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Ana Barbeiro
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All content following this page was uploaded by Ana Barbeiro on 28 January 2019.
Introdução
O estudo da violência institucional e das diferentes formas de vitimização que
dela decorrem não tem sido alvo de grande investimento por parte da vitmologia, com a
excepção das abordagens de género (cf. Khair, 2003; Machado, Dias, & Coelho, 2010;
Rondon, 2003). Por outro lado, as violações dos direitos humanos, quer sejam ou não
consideradas como formas de violência institucional, têm também ocupado um lugar
marginal nesta disciplina, bem como na criminologia. Se estes dois temas, interligados,
podem constituir um novo tipo de abordagem à vitimização, o futuro o dirá. No entanto,
ao longo das últimas décadas, investigadores de diferentes disciplinas das ciências
sociais, como a sociologia ou a psicologia social, têm-se debruçado sobre estes
fenómenos, quer em termos da sua conceptualização quer do seu estudo empírico.
Neste capítulo discutem-se alguns destes trabalhos, sem pretensão de
exaustividade, procurando articulá-los de forma a propor uma base teórica para uma
abordagem vitimológica da violência institucional e da privação dos direitos humanos.
Pretende-se explorar algumas questões, tais como: é possível, de um ponto de vista
teórico, conceptualizar a violência institucional de forma a tornar este conceito
operacionalizável?; poderão as violações dos direitos humanos ser consideradas como
formas de violência?; de que modo estes fenómenos podem tornar-se objectos de estudo
da criminologia e da vitimologia?; e do ponto de vista do senso-comum, serão
percebidos como formas de violência?; como se posicionam os cidadãos face a estas
formas de violência? e do ponto de vista das vítimas, percebem-se elas como tal?; quais
as consequências psicossociais deste tipo de vitimização?
A própria ideia de violência, seja ela institucional ou pessoal, é um conceito
ambíguo. Meyran (2006) destaca algumas das dificuldades em definir e estudar a
violência. Em primeiro lugar, a distinção frequentemente feita nas ciências sociais entre
violência física e violência moral/simbólica tem as suas raízes na oposição tradicional
entre corpo e espírito. Ora se esta oposição se dilui nas ciências contemporâneas, isso
torna difícil traçar uma fronteira entre estes dois tipos de violência. Dizer que um
determinado acto constitiu uma violência exclusivamente centrada no somático e que
outro atinge apenas os aspectos morais de uma vítima é uma distinção enganadora: uma
lesão corporal pode implicar consequências psicológicas; uma humilhação pode
engendrar um sofrimento somático ligado ao sofrimento psíquico. No entanto, parece de
bom senso considerar que um insulto e uma agressão com uma arma de fogo são actos
que, mesmo sendo violentos, pertencem a diferentes categorias de violência (Meyran,
3
2006). Uma segunda questão diz respeito às tensões entre o inato e o cultural nas
diferentes explicações para as origens da violência: se, por exemplo, as abordagens
etológicas e psicanalíticas enfatizam as dimensões instintivas da violência, por outro
lado as abordagens etnológicas e socio-culturais destacam o seu cariz cultural e
aprendido. Geralmente, estas duas perspectivas tendem mais a opôr-se do que a
procurar explicações integradoras (ibidem). Uma terceira clivagem patente nas
concepções da violência relaciona-se com a oscilação entre o determinismo
social/situacional – evidenciado nos estudos clássicos da psicologia social como os de
Milgram (1963) ou Zimbardo (Haney, Banks, & Zimbardo, 1973; Zimbardo, 2007) – e
a responsabilização individual – valorizada nas sociedades contemporâneas, e patente,
por exemplo, na cultura do sistema penal.
A violência tem sem dúvida uma dimensão social: para que ela exista é preciso
nomeá-la, reconhecê-la socialmente como tal (Meyran, 2006). Assim, o que é
considerado ou não como violência depende do contexto histórico e socio-cultural: há
determinadas formas de violência que são alvo de atenção e sanção em certos momentos
históricos (como acontece actualmente com a violência contra as crianças ou contra as
mulheres) e outras tendem a passar despercebidas (como a violência carceral). Deste
modo, a violência tem também uma dimensão performativa: o modo como numa
sociedade é nomeada ou omitida, punida ou tolerada, considerada fora da ordem social
ou integrada na vida quotidiana, determina o seu tipo de existência social, quer em
termos simbólicos quer em termos das práticas sociais. Finalmente, desta dimensão
performativa emerge uma consequência para os investigadores: estudar a violência
implica um posicionamento no campo ético, uma escolha quase inevitável daquilo que
será considerado como violência e das normas que ela viola; esta escolha, por sua vez,
tem implicações na forma de a estudar – na selecção do racional teórico e dos métodos
de pesquisa empírica (Charlot, 1997; Meyran, 2006).
No que respeita especificamente à violência institucional, também uma revisão
da literatura actual permite constatar que este termo tem diversas conotações, as quais
implicam diferentes formas de abordar a sua investigação. Uma, que designamos de
“positivista”, usa o termo “violência institucional” para se referir à violência que
acontece em instituições fechadas ou semi-fechadas (prisões, estabelecimentos de
reeducação para jovens, escolas, empresas). Focaliza-se nas características individuais
dos actores destas instituições como geradores de violência institucional
(essencialmente os destinatários da intervenção institucional - reclusos, jovens
4
para servir interesses que nada têm a ver com os princípios dos direitos fundamentais
(Höijer, 2004; Rentsheler, 2004).
Uma terceira contradição relaciona-se com as relações inter-grupos no seio das
sociedades democráticas, caracterizadas pela dominação, marginalização e exclusão.
Actualmente, a segurança parece ser um direito que se sobrepõe a outros direitos civis,
seja sob um plano estritamente físico seja nas suas dimensões económicas e culturais.
Certos discursos políticos centram-se na necessidade fundamental de segurança sentida
pelos cidadãos para justificar a limitação dos seus direitos, dos direitos de certos grupos
sociais ou mesmo o exercício de certas formas de violência (Landau, et al., 2004). Os
direitos e os deveres não estão distribuídos de forma igualitária na hierarquia social.
Assiste-se nas sociedades contemporâneas a uma reconfiguração das acções sociais e
disciplinares dos Estados, que se manifesta, por exemplo, pelo questionamento e recuo
das responsabilidades colectivas, pelo desenvolvimento de uma cultura de controlo e
exclusão/marginalização de grupos considerados como ameaçadores da ordem social,
pela sobre-responsablização dos indivíduos relativamente à sua eventual situação de
privação de acesso aos direitos (Staerklé, Delay, Gianettoni, & Roux, 2007).
Finalmente, é também importante assinalar que, do mesmo modo que a fundação
dos direitos humanos está historicamente ligada à ideia de nação, a sua protecção
permanece essencialmente sob o domínio dos Estados, apesar dos esforços para a sua
internacionalização (Claude & Weston, 1992; Nash, 2009). Assim, os direitos surgem
directamente ligados à cidadania nacional; a sua fruição é desigual entre cidadãos e não-
cidadãos, deixando em situação particularmente frágil as populações que se deslocam
através dos países, como por exemplo os migrantes (Nash, 2009; Sanchez-Mazas &
Salgado, 2007).
instituição, desde que tenha uma função socializadora (Dubet, 2002). As instituições
económicas, jurídicas, educativas e religiosas fornecem, cada uma delas, soluções para
necessidades específicas. Contudo, elas não estão isoladas umas das outras, mas
constituem conjuntos ligados entre si por uma lógica de resposta global a essas
necessidades (Malinowski, 1944). De um ponto de vista psicossocial, as instituições
constituem pontos de charneira entre os indivíduos e a cultura. Para Kardiner (1939, cit.
in Cuche, 1999) a socialização produz-se através da participação dos indivíduos nas
instituições. Assim, as instituições e as normas que as organizam teriam uma função de
securização e integração social dos membros de uma sociedade (Maisonneuve, 1973).
Esta visão das instituições repousa no postulado durkheimiano do consenso e coesão
social. Para Durkheim, os vínculos entre os indivíduos no seio das sociedades
complexas caracterizam-se por uma “solidariedade orgânica”. Este tipo de organização
social assenta na diferenciação de funções, na divisão do trabalho e na
complementaridade das hierarquias sociais (Durkheim, 1893/1989). No entanto, esta
complementaridade é vista como um ideal a atingir, e quando isso não acontece as
sociedades caracterizam-se por relações anómicas entre os indivíduos e os diferentes
grupos sociais (ibidem).
É possível referir outras definições mais restritivas de instituição, quer no âmbito
do senso-comum quer no âmbito das ciências sociais As instituições podem ser
entendidas num sentido político, como um conjunto de aparelhos e de procedimentos
negociais que visam a produção de decisões e normas legitímas; a institucionalização
de determinadas normas e práticas decorre, assim, do seu reconhecimento legal (Dubet,
2002). Noutros casos, a designação de institutição é utilizada como sinónimo de
organização, como em alguns escritos de Max Weber. Para Dubet (2002), se uma
grande parte das instituições têm a sua concretização em organizações, estas nem
sempre podem ser consideradas como tal, dado que não se caracterizam forçosamente
por uma função socializadora específica. No presente trabalho, por uma questão de
operacionalização, adopta-se uma definição de instituição em que função socializadora
e concretização organizacional se complementam.
Nas sociedades modernas as instituições regulam o quotidiano da vida colectiva,
que se vem tornando cada vez mais complexa; elas são simultaneamente fonte e limite
dos direitos dos indivíduos (Doise, 2002). Têm uma função de protecção e de
securização dos indivíduos na vida em grupo; mas ao mesmo tempo constituem-se em
9
violência foi definida como a negação dessas necessidades. Tendo em conta as duas
dicotomias violência somática/psicológica e pessoal/estrutural, é possível considerar
quatro classes de violência: morte/ mortalidade, miséria/ morbilidade, alienação e
repressão (Galtung, 1995; 1990). As quatro necessidades básicas são postuladas como
uma totalidade não hierarquizável e universal, apesar das diferentes formas de as definir
e concretizar através das sociedades. As quatro classes de violência são os exemplos
extremos de privação da satisfação dessas necessidades.
O conceito de violência cultural refere-se, de acordo com o autor, à dimensão
simbólica da existência humana que pode ser utilizada para justificar ou legitimar a
violência (Galtung, 1990). Esta dimensão simbólica pode exprimir-se através de
aspectos da vida social como a religião, a ideologia, a linguagem, a arte e a ciência.
Assim, a violência perpetrada de forma directa e pessoal ou a violência patente nas
formas de injustiça social têm como fundo uma violência inerente à cultura partilhada
nos grupos sociais, de modo a que o seu exercício passa despercebido ou é visto como
“natural” – a cultura legitima determinadas formas de violência. Deste modo, a
violência cultural constitui a base de um triângulo em cujos outros vértices se
encontram a violência estrutural e a violência directa. As relações entre os três vértices
do triângulo de violência caracterizam-se por fluxos causais e multidireccionais
(ibidem). Pode dar-se o seguinte exemplo de um fluxo causal “violência cultural –
estrutural – pessoal”: a cultura ensina-nos a ver a exploração e a repressão de alguns
grupos sociais como natural, ou mesmo a não ver de todo estes fenómenos; a
criminalidade de “colarinho azul” pode ser vista como uma forma de os indivíduos dos
grupos desfavorecidos procurarem uma redistribuição da riqueza; a criminalidade de
“colarinho branco” como uma forma de os indivíduos dos grupos favorecidos tirarem o
melhor proveito possível da estrutura de desigualdades; estas formas de violência
estrutural e directa criam défices de satisfação de necessidades que, extremados, dão
origem a traumas colectivos; estes traumas colectivos podem sedimentar-se na cultura,
dando lugar a formas de violência que nela se enraizam e manifestam através de
representações, preconceitos e ideologias, servindo de base a um novo ciclo de
violência. Para uma crítica do modelo cíclico, sugerimos a consulta de Elcheroth (2006)
e Elcheroth e Spini (2009), nomeadamente no sentido em que o ciclo de violência pode
ser quebrado: por exemplo em situações de generalização da violência através dos
diferentes grupos da hierarquia social (guerra, violações massivas dos direitos humanos)
os indivíduos podem aderir a normas universalistas e de direito humanitário, como
12
(Van Soest & Bryant, 1995, p. 551) ou por políticas sociais opressivas, e vista pelos
cidadãos como uma forma necessária de controlo social. É uma forma complexa de
violência, porque é subtil e indirecta, podendo envolver consequências a longo prazo,
como por exemplo a exclusão de diversas formas de participação social. No nível
estrutural-cultural encontram-se as raízes normativas e ideológicas da violência que
estruturam e sustentam os níveis individual e institucional. A estrutura da realidade
social, os valores convencionais e as relações sociais quotidianas formam um modo de
pensar colectivo que se torna parte das “psiques” individuais e societais. É uma forma
de violência difícil de apreender, porque se manifesta numa aceitação passiva de uma
determinada ordem das coisas. Em última análise, acaba por se revelar no facto de se
tornar aceitável, ou mesmo legítima, a ameaça e o uso de violência como formas de
exercer o controlo social e de resolver problemas sociais (Van Soest & Bryant, 1995).
Em suma, a violência institucional pode ser considerada, de um ponto de vista
teórico, como um conjunto de práticas de dominação exercidas no quadro de relações
institucionais. Mesmo podendo existir um actor identificável que exerce essa violência,
ela é concretizada “em nome” da instituição, tendo assim tendência a tornar-se
“despersonalizada”. Estas práticas podem ser concretizadas sob forma física ou
psicológica, sobre indivíduos ou grupos, de forma directa ou indirecta. As múltiplas
formas de violência institucional podem ser visíveis (no sentido de serem
compreendidas como violência) ou invisíveis, quer para quem as exerce quer para quem
a elas é sujeito. Por exemplo, as interacções injustas ou violentas que têm lugar em
contextos institucionais podem ser vistas pelos seus perpetradores directos e/ou pelas
suas vítimas como relevando do simples cumprimento das “normas da casa”, sobre as
quais não têm controlo. Deste modo, a violência institucional pode também concretizar-
se em formas de violência directa e pessoal, ainda que no quadro de relações
interpessoais constrangidas pelos contextos institucionais. Por outro lado, a violência
das instituições tem raízes na estrutura social (violência estrutural) e nas representações,
valores e práticas quotidianas dos grupos humanos (violência cultural).
controlo social por parte das instituições, eram relativizados: por exemplo, a expulsão
de estrangeiros sob a acção governamental, a existência da pena de morte na ordem
jurídica e a intromissão do governo ou das empresas na vida privada dos cidadãos nos
casos, respectivamente, de concessão da nacionalidade ou de contratação de trabalho.
Em certas tomadas de decisão sobre a relação entre os direitos e as suas
violações, os indivíduos evocam as instituições como fonte e limite dos direitos (Doise,
2002; Spini & Doise, 2005). Esta ponderação do peso dos diferentes direitos nas
relações entre os indivíduos e as instituições varia de acordo com o valor que os
indivíduos lhes atribuem. Os indivíduos são mais a favor das liberdades individuais ou
do controlo do Estado consoante defendem posições mais restritivas ou mais
universalistas dos direitos (Clémence et al, 1995).
Assim, se os direitos universais constituem representações partilhadas em
grande escala através das sociedades – um dos estudos citados foi realizado em 35
paises (Doise et al, 1999) –, a sua aplicação é, no pensamento dos cidadãos, difícil de
conceber em termos absolutos. O saber comum sobre os direitos humanos e seus limites
não é, neste sentido, diferente do saber dos peritos. Trata-se de um desfasamento entre
os princípios, na sua forma abstracta, e sua aplicabilidade (principles-application gap),
desde há muito evidenciado por Mary Jackman num estudo sobre a tolerância racial
(Jackman, 1978). No que respeita aos direitos humanos, este desfasamento está ligado,
de acordo com Staerklé e Clémence (2004), a um dilema ideológico entre duas normas
de justiça: a norma de sanção de actos condenáveis (aplicação baseada no contexto) e a
norma de protecção dos direitos das pessoas que cometem esses actos (aplicação
baseada nos direitos). Assim, mesmo se as pessoas estão de acordo com os princípios
gerais dos direitos humanos, têm em conta os contextos e os indivíduos aos quais se
aplicam esses direitos. Numa das suas pesquisas, Staerklé e Clémence (2004)
mostraram que, em situações concretas, se os indivíduos cometeram actos susceptíveis
de condenação (tais como tráfico de drogas e homicídio), haverá uma tendência a ser
mais tolerante com a violação dos seus direitos humanos. No entanto, esta tendência
também não é consensual: no seu estudo, os investigadores verificaram que se a maior
parte dos participantes seguia a lógica precedente (aplicação baseada no contexto),
outros condenavam a violação dos direitos dos indivíduos pelas instituições,
independentemente dos actos desses indivíduos (aplicação baseada nos direitos). Os
investigadores verificaram ainda que os respondentes evocavam mais frequentemente o
referencial dos direitos humanos para condenar actos governamentais que constituem
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violações grosseiras e pouco frequentes destes direitos (e.g., tortura), do que violações
mais banais e quotidianas (e.g., intromissão na vida pessoal).
detalhado dos diversos tipos de violência institucional e das formas específicas que
tomam consoante as organizações em que têm lugar. A conceptualização das
instituições como lugares de violência desenvolveu-se a partir dos anos 60 no âmbito de
diversas correntes sociológicas. Estes trabalhos, embora tendo-se focalizado em tipos
específicos de instituições, tiveram como principal contributo o estabelecimento de
conceitos e quadros teóricos que permitiram alargar estudo da violência para as suas
formas institucionais (Ignatieff, 1983). De seguida exemplifica-se com alguns trabalhos
focalizados sobre dois tipos de instituições: as ligadas à saúde mental e à educação.
como uma forma de resistência à violência estrutural de que são alvo (e.g, falta de
oportunidades e incentivos, rejeição, sentimentos de inferioridade) e que contribui para
a construção social da desviância (Watts & Erevelles, 2004).
Nas últimas décadas, a violência da/na escola tem sido alvo de uma grande
atenção mediática e social (Charlot, 1997); em Portugal, bem com em diversos países, a
literatura científica sobre este fenómeno tem sido prolixa, numa grande diversidade de
abordagens teóricas, metodológicas e de enfoque sobre as suas “causas”. Mas se esta
diversidade mostra o carácter complexo e multifacetado do fenómeno, as diversas
perspectivas carecem de integração, mostrando-se por vezes contraditórias (Sebastião,
Alves, & Campos, 2003).
De acordo com Charlot (1997), é possível pensar em três grandes tipos de
violência na escola, relacionados entre si num contínuum. Num extremo deste
contínuum, a violência que emociona a opinião pública, mais “espectacular” e menos
frequente, inclui as mortes, os ferimentos com ou sem armas, as agressões sexuais, o
vandalismo. No outro pólo é possível considerar a violência quotidiana, a que atinge o
direito de cada um (professor ou aluno) a ser respeitado: indisciplina, humilhações,
agressões físicas ligeiras, racismo difuso. Um terceiro tipo de violência, por vezes
invisível, é a violência institucional (conceito considerado pelo autor como sinónimo de
violência simbólica). Trata-se, para este especialista em educação, de uma violência
exercida pela sociedade sobre os actores da escola e concretizada em diversos aspectos
paradoxais: o alargamento do tempo de escolaridade dos jovens e os contrangimentos
da orientação escolar que não encontram um reflexo nas possibilidades de inserção no
mercado de trabalho; o desfasamento entre os códigos da escola e os da vida quotidiana,
bem como a desvalorização destes últimos pela cultura escolar; os desentendimentos
acerca do papel dos professores e os atentados à sua identidade profissional; o
questionamento do sentido dos constrangimentos impostos pela instituição educativa
face aos valores democráticos. Assim, num sistema educativo massificado pelo direito
de todos à educação, a escola é também lugar de confronto, de inclusões e exclusões:
entre alunos, entre alunos e professores, entre professores e decisores das políticas
educativas.
A violência institucional da escola tem uma relação sistémica com os outros
tipos de violência que nela acontecem, bem como com a violência de outros campos da
vida social (Sebastião et al, 2003). Os constrangimentos institucionais, tomando por
vezes formas de violência simbólica que se impõem aos actores da escola, criam as
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condições para que outras formas de violência (e.g., interpessoal) possam desencadear-
se. Ao mesmo tempo, os episódios de violência interpessoal podem conduzir a um
aumento dos constrangimentos institucionais exercidos sobre os seus actores,
alimentando o ciclo de violência. Por outro lado, as relações de dominação e de
reprodução das desigualdades sociais que se fazem sentir na escola podem ser
concebidas como configurações específicas das relações de dominação que caracterizam
o sistema social. A violência institucional da escola é ao mesmo tempo produtora e
produto de outras formas de violência que acontecem no sistema-escola, noutras
instituições e transversalmente ao campo social.
Conclusão
Existe já um certo volume de investigação e teoria, proveniente de diferentes
campos das ciências sociais e humanas, sobre a violência de diversos tipos de
instituições. No entanto, se a ausência de abordagens integradas é notória relativamente
a cada uma delas, a reflexão sobre as dimensões comuns às violências de diversas
instituições é ainda mais rara, ou então assume um carácter relativamente abstracto –
como os conceitos de violência estrutural, cultural, simbólica, institucional ou ainda os
conceitos de dispositivo de normalização e instituição total, apresentados ao longo deste
capítulo. No entanto, é possível destacar alguns aspectos comuns, quer sobre a teoria
quer sobre os resultados empíricos.
O estado dos saberes acerca das relações entre os direitos humanos e a violência
institucional mostra que, numa perpectiva societal, os direitos humanos e a violência
estão ligados na “realidade” social; ao mesmo tempo que se relacionam em termos de
oposição, também se constroem e legitimam mutuamente. Mas se, quer do ponto de
vista teórico quer do ponto de vista do senso-comum, as violações dos direitos humanos
constituem formas de violência, o referencial dos direitos humanos não é suficiente para
abranger uma conceptualização alargada da violência, devido às interpretações restritas
que são frequentemente atribuídas aos direitos.
Os direitos e as violências não se distribuem igualitariamente através das
sociedades e de diferentes períodos históricos; a probabilidade de gozar de direitos ou
de ser vítima de violências depende da posição dos indivíduos na estrutura social,
nomeadamente da sua pertença a grupos considerados “favorecidos” ou
“desfavorecidos”. As relações entre os grupos na hierarquia social caracterizam-se pela
dominação. Muitas das injustiças sociais que dela resultam constituem violações dos
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direitos humanos e tipos de violência que frequentemente tomam forma através das
instituições – a(s) violência(s) institucional(ais).
De um ponto de vista psicossocial, as instituições constituem um lugar de
integração social dos indivíduos, pelas suas funções de socialização, de regulação das
relações sociais e de protecção dos direitos; mas são também lugares de exercício de
violência, geradoras de injustiças e limitadoras dos direitos dos indivíduos.
No que diz respeito às posições e comportamentos dos indivíduos face à relação
entre direitos e violência, se os direitos humanos são representações partilhadas entre
diferentes grupos sociais, a sua violação é também largamente aceite, embora de modo
menos consensual. Este desfasamento pode ser explicado, pelo menos parcialmente,
pelas teorias da legitimação social. As teorias da justificação do sistema e da dominação
social explicam-no pela partilha, entre os grupos, das ideologias dominantes (que
legitimam a violência e constituem a sua base cultural – violência cultural) ou da
propensão de certos indivíduos à dominação. A teoria da identidade social explica este
desfasamento pela necessidade de uma pertença positiva a um grupo social. Segundo os
contextos e as posições que ocupam na hierarquia social, esta necessidade leva os
indivíduos a mobilizar diferentes estratégias para lidar com a percepção de uma
identidade social negativa ou de uma organização social injusta. Assim, se as vítimas da
violência estrutural e institucional nem sempre se percebem como tal, isso não implica
que esta vitimação não tenha consequências psicossociais (por exemplo ao nível
identitário). Os indivíduos podem também pôr em jogo estratégias de acção para fazer
face às situações de injustiça de que são alvo (por exemplo, mobilização individual ou
colectiva).
Se as teorias e estudos que foram apresentados podem constituir uma base para a
construção de uma “vitimologia da violência institucional e das violações dos direitos
humanos”, a construção deste saber encontra-se ainda a dar os primeiros passos. As
dinâmicas macro-sociais e interpessoais envolvidas na concretização e legitimação da
injustiça social, pela sua complexidade, requerem uma abordagem que articule os níveis
mais estruturais com os níveis interpessoais e individuais. As teorias acima apresentadas
salientam mais uma ou outra dimensão, carecendo de uma articulação multinível.
Afigura-se importante prosseguir a investigação sobre a forma como o senso
comum percepciona a violação dos direitos humanos e a violência institucional: será
esta percebida como violência?; como injustiça?; poderão violência e injustiça ser vistas
como sinónimos ao nível dos saberes comuns?; quem tem direito a quê?; em que
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