Artigo 04- Como evitar contaminação cruzada em serviços de alimentação
Um grande problema da saúde pública são os surtos de origem alimentar,
ocasionados por doenças transmitidas por alimentos (DTAs). Estima-se que anualmente 1 a cada 10 pessoas adoecem devido as DTAs, que estão relacionadas ao consumo de alimentos contaminados, no qual dependendo do microrganismo/toxina presente, pode até ser fatal. O consumidor na maioria das vezes não consegue constatar que o alimento que foi ingerido estava contaminado, o que dificulta o rastreamento da origem da doença. São vários fatores que afetam a segurança do alimento, desde a aquisição de matéria-prima até chegar ao consumidor final, e qualquer falha durante este processo pode ocasionar a contaminação do alimento. Por isso é importante conhecer estes fatores e estabelecer ações de prevenção e de controle para que não ocorram estas doenças transmitidas por alimentos. Além disso, a qualidade de um produto está diretamente ligada com as condições higiênico-sanitárias do processo produtivo. A contaminação de um alimento pode acontecer pela presença de contaminantes físicos, químicos ou biológicos que são nocivos à saúde humana. Os contaminantes físicos são objetos estranhos presentes no alimento, e estão relacionados, por exemplo, com a presença pregos, pedaços de vidros ou plástico, fragmento de ossos, pedras, fios de cabelo, brincos, lascas de madeiras, entre outros. Estes materiais podem causar injurias como cortes ou perfurações, além de sensação desagradável perante o ocorrido. Os contaminantes químicos estão relacionados à presença de produtos químicos nos alimentos, que ocorre devido a falhas de diluição do produto, enxágüe mal feito do equipamento ou utensílio e aplicação incorreta de um produto. Nesta categoria entram os fungicidas, herbicidas, produtos de limpeza, metais pesados e antibióticos. Já os contaminantes biológicos são os microrganismos indesejáveis presente no alimento ou na água, e são os principais causadores das DTAs. Estes microrganismos podem estar presentes no próprio alimento, no manipulador, no ambiente, em bancadas, equipamentos e utensílios. A presença de microrganismos patogênicos nos alimentos ocorre principalmente por contaminação cruzada, que é definida como a transferência direta ou indireta de microrganismos de um alimento contaminado para um alimento não contaminado. A contaminação cruzada nos serviços de alimentação ocorre devida as falhas nas medidas higiênico-sanitárias e processamento inadequado durante as diferentes etapas de manipulação do alimento, e a probabilidade de ocorrer está relacionada com três fatores: a presença de uma fonte de contaminação, uma fase intermediária (superfície de contato, equipamentos, utensílios, manipulador, etc) e o alimento. Um exemplo desta situação seria um manipulador utilizar uma faca para cortar um pedaço de carne crua, e em seguida, sem higienizar a mesma, utilizar a mesma faca para cortar uma carne cozida, transferindo microrganismos da carne crua para a carne pronta para consumo. Outro exemplo seria não realizar a troca contínua de esponjas de cozinha. Segundo estudos, as esponjas de limpeza são importantes veículos de microrganismos patógenos, pois restos de alimentos ficam aderidos junto com a água, tornando-se um meio favorável para crescimento microbiano. A partir destes exemplos, podem-se definir os principais erros que causam contaminação cruzada em um serviço de alimentação:
Erros de fluxo operacional, no qual há cruzamento do alimento preparado com
o alimento cru; Falta de higienização da caixa d´água ou água imprópria para uso, pois a água está presente em praticamente todos os processos dentro de um serviço de alimentação, e se ela estiver contaminada, contaminará os alimentos; Uso inadequado de EPIs; Falha no processo de higienização das mãos dos manipuladores; Procedimentos de higiene e sanitização não padronizados; Não setorizar os utensílios por uso/local; Armazenamento incorreto dos alimentos crus e preparados; Não realizar capacitação dos manipuladores.
Cada serviço de alimentação tem suas particularidades de funcionamento, e
deve realizar uma análise do seu processo para verificar quais são os possíveis focos de contaminação cruzada no seu estabelecimento para propor medidas preventivas para que isso não ocorra. Abaixo seguem algumas ações que podem ser realizadas para evitar a contaminação cruzada:
Não deixar acumular sujidades e restos de alimentos em superfícies e
equipamentos, pois são fontes atrativas para desenvolvimento de microrganismos e pragas; A mesma tábua que é utilizada para manipular alimentos crus não deve ser utilizada para manipulação de alimentos prontos ao consumo. Adotar um sistema de cores para as tábuas facilita o uso correto delas; Realizar corretamente a higienização de frutas e hortaliças em solução de água com hipoclorito de sódio; Ter utensílios separados por cor para manipular diferentes tipos de alimentos; Utilizar recipientes adequados e resistentes para o armazenamento dos alimentos crus e preparados; Realizar higienização correta dos utensílios e equipamentos entre um preparo e outro; Higienizar as superfícies de trabalho antes e depois de manipular qualquer alimento; Realizar a higiene das mãos sempre que necessário e de forma correta; Ter instalações apropriadas e em quantidade suficiente para a lavagem de mãos; Se forem utilizadas luvas descartáveis, realizar a troca das luvas cada vez que for manipular um novo alimento ou material; Seguir corretamente a instrução de uso que o fabricante recomenda para o produto químico de limpeza e sanitização (diluição e tempo de ação); Utilizar somente produtos sanitizantes regularizados pelo Ministério da Saúde; Separar utensílios para limpeza e higienização da área de manipulação; Não deixar resíduos de produtos de limpeza nas instalações, equipamentos e utensílios; Ter luvas de borracha separadas para cada tipo de atividade (limpeza do lixo, limpeza dos banheiros, limpeza de equipamentos, etc.); Padronizar os processos de higienização e manter registrado quando e por quem foi executada a operação. O uso de Instruções de Trabalho (IT) é uma ótima ferramenta para realização correta destes processos no dia a dia. O manipulador deve realizar a troca diária do uniforme e sempre que for necessário; Cobrar bons hábitos de conduta e de higiene do manipulador; Garantir que o manipulador está saudável e sem doenças para sua função. Caso fique doente, trocar para outra função que não há manipulação de alimentos ou orientar para retirar um atestado.
Todos os manipuladores devem entender a importância de realizar estas
atividades corretamente. Nos serviços de alimentação o manipulador pode ser o principal veículo de contaminação alimentar, de forma direta ou indireta, colocando em risco a produção de um alimento seguro, e conseqüentemente, em risco a saúde do consumidor. Deve-se investir na capacitação dos colaboradores com o objetivo de aprimorar suas habilidades dentro do serviço de alimentação, pois as falhas ocorrem principalmente devido ao pouco entendimento sobre a execução correta das atividades. Caso algum problema de contaminação cruzada ocorra e acabe afetando a saúde de um consumidor, este pode processar o estabelecimento, o qual ficará mal visto perante a sociedade, além das penalidades por parte da Vigilância Sanitária. É importante lembrar que os serviços de alimentação devem realizar a implantação das Boas Práticas, que é uma forma de garantir a produção de um alimento inócuo, além de estar regularizado para funcionamento perante a Vigilância Sanitária. A contaminação cruzada pode ser um grande problema em um serviço de alimentação, trazendo prejuízos ao estabelecimento, e por isso é fundamental adotar estratégias e práticas que evitem a contaminação cruzada, prezando sempre pela produção de um alimento seguro e pela saúde e bem-estar do consumidor.
Referências:
BRASIL. Resolução RDC nº 216, de 15 de setembro de 2004. Estabelece procedimentos de Boas
Práticas para serviço de alimentação, garantindo as condições higiênico-sanitárias do alimento preparado. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 2004.
MEDEIROS, M. G. G. A.; CARVALHO, L. R. de; FRANCO, R. M. Percepção sobre a higiene dos
manipuladores de alimentos e perfil microbiológico em restaurante universitário. Ciência & Saúde Coletiva, v. 22, n. 2, p. 383-392, fev. 2017.