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SBEC – SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESTUDOS DA CANNABIS

BRUNO PEROZZO

CANNABIS, FIBROMIALGIA E DOR: UMA BREVE REVISÃO

São Paulo

2019
CANNABIS, FIBROMIALGIA E DOR: UMA BREVE REVISÃO

BRUNO PEROZZO

Médico veterinário – UNIPINHAL – Centro Regional de Espírito Santo do Pinhal

Orientador: Professor Doutor Paulo Rogério Morais

São Paulo

2019
"Dedico este trabalho àqueles que sofrem em silêncio.

Seja sofrimento mental, físico ou emocional,

sua angústia é respeitada, merece compaixão e suporte.

Sinta-se amado, sinta-se querido, sinta-se heroico.

Seja forte, aguente firme e nunca desista!"


RESUMO

Há milhares de anos a Cannabis tem sido utilizada pelos seres humanos e, com o
aumento do número de países regulamentando seu uso e permitindo o acesso, surge
a necessidade de conhecer melhor sua capacidade medicinal no tratamento da dor e
da qualidade de vida, mais especificamente em portadores de fibromialgia. Dentre
trabalhos, livros e revisões de artigos, pode-se confirmar o potencial terapêutico
positivo com efeitos colaterais menos danosos quando comparada aos alopáticos.
Apesar do acesso à cannabis medicinal no Brasil ainda ser restrito, novos caminhos
se abrem - aos poucos - e trazem esperança a um tratamento digno, eficaz e mais
completo em alternativa aos tratamentos disponíveis no mercado.

Palavras-chave: Cannabis; fibromialgia; dor; qualidade de vida.


ABSTRACT

For thousands years cannabis has been used by humans and with the increasing
number of countries regulating its use and allowing access to it, there is need to know
more about it’s medicinal capacity in the treatment of pain and quality of life more
specifically in patients with fibromyalgia. Among works, books and articles reviews, it's
possible to confirm your positive therapeutic potential with less side effects when
compared to allopathic ones. Although access to medical cannabis in Brazil is still
restricted, new paths open up and bring hope from a dignified, effective and more
complete treatment as an alternative to the available treatments in the market.

Keywords: Cannabis; fibromyalgia; pain; quality of life.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO................................................................................1
2. FIBROMIALGIA...............................................................................2
3. CANNABINÓIDES, ENDOCANNABINÓIDES,
FITOCANNABINÓIDES E RECEPTORES..............................................5
4. TRATAMENTO..............................................................................10
5. EFEITOS ADVERSOS E RISCOS................................................13
6. CONCLUSÃO................................................................................15
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................19
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Pontos gatilho para identificação da fibromialgia.....................3


Figura 2 – Molécula de THC e CBD..........................................................6
Figura 3 – Distribuição de receptores CB1 e CB2 no corpo humano........7
Figura 4 – Molécula de nabilona................................................................9
Figura 5 – Molécula de dronabinol.............................................................9
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1. INTRODUÇÃO

A fibromialgia é um distúrbio comum e sua prevalência na população do planeta

é de 7% (Habib, G. & Avisar, I. 2018). Após muitos anos de pesquisa, ainda não existe

uma medicação efetiva (Ivker, 2018) e o tratamento principal é o uso de analgésicos

para controle da dor. Alguns pacientes relatam melhora com uso de

benzodiazepínicos, antidepressivos tricíclicos e outros antidepressivos, no entanto

muitas dessas medicações expõem o paciente a efeitos adversos (Habib, G. & Avisar,

I. 2018). O diagnóstico é clinico, ou seja, não necessita de exames complementares

para comprovar que ela está presente (Sociedade Brasileira de Reumatologia, 2011).

Este trabalho busca, na revisão de literatura, trazer informações acerca do

potencial terapêutico da cannabis no controle da dor crônica, especificamente em

portadores de fibromialgia. Conhecer a efetividade da cannabis como opção ao

controle da dor e qual o grau de alívio apresenta para os pacientes. Além da dor,

buscamos descobrir se há auxílio em outros sintomas apresentados pelos portadores.

Visto que a fibromialgia é uma síndrome complexa e que demanda uso de

vários grupos farmacológicos, nos interessa informações sobre interações

medicamentosas e efeitos adversos que possam ocorrer nos pacientes que fazem uso

de alopáticos concomitantes à cannabis.

Neste trabalho será apresentada e investigada a patologia. Haverá menção e

descrição dos canabinóides e processos farmacocinéticos acerca deles, bem como

relato de efeitos adversos e resultados de tratamento, caracterizado como uma nova

opção a ser explorada pela medicina.


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2. FIBROMIALGIA

A fibromialgia é uma doença caracterizada por dor crônica generalizada,

combinada com alguma forma de acometimento psiquiátrico. (Blesching, 2015)

Ivker (2018) define que os sintomas primários da fibromialgia são dores

musculares generalizadas, sensibilidade muscular, rigidez muscular e fadiga

significante. Outros sintomas incluem distúrbios do sono, depressão, memória fraca e

baixa concentração; dor de cabeça ou enxaqueca, tontura, formigamento de

extremidades, síndrome do intestino irritado, urgência em urinar e síndromes da

articulação temporomandibular (ATM).

A fibromialgia acomete principalmente mulheres (10 mulheres para cada

homem) com idade entre 25 e 50 anos. Estima-se que 15 a 20% dos pacientes que

se consultam com reumatologista tenham fibromialgia. (Ivker, 2018)

Não existe teste específico que proporcione um diagnóstico preciso. Os

sintomas geralmente são similares aos do reumatismo, artrite e osteoporose.

(Blesching, 2015). Hemogramas e radiografias normalmente não revelam alterações

específicas. (Ivker, 2018)

Bleshing (2015) informa que o critério estabelecido para o diagnóstico pelo

Colégio Americano de Reumatologia inclui histórico de dor difusa pelo corpo e dor

crônica persistente há mais de três meses, presente nos quatro quadrantes do corpo

bem como a presença de dor em 11 de 18 pontos gatilhos específicos.


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Figura 1 – Pontos gatilhos da fibromialgia.

Fonte: https://www.lilly.com.br/Areas_Terapeuticas/Fibromialgia

Pacientes portadores de fibromialgia desenvolvem alterações anatômicas,

fisiológicas e químicas no Sistema Nervoso Central (SNC) que contribuem

potencialmente para os sintomas experimentados por eles. (Blesching, 2015)

Apesar das numerosas alterações cerebrais, fibromialgia pode não ser o

primeiro distúrbio do cérebro, mas sim a consequência de estresse precoce ou

estresse severo prolongado, afetando a o circuito de modulação cerebral da dor e

emoção em indivíduos geneticamente suscetíveis. (Blesching, Uwe. 2015). Para Ivker

(2018), os fatores de risco estão sempre associados com síndrome de fadiga crônica.

Pesquisadores sugerem danos à produção de energia nas células mitocondriais (o

centro de produção de energia das células), como resultado de um excesso de


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radicais livres, sendo a causa primária da fibromialgia. Baixos níveis do

neurotransmissor Serotonina também contribuem para o desenvolvimento da

fibromialgia. O desligamento metabólico das células musculares pode ser possível

devido ao acúmulo de fosfato e ácido úrico.

Sabe-se que em portadores de fibromialgia, o corpo quebra proteína muscular

em uma taxa excepcionalmente alta e converte isso em glicose para energia. Há

teorias que isso aumenta a ruptura do tecido muscular, sendo a causa primária da dor,

fadiga e latejamento. (Ivker, 2018)

A Sociedade Brasileira de Reumatologia relata que, habitualmente, o paciente

tem dificuldade de definir quando começou a dor, se começou isolado e difundiu ou

se já começou no corpo todo. O paciente sente mais dor no fim do dia, mas também

pode haver dor pela manhã. A dor é sentida “nos ossos”, “na carne” e ao redor das

articulações.

Portadores de fibromialgia têm maior sensibilidade ao toque, sendo que muitos

pacientes não toleram nem mesmo serem abraçados. Não há inchaço nas

articulações pois elas não estão inflamadas. O inchaço pode aparecer pela contração

da musculatura em resposta à dor.

Alteração do sono é frequente, afetando aproximadamente 95% dos

portadores. No início da década de 80, descobriu-se um defeito típico: dificuldade em

manter o sono profundo. O sono tende a ser superficial e/ou interrompido. A depressão

pode ser observada em 50% dos pacientes com fibromialgia. Isto quer dizer duas

coisas: que a depressão é comum nestes pacientes e que nem todo paciente com

fibromialgia tem depressão. Não se pode deixar a depressão de lado ao avaliar o


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portador de fibromialgia. A depressão, por si só, piora o sono, aumenta a fadiga e

sensibilidade do corpo. (Sociedade Brasileira de Reumatologia, 2011)

Um relato comum dos portadores de fibromialgia é sobre alterações na

memória e atenção. Isso se deve mais ao fato da dor crônica do que alguma lesão

cerebral grave. Para o corpo, a dor é sempre um sintoma importante e o cérebro

dedica energia lidando com esta dor. Assim, deixa outras tarefas como memória e

atenção prejudicadas. (Sociedade Brasileira de Reumatologia, 2011)

3. CANABINÓIDES, ENDOCANABINÓIDES, FITOCANABINÓIDES E

RECEPTORES

Os canabinóides são derivados de plantas do gênero Cannabis spp. que é

considerada ilícita na grande maioria dos países, contudo é utilizada legal ou

ilegalmente de forma ampla (Habib, G. & Artul, S. 2018).

Habib & Artul (2018) relatam que as duas espécies mais importantes da planta

são a Cannabis sativa e Cannabis indica. A maioria das espécies hoje são híbridas

das duas, sendo as derivadas da sativa destinada ao uso matutino, já que induz a

“energia”, e as derivadas de indica destinadas ao período noturno, já que induz ao

relaxamento e sono. As flores de cannabis possuem mais de 100 tipos de

fitocanabinóides. A maioria dos estudos focam no THC e CBD, pois ambos são

encontrados em concentrações mais altas na planta.


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Figura 2 – Moléculas de THC e CBD

Fonte: https://www.philosopherseeds.com/blog/en/cannabinoids-marijuana/

Muitos dos pacientes costumam utilizar de 02 a 03 cepas de cannabis a

procurando obter diferentes fitocanabinóides. Isso indica que uma única cepa não é

suficiente para as diferentes queixas como dor, insônia, ansiedade ou falta de energia.

Diferentes cepas e diferentes concentrações de THC e CBD amenizam tais relatos.

(Habib, G., & Avisar, I. 2018)

Para Whiteley, 2016, os canabinóides aliviam a dor por uma variedade de

mecanismos: diretamente pelos receptores CB1 e CB2 do corpo bem como por

mecanismo não-receptor, modulação de neurotransmissores (NT) e interação com

opióides endógenos (produzidos internamente) como a endorfina.

Existem 02 receptores conhecidos de canabinóides endógenos

(endocanabinóides): CB1 e CB2. CB1 é mais comumente encontrado no sistema

nervoso central; CB2 é encontrado em diferentes órgãos do corpo, e sua atividade

também está relacionada ao sistema imunológico. O THC é agonista parcial dos

receptores CB1 e CB2, e o CBD é o antagonista. A ativação do CB1 resulta na

diminuição dos sinais sinápticos e excitabilidade neurológica. (Habib, G., & Artul, S.

2018).
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Figura 3 – Distribuição de receptores CB1 e CB2

Fonte: https://medium.com/cbd-origin/the-endocannabinoid-system-everything-you-need-to-

know-1c38a648cafb

Receptores CB1 e CB2 e os endocanabinóides 2AG e anandamida possuem

funções diferentes na modulação da dor. Por exemplo, THC (tetra-hidrocanabinol) tem

relativamente maior afinidade pelo receptor CB1; ele é fortemente atraído para se

encaixar neste receptor. THC é um agonista CB1 que aumenta a atividade do Sistema

Endocanabinóide. Quando a molécula do THC se encaixa ao receptor CB1, ativando

aquela parte do Sistema Endocanabinóide, temos os efeitos eufóricos bem

conhecidos do THC e seu potente efeito analgésico; quando os receptores CB2 são

ativados, inflamação crônica e dor neuropática passa a ser modulada. O THC também

ativa os receptores CB2. (Whiteley, 2016)

Whiteley (2016) também afirma que o CBD (canabidiol), segundo

fitocanabinóide mais evidente próximo ao THC, também é analgésico. O CBD não se


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encaixa em qualquer receptor CB1 ou CB2. Ele atua como um estimulante do Sistema

Endocanabinóide suprimindo a enzima FAAH (Hidrolase da Amida de Ácidos Gordos),

que quebra a anandamida que se encaixa no CB1. Portanto, o consumo de CBD leva

a menor quebra de anandamida, o que a faz permanecer no organismo por mais

tempo. Em outras palavras: o CBD aumenta o poder dos endocanabinóides do corpo.

Juntos, THC e CBD são melhores moduladores da dor do que separados.

Outros fitocanabinóides como o CBC (canabicromeno), CBG (canabigerol) e

THCV (tetrahidrocanabivarina) bem como os terpenos mirceno (analgésico), beta-

cariofileno (analgésico, anti-inflamatório), alfa-pineno (antibiótico, anti-inflamatório,

broncodilatador) e linalol (anestésico), também contribuem para a modulação da dor.

(Whiteley, 2016)

Os avanços científicos permitiram extrair os princípios ativos da cannabis e

desenvolvê-los sinteticamente, prometendo redução da dor de forma segura e efetiva.

Essa hipótese é baseada no caminho da farmacologia, a fim de desenvolver drogas

mais seguras e efetivas que as próprias plantas. Por exemplo, nabilona e dronabinol

são canabinóides sintéticos, cujas moléculas são compatíveis com o THC. Estão

disponíveis e foram aprovadas pelo FDA (Food and Drug Administration) nos EUA.

(Romero-Sandoval et al. 2018)


9

Figura 4 – Molécula de nabilona Figura 5 – Molécula de dronabinol

Fonte: https://www.rxlist.com/cesamet- Fonte:

drug.htm#description https://www.philosopherseeds.com/blog/en/canna

binoids-marijuana/

Supreendentemente, como um paradoxo farmacológico moderno jamais visto

nas diretrizes do FDA, canabinóides sintéticos orais demonstram conflitos nos

resultados dos pacientes com dor crônica (avaliados de “não significante” para “baixa

significância” na redução da dor quando comparado a placebos). Eles também

apresentam benefícios parciais em alguns aspectos relacionados a dor crônica, sono

e qualidade de vida. Em adição à sua eficácia limitada para tratar a dor, a tolerância

parece ser a limitação principal para seu uso. O número de pacientes que parou o

tratamento com canabinóides sintéticos orais devido aos relatos de efeitos adversos

ou baixa eficiência é maior que aqueles observados quando tratados com

fitocanabinóides. Essa evidência indica que os perfis de tolerância e eficácia de

canabinóides sintéticos são inferiores aos fitocanabinóides. Isso também é notado nos

pacientes de dor crônica que preferem fazer uso da planta toda em vez de

canabinóides orais. (Romero-Sandoval et al. 2018).

Em um estudo de 48 semanas, dronabinol não mostrou superioridade ao

placebo. Curiosamente, a indução de efeitos adversos pelo dronabinol foi maior que
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o placebo, porém, reduzido após 4 semanas de administração, sugerindo que

tolerância pode ser desenvolvida em um curto espaço de tempo quando THC puro

sintético é administrado por via oral. (Romero-Sandoval et al. 2018)

Em avaliações aleatórias de ensaios clínicos de cannabis inalada para controle

de dor crônica, a concentração de THC na cannabis nunca foi superior a 10%,

variando entre 0 – 1,29% a 9,4%. De fato, em vários estudos, baixas concentrações

de THC (1%, 1,29% e 2,9%) mostraram, significativamente, eficácia para controle da

dor. Além disso, em praticamente todos estudos com alto teor de THC, apresentaram

consistentemente efeitos colaterais, causando na maioria dos pacientes a

descontinuação do tratamento. (Romero-Sandoval et al. 2018)

Enquanto a alta concentração de THC é focada pelos consumidores

recreativos, farmacologicamente falando mais THC não é, necessariamente, melhor

para os pacientes. Isso é observado em usuários experientes de cannabis, que

encontram alívio para a dor quando utilizam cannabis com 12,5% de concentração de

THC durante 12 meses. (Romero-Sandoval et al. 2018)

4. TRATAMENTO

De acordo com Blesching, 2015, o tratamento da fibromialgia por grupo

alopático inclui relaxante muscular, analgésicos opióides, antidepressivos,

anticonvulsivantes, agonista de dopamina e canabinóides.

O anticonvulsivante pregabalina (nome comercial Lyrica) é frequentemente

prescrito para dor fibromiálgica. No entanto, a pregabalina pode causar sonolência,

tontura, xerostomia (boca seca), constipação e visão borrada. Antidepressivos como

a duloxetina (nome comercial Cymbalta) são utilizados a fim de proporcionar alívio a


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curto prazo para o sono e depressão, enquanto anti-inflamatórios são utilizados para

tratar a dor, com resultados muito baixos de efetividade. (Ivker, 2018)

Whiteley, 2016, relata que certas patologias com altas taxas de dor como

fibromialgia e enxaqueca, podem ser associadas à deficiência de endocanabinóides.

Isso ajuda explicar, em partes, por que cannabis é efetiva nessas patologias. Elas

demonstram padrões clínicos, bioquímicos e patofisiológicos que sugerem deficiência

de endocanabinóides e que podem ser tratados adequadamente com medicina

endocanabinóide.

Existem poucos estudos na literatura sobre o uso de canabinóides em

pacientes com fibromialgia. Nesses estudos, os pacientes utilizam cannabis sem

licença e de diferentes fornecedores e os estudos também não apresentam

informação ou quantidade (em gramas) de cannabis utilizada. No geral, os pacientes

desses estudos relatam efeitos favoráveis ao uso de cannabis. Uma revisão

sistemática sobre o uso de canabinóides sintéticos (Nabilona) em fibromialgia

apresentou evidência (de baixa qualidade) de redução na dor e limitações de saúde e

qualidade de vida no grupo de usuários de canabinóides sintéticos em comparação

ao grupo placebo e melhoras no efeito do sono quando comparado a Amitriptilina

(Habib, G. & Artul, S. 2018).

Neste estudo, o autor obteve dados de 02 hospitais de Israel sobre pacientes

portadores de fibromialgia que eram tratados com cannabis. Foram identificados 30

pacientes e somente 26 foram incluídos no estudo. Havia 19 pacientes do sexo

feminino (73%), e a média de idade do grupo era 37,8 ± 7,6 anos. A dose média de

cannabis utilizada foi 26 ± 8,3 gramas ao mês, e a duração do tratamento com

cannabis foi 10,4 ± 11,3 meses, com duração média de 03 meses. Após o início do

tratamento, todos os pacientes reportaram melhora significativa em cada parâmetro


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analisado; 13 pacientes (50%) pararam totalmente com outros medicamentos para

fibromialgia. Oito pacientes (30%) relataram efeitos adversos bem leves. (Habib, G. &

Artul, S. 2018).

A dose média de consumo mensal foi de 26 ± 8,3, o que indica que

aproximadamente 1 grama de cannabis ao dia pode ser suficiente para controlar os

sintomas da fibromialgia. (Habib, G. & Artul, S. 2018).

Como formas de administração, a vaporização aparece como alternativa

primária para pacientes que não querem fumar, enquanto gotas de óleo de

canabinóides sintéticos são consideradas fracas em termo de eficácia e geralmente

utilizadas para complementar a vaporização. A vantagem do óleo em relação a

vaporização é que nele podemos mensurar a concentração e a dose que o paciente

toma. (Habib, G. & Avisar, I. 2018)

Desde que a fadiga é um sintoma proeminente na fibromialgia, recomenda-se

evitar o uso de cepas de cannabis indica e ricas em CBD, já que podem elevar a

fadiga. Melhores resultados são encontrados quando utilizamos produtos de uso

tópico, como patches transdérmicos (1:1 CBD:THC), vaporização de cepas 50:50

(sativa-indica) ou híbridas sativa dominante (60:40, 70:30) caso o paciente suporte os

efeitos psicoativos, e óleo full spectrum na proporção 1:1 (Ivker, 2018)

Para Romero-Sandoval et al., o CBD pode reduzir efeitos psicoativos não

desejáveis do THC e potencializar outros efeitos (dos anticonvulsivantes e

analgésicos) quando utilizado em conjunto. Provavelmente por não executar efeitos

em receptor CB1 ou por sua modulação positiva do sistema endocanabinóide. Outros

estudos mostram que o CBD oral não altera os efeitos psicoativos induzidos por

cannabis fumada, o que indica que a interação entre CBD e THC depende da
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farmacocinética e via de administração em adição às suas ações nos receptores CB1

e CB2.

Outra consideração óbvia no tratamento da dor crônica e uso de canabinóides

é sobre sua potencial interação com opióides. Mais de 35% dos pacientes utilizam

canabinóides em substituição aos opióides para tratamento da dor. Além disso,

canabinóides inalados proporcionam melhor analgesia quando combinados com

opióides. Similarmente, pacientes que utilizam drogas controladas e usam

canabinóides para controle da dor, relatam que os canabinóides são mais eficientes

que as drogas controladas. Em estudo, cannabis (6%-14% THC e 0,2%-3,8% CBD)

utilizada diariamente por 6 meses resultou em redução significante dos sintomas da

dor, intensidade da dor e interferência da dor. Neste mesmo estudo, uma significante

proporção de pacientes (44%) descontinuou o uso de opióides com a intervenção da

cannabis. (Romero-Sandoval et al. 2018)

Este estudo demonstra que cannabis não só dispõe de potencial uso clínico

como também demonstra que é clinicamente útil para o tratamento da dor crônica e é

mais segura e tolerável por uso prolongado sob supervisão médica. Entretanto,

monitoramento de parâmetros do paciente e cautela são requisitos para padronizar

seu uso. (Romero-Sandoval et al. 2018)

5. EFEITOS ADVERSOS E RISCOS

A grande maioria dos efeitos adversos relatados tem relação com a forma de

uso da cannabis. A mais prejudicial, sem dúvida, é a forma fumada/inalada. Segundo

Romero-Sandoval et al. 2018, A inalação dos subprodutos da combustão representa

o maior risco à saúde.


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Xerostomia (boca seca), vermelhidão dos olhos e fome também são

destacados. Tais efeitos apareceram no início do tratamento e, os dois primeiros

(xerostomia e vermelhidão dos olhos) são transitórios, encontrados apenas quando

se fuma a cannabis. (Habib, G. & Artul, S. 2018)

Habib & Avisar (2018) demonstram que, quando inalada/fumada, os efeitos

adversos relatados foram leves e transitórios como irritação dos olhos ou garganta

(sem dados registrados). Vale ressaltar que somente em 8% dos usuários de cannabis

medicinal foi detectado dependência enquanto em alopáticos identificou-se 66%. Em

85% dos casos, os pacientes pararam completamente com medicação alopática ou

reduziram a dose. Isso reflete a vantagem da cannabis medicinal em relação aos

demais tratamentos, somados aos efeitos favoráveis no sono e humor. Em 81% dos

pacientes, houve relato no aumento da capacidade de execução de tarefas diárias e

64% relatou voltar ao trabalho ou atividades em período integral, ponto importante

para o paciente pessoalmente, sua família e para sociedade em geral.

De acordo com a Academia Nacional de Ciências em Cannabis Medicinal

(National Academy of Sciences on Medicinal Cannabis), existem evidencias

substanciais que sugerem que o consumo de cannabis em idade precoce, representa

risco de desenvolver uso abusivo de cannabis. O relatório também indica que a

frequência do uso de cannabis é associada à progressão ao abuso. Aproximadamente

18,8% das pessoas que utilizam cannabis diariamente desenvolvem algum tipo de

desordem em seu uso. (Romero-Sandoval et al., 2018)

Romero-Sandoval et al. 2018, indica que pessoas com depressão são mais

vulneráveis a desenvolver vício em cannabis. Entretanto, em outro estudo, pacientes

com dor crônica que utilizam cannabis apresentam taxas mais baixas de depressão e

ansiedade em comparação à pacientes de dor crônica que se tratam com drogas


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prescritas ou opióides. Já que a depressão geralmente acompanha dor crônica, os

médicos devem dedicar atenção especial à pacientes que fazem uso de cannabis

medicinal e sofrem de dor crônica e depressão.

Pacientes com estresse pós-traumático e com histórico de doença psiquiátrica

também devem ser monitorados. Há evidências moderadas de que o abuso de

cannabis associado com tratamento psiquiátrico aumenta a severidade dos sintomas

pós-traumáticos. (Romero-Sandoval et al., 2018)

O uso de cannabis aumenta o risco de desenvolver resultados psicóticos. Esse

risco tem concentração uso e frequência-dependente de THC. Pacientes com

psicoses induzidas por cannabis tem risco maior (50%) de desenvolver esquizofrenia

ou transtorno bipolar, especialmente jovens adultos (16-25 anos). Essa evidência

argumenta contra o uso de altas concentrações de THC (>10-15%) por longos

períodos, o que tem relevância particular com o tratamento da dor crônica. (Romero-

Sandoval et al., 2018)

Romero-Sandoval et al. (2018) destacam que o abuso potencial ou risco de

abuso de cannabis vs. opióides é muito mais favorável à cannabis.

6. CONCLUSÃO

O motivo pela qual algumas pessoas desenvolvem fibromialgia e outras não,

ainda é desconhecido. (Sociedade Brasileira de Reumatologia, 2011)

O que não mais se discute é se a dor do paciente é real ou não. Hoje, com

técnicas de pesquisas que permitem ver o cérebro em funcionamento em tempo real,


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confirmou-se que os pacientes estão sentindo a dor que referem. (Sociedade

Brasileira de Reumatologia, 2011)

Apesar de ser extremamente limitante, a fibromialgia é considerada benigna.

Ela não causa ataque cardíaco, AVC, câncer ou perda de vida. (American College of

Reumathology, 2019)

Para Habib & Artul (2018), o tratamento com cannabis é associado a

significantes resultados favoráveis, com baixos efeitos colaterais, em cada avaliação

do paciente. Em alguns casos, a melhoria foi tão marcante que os pacientes cessaram

totalmente o uso de alopáticos e, em outros casos, houve redução significativa. Os

pacientes expressaram os resultados em suas próprias palavras, como “eu gostaria

de ter conhecido esse tratamento antes”, eu voltei a ser a pessoa que eu era antes”,

“eu recuperei minha saúde” e “este é um tratamento milagroso”.

Num estudo em Israel, alto percentual de pacientes (94%) relatou alívio da dor;

o impacto positivo no sono, problema comum em grande parte dos pacientes, também

foi similar (93%), fazendo da cannabis um remédio versátil. Ela também auxilia na

depressão e ansiedade, apesar de ser relatado por baixa porcentagem de pacientes.

Esses pontos tornam a cannabis muito atraente para os portadores de fibromialgia.

(Habib, G., & Avisar, I. 2018)

A dose média de consumo mensal foi de 26 ± 8,3, o que indica que

aproximadamente 1 grama de cannabis ao dia pode ser suficiente para controlar os

sintomas da fibromialgia. (Habib, G., & Artul, S. 2018).

A exposição de pacientes de dor crônica à altas concentrações de THC os

coloca em risco de efeitos adversos ou quadros sem efeitos benéficos adicionais,


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desenvolverem tolerância ou potencial abuso. (Romero-Sandoval, E. A., Fincham, J.

E., Kolano, A. L., Sharpe, B. N., & Alvarado-Vázquez, P. A. 2018)

Embora pesquisas anteriores tenham proposto um papel para a deficiência

endocanabinóide na fibromialgia, o papel potencial dos canabinóides endógenos na

patogênese da fibromialgia ainda é desconhecido. Mais estudos são necessários para

identificar tais papéis. A distribuição de receptores endocanabinóides pelo corpo

favorece a teoria proposta de sensibilização central na patogênese da fibromialgia.

(Habib, G., & Artul, S. 2018).

Para Romero-Sandoval et al. (2018), o conteúdo molecular de canabinóides

sintéticos vs. fitocanabinóides pode determinar a eficácia diferencial no tratamento da

dor. Canabinóides sintéticos possuem a vantagem de padronização e apresentação

de dose. Em contrapartida, fitocanabinóides possuem dezenas de canabinóides. A

combinação de todas as moléculas exclusivas de cannabis, mais a possível interação

dos principais canabinóides com outras moléculas presentes na planta fornecem um

efeito benéfico adicional para o tratamento da dor que atualmente não é conhecido

mas é, definitivamente, uma possibilidade.

A legalização da cannabis com finalidade medicinal permitirá vantagem

significante no controle da qualidade da planta permitindo padronizar cepas e atingir

“grau farmacêutico”, com certificação de limpeza e segurança, livre de toxinas e com

a concentração de canabinóides conhecida. (Romero-Sandoval, E. A., Fincham, J. E.,

Kolano, A. L., Sharpe, B. N., & Alvarado-Vázquez, P. A. 2018)

Romero-Sandoval et al. (2018), defendem que a medicina moderna e a

comunidade de pesquisa devem implementar novos parâmetros para atuar frente os

desafios da cannabis, com intuito de proporcionar abordagem e manutenção segura


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do paciente. É necessária mais pesquisa científica para entender os mecanismos de

ação da cannabis a fim de desenvolver terapias mais eficazes com reduzidos efeitos

colaterais. A necessidade desses avanços seria alcançada de forma mais eficiente se

as restrições de acesso à cannabis fossem reduzidas.

Baseado em evidências, pode-se concluir que cannabis demonstra ter potencial

para redução do consumo de opióides e é efetiva contra dor crônica (Romero-

Sandoval et al. (2018), além disso, atua positivamente em outros sintomas

apresentados pelos portadores de fibromialgia, tornando-a um forte aliado no

tratamento dos pacientes que buscam amenizar o sofrimento invisível e garantir

qualidade de vida.
19

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMIGUES, Isabelle. Fibromyalgia - American College of Rheumatology. Estados Unidos,


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Reumatologia. Brasil, 20 abr. 2011. Disponível em:
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