Você está na página 1de 5

Universidade de Brasília

Disciplina: Introdução à Teoria Literária


Professor: Ricardo Araújo
Aluna: Beatriz Brito do Nascimento
Turma: E

Referência: Hegel, Georg Wilhelm Friedrich. Estética- Poesia Lisboa, Guimarães Editores,
1980 “Carácter geral da Poesia Épica”, pp. 125-191.
 Épico:
 Lírico:
 Dramático:
 Epopeia:
 Cosmogonia:
 Teogonia:

“É como totalidade original que o poema épico constitui a Sagra, o Livro, a Bíblia de um povo.
Todas as nações grandes e importantes possuem livros deste gênero, que são absolutamente
os primeiros entre todos e nos quais se encontra expresso o seu espírito original. Assim estes
monumentos constituem a verdadeira base sobre a qual repousa a consciência de um povo, e
não seria destituído de interesse formar-se uma coleção de semelhantes Bíblias.” (p. 130)

“Tudo o que mais tarde se torna dogma religioso imutável ou lei moral representa maneiras de
pensar com a sua vida própria, independente e separada do indivíduo, e em que a vontade e o
sentimento se não distinguem entre si.” (p. 131)

"Quando o eu individual se separou do todo substancial da nação e dos seus estados, das suas
maneiras de pensar, das suas ações e destinos e quando, no próprio homem, se efetuou a
separação entre a vontade e o sentimento, a poesia épica dá lugar à poesia lírica, por um lado,
à poesia dramática, por outro.” (p. 131)

“O poeta deve [...] viver nas circunstâncias e condições que descreve, partilhar a maneira de
pensar e as crenças da época que canta e não empregar na exposição do seu tema, que
constitui a base real do seu poema, senão a consciência poética, a arte da apresentação.
Quando não existe esta afinidade entre a fé, a vida e as representações atuais do poeta e os
acontecimentos épicos que descreve, o seu poema torna-se necessariamente contraditório e
sem coesão.” (p. 133)

“Embora a epopeia deva ser, na realidade, a expressão objetiva de um mundo independente,


de um mundo de que o poeta se sente mais próximo pela sua maneira de encarar as coisas, a
ponto de por vezes se identificar com ele, a obra de arte que representa este mundo não deixa
de ser uma livre produção do indivíduo. ” (pp. 133-134)

“[...] o verdadeiro poeta épico, apesar da independência das suas criações, evolui em toda a
liberdade no seu mundo onde tudo lhe é familiar: tanto as ideias, as paixões e os fins que se
agitam na alma dos indivíduos, como todos os aspectos exteriores.” (p. 134)

“Porém, em razão do caráter objetivo da epopeia, o poeta, como sujeito, deve apagar-se ante
as suas criações, deve mesmo desaparecer. Só a obra deve ser aparente, não o poeta; mas,
todavia, o que se exprime no poema é bem o produto da sua intuição, no qual pôs toda a sua
alma e todo o seu espírito.” (p. 135)

“[...] o grande estilo épico exige que a obra se recomende por si mesma, sem se valer do nome
do nome do seu autor.” (p.135)
“[...] o poema épico, como verdadeira obra de arte, não pode ser criado senão por um único
indivíduo. Mesmo exprimindo o espírito de todo um povo, não é uma obra coletiva deste, mas
apenas a de alguém. Certamente, o que constitui a causa ativa e eficaz, é o espírito só dará
origem a uma obra real quando for apreendido pelo gênio individual de um poeta que tome
consciência deste espírito e do seu conteúdo como fazendo parte da sua própria intuição e os
exterioriza numa obra.” (p. 136)

“Tal é efetivamente o caso dos cantos homérico. Neles só está representada a objetividade
concreta, a visão do mundo comum a um povo.” (p.137)

“[...] o que constitui o conteúdo de uma obra épica, não é uma ação isolada e arbitrária, nem um
acontecimento acidental e fortuito, mas uma ação cujas ramificações se confundem com a
totalidade da sua época e da vida nacional; portanto, uma ação que só pode ser concebida
mergulhada no seio de um mundo amplo e que comporta por conseguinte a descrição de toda a
realidade de que faz parte.” (p.140)

“[...] Tudo aquilo de que o homem necessita para a sua vida exterior, casa e campo, tenda,
leito, espada e lança, barco para sulcar o mar, carro que o conduza à batalha, matança e
cozedura de animais, comer e beber, não deve ser para ele um assunto morto, mas deve senti-
lo como uma parte de si mesmo e, em virtude deste estreito laço que une ao indivíduo humano
todos estes objetos e todos estes atos, devem manifestar um cunho humano, como se
participassem da alma individual.” (p.141)

“Este mundo não deve apenas compreender a generalidade limitada de um acontecimento


particular, realizando-se no domínio que acabamos de descrever, mas deve ampliar-se até
tornar a totalidade da visão do mundo nacional” (p. 145)

“[...] todas as epopeias verdadeiramente originais nos oferecem a imagem do espirito nacional,
tal como se manifesta na moral da vida familiar, na guerra e na paz, nas necessidades, nas
artes, usos e interesses, enfim uma imagem completa da fase em que se encontra a
consciência e a sua qualidade.” (p.146)

“[...] o conjunto dos poemas épicos constitui a história universal, no que ela tem de mais belo,
mais vivo e mais livre. Por exemplo, nenhuma fonte nos esclarece de uma forma tão viva e tão
simples sobre o espírito grego, como Homero, ou pelo menos, sobre as origens do povo grego
e sobre os recursos de que dispunha para fazer face às lutas a que teve de se sujeitar no
decurso da sua história propriamente dita.” (p. 146)

“Para ser, [...], uma bíblia com um valor permanente , o verdadeiro livro de um povo, o poema
épico não nos deve pretender interessar pelo lado positivo da realidade passada senão na
medida em que esse lado se une por laços internos ao que constitui a substância da existência
nacional. Na falta da qual, tudo o que diz respeito a este lado positivo nos pareceria acidental e
deixaria indiferentes. Assim é que, por exemplo, uma nacionalidade é inconcebível fora de
condições geográficas apropriadas; mas não são essas condições que imprimem a um povo o
seu caráter específico;” (pp. 146-147)

“[...] a verdadeira matéria da poesia não é constituída pelo estado geral de um povo particular
na imóvel generalidade do seu individualismo, mas este estado geral deve aparecer como a
base sobre a qual se desenrolam os acontecimentos que se relacionam com todos os aspectos
da realidade nacional e integrá-los por assim dizer. Os acontecimentos aludidos não devem ser
acidentes exteriores, mas emanar da vontade que persegue um fim espiritual e substancial.
Porém, para que não haja rotura entre o estado geral da nação e os atos individuais, é preciso
que o acontecimento épico tenha a sua raiz no próprio solo sobre o qual evolui. [...] o mundo
épico, [...], deve ser colocado numa situação particular de tal modo concreta que os fins
determinados, cuja realização o poeta épico nos deve contar, dela resultem natural e
necessariamente. [...]. A situação determinada na qual se apresenta o estado do mundo épico
em que a vida de um povo evolui deve portanto ser por si mesma geradora de conflitos.” (p.
149)

“Pode dizer-se, em geral, que a situação que mais convém à poesia épica é a caracterizada
pelos conflitos de guerra. Com efeito, a guerra significa toda uma nação armada em
movimento; uma noção que é levada a agir, pois que é a si própria e à sua totalidade que tem
de defender.” (p. 149)

“Só são verdadeiramente épicas as guerras que as nações estrangeiras travam entre si;”
(p.151)

“A mútua inimizade entre nações estrangeiras é, pelo contrário, um fator substancial. Cada
povo constitui uma totalidade diferente da dos outros, por vezes mesmo oposta à dos outros.
Quando estes povos se erguem uns contra os outros, nenhum laço moral é destruído, nada do
que tem valor em si é lesado, nenhuma unidade necessária é desagregada, pelo contrário, há
uma luta para a conservação inatacável da totalidade de cada um e para o seu direito à
existência. São estas inimizades as mais próprias para prestar assuntos à poesia épica.” (p.
152)

“É necessário que a guerra tome o nome de uma reivindicação de caráter universal e histórico,
que um povo faz valer contra outro. Só então a guerra se torna um empreendimento de ordem
superior, sem nada de subjetivo, não sendo ditada pela vontade de dominar e subjugar, mas
afirmando-se como um fato absoluto, que se fundamenta numa necessidade superior, podendo
mesmo ser desencadeada por um pretexto exterior, por um aparente desejo de vingança.”
(p.153)

“Para que o espírito de uma nação nos apareça, do ponto de vista poético, tal como é na
realidade, é necessário que a obra nos apresente figuras verdadeiramente históricas e na sua
atividade real.” (p. 157)

“´[...] o acontecimento épico particular só pode ser descrito de forma poética e viva quando se
concentra num só indivíduo.” (p. 157)

“[...] para que a obra épica tenha uma verdadeira unidade é necessário que a própria ação a
tenha também. Estas duas unidades, a do personagem e a do acontecimento objetivo, devem
combinar-se e confundir-se.” (p. 158)

“Uma consequência resultante da objetividade dos caracteres épicos é que as suas figuras
principais devem oferecer um conjunto de feições que os torne homens completos, homens nos
quais o modo de pensar, de sentir e de agir seja comum ao do povo, mas atinja o máximo grau
de desenvolvimento.” (p. 159)

“[...] o destino do herói épico, [...], cria-se fora dele, e este poder das circunstâncias que
imprimem à ação a sua forma individual, que determinam o resultado da sua atividade, e
decidem assim da sua sorte, não é senão o poder do fatum. O que acontece devia acontecer,
em virtude de uma necessidade inelutável.” (p. 164)

“O destino determina o que deve suceder e sucede: êxitos ou frustrações, vida ou morte.”
(p. 164)

“[...] é ainda a poesia grega que ocupa uma bela situação intermediária, visto que em virtude da
sua visão de mundo, deixa intactas a força e a liberdade, assim como a independência
individual tanto dos deuses como dos homens e dos heróis.” (p. 167)
“Ao tratar das condições particulares a que a poesia épica propriamente dita deve satisfazer,
fizemos ressaltar, por um lado, a importância do estado geral do mundo, como cenário e, por
outro lado, a do acontecimento individual que se desenrola sobre esse terreno, assim como o
papel dos indivíduos agindo sob a direção dos deuses e sob o impulso do destino.” (p. 172)

“Na poesia épica, [...], há lugar, não só para a realidade nacional com que a ação se relaciona,
mas também para as circunstâncias e os fatos exteriores e morais, de modo que se pode dizer
que compreende a totalidade do que se constitui a vida poética dos homens. A ela se vincula
ainda a natureza exterior, não só como lugar particular em que a ação decorre, mas também
como visão geral de toda a natureza.” (p. 173)

“Numa obra épica, os sentimentos e reflexões devem ser descritos como acontecimentos e
fatos exteriores, quer dizer sob a forma de uma narração calma, impessoal, desenrolando-se
naturalmente, numa ordem perfeita, sem exagero algum, nem imagens hiperbólicas.” (p. 174)

“[...] o que dá caráter épico a um acontecimento, é o fato de os dois elementos de que este se
compõe, o estado geral do mundo e a ação particular, quando estreitamente unidos, não
deixam de manter cada qual, na sua interação, independência, valor e existência próprios.” (p.
176)

“No épico, o caráter e a necessidade exterior estão em pé de igualdade, de maneira que a


personagem épica pode, sem prejuízo para a sua individualidade épica, seguir a marcha das
circunstâncias exteriores e dar à sua ação a aparência de uma resultante destas circunstâncias,
as quais aparecem assim, por seu turno, como a potência dirigente, em contraste com o que se
passa na poesia dramática, onde a causa preponderante é o caráter.” (p. 178)

“[...] o indivíduo épico ignora a ação pura, ditada unicamente pelo caráter subjetivo e de
sentimentos acidentais, mas atém-se, por um lado, às circunstâncias em toda a sua realidade,
e por outro lado, o meio no qual evolui deve ser o de valores gerais, morais, etc.” (p. 179)

“A poesia épica, pelo próprio fato de descrever um mundo completo, encerrado na sua
totalidade e, por consequência, independente, é uma obra de arte livre e que difere da
realidade, em parte dispersa, em parte fixa a uma inextrincável confusão de dependências,
causas, efeitos e consequências.” (p. 184)

Você também pode gostar