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LIBERDADE SINDICAL, GÊNERO E NOVAS TECNOLOGIAS NO TRABALHO 04/10/21 15(18

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Olívia de Quintana Figueiredo Pasqualeto Ago 16 6 min para ler

LIBERDADE SINDICAL, GÊNERO E NOVAS TECNOLOGIAS


NO TRABALHO
A Opinião Consultiva 27/2021 da CIDH

Imagem: Direito Criativo

A Opinião Consultiva (OC) 27/2021 foi emitida em 5 de maio de 2021 pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos como resposta a uma consulta feita em 2019 pela
Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o alcance das obrigações dos
Estados em garantir a liberdade sindical, sua relação com demais direitos e sua
aplicação desde a perspectiva de gênero.

Em resumo, a consulta envolveu três grandes temas – liberdade sindical, gênero e


mudanças no mercado de trabalho em razão do uso de novas tecnologias – e instou a
Corte a responder diversos (e interligados) questionamentos: (a) qual é o alcance das
obrigações dos Estados na garantia da liberdade sindical, criação de sindicatos,
democracia interna, negociação coletiva e greve? (b) que ações os Estados devem

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realizar para verificar a efetivação desses direitos no cumprimento de suas obrigações


progressivas? (c) como se manifesta a relação entre liberdade de associação, negociação
coletiva e liberdade sindical e qual a sua relação com promoção do direito ao trabalho e
condições justas e equitativas? (d) é possível permitir que as proteções estabelecidas
por lei sejam revogadas “in peius” (para pior) por meio de negociação coletiva? (e) quais
especificidades devem ser levadas em consideração no exercício dos direitos sindicais
pelas mulheres? (f) qual é o papel dos Estados na garantia da participação efetiva de
mulheres como sindicalistas e dirigentes em cumprimento do princípio da igualdade e
não discriminação? (g) qual é o alcance das obrigações dos Estados quanto às garantias
para a participação efetiva dos trabalhadores por meio do exercício da liberdade de
associação, negociação coletiva e greve, nos processos de concepção, construção e
avaliação das normas e políticas públicas relacionadas ao trabalho em contextos de
mudanças no mercado de trabalho por meio do uso de novas tecnologias?

Liberdade sindical

O tema da liberdade sindical ocupa grande parte da OC e é abordado em suas


diferentes dimensões: direito de organização, direito de eleição de representantes
(democracia interna), liberdade de associação para formar um sindicato, direito de se
filiar a um sindicato já estabelecido e direito de deixar um sindicato, sem discriminação.
Segundo a Corte, trabalhadores e empregadores podem se associar livremente para a
defesa de seus interesses, incluindo o direito à negociação coletiva e à greve pelos
trabalhadores. O direito à liberdade sindical é um direito humano, reconhecido em
diversos tratados internacionais e, para ser garantido, necessita de ações e abstenções
dos Estados, como a proibição de dissolução dos sindicatos pela via administrativa, a
proibição de exigências quanto à autorização para criação de um sindicato, a garantia
de proteção para dirigentes sindicais exercerem a sua função sem ameaças de violência.
Destaca-se a menção de que o direito à liberdade sindical é um direito habilitador dos
trabalhadores na defesa de seus interesses e negar o seu exercício constitui um risco
para os direitos trabalhistas.

Um dos elementos essenciais da liberdade sindical é a negociação coletiva, pois viabiliza


os meios necessários para que os trabalhadores defendam os seus interesses. Para
além do reconhecimento de sua importância enquanto instrumento de diálogo social, a
Corte também se manifestou sobre a impossibilidade de a negociação coletiva restringir
direitos assegurados pela legislação. Segundo a Corte, permitir a revogação do direito
do trabalho “in peius” pela negociação coletiva colocaria os trabalhadores em maior
desvantagem em relação ao empregador, podendo causar a deterioração das condições
de trabalho e de vida, violando assim a proteção mínima estabelecida pelo direito
nacional e internacional.

Também decorrente da liberdade sindical, a greve é reconhecida pela Corte como um


dos direitos fundamentais dos trabalhadores. Trata-se de um mecanismo de pressão
sobre o empregador, que busca solucionar problemas que são do interesse direto dos
trabalhadores. Por isso, o direito à greve deve ser reconhecido pelos Estados, sem
prejuízo de limitações no tocante às forças armadas e para a manutenção de serviços
essenciais.

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Gênero

Outro grande tema abordado na OC envolve as questões de gênero no ambiente


laboral e também no âmbito sindical. A Corte reafirmou a proibição de discriminação e
a necessidade de garantir a igualdade em sua dimensão formal e material, ressaltando
a proibição de diferenças arbitrárias de tratamento, bem como a obrigação dos Estados
de criar condições de igualdade real em relação aos grupos que historicamente foram
excluídos ou que correm maior risco de serem discriminados, citando expressamente as
pessoas LBGTQIA+, migrantes, negros, pobres e indígenas, embora a OC não tenha
avançado na abordagem interseccional de uma série de discriminações ainda presentes
no mercado de trabalho.

Dentre as questões de gênero, a Corte sinalizou a preocupação com práticas de


discriminação indireta; necessidade de proteção especial durante e após a gravidez;
estereótipos de gênero, especialmente no trabalho doméstico; violência de gênero no
ambiente laboral e sindical; e maior vulnerabilidade das trabalhadoras na economia
informal.

Diante desses desafios, destacou que os Estados devem adotar medidas destinadas a
eliminar as barreiras que impedem as mulheres de participar ativamente nos
sindicatos, bem como em seus cargos de direção e, portanto, ter uma participação ativa
na tomada de decisões. Em paralelo, destacou também o papel dos Estados em
endereçar ações progressivas para combater desigualdades estruturais, como ampliar a
cobertura dos serviços de creche de acordo com as necessidades das mães e pais que
trabalham, oferecer sistemas abrangentes de licença remunerada, dentre outras.

Destaca-se também a sinalização da Corte sobre a necessidade de mudança nas


práticas das organizações sindicais a fim de alcançar a igualdade de gênero no exercício
dos direitos à liberdade de associação, negociação coletiva e greve, visto que embora o
número de mulheres sindicalizadas tenha aumentado nos últimos tempos, nós
seguimos tendo pouca representatividade na direção dos sindicatos.

Novas tecnologias no trabalho

Por fim, a OC salienta que a proteção dos direitos humanos deve levar conta que as
relações de trabalho estão em constante transformação devido a variados fatores, entre
os quais se destaca a utilização das novas tecnologias digitais no trabalho. Nesse
sentido, os Estados devem adaptar continuamente as suas legislações, o que deve ser
feito de acordo com os critérios da universalidade e inalienabilidade dos direitos
humanos, garantindo um trabalho digno a todos.

Acerca das transformações no mundo do trabalho, a Corte menciona que trabalhadores


a tempo parcial e teletrabalhadores devem se beneficiar dos mesmos direitos que os
demais, inclusive no que diz respeito à liberdade sindical, saúde, proteção de dados,
vida privada, etc. Ainda observa que a popularização do trabalho em plataformas
digitais tem gerado desafios significativos para os direitos trabalhistas de seus usuários,

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que normalmente são considerados como independentes, o que, em geral, acaba por
alijar os trabalhadores de direitos como salário mínimo, estabilidade no emprego, bem
como afastando-os do exercício de direitos sindicais.

Para enfrentar esses desafios, a Corte destacou a importância do diálogo social


tripartite entre trabalhadores, empresas e Estado a fim de garantir direitos humanos
nas relações de trabalho.

A consulta e a OC foram elaboradas em momento muito oportuno, considerando o


cenário global e o brasileiro, bem como os impactos da pandemia de Covid-19 no
mundo do trabalho.

Em 2019, quando a consulta foi feita, as discussões sobre gênero e novas tecnologias no
trabalho eram crescentes. Neste mesmo ano, houve o centenário da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), momento simbólico para o direito internacional do
trabalho, em que foram aprovadas a Convenção nº 190 da OIT sobre violência e assédio
no trabalho, bem como a Declaração do Centenário, documento que salientou que o
mundo do trabalho estava em um momento de grandes transformações e reafirmou a
importância de garantia de direitos fundamentais no trabalho para a promoção da
justiça social e de um desenvolvimento sustentável.

No cenário brasileiro, em 2019, observávamos as primeiras consequências da reforma


trabalhista de 2017, que gerou alterações legislativas que afetaram sensivelmente o
direito coletivo do trabalho acerca de pontos abordados na OC, como o
enfraquecimento da atuação sindical e a negociação coletiva “in peius”.

Em 2021, em meio à pandemia, pontos de preocupação mencionados na OC – como a


desigualdade de gênero, aumento da informalidade, popularização do trabalho em
plataformas digitais e garantia de direitos conectados à liberdade sindical – tornaram-se
mais evidentes.

Nesse sentido, a OC adquire um papel importante ao destacar que o mercado de


trabalho ainda é desigual e que, para além das necessárias ações dos Estados para
mitigar as desigualdades, os direitos de liberdade sindical também são instrumentos
essenciais para perseguir tal finalidade, especialmente considerando um mundo do
trabalho em acelerada mudança. Contudo, não se pode deixar de notar que a OC foi
tímida ao mencionar a existência de interseccionalidades que podem intensificar a
discriminação no mercado de trabalho. Durante a pandemia da desigualdade, foi
possível perceber que as pessoas foram afetadas de forma distinta, tendo tido impactos
particularmente mais severos para mulheres, para os jovens, para a população negra e
pobre, o que não foi endereçado na OC.

Embora não tenha mencionado expressamente consequências diretas da pandemia de


Covid-19, a Opinião Consultiva emitida neste momento serve como um lembrete de que
ainda há muito a ser feito para a garantia dos direitos humanos nas relações de
trabalho.

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Olívia de Quintana Figueiredo Pasqualeto


Professora e pesquisadora na FGV Direito SP.
Doutora e Mestra em Direito do Trabalho pela Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo.
Atualmente realiza Pós-Doutorado na USP.

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