
das relações do filme e dos aspectos estudados em cima dele, pois se confrontam os discursos
Dessa forma, como os sacrifícios são determinados pelo voto da maioria, as pessoas
começam a discutir coletivamente quem são aqueles que deveriam morrer primeiro e quem
são aqueles que poderiam ter a chance de viver. Em outra cena, um personagem ainda coloca
durante uma discussão “só estamos tentando decidir quem merece viver”, expressando bem
como os diálogos e discussões no grupo sempre estão buscando de alguma forma realizar
essas escolhas que não são aleatórias, mas sim estão permeadas de valores, discursos e
Além disso, um ponto importante é que ao exigir-se escolhas de votos para eliminação
de cada sujeito, cada um busca defender seus interesses, que normalmente envolvem
disputa pelo poder de tomar decisões que diferentes discursos surgem para influenciar os
outros nessas decisões. Cada discurso busca validar-se e garantir o sucesso de um interesse
além de desvalidar o outro discurso da disputa. Tal como aponta Pedro de Oliveira Filho
(2013), essa perspectiva teórica enfatiza os conflitos na sociedade, e são exatamente esses
conflitos sociais que serão explicitados para reflexão neste ensaio através do apontamento dos
interesses concorrentes e sua relação com o contexto social. Esse raciocínio ocorre em
consonância com a ideia de Análise do Discurso (AD), que parte do pressuposto de que a
língua não pode ser estudada desvinculadamente de suas condições de produção, uma vez que
contexto da retórica, presente nas construções discursivas, não se restringe às relações entre o
orador e a audiência, mas inclui as opiniões que o orador está buscando legitimar para seu
público, além das opiniões contrárias que estão sendo combatidas, de maneira implícita ou
explícita. Isso significa que, nesse caso, cada construção discursiva que ocorre dentro de
“Circle” seria construída, não só por aquele que a profere, mas pelo público a quem ele fala e
Com base nisso, são selecionados os discursos que se reproduzem no filme para serem
analisados. Para isso, como o autor supracitado ressalta, é importante para uma análise
e os interesses de cada grupo sendo por eles defendidos. Além disso, certas falas utilizadas na
função conativa da linguagem funcionavam como uma espécie de propaganda ideológica, que
no filme foram ora aceitas ora rejeitadas e influenciaram os outros. Esta comunicação
persuasiva dissemina-se entre os participantes, cada qual com a sua técnica para convencer os
demais da validade de suas ideias. Desse modo a retórica e outras estratégias discursivas
compõem o arsenal de disputa neste espaço (Aronson, Wilson & Akert, 2015). Ademais,
outros conceitos serão utilizados para contemplar uma análise psicossocial de “Circle”.
fenômeno a partir da noção de que “em sociedade, dependemos uns dos outros para a
disso, ao defini-la o autor também cita Asch (1952/1977, p. 379) que a define como “a
fica explícito como o conceito de influência social é muito importante para essa análise do
filme, pois é exatamente afetado por esse fenômeno que o grupo de participantes de Circle
formam suas opiniões e também modificam as opiniões dos outros, alterando não só os juízos
como as decisões de cada um, sendo que é exatamente o voto de cada membro que decide
A partir disso, tendo como base que, segundo Gouveia, a influência social ocorre
quando as ações de uma pessoa resultam na ação de outra(s), podemos citar vários momentos
do filme em que o fenômeno pode ser observado. O filme todo, aliás, trata dos efeitos desse
grupo para que não votem nele ou, diversas vezes, intencionalmente influenciá-los a votar em
uma pessoa específica para morrer, conforme a estratégia que cada participante adota para ter
Um exemplo a ser citado nesse momento é o de quando um homem e uma mulher que
se encontram lado a lado combinam de fingir serem casados, influenciando os outros a não
votarem neles, pois como trazem no filme ninguém gostaria de matar o amado do outro. Isso
é de fato bem sucedido até que descobrem que eles não são casados de verdade, o que leva a
personagens buscaram influenciar a perspectiva do grupo sobre eles com base no que eles
acreditam que a sociedade valoriza. Nesse caso, eles apostaram que o amor conjugal seria um
fator que valorizaria suas vidas no juízo grupal e lhes pouparia por mais tempo,
Pode-se citar também que, ao longo do filme, os personagens colocam rótulos nos
outros também de acordo com o julgamento que eles acreditam que a sociedade faria disso,
tentativa de influenciar os outros parte de um homem que, percebendo-se como alvo por sua
última discussão, acusa um mulher de ser uma atriz pornô, insistindo na acusação mesmo
diante da negação dela, interrogando-a e constrangendo-a diante do grupo, perguntando se
seus seios eram naturais, quem pegava por eles, se ela era amante do chefe e outras ameaças
para desqualificá-la diante da coletividade e influenciar os outros votar nela. Apesar de mal
sucedida, sua tentativa exemplifica bem esse tipo de comportamento que ocorre outras vezes
no filme e buscava utilizar o fenômeno da influência social a favor desse indivíduo que a
realiza.
Destaca-se ainda, que mesmo nessas tentativas de influência a partir da rotulação dos
outros, muito é revelado sobre o indivíduo que profere a taxação e a sociedade da qual ele
reproduziu esse discurso. Isso porque, quando o homem acusa a mulher de atriz pornô, ele o
faz ciente de que esta é uma característica que poderia gerar grande julgamento dos outros,
própria sociedade. Assim, essa dinâmica que se reproduz em outras cenas, reproduz vários
Outro aspecto relevante para essa análise ainda é observar como a influência social
como se expressam e que interesses estão implícitos nesses discursos. As ações e falas dos
participantes expressam seus diferentes interesses e a partir disso, nos permite analisar quais
já que os personagens então confusos e desesperados com a situação. Dessa forma, são
expressados alguns valores e interesses de cada um para propor o que fazer na situação e
evitar mortes aleatórias. Uma das primeiras sugestões é a de um jovem que propõe que o
grupo comece votando nos mais velhos para morrer, argumentando que estes já estariam mais
perto da morte de modo que seria mais justo que estes fossem os primeiros sacrificados.
Apesar de contestações de alguns, essa manifestação influencia os outros a votarem nos mais
velhos e, de fato, uma sequência de idosos é eliminada nesse processo. Essa decisão grupal
negligenciada e vista como sem valor. Dessa forma, o discurso manifestado dentro do
vezes, nós não criamos totalmente o que falamos, mas reproduzidos os discursos da
sociedade a qual pertencemos (Oliveira, 2013). A partir disso, podemos analisar como esse
discurso reproduzido se manifesta na sociedade e que interesse ele defende como uma
proposta de uma análise discursiva, mesmo que nem sempre o conteúdo explícito da
comunicação traduza a real ideia que ele transmite e o real interesse que ele defende.
manifestações, é possível apontar, por exemplo, como uma de suas raízes é o próprio modelo
de produção capitalista em que os idosos são desvalorizados por sua baixa produtividade. O
que é relevante para esta análise é que esse discurso é reproduzido pelo jovem e de forma
sociedade a qual essas pessoas pertencem (Oliveira, M., Fernandes, M., & Carvalho, R.,
2011). Com isso, o jovem, na tentativa de ganhar tempo sacrificando idosos em vez de correr
o risco de ser aleatoriamente sacrificado, convence os outros membros do grupo que os mais
Por outro lado, quando a idade possível para ser votado é reduzida o grupo passa a
propôs, já que apesar de seguir a mesma lógica, ela começa a ameaçar a vida de boa parte do
grupo que percebe que hora ou outra mesmo pessoas mais jovens seriam os próximos de
idade mais avançada. O que cabe ressaltar é que a lógica dessa dinâmica não foi alterada, os
mais velhos seriam votados pois estão mais perto da morte, no entanto ela é quebrada, pois
esse argumento não era o verdadeiro ponto por trás desse discurso, pois caso contrário ele
ainda poderia ser considerado justo pela maioria. Assim, esse é apenas um exemplo de uma
possível análise de um dos vários discursos que são reproduzidos ao longo do filme e
porquê estavam ali se cada um falasse um pouco sobre si. A primeira a falar é uma mulher
chamada Beth, que conta um pouco sobre ela e em determinado momento diz ser solteira e
não ter filhos. Quando o alarme toca, indicando que o próximo a morrer deve ser votado é
Beth a escolhida e sacrificada. Os outros argumentam que pelo menos ela não tinha filhos e
por isso a escolheram para morrer. Este é outro discurso que pode ser analisado e aparece
número de filhos de cada um como requisito para votação. Esse é outro exemplo, de
discursos construídos e reproduzidos dentro do filme para atribuir que certas vidas merecem
ser preservadas com o sacrifício de outras. Nesse caso, não ter filhos é colocado como um
motivo para morrer, mas vários outros discursos surgem posteriormente com objetivos
relações do filme acontece também quando um homem ataca uma mulher lesbica, alegando
que sua sexualidade é um pecado e podia ser esse tipo de problema que o experimento
buscasse julgar e eliminar. Ele ainda apela para a filha dela, dizendo que seria melhor para a
criança que sua mãe morresse para ter a chance de não crescer nessa família que ele julga
anormal. O homem ao proferir esse discurso de ataque espera que os outros concordem com
suas ideias homofóbicas e a eliminem, mas seu ataque desmascarado não é tolerado pela
maioria e é ele o eliminado. Os discursos em disputa nesse caso envolvem um ataque às
relações que fogem ao padrão heteronormativo e um discurso de defesa e busca por liberdade
para ter relações que fogem a esse padrão. Embora esses discursos disputem espaço dentro do
filme do grupo, tendo o da defesa da lésbica vencido, esses discursos não são meras criações
analisar a partir das colocações de Oliveira Filho (2013) sobre os discursos permitem uma
análise dos conflitos da sociedade que neles se reproduzem. Além disso, também estão
envolvidas então às disputas de poder por meio desses discursos e o fenômeno da influência
social, já que cada lado busca expressar suas ideias para influenciar a sociedade e garantir
seus interesses, assim como o autor supracitado coloca sobre como os discursos carregam as
ideias opostas, buscando as deslegitimar para legitimar seus próprios interesses, sempre nesse
apontar outro aspecto geral das relações que se desenrolam na primeira parte do filme. Nesse
primeiro momento, em que ainda há muitos personagens vivos, as mortes são mais
“seletivas”, pois eles ainda não aceitam e entendem bem a ideia de que apenas um irá
sobreviver. Com isso, eles começam a fazer perguntas uns pros outro sobre quem são,
conforme o movimento iniciado com a fala de Beth, a fim de encontrar alguma falha que os
manche socialmente e os selecione. Nesse caso, justificados por diversos discursos, diferentes
aspectos levam à eliminação da pessoa. Isso é sintetizado em uma cena em que um dos
personagens expressa uma opinião e é repreendido por isso. Então uma mulher o defende “ele
só está sendo honesto” e outro homem então retruca que lá ser honesto os faz morrer. Ela
então coloca “aqui, tudo faz você morrer”, transmitindo com clareza a ideia desta etapa do
filme em que, de fato, tudo aquilo que nessa disputa discursiva é em algum momento
delicadas seleções daquilo que se valoriza e daquilo que se desvaloriza, passa a ser cada vez
mais explícito a partir de uma cena em que um homem é eliminado por ser um agressor. Nela,
um policial reconhece outro homem alegando que ele havia espancado a namorada e, diante
da discussão entre eles, o homem acaba por confirmar que o havia feito e é então votado e
eliminado. Com isso, percebe-se dois pontos nessa cena. O primeiro é que o policial através
alguns de fato merecem a morte devido a seu caráter ruim. A partir disso, os participantes
começam a discutir sobre como poderiam descobrir “quem era bom e quem era mau”,
buscando realizar um julgamento moral dos que mereciam morrer. Então um dos membros
aponta que isso já era exatamente o que estava acontecendo, o que de fato é verdade, pois os
personagens passam a fazer isso com mais clareza sobre suas intenções de julgamento.
Cabe ressaltar, no entanto, que bom ou mau são classificações abstratas que só
existem no âmbito da sociedade que os constrói coletivamente. Dessa forma, tais conceitos
justificar a dinâmica da sociedade e os interesses nela dominantes. Prova disso é que quando
perguntam então qual seria o critério para definir quem são os bons e os maus, um homem
responde que tudo deve ser levado em conta, exemplificando que deveriam considerar os
esse mesmo homem, envolve uma forte noção de meritocracia. Dessa forma, ele começa a
questionar a profissão das pessoas alegando que isso é importante para decidir quem merece
viver pois “algumas pessoas contribuem mais para a sociedade”. Quando a pergunta se volta
para ele, ele argumenta que deveria ser poupado por ser um banqueiro que trabalha muito,
interesse de que aqueles de nível socioeconômico mais elevado merecem mais viver.
consonância com isso, Wilson Moreira (2016) disserta sobre o impacto da meritocracia nas
decisões socialmente críticas, que seriam aquelas que causam consequências sérias para os
morte de outras pessoas. Dessa forma, usando dilemas morais como exemplo deste tipo de
membros de grupos de baixo estatuto, tais como moradores de rua e dependentes químicos.
Dessa forma, em alguns casos percebeu-se que o fato das pessoas pertencerem a esse baixo
estatuto realmente interferia nos resultados, que foram discutidos à luz das dinâmicas
relevantes para a discussão e reflexão sobre o valor da vida de cada pessoa, o que se relaciona
fortemente com o filme tanto pela obra representar uma situação extrema, que traz a tona as
decisões críticas, como por envolver esses juízos de valor do estatuto de cada indivíduo,
cena descrita.
Além disso, nessa cena, o banqueiro questiona a grávida sobre sua condição
empregatícia e a de seu marido alegando que o mundo já possui muitas mães solteiras na
assistência social, de modo que, caso a mulher fosse pobre, conforme sua lógica ela deveria
ser eliminada. O discurso por trás dessa ideia é a de que seria mais justo que alguém com boa
condição financeira sobrevivesse, pois as classes sociais mais baixas seriam um custo maior
para a sociedade, nesse caso da fala do banqueiro, mães solteiras desempregadas seriam um
custo maior por necessitarem de seguro social. No entanto, o interesse por trás desse discurso
é o interesse da classe dominante que busca atacar as camadas mais pobres em favor da
contradições do sistema que mantém seu poder ao atacar aqueles que sofrem com ela, que são
as camadas mais pobres. Com isso, quando o banqueiro pergunta sobre a profissão da grávida
buscando um argumento para eliminá-la, ele reproduz esse discurso que desqualifica os mais
pobres, nesse caso, considerando-os um gasto para o Estado. Mais uma vez, os discursos da
Outra situação que remete a outras relações de poder, ocorre quando um homem
que, por serem uma minoria historicamente explorada, os negros não deverim ser votados.
Dois homens brancos discutem mais intensamente com ele como não consideram o racismo
relevante nessa discussão, alegando não se importarem com isso. Pode-se notar que o negro
buscou influenciar os outros a eliminar pessoas brancas, mas ocorre uma disputa de poder
entre os dois interesses polêmicos que poderia se encaixar em várias discussões de nossa
discursos de cada lado são importados da sociedade de modo que o que cabe destacar é que
um dos discursos defende que levar em conta o racismo como medida para tomar decisões a
favor da população negra é uma forma de vitimização. Esse por sua vez, é também é um
discurso reproduzido de nossa sociedade, cujos interesses mais implícitos estão ligados ao
processo de escravidão que produziu mazelas tanto concretas quanto na mentalidade social de
duas frases que recentemente ficaram famosas. Uma delas surge a partir de um contexto de
conflitos raciais recentes, protestando que “vidas negras importam" defendendo uma atenção
pensar de forma especial o povo negro. Mais uma vez as disputas de poder e os discursos são
reproduzidos nesse experimento social através das interações grupais para decidir o valor de
cada vida ali. Não ficaria de fora desse experimento social do filme, que discute quais vidas
valem mais, as discussões sobre o diferente valor que a sociedade dá para as vidas negras e as
vidas brancas.
Por fim, no meio dessa discussão outro homem branco se manifesta mais
desmascaradamente racista, o que leva ao seu sacrificio. Podemos analisar, portanto, que
nesse momento o grupo não sacrifica nem o homem negro nem os outros dois brancos, pois
mesmo que com interesses distintos é o terceito homem branco que ao ser abertamente racista
é eliminado visto que mesmo com ideias semelhantes essas ideias mascaradas em outras falas
argumento não é aceito. Posteriormente então o homem faz com que uma mulher que fala a
língua dele pergunte se ele estava nos Estados Unidos ilegalmente, o que ele confirma.
Apesar disso, ele conta que possui três filhas, retirando suas fotos do chapéu, o que causa
certa simpatia dos outros, já que ter filhos ainda era um fator muito influente nesse ponto do
filme. Além disso, ainda há os que defendem que todos são iguais e que não seria justo
matá-lo, enquanto outros reproduzem discursos xenofóbicos de que ele estava “roubando
empregos dos americanos”. A situação é interrompida por outra discussão que conquista a
atenção da maioria, mas mesmo assim, em outro momento do filme, o imigrante é de fato
expressados de forma geral no filme. Conforme aborda Pedro de Oliveira Filho (2013), o
sociedade em discursos que estão envoltos em nossas relações e também internalizados por
nós, tendo esses consequências e armadilhas muitas vezes implícitas e difíceis de controlar.
qualquer forma de mensurar o valor de cada vida sobrepassa esses discursos preconceituosos.
negro, outro homem com a lésbica e outro com o imigrante, são reeprendidos e nos dois
primeiros casos eliminados pela expressão preconceituosa. Assim, as relações de poder atual,
manifestações implícitas, já que como aponta o autor supracitado, estas são menos
sobreviventes vai se tornando cada vez menor, aqueles que têm o interesse máximo em ser o
dois pólos opostos de interesses, formando dois subgrupos. Com isso, duas ideias principais
eliminá-las para que qualquer outra pessoa de alguma forma tente sobreviver. Dessa forma, o
primeiro reproduz discursos que valorizam a vida da criança e da grávida acima das outras,
enquanto o segundo reproduz discursos que alegam que cada vida tem o mesmo valor,
portanto, todos deveriam ter chance de tentar sobreviver. Embora esses sejam os argumentos
explícitos em cada um, como já apontado, nem sempre são essas as raízes do discurso além
sequência de ações de cada um, mostrou como o que importa para a guiar suas ações não
raciocínio propostas, quando essa mesma linha ameaçava seus interesses ela era
Com isso, uma forma de pensar essa polarização do grupo pode ir além da lógica que
cada discurso defende explicitamente, adentrando ao interesse final de cada uma. No caso do
grupo que deseja sacrificar a grávida e a criança, o interesse final de cada um que a defende
não necessariamente é que cada vida tem igual valor, mas que, independente disso, eles
querem desesperadamente viver. Aqueles que o defendem afirmam que “ninguém é especial”,
“eu não sou má pessoa por querer sobreviver” e “todos são iguais aqui”. Prevalece, no caso,
não um desejo por igualdade, um dos argumentos, mas o interesse de sobreviver mesmo que
precise matar qualquer um ali, incluindo a criança. O discurso deles expressa que a prioridade
do indivíduo é garantir o seu próprio bem-estar e farão o que for preciso para isso.
Por outro lado, o grupo que quer que a grávida sobreviva possui um interesse altruísta,
pois o bem que buscam se volta para outra pessoa, de modo que eles estão dispostos a abrir
mão da própria sobrevivência para que alguém que eles consideram que deve ser defendido
viva. É interessante notar que diante de uma situação tão extrema os indivíduos foram
que segundo ela ao estabelecer uma relação de empatia para com alguém, as pessoas tentam
ajudá-las estas por altruísmo, sem levar em conta ganhos ou perdas (Aronson, Wilson &
Akert, 2015).
Com isso, um fator a se considerar é de que forma a grávida e a criança geram mais
empatia nas pessoas e que discurso social está envolvido nessa valorização de suas vidas. O
discurso de que a vida da grávida ou da criança vale mais é defendido logicamente por
questão de quantidades, pois no caso da grávida por carregar outra vida ela contaria como
duas, valendo mais que outra vida e no caso da criança por ter uma idade menor ao ser morta
ela estaria perdendo mais tempo de vida que as outras pessoas. No entanto, como já foi
destacado, não é a lógica que rege implicitamente os interesses dos discursos, mas sim os
novamente a partir das relações de poder e dominância que surgem conforme os interesses do
por ser uma futura mão-de-obra produtiva na sociedade e a grávida por pelo mesmo motivo
pois ela carrega uma futura vida trabalhadora. Essa possível análise, que pode também ter
bases mais profundas e antigas, se pauta nesse caso na própria origem da palavra
proletariado, que vem de “prole” exatamente porque são os filhos o que a classe trabalhadora
tem de interessante para o sistema dominante, já que estes são a mão de obra que move o
sistema. Com isso, essa breve análise busca pensar um dos motivos relacionados à construção
social da valorização da criança e da grávida, além de envolver outros aspectos tais como a
ideia de família e outros valores muitas vezes herdados culturalmente das religiões, o que
exigiria mais estudos complexos limitados no caso desse ensaio. O que se destaca é que isso
não significa que os personagens conscientemente pensaram “uma criança vale mais pois
sócio e culturalmente ela é valorizada, já que possui tal papel”, mas sim, esses valores e
podem ser reproduzidos nos discursos dessa sociedade mesmo sem a intenção clara do
indivíduo.
muito relevante para análise, pois o final do filme envolve a influência de cada subgrupo no
grupo, na busca por influenciar os indivíduos a aderirem seu lado para conquistar a maioria
de votos e eliminar os membros do outro grupo para garantir de seu interesse. É observável
ainda que o discurso que preza pela eliminação da grávida e da criança utiliza vários
mecanismos de apelo para sua adesão, buscando lembrar a pessoa envolvida sobre sua família
e seu desejo de sobreviver. No entanto, esse forte apelo à sobrevivência mascara a grande
lacuna desse grupo, que apesar de alegar dar a chance para que cada um sobreviva, não pode
concretizar essa ação, pois no fim só um pode sobreviver. Um dos mais influentes do grupo
ainda afirma “se ficar do nosso lado prometo que ficará viva”, o que convence a mulher a
quem ele fala, mesmo que posteriormente ele proponha eliminá-la como troca de alvos entre
os grupos. Assim, esse discurso que se fortalece com interesse de cada um sobreviver, no fim,
não pode garantir que isso aconteça e se vencesse, levaria a uma disputa interna de qualquer
jeito, o que não impediu que ele usasse essas formas de persuasão para conseguir adeptos.
Um último ponto de análise possível a ser apontado é destacar não só como as
telespectadores da obra e a sua própria construção. A partir disso, é bem comum que, em
filmes, as pessoas torçam para que este alcance um determinado fim, que normalmente
envolve o sucesso dos personagens que ela se identificou, muitas vezes influenciada pela
disso, embora não haja um protagonista, é muito possível que a maioria dos que o assistem
torça para o lado que busca a sobrevivência da grávida e da criança e inclusive se frustre com
final em que um homem engana a todos e estrategicamente sobrevive. Assim, como assistir o
filme nos aproxima da situação como se esta fosse real devido a verossimilhança, a reflexão
possível referente a esse aspecto é pensar como o filme influencia nossas percepções,
Dessa forma, ao longo da obra, alguns personagens são construídos para despertar
racistas, homofóbicos ou xenofóbicos, além de também serem “egoístas”, por terem como
prioridade máxima sua própria sobrevivência. Outros ainda, não expressam marcadamente
algum preconceito, são egoístas pois apenas tem como prioridade sobreviver, o que também
acaba por despertar grande antipatia dos que assistem o filme. Dessa forma, o egoísmo é uma
característica que adquire caráter pejorativo, seja pela forma como os estereótipos
própria forma que o filme organiza as cenas para despertar nossa empatia com os
personagens altruístas, influenciando nossa percepção nessa disputa. Além disso, é possível
apontar que o lado egoísta, ao qual o filme busca tecer críticas, de fato possui em determinada
medida um caráter pejorativo em nossa sociedade, de modo que os discursos dela influenciam
a produção do próprio filme. Essa reflexão demonstra que mesmo em sua produção, o próprio
filme já realiza julgamentos do valor de cada personagem nos levando a defender um lado.
Válido ou não para a crítica do filme, o que se destaca nesse ensaio não é a defesa de um lado
ou de outro, mas a reflexão de como os discursos influenciam o juízo de valor que ocorre na
Em síntese, o que vale destacar dessa reflexão final proposta é que a análise
psicossocial do filme Circle pode incluir também uma análise social das reações e impressões
dos telespectadores do filme, já que o fenômeno da influência social pode se manifestar por
são discursos que de fato fazem parte das disputas de poder de nossa sociedade, mesmo que
nosso contato com essa reprodução seja por meio de uma obra cinematográfica. Dessa forma,
valores e comportamentos.
Considerações Finais
discursos se tornam uma forma de influência social que transforma ideias em normas,
valores, comportamentos e opiniões. Esses discursos estão envolvidos nas relações de poder,
No filme, essa disputa pode ser distinguida nos dois momentos discutidos: um
primeiro, quando o grupo ainda possui uma quantidade maior de sobreviventes e busca
discursos que valorizam ou desvalorizam cada um; E um segundo momento ocorre quando
sendo possível analisar diversos elementos envolvidos nesses discursos como seu interesse
implícito, sua implicação dentro do grupo e da sociedade, além de como cada um influencia
os participantes de determinada maneira nas decisões sobre quem merece morrer e quem
merece viver.
Referências
Aronson, E., Wilson, T. & Akert, R. (2015). Psicologia Social. 8ª ed. Rio de Janeiro: LTC.
Camino, L., Torres, A. R. R., Lima, M. E. O., & Pereira, M. E. (2013). Psicologia Social:
Hann, A. & Miscione, M. (Diretores), Nardelli, M., Stiefel, B., Nardelli, T., Bursch, J. &
Oliveira, M., Fernandes, M., & Carvalho, R. (2011). O papel do idoso na sociedade