Você está na página 1de 24

Embriologia e

Reprodução Humana
Reprodução Humana e Tecnologias

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Carolina Garrido Zinn

Revisão Textual:
Prof.ª Esp. Adrielly Camila de Oliveira Rodrigues Vital

Revisão Técnica:
Prof.ª Dr.ª Gabriela Cavagnolli
Reprodução Humana e Tecnologias

• Estudo do Parto e Suas Consequências ;


• Defeitos Congênitos Humanos;
• Epigenética no Desenvolvimento Embrionário;
• Reprodução Humana.


OBJETIVO

DE APRENDIZADO
• Assimilar os conhecimentos adquiridos nas unidades precedentes e relacionar com as
técnicas de reprodução assistida, bem como com as formas de diagnóstico de patologias.
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

Estudo do Parto e Suas Consequências 


A partir da 37ª semana completa de gestação, o bebê já é considerado maduro
em relação ao seu estágio de desenvolvimento. O período entre a 37ª semana e a
42ª semana incompleta compreende o estágio final da gestação que culmina, em
condições normais, com o parto (SADLER, 2019).

O parto é o processo de saída do bebê para o ambiente externo. Este processo


pode ocorrer de dois modos: por via genital, conhecido como parto normal, ou via
procedimento cirúrgico, chamado de cesariana (SADLER, 2019).

Parto Via Genital


O parto via genital é um processo complexo que envolve uma sequência de movi-
mentos fetais que conduzirão a passagem do feto pelo canal de parto.

Dias antes do princípio da fase ativa do trabalho de parto, a gestante passa por
algumas mudanças. Inicialmente, o colo do útero passa a apresentar características
de maturidade, ao tornar-se mais maleável. Além disso, a região pélvica passa a
apresentar ligamentos mais frouxos, características que facilitarão a passagem do
feto (REZENDE; MONTENEGRO, 2014).

O início do trabalho de parto ativo ocorre com a conclusão do desenvolvimento fetal.


Neste contexto, o feto se reposiciona com a cabeça para baixo no útero. Esta nova
posição força a cabeça do feto contra o colo uterino que, conforme visto anteriormente,
agora apresenta maior maleabilidade, estirando-se (REZENDE; MONTENEGRO, 2014).

O estiramento do colo do útero desencadeia dois eventos relevantes durante o tra-


balho de parto: o início das contrações uterinas e a liberação de ocitocina, hormônio
oriundo da neuro-hipófise. A secreção de ocitocina ativa novas contrações por vias
diretas e indiretas. Isso porque, diretamente, ela estimula novas contrações uterinas
e, indiretamente, pelo estímulo à produção de prostaglandinas nas paredes do útero
(SILVERTHORN, 2017).

Assim, as prostaglandinas incrementam as contrações desencadeadas pela oci-


tocina. Por fim, as contrações uterinas geram estímulo para que o colo uterino se
estire. Todas estas vias, que resultam em reforço contínuo das contrações até que o
nascimento do bebê ocorra, recebem o nome de alça de retroalimentação positiva
(SILVERTHORN, 2017).

Alças de retroalimentação são mecanismos de controle e regulação que permitem


modular respostas a estímulos com o intuito de manter nosso organismo em equilíbrio.
As alças de retroalimentação podem ser compostas por respostas que reforçam ou inibem
estímulos. Quando uma alça de retroalimentação inibe um estímulo, estamos nos referindo
à alça de retroalimentação negativa, voltadas para o estabelecimento da homeostase.
Quando uma alça de retroalimentação reforça um estímulo, estamos nos referindo a uma
alça de retroalimentação positiva (SILVERTHORN, 2017).

8
As contrações que ocorrem espontaneamente ao longo do trabalho de parto são
essenciais para auxiliar na expulsão do feto. Elas ocorrem na camada muscular ute-
rina, que recebe o nome de miométrio. Trata-se de uma camada muscular que, ao
final da gestação, é do tipo lisa unitária.

Você Sabia?
Que a musculatura uterina passa de multiunitário a unitário quando se aproxima o mo-
mento do parto?

O músculo liso multiunitário é encontrado na íris e no músculo ciliar do


olho, em parte do trato reprodutor masculino e no útero (exceto no perío-
do logo antes do parto). De modo surpreendente, o músculo liso multiuni-
tário presente no útero se transforma em músculo liso unitário durante os
estágios finais da gestação. Os genes que codificam as proteínas conexi-
nas das junções comunicantes são ativados provavelmente pela influência
dos hormônios da gestação. A adição de junções comunicantes às células
musculares do útero permite a sincronização dos sinais elétricos, fazendo
a musculatura uterina contrair de modo mais eficaz durante o trabalho de
parto. (SILVERTHORN, 2017, p. 404)

Este tipo de musculatura manifesta contrações que, para fins didáticos, podemos
dividir em 3 elementos:
• Propagação: A contração é desencadeada nos marca-passos presentes nas tu-
bas uterinas. Com este estímulo, a contração ocorre em direção à porção infe-
rior do útero;
• Duração: O tempo de duração da contração reduz à medida que a contração
avança em direção à porção inferior do útero. Durante as contrações, o tempo
de permanência da contração é maior na porção superior uterino, local mais
próximo dos marca-passos;
• Intensidade: A intensidade da contração varia de acordo com a porção do
útero. O segmento superior uterino apresenta maior intensidade de contração
em relação ao segmento inferior (POSNER; DY; BLACK; JONES, 2013).

De acordo com Posner et al. (2013), para que o trabalho de parto normal ocorra,
é necessário que os três elementos supracitados, conhecidos como Tríplice Gradiente
Descendente, se desenvolvam de modo que o segmento uterino superior apresente
maior duração, atividade e intensidade de contrações em relação à porção inferior.
O útero intercala períodos de contração e relaxamento de modo coordenado e inter-
mitente. É considerado trabalho de parto ativo quando a gestante apresenta entre
2 e 3 contrações com duração de 30 a 40 segundos em um intervalo de 10 minutos.
O trabalho de parto intercala períodos de dilatação do colo do útero (que tem por
função permitir a passagem do bebê pelo canal de parto) e contração (que tem por
função expulsar o bebê para o ambiente externo), ambos involuntários, que recebem
reforço via contrações voluntárias da mãe.

9
9
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

Em situações normais, este ciclo perdura até a completa expulsão do bebê e seu
nascimento. As contrações, contudo, não cessam imediatamente após o nascimento
do bebê. Este período é classificado como repouso fisiológico, momento em que as
contrações ainda ocorrem com ritmo e intensidade, porém sem gerar dor para a
mãe. Após algumas destas contrações ocorre o descolamento da placenta (Figura 1),
que é expelida pelo canal de parto (POSNER et al., 2013).

Figura 1 – Placenta expelida logo após o parto


Fonte: Getty Imagens

Parto Por Via Cirúrgica – Cesariana


Quando existe alguma condição que limita o parto por via vaginal, a alternativa é
realizar um procedimento cirúrgico para retirada do bebê. Este procedimento recebe
o nome de cesariana. Nesta cirurgia uma incisão é realizada na parede abdominal
e no útero. A partir desta abertura é possível retirar o feto (POSNER et al., 2013).

A opção da equipe médica pela cesariana, de modo geral, ocorre quando são
identificadas condições maternas ou fetais que inviabilizam o parto vaginal. A seguir,
você vai conhecer algumas indicações clínicas para realização da cesariana:
• Desproporção entre feto e pelve: Quando o feto cresce além do esperado,
tornando-se desproporcional em relação à pelve, a passagem pelo canal de par-
to e expulsão pode ser considerada inviável;
• Posicionamento do feto: Existem situações em que o feto fica posicionado de
modo que inviabiliza seu nascimento por via vaginal. Nestes casos, a opção é a
realização da cesariana;
• Neoplasias: Câncer no colo uterino e miomas geram bloqueio pélvico, inviabi-
lizando o parto normal;
• Histórico de cirurgia uterina: Gestantes com histórico prévio de miomectomia
extensa (remoção de mioma) e cesariana, por exemplo, estão associados à pos-
sibilidade de ruptura uterina;
• Toxemia da gravidez: Condições como nefrite crônica, hipertensão essen-
cial, pré-eclâmpsia e eclâmpsia requerem realização do parto com brevidade.

10
Quando isso acontece sem que o colo uterino esteja maduro, a cesariana é a
opção de escolha;
• Frequência cardíaca fetal anormal: Fetos que apresentam bradicardia (frequ-
ência cardíaca baixa) ou irregularidade na frequência cardíaca estão associados
a quadros de hipóxia fetal, que corresponde à baixa disponibilidade de oxigênio
para os tecidos (OLIVEIRA et al., 2017).

Mas, afinal, o que é pré-eclâmpsia? Vamos aprender a respeito desta importante síndrome!

Pré-eclâmpsia é uma síndrome hipertensiva que caracteriza um dos tipos de


complicações gestacionais de maior frequência no país. Gestantes que manifestam
pré-eclâmpsia apresentam redução da perfusão (aporte de oxigênio e nutrientes) na
placenta. De acordo com Kahhale et al. (2018):
Episódios de hipóxia placentária resultam em estresse oxidativo e libe-
ração de produtos trofoblásticos e excesso de fatores antiangiogênicos,
como a endoglobina solúvel e a forma solúvel do receptor Flt-1 (sFlt-1),
conhecido como ‘fms-like tirosine kinase-1’, e que são identificados pre-
cocemente na gestação. Como consequência de invasão trofoblástica ina-
dequada, o trofoblasto pobremente perfundido elabora substâncias tóxi-
cas que danificam o endotélio levando à síndrome clínica pré-eclâmpsia.

As consequências da pré-eclâmpsia dependem da severidade da síndrome, que


podem variar de leve a grave. Casos de maior gravidade podem resultar em coagu-
lação intravascular disseminada, insuficiência renal aguda, edema agudo de pulmão
e hemorragia cerebral.

O biomédico desempenha papel ativo no auxílio ao diagnóstico da pré-eclâmpsia.


Isso porque existem análises laboratoriais que, quando alteradas, são indicadores
cruciais na identificação desta condição clínica, como:
• Proteinúria de 24 horas: consiste na dosagem de proteínas presentes no volume
total de urina produzido ao longo de 24 horas. Gestantes que apresentam resultados
iguais ou superiores a 300 mg em 24 horas, quando associados à hipertensão,
têm forte suspeita de pré-eclâmpsia. A identificação de valores aumentados de
proteinúria de 24 horas indicam presença lesão endotelial sistêmica resultante da
ação do fator antiangiogênico tirosina-quinase 1 solúvel (sFlt-1, do inglês soluble
fms-like tyrosine kinase-1) (DE OLIVEIRA; KARUMANCHI; SASS, 2010);
• Relação proteína/creatinina urinária: consiste na dosagem de proteína e cre-
atinina em amostra isolada de urina. A partir destes resultados é calculada a
relação entre a concentração destes analitos. Sua utilização é justificada pela
praticidade, quando comparada à dosagem de proteinúria de 24 horas; uma vez
que esta análise requer apenas uma amostra de urina, e não o volume total pro-
duzido em 24 horas. Gestantes que apresentam resultados iguais ou superiores
a 0,3 mg/dL, quando associados à hipertensão, têm indicativo de pré-eclâmpsia
(PAPANNA et al., 2008).

11
11
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

Teste seu conhecimento


• Quais eventos são desencadeados pelo estiramento do colo do útero? Qual é a função
da ocitocina?
• Quais são os elementos envolvidos na contração da musculatura uterina?
• Em que momento é considerado o trabalho de parto ativo?
• O que é o período classificado como repouso fisiológico?
• Quais são as indicações clínicas para realização da cesariana?
• O que é pré-eclâmpsia? Quais exames laboratoriais são indicativos desta
condição clínica?

Defeitos Congênitos Humanos 


Conforme estudado nos capítulos anteriores, existem diversas etapas que, ao
longo de nove meses, compõem o desenvolvimento fetal. Contudo, existem fato-
res externos (ambientais) ou internos (genéticos), que podem interferir nas etapas
de formação fetal resultando em anomalias. Distúrbios que têm origem neste
período recebem o nome de defeitos congênitos. De acordo com Mendes et al.
(2018), este grupo de distúrbios está presente em, aproximadamente, 5% dos nas-
cidos vivos e apresenta influência crescente nas taxas de mortalidade e morbidade
da população.

Defeitos congênitos são compostos por distúrbios heterogêneos, que se dividem


em 4 grupos abaixo:
• Malformações: defeitos congênitos que resultam em anormalidade na morfolo-
gia de órgãos ou alterações anatômicas. Malformações são consequência de es-
truturas com formação incompleta, distúrbios na separação ou não formação de
estruturas anatômicas. Trata-se de um defeito que ocorre durante o período da
organogênese, que pode ter vários fatores relacionados ao seu estabelecimento;
• Deformações: alteração no aspecto normal de estruturas já formadas do feto.
Afeta principalmente articulações, cartilagens e ossos, em resposta à influência
de forças mecânicas intrínsecas, como a presença de edema fetal, ou extrínse-
cas, como uma pelve desproporcional ao tamanho do feto. Quando ocorre a
retirada da força mecânica que provoca a deformidade, é possível que as estru-
turas anatômicas retornem a sua configuração usual;
• Rupturas: defeitos que comprometem a integridade morfológica de um órgão
total, ou parcialmente, ou de uma região do corpo. Como resultado, pode ocor-
rer a perda ou alteração de estruturas inicialmente normais e já formadas. Um
exemplo muito conhecido de ruptura é a focomelia resultante do uso de um
medicamento chamado Talidomida (CABRAL-OLIVEIRA et al., 2007);
• Displasias: anormalidade tecidual que resulta da desorganização das células que
compõem os tecidos (CABRAL-OLIVEIRA et al., 2007).

12
Você conhece a história da talidomida e sua relação com a embriologia?
Vamos conhecer agora!

Durante a década de 60, na Alemanha, foi constatado um aumento significativo


na incidência de uma malformação congênita chamada focomelia, nome dado à sín-
drome que gera membros semelhantes aos de uma foca, encurtados (link a seguir).
Além da focomelia, também foram identificados casos de amelia, síndrome que re-
sulta na não formação de membros, ou ainda, na malformação ou não formação de
dedos dos pés e das mãos. Estas síndromes ocorriam em resultado à manifestação de
defeitos na formação de ossos longos. Por isso, o estabelecimento de encurtamento
ou ausência de membros (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013). Em um estudo desen-
volvido por Lenz Pfeiffer e Kosenow (1962), verificou-se a relação entre as anomalias
e a utilização de um medicamento para enjoos matinais em gestantes, a talidomida.

Ocorre que, apesar do baixo potencial de toxicidade (potencial tóxico de uma


substância) apresentado pelo fármaco, ele tinha um grande potencial teratogênico, ou
seja, tratava-se de uma substância com potencial de geração de prejuízos ao embrião
e ao feto. Estudos recentes de Donavon et al. (2018) demonstraram que os efeitos
da talidomida estão relacionados a sua capacidade de degradar proteínas celulares
responsáveis pela ativação e desativação de genes, em especial o fator Sal-like protein
4 (SALL4). Com esta ação, a talidomida remove a SALL4 das células, prejudicando o
desenvolvimento fetal representado, por exemplo, pelo estabelecimento da focamelia
e amelia.

Paciente com focomelia resultante do uso de Talidomida durante a gestação,


disponível em: https://bit.ly/3h0lDwr

Possíveis Causas das Aberrações Gênicas e Cromossômicas


O estabelecimento de defeitos congênitos não é unicausal. Para fins didáticos,
as causas desses defeitos são agrupadas em duas classificações, relacionadas a
sua origem:
• Ambientais: defeitos originados por características do ambiente em que estamos
inseridos. Este grupo de causas pode estar relacionado à composição do meio,
como a água, ar e terra. O ambiente também pode gerar fatores ocupacionais,
como o ambiente em que trabalhamos e as indústrias inseridas no meio em que
vivemos. As causas ambientais podem estar atreladas também a elementos cul-
turais e sociais, representadas pelos hábitos e estilo de vida que incorporamos;
• Genéticas: compreende defeitos causados por anomalias gênicas ou cromos-
sômicas. Defeitos congênitos relacionados a anomalias gênicas são, majorita-
riamente, deletérios. A acondroplasia ou nanismo é um exemplo de aberração

13
13
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

congênita de origem genética. Quando existem anomalias nos cromossômi-


cos que resultam em aberrações congênitas, temos defeitos causados por ano-
malias cromossômicas, como a Síndrome de Klinefelter (CABRAL-OLIVEIRA
et al., 2007).

Neste contexto, interações entre o genoma (conjunto genético do ser em desenvol-


vimento) e o ambiente são relevantes no processo de desenvolvimento embrionário.
Ecogenética é o termo que caracteriza a influência do ambiente no estabelecimento de
doenças (CABRAL-OLIVEIRA et al., 2007).

É importante ressaltar que, apesar da existência das classificações previamente


descritas, mais da metade dos defeitos congênitos ainda não apresenta origem defi-
nida (COSME et al., 2017).  

Agora que você compreende as possíveis origens dos defeitos congênitos e entende que
o ambiente pode influenciar de maneira significativa no desenvolvimento embrionário, é
importante observar e identificar quais possíveis fatores ambientais podem implicar em
aberrações congênitas.

Alguns medicamentos são fatores químicos relacionados ao ambiente que po-


dem favorecer o aparecimento de defeitos congênitos. Anticonvulsivantes como a
fenitoína, sedativos como a talidomida e antibióticos como a tetraciclina e a estrep-
tomicina apresentam alto potencial teratogênico. Isso porque atuam interferindo na
malformação de membros (talidomida), promovendo retardamento mental (fenitoína)
e o estabelecimento da surdez da orelha interna (estreptomicina). Além dos fatores
químicos, o ambiente oferece riscos relacionados a fatores físicos, como as radia-
ções ionizantes. Em especial, embriões expostos a este tipo de radiação no período
entre a 3ª e 15ª semana de desenvolvimento podem apresentar anormalidades
no sistema nervoso central, resultando em casos de microcefalia e hidrocefalia
(LIMA et al., 2013). Agentes infecciosos são fatores ambientais que interferem sig-
nificativamente no desenvolvimento embrionário. O vírus da rubéola, por exemplo,
relaciona-se à presença de surdez, defeitos cardiovasculares e catarata, compondo
a síndrome da rubéola congênita. Gestantes infectadas por citomegalovírus, por
sua vez, podem ter filhos que manifestarão distúrbios neurológicos e comportamen-
tais identificados ao longo da infância (SADLER, 2019). O contexto social em que a
gestante está inserida é um fator ambiental que pode afetar o desenvolvimento fetal.
Isso porque gestantes em situação de vulnerabilidade social dispõem de menos recur-
sos financeiros, o que limita o acesso ao aporte nutricional necessário neste período.
Como consequência, o desenvolvimento fetal fica prejudicado e os recém-nascidos
podem apresentar, além de baixo peso, prejuízo no desenvolvimento cognitivo e
físico (SADLER, 2019).

14
Teste seu conhecimento
• Quais são os tipos de defeitos congênitos? Explique brevemente o que caracteriza
cada grupo.
• Qual é o efeito da talidomida no desenvolvimento embrionário?
• Que doenças são causadas por anomalias gênicas ou cromossômicas?
• Quais fatores ambientais podem implicar em aberrações congênitas?
• O que os agentes infecciosos como o vírus da rubéola e o citomegalovírus podem cau-
sar no desenvolvimento embrionário?

Epigenética no Desenvolvimento Embrionário


Conforme apresentado ao longo desta unidade, anormalidades em que a sequ-
ência de DNA é alterada constituem um fenômeno que pode impactar o desenvol-
vimento embrionário. Contudo, existem alterações que direcionam a formação de
órgãos e tecidos sem que exista alteração na sequência gênica. O campo de estudos
que observa e analisa as mudanças hereditárias na expressão de genes sem mudança
na sequência de DNA recebe o nome de epigenética (BASTOS et al., 2016).

Nosso código genético é o mesmo em todas as células, independentemente do


tipo. Isso significa que o mesmo código genético envolvido na formação de tecido
muscular também codifica nossos neurônios. Neste contexto, elementos epigenéticos
atuam de modo regulatório, permitindo que apenas as funções relacionadas àquela
célula sejam ativadas e bloqueando funções relacionadas a outros tecidos (BASTOS
et al., 2016). Estas dinâmicas regulatórias dependem da expressão de marcas epi-
genéticas, compostas por mecanismos moleculares, como:
• Metilação do DNA: consiste na ligação de um grupo metil a um determinado
locus gênico silenciando a expressão deste gene e, por conseguinte, o que é
produzido a partir deste locus;
• Acetilação: atua adicionando um grupo acetil na cauda da histona (proteína
nuclear em torno do qual o DNA fica enrolado). Como efeito, o DNA fica menos
enrolado às histonas acetiladas, tornando possível o acesso a fatores de trans-
crição das informações presentes nos genes-alvo. Com isso, a acetilação está
relacionada à ativação de locus gênicos;
• Desacetilação: é a retirada do grupo acetil da cauda da histona. Com isso, a fita
de DNA volta a se enrolar na histona, o que a torna indisponível para expressão
de seus genes (NUSSBAUM et al., 2008).

15
15
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

O desenvolvimento embrionário é permeado por fenômenos epigenéticos, entre


eles podemos destacar o imprint genômico, que corresponde a marcações epige-
néticas que ocorrem nos genes maternos ou nos genes paternos. Assim, os genes
marcados de uma das partes são inativados permitindo a expressão monoalélica, ou
seja, a expressão apenas no alelo que não recebeu o imprint. De acordo com Costa
e Pacheco (2013, p. 129);
Os mecanismos do impriting são ainda incompletamente definidos, mas
admite-se que as marcações epigenéticas herdadas dos pais são passadas
em todas as células somáticas do indivíduo, porém, nas células germinativas
em desenvolvimento quando o indivíduo ainda é embrião, essas marcações
precisam, inicialmente, serem apagadas para serem restabelecidas posterior-
mente, refletindo as marcações herdadas de seu sexo-correspondente, ou
seja, as filhas restauram as marcações maternas em suas células germinati-
vas, enquanto os filhos restabelecem as marcações herdadas do pai. Desse
modo, pode-se dizer que o imprinting ocorre de maneira sexo-específica.

Ative as legendas para compreender como a epigenética pode ser influenciada pela alimen-
tação dos seus avós. Disponível em: https://youtu.be/Udlz7CMLuLQ

Teste seu conhecimento


• O que é epigenética?
• Quais são os mecanismos moleculares das marcas epigenéticas?
• O que é o imprint genômico?

Reprodução Humana
Técnicas de Diagnóstico E Reprodução Assistida
De acordo com a Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida, o Brasil foi o
país da América Latina com maior número de bebês gerados por meio de reprodu-
ção assistida nos últimos 25 anos (SBRA, 2019).

Reprodução assistida é o termo que abrange o somatório de técnicas que possibi-


litam a gestação em casais com dificuldades de engravidar. A partir da identificação
das causas associadas à infertilidade, a equipe médica define quais técnicas serão a
melhor escolha para o casal. Este conjunto de técnicas podem ser agrupados em
dois tipos, conforme seu grau de complexidade, que são:
• Coito programado: Técnica em que a mulher passa por tratamento hormonal
com o objetivo de estimular o desenvolvimento folicular até que o folículo atin-
ja tamanho ideal (que é identificado via acompanhamento ultrassonográfico).
A partir desta etapa, a mulher passa a receber injeção de outro hormônio que

16
estimulará a ovulação. As relações sexuais deverão acontecer 36 horas após a
injeção, momento que a ovulação estará ocorrendo (ORIGEN, 2017);
• Inseminação artificial: Técnica em que a fecundação ocorre dentro do corpo
da mulher. A inseminação artificial consiste em injetar os espermatozoides com
maior mobilidade, selecionados em ambiente laboratorial, no útero da mulher
para que ocorra a fecundação. A inseminação artificial subdivide-se em homólo-
ga (gametas oriundos do casal que busca o tratamento) ou heteróloga (gametas
oriundos de doadores anônimos) (ORIGEN, 2017). Esta técnica é utilizada quan-
do o espermatozoide não consegue alcançar o ovócito de forma natural;
• Fertilização in vitro: Técnica mais complexa, em que a fecundação é realizada
em laboratório. A fertilização in vitro é realizada após a coleta de alguns ovóci-
tos e estímulo hormonal para que então ocorra a fertilização destes ovócitos por
espermatozoides (Figura 2) em ambiente laboratorial. Os zigotos formados são
cultivados em laboratório até a fase de blastocisto, quando então são transferi-
dos para o útero da mulher (ORIGEN, 2017). Esta técnica é utilizada quando o
homem possui baixa contagem de espermatozoides.

Figura 2 – Microinjeção de espermatozoide em um ovócito humano


a partir da inserção de uma micropipeta (à direita)
Fonte: Getty Imagens

Estimulação e coleta Desenvolvimento Transferência dos


1 2 Fertilização dos ovócitos 3 4
dos ovócitos. dos embriões embriões para o útero

Figura 3 – Procedimento de fertilização in vitro


Fonte: Getty Imagens

Primeiramente ocorre a estimulação do desenvolvimento folicular e os ovó-


citos serão então coletados. Após a fertilização dos ovócitos pelos esper-
matozoides é feita in vitro. Ocorre o desenvolvimento embrionário até a
etapa de blastocisto, quando os embriões são transferidos para o útero e se
aguarda a implantação.

17
17
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

Nos links a seguir você poderá assistir a todas as etapas da fertilização in vitro:
• Fertilização in vitro: O Passo a Passo, disponível em: https://youtu.be/eQYf9xPp8RU
• Procedimentos de Fertilização in vitro, disponível em: https://youtu.be/mAdMB9cfwSM

Células-tronco, Clonagem e Organismos Transgênicos


No ano de 1997, a ovelha Dolly representou o início de uma Nova Era não apenas
científica, mas também social. Isso porque Dolly foi o primeiro mamífero que não
era resultado da união entre óvulo e espermatozoide. Dolly era um clone. Webber
(1903, apud ZATZ 2004) define clones como uma população de moléculas, células
ou organismos que se originaram de uma única célula e que são idênticas à célula
original e entre elas. Dolly foi a comprovação da viabilidade de clonar um mamífero
partindo de uma célula glandular mamária, ou seja, uma célula somática diferenciada
(ZATS, 2004). A relevância do processo de clonagem de Dolly, de acordo com Zatz
(2004, p. 249):
(...) foi justamente a descoberta de que uma célula somática de mamífero,
já diferenciada, poderia ser reprogramada ao estágio inicial e voltar a ser
totipotente. Isto foi conseguido através da transferência do núcleo de uma
célula somática da glândula mamária da ovelha que originou a Dolly para
um óvulo enucleado. Surpreendentemente, este começou a comportar-se
como um óvulo recém-fecundado por um espermatozóide. Isto prova-
velmente ocorreu porque o óvulo, quando fecundado, tem mecanismos,
para nós ainda desconhecidos, para reprogramar o DNA de modo a
tornar todos os seus genes novamente ativos, o que ocorre no processo
normal de fertilização.

As células totipotentes, referidas na citação de Zatz (2004), compõem um gru-


po de células chamadas de células-tronco. Estas células possuem a capacidade de
diferenciar-se em outros tipos celulares com características específicas dos tecidos
que integram o corpo. As células-tronco podem ter duas origens:
• Embrionárias: Células localizadas no blastocisto que possuem capacidade de
transformação em qualquer um dos 216 tipos de células adultas do organismo;
• Adultas: Localizadas em tecidos não embrionários. Sua capacidade de trans-
formação em outros tipos celulares está relacionada aos tecidos dos quais são
oriundas (REDE NACIONAL DE TERAPIA CELULAR, 2005).

Além da origem, as células-tronco são classificadas de acordo com sua capacidade


de diferenciação (SOUZA et al., 2003) em:
• Totipotentes: capazes de transformar-se em qualquer um dos tecidos do corpo
humano, incluindo tecidos embrionários e placenta, podem dar origem a um
organismo completamente funcional. Possuem origem embrionária;
• Pluripotentes: capazes de transformar-se em qualquer tecido, porém, diferen-
tes das células totipotentes, não é capaz de originar um organismo em sua

18
totalidade. Esta limitação ocorre pois este tipo celular não se diferencia em teci-
dos embrionários e placenta;
• Multipotentes: possuem capacidade de diferenciação limitada aos órgãos de
que se originam, estando associadas à regeneração tecidual do órgão a que
estão vinculadas.

A partir dos conhecimentos aqui apresentados sobre clonagem e células-tronco,


é possível perceber que existe um grande potencial no desenvolvimento de terapias
para diversas doenças. Contudo, para que tratamentos sejam desenvolvidos e dis-
ponibilizados com segurança para a população, ainda existe a necessidade de mais
esclarecimentos sobre diversos mecanismos intrínsecos celulares.

Dentro do contexto de técnicas de reprodução, é comum que o conceito de clone


se confunda com o conceito de organismos transgênicos. Enquanto o clone constitui
um organismo igual aquele que do qual foi extraída uma célula, organismos trans-
gênicos são organismos geneticamente modificados. Essa modificação genética ob-
jetiva a melhoria do organismo ao qual é adicionado um gene em seu DNA. Em
humanos, a transgenia representa uma oportunidade de corrigir condições graves
de origem genética. Apesar deste potencial, ainda existe a necessidade de mais in-
vestigações para o desenvolvimento de protocolos eficazes e seguros, além de todas
as questões éticas envolvidas.

No link a seguir você poderá assistir a um resumo sobre clonagem, “Clonagem - Flashdica
#15 - Maratona ENEM - Prof. Gui”: https://youtu.be/XCRLvWFqRcA

Teste seu conhecimento


• Quais são as técnicas utilizadas para reprodução assistida? Explique cada uma das
técnicas.
• O que é um clone?
• O que são células-tronco? Quais são as origens destas células?
• Quais são as classificações das células-tronco?
• O que são organismos transgênicos?

19
19
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Vídeos
Fertilização in vitro: Reprodução Humana
Nesta animação, a fertilização in vitro será apresentada a você de maneira clara,
iniciando pela avaliação de fatores associados a fertilidade feminina, passando pela
estimulação folicular até a transferência do embrião para mulher.
https://youtu.be/OC-IJ59REew
Anomalias Congênitas ou de Manifestação Tardia
Neste curso, a Professora Lavínia Schuler apresenta uma revisão das portarias e
diretrizes relativas à atenção integral a pessoas com doenças genéticas, seguida da
discussão sobre as anomalias congênitas e de manifestação tardia.
https://youtu.be/xg7xYhemXbU
Corpo Humano: Órgãos e Sistemas – Aula 27 – Fisiologia da gravidez, parto e lactação
Nesta aula, você compreenderá os processos fisiológicos relacionados a gravidez,
o parto e a lactação.
https://youtu.be/g0zyJvoWwL0
Biologia – Embriologia: Tipos Particulares de Reprodução
Nesta aula, você conhecerá outros tipos de reprodução, como a neotenia, a
poliembrionia, a partenogênese, a pedogênese e suas particulares.
https://youtu.be/itrPwjHu698

 Leitura
Tecnologias de Reprodução Assistida no Brasil: Opções para Ampliar o Acesso
Neste artigo, você compreenderá o panorama histórico das tecnologias de reprodução
assistida e alternativas que podem expandir o acesso a estas tecnologias, como o
Programa acesso e a doação compartilhada de óvulos.
https://bit.ly/2DSI1to
Clonagem – O que Aprendemos com Dolly?
Neste artigo, a autora discorre sobre os entendimentos obtidos desde o nascimento
de Dolly, primeiro mamífero reproduzido a partir de uma célula somática adulta,
até os prós e contras relacionados a clonagem reprodutiva em humanos.
https://bit.ly/2XWoOxN

20
Referências
BASTOS, L. C. N.; CARVALHO, D. P.; SANTOS, T. R. Epigenética e seu papel no
desenvolvimento embrionário. Multiverso v.1,2016, n.2 p. 171-180

BRASIL. Ministério da Saúde. Talidomida: orientação para o uso controlado. 2013.


Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/talidomida_orientacao_
para_uso_controlado.pdf>. Acesso em: 15 de março de 2020.

CABRAL-OLIVEIRA, F. C. et al. Embriologia humana e biologia do desenvolvi-


mento. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.

COSME, H. W.; LIMA L. S.; BARBOSA, L. G. Prevalência de anomalias congênitas


e fatores associados em recém-nascidos do município de São Paulo no período de
2010 a 2014. Rev. Paul. Pediatr. v. 35, n. 1, p. 33-38, 2017.

COSTA, E. B. O.; PACHECO, C. Epigenética: regulação da expressão gênica em nível


transcricional e suas implicações. Semina: Ciências Biológicas e da Saúde, v. 34, n. 2,
p. 125-136, 2013.

DE OLIVEIRA, L. G.; KARUMANCHI, A.; SASS, N. Preeclampsia: oxidative stress,


inflammation and endothelial dysfunction. Rev. Bras. Ginecol.Obstet.2010;32(12):
609-16, 2010.

DONAVON, K. A. et al. Thalidomide promotes degradation of SALL4, a transcription


factor implicated in Duane Radial Ray syndrome. Elife. 2018, 1- 7. E38430.

FORTUNA, F. N. et al. Defeitos congênitos: tópicos relevantes. Gazeta Médica da


Bahia;76, S32-S39, 2006.

KAHHALE, S.; FRANCISCO, R.; ZUGAIB, M. Pré-eclâmpsia. Revista de Medicina,


97(2), 226-234, 2018.

LENZ, W. et al. Thalidomide and congenital abnormalities. The Lancet 1962;


279, p.45-46.

LIMA, G. G. et al. Risco da radiação ionizante em mulheres férteis submetidas à


ablação por radiofrequência. Arq. Bras. Cardiol. 2013;101(5):418-422.

MENDES, I. C. et al. Anomalias congênitas e suas principais causas evitáveis: uma


revisão. Rev. Med Minas Gerais. 2018; 28: e-1977.

MOORE, K.; PERSAUD, T. V. N. Embriologia clínica. 10. ed. Rio de Janeiro:


Elsevier; Guanabara Koogan, 2016.

NUSSBAUN, R. L.; McINNES, R. R.; WILLARD, H. F. Thompson & Thompson:


genética médica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

PAPANNA R. et al. Protein/creatinine ratio in preeclampsia: a systematic review.


Obstet Gynecol. 2008; 112: 135-44.

21
21
UNIDADE Reprodução Humana e Tecnologias

POSNER, G. D. et al. Trabalho de parto e Parto de Oxorn e Foote. 6. ed. Porto


Alegre: Mc Graw Hill, 2013.

REZENDE, JR.; MONTENEGRO, C. A. B. Obstetrícia fundamental. 13. ed. Rio


de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.

RNTC. O que são células tronco?. Disponível em: <http://www.rntc.org.br/


ceacutelulas-tronco.html>. Acesso em: 19/03/2020.

SADLER, T. W. L. Embriologia médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019.

SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto


Alegre: Artmed, 2017.

SOUZA, V. F. et al. Células-tronco: uma breve revisão. R. Ci. méd. biol., 2003, v. 2,
n. 2, p. 251-256.

ZATZ, M. Clonagem e células-tronco. Estud. av., 2004 v. 18, n. 51, p. 247-256.

Sites Visitados
SBRA. Brasil Lidera Ranking de Reprodução Assistida, aponta levantamento.
2019. Disponível em: <https://sbra.com.br/noticias/brasil-lidera-ranking-da-ameri-
ca-latina-em-reproducao-assistida-aponta-levantamento/>. Acesso em: 17/03/2020.

ORIGEN. Reprodução assistida: conheça as 5 técnicas mais utilizadas. 2017.


Disponível em: <https://origen.com.br/reproducao-assistida-conheca-as-5-tecnicas-
-mais-utilizadas/>. Acesso em: 14/08/2020.

22

Você também pode gostar