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MICHEL LAURICELLA GG
Título original: Morpho. Anatomie artistique. Dados Internacionais de
Publicado originalmente por Groupe Eyrolles, Catalogação na Publicação (CIP)
Paris em 2014 (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
5 apresentação
7 introdução
53 tronco
79 raízes do braço
Este livro foi concebido na Fabrica114, local Também gostaria de lembrar o nome de
que se dedica ao ensino da morfologia e outro professor do Belas Artes de Paris,
se inscreve na tradição da École nationale Paul Richer (1849-1933), cujo livro Nouvelle
supérieure des beaux-arts de Paris, con- anatomie artistique (três volumes publica-
forme transmitida por François Fontaine, dos entre 1906 e 1921) continua sendo uma
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4 Anatomia artística
apresentação
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ou menos detalhadas, de esquemas e de dessa disciplina, sei que ele não pode
écorchés,1 a fim de variar as possibilidades substitui frequentar-se um ateliê com mo-
de representação à nossa disposição. delos vivos e o acompanhamento de um
As letras e os números inscritos nos dese- professor.
nhos remetem às legendas na parte interna No que me diz respeito, a abordagem das
das orelhas do livro. Basta deixá-las abertas formas corporais me levou a uma releitu-
para uma consulta rápida durante a leitura. ra de todas as formas naturais e continua
Espero que você se familiarize com as estimulando minha curiosidade e meu
formas do corpo humano para libertar deslumbramento.
sua concentração e torná-la disponível 1
Écorché (esfolado) é o termo francês usado em anatomia artís-
a interpretações mais livres e pessoais. tica para designar o desenho (ou pintura, ou escultura) mor-
fológico das partes anatômicas localizadas sob a pele [N.T.].
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introdução
“Esses esqueletos ou écorchés espantam porque se comportam como os vivos.”
Roger Caillois, Au cœur du fantastique, Gallimard, Paris, 1965.
André Vésale (1514-1564) e Jan Steven Van Bernhard Siegfried Albinus (1697-1770) e Jan
Calcar (1499-1546), A Epítome, 1543. Wandelaar (1690-1759), Tabulae Sceleti et
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Jacques Fabien Gautier d’Agoty (1716-1785),
Miologia completa em cores e tamanho natural (1746)
(rebatizado de “Anjo anatômico” pelos surrealistas
Esses improváveis personagens despidos anatômico que predomina sob a pele coin-
de suas peles, verdadeiros barqueiros en- cidir com os contornos do desenho. Assim,
tre a vida e a morte, fascinam. Sua forte a espessura da pele não é levada em conta
dimensão fantástica não escapou aos e, dependendo das regiões do corpo e das
surrealistas. características morfológicas do modelo, o
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O desenho do écorché se momento, todas as estruturas ósseas,
O écorché pode ser desenhado em várias diferenciar graficamente as partes duras
etapas. Num primeiro momento, sugiro das moles. Depois, una essas estruturas
que se estabeleça a composição do dese- umas às outras, começando pelos ele-
nho, que se organize a silhueta do modelo mentos mais volumosos, como a caixa
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como um todo, por meio de formas sim- torácica (que tem a forma simples de um
ples, sintéticas e geométricas. Controle as ovo), a bacia (como uma grande caixa de
proporções medindo e comparando as di- fósforos) e o crânio. A orientação desses
ferentes partes do corpo entre si. Verifique primeiros elementos é essencial para a ex-
os alinhamentos confrontando e justapon- pressão da dinâmica de uma pose.
do a silhueta do modelo às linhas verticais
do espaço arquitetônico (se um fio de pru-
mo não estiver à disposição) e aos limites
do suporte.
O trabalho sobre o écorché vem a seguir.
É interessante registrar no desenho, nes-
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Leonardo da Vinci,
O homem vitruviano,
c. 1490.
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Cabeça Membro superior
Os olhos ficam na meia altura da cabeça. A distância que separa a parte de cima do
Essa proporção varia com a proporção da ombro (clavícula) do cotovelo equivale à
mandíbula. De frente, a largura de um olho distância do cotovelo às cabeças dos me-
separa os dois globos oculares. tacarpos (punho fechado).
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Membro inferior matizou e enriqueceu esse cânone: em ge-
Da articulação do quadril até o chão, a ral, a envergadura masculina é maior que
meia altura fica no nível da articulação do a altura; a altura feminina, maior que a en-
joelho. Com a perna dobrada, o calcanhar vergadura. A diferença entre a largura dos
fica embaixo das nádegas. ombros, que influencia a medida da enver-
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Aprumos lação do quadril, na frente da articulação
Com o auxílio de um fio de prumo (um do joelho e no peito do pé. A coluna ver-
simples objeto suspenso à ponta de um tebral se articula com o crânio sobre essa
fio pode servir) ou de uma vertical no linha e o sustenta por baixo, curvando-se
ambiente que circunda o modelo (canto para frente. Ela fica atrás da linha de pru-
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entre duas paredes, marco de uma porta mo até chegar às vértebras lombares que,
etc.), você pode verificar o alinhamento na curvatura máxima (posição em pé),
de diferentes pontos do corpo e o equilí- passam na frente da linha antes de chegar
brio entre as diferentes partes. Respeitar ao osso sacro por trás dela.
os alinhamentos permite expressar o peso
do corpo, a estabilidade ou, ao contrário, Uma visão frontal do membro inferior, na
o desequilíbrio, a dinâmica de uma pose. mesma posição, complementa essa des-
De perfil, posição em pé, braços ao longo crição: uma linha vertical desce da articu-
do corpo: uma linha vertical vai do buraco lação do quadril (partindo da cabeça do
auditivo (articulação do maxilar inferior), fêmur). Ela passa pelo meio das articula-
passa na frente do ombro, atrás da articu- ções do joelho e do tornozelo. Observe a
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tir
direção do fêmur: o colo femoral, desvian- cio da arcada zigomática que se desenha
do-o para fora, obriga-o a reencontrar a sob a pele até o osso zigomático. É pos-
linha de prumo descendo obliquamente. sível posicionar as órbitas tomando como
referência o cânone de proporções que
Cabeça e pescoço coloca os olhos na meia altura da cabeça
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xilar inferior. No rosto, os músculos são a ligação entre o crânio e a caixa toráci-
subcutâneos: eles se prendem à pele e ca, desenhando duas linhas que ladeiam
se confundem com ela. Como o écorché, o pomo de adão. A glândula tireoide fica
por definição, é um “desprovido de pele”, embaixo dessa cartilagem e pode arre-
é difícil representá-los. Quase todos esses dondar e suavizar o desenho dessa região,
músculos irradiam da boca. Não penso principalmente nas mulheres.
que seja necessário conhecer seus pontos
de inserção. Apenas a disposição em es-
trela, ao redor dos lábios e sobre eles, será
lembrada aqui.
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Feminino
Masculino
ísquio
treita e se fecha abaixo dela. O espaço que As bacias mais largas em valor absoluto
a separa da bacia é menor do que parece são as masculinas. É no valor relativo, em
(três dedos em média). Em certas posi- relação à massa corporal, que as bacias fe-
ções (flexão, inclinação), a caixa torácica mininas são mais largas. As asas e arcadas
pode ir para dentro da bacia. que se desenvolvem acima e abaixo do
anel oferecem superfícies de inserção para
A bacia cinge a parte de baixo do abdô- os músculos da cintura abdominal e para
men e divide o peso da metade superior os músculos da coxa.
do corpo entre os fêmures, por meio do
anel pélvico. A maior ou menor circunfe-
rência desse anel (em que o osso sacro
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cl
esc
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ume
ulna
rad
a junção clavícula/escápula, ela cria uma pequenos ossos do punho pouco se dis-
forma arredondada sob o músculo. tinguem, com exceção dos dois que ficam
Na região do cotovelo, esse osso termina no “calcanhar” da mão. Encontramos uma
numa articulação dupla: uma esfera en- articulação esférica (rotação) nas cabe-
costada numa polia. A esfera se articula ças dos metacarpos, na parte de cima do
com o rádio (rad) e possibilita os movi- punho fechado. Mas são as polias (flexão/
mentos de rotação da mão. A polia está extensão) que separam as diferentes fa-
reservada à ulna (ulna) e possibilita, por langes entre si. Observe: duas falanges
sua vez, os movimentos de flexão/exten- para o polegar, três para os outros dedos.
são. Esse osso subcutâneo é desenhado,
no écorché, do cotovelo até a saliência ar-
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por uma camada adiposa que se estende da mão e dos dedos, polegares inclusos)
e se confunde com o tríceps (19). e os flexores (26, da mão e dos dedos).
Aos três feixes do tríceps (três feixes para A posição chamada “anatômica” (mão
um único tendão) deve-se opor o músculo aberta, o polegar para fora, numa visão de
braquial (22, que nem sempre represento frente) foi muito privilegiada nas obras de
em meus desenhos, por simplificação), o anatomia, pois permite uma leitura plana
bíceps (21, dois feixes para um tendão co- dos ossos da mão e do antebraço, que se
mum) e o úmero estilorradial (23). O trí- cruzam quando o polegar é trazido para
ceps é extensor do antebraço, os outros dentro. Para compreender a musculatura,
são flexores. porém, é melhor partir de uma posição na-
tural: mão pendendo ao longo do corpo,
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a palma contra a coxa. Nessa posição, os A mobilidade do polegar e a mobilidade
extensores, que se prendem à parte ex- relativa do dedo mínimo necessitam, na
terna do úmero, descem verticalmente na base, da presença de músculos que contri-
mesma linha do dorso da mão. Os flexores, buam para tornar a palma carnuda.
a partir da extremidade interna do úmero,
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sacr
fe
ro
fib
tib
bras de pele (comissura interdigital) e o limitam sob a pele – no alto, o início das
plano chanfrado entre os dedos. As linhas duas asas da bacia e, em baixo, o início da
da mão são dobras de flexão do polegar fenda interglútea.
(as chamadas linhas “da vida e do desti-
no”) e dos dedos (linhas “do coração e da O fêmur (fe), na altura da articulação do
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Para bem compreender o pé, é impor- alto na borda interna (lado do maléolo
tante conhecer sua estrutura óssea. Ele mais alto), gira progressivamente até a
deve ser concebido como um arco natu- borda externa (maléolo baixo).
ral. Verdadeiro amortecedor, seu papel é
suportar choques e o peso do corpo. O Assim, em geral se distingue uma parte
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arco plantar expressa essa dinâmica em- dinâmica (arco interno associado ao mús-
baixo do pé, como se sabe, mas também culo abdutor e ao dedo mais forte) e uma
no dorso (não levaremos em conta o arco parte estática (os três últimos metatarsos
externo). O pé é convexo, portanto, e a não e dedos correspondentes).
ser que se esteja diante de um pé chato,
convém respeitar a forma do tornozelo até Formas musculares
as cabeças dos metatarsos. A asa da bacia oferece uma ampla super-
fície de inserção para o glúteo médio (31),
A essa visão esquemática é preciso jus- às vezes chamado de “deltoide da bacia”.
tapor outra: o esqueleto do pé como um O glúteo máximo (32) o prolonga até o
todo tem uma forma helicoidal. O pé, mais sacro. Existem várias versões anatômicas
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dessa região. Prefiro enfatizar a parte prin- cujo comprimento depende justamente
cipal desse músculo, que se prende direta- da espessura do tecido adiposo.
mente ao primeiro terço do fêmur, entre o
quadríceps (33) e os isquiotibiais (34). O quadríceps, como o nome indica, é
constituído por quatro feixes musculares
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O erro mais comum consiste em confun- que se unem num único tendão, que de-
dir músculos e gordura na região glútea. pois de envolver a rótula se insere na tíbia.
O desenho das nádegas depende da gor- Desses diferentes feixes, manteremos ape-
dura. É difícil avaliar a proporção muscular, nas os três principais. O quarto, profundo,
mas é possível estimá-la baseando-se em não pode ser visto. Enquanto os dois fei-
outras partes do corpo. De todo modo, pa- xes laterais partem do fêmur, que impõe
rece-me mais interessante tentar simplifi- ao músculo sua direção, o feixe central se
car e sintetizar as formas adiposas. Sem a prende à bacia e se une aos outros na tíbia.
gordura, o músculo glúteo máximo toma-
ria o caminho entre o sacro e o fêmur mais
direto, não teríamos a fenda interglútea,
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O tensor da fáscia lata (36) é um músculo funcionar juntos, contendo a coxa antes de
que tem um modo de inserção particu- chegar ao joelho embaixo da articulação,
lar. Aqui também, deve-se optar. Convém como para reforçá-la de lado a lado. A dis-
lembrar que o quadríceps, como todos os posição dos dois lembra as rédeas de um
músculos, é envolvido por uma membrana arreio que tivesse o freio nos joelhos.
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A versão simplificada dos adutores (35) que a camada adiposa diminui da raiz até
consiste em considerar apenas os feixes as extremidades dos membros.
mais potentes e em confundi-los sob a
mesma denominação. Esses músculos O conjunto muscular gastrocnêmios e só-
quase sempre estão cobertos por uma leo (38) forma um tríceps. Seu tendão em
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espessa camada de gordura que começa comum é o famoso tendão de Aquiles, que
no alto das coxas e se torna mais fina ao se integra ao calcanhar (calcâneo), poten-
descer. te alavanca. Na parte frontal da perna, os
extensores (42) lembram os do antebra-
Encontramos um ponto adiposo simétri- ço: os feixes partem do exterior e descem
co do outro lado da coxa, sob a articula- para se inserir no dorso do pé (no outro
ção do quadril, tipicamente feminino. Se caso, da mão).
compararmos os dois membros, inferior e
superior, esse ponto adiposo lembra aque-
le que fica atrás da ponta do deltoide. De
modo geral, é possível dizer, simplificando,
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O pé, concebido como um arco em que pele e o plano chanfrado entre os dedos,
esqueleto seria a armação, precisa ser pelas mesmas razões.
submetido à protensão de uma corda
muscular. O abdutor (44) do dedão de- Similitudes entre braços e pernas
sempenha esse papel. Podemos comparar o esqueleto dos
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punho que poderiam corresponder aos do É a justaposição por pares de ossos, rádio/
tornozelo. Por fim, cinco dedos na mão e ulna e tíbia/fíbula, que permite isso.
no pé, com o mesmo número de falanges
nas extremidades, sendo uma a menos no A disposição mais simples é a que encon-
polegar e no dedão. tramos no membro inferior (tíbia e fíbula
sempre paralelos), como se “a natureza
Vimos que os músculos que acionam a tivesse fabricado”, a partir de uma dis-
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pranchas
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30 Anatomia artística
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&
cabeça
pescoço
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Fig. 3 6
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Características sexuais
O crânio feminino (Fig. 2) tem a testa mais
vertical, as eminências frontais mais salientes,
as aberturas (órbitas e fossas nasais) maiores.
O crânio masculino (Fig. 3) tem a testa mais
inclinada, os arcos superciliares mais marcados,
as mandíbulas e os dentes mais fortes. Mais
resistente, ele é mais espesso em detrimento das
aberturas.
O ângulo da mandíbula é mais marcado, bem
como a inserção do esternoclidomastoideo (6).