Você está na página 1de 164

Instituto de Matemática - UFRJ

ESPAÇOS DE SOBOLEV

Iniciação aos Problemas Elı́ticos não Homogêneos


 

por

L. A. Medeiros M. Milla Miranda


Professor Emérito UFRJ Professor Titular UFRJ

Rio de Janeiro, RJ
2000
Medeiros, Luis Adauto da Justa, 1926 -
Espaços de Sobolev : iniciação aos problemas elı́ticos não
M488e homogêneos/ Luis Adauto da Justa Medeiros, Manuel Anto-
lino Milla Miranda - Rio de Janeiro: UFRJ. IM, 2000.
151p.
Inclui bibliografia.

1. Espaços de Sobolev. 2. Equações Diferenciais Parciais


Elı́pticas. I. Milla Miranda, Manuel Antolino. II. Universida-
de Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Matemática. III.
Tı́tulo.
ISBN: 85-87674-03-X CDD-20a 515.782
“Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores,
cousa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente
consternará é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal,
nem cinqüenta, nem vinte e, quando muito, dez. Dez? Talvez cinco.”

Brás Cubas
i

Dedicado à memória de nosso saudoso


Pedro Humberto Rivera Rodriguez
por seu talento matemático e
caráter exemplar.
ii
Prefácio

O presente livro teve sua origem no inı́cio dos anos setenta, cujo prefácio, reproduzido
a seguir traz informações históricas sobre sua origem.
Nesta edição, o Capı́tulo III versa sobre os problemas de Dirichlet e Neumann, para
o Laplaciano, no caso não homogêneo com escolhas gerais das condições de fronteira. Este
capı́tulo segue as idéias de Lions [8] e Lions-Magenes [11], enriquecidos com as referências da
Bibliografia Complementar, particularmente Aubin [18], Brezis [19], Chavent [21], Dautray-
Lions [22], Kesavan [23].
O conteúdo deste livro inclui parte dos programas de disciplinas básicas sobre equações
diferenciais parciais do Instituto de Matemática da UFRJ.
Os autores agradecem aos colegas e aos seus alunos pelo estı́mulo para aperfeiçoar as
edições anteriores que convergiram para a atual. Em particular, gostarı́amos de deixar nossos
agradecimentos ao Marcos Araújo, pela cuidadosa revisão do texto acrescentado modificações
que o tornaram mais inteligı́vel.
Ao Wilson Góes, agradecemos pelo perfeito trabalho de digitação.

Rio de Janeiro, maio de 1997

L.A. Medeiros – M. Milla Miranda

iii
iv
Prefácio (1a edição)

A idéia de escrever este texto surgiu-nos quando em 1970 iniciamos um seminário


sobre espaços de Sobolev e equações diferenciais parciais, realizado no Centro Brasileiro de
Pesquisas Fı́sicas, na esperança de despertar a atenção de algum estudante para o aspecto
das equações diferenciais parciais formulado em termos destes espaços. Aquele seminário
continuou no Instituto de Matemática da UFRJ, estimulado e fortalecido pela inclusão de
novos participantes. O plano de trabalho teve como base os textos [7] e [8] do Professor
J.L. Lions, complementado com alguns trabalhos mencionados na bibliografia dos mesmos.
Posteriormente, foram incluı́das no Curso de Pós-Graduação do IM-UFRJ, certas discipli-
nas fundamentadas nos espaços de Sobolev, para as quais este texto se adapta considera-
velmente. Deste modo, preparamos esta monografia, baseada nas exposições feitas no se-
minário de equações diferenciais parciais e em nossas aulas nas disciplinas de pós-graduação
do IM, tendo por objetivo introduzir estudantes interessados em linhas de pesquisa liga-
das às equações diferenciais parciais não lineares, controle ótimo de sistemas governados
por equações diferenciais parciais, inequações variacionais ou análise numérica de elementos
finitos.
A exposição divide-se em três capı́tulos. O Capı́tulo I é um pequeno fascı́culo de
resultados sobre distribuições a ser usado nos capı́tulos seguintes. O Capı́tulo II contém os
teoremas elementares sobre os espaços de Sobolev e, com base neste, é possı́vel entender
vários aspectos do estudo de soluções fracas de equações diferenciais parciais, o que é feito
no Capı́tulo III e nos Apêndices.

v
vi

No inı́cio deste prefácio referimo-nos ao fortalecimento do Seminário de Equações Di-


ferenciais Parciais do IM-UFRJ e retornamos a ele, deixando aqui fixada a nossa gratidão à
Beatriz, Eliana, Milla e Perla, pelo entusiasmo que sempre nos transmitiram quando men-
cionávamos a idéia de escrever este texto, bem como por suas valiosas crı́ticas e sugestões.
Resta-nos, portanto, a esperança de que possamos de fato atrair a atenção daqueles interessa-
dos em matemática aplicada, para este aspecto das equações diferenciais parciais, lembrando,
todavia que, como diz Erich From, “ter esperança, significa estar pronto a todo momento
para aquilo que ainda não nasceu e, todavia, não desesperar se não ocorrer nascimento algum
durante nossa existência”.
Ao redigirmos este texto, recebemos apoio financeiro do Fundo Nacional de Desen-
volvimento Cientı́fico (FNDCT) e do CEPG-UFRJ.
Finalizando, lembramos uma vez mais que a boa impressão dos textos de Métodos
Matemáticos, deve-se à dedicação do Sr. Arlindo Coutinho de Azevedo, chefe da Seção de
Reprografia do IM, bem como de seus auxiliares, enquanto a datilografia perfeita é trabalho
de arte do Sr. Wilson Góes.

Rio de Janeiro, agosto de 1975

L.A. Medeiros – P.H. Rivera


Prefácio (2a edição)

Esta introdução aos Espaços de Sobolev que aqui apresentamos, é uma revisão dos
Capı́tulos I e II de nossa monografia Espaços de Sobolev e Equações Diferenciais Parciais
(Bibliografia número 11).
A presente edição além das correções decorrente da revisão acima mencionada, vem
aumentada do estudo do traço de ordem m e do traço da derivada normal. Deste modo, a
exposição fica completa, servindo de base ao estudo de uma ampla variedade de problemas
relacionados aos sistemas governados por equações diferenciais parciais. Para uma exposição
completa consulte Lions-Magenes número 11 da Bibliografia.

Rio de Janeiro, janeiro de 1977

L.A. Medeiros – P.H. Rivera

vii
viii
Sumário

1 Resultados Básicos Sobre Distribuições 1


1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 Espaço de Funções Testes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.2.1 Os Espaços Lp (Ω) e Convolução de Funções . . . . . . . . . . . . . . 2
1.2.2 Exemplos de Funções Testes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2.3 Regularização de Funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.2.4 Convergência em D(Ω) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
1.3 Distribuições sobre um aberto Ω do Rn . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
1.3.1 Produto de Funções por Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
1.3.2 Restrição de Distribuições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.3.3 Distribuições Temperadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.3.4 Transformada de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

2 Espaços de Sobolev 23
2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.2 Propriedades Elementares dos Espaços de Sobolev . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.2.1 Geometria dos Espaços de Sobolev . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
2.2.2 O Espaço W0m,p (Ω) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
2.2.3 O Espaço W −m,q (Ω) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

ix
x SUMÁRIO

2.2.4 Reflexividade dos Espaços de Sobolev . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33


2.2.5 Os Espaços H m (Ω) e H −m (Ω) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.3 Imersões de Espaços de Sobolev . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
2.3.1 Caso mp < n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
2.3.2 Caso mp = n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
2.3.3 Caso mp > n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
2.3.4 Caso n = 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
2.3.5 Caso p = ∞ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
2.4 Prolongamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
2.4.1 Caso Ω = Rn+ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
2.4.2 Caso Ω Aberto Limitado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
2.5 Imersões dos Espaços W m,p (Ω) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
2.5.1 Imersões Contı́nuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
2.5.2 Imersões Compactas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
2.6 Espaços H s (Ω) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
2.7 Teoremas de Traço . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99
2.8 Traço da Derivada Normal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
2.9 Fórmula de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122

3 Problemas Elı́ticos não Homogêneos 125


3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
3.2 Problema de Dirichlet . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
3.3 Problema de Neumann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 138
3.4 Teorema do Traço. Fórmula de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 145
Capı́tulo 1

Resultados Básicos Sobre


Distribuições

1.1 Introdução
No presente capı́tulo serão fixadas terminologia, a notação e certos resultados sobre
integração e teoria das distribuições, resultados estes a serem usados no desenvolver deste
texto.
Com a letra K representa-se, simultaneamente, o corpo dos números reais R ou o dos
números complexos C. Por N representa-se o monóide dos números naturais e por Z o anel
dos inteiros.
Dados α = (α1 , α2 , . . . , αn ) ∈ Nn e z = (z1 , z2 , . . . , zn ) ∈ Kn define-se

|α| = α1 + α2 + . . . + αn , z α = z1α1 z2α2 . . . znαn , α! = α1 !α2 ! . . . αn ! .

Por D α denota-se o operador de derivação de ordem α definido por

∂ |α| /∂xα1 1 ∂xα2 2 . . . ∂xαnn

e para α = (0, 0, . . . , 0) define D 0 u = u para toda função u. Por Di , para i = 1, 2, . . . , n,


representa-se a derivação parcial ∂/∂xi .

1
2 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Se α, β ∈ Nn , escreve-se β ≤ α quando βi ≤ αi para todo i = 1, 2, . . . , n. Quando u e


v forem funções numéricas suficientemente deriváveis, tem-se a regra de Leibniz dada por
X α!
D α (uv) = (D β u)(D α−β v).
β≤α
β!(α − β)!
Sejam E e F dois espaços topológicos com E ⊂ F . Para indicar que a imersão de E
em F é contı́nua será usada a notação E ֒→ F .
Por Ω representa-se um subconjunto aberto do Rn e por Γ sua fronteira. Será fixada
em Ω a medida de Lebesgue dx.

1.2 Espaço de Funções Testes


Inicia-se introduzindo alguns resultados e noções prévias.

1.2.1 Os Espaços Lp (Ω) e Convolução de Funções

Seja u uma função numérica definida em Ω, u mensurável, e seja (Oi )i∈I a famı́lia de
todos os subconjuntos abertos Oi de Ω tais que u = 0 quase sempre em Oi . Considera-se o
[
subconjunto aberto O = Oi . Então u = 0 quase sempre em O. Como conseqüência deste
i∈I
fato, o suporte de u, o qual é denotado por supp u, é definido como sendo o subconjunto
fechado de Ω,
suppu = Ω\O.

Observe que se u é contı́nua em Ω então

supp u é igual ao fecho em Ω do conjunto {x ∈ Ω; u(x) 6= 0}.

Sejam u e v funções numéricas, mensuráveis em Ω e λ ∈ K, λ 6= 0. Mostra-se que

supp (u + v) ⊂ (supp u) ∪ (supp v)

supp (uv) ⊂ (supp u) ∩ (supp v)

supp (λu) = λsupp u


1.2. ESPAÇO DE FUNÇÕES TESTES 3

Seja u uma função numérica, mensurável no Rn . A função τy u definida por (τy u)(x) =
u(x − y) denomina-se a translação de u por y. Mostra-se que

supp(τy u) = y + supp u.

Representa-se por Lp (Ω), 1 ≤ p < ∞, o espaço de Banach das funções numéricas u


definidas em Ω, mensuráveis cuja potência p, |u|p, é integrável em Ω, equipado com a norma
Z 1/p
||u||Lp(Ω) = |u(x)|p dx .

No caso p = 2, L2 (Ω) é um espaço de Hilbert com o produto escalar


Z
(u, v)L2 (Ω) = u(x)v̄(x) dx, v̄ complexo conjugado de v.

Por L∞ (Ω) denota-se o espaço de Banach das funções numéricas u, mensuráveis em Ω e que
são essencialmente limitadas em Ω, equipado com a norma

||u||L∞(Ω) = sup ess |u(x)|.


x∈Ω

Denota-se por Lploc (Ω), 1 ≤ p < ∞, o espaço localmente convexo das funções
numéricas u, mensuráveis em Ω, equipado com a famı́lia de semi-normas

{pO ; O subconjunto aberto limitado de Ω}

onde
Z 1/p
p
pO (u) = |u(x)| dx .
O

Diz-se que a sucessão (uν ) de funções de Lploc (Ω) converge para zero em Lploc (Ω) se

lim pO (uν ) = 0 para todo O aberto limitado de Ω.


ν→∞

Seja u ∈ Lploc (Ω) e (uν ) uma sucessão de funções de Lploc (Ω). Diz-se que (uν ) converge para
u em Lploc (Ω) se (uν − u) converge para zero em Lploc (Ω).
4 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Proposição 1.2.1 (Desigualdade de Interpolação) Se u ∈ Lp (Ω) ∩ Lq (Ω) com


1 ≤ p ≤ q ≤ ∞ então u ∈ Lr (Ω) para todo p ≤ r ≤ q e se tem a desigualdade

||u||Lr (Ω) ≤ ||u||θLp(Ω) ||u||1−θ


Lq (Ω) (1.2.1)
1 θ 1−θ
onde 0 ≤ θ ≤ 1 verifica = + ·
r p q
Demonstração: Se p = q então θ = 1/2; se r = p, θ = 1 e se r = q, θ = 0. Nestes três
casos tem-se uma igualdade em (1.2.1).
Considere-se o caso 1 ≤ p < r < q < ∞. Observe que neste caso 0 < θ < 1. Tem-se,
pela desigualdade de Hölder:
Z Z Z 1/α  Z 1/α′
r rθ+r(1−θ) rθα r(1−θ)α′
|u| dx = |u| dx ≤ |u| dx |u| (1.2.2)
Ω Ω Ω Ω

com α = p/rθ, α′ = q/r(1 − θ) . Observe que α1 + α1′ = 1. De (1.2.2) resulta


Z
p/α q/α′
|u|r dx ≤ ||u||Lp (Ω) ||u||Lq .

1 θα 1 (1−θ)α′
Daı́, notando que r
= p
e r
= q
, obtém-se a desigualdade (1.2.1).
No caso 1 ≤ p < r < ∞, segue-se que p = rθ e 0 < θ < 1. Portanto
Z Z
r(1−θ)
r
|u| dx = |u|rθ+r(1−θ) dx ≤ ||u||L∞(Ω) ||u||pLp (Ω)
Ω Ω

implicando na desigualdade (1.2.1). 


Sejam u e v funções numéricas definidas no Rn . Considera-se a convolução u ∗ v das
funções u e v, isto é,
Z Z
(u ∗ v)(x) = u(x − y)v(y) dy = v(y)v(x − y) dy.
Rn Rn

Tem-se o seguinte resultado:


Desigualdade de Young. Sejam u ∈ Lp (Rn ) e v ∈ Lq (Rn ) com 1 ≤ p ≤ ∞,
1 1 1
1 ≤ q ≤ ∞, e r o número real verificando = + − 1 ≥ 0. Então u ∗ v ∈ Lr (Rn )
r p q
e
||u ∗ v||Lr (Rn ) ≤ ||u||Lp(Rn ) ||v||Lq (Rn ) . (1.2.3)
1.2. ESPAÇO DE FUNÇÕES TESTES 5

Além disso,
supp(u ∗ v) ⊂ supp u + supp v. (1.2.4)

1.2.2 Exemplos de Funções Testes

Representa-se por C0∞ (Ω) o espaço vetorial das funções numéricas definidas em Ω,
com suporte compacto, possuindo em Ω derivadas parciais contı́nuas de todas as ordens. Os
elementos de C0∞ (Ω) são denominados funções testes em Ω.
Exemplo 1. Seja ρ: Rn 7→ R definida por:


exp (−1/(1 − ||x||2 )) se ||x|| < 1
ρ(x) =
0 se ||x|| ≥ 1

sendo ||x||2 = x21 + x22 + . . . + x2n . Mostra-se que ρ pertence a C0∞ (Rn ) e que supp ρ = {x ∈
Rn ; ||x|| ≤ 1}.
R
Exemplo 2. Seja k Rn
ρ(x) dx sendo ρ a função do Exemplo 1. Para cada ν = 1, 2, . . . , n, . . .
considere a função ρν : Rn 7→ R definido por

ρν (x) = (ν n /k)ρ(νx) para todo x ∈ Rn .

Mostra-se que ρν é, para cada ν, uma função teste no Rn possuindo as seguintes propriedades:

a) 0 ≤ ρν (x) ≤ ν n /ke
R R
b) Rn
ρν (x) dx = ||x||≤1/ν
ρν (x) dx = 1

c) supp ρν = {x ∈ Rn ; ||x|| ≤ 1/ν}

Uma sucessão (ρν ) de funções testes no Rn com as propriedades a), b), c) é denomi-
nada uma sucessão regularizante.
Exemplo 3. Sejam u ∈ C0∞ (Rn ) e v ∈ Lp (Rn ), 1 ≤ p < ∞. Então u ∗ v pertence a
C ∞ (Rn ) ∩ Lp (Rn ) e D α (u ∗ v) = (D α u) ∗ v para todo α ∈ Nn . Quando v possui suporte
compacto, então, por (4), u ∗ v é uma função teste no Rn .
6 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Exemplo 4. Considere-se dois subconjuntos K e F do Rn , disjuntos, sendo K compacto e


F fechado. Então existe uma função teste ϕ no Rn tal que

ϕ(x) = 1 em K, ϕ(x) = 0 em F e 0 ≤ ϕ(x) ≤ 1.

Para construir tal ϕ considere ε > 0 definido por ε = dist(K, F )/4 e construa os conjuntos
F0 = {x ∈ Rn ; dist(x, K) ≥ 2ε}, K0 = {x ∈ Rn ; dist(x, K) ≤ ε}. Considere ν ∈ N tal que
εν ≥ 1. Então se v: Rn 7→ R é definida por v(x) = dist(x, F0 )/(dist(x, F0 ) + dist(x, K0 )) para
todo x ∈ Rn , segue-se que ϕ = ρν ∗ v satisfaz todas as condições requeridas.

1.2.3 Regularização de Funções

O objetivo nesta seção é mostrar que C0∞ (Ω) é denso em Lp (Ω), 1 ≤ p < ∞. Inicia-se,
para isto, com um resultado de continuidade.

Proposição 1.2.2 Seja u ∈ Lp (Rn ), 1 ≤ p < ∞. Então a aplicação translação

Rn → Lp (Rn )
y 7→ τy u,

é contı́nua.

Demonstração: Note-se que é suficiente demonstrar que a aplicação é contı́nua em y = 0.


Com efeito, seja y ∈ Rn e (yν ) uma sucessão de vetores de Rn com yν → y. Tem-se:
Z Z
p p
||τyν u − τy u||Lp (Rn ) = |u(x − yν ) − u(x − y)| dx = |u(x − zν ) − u(x)|p dx
Rn Rn

onde zν = yν − y → 0.
Provar-se-á, portanto, que a translação é contı́nua em y = 0. Seja (yν ) uma sucessão
de vetores do Rn com yν → 0. Primeiro mostra-se a continuidade para u = χO onde χO é a
função caracterı́stica de um subconjunto aberto limitado O de Rn . Tem-se:
Z
p
||τyν u − u||Lp (Rn ) = |χO (x − yν ) − χO (x)|p dx. (1.2.5)
Rn
1.2. ESPAÇO DE FUNÇÕES TESTES 7

Observe que χO (x − yν ) → χO (x) para todo x ∈ Rn \∂O (∂O fronteira de O), logo

χO (x − yν ) → χO (x) quase sempre em Rn . (1.2.6)

Por outro lado


|χO (x − yν ) − χU (x)|p ≤ χU (x), ∀ x ∈ Rn (1.2.7)

!
[
onde U é o conjunto U = O + yν ∪O, U aberto limitado do Rn . Aplicando o Teorema
ν=1
da Convergência Dominada de Lebesgue à integral da direita de (1.2.5), decorre de (1.2.6) e
(1.2.7) que
τyν u → u em Lp (Rn ) quando ν → ∞.

Resulta da primeira parte que a translação é contı́nua em y = 0 para u função escada


de Rn , isto é, para u igual a uma combinação linear finita de funções caracterı́sticas de
subconjuntos abertos limitados de Rn .
Note-se que o conjunto das funções escadas do Rn é denso em Lp (Rn ). Seja u ∈ Lp (Rn )
e ε > 0. Então existe uma função escada ψ de Rn tal que ||u − ψ||Lp (Rn ) < ε. Tem-se:

||τyν u − u||Lp ≤ ||τyν u − τyν ψ||Lp + ||τyν ψ − ψ||Lp + ||ψ − u||Lp =


= 2||ψ − u||Lp + ||τyν ψ − ψ||Lp < 3ε para ν ≥ ν0

que prova, finalmente, o resultado desejado. 

Teorema 1.2.1 Seja (ρν ) a sucessão regularizante dada no Exemplo 2. Se u ∈ Lp (Rn ),


1 ≤ p < ∞, então a sucessão (ρν ∗ u) converge para u em Lp (Rn ).

Demonstração: Tem-se:
Z
(ρν ∗ u)(x) − u(x) = ρν (y){u(x − y) − u(x)} dy (1.2.8)
||y||≤1/ν
Z
pois ρν (y) dy = 1. Se p = 1, do Teorema de Fubini, resulta
||y||≤1/ν
Z
||ρν ∗ u − u||L1 (Rn ) ≤ ρν (y)||τy u − u||L1 (Rn ) dy,
||y||≤1/ν
8 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

e o Teorema 1.2.1 é uma conseqüência da continuidade da translação τy u demonstrada na


Proposição 1.2.2.
1 1
No caso 1 < p < ∞, considere q tal que p
+ q
= 1. De (1.2.8) e da desigualdade de
Hölder, obtém-se:
Z p/q Z
p q
|(ρν ∗ u)(x) − u(x)| ≤ ρν (y) |u(x − y) − u(x)|p dx. (1.2.9)
||y||≤1/ν ||y||≤1/ν

Note que Z Z
ν nq
q ν nq 1
ρν (y) dy ≤ q q dy = q q
wn n
||y||≤1/ν k e ||y||≤1/ν k e ν
onde wn é o volume da esfera unitária do R . Portanto, n

Z p/q wn
p/q
1
q
ρν (y) dy ≤ p p ν (nq−n)p/q = C ν np(1− q ) = C ν n (1.2.10)
||y||≤1/ν k e
p/q
onde C = wn /k p ep . Considerando (1.2.10) em (1.2.9) e aplicando o Teorema de Fubini,
resulta
Z
||ρν ∗ u − u||pLp (Rn ) ≤Cν n
||τy u − u||pLp (Rn ) dy ≤ C wn sup ||τy u − u||pLp (Rn ) .
||y||≤1/ν ||y||≤1/ν

Esta expressão e a continuidade da translação acarretam o Teorema 1.2.1. 

Observação 1 Para o conjunto aberto Ω do Rn , pode-se construir uma sucessão de conjun-


tos compactos {Kν } tal que

[
Kν ⊂ Kν+1 , ∀ ν, ; e Ω = Kν .
ν=1

Com efeito, é suficiente considerar Kν como sendo

1
Kν = {x ∈ Ω; dist(x, Γ) ≥ } ∩ {x ∈ Rn ; ||x|| ≤ ν}
ν

onde Γ é a fronteira de Ω.
1.2. ESPAÇO DE FUNÇÕES TESTES 9

Corolário 1 C0∞ (Ω) é denso em Lp (Ω) para 1 ≤ p < ∞.

Demonstração: Seja {Kν } a sucessão de subconjuntos compactos de Ω dada na Observação


1. Se u ∈ Lp (Ω), para cada ν = 1, 2, . . . seja χ Kν a função caracterı́stica de Kν e considere
a função uν = u χ Kν . Segue-se que uν ∈ Lp (Ω) para cada ν e a sucessão (uν ) é convergente
para u na norma Lp (Ω), convergência que decorre do Teorema da Convergência Dominada
de Lebesgue. Desde que as funções uν possuem suporte compacto, para provar o corolário é
suficiente aproximar as funções uν por funções de C0∞ (Ω).
De fato, seja u ∈ Lp (Ω), u com suporte compacto, e considere r = dist(suppu, Γ),
que é um número positivo. Defina ũ: Rn →7 K por


u(x) se x ∈ Ω
ũ(x) =
0 se x ∈ CΩ

Diz-se que ũ é a extensão de u por zero fora de Ω. Tem-se ũ ∈ Lp (Rn ) e supp ũ = supp u é
um compacto de Rn . Portanto, (ρν ∗ ũ) é uma sucessão de funções testes no Rn que converge
para ũ em Lp (Rn ). Represente por vν a restrição a Ω da função ρν ∗ ũ. Resulta que vν é uma
função teste em Ω para cada ν ≥ 2/r e a sucessão (vν ) converge para u em Lp (Ω). 

1.2.4 Convergência em D(Ω)

Diz-se que uma sucessão (ϕν ) de funções de C0∞ (Ω) é convergente para zero, quando
as seguintes condições forem satisfeitas:

a) Os suportes de todas as funções testes ϕν , da sucessão dada, estão contidos num


compacto fixo K.

b) Para cada α ∈ Nn , a sucessão (D α ϕν ) converge para zero uniformemente em K.

Se ϕ ∈ C0∞ (Ω), diz-se que a sucessão (ϕν ) de elementos de C0∞ (Ω) converge para ϕ em
C0∞ (Ω), quando a sucessão (ϕν − ϕ) converge para zero no sentido dado acima.
10 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

O espaço vetorial C0∞ (Ω) com esta noção de convergência é representado por D(Ω) e
denominado espaço das funções testes em Ω.

1.3 Distribuições sobre um aberto Ω do Rn


Define-se como distribuição sobre Ω a toda forma linear T sobre D(Ω) que é contı́nua
no sentido da convergência definida sobre D(Ω). Isto significa que para toda sucessão (ϕν ) de
D(Ω), convergente para zero no sentido definido em 1.2.4, então a sucessão (hT, ϕν i) converge
para zero em K. (Note que K = R ou C e hT, ϕν i é o valor de T em ϕν ). O conjunto de
todas as distribuições sobre Ω é um espaço vetorial o qual representa-se por D ′ (Ω). Neste
espaço vetorial diz-se que uma sucessão (Tν ) de vetores de D ′ (Ω) converge para zero em
D ′ (Ω), quando para toda função teste ϕ ∈ D(Ω), a sucessão (hT, ϕν i) converge para zero em
K. Neste caso escreve-se lim Tν = 0 em D ′ (Ω). Diz-se que
ν→∞

lim Tν = T em D ′ (Ω),
ν→∞

quando lim (Tν − T ) = 0 em D ′ (Ω).


ν→∞
Exemplo 1. Seja u ∈ L1loc (Ω). Considere a forma linear Tu definida em D(Ω) por:
Z
hTu , ϕi = u(x)ϕ(x) dx

para toda ϕ ∈ D(Ω). Mostra-se sem dificuldades que Tu é uma distribuição sobre Ω.

Proposição 1.3.1 (Lema de Du Bois Raymond) Seja u ∈ L1loc (Ω). Então Tu = 0 se e


somente se u = 0 quase sempre em Ω.

Demonstração: Claramente se u = 0 quase sempre em Ω então Tu = 0. Mostra-se, então,


que a condição Tu = 0 implica u = 0 quase sempre em Ω. Com efeito, considere-se um
subconjunto aberto limitado O de Ω. Sabe-se pelo Corolário 1 que D(O) é denso em L1 (O).
Conseqüentemente, como u ∈ L1 (O), vem que para cada ε > 0 existe v ∈ D(O) tal que
Z
|u − v| dx < ε.
O
1.3. DISTRIBUIÇÕES SOBRE UM ABERTO Ω DO RN 11

Da hipótese e desta última desigualdade, resulta:


Z Z

vϕ dx = (vϕ − uϕ) dx ≤ ε max |ϕ| (1.3.11)

O O

para toda ϕ ∈ D(O).


Considere-se os conjuntos

K1 = {x ∈ O; v(x) ≥ ε} e K2 = {x ∈ O; v(x) ≤ −ε},

que são subconjuntos compactos disjuntos de O. Do Exemplo 4 da Seção 1.2.2, vem que
existem ϕ1 , ϕ2 em D(O) tais que:

ϕ1 = 1 em K1 Dϕ1 = 0 em K2 0 ≤ ϕ1 ≤ 1
ϕ2 = 0 em K1 ϕ2 = 1 em K2 0 ≤ ϕ2 ≤ 1

Tomando-se ψ = ϕ1 − ϕ2 , obtém-se:

ψ = 1 em K1 , ψ = −1 em K2 , −1 ≤ ψ ≤ 1.

Resulta, portanto,
Z Z Z
vψ dx = vψ dx + vψ dx,
O O\K K

onde K = K1 ∪ K2 . Observando-se que |v| ≤ ε em O\K e levando em consideração (1.3.11)


obtém-se: Z Z Z

vψ dx ≤ vψ dx + vψ dx ≤ ε + ε med(O).

K O O\K

Da definição de ψ e desta última desigualdade, encontra-se:


Z Z
|v| dx = |vψ| dx ≤ ε + med(O)ε.
K K

Portanto,
Z Z Z Z
|u| dx ≤ |u − v| dx + |v| dx + |v| dx ≤ 2ε + 2ε med(O).
O O K O\K
12 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Fazendo-se ε tender para zero obtém-se que u = 0 quase sempre em O. Sendo O arbitrário,
resulta que u = 0 quase sempre em Ω.
A demonstração acima é válida para u tomando valores reais. Se u toma valores
R
complexos, observa-se que a condição Ω uϕ dx = 0 para toda ϕ em D(O), implica
Z Z
(Re u)ϕ dx = 0, (Im u)ϕ = 0, ∀ ϕ ∈ D(Ω), ϕ uma função real.
Ω Ω

A proposição segue aplicando a demonstração feita acima a cada uma destas integrais. 

Observação 2 Do Lema de Du Bois Raymond segue-se que para cada u ∈ L1loc (Ω), tem-se
Tu univocamente determinada por u sobre Ω, quase sempre, no seguinte sentido: se u, v ∈
L1loc (Ω) então Tu = Tv se e somente se u = v quase sempre em Ω. Por esta razão, identifica-
se u com a distribuição Tu por ela definida e diz-se a distribuição u ao invés de dizer a
distribuição Tu .
É oportuno observar que existem distribuições não definidas por funções de L1loc (Ω),
como pode ser visto no exemplo que se segue.

Exemplo 2. Seja x0 um ponto de Ω e δx0 a forma linear definida em D(Ω) do seguinte


modo:
hδx0 , ϕi = ϕ(x0 ) para toda ϕ ∈ D(Ω).

Fácil é verificar que δx0 é uma distribuição sobre Ω, denominada distribuição de Dirac ou
medida de Dirac concentrada em x0 . Quando x0 = 0 escreve-se δ0 .
Mostra-se que a distribuição δx0 não é definida por uma função u de L1loc (Ω), isto é,
não existe u ∈ L1loc (Ω) tal que
Z
u(x)ϕ(x) dx = ϕ(x0 ) para toda ϕ ∈ D(Ω).

De fato, se existisse uma tal função u, então


Z
u(x)||x − x0 ||2 ϕ(x) dx = ||x − x0 ||2 ϕ(x)|x=x0 = 0

1.3. DISTRIBUIÇÕES SOBRE UM ABERTO Ω DO RN 13

para toda ϕ ∈ D(Ω). Pelo Lema de Du Bois Raymond tem-se ||x − x0 ||2 u(x) = 0 quase
sempre em Ω, mostrando que u(x) = 0 quase sempre em Ω, isto é, δx0 = 0 o que é uma
contradição.

Observação 3 Existem sucessões (uν ) de funções de L1loc (Ω) que convergem para distri-
buições T em D ′ (Ω), mas o limite T não pode ser definido por uma função de L1loc (Ω).

De fato, seja x0 ∈ Ω e Br (x0 ) = {x ∈ Rn ; ||x − x0 || ≤ r} uma bola contida em Ω. Para cada


0 < ε < r, seja θε a função teste
1  x − x0 
θε (x) =ρ para todo x ∈ Ω,
kεn ε
R
sendo ρ a função teste definida no Exemplo 1 da Seção 1.2 e k = Rn ρ(y) dy. Tem-se, para
ϕ ∈ D(Ω),
Z x − x  Z
1 0 1
hθε , ϕi = n ρ ϕ(x)dx = ρ(y)ϕ(εy + x0 )dy → ϕ(x0 ) quando ε → 0+ .
kε Ω ε k Ω

Assim
lim θε = δx0 em D ′ (Ω).
ε→0+

Exemplo 3. Seja (uν ) uma sucessão de funções de Lploc (Ω), 1 ≤ p < ∞; tal que

lim uν = u em Lploc (Ω).


ν→∞

Então resulta que


lim uν = u em D ′ (Ω).
ν→∞

De fato, seja ϕ ∈ D(Ω) e O um subconjunto aberto limitado de Ω tal que suppϕ ⊂ O.


Se p = 1, tem-se:
Z Z


|huν − u, ϕi| = (uν (x) − u(x))ϕ(x)dx ≤ max |ϕ(x)| |ϕ(x)| |uν (x) − u(x)| dx,
Ω x∈O O
1 1
e se 1 < p < ∞, considera-se o seu conjugado q, isto é, p
+ q
= 1, obtendo-se:

|huν − u, ϕi| ≤ ||uν − u||Lp (O) ||ϕ||Lq (O) .

As desigualdades acima implicam nossa afirmação.


14 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Observação 4 Tem-se a seguinte cadeia, para 1 ≤ p < ∞,

D(Ω) ֒→ Lploc (Ω) ֒→ D ′ (Ω),

sendo cada inclusão densa na seguinte.

Com efeito, a continuidade da imersão de D(Ω) em Lploc (Ω) é fácil de verificar e a continuidade
da imersão de Lploc (Ω) em D ′ (Ω) foi mostrada no Exemplo 3. A densidade de D(Ω) em D ′ (Ω)
será provada posteriormente. Para mostrar que D(Ω) é denso em Lploc (Ω), procede-se como
se segue. Seja u ∈ Lploc (Ω) e (Kν ) a sucessão de subconjuntos compactos de Ω dada na
Observação 1. Para cada aberto Oν = int Kν determina-se ϕν ∈ D(Oν ) tal que
1
||u − ϕν ||Lp (Oν ) < ·
ν
A sucessão (ϕν ) de funções testes em Ω converge para u em Lploc (Ω) quando ν → ∞. 
Considere uma distribuição T sobre Ω e α ∈ Nn . A derivada de ordem α de T é, por
definição, a forma linear D α T definida em D(Ω) por:

hD α T, ϕi = (−1)|α| hT, D α ϕi para todo ϕ ∈ D(Ω).

Não é difı́cil mostrar que D α T é uma distribuição sobre Ω.


Segue-se da definição acima que cada distribuição T sobre Ω possui derivadas de todas
as ordens. Assim, as funções de L1loc (Ω) possuem derivadas de todas as ordens no sentido
das distribuições. Observe que a aplicação

D α : D ′ (Ω) 7→ D ′ (Ω), T 7→ D α T

é linear e contı́nua no sentido da convergência definida em D ′(Ω). Isto significa que se

lim Tν = T em D ′ (Ω) então lim D α Tν = D α T em D ′ (Ω).


ν→∞ ν→∞

Outro resultado que vale a pena mencionar é que a derivada de uma função de L1loc (Ω),
não é, em geral, uma função de L1loc (Ω), como mostra o exemplo que vem a seguir. Tal fato,
1.3. DISTRIBUIÇÕES SOBRE UM ABERTO Ω DO RN 15

motivará a definição de uma classe significativa de espaços de Banach de funções, conhecidos


sob a denominação de Espaços de Sobolev, tendo este texto como um dos objetivos fazer um
estudo introdutório destes espaços.
Exemplo 4. Seja u a função de Heaviside, isto é, u é definida em R e tem a seguinte forma:
u(x) = 1 se x > 0 e u(x) = 0 se x < 0. Ela pertence a L1loc (R) mas sua derivada u′ = δ0 não
pertence a L1loc (R). De fato, tem-se:
Z ∞
′ ′
hu , ϕi = −hu, ϕ i = − ϕ′ (x) dx = ϕ(0) = hδ0 , ϕi
0

para todo ϕ ∈ D(R).


Exemplo 5. Se u ∈ C k (Rn ), para cada |α| ≤ k, a derivada D α u no sentido das distribuições
é igual à derivada no sentido clássico, isto é, D α Tu = TDα u para todo |α| ≤ k. Isto é uma
conseqüência simples da fórmula de integração de Gauss.
Exemplo 6. Seja u ∈ L1loc (Rn ) e k ∈ N. Suponha que para cada |α| ≤ k, D α u pertença a
L1loc (Rn ). Então, para toda ϕ em D(Rn ) e |α| ≤ k, tem-se:

D α (ϕ ∗ u) = ϕ ∗ D α u.

Note que D α u é a derivada no sentido das distribuições. A igualdade acima é uma con-
seqüência da definição de derivada e do Teorema de Fubini.
A seguir serão fixados certos resultados sobre multiplicação de uma distribuição por
uma função, restrição de uma distribuição, distribuição temperada e transformada de Fourier.

1.3.1 Produto de Funções por Distribuições

Se ρ ∈ C ∞ (Ω) para cada ϕ ∈ D(Ω) tem-se ρϕ ∈ D(Ω) e se lim ϕν = 0 em D(Ω) isto


ν→∞
implica lim ρϕν = 0 em D(Ω) (segue-se da Fórmula de Leibniz para funções). Quando T é
ν→∞
uma distribuição sobre Ω, define-se o produto ρT como a forma linear definida em D(Ω) do
seguinte modo:
hρT, ϕi = hT, ρϕi para toda ϕ em D(Ω).
16 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Segue-se que ρT é uma distribuição sobre Ω.


Se α ∈ Nn , tem-se a fórmula de Leibniz:
X α!
D α (ρT ) = D β ρ D α−β T.
β!(α − β)!
β≤α

Verificar-se-á esta fórmula no caso α = ei = (0, . . . , 1, . . . , 0). Para todo ϕ em D(Ω) tem-se:

hDi (ρT ), ϕi = −hρT, Di ϕi = −hT, ρ(Di ϕ)i = hT, −Di (ρϕ) + (Di ρ)ϕi =
= −hT, Di (ρϕ)i + hT, (Di ρ)ϕi = hDi T, ρϕi + h(Diρ)T, ϕi =
= hρDi T + (Di ρ)T, ϕi.

1.3.2 Restrição de Distribuições

Suponha-se Ω e U subconjuntos abertos do Rn tais que Ω ⊂ U. Para cada função ϕ


em D(Ω) considere-se ϕ(x)
e = ϕ(x) se x ∈ Ω e ϕ(x)
e = 0 se x ∈ U\Ω. Tem-se ϕ
e ∈ D(U) e
mais:

a) D α ϕ g
e=D α ϕ para todo α ∈ Nn

b) Se lim ϕν = 0 em D(Ω), segue-se que lim ϕ


eν = 0 em D(U).
ν→∞ ν→∞

Como uma conseqüência daqueles resultados, se T ∈ D ′ (U), a forma linear T |Ω definida em


D(Ω) por hT |Ω , ϕi = hT, ϕi
e para todo ϕ em D(Ω), é uma distribuição sobre Ω denominada a
restrição de T a Ω. De a) prova-se que D α (T |Ω ) = (D α T ) |Ω para todo α ∈ Nn e T ∈ D ′ (U).

1.3.3 Distribuições Temperadas

Uma função ϕ ∈ C ∞ (Rn ) diz-se rapidamente decrescente no infinito, quando para


cada k ∈ N tem-se
pk (ϕ) = max sup (1 + ||x||2)k |D α ϕ(x)| < ∞, (1.3.12)
|α|≤k x∈Rn

que é equivalente a dizer que


lim p(x)D α ϕ(x) = 0 (1.3.13)
||x||→∞
1.3. DISTRIBUIÇÕES SOBRE UM ABERTO Ω DO RN 17

para todo polinômio p de n variáveis reais e α ∈ Nn .


Considere o espaço vetorial S(Rn ) das funções rapidamente decrescentes no infinito,
no qual definiremos a seguinte noção de convergência: uma sucessão (ϕν ) de funções de
S(Rn ) converge para zero, quando para todo k ∈ N a sucessão (pk (ϕν )) converge para zero
em K. A sucessão (ϕν ) converge para ϕ em S(Rn ) se (pk (ϕν − ϕ)) converge para zero em K
para todo k ∈ N.
As formas lineares definidas em S(Rn ), contı́nuas no sentido da convergência definida
em S(Rn ) são denominadas distribuições temperadas. O espaço vetorial de todas as distri-
buições temperadas com a convergência pontual de sucessões será representado por S ′ (Rn ).
Assim
lim Tν = T em S ′ (Rn ) se lim hTν , ϕi = hT, ϕi, ∀ ϕ ∈ S(Rn ).
ν→∞ ν→∞

Tem-se D(Rn ) ֒→ S(Rn ). O espaço D(Rn ) é denso em S(Rn ). De fato, seja θ ∈ D(Rn )
tal que
θ(x) = 1 se ||x|| ≤ 1 e θ(x) = 0 se ||x|| ≥ 2. (1.3.14)

Para cada ν ∈ N, define-se θν (x) = θ(x/ν) para todo x ∈ Rn . Seja u ∈ S(Rn ) então a
sucessão (θν u) de funções de D(Rn ) converge para u em S(Rn ). Para mostrar a convergência
observe que pela Fórmula de Leibniz para funções, resulta
D α (θν (x)u(x)) −D α u(x) = (θν (x)D α u(x) − D α u(x))+
X α! 1 β
+ |β|
D θ(x/ν)D α u(x).
β≤α
β!(α − β)! ν
β>0

Portanto
pk (θν u − u) ≤ max sup (1 + ||x||2)k |θν (x)D α u(x) − D α u(x)| +
" |α|≤k x∈Rn #
X α! 1 (1.3.15)
+ max sup (1 + ||x||2)k |β|
|D β θ(x/ν)D α−β u(x)|
|α|≤k x∈Rn
β≤α, β>0
β!(α − β)! ν

A segunda parcela do segundo membro de (1.3.15) converge para zero quando ν → ∞ como
pode ser visto facilmente. A primeira parcela converge para zero como conseqüência da
expressão (1.3.13) e do fato que θν (x)D α u(x) = D α u(x) para ||x|| ≤ ν.
18 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

2
Observe-se que u(x) = e−||x|| pertence a S(Rn ) mas não pertence a D(Rn ).
Como conseqüência do exposto vem que se T é uma distribuição temperada, sua
restrição a D(Rn ) é uma distribuição sobre Rn , a qual ainda representa-se por T . Além
disto, se S é uma distribuição sobre Rn tal que existe C > 0 e k ∈ N satisfazendo a condição:

|hS, ϕi| ≤ C pk (ϕ) para toda ϕ ∈ D(Rn ), (1.3.16)

segue-se da densidade de D(Rn ) em S(Rn ), que S pode ser estendida como uma distribuição
temperada.
Exemplo 1. Como |hδ0 , ϕi| ≤ p0 (ϕ) para toda ϕ ∈ D(Rn ) segue-se de (1.3.16) que δ0 ∈
S ′ (Rn ).
Exemplo 2. Seja u ∈ L1loc (Rn ) tal que
Z
|u(x)|
C= dx < ∞
Rn (1 + ||x||2)k
para algum k ∈ N, k > 0. Então |hu, ϕi| ≤ C pk (ϕ) para toda ϕ ∈ D(Rn ). Conseqüente-
mente, u é uma distribuição temperada.
Como conseqüência do Exemplo 2 e notando que
Z
1
2 m
dx < ∞ para m > n/2,
Rn (1 + ||x|| )

vem que toda u ∈ Lp (Rn ) 1 ≤ p ≤ ∞, define uma distribuição temperada. Para 1 < p < ∞,
tem-se:
1 1 
D(Rn ) ֒→ S(Rn ) ֒→ Lq (Rn ) + =1
p q
sendo cada inclusão densa na seguinte. Então por dualidade resulta

Lp (Rn ) ֒→ S ′ (Rn ) ֒→ D ′ (R|g n ) (1.3.17)

com cada inclusão densa na seguinte.


Exemplo 3. Se T ∈ S ′ (Rn ) e α ∈ Nn , então a forma linear D α T definido em S(Rn ) por

hD α T, ϕi = (−1)|α| hT, Dα ϕi para todo ϕ ∈ S(Rn )


1.3. DISTRIBUIÇÕES SOBRE UM ABERTO Ω DO RN 19

é uma distribuição temperada.


Seja T ∈ S ′ (Rn ) e ρ ∈ C ∞ (Rn ). Então o produto ρT não é necessariamente uma
distribuição temperada. Diz-se que ρ é lentamente crescente no infinito, quando para cada
α ∈ NN , existe um polinômio pα , tal que

|D α ρ(x)| ≤ pα (x) para todo x ∈ Rn .

Assim, se ρ é lentamente crescente no infinito, então ρT é uma distribuição temperada.

1.3.4 Transformada de Fourier

Dada uma função u ∈ L1 (Rn ), define-se sua transformada de Fourier como sendo a
função F u definida no Rn por
Z
−n/2
(F u)(x) = (2π) e−i(x,y) u(y) dy
Rn

sendo (x, y) = x1 y1 + x2 y2 + . . . + xn yn . A aplicação (Feu)(x) = (F u)(−x) para todo x no


Rn , é denominada transformada de Fourier inversa de u. Obtém-se F u = Feū, sendo v̄ o
complexo conjugado de v.
e e
Desde que S(Rn ) ⊂ L1 (Rn ), para cada ϕ ∈ S(Rn ), estão bem definidas F ϕ, Fϕ
mostra-se que elas são rapidamente decrescentes no infinito. Além disto

F : S(Rn ) 7→ S(Rn ) e F : S(Rn ) 7→ S(Rn )

e
são isomorfismos contı́nuos e F −1 = F.
2 /2 2 /2
Observe que F e−||x|| = e−||x|| .
Para todo ϕ, ψ ∈ S(Rn ), tem-se:

F (D αϕ) = i|α| xα F ϕ, D α (F ϕ) = F ((−i)|α| xα ϕ)


(F ϕ, F ψ)L2(Rn ) = e Fψ)
(ϕ, ψ)L2 (Rn ) = (Fϕ, e L2 (Rn ) .
20 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

Dada uma distribuição temperada T , define-se a sua transformada de Fourier do


seguinte modo:
hF T, ϕi = hT, F ϕi para todo ϕ ∈ S(Rn )
hFeT, ϕi = hT, Feϕi para todo ϕ ∈ S(Rn ).
e são distri-
Da continuidade da transformada de Fourier em S(Rn ), segue-se que F T e FT
buições temperadas. Mostra-se que

F : S ′ (Rn ) 7→ S ′ (Rn ) e Fe: S ′ (Rn ) 7→ S ′ (Rn )

são isomorfismos contı́nuos sendo F −1 = Fe. Também

F (D αT ) = i|α| xα F T, Dα (F T ) = F ((−i)α xα T ).

Seja u ∈ L2 (Rn ) e F uν , ν = 1, 2, . . ., as funções


Z
−n/2
(F uν )(x) = (2π) e−i(x,y) u(y) dy para todo x no Rn .
||y||≤ν

Mostra-se que F uν ∈ L2 (Rn ) e que (F uν ) é uma sucessão de Cauchy no espaço de Hilbert


L2 (Rn ). O limite em L2 (Rn ) da sucessão (F uν ) é denotado por F u. Observa-se que F u e a
transformada de Fourier de u, u considerada como uma distribuição temperada, coincidem.
Tem-se o seguinte resultado.
Teorema de Plancherel. As aplicações

F : L2 (Rn ) 7→ L2 (Rn ) e Fe: L2 (Rn ) 7→ L2 (Rn )

são isomorfismos de espaços de Hilbert tais que

e Fv)
(F u, F v)L2(Rn ) = (u, v)L2(Rn ) = (Fu, e L2 (Rn )

para todo par u, v no L2 (Rn ).


e respectivamente.
b e ǔ no lugar de F u e Fu,
Serão usadas, também, as notações u
A demonstração dos resultados expostos nas duas últimas seções podem ser encon-
tradas em K. Yosida [16]
1.3. DISTRIBUIÇÕES SOBRE UM ABERTO Ω DO RN 21

Exercı́cios

1. Seja u: R → R uma função contı́nua e periódica de perı́odo P > 0 e (ρν ) uma sucessão
regularizante em R. Mostre que:

i) uν = ρν ∗ u é periódica com perı́odo P .

ii) uν → u uniformemente em R quando ν → ∞.

2. Considere a sucessão de funções (uν ), uν : Rn 7→ R definida por




0 se ||x|| ≥ 1/ν
uν (x) =
ν n+1 se ||x|| < 1/ν

Prove que uν → 0 quase sempre em Rn quando ν → ∞ e que (uν ) não converge em


D ′ (Rn ).

3. Seja ]a, b[ um intervalo aberto finito da reta e A o operador d/dx com domı́nio
n du o
D(A) = u ∈ L2 (a, b); ∈ L2 (a, b) . Mostre que
dx
A: D(A) ⊂ L2 (a, b) → L2 (a, b)

não é contı́nuo.

4. Prove que as expressões (1.3.12) e (1.3.13) da Seção 1.3.3 são equivalentes.

Sugestão: Primeiro mostre que (1.3.12) implica lim xβ D α ϕ(x) = 0. Para isto
||x||→∞
observe que |a| ≤ 12 (1 + a2), para todo a ∈ R, e que sup (1 + ||x||2)k |g(x)| < ∞ implica
x∈Rn
g(x) → 0 quando ||x|| → ∞.

5. Seja k ∈ N. Mostre que existem constantes positivas C1 e C2 tais que


X
C1 (1 + ||x||2)k ≤ x2α ≤ C2 (1 + ||x||2 )k para todo x ∈ Rn
|α|≤k
22 CAPÍTULO 1. RESULTADOS BÁSICOS SOBRE DISTRIBUIÇÕES

6. Seja u a função caracterı́stica do cubo U do Rn :

U = {x ∈ Rn ; |xi | ≤ 1, i = 1, 2, . . . , n}.

Prove que u ∈ L1 (Rn ) mas F u ∈


/ L1 (Rn ).

7. Seja u ∈ L1 (Rn ) ∩ L2 (Rn ). Mostre que


Z
−n/2
(F u)(x) = (2π) e−i(x,y) u(y) dy.
Rn
Capı́tulo 2

Espaços de Sobolev

2.1 Introdução

Este é o capı́tulo fundamental deste texto, pois nele serão demonstrados os resultados
básicos para aplicação às equações diferenciais parciais. Inicialmente introduz-se a noção
de espaço de Sobolev e certas propriedades elementares são mencionadas. Com base nestes
conceitos demonstra-se os teoremas de imersão, incluindo as imersões compactas; estuda-
se o prolongamento; finalizando o capı́tulo com a demonstração de uma versão simples do
teorema do traço e uma generalização do teorema de Green.

2.2 Propriedades Elementares dos Espaços de Sobolev

São estudadas nesta seção propriedades elementares da geometria dos espaços de


Sobolev e alguns resultados simples de dualidade.

23
24 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

2.2.1 Geometria dos Espaços de Sobolev

Sejam Ω um aberto do Rn , 1 ≤ p ≤ ∞ e m ∈ N. Se u ∈ Lp (Ω), foi visto no capı́tulo


anterior que u possui derivadas de todas as ordens no sentido das distribuições. Viu-se
que D α u não é, em geral, uma distribuição definida por uma função de Lp (Ω). Quando
D α u é definida por uma função de Lp (Ω), define-se um novo espaço denominado espaço de
Sobolev. Representa-se por W m,p (Ω) o espaço vetorial de todas as funções u de Lp (Ω) tais
que para todo |α| ≤ m, D α u pertence a Lp (Ω), sendo D α u a derivada de u no sentido das
distribuições. Para cada u ∈ W m,p (Ω) define-se a norma de u por:
 X Z 1/p
α p
||u||m,p = |D u(x)| dx , 1≤p<∞
|α|≤m Ω
X
||u||m,∞ = sup ess |D α u(x)|
x∈Ω
|α|≤m

Não é difı́cil verificar que a função ||u||m,p , 1 ≤ p ≤ ∞, é uma norma em W m,p (Ω). Os
espaços normados W m,p (Ω) são denominados espaços de Sobolev.

Proposição 2.2.1 O espaço de Sobolev W m,p (Ω) é um espaço de Banach.

Demonstração: Seja (uν ) uma sucessão de Cauchy de vetores de W m,p (Ω). Sendo ||D α u||Lp (Ω) ≤
||u||m,p para todo u ∈ W m,p (Ω) e |α| ≤ m, segue-se que (D α uν ) é uma sucessão de Cauchy
do espaço de Banach Lp (Ω), então existe um vetor vα de Lp (Ω) tal que

D α uν → vα em Lp (Ω). (2.2.1)

Quando α = (0, 0, . . . , 0), u = vα , então

uν → u em Lp (Ω). (2.2.2)

Para provar a proposição é suficiente mostrar que D α u = vα no sentido das distribuições,


para todo 0 < |α| ≤ m. Com efeito de (2.2.1) e (2.2.2) resulta

D α uν → vα em D ′ (Ω), 0 < |α| ≤ m (2.2.3)


2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 25

e
uν → u em D ′ (Ω) (2.2.4)

pois Lp (Ω) ֒→ D ′ (Ω). Como a derivação é contı́nua em D ′ (Ω), obtém-se de (2.2.4):

D α uν → D α u em D ′ (Ω). (2.2.5)

De (2.2.3), (2.2.5) e a unicidade dos limites em D ′ (Ω) resulta D α u = vα , 0 < |α| ≤ m, que
mostra a proposição. 
O caso particular p = 2 é útil nas aplicações e neste caso o espaço de Sobolev W m,p (Ω)
é representado por H m (Ω). O espaço H m (Ω) é um espaço de Hilbert com o produto escalar
dado por:
X
(u, v)m = (D α u, D α v)L2 (Ω)
|α|≤m

para todo u, v ∈ H m (Ω), e é denominado espaço de Sobolev de ordem m.

2.2.2 O Espaço W0m,p (Ω)

Quando m = 0, tem-se W 0,p (Ω) = Lp (Ω) e do Corolário 1 do Capı́tulo 1, sabe-se que


D(Ω) é denso em Lp (Ω), mas não é verdade que D(Ω) seja sempre denso em W m,p (Ω) para
m ≥ 1, como será visto posteriormente. Motivado por este fato, define-se o espaço W0m,p (Ω)
como sendo o fecho de D(Ω) em W m,p (Ω). Quando p = 2, escreve-se H0m (Ω) em lugar de
W0m,2 (Ω).

Proposição 2.2.2 Seja u ∈ W0m,p (Ω) e ũ a extensão de u por zero fora de Ω. Tem-se:

a) ũ ∈ W m,p (Rn )

g
b) D α ũ = D α u para todo |α| ≤ m

c) ||u||m,p = ||ũ||m,p .
26 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

e ∈ D(Rn ) ⊂ W m,p (Rn ) e as condições


Demonstração: Dada uma função ϕ ∈ D(Ω), tem-se ϕ
a)–c) são satisfeitas por ϕ. Segue-se que a função σ: D(Ω) → W m,p (Rn ) é uma isometria
linear de espaços normados e pode ser estendida por continuidade a uma isometria linear
σ̃: W0m,p (Ω) → W m,p (Rn ) definida do seguinte modo: se u ∈ W0m,p (Ω) e (ϕν ) é uma sucessão
de funções testes em Ω tais que ϕν → u em W0m,p (Ω), então ϕ
eν → σ̃u em W m,p (Rn ). Mostra-
se que σ̃u = ũ para todo u ∈ W0m,p (Ω). De fato, se ϕν → u em W0m,p (Ω) então a sucessão
eν ) converge para ũ e também para σ̃u em Lp (Rn ), logo ũ − σ̃u. Pelo mesmo argumento

g
tem-se D α ũ = D α u para todo |α| ≤ m o que prova a proposição. 

Com base na proposição anterior, mostra-se que se Ω é um conjunto aberto do Rn ,


pode acontecer que W0m,p (Ω) seja diferente de W m,p (Ω).

Proposição 2.2.3 Se W0m,p (Ω) = W m,p (Ω), o complemento de Ω no Rn , ∁ Ω, possui medida


de Lebesgue igual a zero.

Demonstração: Sejam U uma bola aberta tal que U ∩ Ω 6= φ e θ ∈ D(Rn ) tal que θ = 1
em U ∩ Ω. Considerando u(x) = 1, x em Ω, então v = θu ∈ W m,p (Ω) = W0m,p (Ω), logo
^
ṽ ∈ W m,p (Rn ) e Di ṽ = (D i v) (i = 1, . . . , n). Seja ϕ ∈ D(Ω). Tem-se:
Z Z Z Z
(Di ṽ)ϕ dx = (Di ṽ)ϕ dx + (Di ṽ)ϕ dx = (Dgi v)ϕ dx = 0
U U ∩∁ Ω U ∩Ω U ∩∁Ω

para i = 1, 2, . . . , n, isto é, Di ṽ = 0 em U para i = 1, 2, . . . , n, logo ṽ|U é uma distribuição


definida por uma função constante. Conseqüentemente existe uma constante c tal que A =
{x ∈ U; ṽ 6= c} é de medida zero. Como ṽ(x) = 1 em U ∩ Ω, que é um aberto não vazio,
tem-se c = 1, portanto U ∩ ∁ Ω ⊂ A, donde U ∩ ∁ Ω tem medida zero para qualquer bola
aberta U. De
h[
∞ i [∞
∁Ω = ∁Ω∩ Bν (0) = [∁ Ω ∩ Bν (0)]
ν=1 ν=1

onde Bν (0) é a bola aberta do R de centro em x = 0 e raio ν, segue-se que med ∁ Ω = 0


n

pois

X
med ∁ Ω ≤ med[∁ Ω ∩ B(0, ν)] = 0
ν=1
2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 27

e a demonstração da proposição está concluı́da. 


Observe-se que a recı́proca da Proposição 2.2.3 nem sempre é verdadeira, isto é, se C Ω
ter medida de Lebesgue zero não implica, necessariamente que, W0m,p (Ω) = W m,p (Ω). Para
um estudo das condições necessárias e suficientes sobre C Ω para que se tenha W0m,p (Ω) =
W m,p (Ω) pode consultar-se J.L. Lions [8]. Segundo estes resultados observa-se que se
Ω = Rn \{x0 }, x0 ponto de Rn , e mp > n, 1 < p < ∞, então W0m,p (Ω) está contido
estritamente em W m,p (Ω).
Resulta da Proposição 2.2.3 que se o complemento de Ω possui medida positiva, tem-
se W0m,p (Ω) 6= W m,p (Ω). Em particular, se Ω é um conjunto aberto limitado do Rn , tem-se
W0m,p (Ω) 6= W m,p (Ω). No caso extremo Ω = Rn , tem-se W0m,p (Rn ) = W m,p (Rn ), como uma
conseqüência do seguinte teorema:

Teorema 2.2.1 D(Rn ) é denso no W m,p (Rn ).

Demonstração: A idéia da demonstração é primeiro aproximar os elementos de W m,p (Rn )


por elementos do mesmo espaço mas com suporte compacto. A seguir, aproximar os elemen-
tos de W m,p (Rn ) com suporte compacto por funções testes em Rn .
De fato, seja θ uma função teste no Rn tal que θ = 1 sobre a bola aberta B1 (0) e
θ = 0 fora da bola aberta B2 (0). Para todo ν ∈ N, suponha θν (x) = θ(x/ν) para todo
x ∈ Rn . Portanto, (θν ) é uma sucessão de funções testes em Rn com a seguinte propriedade:

a) θν = 1 sobre Bν (0) e supp (θν ) ⊂ B2ν (0).

b) Para todo α ∈ Nn , α 6= (0, 0, . . . , 0), existe Mα > 0 tal que:

|D α θν (x)| ≤ Mα /ν |α|

para todo x ∈ Rn e ν ∈ N.

Da parte a) e do teorema de Lebesgue sobre a convergência limitada, para todo u ∈ Lp (Rn )


tem-se:

θν u → u em Lp (Rn )
28 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

(D α θν )u → 0 em Lp (Rn ), se α 6= 0.

Se u ∈ W m,p (Rn ), pela fórmula de Leibniz, tem-se:


X α!
D α (θν u) = θν D α u + (D β θν )(D α−β u)
β≤α
β!(α − β)!
β6=0

e dos limites acima, segue-se que para todo 0 < |α| ≤ m a sucessão (D α (θν u)) converge para
D α u em Lp (Rn ). Portanto, (θν u) é uma sucessão de vetores de W m,p (Rn ) convergente para
u em W m,p (Rn ) e além disto, θν u possui suporte compacto contido na bola B2ν (0).
Suponha agora que u ∈ W m,p (Rn ) seja tal que seu suporte seja compacto. Se (ρν ) é
uma sucessão regularizante no Rn , segue-se que (ρν ∗ u) é uma sucessão de funções testes no
Rn . Além disto, para todo |α| ≤ m, tem-se:

D α (ρν ∗ u) = ρν ∗ D α u para todo ν ∈ N.

Portanto,
D α (ρν ∗ u) → D α u em Lp (Rn ),

como uma conseqüência do Teorema 1.2.1 do Capı́tulo 1 o que prova ser ρν ∗ u → u em


W m,p (Rn ). 
A seguir faz-se um comentário relativo ao suporte de funções de W m,p (Ω) o qual será
usado na demonstração da próxima proposição.

Observação 5 Seja u ∈ W m,p (Ω). Então, note-se que supp (D α u) ⊂ supp u, para todo
|α| ≤ m.

Com efeito, seja O = {Oi ; i ∈ i} a famı́lia de todos os subconjuntos abertos Oi de Ω


tais que u = 0 quase sempre em Oi . Então, por definição, ver Seção 1.2.1 do Capı́tulo 1,
[
supp u = Ω\O onde O = Oi . A observação decorrerá se mostrarmos que D α u = 0 quase
i∈I
sempre em Oi , para todo i ∈ I, com |α| ≤ m. Tem-se, para ϕ ∈ D(Oi ):
Z Z
α |α|
(D u)ϕ dx = (−1) u D αϕ dx = 0
Oi Oi
2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 29

que implica, pelo Lema de Du Bois Raymond, D α u = 0 quase sempre em Oi . 


Quando Ω for um aberto arbitrário do Rn , como foi provado, tem-se em geral W m,p (Ω) 6=
W0m,p (Ω). Entretanto, o seguinte resultado caracteriza os elementos de W m,p (Ω) que possuem
suporte compacto.

Proposição 2.2.4 Se u ∈ W m,p (Ω) e possui suporte compacto, então u ∈ W0m,p (Ω).

Demonstração: De fato, seja r = dist(suppu, C Ω) > 0 e ρ uma função teste no Rn tal que
ρ = 1 numa vizinhança U do supp u, U ⊂ Ω. Para toda ϕ em D(Rn ), tem-se ρϕ|Ω é uma
função teste em Ω, logo se |α| ≤ m tem-se:
Z
α
hD ũ, ϕi = (−1) |α|
u(x)D α (ρϕ)(x) dx = (−1)|α| hu, D α(ρϕ|Ω )i =
U Z
α
= hD u, (ρϕ|Ω )i = D α u(x)ρ(x)ϕ(x) dx = hDg α u, ϕi
U

provando que ũ ∈ W m,p (Rn ). Note-se que na última integral usa-se a Observação 5.
Tem-se também supp ũ = sup u, que é um compacto do Rn , portanto (ρν ∗ ũ) é uma
sucessão de funções testes no Rn que converge para ũ em W m,p (Rn ). Seja uν a restrição de
ρν ∗ ũ a Ω. Segue-se então que (uν ) converge para u = ũ|Ω em W m,p (Ω). Para ν > 2/r,
tem-se:

supp(ρν ∗ ũ) ⊂ supp u + B1/ν (0) ⊂ {x ∈ Rn ; dist(x, supp u) ≤ r/2} ⊂ Ω,

logo, supp uν = supp(ρν ∗ ũ)∩Ω = supp(ρν ∗ ũ) é um compacto de Ω. Este argumento significa
que (uν )ν≥2/r é uma sucessão de funções testes em Ω convergindo para u em W m,p (Ω), isto
é, u ∈ W0m,p (Ω), o que prova a proposição. 

Observação 6 Se supp u for compacto e u ∈ W m,p (Ω)∩W s,q (Ω), então existe uma sucessão
(ϕν ) de funções testes em Ω convergente para u na topologia de W m,p (Ω) e também na
topologia de W s,q (Ω). Isto pode ser deduzido a partir da demonstração da Proposição . Em
verdade, este fato é uma conseqüência do seguinte resultado: Sejam Z um espaço vetorial
30 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

e X, Y subespaços vetoriais de Z. Dote a X e Y de estrutura de espaços de Banach e


considere o espaço de Banach X ∩ Y com norma

||u||X∩Y = ||u||X + ||u||Y .

Seja D um subconjunto denso em X e em Y . Então D é um subconjunto denso em X ∩ Y .

2.2.3 O Espaço W −m,q (Ω)


1 1
Suponha 1 ≤ p < ∞ e 1 < q ≤ ∞ tal que p
+ q
= 1. Representa-se por W −m,q (Ω) o
dual topológico de W0m,p (Ω). O dual topológico de H0m (Ω) denota-se por H −m (Ω).
Seja f ∈ W −m,q (Ω) e (ϕν ) uma sucessão de funções testes em Ω tal que ϕν → 0 em
D(Ω). Resulta que ϕν → 0 em W0m,p (Ω), portanto, hf, ϕν i → 0, o que permite concluir que
a restrição de f a D(Ω) é uma distribuição. Considere a aplicação linear

σ: W −m,q (Ω) 7→ D ′ (Ω),

tal que σ(f ) = f |D(Ω) para todo f em W −m,q (Ω). Por ser D(Ω) denso em W0m,q (Ω) resulta
que σ é injetora. Também se (fν ) é uma sucessão de vetores de W −m,q (Ω) tal que fν → 0 em
W −m,q (Ω) então σ(fν ) → 0 em D ′ (Ω), isto é, σ é contı́nua. A aplicação σ permite identificar
W −m,q (Ω) a um subespaço vetorial de D ′ (Ω) e com esta identificação tem-se:

W −m,q (Ω) ֒→ D ′ (Ω).

Quando se diz que uma distribuição T pertence a W −m,q (Ω), significa dizer que T ,
definida em D(Ω), pode ser estendida como um funcional linear contı́nuo ao espaço W0m,p (Ω).
Esta extensão contı́nua é representada por T . O resultado que segue caracteriza as distri-
buições de W −m,q (Ω).

Lema 2.2.1 Seja k um inteiro positivo e E = (Lp (Ω))k normado por:


X
k 1/p
||ω||E = ||ων ||pLp (Ω) ,
ν=1
2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 31

para todo ω = (ω1 , ω2, . . . , ωk ) ∈ E. Um funcional linear f definido em E é contı́nuo se e


somente se existem f1 , f2 , . . . , fk ∈ Lq (Ω), dual de Lp (Ω), tal que
k Z
X
hf, ωi = fν (x)ων (x) dx
ν=1 Ω

para todo ω ∈ E.

A demonstração fica como exercı́cio para o leitor.

Teorema 2.2.2 Seja T uma distribuição sobre Ω, então T ∈ W −m,q (Ω) se e somente se
existem funções gα ∈ Lq (Ω), |α| ≤ m, tais que
X
T = D α gα .
|α|≤m

Demonstração: Suponha T definida pelo somatório acima. Então, para todo ϕ ∈ D(Ω),
tem-se:
 X 1/q
|hT, ϕi| ≤ ||ϕ||m,p ||gα||Lq (Ω) , 1 < p < ∞.
|α|≤m

Sendo D(Ω) denso em W0m,q (Ω), a última desigualdade diz ser possı́vel estender T , por
continuidade, ao espaço W0m,q (Ω) e portanto, T ∈ W −m,q (Ω). O caso p = 1 se procede de
forma análoga.
Seja T ∈ W −m,q (Ω) e k o número de ı́ndices α ∈ Nn tais que |α| ≤ m. Os elementos
u de E = (Lp (Ω))k podem ser escritos como (uα )|α|≤m , uα ∈ Lp (Ω). Desde que a aplicação

σ: W0m,p (Ω) → E

tal que σ(u) = (D α u)|α|≤m é uma isometria linear, tem-se E0 = {(D α u)|α|≤m ; ∈ W0m,q (Ω)} é
um subespaço fechado de E. Seja f0 o funcional linear definido em E0 por

hf0 , (D α u)|α|≤m i = hT, ui, u ∈ W0m,p (Ω),


32 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

isto é, f0 = T σ −1 , é um funcional linear contı́nuo. Pelo teorema de Hahn-Banach, f0 possui


uma extensão ao espaço E, que representa-se por f . Pelo Lema 2.2.1 existe um vetor
(g ′ α )|α|≤m , gα′ ∈ Lq (Ω), dual de Lp (Ω), tal que:
X Z
hf, (ωα )|α|≤m i = gα′ (x)ωα (x) dx
|α|≤m Ω

para todo (ωα )|α|≤m em E.


Para todo ϕ em D(Ω) tem-se:
X Z
α
hT, ϕi = hf0 , (D ϕ)|α|≤m i = gα′ (x)D α ϕ(x) dx =
|α|≤m Ω
X
=h (−1)|α| D α gα′ , ϕi.
|α≤m

Tomando gα = (−1)|α| gα′ , a última igualdade diz que


X
T = D α gα
|α|≤m

o que demonstra o teorema. 

Observação 7 O mesmo argumento usado na demonstração do Teorema 2.2.2 mostra que


se T ∈ (W m,p (Ω))′ , isto é, T pertence ao dual de W m,p (Ω), existem funções gα ∈ Lq (Ω),
dual de Lp (Ω), |α| ≤ m, tais que
X Z
hT, ui = gα (x)D α u(x) dx
|α|≤m Ω

para todo u em W m,p (Ω). Tem-se T |D(Ω) pertence a D ′ (Ω), mas a aplicação

σ: (W m,p (Ω))′ 7→ D ′ (Ω)

definida por σ(T ) = T |D(Ω) não é injetora se W0m,p (Ω) está contido estritamente em W m,p (Ω).

/ W0m,p (Ω) e T o funcional identicamente nulo em


De fato, seja u0 ∈ W m,p (Ω) tal que u0 ∈
W m,p (Ω). Considere, pelo Teorema de Hahn-Banach, S ∈ (W m,p (Ω))′ tal que Su = 0 para
u ∈ W0m,p (Ω) e hS, u0 i =
6 0. Tem-se T |D(Ω) = S|D(Ω) mas T 6= S pois hT, u0 i = 0 e hS, u0 i =
6 0.
Por esta razão diz-se que, se W0m,p (Ω) W m,p (Ω), o espaço (W m,p (Ω))′ não define um espaço
de distribuições sobre Ω.
2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 33

2.2.4 Reflexividade dos Espaços de Sobolev

Para provar que os espaços W m,p (Ω), 1 < p < ∞, são reflexivos, dois resultados são
recordados: o primeiro é que os Lp (Ω), 1 < p < ∞, são reflexivos e o segundo é o Teorema de
Alaoglu-Bourbaki; este teorema afirma que um espaço de Banach E é reflexivo se e somente
se toda sucessão limitada de vetores de E possui uma subsucessão fracamente convergente.

Teorema 2.2.3 Se 1 < p < +∞ então W m,p (Ω) é um espaço de Banach reflexivo.

Demonstração: Seja (uν ) uma sucessão limitada de vetores de W m,p (Ω). Então, para
todo |α| ≤ m, (D α uν ) é limitada em Lp (Ω). Resulta a existência de uma subsucessão
(u′ν ) de (uν ) que converge fracamente, logo (D1 u′ν ) é limitada em Lp (Ω), assim existe uma
subsucessão (u′′ν ) de (u′ν ) tal que (D1 u′′ν ) é fracamente convergente. Por sucessivas aplicações
deste argumento encontra-se uma subsucessão (vν ) de (uν ) e uma função vα ∈ Lp (Ω) tal que
para todo |α| ≤ m a sucessão (D α vν ) é fracamente convergente em Lp (Ω) para um vetor vα .
Isto significa que para cada |α| ≤ m e ω̄ ∈ Lq (Ω), tem-se:
Z Z
α
D vν (x)ω(x) dx → vα (x)ω(x) dx
Ω Ω

1 1
sendo p
+ q
= 1. Considerando-se v = v(0,0,...,0) , da convergência acima, obtém-se que
vν → v em D ′ (Ω) e D α uν → vα em D ′ (Ω), 0 < |α| ≤ m, portanto D α uν → D α v em D ′ (Ω),
|α| ≤ m. Da unicidade dos limites em D ′(Ω) segue-se então que D α v = vα , |α| ≤ m. Assim
v ∈ W m,p (Ω).
Resta somente provar que (vν ) converge para v fracamente em W m,p (Ω). De fato,
seja T uma forma linear contı́nua definida em W m,p (Ω). Da Observação 2.2.3 desta seção,
tem-se a existência de funções gα ∈ Lq (Ω) tais que

X Z
hT, ui = gα (x)D α u(x) dx
|α|≤m Ω
34 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

para todo u ∈ W m,p (Ω). Segue-se que:


X Z
lim hT, vν i = lim gα (x)D α vν (x) dx =
ν→∞ ν→∞ Ω
X Z
|α|≤m

= gα (x)D α v(x) dx = hT, vi


|α|≤m Ω

o que demonstra o teorema. 

2.2.5 Os Espaços H m (Ω) e H −m (Ω)


X
Se L for o operador diferencial (−1)|α| D 2α , resulta que para u ∈ H m (Ω), Lu é
|α|≤m
uma distribuição não necessariamente definida por uma função localmente integrável. Além
X
disto, se u ∈ H m (Ω) e |α| ≤ m, gα = D α u pertence a L2 (Ω) e Lu = (−1)|α| D α gα
|α|≤m
pertence a H −m (Ω) como uma conseqüência do Teorema 2.2.3 deste parágrafo. Portanto,
podemos considerar a realização de L como um operador linear de H m (Ω) em H −m (Ω). A
seguir caracteriza-se a imagem de H0m (Ω) por L.

Proposição 2.2.5 O complemento ortogonal de H0m (Ω) em H m (Ω) é o núcleo do operador


diferencial linear L.

Demonstração: Para todo u em H m (Ω) e ϕ em D(Ω) tem-se:

hLu, ϕi = (u, ϕ̄)m .

Se u pertence ao ortogonal de H0m (Ω) então (u, v)m = 0 para todo v ∈ H0m (Ω), em particular,
(u, ϕ̄)m = 0 para toda função teste ϕ em Ω, portanto, hLu, ϕi = 0 para toda função teste,
isto é, Lu = 0.
Suponha agora u ∈ H m (Ω) e Lu = 0. Então (u, ϕ)m = hLu, ϕ̄i = 0 par toda
ϕ ∈ D(Ω). Sendo D(Ω) denso em H0m (Ω), tem-se (u, v)m = 0 para todo v em H0m (Ω), isto
é, u é ortogonal a H0m (Ω). 
2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 35

Proposição 2.2.6 O operador L transforma H0m (Ω) sobre H −m (Ω), de maneira isométrica.

Demonstração: Seja u ∈ H0m (Ω) tal que Lu = 0. Pela Proposição 2.2.5 tem-se u ∈
H0m (Ω) ∩ (H0m (Ω))⊥ , portanto, u = 0. Se f ∈ H −m (Ω), pelo teorema de Riesz existe
u ∈ H0m (Ω) tal que
hf, vi = (v, u)m para todo v ∈ H0m (Ω),

e ||f ||−m = ||u||m . Segue-se que

hf, ϕi = (ϕ, u)m = hLū, ϕi para todo ϕ ∈ D(Ω),

portanto, tem-se f = Lū com u ∈ H0m (Ω) e ||Lū||−m = ||f ||−m = ||u||m = ||ū||m .

Proposição 2.2.7 D(Ω) é denso em H −m (Ω).

Demonstração: Dado f ∈ H −m (Ω), seja u ∈ H0m (Ω) tal que Lu = f . Se (ϕν ) é uma
sucessão de D(Ω), convergente para u em H0m (Ω), a sucessão (Lϕν ) converge para Lu = f
em H −m (Ω), porque L é uma isometria. Isto prova a proposição, desde que Lϕν é uma
função teste. 

Proposição 2.2.8 D(Ω) é denso em D ′ (Ω).

Demonstração: Tem-se D(Ω) ֒→ H0m (Ω) com D(Ω) denso em H0m (Ω). Então por dualidade
resulta H −m (Ω) ֒→ D ′ (Ω) com H −m (Ω) denso em D ′(Ω). Desta densidade e da densidade
de D(Ω) em H −m (Ω) dada pela Proposição 2.2.7, segue o corolário. 
Para concluir esta seção mostra-se a Desigualdade de Poincaré da qual obtém-se sig-
nificantes propriedades para os espaços H0m (Ω). Inicia-se introduzindo a seguinte definição.
Diz-se que o aberto Ω do Rn é limitado na direção xi se existe um intervalo aberto finito
]a, b[ da reta tal que
pri Ω ⊂ ]a, b[

onde pri é a projeção de Rn sobre o eixo xi .


36 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Teorema 2.2.4 (Desigualdade de Poincaré) Seja Ω um aberto do Rn limitado em al-


guma direção xi . Então
Z Z
∂u 2
2
|u| dx ≤ (b − a) 2
u ∈ H01 (Ω)
∂xi dx para todo (2.2.6)
Ω Ω

onde pri Ω ⊂]a, b[ .

Demonstração: Primeiro mostra-se a desigualdade (2.2.6) para ϕ ∈ D(Ω). O resultado


geral seguirá então por densidade. Inicialmente considera-se ϕ ∈ D(]a, b[). Tem-se:
Z t
ϕ(t) = ϕ′ (s) ds, a ≤ t ≤ b,
a

Z b
2
que acarreta, pela desigualdade de Schwarz, |ϕ(t)| ≤ (b − a) |ϕ′(s)|2 ds, a qual implica
a

Z b Z b
2 2
|ϕ(t)| dt ≤ (b − a) |ϕ′ (t)|2 dt. (2.2.7)
a a

Sem perda de generalidade supõe-se que Ω é limitado na direção x1 . Considera-se a notação


x = (t, x′ ) onde x′ = (x2 , x3 , . . . , xn ) e seja ϕ ∈ D(Ω), então:
Z Z Z b 
2
|ϕ(x)| dx = |ϕ(t, x′ )|2 dt dx′ . (2.2.8)
Ω Rn−1 a

Observa-se que ψx′ (t) = ϕ(t, x′ ) pertence a D(]a, b[) para cada x′ ∈ Rn−1 . Logo a desigual-
dade (2.2.7) com ψx′ implica
Z Z b 2
b ∂ϕ
′ 2
|ϕ(t, x )| dt ≤ (b − a) ′ 2
∂t (t, x ) dt.
a a

Considerando esta desigualdade em (2.2.8) resulta:


Z Z  Z b ∂ϕ 2 

Z
∂ϕ
2

2
|ϕ(x)| dx ≤ (b − a) 2 (t, x ) dt dx = (b − a)
′ ′ 2 (x) dx,
∂t
Ω Rn−1 a Ω ∂x1

que é precisamente a desigualdade (2.2.6). Assim o teorema está provado. 


2.2. PROPRIEDADES ELEMENTARES DOS ESPAÇOS DE SOBOLEV 37

Observação 8 Considere-se em H01 (Ω), Ω limitado em alguma direção xi de Rn , a ex-


pressão
Xn Z
∂u 2 1/2
||u|| =
∂xi dx .
i=1 Ω

Então a desigualdade de Poincaré diz que ||u|| é uma norma em H01 (Ω) e que em H01 (Ω) as
normas ||u|| e ||u||1 = ||u||H 1(Ω) são equivalentes. Com base neste resultado, em H01 (Ω), Ω
limitado em alguma direção xi de Rn , considera-se o produto escalar
Xn Z
∂u ∂v
((u, v)) = dx.
i=1 Ω
∂xi ∂xi

Corolário 2 Em H0m (Ω), Ω aberto limitado em alguma direção xi de Rn , as normas


 X Z 1/2
||u|| = |D α u|2 dx
|α|=m Ω

e ||u||1 são equivalentes.

Demonstração: Mostra-se que


X Z
||u||21 = |D α u|2 dx ≤ C||u||2 (2.2.9)
|α|≤m Ω

onde C > 0 é uma constante independente de u ∈ H0m (Ω). A outra desigualdade é imediata.
Seja u ∈ H0m (Ω) então D α u ∈ H01 (Ω) para todo |α| ≤ m − 1. Da Observação 8 resulta então
Z Xn Z 2

α 2
|D u| dx ≤ C D α
u
∂xi dx.
Ω i=1 Ω

Isto acarreta,
Z X Z
α 2
|D u| dx ≤ C |D β u|2 dx para todo |α| ≤ m − 1.
Ω |β|=m Ω

Esta desigualdade implica (2.2.9) e a demonstração está concluı́da. 


38 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Corolário 3 Em W0m,p (Ω), Ω aberto limitado em alguma direção xi de Rn e 1 ≤ p < ∞,


as normas
 X Z 1/p
α p
||u|| = |D u| dx
|α|=m Ω

e ||u||m,p são equivalentes.

Demonstração: Aplicando raciocı́nio análogo ao usado para obter (2.2.8), resulta


Z b Z b  
p
p+q 1 1
|ϕ(t)| dt ≤ (b − a) q |ϕ′ (t)|p dt, 1 < p < ∞, + = 1
a a p q

e
Z b Z b
|ϕ(t)| dt ≤ (b − a) |ϕ′(t)| dt, ∀ ϕ ∈ D(]a, b[).
a a

Com estas desigualdades e com argumentos semelhantes aos usados na demonstração do


Corolário 2, segue o corolário. 
Observe que o Corolário 3 com Ω limitado do Rn também pode ser obtido usando as
desigualdades de Sobolev e serem demonstradas no próximo parágrafo.

Observação 9 Considere-se em H0m (Ω), Ω aberto limitado em alguma direção xi de Rn ,


a norma introduzida na Observação 8. Então pelos argumentos usados na demonstração do
Teorema 2.2.4, obtém-se que

X
L: H0m (Ω) 7→ H −m (Ω), L= (−1)|α| D 2α
|α|≤m

é uma isometria linear. Em particular

Xn
∂2
−∆: H01 (Ω) 7→ H −1
(Ω), ∆=
i=1
∂x2i

é uma isometria linear.


2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 39

2.3 Imersões de Espaços de Sobolev


Neste parágrafo estuda-se a relação entre os espaços de Sobolev W m,p (Rn ) e certos espaços
clássicos de funções em Rn . Mostra-se certa regularidade dos objetos de um certo espaço
de Sobolev, isto é, mostra-se que quando a ordem m de W m,p (Rn ) é grande eles possuem
derivadas genuinas em Rn .
O estudo é dividido em três partes:

I) n≥2e1≤p<∞

II) n=1e1≤p<∞

III) n≥1ep=∞

Na parte I) analisa-se os três casos possı́veis: mp < n, mp = n e mp > n. As partes II) e


III) são estudadas nas Seções 2.3.4 e 2.3.5, respectivamente. Assim todos os casos possı́veis
são analisados.
No que se segue, nas três primeiras seções, estuda-se a parte I), isto é, quando n ≥ 2
e 1 ≤ p < ∞.

2.3.1 Caso mp < n

Nesta seção mostra-se a imersão contı́nua de W m,p (Rn ) em Lq (Rn ), q especial.


Inicia-se o estudo com a obtenção de alguns resultados preliminares. Representa-se
por pi (i = 1, 2, . . . , n) a projeção de Rn em Rn−1 dado por

pi x = (x1 , . . . , xi−1 , xi+1 , . . . , xn ), x = (x1 , x2 , . . . , xn ).

Os pontos do Rn+1 são também escritos sob a forma (x, t) sendo x ∈ Rn e t ∈ R; as projeções
de Rn+1 em Rn dadas por

σi (x, t) = (pi x, t), i = 1, 2, . . . , n e σn+1 (x, t) = x.


40 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Proposição 2.3.1 (Sobolev-Gagliardo) Se u1 , u2 , . . . , un ∈ Ln−1 (Rn−1 ) então

a) u = (u1 p1 ) · (u2 p2 ) . . . (un pn ) ∈ L1 (RN )


n
Y
b) ||u||L1(Rn ) ≤ ||ui||Ln−1 (Rn−1 )
i=1

Demonstração: Inicialmente, observe que se x ∈ Rn , (ui pi )(x) = ui (x1 , . . . , xi−1 , xi+1 , . . . , xn ).


No caso n = 2 vem u(x1 , x2 ) = u1 (x1 )u2 (x2 ) para todo (x1 , x2 ) ∈ Rn , portanto

||u||L1(R2 ) = ||u1||L1 (R) · ||u2||L1 (R) .

Suponha a proposição verdadeira para n ≥ 2. Dados ω1 , ω2 , . . . , ωn , ωn+1 em Ln (Rn ), seja


n+1
Y
ω= ωi σi , isto é,
i=1
n
Y
ω(x, t) = ωi (pi x, t) · ωn+1 (x) para todo (x, t) ∈ Rn+1 .
i=1

Para todo t ∈ R, considere:

ui,t (y) = |ωi (y, t)|n/n−1, y ∈ Rn−1 , i = 1, 2, . . . , n


Yn Yn
ut (x) = ui,t pi (x) = |ωi (pi x, t)|n/n−1 , x ∈ Rn .
i=1 i=1

Do teorema de Fubini obtém-se ui,t ∈ Ln−1 (Rn−1 ) e da hipótese indutiva obtém-se


ut ∈ L1 (Rn ) e também
n
Y
||ut ||L1 (Rn ) ≤ ||ui,t||Ln−1 (Rn−1 ) . (2.3.10)
i=1
n−1 1
Observando que |ω(x, t)| = ut (x)(n−1)/n |ωn+1 (x)| e que + = 1, de (2.3.10) e da
n n
desigualdade de Hölder, obtém-se:
Z Z
|ω(x, t)|dx = (ut (x))(n−1)/n |ωn+1(x)| dx ≤
Rn Rn
Z (n−1)/n
≤ ut (x)dx ||ωn+1||Ln (Rn ) ≤ (2.3.11)
Rn
n
Y (n−1)/n
≤ ||ui,t||Ln−1 (Rn−1 ) · ||ωn+1||Ln (Rn )
i=1
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 41

Obtém-se também,
Z
||ui,t||Ln−1
n−1 (Rn−1 ) = |ωi(y, t)|n dy.
Rn−1

(n−1)/n
Se θi (t) = ||ui,t||Ln−1 (Rn−1 ) segue-se do teorema de Fubini que θi ∈ Ln (R) e que:
Z Z
θin (t) dt = |ωi(y, t)|n dydt,
R Rn

isto é,
||θ||Ln(R) = ||ω||Ln(Rn ) . (2.3.12)

De (2.3.11) e (2.3.12) obtém-se:


Z Z Y
n
|ω(x, t)| dxdt ≤ θi (t)dt · ||ωn+1 ||Ln(Rn ) ≤
Rn+1 R i=1
n Z
Y 1/n
≤ θin (t) dt ||ωn+1||Ln (Rn ) ≤
i=1 R
n
Y
≤ ||θi ||Ln (R) · ||ωn+1 ||Ln (Rn ) =
i=1
n+1
Y
= ||ωi||Ln (Rn )
i=1

o que prova a proposição.

(n − 1)p n(p − 1)
Proposição 2.3.2 Dado 1 ≤ p < n, considere C0 = es= · Então, para
n−p n−p
toda função teste ϕ sobre o Rn , existem u1 , u2, . . . , un no Ln−1 (Rn−1 ), sendo:
Z
n−1
a) ||ui||Ln−1 (Rn−1 ) ≤ C0 |ϕ(x)|s |Di ϕ(x)| dx, i = 1, 2, . . . , n
Rn

b) |ϕ(x)|p/(n−p) ≤ |ui (pi x)|, para x ∈ Rn

Demonstração: Não há perda de generalidade admitir-se i = 1. Se u1 (y) = sup |ϕ(t, y)|p/(n−p),
t∈R
y ∈ Rn−1 , é simples concluir, notando que o suporte de u1 é um compacto de Rn−1 , que
42 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

u1 ∈ Ln−1 (Rn−1 ) e que u1 satisfaz a condição b). Mostra-se que u1 também satisfaz a
primeira condição a). Com efeito, para todo x ∈ Rn tal que ϕ(x) 6= 0, tem-se:

D1 |ϕ|C0 = D1 (ϕϕ̄)C0 /2 = (C0 /2)|ϕ|C0 −2 (ϕD1 ϕ̄ + ϕ̄D1 ϕ) = C0 |ϕ|C0 −2 Re(ϕD1 ϕ̄)

donde, notando que C0 = s + 1,


D1 |ϕ(x)|C0 ≤ C0 |ϕ(x)|s |D1 ϕ(x)|.

É simples verificar que se x pertence à fronteira de supp ϕ então existe D1 |ϕ(x)|C0 e


D1 |ϕ(x)|C0 = 0. Claramente D1 |ϕ(x)|C0 = 0 para todo x fora de suppϕ. Da última
desigualdade obtém-se que D1 |ϕ(x)|C0 é contı́nua para todo x pertencente à fronteira de
suppu. Resulta então que D1 |ϕ|C0 é uma função contı́nua em Rn . Portanto disto e da última
desigualdade vem:
Z t Z
C0 C0
|ϕ(t, y)| = D1 |ϕ(ξ, y)| dξ ≤ C0 |ϕ(ξ, y)|s |D1 ϕ(ξ, y)| dξ
−∞ R

que acarreta
Z
n−1
|u1(y)| ≤ C0 |ϕ(ξ, y)|s |D1 ϕ(ξ, y)| dξ
R

de onde conclui-se a parte a). 

Proposição 2.3.3 (Desigualdade de Sobolev) Suponha 1 ≤ p < n e considere

1 1 1 (n − 1)p
= − e C0 = ·
q p n (n − p)

Então para cada ϕ ∈ D(Rn ) tem-se:


n
C0 X
||ϕ||Lq (Rn ) ≤ ||Di ϕ||Lp (Rn ) .
n i=1
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 43

Demonstração: Quando p = 1, tem-se s = 0, C0 = 1 e (n − 1)q = n na Proposição 2.3.2.


Portanto,
Z n−1  Z n
Y n−1
(n−1)q n/(n−1)
||ϕ||Lq (Rn ) = |ϕ(x)| dx ≤ |ui(pi (x))| dx .
Rn Rn i=1

Disto e das Proposições 2.3.1 e 2.3.2 decorre


n
Y n
Y
(n−1)q
||ϕ||Lq (Rn ) ≤ ||ui||Ln−1
n−1 (Rn−1 ) ≤ ||Di ϕ||L1 (Rn ) (2.3.13)
i=1 i=1

que implica a desigualdade de Sobolev, pois para números reais não negativos a1 , a2 , . . . , an
Y n 1/n 1 X
n
tem-se ai ≤ ai . No caso p > 1, considere p′ = p/(p − 1). Desde que
i=1
n i=1
p′ s = np/(n − p) = q, tem-se:

|| |ϕ|s||Lp p′ (Rn ) = ||ϕ||qLq (Rn ) .

Considere u1 , u2, . . . , un em Ln−1 (Rn−1 ) como na Proposição 2.3.2. Pela parte a) desta
proposição e pela desigualdade de Hölder, obtém-se:

q/p′
||ui||Ln−1
n−1 (Rn−1 ) ≤ C0 ||Di ϕ||Lp (Rn ) ||ϕ||Lq (Rn ) .

Da parte b) da Proposição 2.3.2, resulta:


n
Y
q p/(n−p) n
|ϕ(x)| = (|ϕ(x)| ) ≤ |ui (pi (x))|, x ∈ Rn .
i=1

Pela Proposição 2.3.1 e pelas duas últimas desigualdades, obtém-se


Z n−1 Z n
!n−1
(n−1)q
Y
q
||ϕ||Lq (Rn ) = |ϕ(x)| dx ≤ |ui (pi (x))| dx ≤
Rn Rn i=1
n
Y n
Y
nq/p′
≤ ||ui||Ln−1
n−1 (Rn−1 ) ≤ C0n ||ϕ||Lq (Rn ) ||Diϕ||Lp (Rn ) .
i=1 i=1

nq
Note que sendo (n − 1)q −= n, a desigualdade anterior implica a de Sobolev quando
p′
6 0. Quando ϕ = 0 a desigualdade segue diretamente. Assim a demonstração está
ϕ =
concluı́da. 
44 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Observação 10 Note-se que a desigualdade de Sobolev dada na Proposição 2.3.3 é válida


para toda ϕ ∈ C01 (Rn ), isto é, para ϕ ∈ C 1 (Rn ) e ϕ com suporte compacto. Em particular
de (2.3.13) resulta com q = n/(n − 1):
n
Y
||ϕ||nLn/(n−1) (Rn ) ≤ ||Diϕ||L1 (Rn ) para todo ϕ ∈ C01 (Rn ).
n=1

Observação 11 Note-se que se 1 ≤ p < ∞ e m, n são números naturais não negativos


então

1 m
a) − > 0 se e somente se mp < n
p n
1 1 m
b) = − > 0 implica p < q
q p n

A seguir mostra-se a imersão de W m,p (Rn ) em Lq (Rn ).

1 1 m
Teorema 2.3.1 (Sobolev) Sejam 1 ≤ p < ∞, mp < n e = − · Então W m,p (Rn )
q p n
está contido em Lq (Rn ) e se verifica
 C m X
0
||u||Lq (Rn ) ≤ ||D α u||Lp (Rn ) , (2.3.14)
n
|α|=m

para todo u ∈ W m,p (Rn ), onde C0 = (n − 1)p/(n − p).

Demonstração: Prova-se primeiro a desigualdade para as funções ϕ em D(Rn ). Na prova


aplica-se o método de indução com relação a m. Com efeito, para m = 1 a desigualdade
(2.3.14) é a desigualdade obtida na Proposição 2.3.3. Suponha então que (2.3.14) é válida
para m ≥ 1, isto é,
 C m X
0
||ϕ||Lq1 (Rn ) ≤ ||D αϕ||Lp1 (Rn ) para todo ϕ ∈ D(Rn )
n
|α|=m
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 45

1 1 m
com mp1 < n e = − · Deseja-se obter a desigualdade (2.3.14) para m + 1. Tem-se
q1 p1 n
então (m + 1)p < n e

1 1 m+1 1 m 1 1 1 m 1 1 1
= − = − − , = − > 0, = − ·
q p n p n n q1 p n q q1 n

Da hipótese de indução e da Proposição 2.3.3 resulta então para ϕ ∈ D(Rn ):


 C m X
0
||ϕ|| Lq1 (Rn ) ≤ ||D α ϕ||Lp (Rn ) (2.3.15)
n
|α|=m
X n
C0
||ϕ||Lq (Rn ) ≤ ||Di ϕ||Lq1 (Rn ) . (2.3.16)
n i=1

De (2.3.15) obtém-se:
 C m X
0
||Di ϕ||Lq1 (Rn ) ≤ ||D α Di ϕ||Lp (Rn )
n
|α|=m

portanto
n  m+1 Xn X
C0 X C0
||Diϕ||Lq1 (Rn ) ≤ ||D α Di ϕ||Lp (Rn ) =
n i=1 n i=1 |α|=m
 m+1 X (2.3.17)
C0
= ||D α ϕ||Lp (Rn ) .
n
|α|=m+1

De (2.3.16) e (2.3.17) segue a desigualdade (2.3.14) para m + 1. Assim o teorema está


mostrado para ϕ em D(Rn ).
Seja u ∈ W m,p (Rn ). Então existe uma sucessão (ϕν ) de funções de D(Rn ) tal que
ϕν → u em W m,p (Rn ). Logo

D α ϕν → D α u em Lp (Rn ), para todo |α| ≤ m. (2.3.18)

Tem-se:
 C m X
0
||ϕν − ϕµ ||Lq (Rn ) ≤ ||D α ϕν − D α ϕµ ||Lp (Rn ) .
n
|α|=m
46 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Logo, pelas convergências (2.3.18), segue-se que (ϕν ) é uma sucessão de Cauchy em Lq (Rn ).
Resulta disto e de (2.3.18) que

ϕν → v em Lq (Rn ) e ϕν → u em Lp (Rn ). (2.3.19)

Passando ambas as convergências ao espaço D(Rn ) resulta u = v, portanto u ∈ Lq (Rn ).


Assim W m,p (Rn ) está contido em Lq (Rn ). Tomando o limite em ambos os lados da desigual-
dade
 C m X
0
||ϕν ||Lq (Rn ) ≤ ||D αϕν ||Lp (Rn )
n
|α|=m

segue das convergências (2.3.18) e (2.3.19), a desigualdade (2.3.14) para u ∈ W m,p (Rn ). Isto
prova o teorema. 
Como uma conseqüência direta do Teorema 2.3.1, segue o resultado:

1 1 m
Corolário 4 Seja 1 ≤ p < ∞, mp < n e = − · Então
q p n

W m,p (Rn ) ֒→ Lq (Rn ).

np
Corolário 5 Se 1 ≤ p < ∞, mp < n e p ≤ q ≤ então
n − mp

W m,p (Rn ) ֒→ Lq (Rn ).

np
Demonstração: De fato, ponha q0 = e considere o espaço de Banach E = Lp (Rn )∩
n − mp
Lq0 (Rn ) com a norma
||u||E = ||u||Lp(Rn ) + ||u||Lq0 (Rn ) .

Sendo p ≤ q ≤ q0 , tem-se pela Proposição 1.2.1 do Capı́tulo 1, que E ֒→ Lq (Rn ). Pelo


Corolário 4 resulta W m,p (Rn ) ֒→ E. Destas duas imersões contı́nuas segue o corolário. 

1 1 m
Corolário 6 Se 1 ≤ p < ∞, mp < n e = − então W m+k,p(Rn ) ֒→ W k,q (Rn ) para
q p n
todo k inteiro não negativo.
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 47

Demonstração: Seja |α| ≤ k então pelo Teorema 2.3.1 resulta para ϕ em D(Rn ):
 m X
α C0
||D ϕ||Lq (Rn ) ≤ ||D β D α ϕ||Lp (Rn )
n
|β|=m

de onde  1/p
X
||D αϕ||Lq (Rn ) ≤ C  ||D γ ϕ||pLp (Rn ) 
|γ|≤m+k

que implica

||ϕ||W k,p(Rn ) ≤ C||ϕ||W m+k,p(Rn )

onde C > 0 é uma constante independente de ϕ. Desta desigualdade e da densidade de


D(Rn ) em W m+k,p (Rn ) segue o corolário. 

Observação 12 Seja 1 ≤ p < n. Note-se que se existem constantes C > 0 e 1 ≤ r ≤ ∞


verificando a desigualdade
n
X
||ϕ||Lr (Rn ) ≤ C ||Diϕ||Lp (Rn ) para todo ϕ ∈ D(Rn ).
i=1

1 1 1
Então r = q onde = − ·
q p n

Com efeito, da desigualdade com ϕλ (x) = ϕ(λx), λ > 0, resulta


n
n X
≤ C λ(1+ r − p )
n
||ϕ||Lr (Rn ) ||D ϕ|| i Lp (Rn ) para todo λ > 0
i=1

n n
que implica 1 + − = 0. 
r p

2.3.2 Caso mp = n

Nesta seção mostra-se que W m,p (Rn ) está imerso continuamente em Lq (Rn ) para todo
q ∈ [p, ∞[ . Para isto prova-se inicialmente o seguinte resultado:
48 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Lema 2.3.1 Seja q ∈ [n, ∞[ . Então existe uma constante C(n, q) > 0 tal que

||ϕ||Lq (Rn ) ≤ C(n, q)||ϕ||W 1,n(Rn ) para todo ϕ ∈ D(Rn ).

Demonstração: De fato, da Observação 10 deste capı́tulo resulta


n
Y 1/n
||ϕ||Ln/(n−1) (Rn ) ≤ ||Di ϕ||L1(Rn ) para todo ϕ ∈ C01 (Rn ).
i=1

Seja ρ > 1 e ψ = |ϕ|ρ−1 ϕ com ϕ ∈ D(Rn ). Então desta desigualdade com ψ resulta
n
Y 1/n
||ϕ||ρLρn/(n−1) (Rn ) ≤ρ || |ϕ|ρ−1 Di ϕ||L1 (Rn ) .
i=1

1 1
Tem-se, com + ′ = 1:
p p
Z
|ϕ|ρ−1 |Di ϕ| dx = ||ϕ||ρ−1 ′
L(ρ−1)p (Rn )
||Diϕ||Lp (Rn ) .
Rn

Combinando as duas últimas desigualdades resulta


n
Y 1/n
||ϕ||ρLρn/(n−1) (Rn ) ≤ ρ||ϕ||ρ−1 ′
L(ρ−1)p (Rn )
||Diϕ||Lp (Rn ) .
i=1

Fazendo p = n, portanto p′ = n/(n − 1), nesta última desigualdade e notando que a média
geométrica é menor ou igual que a média aritmética, obtém-se:
X n
ρ
||ϕ||ρLρn/(n−1) (Rn ) ≤ ||ϕ||ρ−1
L(ρ−1)n/(n−1) n
(R )
||Diϕ||Ln (Rn ) .
n i=1

Desta expressão e aplicando a desigualdade de Hölder para números reais não negativos
aρ bρ/(ρ−1)
ab ≤ + resulta
ρ ρ/(ρ − 1)
n
(ρ − 1) 1X
||ϕ||Lρn/(n−1) (Rn ) ≤ ||ϕ||L(ρ−1)n/(n−1) (Rn ) + ||Di ϕ||Ln (Rn ) . (2.3.20)
ρ n i=1
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 49

A expressão (2.3.20) implicará a seguinte desigualdade:

(n − 1)
||ϕ||L(n+k)n/(n−1) (Rn ) ≤ ||ϕ||Ln(Rn ) +
n + k
(k + 1)(2n + k) X
n (2.3.21)
+ ||Diϕ||Ln (Rn ) , ∀ k = 0, 1, 2, . . .
2n(n + k) i=1

Mostra-se esta desigualdade por indução com relação a k. Com efeito, fazendo ρ = n em
(2.3.20) resulta (2.3.21) com k = 0. Suponha (2.3.21) verdadeiro para k ≥ 0 e considere
k + 1. Fazendo ρ = n + k + 1 em (2.3.20) e usando a hipótese de indução, obtém-se:

||ϕ||L(n+k+1)n/(n−1) (Rn ) ≤
" n
#
n+k n−1 (k + 1)(2n + k) X
≤ ||ϕ||Ln(Rn ) + ||Diϕ||Ln (Rn ) +
n+k+1 n+k 2n(n + k) i=1
n
1X n−1
+ ||Di ϕ||Ln (Rn ) = ||ϕ||Ln(Rn ) +
n i=1 n+k+1
n
(k + 2)(2n + k + 1) X
+ ||Diϕ||Ln (Rn )
2n(n + k + 1) i=1

que dá a desigualdade (2.3.21) com k + 1.


(n+k)n
Seja q ∈ [n, ∞[ então existe k = 0, 1, . . . tal que n ≤ q ≤ n−1
· Pela desigualdade
de interpolação, Proposição 1.2.1 do Capı́tulo 1, resulta:

||ϕ||Lq (Rn ) ≤ θ||ϕ||Ln(Rn ) + (1 − θ)||ϕ||L(n+k)n/(n−1) (Rn ) (2.3.22)

1 θ 1−θ
onde = + e 0 ≤ θ ≤ 1. Combinando (2.3.21) e (2.3.22) obtém-se a
q n (n + k)n/(n − 1)
desigualdade do lema. 

Teorema 2.3.2 Seja 1 ≤ p < ∞, mp = n e q ∈ [p, ∞[ . Então

W m,p (Rn ) ֒→ Lq (Rn ).


50 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Demonstração: Mostra-se o teorema por indução com relação a m. Com efeito, se m = 1


então p = n e o Lema 2.3.1 diz

||ϕ||Lq (Rn ) ≤ C(n, q)||ϕ||W 1,p(Rn ) para todo ϕ ∈ D(Rn ).

O teorema segue então pela densidade de D(Rn ) em W 1,p (Rn ). Suponha que o teorema é
1 1 1
válido para m ≥ 1 e considere m + 1 com (m + 1)p = n. Tem-se então = − > 0 que
n/m p n
1,p n n/m n
implica, pelo Corolário 4, W (R ) ֒→ L (R ), que por sua vez, pelo Corolário 6, acarreta
W m+1,p (Rn ) ֒→ W m,n/m (Rn ). Pela hipótese de indução resulta W m,n/m (Rn ) ֒→ Lq (Rn ) para
todo q ∈ [n/m, ∞[ . Das duas últimas inclusões contı́nuas segue

W m+1,p (Rn ) ֒→ Lq (Rn ) para todo q ∈ [n/m, ∞[ . (2.3.23)

n
De (2.3.23) resulta W m+1,p (Rn ) ֒→ Ln/m (Rn ) e como W m+1,p (Rn ) ֒→ Lp (Rn ), p = m+1
,
segue-se por interpolação de espaços que

W m+1,p (Rn ) ֒→ Lq (Rn ) para todo q ∈ [p, n/m]. (2.3.24)

De (2.3.23) e (2.3.24) segue o teorema. 


No caso p = 1 tem-se o resultado suplementar W n,1 (Rn ) ֒→ Cb0 (Rn ). Cb0 (Rn ) é o
espaço de Banach das funções contı́nuas e limitadas em Rn com valores em K, equipado com
a norma do supremo em Rn (ver a seção a seguir).

2.3.3 Caso mp > n

Nesta seção mostra-se que W m,p (Rn ) está imerso continuamente num espaço de funções
regulares em Rn .
Inicialmente introduz-se alguns espaços que serão utilizados na formulação dos resul-
tados. Com efeito, denota-se por Cbk (Rn ), k inteiro não negativo, o espaço de Banach das
funções u: Rn 7→ K de classe C k , limitadas assim como todas suas derivadas até a ordem k,
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 51

equipado com a norma


||u||Cbk (Rn ) = max sup |D α u(x)|,
|α|≤k x∈Rn

e denota-se por C k,λ(Rn ), 0 < λ ≤ 1, o espaço de Banach das funções u ∈ Cbk (Rn ) tais
que u e todas suas derivadas até a ordem k são Hölderianas com expoente λ em Rn , mais
precisamente,
|D αu(x) − D α u(y)|
max sup < ∞,
|α|≤k x,y∈Rn ||x − y||λ
x6=y

equipado com a norma


|D α u(x) − D α u(y)|
||u||C k,λ(Rn ) = ||u||Cbk (Rn ) + max sup ·
|α|≤k x,y∈Rn ||x − y||λ
x6=y

Observação 13 Claramente C k,λ (Rn ) ֒→ Cbk (Rn ). Tem-se também que

C k,λ (Rn ) ֒→ C k,σ (Rn ) se 0 < σ < λ.

Com efeito, se x 6= y e ||x − y|| ≤ 1 então


|D αu(x) − D α u(y)| |D α u(x) − D α u(y)|

||x − y||σ ||x − y||λ
e se ||x − y|| > 1 então
|D α u(x) − D α u(y)|
≤ |D α u(x) − D α u(y)| ≤ 2 sup |D α u(z)|
||x − y||σ z∈Rn

de onde segue a afirmação. 


Tem-se o seguinte resultado:
n
Lema 2.3.2 Seja λ0 = m − com 0 < λ0 ≤ 1, Ur um paralelepı́pedo do Rn de lados
p
paralelos aos eixos coordenados e cada lado de comprimento r > 0 e x0 ∈ Ur . Então
Z n
1 λX
ϕ(x0 ) − 1
ϕ(z) dz ≤ r ||Diϕ||Lq (Rn ) para todo ϕ ∈ D(Rn )
r n Ur λ i=1

onde
52 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

1 1 m−1
a) λ = λ0 e = − se λ0 < 1
q p n
n
b) 0 < λ < 1 e q = se λ0 = 1
1−λ

1 m−1 n
Observação 14 No caso a) tem-se − > 0 pois λ0 < 1 e no caso b), >p
p n 1−λ
pois λ0 = 1.

Demonstração do Lema: Seja z ∈ Ur e u(t) = ϕ(tz + [1 − t]x0 ), ϕ ∈ D(Rn ). Então


Z 1 n Z
X 1

ϕ(z) − ϕ(x0 ) = u(1) − u(0) = u (t) dt = Di ϕ(tz + [1 − t]x0 )(zi − xoi )
0 i=1 0

que implica
n Z
X 1
|ϕ(z) − ϕ(x0 )| ≤ r |Di ϕ(tz + [1 − t]x0 )| dt.
i=1 0
Z
1
Notando que ϕ(x0 ) = ϕ(x0 ) dz e usando esta última desigualdade, obtém-se:
rn Ur
Z Z
1 1

ϕ(z) dz − ϕ(x0 ) = n [ϕ(z) − ϕ(x0 )] dz
rn r Ur
Ur
Xn Z 1Z (2.3.25)
≤ r 1−n |Di ϕ(tz + [1 − t]x0 )|dzdt.
i=1 0 Ur

Fazendo y = tz + (1 − t)x0 resulta


Z Z
|Di ϕ(tz + [1 − t]x0 | dz = |Di ϕ(y)|t−n dy =
Ur Z (1−t)x0 +tUr
−n
=t |Di ϕ(y)|χ(1−t)x0 +tUr (y) dy
Rn

onde χ(1−t)x0 +tUr é a função caracterı́stica do conjunto (1 − t)x0 + tUr . Aplicando a desi-
 
gualdade de Hölder β1 + β1′ = 1 nesta última igualdade, vem:
Z

|Di ϕ(tz + [1 − t]x0 )| dz ≤ t−n ||Diϕ||Lβ (Rn ) (tn r n )1/β . (2.3.26)
Ur
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 53

Combinando (2.3.25) e (2.3.26) resulta


Z Xn Z 1

ϕ(x0 ) − 1
ϕ(z) dz ≤ r
1−n+ βn′
||Diϕ||Lβ (Rn ) t
−n+ βn′
dt.
n
r Ur i=1 0

n n
Observando que 1 − n + ′
= 1 − obtém-se desta última desigualdade
β β
Z Xn Z 1
1 1− n
ϕ(x0 ) −
ϕ(z) dz ≤ r β ||Diϕ||Lβ (Rn ) t−n/β dt. (2.3.27)
n
r Ur i=1 0

Fazendo β = q em (2.3.27) obter-se-á o lema. Com efeito:


q = np/(n − [m − 1]p), em (2.3.27). Então notando que
Caso a). Considere β = q, Z
1
n n
1 − = m − = λ0 , portanto t−n/q dt = 1/λ0 , obtém-se:
q p 0

Z n
X
ϕ(x0 ) − 1 ϕ(z) dz ≤ 1 r λ0 ||Diϕ||Lq (Rn ) .
r n Ur λ0
i=1

Caso b). Seja 0 < λ < 1 e β > 1 tal que 1 − βn = λ. Então β = n/(1 − λ), β = q e
R 1 −n/β n
0
t dt = 1/λ. Fazendo β = 1−λ em (2.3.27) resulta então
Z n
1 1 λX
ϕ(x0 ) −
ϕ(z) dz ≤ r ||Diϕ||Lq (Rn )
r n Ur λ i=1

concluindo-se a demonstração. 

Lema 2.3.3 Sob as hipóteses do Lema 2.3.2, tem-se:


Z

ϕ(x0 ) − 1 ϕ(z) dz ≤ C rλ ||ϕ||W m,p(Rn ) para todo ϕ ∈ D(Rn )
n
r Ur

onde C > 0 é uma constante independente de ϕ, r, x0 e

a) λ = λ0 se λ0 < 1

b) 0 < λ < 1 se λ0 = 1
54 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

O Lema 2.3.3 é uma conseqüência direta do Lema 2.3.2 e do fato que W m−1,p (Rn ) ֒→
1 1 m−1
Lq (Rn ) em ambos os casos a) e b). Para o primeiro caso note que = − >0e
q p n
para o segundo caso, que (m − 1)p = n e q > p. (Ver Observação 14).

n
Teorema 2.3.3 Seja k < m − p
≤ k + 1, k um inteiro não negativo. Então

W m,p (Rn ) ֒→ C k,λ(Rn )

onde
n n
a) 0 < λ ≤ m − k − se m − k − <1
p p
n
b) 0 < λ < 1 se m − k − =1
p

n
Observação 15 Quando se diz que se u ∈ W m,p (Rn ), k < m−≤ k + 1, então
p
u ∈ C k,λ(Rn ) significa dizer que u, depois de uma eventual modificação num conjunto de
medida nula de Rn , transforma-se numa função pertencente a C k,λ (Rn ).

Demonstração do Teorema: Tem-se

n
0 <m−k− = λ0 ≤ 1. (2.3.28)
p

Seja ϕ ∈ D(Rn ); x, y ∈ Rn , x 6= y; e Ur um paralelepı́pedo de Rn de lados paralelos aos


eixos coordenados e cada lado de comprimento r = 2||x − y|| contendo x, y. Pelo Lema 2.3.3,
para cada |α| ≤ k, obtém-se:
Z Z
α 1 1
α α
|D ϕ(x) − D ϕ(y)| = D ϕ(x) − n α
D ϕ(z)dz + n D ϕ(z)dz − D ϕ(y) ≤
α α
r Ur r Ur
≤ 2C(2||x − y||)λ ||D αϕ||W m−k,p (Rn )

isto é,

|D αϕ(x) − D α ϕ(y)| ≤ C1 ||x − y||λ ||ϕ||W m,p(Rn ) para todo |α| ≤ k (2.3.29)
2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 55

onde C1 > 0 é uma constante independente de ϕ, x, y e λ com

λ = λ0 se λ0 < 1 e 0 < λ < 1 se λ0 = 1, (2.3.30)

λ0 definido por (2.3.28).


Por outro lado, seja ϕ ∈ D(Rn ), x ∈ Rn e Ur um paralelepı́pedo do Rn , nas condições
do Lema 2.3.2, de volume igual a um e que contém x. Então do Lema 2.3.3, com |α| ≤ k,
resulta: Z Z
α
|D ϕ(x)| ≤ D ϕ(x) −
α
D ϕ(z)dz +
α
D ϕ(z)dz ≤
α
Ur Ur
Z 1/p
α α p
≤ C||D ϕ||W m−k,p(Rn ) + |D ϕ(z)|
Ur

isto é,

|D α ϕ(x)| ≤ C2 ||ϕ||W m,p(Rn ) , ∀ x ∈ Rn , ∀ |α| ≤ k (2.3.31)

onde C2 > 0 é uma constante independente de ϕ e x.


Seja u ∈ W m,p (Rn ) então pelo Teorema 2.2.1, existe uma sucessão (ϕν ) de funções de
D(Rn ) tal que

ϕν → u em W m,p (Rn ) (2.3.32)

ϕν → u quase sempre em Rn . (2.3.33)

De (2.3.31) resulta

|D α ϕν (x) − D α ϕµ (x)| ≤ C2 ||ϕν − ϕµ ||W m,p (Rn ) , ∀ x ∈ Rn , ∀ |α| ≤ k.

Desta expressão, da convergência (2.3.32) e da desigualdade (2.3.31) escrita com ϕν vem que
(ϕν ) é uma sucessão de Cauchy no espaço de Banach Cbk (Rn ), portanto existe
v ∈ Cbk (Rn ) tal que

ϕν → v em Cbk (Rn ). (2.3.34)


56 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

As convergências (2.3.33) e (2.3.34) permitem identificar u com v, mais precisamente, u


depois de uma eventual modificação num conjunto de medida nula em Rn , transforma-se em
v. Assim
ϕν → u em Cbk (Rn ). (2.3.35)

Escrevendo (2.3.29) e (2.3.31) com ϕν e tomando o limite em ambas as expressões, vem das
convergências (2.3.32) e (2.3.35):

|D α u(x) − D α u(y)| ≤ C1 ||x − y||λ ||u||W m,p(Rn ) para todo |α| ≤ k

com λ nas condições (2.3.30), e

|D α u(x)| ≤ C2 ||u||W m,p(Rn ) , ∀ x ∈ Rn , ∀ |α| ≤ k.

Estas duas últimas desigualdades e a Observação 13 implicam o teorema. 


O Teorema 2.3.3 e a Observação 13 acarretam:

Corolário 7 Sob as hipóteses do Teorema 2.3.3, tem-se:

W m,p (Rn ) ֒→ Cbk (Rn ).

2.3.4 Caso n = 1

Neste caso obtém-se uma melhor regularidade para as funções de W m,p (R).

Teorema 2.3.4 Tem-se com m ≥ 1:

1
a) W m,p (R) ֒→ C m−1,λ (R) com 0 < λ ≤ 1 − se p > 1
p

b) W m,p (R) ֒→ Cbm−1 (R) se p = 1


2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 57

Demonstração: Seja ϕ ∈ D(R), y > x e j um inteiro não negativo. Então


Z y Z
(j) (j) (j+1)
|ϕ (x) − ϕ (y)| ≤ |ϕ (t)| dt = |ϕ(j+1) (t)|χ]x,y[ (t) dt (2.3.36)
x R

onde χ]x,y[ é a função caracterı́stica do intervalo aberto ]x, y[ . Seja I um intervalo aberto da
reta de comprimento r e x ∈ I. Tem-se:
Z Z
(j)
ϕ (x) − 1 ϕ(j) (z) dz ≤ 1 |ϕ(j) (x) − ϕ(j) (z)| dz
r I r
I

donde, por (2.3.36),


Z Z Z
(j) 1 1
ϕ (x) − ϕ (z) dz ≤
(j)
|ϕ(j+1) (t)|χ ]x, z[ (t) dtdz. (2.3.37)
r I r I R

Caso a) De (2.3.36) segue


1 1 
(j) (j) (j+1) 1/p′
|ϕ (x) − ϕ (y)| ≤ ||ϕ ||Lp (R) |x − y| + =1
p p′

isto é,

1
|ϕ(j) (x) − ϕ(j) (y)| ≤ ||ϕ||W m,p(R) |x − y|1− p , ∀ j = 0, 1, . . . , m − 1. (2.3.38)

De (2.3.37) resulta
Z Z
(j)
ϕ (x) − 1 ϕ(j) (z)dz ≤ 1 ||ϕ(j+1)||Lp (R) |x − z|1/p′ dz
r I r
I

isto é,
Z
(j) 1 1
ϕ (x) − ϕ (z)dz ≤ r 1− p ||ϕ(j+1) ||Lp (R) .
(j)
r I
Seja x ∈ R e I um intervalo aberto da reta de comprimento um e que contenha x. Da última
desigualdade resulta
Z Z
(j)
|ϕ (x)| ≤ ϕ (x) − ϕ (z) dz + ϕ (z) dz ≤
(j) (j) (j)
I I
(j+1) (j)
≤ ||ϕ ||Lp (R) + ||ϕ ||Lp (R)
58 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

isto é,
|ϕ(j) (x)| ≤ ||ϕ||W m,p(R) , ∀ x ∈ R, j = 0, 1, . . . , m − 1. (2.3.39)

A seguir, de posse das estimativas (2.3.38) e (2.3.39), procede-se como na demonstração do


Teorema 2.3.3.
Caso b) De (2.3.37) vem
Z
(j) 1
ϕ (x) − ϕ (j)
(z) dz ≤ ||ϕ(j+1) ||L1 (R) .
r I

Conseqüentemente considerando I de comprimento um e contendo x, resulta


Z Z
(j)
|ϕ (x)| ≤ ϕ (x) − ϕ (z) dz + ϕ (z) dz ≤
(j) (j) (j)
I I
(j+1) (j)
≤ ||ϕ ||L1 (R) + ||ϕ ||L1 (R)

isto é,
|ϕ(j) (x)| ≤ ||ϕ||W m,1(R) , ∀ x ∈ R, j = 0, 1, . . . , m − 1.

A demonstração prossegue como no Caso a). 

2.3.5 Caso p = ∞

Nesta seção mostra-se que W 1,∞ (Rn ) está imerso continuamente no espaço das funções
Lipschitzianas e limitadas de Rn com n ≥ 1, mais precisamente:

Teorema 2.3.5 Tem-se, para n ≥ 1 e m ≥ 1:

W m,∞ (Rn ) ֒→ C m−1,1 (Rn ).

Demonstração: Mostra-se primeiro que se u ∈ W m,∞ (Rn ) então u ∈ C m−1 (Rn ) e vale a
desigualdade

|D α u(x) − D α u(y)| ≤ C||x − y|| ||u||W m,∞(Rn ) , ∀ x, y ∈ Rn e ∀ |α| ≤ m − 1 (2.3.40)


2.3. IMERSÕES DE ESPAÇOS DE SOBOLEV 59

onde C > 0 é uma constante independente de u. Mostra-se este resultado por indução com
relação a m ≥ 1. Seja então m = 1 e considere u ∈ W 1,∞ (Rn ). De inı́cio analisa-se o caso
n ≥ 2. O caso n = 1 seguirá de forma análoga. Seja θ ∈ D(Rn ) tal que

θ(x) = 1 para ||x|| ≤ 1, θ(x) = 0 para ||x|| ≥ 2 e 0 ≤ θ ≤ 1.

Considere θν (x) = θ(x/ν) para ν inteiro positivo. Então

θν (x) = 1 para ||x|| ≤ 1 e θν (x) = 0 para ||x|| ≥ 2ν.

n
Seja p > n então 0 < 1 − p
= λ0 < 1. Tem-se que θν u ∈ W 1,p (Rn ), para todo ν, portanto,
pelo Teorema 2.3.3, resulta que θν u ∈ C 0,λ0 (Rn ), para todo ν. Disto vem que u é contı́nua
em Rn . Observe-se também que é válida a desigualdade
Z n

(θν u)(x0 ) − 1
1 λ0 X
(θν u)(z) dz ≤ r ||Di(θν u)||Lp (Rn ) (2.3.41)
r n Ur λ0 i=1

onde x0 é um ponto qualquer do paralelepı́pedo Ur . Este resultado é obtido quando se


considera a desigualdade do Lema 2.3.2 com ϕµ , (ϕµ ) sucessão de funções testes em Rn
com ϕµ → θν u em W 1,p (Rn ), e toma-se o limite nesta desigualdade.
Sejam x, y ∈ Rn , x 6= y, ν um inteiro não negativo tal que ||x|| ≤ ν, ||y|| ≤ ν, e
r = 2||x − y||. Então por (2.3.41) resulta

X n
2
|u(x) − u(y)| = |(θν u)(x) − (θν u)(y)| ≤ (2||x − y||)λ0 ||Di(θν u)||Lp (Rn )
λ0 i=1

isto é,

21+λ0 X n  n
|u(x) − u(y)| ≤ ||x − y||λ0 ||Di(θν u)||Lp (Rn ) λ0 = 1 − . (2.3.42)
λ0 i=1
p

Tem-se:
Z Z Z
p 2p p p p
|Di (θν u)| dx ≤ p |Di θ(x/ν)| |u(x)| dx + 2 |θν (x)|p |Di u(x)|p dx
Rn ν ||x||<2ν ||x||<2ν
60 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

onde B2ν (0) = {x ∈ Rn ; ||x|| < 2ν}, que implica

||Di (θν u)||Lp(Rn ) ≤ 2[ maxx∈Rn |Di θ(x)|]||u||Lp(B2ν (0)) + 2||Diu||Lp (B2ν (0)) ≤
≤ C(θ)||u||Lp(B2ν (0)) + 2||Diu||Lp (B2ν (0))

Substituindo esta desigualdade em (2.3.42) resulta

21+λ0 h X n i
|u(x) − u(y)| ≤ ||x − y||λ0 nC(θ)||u||Lp(B2ν (0)) + 2 ||Diu||Lp (B2ν (0)) . (2.3.43)
λ0 i=1

Observe que se v ∈ L∞ (B2ν (0)) então


Z 1/p
p
|v| dx ≤ ||v||L∞ (B2ν (0)) (vol B2ν (0))1/p
B2ν (0)

que implica
lim sup ||v||Lp (B2ν (0)) ≤ ||v||L∞(B2ν (0)) .
p→∞

Tomando o limite superior em p na desigualdade (2.3.43) e levando em consideração esta


última observação, obtém-se
h n
X i
|u(x) − u(y)| ≤ 4||x − y|| nC(θ)||u||L∞(B2ν (0)) + 2 ||Di u||L∞ (B2ν (0))
i=1

que implica
|u(x) − u(y)| ≤ C||x − y|| ||u||W 1,∞(Rn )

que mostra a desigualdade (2.3.40) para m − 1.


Para o caso n = 1, tem-se a desigualdade

λ0
d
(θν u) 1
|u(x) − u(y)| ≤ |(θν u(x) − (θν u)(y)| ≤ |x − y| dx λ0 = 1 −
Lp (R) p

a qual vem de (2.3.38). A demonstração de (2.3.40) prossegue então como no caso n ≥ 2.


Suponha que a desigualdade (2.3.40) é válida para m ≥ 1. Considere m + 1 e
n
u ∈ W m+1,∞ (Rn ). Seja p > n então m < (m + 1) − < m + 1. Pelo Teorema 2.3.3 e
p
por análogo raciocı́nio ao feito acima vem que u ∈ C m+1 (Rn ). Seja |α| ≤ m. Considere um
2.4. PROLONGAMENTO 61

multi-ı́ndice β tal que |β| = |α| − 1 e D β Di u = D α u. Como Di u ∈ W m,∞ (Rn ) e |β| ≤ m − 1


vem da hipótese de indução que

|D β (Di u)(x) − D β (Di u)(y)| ≤ C||x − y|| ||Diu||W m,∞ (Rn )

isto é,
|D αu(x) − D α u(y)| ≤ C||x − y|| ||u||W m+1,∞(Rn ) , ∀ x, y ∈ Rn

que mostra (2.3.40) para m + 1.


Da desigualdade (2.3.40) e notando que ||u||C m−1(Rn ) ≤ ||u||W m,∞(Rn ) segue o teorema. 
b

2.4 Prolongamento
Seja Ω um aberto de Rn . Neste parágrafo estuda-se o prolongamento ao Rn das funções
u definidas em Ω, tudo no contexto dos espaços de Sobolev, mais precisamente, determina-se
um operador linear e contı́nuo

P : W m,p(Ω) → W m,p (Rn ) tal que P u|Ω = u em Ω.

Na Seção 2.4.1 analiza-se o prolongamento para o caso em que Ω é o semi-espaço Rn+


e na Seção 2.4.2, para o caso Ω aberto-limitado de classe C m .
Por D(Ω) representa-se a restrição a Ω das funções de D(Rn ) e por C0m (Ω) a restrição
a Ω das funções de C m (Rn ) que possuem suporte compacto.

2.4.1 Caso Ω = Rn+

Denota-se por Rn+ ao semi espaço

Rn+ = {x ∈ Rn ; xn > 0}.

Faz-se x = (x1 , x2 , . . . , xn ) e x′ = (x1 , x2 , . . . , xn−1 ) ∈ Rn−1 . Representa-se um vetor x do Rn


como sendo x = (x′ , xn ),
62 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

A seguir dar-se-á um resultado de densidade que é central no desenvolver das idéias


deste parágrafo.

Proposição 2.4.1 D(Rn+ ) é denso em W m,p (Rn+ ), sendo 1 ≤ p < ∞.

Demonstração: Primeira Etapa - Aproximação por funções com suporte limitado.


Seja θ uma função teste no Rn tal que θ(x) = 1 se ||x|| ≤ 1, θ(x) = 0 para ||x|| ≥ 2 e
0 ≤ θ ≤ 1. Para todo k = 1, 2, . . . considere-se θk (x) = θ(x/k), x ∈ Rn . Dada uma função
u em W m,p (Rn+ ), seja

uk (x) = θk (x)u(x) para todo x ∈ Rn+ .

Repetindo o mesmo argumento usado no Teorema 2.2.1 da Seção 2.2.2, conclui-se que a
sucessão (uk ) converge para u no espaço W m,p (Rn+ ). Além disso,

supp (uk ) ⊂ supp (θk |Rn+ ) ⊂ {x ∈ Rn ; xn > 0, ||x|| ≤ 2k}

isto é, supp (uk ) é um conjunto limitado de Rn+ , para todo k.


Segunda Etapa - Aproximação por funções de W m,p (Rn ).
Seja u ∈ W m,p (Rn+ ) tal que supp (u) seja um limitado de Rn+ . Mostrar-se-á que existe uma
sucessão (ων ) de W m,p (Rn ) tal que ων |Rn → u em W m,p (Rn+ ). Sejam K1 um compacto de
+

R n−1
e T > 0 tais que supp (u) ⊂ K1 × [0, T ]. Para todo ν = 1, 2, . . . sejam:

Ων = {x ∈ Rn ; xn > −1/ν} = Rn−1 ×] − 1/ν, ∞[

1
ρν ∈ D(Rn ) tal que ρν = 1 em K1 × [0, T ] e supp (ρν ) ⊂ Rn−1 × [ − , ∞[

 1
uν (x) = u x′ , xn + para todo x ∈ Ων
ν
vν (x) = ρν (x)uν (x) para todo x ∈ Ων
ων (x) = ṽν (x).

Graficamente teria-se
2.4. PROLONGAMENTO 63

xn
6

K1 × [0, T]
r -
Rn−1
r− 2ν
1

r− ν1
Ων

Tem-se as seguintes propriedades:

1
a) D α uν (x′ , xn ) = (D α u)(x′ , xn + ) para quase todo (x′ , xn ) ∈ Ων e para todo |α| ≤ m.
ν
1
De fato, se ϕ ∈ D(Ων ) seja ψ(x) = ϕ(x′ , xn − ) para x ∈ Rn+ , então ψ é uma função
ν
teste em Rn+ e
Z
α |α| 1
hD uν , ϕi = (−1) u(x′ , xn + )(D α ϕ)(x′ , xn )dx′ dxn =
Ων ν
Z
1 |α|
= (fazendo yn = xn + )(−1) u(x)D α ψ(x) dx =
ν n
R+
Z Z
1
= D α u(x)ψ(x) dx = (D α u)(x′ , xn + )ϕ(x) dx.
Rn
+ Ων ν

b) uν |Rn → u em W m,p (Rn+ ).


+

1 1
Observe que se kν = (0, 0, . . . , 0, − ) então (τkν ũ)(x′ , xn ) = ũ(x′ , xn + ) = ũν (x′ , xn ),
ν ν
isto é, τkν ũ = ũν . Tem-se:

||uν − u||Lp (Rn+ ) ≤ ||τkν ũ − ũ||Lp (Rn )

e sendo a translação contı́nua, resulta:

lim ||uν − u||Lp (Rn+ ) = 0.


ν→∞
64 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

De forma análoga, levando em consideração a parte a), obtém-se

g g
α u)(x′ , x ) = D
1 ]
α u(x′ , x + ) = D α u (x′ , x )
(τkν D n n ν n
ν

g
isto é, τkν D ]
αu = D α u , para todo |α| ≤ m. Por um raciocı́nio análogo ao feito acima
ν

segue então que


||D αuν − D α u||Lp (Rn ) → 0, ∀ |α| ≤ m

o que mostra a parte b).

c) ων ∈ W m,p (Rn ) e ων | Rn+ → u em W m,p (Rn ).


1 1 1
De fato, sendo supp (uν ) ⊂ K1 ×]− , T − [ e supp (ρν ) ⊂ {x ∈ Rn ; xn ≥ − } tem-se
ν ν 2ν
1 1
supp (vν ) ⊂ K1 × [ − , T − ] o que demonstra que supp (vν ) é um compacto de Ων .
2ν ν
Além disso, da parte a) decorre que vν ∈ W m,p (Ων ), que implica ων = ṽν ∈ W m,p (Rn ).
Sendo ων |Rn = vν |Rn = uν |Rn , por ser ρν = 1 em K1 × [0, T ], tem-se que ων |Rn → u
+ + + +
m,p
em W (Rn+ ).

Sejam u ∈ W m,p (Rn+ ) e ε > 0. Da primeira etapa resulta a existência de u1 em


ε
W m,p (Rn+ ) tal que ||u − u1 ||m,p < 3
e u1 é de suporte limitado. Da segunda etapa,
obtém-se a existência de u2 ∈ W m,p (Rn ) tal que ||(u2|Rn ) −u1 ||m,p < ε/3. Sendo D(Rn )
+
m,p n n
denso em W (R ), existe ϕ em D(R ) tal que ||ϕ − u2 ||m,p < ε/3. Considerando
ψ = ϕ|Rn em D(Rn+ ) e da desigualdade do triângulo decorre que ||u − ψ||m,p < ε, o que
+

demonstra ser D(Rn+ ) denso em W m,p (Rn+ ). 

Teorema 2.4.1 Seja 1 ≤ p < ∞. Então existe um operador de prolongamento

P : W m,p (Rn+ ) → W m,p (Rn )

linear tal que


||P u||W m,p(Rn ) ≤ C||u||W m,p(Rn+ )
2.4. PROLONGAMENTO 65

onde C é uma constante que depende apenas de m, e

P u|Rn+ = u quase sempre em Rn+ , ∀ u ∈ W m,p (Rn+ ).

Demonstração: Na demonstração do teorema será empregado o resultado que segue enun-


ciado sob forma de lema.

∂u
Lema 2.4.1 Seja u contı́nua em Rn tal que a derivada clássica existe em Rn+ e Rn− =
∂xn
∂u
{x ∈ Rn ; xn < 0} e ∈ L1loc (Rn ). Então
∂xn


Tu = T ∂u em D ′ (Rn ).
∂xn ∂xn

A demonstração do lema segue por integração por partes.


Seja v ∈ D(Rn+ ) e



 v(x) se xn > 0
Xm
(P v)(x) =

 cν v(x′ , −νxn ) se xn < 0

ν=1

Dado α = (α′ , k) em Nn , com α′ em Nn−1 e k em N, obtém-se:

D α (P v) = P (D α v) quando k = 0.


Fazendo Dn = , vem:
∂xn


 k
 (Dn v)(x), xn > 0
k Xm
Dn (P v)(x) =

 (−ν)k cν (Dnk v)(x′ , −νxn ), xn < 0.

ν=1
66 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

m
X
Escolhendo os coeficientes c1 , c2 , . . . , cm tais que (−ν)k cν = 1, k = 0, 1, . . . , m − 1,
ν=1
as funções Dnk (P v) satisfazem as condições do Lema 2.4.1, logo Dnk (P v) ∈ Lp (Rn ) para
k = 1, 2, . . . , m, pois v ∈ D(Rn+ ). Observe que os coeficientes c1 , c2 , . . . , cm são as soluções
do sistema de equações AC = 1 onde A é a matriz
 
1 1 1 ... 1
 
 
 (−1) (−2) (−3) ... (−m) 
 
 
A =  (−1)2 (−2)2 (−3)2 ... (−m)2 
 
 .. .. .. .. .. 
 . . . . . 
 
(−1)m−1 (−2)m−1 (−3)m−1 . . . (−m)m−1

C = (c1 , c2 , . . . , cm )τ e 1 = (1, 1, . . . , 1)τ (τ = transposta). Este sistema possui solução


única C pois det A é um determinante de Vandermonde. Como é conhecido o determinante
de Vandermonde


1 1 1 ... 1


y1 y2 y3 ... ym


V (y1 , y2 , . . . , ym ) = y12 y22 y32 ... ym2 , y1 , y2, . . . , ym ∈ R,

.. .. .. .. ..
. . . . .

m−1 m−1 m−1 m−1
y1 y2 y3 . . . ym
Y
é igual a (yj − yi).
i,j=1
i<j
No caso geral α = (α′ , k) com k + |α′ | ≤ m, obtém-se

D α P v = Dnk (P (D α v)) ∈ Lp (Rn )

já que D α v é um elemento de D(Rn+ ). Resulta então
Z Z
α p ′
|D (P v)(x)| dx = |Dnk (P (D α v))(x)|p dx =
Z Rn
Z X m
Rn p


= |D α v(x)|p dx + (−ν)k cν Dnk D α v(x′ , −νxn ) dx′ dxn .
Rn Rn
+ − ν=1
2.4. PROLONGAMENTO 67

1 X
m p 1 X p
m
Notando que aν ≤ a , aν ≥ 0, segue-se que
m ν=1
m ν=1 ν
Z p
Xm

(−ν)k cν Dnk D α v(x′ , −νxn ) dx′ dx ≤
Rn
− ν=1

m
X Z Z 0
≤ mp−1 ν mp |cν |p |D α v(x′ , −νxn )|p dx′ dxn ≤
ν=1 Rn−1 −∞
m
X Z
≤ mp−1 ν mp−1 |cν |p |D αv(x)|p dx.
ν=1 Rn
+

Combinando os dois últimos cálculos resulta


Z  m
X Z
α p p−1 mp−1 p
|D (P v)(x)| dx ≤ 1 + m ν |cν | |D α v(x)|p dx
Rn ν=1 Rn
+

que acarreta
X Z  m
X  X Z
α p p mp p
|D (P v)(x)| dx ≤ 1 + m ν |cν | |D α v(x)|p dx.
|α|≤m Rn ν=1 |α|≤m Rn
+

Portanto
 m
X 
||P v||W m,p(Rn ) ≤ 1 + m ν m |cν | ||v||W m,p(Rn+ ) , ∀ v ∈ D(Rn+ ).
ν=1
Da Proposição 2.4.1 decorre então que P estende-se a uma aplicação linear contı́nua

P : W m,p (Rn+ ) 7→ W m,p (Rn )

com P verificando
||P u||W m,p(Rn ) ≤ C||u||W m,p(Rn+ )
m
X
com C = 1 + m ν m |cν |. Resta apenas mostrar que P é um prolongamento.
ν=1
Seja u em W m,p (Rn+ ) e seja (ϕν ) uma sucessão de funções de D(Rn+ ) tal que ϕν → u
em W m,p (Rn+ ), então P ϕν → P u em W m,p (Rn ), logo

(P ϕν )|Rn → (P u)|Rn em W m,p (Rn+ ).


+ +

Da definição de P resulta que P ϕν |Rn = ϕν , portanto P u|Rn = u, o que demonstra o


+ +

teorema. 
68 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Observação 16 Sejam v ∈ D(Rn+ ) e K1 compacto de Rn−1 , T > 0 tal que sup (v|Rn ) ⊂
+
′ ′
K1 × [0, T ]. Note que P v(x , xn ) = 0 se xn < 0 e (x , −xn ) ∈ K1 × [0, T ]. Resulta disto que
supp P v está contido em K1 × [−T, T ].

2.4.2 Caso Ω Aberto Limitado

Inicialmente fixa-se algumas notações. Sejam Q o retângulo aberto

Q = {y ∈ Rn ; 0 < yi < 1, i = 1, 2, . . . , n − 1, −1 < yn < 1},

Q+ e Q− os quadrados abertos

Q+ = Q ∩ {yn > 0}, Q− = Q ∩ {y1 < 0},

e Σ o segmento aberto Q ∩ {yn = 0}.


Seja Ω um subconjunto aberto do Rn . Diz-se que Ω é de classe C m (m = 1, 2, . . .) se
sua fronteira Γ é uma variedade de classe C m de dimensão n − 1 e Ω estando localmente de
um mesmo lado de Γ. Se Ω é de classe C m então existe um sistema de cartas locais (Uj , ϕj ),
j = 1, 2, . . . definindo Γ tal que

Uj é um aberto limitado do Rn e os Uj cobrem Γ


ϕj : Uj 7→ Q é uma bijeção de classe C m
ϕ−1
j : Q 7→ Uj é de classe C m
ϕj (Uj ∩ Ω) = Q+ , ϕj (Uj ∩ Γ) = Σ

Decorre da última expressão que ϕj (Uj ∩ CΩ) = Q− . Evidentemente as condições de compa-


tibilidade são satisfeitas, isto é, se Ui ∩ Uj 6= ∅ então existe um homeomorfismo Jij de classe
C m com jacobiano positivo de ϕi (Ui ∩ Uj ) sobre ϕj (Ui ∩ Uj ) tal que

ϕj (x) = Jij (ϕi (x)), para todo x ∈ Ui ∩ Uj .

Graficamente teria-se
2.4. PROLONGAMENTO 69

yn
6

U ϕ
j
rx
Q+
-
Rn−1

Q

Não são de classe C 1 os seguintes abertos

x2 6 x2 6

'$ '$
r r
x0 M N
&% &%

- -
x1 x1

No primeiro exemplo Ω é o disco aberto menos o centro x0 e no segundo, Ω é o disco


aberto menos o raio MN. Claramente Rn+ é um aberto de classe C m para todo m ≥ 1.
Se Ω é um aberto limitado do Rn de classe C m podemos escolher um sistema de cartas
locais finito
(U1 , ϕ1 ), . . . , (UN , ϕN )

definindo Γ que satisfazem as condições acima.


O aberto Ω do Rn é denominado bem regular se Ω é de classe C m para todo
m = 1, 2, . . .
A seguir fixa-se Ω um aberto limitado do Rn , Ω de classe C m , e denota-se por Γ sua
fronteira. Mostrar-se-á que existe um operador de prolongamento P : W m,p(Ω) 7→ W m,p (Rn ).
Este resultado é obtido observando-se, por meio de cartas locais, que localmente as funções
70 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

definidas em Ω, perto da fronteira Γ comportam-se como se estivessem definidas em Q+ .


Existindo um operador de prolongamento P : W m,p(Rn+ ) 7→ W m,p (Rn ), o prolongamento a
Rn+ das funções definidas em Q+ dará o resultado.
Antes de enunciar o teorema central desta seção, introduz-se certas notações e demons-
tra-se alguns resultados prévios. Com efeito, primeiro constrói-se um sistema finito
{(Uj , ϕj )}1≤j≤N de cartas locais para Γ. Considerar que o sistema seja finito é possı́vel
pois Γ é compacto em Rn . De posse destas cartas locais, determina-se, aplicando-se o Teo-
[N 

rema da Partição C da Unidade à cobertura {Uj } ∪ Ω do aberto Uj ∪ Ω, uma coleção
j=1
de funções σ0 , σ1 , . . . , σN tais que


σj ∈ D(RN )


supp (σ0 ) ⊂ Ω, supp σj ⊂ Uj


0 ≤ σj ≤ 1
N
X

σj (x) = 1, ∀ x ∈ Ω.
j=0

P
N
Seja u ∈ W m,p (Ω) então u = uσ0 + uσj . Observe que w0 = uσ0 tem o prolongamento
j=1
natural a Rn por zero fora de Ω. A dificuldade está com os wj = uσj . Seja Uj+ = Uj ∩ Ω e

vj (y) = wj (ϕ−1
j (y)), y ∈ Q+ .

Claramente, wj ∈ W m,p (Uj+ ). Tem-se o seguinte resultado:

Lema 2.4.2 Seja u ∈ W m,p (Ω) e vj , wj definidos como acima, então vj ∈ W m,p (Q+ ) e
existe uma constante C0 = C0 (σj , ϕj , m, n) > 0 independente de u e p tal que

||vj ||W m,p (Q+ ) ≤ C0 ||wj ||W m,p(Uj+ ) .

Demonstração: Para facilitar a escrita não escrever-se-á o ı́ndice j. Seja y = ϕ(x) e

ψ(y) = ϕ−1 (y) = (β1 (y), β2(y), . . . , βn (y)) = (x1 , x2 , . . . , xn ).


2.4. PROLONGAMENTO 71

Note que v(ϕ(x)) = w(x) e | det(Jϕ(x))| = A(x) > 0, para todo x ∈ U. Tem-se:
Z Z Z
p p
|v(y)| dy = |v(ϕ(x))| A(x)dx = |w(x)|p A(x)dx ≤
Q + U +
Z supp w
p
≤ ( max A(x)) |w(x)| dx.
x∈ supp σ U+

Também
m
X ∂w
∂v ∂βk
(y) = (ψ(y)) (y),
∂yi k=1
∂x k ∂y i
Z p Xn Z p
∂v ∂wk p ∂βk
(y) dy ≤ n p−1 (x) (ϕ(x)) A(x)dx ≤

Q+ ∂yi k=1 U
+ ∂xk ∂yi
 m Z
∂βk 
p X ∂w p
≤n p−1
max max
(ϕ(x)) ( max A(x)) dx.
1≤k≤n x∈supp σ ∂yi x∈supp σ
+ ∂xk
U

k=1
Da mesma forma:
∂2v X  X ∂2w ∂βr  ∂βk
(y) = (ψ(y)) (y) (y) +
∂yi ∂yℓ k r
∂xk ∂xr ∂yℓ ∂yi
X ∂w ∂ 2 βk
+ (y) (y)
k
∂xk ∂y i ∂yℓ

e por um procedimento análogo ao anterior, obtém-se


Z 2 p X
∂ v ∂ 2 w p
2(p−1)
+
∂yi ∂yℓ (y) dy ≤ n Ci,ℓ (σj , ϕj ) ∂xk ∂xr p + +
Q k,r L (U )

X ∂w p
+n2(p−1) Ci,ℓ (σj , ϕj )
∂xk p + .
k L (U )

Repetindo os mesmos argumentos obtém-se desigualdades do mesmo tipo para as outras


derivadas parciais de v. Assim o lema está demonstrado. 
Seja W o espaço das funções g ∈ W m,p (Q+ ) tais que todas elas se anulam numa
vizinhança fixa O de ∂Q+ \Σ. Define-se h(x) = g(ϕj (x)) então tem-se o seguinte resultado:

Lema 2.4.3 Nas condições acima, h ∈ W m,p (Uj+ ) e existe uma constante C1 = C1 (O, ϕj , m, n),
independente de g ∈ W e p, tal que

||h||W m,p(Uj+ ) ≤ C1 ||g||W m,p(Q+ ) .


72 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Demonstração: Seja x = ψ(y) então | det(Jψ(y))| = B(y) > 0, para todo y ∈ Q. Tem-se:
Z Z Z
p
|h(x)| dx = |g(y)|B(y) dy ≤ ( sup B(y)) |g(y)|p dy.
Uj+
supp g +
y∈Q \O Q+

Procedendo como no Lema 2.4.2, obtém-se os resultados desejados. 


Se em lugar de Q+ , considera-se Q e fixa-se uma vizinhança O de ∂Q, obtém-se, de
forma análoga ao Lema 2.4.3, o seguinte resultado:

Lema 2.4.4 Nas condições acima, h ∈ W m,p (Uj ) e existe uma constante C2 = C2 (O, ϕj , m, n) >
0, independente de g ∈ W e p, tal que

||h||W m,p(Uj ) ≤ C2 ||g||W m,p(Q) .

Aplicando os três últimos lemas, obtém-se para Ω resultados análogos aos obtidos
para Rn+ . Com efeito:

Proposição 2.4.2 Seja Ω limitado de Rn e de classe C m então D(Ω) é denso em W m,p (Ω)
sendo 1 ≤ p < ∞.
N
X
m,p
Demonstração: Seja u ∈ W (Ω) então por cartas locais u = uσ0 + uσj . Seja
j=1
wj = uσj , j = 0, 1, . . . , N. Note que w0 ∈ W0m,p (Ω). Com wj ∈ W (Uj+ )
m,p
constrói-se
vj ∈ W m,p (Q+ ). Observe que vj anula-se numa vizinhança de ∂Q+ \Σ, então pode-se con-
siderar vj como pertencendo a W m,p (Rn+ ). Pela seção anterior existe uma sucessão (γν ) de
funções de D(Rn+ ) tal que
γν → vj em W m,p (Rn+ ).

Seja ρ ∈ D(Q) tal que ρ = 1 no suporte de vj então

ργν → ρvj = vj em W m,p (Rn+ ).


2.4. PROLONGAMENTO 73

Observe que cada ργν se anula numa vizinhança fixa de ∂Q. Seja σν (x) = ργν (ϕ(x)) então
os σν restritos a Ω formam uma sucessão de C0m (Ω), e pelo Lema 2.4.4, segue que

σν → wj em W m,p (Ω).

ε
Seja ε > 0 e ξj ∈ C0m (Ω) tal que ||ξj − wj || W m,p (Ω) < N
, j = 0, 1, . . . , N então

N
X N
X

u − ξ j ≤ ||wj − ξj ||W m,p (Ω) < ε

j=1 W m,p (Ω) j=1

que mostra a densidade de C0m (Ω) em W m,p (Ω). Regularizando as funções de C0m (Ω)
(ver Teorema 2.2.1) segue que D(Ω) é denso em W m,p (Ω). 

Teorema 2.4.2 Seja Ω aberto limitado do Rn , Ω de classe C m , e 1 ≤ p < ∞. Então existe


um operador de prolongamento

P : W m,p(Ω) 7→ W m,p (Rn ) linear

tal que
||P u||W m,p(Rn ) ≤ c||u||W m,p(Ω)

onde c é uma constante independente de u ∈ W m,p (Ω) e p, e

P u|Ω = u quase sempre em Ω.

P
N
Demonstração: Seja u ∈ D(Ω) então por cartas locais u = uσ0 + uσj . Com wj = uσj
j=1
constrói-se vj que se anula numa vizinhança de ∂Q+ \Σ. Tem-se que vj ∈ W m,p (Rn+ ) e
pelo Teorema 2.4.1, da seção anterior, P vj ∈ W m,p (Rn ). Pela própria construção de P
(ver Observação 16), note-se que P vj tem suporte compacto em Q. Com P vj constrói-se
hj ∈ W m,p (Uj ) que se anula numa vizinhança de ∂Uj e hj restrito a Uj+ é igual a wj .
74 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Denotando-se com h̃j o prolongamento de hj ao Rn por zero fora de Uj , tem-se, então, dos
três últimos lemas e do Teorema 2.4.1, que

||h̃j ||W m,p (Rn ) = ||hj ||W m,p (Ui ) ≤ C1 ||P vj ||W m,p (Q) ≤
≤ C2 ||vj ||W m,p(Q+ ) ≤ C3 ||wj ||W m,p(Ui+ ) = C3 ||wj ||W m,p(Ω)

onde as diferentes constantes Ci são independentes de u e p. Seja Pj wj = h̃j então Pj é


linear e contı́nuo. Define-se o operador de prolongamento P como sendo
N
X
P u = w̃0 + Pj w j .
j=1

Tem-se:
N
X
||P u||W m,p(Rn ) ≤ ||w0 ||W m,p(Ω) + C||wj ||W m,p(Ω) ≤ C||u||W m,p(Ω)
j=1

sendo a constante C é independente de u e p. O teorema segue pelo resultado de densidade


da Proposição 2.4.2. 
Sejam Sn−1 = {σ ∈ Rn ; ||σ|| = 1} e σ0 ∈ Sn−1 , α > 0. Denota-se por C(σ0 , α) ao
cone
C(σ0 , α) = {tσ; 0 < t < ∞ e ||σ − σ0 || < α, σ ∈ Sn−1 }.

Seja Ω aberto limitado do Rn . Diz-se que Ω possui a propriedade do cone se existe uma
cobertura (Ui )1≤i≤N da fronteira Γ de Ω verificando:

para cada Ui existe um cone C(σ0i , αi ) tal que para todo


x ∈ Ui ∩ Ω, x + C(σ0i , αi ) não intersepta Ui ∩ Γ.

Mostra-se (ver [8] e [17]) que os abertos limitados Ω do Rn com a propriedade do cone
possuem a propriedade do (m, p)-prolongamento para todo m ≥ 1 e 1 < p < ∞. Este é
um resultado devido a A.P. Calderon e baseado em propriedades de integrais singulares de
Calderon-Zygmund. Observe que os paralelepı́pedos abertos do Rn tem a propriedade do
cone. A desvantagem do operador de prolongamento de Calderon é de que este é construı́do
especialmente para W m,p (Ω) e não serve para prolongar simultaneamente os espaços W k,p(Ω)
2.5. IMERSÕES DOS ESPAÇOS W M,P (Ω) 75

com 0 < k < m, como é o caso do operador P estudado anteriormente. Esta propriedade de
P é importante na obtenção de desigualdades de intepolação para os espaços W m,p (Ω).

2.5 Imersões dos Espaços W m,p(Ω)

Os teoremas de imersão de W m,p (Rn ) e o operador de prolongamento P : W m,p(Ω) 7→


W m,p (Rn ) introduzido no Parágrafo 2.4, permitem obter resultados de imersão para os
espaços W m,p (Ω).
Neste parágrafo estudar-se-á as imersões contı́nuas e as imersões compactas do espaço
W m,p (Ω) com Ω limitado do Rn .

2.5.1 Imersões Contı́nuas

Denota-se por C k,λ(Ω) ao espaço de Banach das restrições a Ω das funções pertencentes
a C k,λ (Rn ) (ver Parágrafo 2.3), equipado com a norma induzida, isto é,

|D α u(x) − D α u(y)|
||u||C k,λ(Ω) = max sup |D α u(x)| + max sup ·
|α|≤k x∈Ω |α|≤k x,y∈Ω ||x − y||λ
x6=y

Teorema 2.5.1 Sejam Ω um subconjunto limitado do Rn , (n ≥ 2), Ω de classe C m e


1 ≤ p < ∞, então

np
a) W m,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1≤q≤ = p∗ se mp < n
n − mp

b) W m,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1 ≤ q < ∞ e mp = n

c) W m,p (Ω) ֒→ C k,λ(Ω) se mp > n.

n
No caso c), k é um inteiro verificando k < m − ≤ k + 1 e λ um real satisfazendo
p
n
0 < λ ≤ m − k − = λ0 se λ0 < 1 e 0 < λ < 1 se λ0 = 1.
p
76 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

I
Demonstração: a) O Corolário 5 diz que W m,p (Rn ) 7→ Lq (Rn ) é contı́nua para p ≤ q ≤ p∗ .
Tem-se a seguinte cadeia de aplicações lineares contı́nuas:
P I r
W m,p (Ω) 7→ W m,p (Rn ) 7→ Lq (Rn ) 7→

Lq (Ω)

que mostra a) para p ≤ q ≤ p∗ . O caso 1 ≤ q ≤ p é obtido pelo fato de ter-se Lp (Ω) ֒→ Lq (Ω)
pois Ω é limitado.
Os casos b) e c) são obtidos aplicando o raciocı́nio acima, o Teorema 2.3.2 e o Teorema
2.3.3, respectivamente. 

Teorema 2.5.2 Seja I um intervalo aberto finito da reta e 1 ≤ p < ∞. Então


1
a) W m,p (I) ֒→ C m−1,λ (I) com 0 < λ ≤ 1 − se p > 1
p
b) W m,p (I) ֒→ C m−1 (I) se p = 1.

Este resultado é obtido aplicando o Teorema 2.3.4 e a demonstração do Teorema 2.5.1.

Teorema 2.5.3 Seja Ω aberto limitado do Rn (n ≥ 1), Ω de classe C m . Então

W m,∞ (Ω) ֒→ C m−1,1 (Ω).

Demonstração: Faz-se a demonstração por indução com relação a m. Seja então m = 1.


Por ser Ω limitado W 1,∞ (Ω) ֒→ W 1,p (Ω), 1 ≤ p ≤ ∞. O Teorema 2.4.2 diz que

||P u||W 1,p(Rn ) ≤ C||u||W 1,p(Ω) (2.5.44)

onde C é uma constante independente de u ∈ W 1,p (Ω) e 1 ≤ p < ∞. Considere p > n. Então
pelo Teorema 2.5.1, parte c), vem que W 1,p (Ω) ֒→ C 0 (Ω), isto é, as funções u de W 1,∞ (Ω)
são funções contı́nuas em Ω. Aplicando os mesmos argumentos usados para obter (2.3.42),
na demonstração do Teorema 2.3.5, resulta para x, y ∈ Ω, x 6= y,
X n
21+λ0
|u(x) − u(y)| = |(P u)(x) − (P u)(y)| ≤ ||x − y||λ0 ||Di(P u)||Lp (Rn )
λ0 i=1
2.5. IMERSÕES DOS ESPAÇOS W M,P (Ω) 77

n
onde λ0 = 1 − · (Para o caso n = 1, obtém-se desigualdade semelhante, ver demonstração
p
do Teorema 2.3.4). Isto implica

21+λ0
|u(x) − u(y)| ≤ ||x − y||λ0 n||P u||W 1,p(Rn ) .
λ0

Tomando o limite superior quando p → ∞, resulta então

|u(x) − u(y)| ≤ 4||x − y||n lim sup ||P u||W 1,p(Rn ) . (2.5.45)
p→∞

Observando que lim sup ||u||W 1,p(Ω) ≤ ||u||W 1,∞(Ω) , vem então de (2.5.44) e (2.5.45)
p→∞

|u(x) − u(y)| ≤ 4n C||x − y|| ||u||W 1,∞(Ω) , ∀ x, y ∈ Ω

que mostra o teorema para m = 1.


Suponha o teorema válido para m ≥ 1. Considere m + 1. Seja p > n então
n
m < (m+1)− < m+1. Isto implica pelo Teorema 2.5.1, parte c), que W m,p (Ω) ֒→ C m (Ω).
p
Seja |α| ≤ m. Considere um multi-ı́ndice β tal que |β| = |α| − 1 e D β Di u = D α u. Como
Di u ∈ W m,∞ (Ω) vem da hipótese de inducão que

|D β (Di u)(x) − D β (Di u)(y)| ≤ C||x − y|| ||Diu||W m,∞ (Ω)

para x, y ∈ Ω, portanto

|D α u(x) − D α u(y)| ≤ C||x − y|| ||u||W m+1,∞(Ω)

para todo x, y ∈ Ω e todo |α| ≤ m. Assim o teorema está provado. 

Corolário 8 Seja Ω um aberto limitado do Rn sem condições de regularidade na fronteira.


Então
W0m,∞ (Ω) ֒→ C m−1,1 (Ω).

Este resultado é obtido aplicando o raciocı́nio usado na demonstração do Teorema 2.5.3 com
P u = ũ onde ũ é a extensão de u ao Rn por zero fora de Ω.
78 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

2.5.2 Imersões Compactas

O resultado central desta seção é o Teorema de Rellich-Kondrachov. Para demonstrá-


lo, primeiro prova-se o seguinte resultado:

Lema 2.5.1 Se u ∈ W 1,1 (Ω) então


n
X

∂u
||τh u − u||L1 (Rn ) ≤ ||h||
∂xi
i=1 L1 (Rn )

onde (τh u)(x) = u(x − h).

Demonstração: Mostra-se o resultado, inicialmente, para funções ϕ ∈ D(Rn ). Tem-se:


Z 1 Z 1X n 
d ∂ϕ
ϕ(x − h) − ϕ(x) = ϕ(x − th) dt = (x − th)(−hi ) dt
0 dt 0 i=1
∂xi
que implica
n Z
X 1 ∂ϕ
|(τh ϕ)(x) − ϕ(x)| ≤ ||h|| (x − th) dt
∂xi
i=1 0

e isto acarreta,
Z n Z 1Z
X
∂ϕ
|τh ϕ(x) − ϕ(x)| dx = ||h|| (x − th) dxdt =

n ∂xi
Rn i=1 0 R
n Z
X ∂ϕ
= ||h|| (x) dx

n ∂xi

i=1 R

isto é,
n
X

∂ϕ
||τh ϕ − ϕ||L1 (Rn ) ≤ ||h|| . (2.5.46)
∂xi
i=1 L1 (Rn )
1,1
Seja u ∈ W (R ), então existe uma sucessão (ϕν ) de funções de D(Rn ) tal que
n


ϕν → u em W 1,1 (Rn )


ϕν → u quase sempre em Rn


|ϕν (x)| ≤ g(x) quase sempre em Rn , g ∈ L1 (Rn )

Escrevendo (2.5.46) com ϕν , tomando o limite a ambos os membros desta desigualdade e


aplicando o Teorema da Convergência Dominada de Lebesgue no primeiro membro, obtém-se
o lema. 
2.5. IMERSÕES DOS ESPAÇOS W M,P (Ω) 79

Observação 17 Seja Ω aberto limitado do Rn . Então, dado ε > 0, existe K compacto de


Ω tal que mes (Ω\K) < ε (ver Observação 1 do Capı́tulo 1).

Com efeito, seja Kν o compacto de Ω definido por Kν = {x ∈ Ω; dist(x, Γ) ≥ ν1 }. Tem-se:



[
K1 ⊂ K2 ⊂ . . . , Kν = Ω.
ν=1

Portanto,
χKν ≤ χΩ e lim χKν (x) = χΩ (x), ∀x ∈ Ω

onde χO é a função caracterı́stica do conjunto O. Resulta, então, pelo Teorema da Con-


vergência Dominada de Lebesgue que
Z Z
lim(mes Kν ) = lim χKν (x) dx = χΩ (x) dx = mes Ω
Ω Ω

que mostra a observação.

Teorema 2.5.4 (Rellich-Kondrachov) Sejam Ω um aberto limitado do Rn , Ω de classe


C 1 e 1 ≤ p ≤ ∞. Então as seguintes imersões são compactas:
np
a) W 1,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1 ≤ q < = p∗ se p < n
n−p
b) W 1,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1 ≤ q < ∞ se p = n

c) W 1,p (Ω) ֒→ C 0 (Ω) se p > n

Demonstração: Estudar-se-á primeiro o caso a). O Teorema de Frechet-Kolmogorov


(ver K. Yosida [16]) diz que o subconjunto F de Lq (Ω), 1 ≤ q < ∞, é relativamente
compacto em Lq (Ω) se

i) F é limitado.

ii) Para todo ε > 0, existe um compacto K de Ω tal que


Z
|u|q dx < ε, ∀ u ∈ F.
Ω\K
80 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

iii) Para todo ε1 > 0, existe η > 0 tal que se h ∈ Rn , ||h|| < η, então

||τh ũ − ũ||Lq (Rn ) < ε1 , ∀ u ∈ F,

onde ũ é a extensão de u a Rn por zero fora de Ω e (τh u)(x) = u(x − h).

Seja B um conjunto limitado de W 1,p (Ω). Mostrar-se-á que B satisfaz às três condições de
Frechet-Kolmogorov em Lq (Ω) com 1 ≤ q < p∗ .
A condição i) segue pelo Teorema 2.5.1, parte a). Estudar-se-á a condição ii). Por se
ter 0 < q < p∗ , existe ρ > 1 tal que

1 ∗ 1 1 1
q= p + ′ × 0 onde + ′ = 1.
ρ ρ ρ ρ

Tem-se, aplicando a desigualdade de Hölder:


Z Z 1/ρ  Z 1/ρ′
q qρ
|u| dx ≤ |u| dx ≤
Ω\K Ω\K Ω\K

||u||qLp∗ (Ω)
′ ′
≤ mes(Ω\K)1/ρ ≤ C mes(Ω\K)1/ρ ≤ C ε

pois mes(Ω\K)1/ρ pode ser escolhido arbitrariamente pequeno, ver Observação 2.5.2. Isto
mostra ii).
Verifica-se iii). Seja ε1 > 0. Escolha K compacto de Ω tal que
Z 1/q
q
|u| dx < ε1 /3 , ∀ u ∈ B. (2.5.47)
Ω\K

Este compacto K existe pela parte ii). Sejam η = dist (K, Γ) e

K1 = {x ∈ Rn ; dist (x, K) ≤ η/3}, K2 = {x ∈ Rn ; dist(x, K) ≤ 2η/3}

Claramente K1 e K2 são subconjuntos compactos de Ω. Observa-se que se x ∈ CK1 e


||h|| ≤ η/3 então x − h ∈ CK. Logo para ||h|| ≤ η/3 resulta de (2.5.47)
Z 1/q  Z 1/q  Z 1/q
q q
|ũ(x − h)| dx ≤ |ũ(x)| dx = |u(x)|q dx < ε1 /3
CK1 CK Ω\K
2.5. IMERSÕES DOS ESPAÇOS W M,P (Ω) 81

isto é ,
||τh ũ||Lq (CK1 ) ≤ ε1 /3, ∀ u ∈ B, ∀ ||h|| < η/3. (2.5.48)

Seja ϕ ∈ D(Ω) tal que ϕ = 1 em K2 , 0 ≤ ϕ ≤ 1 e ψ = 1 − ϕ. Então 0 ≤ ψ ≤ 1 e


1 = ϕ + ψ. Tem-se:

||τh ũ − ũ||Lq (Rn ) = ||τh (ϕũ + ψũ) − (ϕũ + ψũ)||Lq (Rn ) ≤


(2.5.49)
≤ ||τh (ϕũ) − ϕũ||Lq (Rn ) + ||τh (ψũ)||Lq (Rn ) + ||ψũ||Lq (Rn ) .

Mostra-se que cada um dos três últimos termos de (2.5.49) é pequeno para ||h|| pequeno.
Com efeito, de ψ = 0 em K2 , resulta de (2.5.47):
Z 1/q  Z 1/q  Z 1/q
q q q
||ψũ||Lq (Rn ) = |ψũ| ≤ |ũ| ≤ |u| < ε1 /3
CK2 CK2 Ω\K

isto é,
||ψũ||Lq (Rn ) < ε1 /3 , ∀ u ∈ B. (2.5.50)

Também, dos fatos se x ∈ K1 então x − h ∈ K2 com ||h|| < η/3 e de ψ = 0 em K2 , resulta:


Z 1/q
||τh (ψũ)||Lq (Rn ) = |ψ(x − h)ũ(x − h)|q ≤ ||τh ũ||Lq (CK1 ) .
CK1

Resulta de (2.5.48) que

||τh (ψũ)||Lq (Rn ) < ε1 /3 , ∀ u ∈ B, ∀ ||h|| < η/3. (2.5.51)

Aplicando o Lema 2.5.1 com u = ϕũ, obtém-se:

||τh (ϕũ) − ϕũ||L1 (Rn ) ≤ ||h|| ||ϕu||W 1,1(Rn ) ≤ ||h|| ||ϕu||W 1,1(supp ϕ) ≤
≤ ||h||c(ϕ, p)||u||W 1,p(supp ϕ) ≤ C1 ||h||

isto é,
||τh (ϕũ) − ϕũ||L1 (Rn ) ≤ C1 ||h||, ∀ u ∈ B. (2.5.52)
1 1−θ
Seja θ ∈ ]0, 1[ tal que = θ + ∗ , que existe por se ter 1 ≤ q < p∗ . Pela desigualdade de
q p
interpolação (Proposição 1.2.1 do Capı́tulo 1), obtém-se:

||τh (ϕũ) − ϕũ||Lq (Rn ) ≤ ||τh (ϕũ) − ϕũ||θL1 (Rn ) ||τh (ϕũ) − ϕũ||1−θ
Lp∗ (Rn )
. (2.5.53)
82 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Note que
Z ∗
1/p∗
||τh (ϕũ)||Lp∗ (Rn ) ≤ |ũ(x − h)|p = ||u||Lp∗ (Ω)
Rn

portanto
1−θ
||τh (ϕũ) − ϕũ||L1−θ
p∗ (Rn ) ≤ (2||u||Lp (Ω) )
∗ ≤ C, ∀ u ∈ B. (2.5.54)

De (2.5.53) e das desigualdades (2.5.52) e (2.5.54), obtém-se

||τh (ϕũ) − ϕũ||Lq (Rn ) ≤ C||h||θ , ∀ u ∈ B. (2.5.55)

Usando-se as desigualdades (2.5.50), (2.5.51) e (2.5.55) em (2.5.49) resulta

||τh ũ − ũ||Lq (Rn ) < C ε1 , ∀ u ∈ B, ∀ ||h|| < η,

que mostra a parte iii). Assim B é relativamente compacto em Lq (Ω). Demonstração do


caso b): Aplique o raciocı́nio usado na demonstração do caso a), com, por exemplo, p∗ = 2q.
n
Demonstração do caso c): Tem-se 0 < 1 − = λ0 ≤ 1. Então pelo Teorema 2.5.1, parte c),
p
para n < p < ∞, ou pelo Teorema 2.5.3, para p = ∞, resulta

W 1,p (Ω) ֒→ C 0,λ0 (Ω).

Seja B um conjunto limitado de W 1,p (Ω) então, pela imersão acima vem que B é limitado
em C 0 (Ω) e
sup |u(x) − u(y)| ≤ C||x − y||λ0 .
x,y∈Ω
x6=y

Esta desigualdade implica que B é equicontı́nuo em Ω. Pelo Teorema de Arzela-Ascoli, segue


o caso c) do teorema. 

Corolário 9 Seja Ω um aberto limitado do Rn , Ω de classe C m+1 , e 1 ≤ p ≤ ∞. Então as


seguintes imersões são compactas:

np
a) W m+1,p (Ω) ֒→ W m,q (Ω), 1≤q< se p < n
n−p
2.5. IMERSÕES DOS ESPAÇOS W M,P (Ω) 83

b) W m+1,p (Ω) ֒→ W m,q (Ω), 1 ≤ q < ∞ se p = n

c) W m+1,p (Ω) ֒→ C m (Ω) se p > n.

Demonstração: Seja (uν ) uma sucessão limitada de funções de W m+1,p (Ω). Então

(D α uν ) é limitada em W 1,p (Ω), ∀ |α| ≤ m.

Aplicando o Teorema de Rellich-Kondrachov, vem que existe uma subsucessão de (uν ), de-
notada também por (uν ), e u ∈ W m,q (Ω), para os casos a) e b), tal que

D α uν → D α u em Lq (Ω), ∀ |α| ≤ m

que mostra a) e b). Para o caso c), existe u ∈ W m+1,p (Ω) tal que uν → u fraco em
n
W m+1,p (Ω), portanto u ∈ C m (Ω) pois m < m + 1 − ≤ m + 1. Aplicando o Teorema de
p
Rellich-Kondrachov, obtém-se:

D α uν → D α u em C 0 (Ω), ∀ |α| ≤ m

que mostra a parte c) do corolário. 

Corolário 10 Seja Ω um aberto limitado do Rn e 1 ≤ p ≤ ∞. Então


a) se Ω é de classe C m+1 a seguinte imersão é compacta:

W m+1,p (Ω) ֒→ W m,p (Ω)

b) se Ω não possui condições de regularidade, a seguinte imersão é compacta:

W0m+1,p (Ω) ֒→ W0m,p (Ω).

Demonstração: A parte a) é obtida aplicando o Corolário 9 para as diferentes possibilidades


de p e n. Note que se p < n então p < np/(n − p). Também C m (Ω) ֒→ W m,p (Ω). Para a
84 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

parte b), considere O uma bola aberto do Rn que contenha propriamente Ω. Considere as
aplicações
ext I rΩ
W0m+1,p (Ω) −→ W m+1,p (O) −→ W m,p (O) −→ W01,p (Ω)

onde ext u = ũ, ũ a extensão de u a O por zero fora de Ω e rΩ u = u|Ω . Notando que a
primeira e terceira aplicações são contı́nuas e a aplicação I é compacta, pela parte a), segue
a parte b) do corolário. 

Teorema 2.5.5 Seja Ω aberto limitado do Rn , Ω de classe C m , e 1 ≤ p ≤ ∞. Então as


seguintes imersões são compactas:

np
a) W m,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1≤q< se mp < n
n − mp

b) W m,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1 ≤ q < ∞ se mp = n

n
c) W m,p (Ω) ֒→ C k (Ω). k < m− ≤ k + 1 se mp > n onde k é um inteiro não negativo.
p

Demonstração: As partes a) e b) serão mostradas aplicando indução com relação a m.


Mostrar-se-á a). Para m = 1, o resultado é verdadeiro pelo Teorema de Rellich-
Kondrachov. Suponha a) válido para m ≥ 1. Será provado que a) é válido para m + 1, isto
é, para (m + 1)p < n será provado que a imersão

np
W m+1,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1≤q< = q∗
n − (m + 1)p

é compacta. Com efeito

1 1 m 1 1 1 1 1 m

= − − = ∗− com ∗
= − ·
q p n n p n p p n

1 1 1
Pelo Teorema de Rellich-Kondrachov, aplicado a = − , obtém-se que a imersão
q∗ p∗ n

W 1,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1 ≤ q < q∗ (2.5.56)
2.5. IMERSÕES DOS ESPAÇOS W M,P (Ω) 85

1 1 m
é compacta e, pelo Teorema 2.5.1, aplicado a ∗
− − ,
p p n

W m,p (Ω) ֒→ Lp (Ω)

que acarreta

W m+1,p (Ω) ֒→ W 1,p (Ω). (2.5.57)

As imersões (2.5.56) e (2.5.57) implicam a parte a) para m + 1.


Mostrar-se-á b). Para m = 1, o resultado é válido pelo Teorema de Rellich-Kondrachov.
Suponha b) válido para m ≥ 1. Será provado que b) é válido para m + 1, isto é, para
(m + 1)p = n demonstrar-se-á que a imersão

W m+1,p (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1≤q<∞

1 1 m
é compacta. De fato, tem-se = − que implica, pelo Teorema 2.5.1,
n p n

W m,p (Ω) ֒→ Ln (Ω),

portanto:
W m+1,p (Ω) ֒→ W 1,n (Ω).

O Teorema de Rellich-Kondrachov garante a imersão

W 1,n (Ω) ֒→ Lq (Ω), 1≤q<∞

é compacta. As duas últimas imersões implicam b) para m + 1.


Demonstrar-se-á c). Pelos Teoremas 2.5.1 e 2.5.3 vem que

W m,p (Ω) ֒→ C k,λ1 (Ω)

para algum 0 < λ1 ≤ 1. Notando que C k,λ1 (Ω) ֒→ C k (Ω) resulta

W m,p (Ω) ֒→ C k,λ1 (Ω) ֒→ C k (Ω).


86 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Seja B um conjunto limitado de W m,p (Ω) então B é um conjunto limitado em C k (Ω) e

|D α u(x) − D α u(y)| ≤ C||x − y||λ1 , ∀ x, y ∈ Ω, |α| ≤ k e u ∈ B.

Pelo Teorema de Arzela-Ascoli segue então que B é relativamente compacto em C k (Ω).


Assim o teorema está demonstrado. 

Observação 18 Grande parte dos resultados do Capı́tulo 2 foram obtidos para funções a
valores reais, por exemplo, a Proposição 2.3.2. Entretanto, todos os resultados do capı́tulo
são válidos para funções a valores complexos. Isto deve-se ao fato de que sendo u(x) =
Re u(x) + i Im u(x) então as funções Re u(x) e Im u(x) têm a mesma regularidade que u e
o suporte de cada uma delas está contido no suporte de u. Também, por exemplo,
Z 1/q Z 1/q Z 1/q
q q q
|u| dx ≤2 |Re u| dx +2 |Im u| dx

e
||Re u||W m,p ≤ ||u||W m,p , ||Im u||W m,p ≤ ||u||W m,p .

Resultados análogos para q = p = ∞. Então a observação decorre aplicando os resultados


obtidos para funções reais e as propriedades mencionadas.

2.6 Espaços H s (Ω)


Inicia-se o estudo com outra caracterização dos espaços H m (Rn ), m inteiro positivo,
que servirá de motivação para a definição dos espaços H s (Ω), quando s é um real positivo
e Ω um aberto do Rn . Considera-se a função Jm (x) = (1 + ||x||2 )m/2 , x ∈ Rn . Note que
b estará representando a
Jm (x) é uma função lentamente crescente no infinito. Nesta seção u
transformada de Fourier de u e ǔ a transformada de Fourier inversa.

Proposição 2.6.1 H m (Rn ) coincide com {u ∈ S ′ (Rn ); (1 + ||x||2)m/2 u


b ∈ L2 (Rn )}. Defi-
nindo
|||u|||m = ||(1 + ||x||2)m/2 u
b||L2 (Rn )
2.6. ESPAÇOS H S (Ω) 87

a aplicação u 7→ |||u|||m de H m (Rn ) → R+ é uma norma equivalente a norma de Sobolev


||u||m .

Demonstração: Sejam C1 , C2 constantes positivas verificando a desigualdade:


X X
C1 x2α ≤ (1 + ||x||2)m ≤ C2 x2α , ∀ x ∈ Rn
|α|≤m |α|≤m

(ver Exercı́cio 5 do Capı́tulo 1). Observe que H m (Rn ) ֒→ L2 (Rn ) ֒→ S ′ (Rn ) (ver Seção 1.3.3
do Capı́tulo 1). Se u ∈ H m (Rn ), para todo |α| ≤ m, resulta

D\
α u(x) = (ix)α u
b(x) quase sempre no Rn .

Daı́ e da última desigualdade elementar acima mencionada conclui-se que Jm u b ∈ L2 (Rn ) e


Z
2
|||u|||m = (1 + ||x||2 )m |b
u(x)|2 dx ≤
Rn
X Z X
≤ C2 |xα u
b(x)|2 dx = C2 |D\
α u(x)|2 dx =
n
|α|≤m ZR |α|≤m
X
= C2 |D u(x)| dx = C2 ||u||2m .
α 2

|α|≤m Rn

Reciprocamente, se u ∈ S ′ (Rn ) e Jm u
b ∈ L2 (Rn ), da desigualdade elementar resulta, que para
todo |α| ≤ m, (ix)α u
b ∈ L2 (Rn ), isto é, Dd α u ∈ L2 (Rn ). Logo D α u ∈ L2 (Rn ) e, além disso,

X Z
2
||u||m = |D\ α u(x)|2 dx =
R n
|α|≤m Z
X 1
= x2α |bu(x)|2 dx ≤ |||u|||2m
R n C 1
|α|≤m

que demonstra a proposição. 


A seguir, serão estudados os espaços H s (Rn ) sendo s um número real não negativo.
Para todo x ∈ Rn e s real não negativo, seja Js (x) = (1 + ||x||2 )s/2 , semelhante a Jm caso m
inteiro não negativo. Define-se H s (Rn ) como sendo o espaço vetorial

{u ∈ S ′ (Rn ); (1 + ||x||2 )s/2 u


b ∈ L2 (Rn )}
88 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

com o produto escalar definido por:


Z
(u, v)H s(Rn ) = (1 + ||x||2 )s u
b(x)b
v (x) dx,
Rn

cuja norma por ele induzida é:


Z
||u||2H s(Rn ) = (1 + ||x||2 )s |b
u(x)|2 dx.
Rn

Simples é mostrar que H s (Rn ) está imerso continuamente em L2 (Rn ).

Proposição 2.6.2 H s (Rn ) é um espaço de Hilbert e S(Rn ) está continuamente imerso em


H s (Rn ), sendo aı́ denso.

Demonstração: Seja (uν ) uma sucessão de Cauchy de H s (Rn ). Então (uν ) e (Js u
bν ) são
sucessões de Cauchy de L2 (Rn ), logo existem u e v em L2 (Rn ) tais que uν → u e Js u
bν → v
em L2 (Rn ). Para provar que H s (Rn ) é Hilbert, basta mostrar que v = Js u
b. Para toda função
teste ϕ no Rn , tem-se:

hJs u
b, ϕi = hb
u, Js ϕi = lim hb
uν , Js ϕi = lim hJs u
bν , ϕi = hv, ϕi
ν→∞ ν→∞

b = v.
e do lema de Du Bois Raymond, obtém-se Js u
Dada uma função u ∈ H s (Rn ), seja (ϕν ) uma sucessão de funções testes no Rn
b em L2 (Rn ). Para todo ν ∈ N, a função ϕν (x)/(1 + ||x||2)s/2 pertence
convergente para Js u
a D(Rn ) ⊂ S(Rn ). Logo existe ψν ∈ S(Rn ) tal que ψbν (x) = ϕν (x)/(1 + ||x||2 )s/2 para todo
x ∈ Rn . Daı́ Z
||ψν − u||2H s(Rn ) = (1 + ||x||2)s |ψbν (x) − u
b(x)|2 dx =
ZRn
= u(x)|2 dx,
|ϕν (x) − Js (x)b
Rn
isto é, (ψν ) é uma sucessão de S(Rn ) convergente para u em H s (Rn ).
Resta demonstrar a continuidade da inclusão de S(Rn ) em H s (Rn ). Seja m um inteiro
positivo tal que Z
C= (1 + ||x||2)−(m−s) dx < +∞.
Rn
2.6. ESPAÇOS H S (Ω) 89

Para todo u em S(Rn ) tem-se:


Z
2
||u||H s(Rn ) = (1 + ||x||2)m (1 + ||x||2 )−(m−s) |b
u(x)|2 dx ≤ C pm (b
u)
Rn

sendo pm as seminormas que definem a topologia de S(Rn ). Se (uν ) converge para zero em
S(Rn ), da continuidade da transformação de Fourier em S(Rn ) decorre que (b
uν ) converge
para zero em S(R). Logo, daı́ e da última desigualdade decorre que (uν ) converge para zero
em H s (Rn ). 

Corolário 11 D(Rn ) é denso em H s (Rn ) e D(Rn ) ֒→ H s (Rn ).

Seja s ≥ 0 e H −s (Rn ) = (H s (Rn ))′ o dual de H s (Rn ). Da proposição anterior resulta


que
S(Rn ) ֒→ H s (Rn ) ֒→ H −s (Rn ) ֒→ S ′ (Rn )

Representa-se por ||f ||H −s(Rn ) a norma de uma forma linear contı́nua f ∈ H −s (Rn ),
isto é,
||f ||H −s(Rn ) = sup {|hf, ui|; u ∈ H s (Rn ), ||u||H s(Rn ) = 1}.

Proposição 2.6.3 São verdadeiras as seguintes assertivas:

a) H −s (Rn ) = {f ∈ S ′ (Rn ); (1 + ||x||2)−s/2 fb ∈ L2 (Rn )}

b) ||f ||H −s(Rn ) = ||(1 + ||x||2)−s/2 fb||L2 (Rn )

para toda f em H −s (Rn ).

Demonstração: Dada f ∈ H −s (Rn ), do teorema de Riesz decorre a existência de u0 ∈


H s (Rn ) tal que
||f ||H −s(Rn ) = ||u0 ||H s(Rn )

e
hf, ui = (u, u0)H s (Rn ) para todo u em H s (Rn ).
90 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

bb
Para todo ϕ em S(Rn ) tem-se ϕ(x) = ϕ(−x), logo
Z
b
hf, ϕi = (ϕ,
b u0 )H s (Rn ) = (1 + ||x||2 )s ϕ(−x)b
u0 (x) dx =
Z R n

= (1 + ||x||2)s u b(−x) ϕ(x) dx,


Rn

logo, fb é definida pela função (1 + ||x||2 )s u b = (1 + ||x||2 )s/2 u


b0 (−x), donde J−s f(x) b0 (−x) ou
seja, J−s fb ∈ L2 (Rn ) e

||J−s fb||L2 (Rn ) = ||Js u


b0 ||L2 (Rn ) = ||u0||H s (Rn ) = ||f ||H −s(Rn ) .

Seja f ∈ S ′ (Rn ) tal que J−s fb pertence a L2 (Rn ). Dada uma função ϕ ∈ S(Rn ) seja
ϕ∗ (x) = ϕ(−x),
b bb
x ∈ Rn . Notando que ϕ(x) b̌
= ϕ(x) b∗ = ϕ. Escrevendo
= ϕ(x), vem que ϕ
−ψ = Js ϕ∗ pertencente a S(Rn ), tem-se

b L2 (Rn ) = ||Js ϕ∗ ||L2 (Rn ) = ||ψ||L2(Rn )


||ϕ||H s(Rn ) = ||Js ϕ||

b∗ = J[
e também, ϕ = ϕ −s ψ, logo:
Z
s
hf, ϕi = hf, J[ b
−s ψi = hJ−s f, ψi = (1 + ||x||2)− 2 fb(x)ψ(x) dx,
Rn

portanto,
|hf, ϕi| ≤ ||J−s fb||L2 (Rn ) ||ψ||L2(Rn ) ≤ ||J−s fb||L2 (Rn ) ||ϕ||H s(Rn ) ,

desigualdade esta que demonstra ser f : S(Rn ) → K contı́nua na topologia de H s (Rn ). Logo
f estende-se a um único funcional linear contı́nuo ao H s (Rn ), isto é, f ∈ H −s (Rn ). 
A seguir mostra-se que para ϕ ∈ S(Rn ) a aplicação linear

u 7→ ϕu de H s (Rn ) 7→ H s (Rn )

é contı́nua. Para isto observa-se que

Lema 2.6.1 Para ϕ e u em S(Rn ), tem-se

(2π)n/2 ϕu
c =ϕ
b∗u
b.
2.6. ESPAÇOS H S (Ω) 91

Demonstração: De fato, nota-se que


Z
\
(ϕ(u)(x) = (2π)−n/2 e−i(x,y) ϕ(y)u(y) dy


e ϕ(y) = ϕ(y), isto é,
Z Z
−n
ϕ(y) = (2π) ei(y,z)−i(z,w) ϕ(w) dwdz

onde cada integral é tomado sobre Rn . Segue então


Z Z Z
[
(ϕu)(x) = (2π) −3n/2
e−i(x−z,y) e−i(z,w) u(y)ϕ(w) dydwdz =
Z Z
= (2π) −n
e−i(z,w) ϕ(w)bu(x − z) dwdz =
Z
= (2π)−n/2 u b dz = (2π)−n/2(b
b(x − z)ϕ(z) u ∗ ϕ)(x)
b

que mostra o lema. 

Proposição 2.6.4 Sejam ϕ ∈ S(Rn ) e u ∈ H s (Rn ) com s real ≥ 0, então

a) ϕu ∈ H s (Rn )

b) A aplicação linear

u 7→ ϕu de H s (Rn ) 7→ H s (Rn )

é contı́nua e verifica:
||ϕu||H s(Rn ) ≤ C||ϕ||H r (Rn ) ||u||H s(Rn )

onde 2r − 2s > n, C 2 = (2π)−n C0 22s+1 e


Z
1
C0 = dy.
Rn (1 + ||y||2)r−s

Demonstração: De inı́cio considera-se u ∈ S(Rn ). Então pelo Lema 2.6.1 segue-se:


Z Z
2 s
(1 + ||x|| ) |ϕu(x)|
c 2
dx = (2π) −n
(1 + ||x||2)s/2 |(ϕ b)(x)|2 dx,
b∗u
92 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

onde as integrais são tomadas sobre Rn . Por outro lado,


Z (1 + ||x||2 )s/2
2 s/2
(1 + ||x|| ) (ϕ b×ub)(x) ≤ 2 r/2
u(x − y)|(1 + ||y||2)r/2 |ϕ(y)|
|b b dy,
(1 + ||y|| )
que implica, pela desigualdade de Cauchy-Schwarz,
2 Z
2 s/2 2 (1 + ||x||2)s
(1 + ||x|| ) (ϕ b∗u
b)(x) ≤ ||ϕ||H r (Rn ) u(x − y)|2 dy.
|b
(1 + ||y||2)r
Assim
Z Z
(1 + ||x||2 )s
||ϕ||2H s(Rn ) ≤ (2π) −n
||ϕ||2H r (Rn ) 2 r
u(x − y)|2 dydx.
|b (2.6.58)
(1 + ||y|| )
Observe que 1 + ||x||2 < 2(1 + ||x − y||2) + 2(1 + ||y||2), portanto

(1 + ||x||2)s ≤ 22s (1 + ||x − y||2)s + 22s (1 + ||y||2)s ,

donde pelo Teorema de Fubini,


Z Z
(1 + ||x||2 )s
2 )r
u(x − y)|2 dxdy ≤
|b
(1
Z + ||y||
1 hZ i
2s 2 s 2
≤2 2 r
(1 + ||x − y|| ) |b
u (x − y)| dx dy +
Z (1 + ||y|| ) h Z i
1 2
+22s 2 r−s
|bu(x − y)| dx dy ≤
h + ||y|| )
(1 i
≤ C0 22s ||u||2H s(Rn ) + ||u||2L2(Rn ) ≤ C0 22s+1 ||u||2H s(Rn ) .
De (2.6.58) e desta última desigualdade resulta

||ϕu||H s(Rn ) ≤ C||ϕ||H r (Rn ) ||u||H s(Rn ) . (2.6.59)

Seja u ∈ H s (Rn ) e (uν ) uma sucessão de funções D(Rn ) tal que uν → u em H s (Rn )
(ver Corolário 11). Segue então que

ϕ uν → ϕ u em L2 (Rn ).

Por (2.6.59) vem que (ϕ uν ) é uma sucessão de Cauchy em H s (Rn ), logo, existe v ∈ H s (Rn )
tal que ϕ uν → v em H s (Rn ), portanto ϕ uν → v em L2 (Rn ). Da unicidade dos limites vem
que v = ϕ u e
ϕ uν → ϕ u em H s (Rn ).

Isto mostra a parte a). A parte b) segue de (2.6.59) e desta última convergência. 
2.6. ESPAÇOS H S (Ω) 93

A seguir serão introduzidos os espaços H s (Ω). Denota-se por H s (Ω), s um número


real não negativo e Ω um aberto do Rn , ao espaço vetorial

H s (Ω) = {u = v|Ω ; v ∈ H s (Rn )}.

Dota-se a H s (Ω) de uma topologia. De fato, considera-se a aplicação linear sobrejetiva

H s (Rn ) → H s (Ω), v 7→ rv = v|Ω .

Observe que o núcleo N(r) de r é fechado. Com efeito, seja (vν ) uma sucessão de elementos
de H s (Rn ) tal que rvν = 0 e vν → v em H s (Rn ). Tem-se
Z
2
||vν − v||H s (Rn ) = (1 + ||x||2)s |b v(x)|2 dx ≥
vν (x) − b
Z Rn Z Z
≥ \ 2
|(vν − v)(x)| dx = 2
|vν (x) − v(x)| dx ≥ |v|2 dx
Rn Rn Ω

logo Z
|v|2 dx ≤ lim ||vν − v||2H s(Rn ) = 0

isto é, v|Ω = 0 o que mostra que N(r) é fechado.


Considera-se
r
H s (Rn ) −→ H s (Ω)
πց σր (2.6.60)
H s (Rn )/N(r)
onde π é o homomorfismo canônico. Tem-se que σ é um isomorfismo de espaço vetorial e
X = H s (Rn )/N(r) é um espaço de Hilbert com produto escalar

([v], [w])X = ([v], [w])1 + i([v], i[w])1 ,

onde
([v], [w])1 = 4−1 (||[v + w]||2 − ||[v − w]||2),

e norma
||[v]||X = inf {||w||H s(Rn ) ; w ∈ [v]}. (2.6.61)
94 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Equipa-se H s (Ω) com a topologia dada por H s (Rn )/N(r), via o isomorfismo σ. Assim

(u1 , u2 )H s (Ω) = ([v1 ], [v2 ])X onde v1 |Ω = u1 e v2 |Ω = u2 (2.6.62)

||u||H s(Ω) = ||[v]||X = inf {||v||H s(Rn ) ; v|Ω = u} (2.6.63)

Com esse produto escalar, H s (Ω) torna-se um espaço de Hilbert.

Observação 19 Com o intuito de tornar autosuficiente a leitura destas notas, mostra-se


que a norma (2.6.61) do espaço X = H s (Rn )/N(r) satisfaz a lei do paralelogramo.

Com efeito, sejam v1 ∈ [v] e w1 ∈ [w] então v1 ± w1 ∈ [v ± w]. Tem-se

||[v] + [w]||2X + ||[v] − [w]||2X ≤ ||v1 + w1 ||2H s + ||v1 − w1 ||2H s = 2||v1||2H s + 2||w1 ||2H s

que implica, tomando o mı́nimo de cada um dos termos da última expressão,

||[v] + [w]||2X + ||[v] − [w]||2X ≤ 2||[v]||2X + 2||[w]||2X .

A desigualdade

2||[v]||2X + 2||[w]||2X = ||[v] + [w]||2 + ||[v] − [w]||2

é mostrada de forma análoga.

Proposição 2.6.5 D(Ω) é denso em H s (Ω), s real ≥ 0.

Demonstração: Por construção a aplicação r definida em (2.6.60) é contı́nua. Seja u ∈


H s (Ω) então existe v ∈ H s (Rn ) tal que rv = v|Ω = u. Como D(Rn ) é denso em H s (Rn )
(Corolário 11) vem que existe (ϕν ) sucessão de funções de D(Rn ) tal que ϕν → v em H s (Rn ),
e pela continuidade de r, resulta rvν → rv em H s (Ω), que mostra a proposição. 
No caso de ser s um inteiro não negativo m e Ω um aberto limitado, tem-se o seguinte
resultado:
2.6. ESPAÇOS H S (Ω) 95

Proposição 2.6.6 Seja Ω um aberto limitado do Rn , Ω de classe C m . Então

H m (Ω) = {u = v|Ω ; v ∈ H m (Rn )}

e as normas ||u||H m(Ω) e |||u|||H m(Ω) são equivalentes, onde |||u|||H m(Ω) é a norma definida
em (2.6.63) para s = m.

Demonstração: Seja P : H m(Ω) 7→ H m (Rn ) o operador de prolongamento dado pelo Teo-


rema 2.4.2. Considere u ∈ H m (Ω). Seja v = P u então rv = rP u = u onde rv = v| Ω . Isto
mostra uma das inclusões dos conjuntos. Por outro lado, note que rD α v = D α rv, |α| ≤ m,
que mostra a outra inclusão.
Tem-se:
|||u|||H m(Ω) ≤ ||P u||H m(Rn ) ≤ C||u||H m(Ω) . (2.6.64)

Por outro lado, seja v ∈ H m (Rn ) tal que rv = u. Então

|D α(rv)||L2 (Ω) = ||r(D αv)||L2 (Ω) ≤ ||D α v||L2 (Rn ) , |α| ≤ m

logo
||u||H m(Ω) ≤ ||v||H m(Rn ) .

Como v foi arbitrário segue-se que

||u||H m(Ω) ≤ |||u|||H m(Ω) . (2.6.65)

De (2.6.64) e (2.6.65) obtém-se que as normas são equivalentes. 


Conclui-se da Proposição 2.6.6 que quando Ω é um aberto limitado do Rn com Ω
de classe C m , a definição de espaço H m (Ω) dada no Parágrafo 2.2 coincide com a definição
dada por (2.6.60)–(2.6.62). Em geral, isto é, quando Ω não é regular, tem-se que o espaço
definido por (2.6.60)–(2.6.62) está contido no espaço definido no Parágrafo 2.3. Para um
estudo deste caso o leitor pode consultar N. Meyers - J. Serrin [24].
Serão demonstradas algumas propriedades dos espaços H s (Ω).
96 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Proposição 2.6.7 Se 0 ≤ s1 ≤ s2 então

H s2 (Ω) ֒→ H s1 (Ω).

Demonstração: Do fato H s2 (Rn ) ⊂ H s1 (Rn ) segue que H s2 (Ω) ⊂ H s1 (Ω). Também para
u ∈ H s2 (Ω),
{v ∈ H s2 (Rn ); v|Ω = u} ⊂ {w ∈ H s1 (Rn ); w|Ω = u}.

Desta inclusão e notando que ||z||H s1 (Rn ) ≤ ||z||H s2 (Rn ) para todo z ∈ H s2 (Rn ), vem que

inf {||w||H s1 (Rn ) ; w|Ω = u} ≤ inf {||v||H s2 (Rn ) ; v|Ω = u}

isto é,
||u||H s1 (Ω) ≤ ||u||H s2 (Ω) , u ∈ H s2 (Ω)

que mostra a inclusão contı́nua de H s2 (Ω) em H s1 (Ω). 


Denota-se por Cbm (Ω) ao espaço de Banach

Cbm (Ω) = {u = v|Ω ; v ∈ C m (Rn ) e D α u é limitado em Ω, |α| ≤ m}

equipado com a norma


 
α
||u||Cbm(Ω) = max sup |D u(x)| .
|α|≤m x∈Ω

Claramente se Ω é limitado, Cbm (Ω) = C m (Ω).

n
Proposição 2.6.8 Se s − > m, m inteiro não negativo, então
2

H s (Ω) ֒→ Cbm (Ω).

Demonstração: Faz-se a demonstração por indução com relação m. Mostra-se o resultado


para m = 0.
2.6. ESPAÇOS H S (Ω) 97

Sejam u ∈ H s (Ω) e v ∈ H s (Rn ) tal que v|Ω = u. Tem-se que

v(x) = (1 + ||x||2)−s/2 (1 + ||x||2)s/2 vb(x) ∈ L2 (Rn ) ∩ L1 (Rn )


b

v||L1 (Rn ) ≤ C 1/2 ||v||H s(Rn )


||b
R
com C = Rn
(1 + ||x||2 )−s dx < ∞. Dados x, xν no Rn , tem-se v(x) = b̌
v(x), logo
Z
−n/2
v(xν ) − v(x) = (2π) [ei(xν ,z) − ei(x,z) ]b
v(z) dz.
Rn

Se xν → x em Rn , decorre desta última igualdade e do Teorema da Convergência Dominada


de Lebesgue aplicado às funções wν (z) = ei(xν ,z) b
v (z), que v(xν ) → v(x), isto é, v é contı́nua
em x. Como x ∈ Rn foi arbitrário segue-se que v é contı́nua em Rn . Portanto u é contı́nua
em Ω. Também

|v(x)| ≤ (2π)−n/2 ||b


v||L1 (Rn ) ≤ (2π)−n/2 C 1/2 ||v||H s(Rn ) , ∀ x ∈ Rn

que implica

||u||Cb0(Ω) ≤ (2π)−n/2 C 1/2 ||v||H s(Rn ) , ∀ v ∈ H s (Rn ), v|Ω = u

portanto

||u||C 0(Ω) ≤ (2π)−n/2 C 1/2 ||u||H s(Ω)


b

que mostra a proposição para m = 0.


Suponha o resultado válido para m ≥ 0. Mostra-se que ele também é válido para
∂v
m+1, isto é, para s− n2 > m+1. De inı́cio observe que se v ∈ H s (Rn ) então ∈ H s−1 (Rn )
∂xj
e

∂v

∂xj s−1 n ≤ ||v||H s(Rn ) , j = 1, 2, . . . , n . (2.6.66)
H (R )
98 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

d
∂v
Com efeito, (x) = ixj vb(x) e
∂xj

Z 2 Z
d
2 s−1 ∂v
(1 + ||x|| ) (x) dx = (1 + ||x||2)s−1 |xj |2 |bv (x)|2 dx ≤
Rn ∂xj n
ZR
≤ (1 + ||x||2 )s |b
v (x)|2 dx
Rn

que mostra a afirmação. Sejam u ∈ H s (Ω) e v ∈ H s (Rn ) tal que v|Ω = u. Pela primeira
∂v
parte vem que v ∈ Cb0 (Rn ) e pela hipótese de indução pois ∈ H s−1 (Rn ) e Ω pode ser o
∂xj
∂v
Rn , ∈ Cbm (Rn ) e
∂xj

α ∂v ∂v
D (x) ≤ C1 ∀ x ∈ Rn e |α| ≤ m
∂xj ∂xj s−1 n ,
H (R )

∂v
que implica por (2.6.66) e notando que v ∈ C 1 (Rn ) pois ∈ C 0 (Rn ), j = 1, 2, . . . , n,
∂xj

|D a v(x)| ≤ C1 ||v||H s(Rn ) , ∀ x ∈ Rn e |α| ≤ m + 1.

Assim

||u||C m+(Ω) ≤ C1 ||v||H s(Rn ) , ∀ v ∈ H s (Rn ), v| Ω = u


b

isto é

||u||C0m+1(Ω) ≤ C1 ||u||H s(Ω)

e a proposição está demonstrada. 


Observe que a Proposição 2.6.8 é uma generalização, num certo sentido, do Teorema
n
2.3.3, Parágrafo 2.3, onde é estudado a imersão para o caso m − > k.
2
Existem outros métodos para definir H s (Ω), todos coincidentes quando Ω = Rn , Rn+
ou um aberto limitado regular. Como exemplo de algum desses métodos pode-se mencionar
os que usam a teoria de interpolação de espaços de Hilbert (ver J.L. Lions-E. Magenes [11]).
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 99

2.7 Teoremas de Traço

A seguir estuda-se uma versão elementar do teorema de traço. Considera-se Ω = Rn


ou Ω um aberto limitado bem regular do Rn (isto é, Ω é de classe C m para todo m = 1, 2, . . .),
com fronteira Γ. Com D(Γ) representa-se o espaço vetorial das funções reais w definidas em
Γ, possuindo derivadas parciais contı́nuas de todas as ordens. Dada uma função u definida
em Ω, representa-se por γ0 u a restrição de u a Γ. A caracterização do espaço ao qual pertence
γ0 u, quando u pertence a H m (Ω), é conhecido sob a denominação de teorema de traço. Note
que se u ∈ D(Ω) resulta que γ0 u ∈ D(Γ). Para a demonstração do teorema de traço é preciso
dar sentido do espaço H s (Γ), cuja construção faz-se a seguir.
No caso Ω = Rn+ , tem-se Γ = {(x′ , 0); x′ ∈ Rn−1 }, identificando-se toda função u
definida em Γ com a função x′ → u(x′ , 0) do Rn−1 em R. Com tal identificação tem-se
D(Γ) = D(Rn−1 ), Lp (Γ) = Lp (Rn−1 ). Portanto, neste caso simples, define-se H s (Γ) como
sendo H s (Rn−1 ).
Suponha Ω um aberto limitado do Rn , suposto bem regular. Considere um sistema
de cartas locais de Γ, isto é, {(U1 , ϕ1 ), (U2 , ϕ2 ), . . . , (UN , ϕN )}, e funções testes σ1 , σ2 , . . . , σN
no Rn tais que
N
X
supp (σj ) ⊂ Uj , j = 1, 2, . . . , N, σj (x) = 1, x ∈ Γ.
j=1

Dada uma função w definida em Γ, para todo j = 1, 2, . . . , N seja




(σj w)(ϕ−1 ′
j (y , 0)) se y ′ ∈ Ω0 =]0, 1[n−1
wj (y) =
0 se y ′ ∈ Rn−1 \Ω0

Sendo supp (γ0 σj ) = supp σj ∩ Γ ⊂ Uj ∩ Γ e como ϕj aplica Uj ∩ Γ sobre Ω0 × {0}, tem-se

supp (wj ) ⊂ ϕj (supp σj ∩ Γ) ⊂ Ω0 × {0}.

Decorre daı́ que se w ∈ D(Γ), então wj pertence a D(Rn−1 ) para todo j = 1, 2, . . . , N.


100 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Dado s > 0 considere-se H s (Γ) como sendo o espaço vetorial das funções w definidas
em Γ tais que wj ∈ H s (Rn−1 ) para todo j = 1, 2, . . . , N, munido do produto escalar seguinte:
N
X
(w, v)H s(Γ) = (wj , vj )H s (Rn−1 )
j=1

para todo par w, v ∈ H s (Γ). Tem-se que H s (Γ) é um espaço de Hilbert sendo D(Γ) denso
em H s (Γ).

Proposição 2.7.1 Existe uma constante positiva C tal que

||γ0 u||H 1/2 (Γ) ≤ C||u||H 1(Ω)

para toda u ∈ D(Ω).

Observação 20 Suponha demonstrada a Proposição 2.7.1. Ela afirma que considerando


D(Ω) com a topologia induzida por H 1 (Ω), a aplicação

γ0 : D(Ω) → H 1/2 (Γ)

é contı́nua. Sendo D(Ω) denso em H 1 (Ω), pois Ω é bem regular, esta aplicação prolonga-se
por continuidade a uma aplicação linear e contı́nua, ainda representada por γ0 , tal que:

γ0 : H 1 (Ω) → H 1/2 (Γ),

a qual denomina-se função traço e seu valor γ0 u, para u em H 1 (Ω), denomina-se o traço
de u sobre Γ. Pode-se assim, enunciar o seguinte teorema, conhecido sob a denominação de
teorema de traço.

Teorema 2.7.1 A função traço aplica H 1 (Ω) sobre H 1/2 (Γ) e o núcleo de γ0 é o espaço
H01 (Ω).

Observação 21 Quando se diz que os objetos de H01 (Ω) são nulos na fronteira de Ω, deseja-
se com isto dizer que o núcleo do traço de γ0 é o espaço H01 (Ω).
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 101

Demonstração da Proposição 2.7.1: É suficiente considerar o caso Ω = Rn+ . De fato,


suponhamos que a proposição seja válida para Ω = Rn+ . Dado u ∈ D(Ω) e j = 1, 2, . . . , N,
seja

(σj u)(ϕ−1
j (x)), x ∈]0, 1[n−1 ×[0, 1] = V
vj (x) =
0 x ∈ Rn+ \V
Segue-se que vj ∈ (Rn+ ) e γ0 vj = γ0 uj , onde uj = σj u, logo,

||uj ||H 1/2 (Rn−1 ) = ||γ0vj ||H 1/2 (Rn−1 ) ≤ C||vj ||H 1 (Rn+ ) ≤ CCj ||u||H 1(Ω)
P n 1/2
sendo Cj uma constante que depende de σj e ϕj . Fazendo C1 = C Cj2 , tem-se:
j=1

||γ0 u||H 1/2(Γ) ≤ C1 ||u||H 1(Ω) para todo u ∈ D(Ω).

Demonstra-se a Proposição 2.7.1 no caso Ω = Rn+ . Represente-se por F1 a transfor-


mada de Fourier no L2 (Rn−1 ). Dado um elemento u ∈ D(Rn+ ), para todo t ≥ 0 seja u(t) a
função de Rn−1 em R dada por

u(t)(x′ ) = u(x′ , t) para x′ ∈ Rn−1


w(t) = F1 [u(t)]
Z
′ ′

w(x , t) = w(t)(x ) = (2π) ′ −(n−1)/2
e−i(x ,y ) u(y ′, t) dy ′
Rn−1
′ ′ ′
Observe-se que (γ0 u)(x , 0) = u(x , 0) = u(0)(x ), logo:

1. ||γ0u||2H 1/2 (Γ) = ||u(0)||2H 1/2(Rn−1 ) =


Z
= (1 + ||x′ ||2 )1/2 |F1 u(0)(x′ )|2 dx′ =
n−1
ZR
= (1 + ||x′ ||2 )1/2 ||w(x′, 0)|2 dx′ .
Rn−1
Tem-se, também:
Z ∞ Z
2. ||u||2L2(Rn ) = |w(x′ , t)|2 dx′ dt =
+
Z ∞ 0 Rn−1 Z ∞
2
= ||u(t)||L2(Rn−1 ) dt = ||F1[u(t)]||2L2 (Rn−1 ) dt =
Z0 ∞ Z 0

= |w(x′ , t)|2 dx′ dt.


0 Rn−1
102 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV


Para j = 1, 2, . . . , n − 1, seja Dj = · Então:
∂xj
F1 [Dj u(t)](x′ ) = (−ixj )F1 [u(t)](x′ ) = (−ixj )w(x′ , t),

para (x′ , t) ∈ Rn+ . Tem-se, também:

(Dj u(t))(x′ ) = (Dj u)(x′ , t).

Do cálculo anterior obtém-se:


Z 1 nZ o
3. ||Dj u||2L2(Rn ) = |(Dj u(t))(x′ )|2 dx′ dt =
+
Z ∞ 0 Rn−1 Z

= |Dj u(t)||2L2(Rn ) dt = ||F1 [Dj u(t)]||2L2 (Rn−1 ) dt =
Z0 ∞ Z 0

= |xj |2 |w(x′ , t)|2 dx′ dt.


0 Rn−1

∂u ′
Fazendo v(x′ , t) = (x , t) tem-se que
∂t
∂w ′
(x , t) = F1 [v(t)](x′ ),
∂t
logo
Z ∞
4. ||Dn u||2L2 (Rn ) ||v(t)||2L2 (Rn−1 ) dt =
=
+
Z ∞ 0 Z ∞Z
∂w ′ 2 ′
= 2
||F1 v(t)||L2(Rn−1 ) dt = (x , t) dx dt.

0 0 Rn−1 ∂t

Das três últimas relações conclui-se:


Z ∞Z n
∂w ′ 2 o ′
5. 2
||u||H 1(Rn ) = ′ 2 ′ 2
(1 + ||x || )|w(x , t)| + (x , t) dx dt.
+
0 Rn−1 ∂t
Fixando x′ no Rn−1 , seja ϕ(t) = w(x′ , t), t ≥ 0, então ϕ ∈ D([0, ∞)) e
∂w ′
ϕ′ (t) = (x , t). Da desigualdade de Schwarz obtém-se:
∂t
Z ∞ Z ∞
d 2
2
|ϕ(0)| = − |ϕ(t)| dt = −2Re ϕ(t)ϕ′ (t) dt ≤
0 dt 0
Z ∞ 1/2  Z ∞ 1/2
≤2 |ϕ(t)|2 dt |ϕ′ (t)|2 dt ,
0 0
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 103

ou seja,
Z ∞ 1/2  Z ∞ ∂w ′ 2 1/2
′ 2
|w(x , 0)| ≤ 2 ′
|w(x , t)| dt 2
∂t (x , t) dt
0 0

6. (1 + ||x′ ||2 )1/2 |w(x′, 0)|2 ≤


Z ∞ 1/2  Z ∞ ∂w 2 
1/2
≤2 (1 + ||x′ ||2 )|w(x′, t)|2 dt (x′ , t) dt ≤
∂t
0 0
Z ∞ Z ∞
∂w ′ 2
≤ ′ 2 ′ 2
(1 + ||x || )|w(x , t)| dt +
∂t (x , t) dt.
0 0
Integrando sobre o Rn−1 , aplicando o teorema de Fubini e levando em conta as relações 1. e
6. obtém-se:
||γ0u||H 1/2 (Γ) ≤ ||u||H 1(Rn+ )

o que demonstra a Proposição 2.7.1. 


Demonstração do Teorema 2.7.1 no caso Ω = Rn+

a) γ0 é uma aplicação sobre – De fato, seja ϕ ∈ S(Rn−1 ) e considera-se


p
v(x′ , xn ) = (F1 ϕ)(x′ ) exp ( − 1 + ||x′ ||2 || xn )
Z
−1 1−n ′ ′
′ ′
u(x , xn ) = F1 [v(xn )](x ) = (2π) 2 ei(x ,y ) v(y ′, xn ) dy ′.
Rn−1

Sendo v(0)(x′ ) = v(x′ , 0) = (F1 ϕ)(x′ ) tem-se

γ0 u = F1−1 [v(0)] = F1−1 F1 ϕ = ϕ.

Resulta daı́ que para demonstrar que γ0 é uma aplicação sobre é suficiente demonstrar
que u ∈ H 1 (Rn+ ).

Note-se que sendo


Z ∞ p 1
exp ( − 2 1 + ||x′ ||2 xn ) dxn = p ,
0 2 1 + ||x′ ||2
obtém-se:
Z
1. (1 + ||x′ ||2 )|v(x′ , xn )|2 dx′ dxn =
Z Rn
+
1 1
= (1 + ||x′ ||2 )1/2 |F1 ϕ(x′ )|2 dx′ = ||ϕ||2H 1/2 (Rn−1 ) .
2 Rn−1 2
104 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Também:
∂v p
(x′ , xn ) = − 1 + ||x′ ||2 v(x′ , xn )
∂xn
e portanto:
Z 2
∂v
2. ′ ′
∂xn (x , xn ) dx dxn =
Z Rn
+
1
= (1 + ||x′ ||2 )|v(x′ , xn )| dx′ dxn = ||ϕ||2H 1/2 (Rn−1 ) .
Rn
+
2

Fazendo:
wj (x′ , xn ) = i x′j v(x′ , xn ), j = 1, 2, . . . , n − 1
∂v
wn (x′ , xn ) = ∂xn
(x′ , xn ),
tem-se:
Dj u(x′ , xn ) = F1−1 [wj (xn )](x′ ), j = 1, 2, . . . , n − 1
Dn u(x′ , xn ) = F1−1 [wn (xn )](x′ ).

Sendo F1−1 uma isometria de L2 (Rn−1 ) sobre L2 (Rn−1 ) tem-se:


Z n−1
X
3. (|u(x′ , xn )|2 + |Dj u(x′ , xn )|2 ) dx′ dxn =
Rn
+ j=1
Z ∞  n−1
X 
2
= ||v(xn )||L2(Rn−1 ) + ||F1−1[wj (xn )]||L2 (Rn−1 ) dxn =
0 j=1
Z ∞  n−1
X 
= ||v(xn )||2L2(Rn−1 ) + ||wj (xn )||2L2 (Rn−1 ) dxn =
Z0 j=1
1
= (1 + ||x || )|v(x , xn )|2 dx′ dxn =
′ 2 ′
||ϕ||2H 1/2 (Rn−1 ) .
Rn
+
2

Tem-se também:
Z Z 2
∂v
4. ′
|Dn u(x , xn )| dx dxn = 2 ′ (x′
, x ) dx′ dxn =
∂xn n
Rn
+ Rn
+
1
= ||ϕ||2H 1/2 (Rn−1 ) .
2
Das relações 3. e 4. resulta que u ∈ H 1 (Rn+ ) e ||u||H 1(Rn+ ) = ||ϕ||H 1/2 (Rn−1 ) . Desta
relação e da densidade de S(Rn−1 ) em H 1/2 (Rn−1 ) resulta que γ0 é sobre.
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 105

Resta demonstrar que o núcleo de γ0 é o espaço H01 (Rn+ ). Para tal usa-se o seguinte
resultado:

Lema 2.7.1 Dados u ∈ H 1 (Rn+ ) e ϕ ∈ D(Rn+ ), tem-se γo(ϕ u) = (γ0ϕ)(γ0 u).

Demonstração: Observa-se que as aplicações

σ1 : H 1 (Rn+ ) → H 1 (Rn+ ) e σ2 : H 1/2 (Rn−1 ) → H 1/2 (Rn−1 )


u → ϕu u → (γ0 ϕ)u

são lineares e contı́nuas, (ver Proposição 2.6.4). Também, o lema é verdadeiro quando
u ∈ D(Rn+ ).
Seja (ϕk ) uma sucessão de D(Rn+ ), convergente para u em H 1 (Rn+ ). Da continuidade
das aplicações σ1 , σ2 e γ0 , são verdadeiros os seguintes limites na topologia de H 1/2 (Rn−1 ):

(γ0 ϕ)(γ0 u) = lim (γ0 ϕ)(γ0 ϕk ) = lim γ0 (ϕϕk ) = γ0 (ϕu ).


k→∞ k→∞

b) O espaço H01 (Ω) é o núcleo de γ0 – Com efeito, sendo γ0 u = 0 para todo u ∈ D(Rn+ ),
H 1 (Rn
+)
tem-se γ0 u = 0 para todo u ∈ H01 (Rn+ ) = D(Rn+ ) , o que demonstra estar H01 (Rn+ )
contido no núcleo de γ0 .

Considere u ∈ H 1(Rn+ ) tal que γ0 u = 0. Será provado que u ∈ H01 (Rn+ ).


n
Caso 1: S(u) = supp uR é um compacto do Rn+ . Para k ∈ N considere as funções:
θ 6

1 1
0 se 0 ≤ t <

1 2

θk (t) = kt − 1 se ≤t ≤ θ

k
k k

q
2

-
1 se t > 1 2
k 0 k k
t

e
uk (x′ , xn ) = θk (xn )u(x′ , xn ), (x′ , xn ) ∈ Rn+ ,
106 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

então supp (uk ) ⊂ S(u) ∩ {Rn−1 × [1/k, ∞[}, sendo este último um compacto do Rn+ ,
resulta que uk é um elemento de H 1 (Rn+ ) com suporte compacto contido no Rn+ , logo
uk ∈ H01 (Rn+ ). Demonstrando-se que (uk ) converge para u na topologia de H 1 (Rn+ )
ficará provado que u ∈ H01 (Rn+ ).

Realmente,
Z
|uk (x) − u(x)|2 dx =
Z Rn
+
Z ∞ 

= dx |θk (xn )u(x′ , xn ) − u(x′ , xn )|2 dxn =
ZRn−1 Z 1/k 0
= |u(x′ , xn )|2 dxn dx′ +
n−1
Z R Z 02/k
+ |(kxn − 2)2 |u(x′ , xn )|2 dxn dx′ ,
Rn−1 1/k

logo, Z 2/k
||uk − u||2L2 (Rn+ ) ≤ ||u(xn )||2L2 (Rn−1 ) dxn ,
0

demonstrando ser a sucessão (uk ) convergente para u em L2 (Rn+ ).

Dado j = 1, 2, . . . , n − 1 tem-se:

Dj uk (x′ , xn ) = θk (xn )(Dj u)(x′ , xn ).

Sendo Dj u um elemento de L2 (Rn+ ), tem-se que a sucessão (Dj uk ) converge para Dj u


na topologia de L2 (Rn+ ). Tem-se também:

Dn uk (x′ , xn ) = θk (xn )(Dn u)(x′ , xn ) + θk′ (xn )u(x′ , xn ).

Sendo Dn u ∈ L2 (Rn+ ) a sucessão de funções dada pela primeira parcela da expressão


anterior converge para Dn u em L2 (Rn+ ). Observe que u ∈ L2 (0, T ; L2 (Rn−1 )) e Dn u ∈
L2 (0, T ; L2(Rn−1 )) onde 0 < T < ∞, portanto u ∈ C 0 ([0, T ]; L2 (Rn−1 )) (ver J.L. Lions
[8]). Disto vem que u(0) = γ0 u = 0, onde u(0)(x′) = u(x′ , 0), s′ ∈ Rn−1 . Assim
Z xn
′ ′ ′ ∂u ′
u(x , xn ) = u(x , xn ) − u(x , 0) = (x , t) dt,
0 ∂xn
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 107

de onde, aplicando a desigualdade de Schwarz, obtém-se:


Z
∂u ′ 2
xn

|u(x , xn )| 2
≤ xn
∂xn (x , t) dt ≤
Z0 2
2 2/k ∂u ′
≤ (x , t) dt,
k 0 ∂xn

para 0 ≤ xn ≤ 2/k. Logo,


Z
|θk′ (xn )u(x′ , xn )|2 dx′ dxn =
Rn
Z
+
Z 2/k
= k 2 |u(x′ , xn )|2 dx′ dxn ≤
n−1
ZR Z1/k Z 2/k
2/k ∂u ′
≤ 2k ′
n−1
∂xn (x , t) dt dxn dx =
1/k
R
Z Z 2/k 0
∂u ′
=2 ′
∂xn (x , t) dtdx ,
Rn−1 0

provando que (Dn uk ) converge para Dn u em L2 (Rn+ ).

Caso 2: Tome u ∈ H 1 (Rn+ ). Seja θ uma função teste no Rn tal que θ(x) = 1 se
||x|| ≤ 1 e θ(x) = 0 se ||x|| ≥ 2, 0 ≤ θ(x) ≤ 1. Para k ∈ N seja θk (x) = θ(x/k), x ∈ Rn
e uk (x) = θk (x)u(x), x ∈ Rn+ . Então, (uk ) converge para u na topologia de H 1 (Rn+ ).
Do Lema 2.7.1 resulta que γ0 (uk ) = γ(θk )γ0 (u) = 0. Sendo S(uk ) ⊂ supp (θk ) ∩ Rn+ ,
do Caso 1 resulta que uk ∈ H01 (Rn+ ), logo u ∈ H01 (Rn+ ), o que completa a demonstração
do teorema de traço no caso Rn+ .

Demonstração do Teorema 2.7.1 quando Ω limitado


a) γ0 é uma aplicação sobre – Dada uma função w ∈ H 1/2 (Γ), por definição,
tem-se que

(σj w)(ϕ−1 ′
j (y , 0)) se y ′ ∈ Ω0 =]0, 1[n−1
wj (y ) =

0 se y ′ ∈ Rn−1 \Ω0

é um objeto de H 1/2 (Rn−1 ) com suporte contido em Ω0 . Seja θ uma função teste no Rn tal
que supp (θ) ⊂ Ω0 ×] − 1, +1[ e θ(x′ , 0) = 1 para todo y ′ ∈ supp (wj ). Do caso Ω = Rn+
108 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

resulta a existência de vj ∈ H 1 (Rn+ ) tal que γ0 vj = wj . Do Lema 2.7.1 obtém-se:

γ0 (θvj ) = (γ0 θ)(γ0 vj ) = (γ0 θ)wj = wj

(porque θ = 1 em supp (wj ) × {0}). Além disso, tem-se:

S(θvj ) ⊂ supp (θ) ∩ Rn+ ⊂ Ω0 × [0, 1),

logo a função definida em Ω por




(θvj )(ϕj (x)) se x ∈ Uj ∩ Ω
uj (x) =
0 se x ∈ Ω\(Uj ∩ Ω)

Uj yn 6
ϕj
- 1

-
Rn−1

-1
Γ

tem suporte compacto em Uj ∩ Ω, sendo um elemento de H 1 (Ω). Se x ∈ Uj ∩ Γ obtém-se:

uj (x) = γ0 (θvj )(ϕj (x)) = wj (ϕj (x)) = (σj w)(x)

isto é,

(σj w)(x) se x ∈ Uj ∩ Γ
(γ0 uj )(x) =
0 se x ∈ Γ, x ∈
/ Uj
Da relação anterior e do fato de ser supp (σj ) ⊂ Uj , tem-se que
N
X N
X X
N 
γ0 u j = σj w = σj w = w.
j=1 j=1 j=1
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 109

N
X N
X
Sendo u = uj tem-se que u ∈ H 1 (Ω) e γ0 u = γ0 uj = w.
j=1 j=1
b) O núcleo de γ0 é H01 (Ω) - Seja σ ∈ D(Rn ) tal que supp (σ) ⊂ Ω e
N
X
σ(x) + σj (x) = 1 para todo x ∈ Ω.
j=1

Seja u ∈ H 1 (Ω) tal que γ0 u = 0. Sendo


N
X
u = σu + σj u
j=1

e σu um vetor de H 1 (Ω) com suporte compacto em Ω, tem-se que σu ∈ H01 (Ω). Logo para
provar a parte b) é suficiente demonstrar que cada função σj u ∈ H01 (Ω). Do Lema 2.7.1 vem
que γ0 (σj u) = γ0 (σj ) · γ0 u = 0 (observe que o Lema 2.7.1 também é válido para Ω aberto
limitado bem regular do Rn ), da qual por meio de cartas locais e reduzindo ao caso Ω = Rn+ ,
tem-se que σj u ∈ H01 (Ω), j = 1, 2, . . . , N, demonstrando que o núcleo de γ0 está contido em
H01 (Ω).
A demonstração de que H01 (Ω) está contido no núcleo de γ0 é análoga a que foi feito
quando Ω = Rn+ . 
Completando o estudo introdutório do traço γ0 de uma função, a etapa seguinte seria
a do estudo do traço de suas derivadas, o que será feito por meio do Teorema 2.7.2, o análogo
do Teorema 2.7.1. Antes, porém, será fixada a notação.
Inicia-se com o caso Ω = Rn+ , identificando sua fronteira Γ = ∂Ω ao Rn−1 , como já
fora feito anteriormente. Seja u uma função definida em uma vizinhança de Γ, possuindo
derivadas parciais até a ordem m. Define-se

(γj u)(x′ ) = (Dnj u)(x′ , 0) = γ0 (Dnj u)(x′ )

para j = 0, 1, 2, . . . , m − 1 e x′ do Rn−1 , sendo Dn = ∂


∂xn
· Para j = 0, 1, 2, . . . , m − 1,
representa-se por
m−1
Y 1
H m−j− 2 (Γ)
j=0
110 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

o espaço de Hilbert
1 3 1
H m− 2 (Γ) × H m− 2 (Γ) × . . . × H 2 (Γ),

no qual (D(Γ))m é denso.

Teorema 2.7.2 A aplicação linear

ϕ → (γ0 ϕ, γ1ϕ, . . . , γm−1 ϕ)


m−1
Y 1
de D(Ω) em H m−j− 2 (Γ), prolonga-se por continuidade a uma aplicação linear e contı́nua
j=0
m−1
Y 1
m
γ de H (Ω) sobre H m−j− 2 (Γ), cujo núcleo é o espaço H0m (Ω). Tem-se ainda que γ
j=0
possui uma inversa à direita linear e contı́nua, isto é, existe uma aplicação linear e contı́nua
m−1
Y m−1
Y
m−j− 21 1
θ de H m
(Γ) em H (Ω) tal que γ(θw) = w para todo w em H m−j− 2 (Γ).
j=0 j=0

Observação 22 A aplicação γ denomina-se traço de ordem m. O traço da função é o traço


de ordem zero.

A demonstradoção do Teorema 2.7.2 será feita em três etapas.


Na primeira demonstra-se que a aplicação dada é contı́nua quando considera-se em
D(Ω) a topologia de H m (Ω). Para isto, basta provar que existe uma constante C > 0 tal
que
||γj u||H mj (Γ) ≤ C||u||H m(Ω)

para todo u em D(Rn ) e j = 0, 1, 2, . . . , m − 1. Continua-se representando por γj a extensão


de γj ao espaço H m (Ω).
Na segunda etapa, prova-se que o núcleo de γ é o espaço H0m (Ω). Sendo D(Ω)
denso em H0m (Ω) e γu = 0 para todo u em D(Ω), restará demonstrar que se u ∈ H m (Ω) e
γj u = 0, j = 0, 1, 2, . . . , m − 1, então u ∈ H0m (Ω). Finalmente, na terceira e última etapa da
demonstração, constrói-se uma inversa à direita de γ, o que também provará que γ aplica
m−1
Y 1
m
H (Ω) sobre H m−j− 2 (Γ).
j=0
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 111

Demonstração do Teorema 2.7.2


Primeira Etapa: Da Proposição 2.7.1, decorre a existência de uma constante C0 > 0 tal
que
2
||γ0u|| H 1/2 (Γ) ≤ C0 ||u||H 1(Ω) , ∀ u ∈ D(Ω).

Fixe j = 1, 2, . . . , m−1 e para todo multi-ı́ndice ν ′ ∈ Nn−1 , seja ν = (ν ′ , j) = (ν1 , ν2 , . . . , νn−1 , j)


pertencente a Nn . Seja F1 a transformada de Fourier no L2 (Rn−1 ). Para todo u em D(Rn ),
tem-se:

|(x′ )ν F1 (γj u)(x′ )| = |F1 (γ0 (D ν u)(x′ ))|.

Observe-se, também, que se |ν ′ | ≤ m − j − 1, então |ν| ≤ m − 1, portanto,

||D ν u||2H 1 (Ω) ≤ ||u||2H m(Ω) .

Daı́ resulta:
Z
1
||γj u||2H mj (Γ) = (1 + ||x′ ||2 ) 2 (1 + ||x′ ||2 )m−j−1 |F1 (γj u)(x′ )|2 dx′ ≤
X Z
Rn−1
1
≤ (1 + ||x′ ||2 ) 2 |F1(γ0 (D ν u)(x′ )|2 dx′ ≤
|ν ′ |≤m−j−1 Rn−1
X
≤ C0 ||D ν u||2H 1 (Ω) ≤ C||u||2H m(Ω) .
|ν ′ |≤m−j−1

Segunda Etapa: Para provar que γ −1 (0) = H0m (Ω) serão salientados certos resultados
enunciados e provados sob a forma de lema.

Lema 2.7.2 Se u ∈ H m (Ω) e γ0 u = γ1 u = . . . = γm−1 u = 0, então


 2 2m−1 Z 2
k
′ 2
|u(x .xn )| ≤ |Dnm u(x′ , t)|2 dt,
k 0

2
para quase todo x′ ∈ Rn−1 e 0 ≤ xn ≤ ·
k

Demonstração: O caso m = 1 foi anteriormente demonstrado (ver Caso 1 do Teorema


2.7.1). Suponha o Lema 2.7.2 verdadeiro para m ≥ 1 e seja u ∈ H m+1 (Ω) tal que
112 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

γ0 u = γ1 u = . . . = γm−1 u = γm u = 0. Sendo γi (Dm u) = γi+1 u = 0, para i = 1, 2, . . . , m − 1


e Dn u ∈ H m (Ω), da hipótese indutiva vem:
 2 2m−1 Z 2
k
′ 2
|(Dn v)(x , t)| ≤ |Dnm+1 u(x′ , s)|2 ds
k 0

2
para quase todo x′ ∈ Rn−1 e 0 ≤ t ≤ · Resulta, também,. do caso m = 1 que
k
 2  Z k2
|u(x′ , xn )|2 ≤ |Dn u(x′ , t)|2 dt ≤
k 0
 2 2m+1 Z k2
≤ |(Dnm+1 u)(x′ , s)|2 ds,
k 0

2
para quase todo x′ ∈ Rn−1 , 0 ≤ xn ≤ · 
k

Lema 2.7.3 Dado um inteiro positivo p, seja θ ∈ C p (R) tal que 0 ≤ θ(t) ≤ 1 para todo
t ∈ R, θ(t) = 0 se t ≤ 1 e θ(t) = 1 se t ≥ 2. Para todo k = 1, 2, . . . , seja θk (t) = θ(kt) para
todo t ∈ R. Então:

a) Se u ∈ L2 (Ω) seja uk (x) = θk (xn )u(x) para x ∈ Ω, resulta que (uk ) converge para u
em L2 (Ω).

b) Se u ∈ H p (Ω) e γ0 u = γ1 u = . . . = γp−1 u = 0, então a sucessão (vk ) converge para


zero em L2 (Ω), onde vk é dada por:

(p)
vk (x) = θk (xn )u(x), x ∈ Ω.

Demonstração: A primeira parte é uma conseqüência direta do teorema de Lebesgue


sobre convergência dominada. Para demonstrar a parte b), considere-se M > 0 tal que
|θ(p) (t)| ≤ M, t ∈ R. Usando o Lema 2.7.2 obtém-se:
Z 2 Z
k
||vk ||2L2 (Ω) ≤M |Dnp u(x′ , t)|2 dx′ dt,
0 Rn−1
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 113

o que prova ser (vk ) convergente para zero em L2 (Ω).


Prova-se, a seguir, que γ −1 (0) ⊂ H0m (Ω). Seja θ ∈ C m (R) tal que 0 ≤ θ(t) ≤ 1,
θ(t) = 0 se t ≤ 1 e θ(t) = 1 se t ≥ 2. Considere-se u ∈ H m (Ω) tal que γ0 u = γ1 u = . . . =
γm−1 u = 0. Se θk (t) = θ(kt) k = 1, 2, . . . e t ∈ R, seja

uk (x′ , xn ) = θk (xn )u(x′ , xn ), x′ ∈ Rn−1 , xn > 0.

Dado α em Nn com |α| ≤ m, sejam α = (α1 , α2 , . . . , αn−1 , 0), j = αn . No caso j = 0 tem-se:

(D α uk )(x′ , xn ) = θk (xn )(D α u)(x′ , xn ),

portanto, (D α uk ) converge para D α u em L2 (Ω) (consulte Lema 2.7.3).


No caso 0 < j ≤ m, tem-se:
j  
X j (p) ′
α α
(D uk )(x) = θk (xn )(D u)(x) + θk (xn )(Dnj−p D α u)(x).
p=1
p

Para continuar a demonstração, admite-se o seguinte resultado, o qual será provado ao final
da segunda etapa.

Lema 2.7.4 Seja q > 1 um inteiro. Então

D α (γiϕ) = γi (D α ϕ)

para toda ϕ ∈ H q (Ω), i = 0, 1, . . . , q − 1, α ∈ Nn tal que |α| + i ≤ q − 1, αn = 0.


Admitindo o Lema 2.7.4, obtém-se que γi (Dnj−p D α u) = 0, para p = 1, 2, . . . , j e i =
0, 1, 2, . . . , p − 1. Usando este resultado e o do Lema 2.7.3 decorre que a segunda parcela que
aparece na expressão para D α uk converge para zero em L2 (Ω). Logo, a sucessão (D α uk )
converge para D α u em L2 (Ω). Resulta, daı́, que a sucessão (uk ) converge para u em H m (Ω).
Seja ϕ ∈ D(Rn ) tal que ϕ(x) = 1 se ||x|| ≤ 1 e ϕ(x) = 0 se ||x|| ≥ 2. Para todo
x
p = 1, 2, . . . seja uk,p (x) = ϕ uk (x), para x ∈ Rn+ . Então uk,p é um vetor de H m (Ω) com
p
114 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

suporte em Ω, logo, uk,p ∈ H0m (Ω). Sendo uk,p convergente para uk em H m (Ω), quando p
tende para o infinito, conclui-se que uk ∈ H0m (Ω), logo u ∈ H0m (Ω).
Resta, para completar a demonstração da segunda etapa, provar o Lema 2.7.4, o que
será feito a seguir.
Para demonstrar o Lema 2.7.4, suponha que ele seja verdadeiro para ϕ em D(Ω).
Dado v em H q (Ω), seja (ϕj ) uma sucessão de D(Ω) convergente para v em H q (Ω). Logo,
1
(γi ϕj ) converge para γi v em H q−i− 2 (Γ), e como por hipótese |α| ≤ q − i − 1 ≤ q − i − 12 ,
tem-se:
D α (γi ϕj ) converge para D α (γi v)
1
em H s (Γ), s = q −|α|−i− · Tem-se, também (D α ϕj ) convergente para D α v em H q−|α| (Ω),
2
portanto:
γi (D α ϕj ) converge para γi (D α v)

em H s (Γ). Conclui-se que γi (D α v) = D α (γi v) como se desejava provar.


Terceira Etapa: Deduz-se o argumento descrito para esta etapa, como nas anteriores, por
meio de lemas.

Lema 2.7.5 Para todo u ∈ S(Rn ) e j = 0, 1, 2, . . . , m − 1, vale a seguinte relação:


Z
′ − 21
F1 (γj u)(x ) = (2π) (it)j (F u)(x′ , t) dt,
R

para x′ no Rn−1 , sendo F a transformada de Fourier no L2 (Rn ).

Demonstração: Represente por Fe e Fe1 , respectivamente, as transformadas de Fourier


e u) = u, obtém-se:
inversas de F e F1 . Sendo F(F
Z Z
′ −n ′ ′ ′
u(x , xn ) = (2π) 2 dy ei{(x ,y )+xn yn } (F u)(y ′, yn ) dyn .
Rn−1 R

Fazendo Z
′ − 21
w(x ) = (2π) (it)j (F u)(x′ , t) dt,
R
2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 115

obtém-se, da última expressão:

(γj u)(x′ ) = (Dnj u)(x′ , 0) =


Z Z
−n ′ ′ ′
= (2π) 2 dy (iyn )j ei(x ,y ) (F u)(y ′, yn ) dyn =
ZRn−1 R
n−1
= (2π) 2 e i(x ′ ,y ′ )
e
w(y ′) dy ′ = (Fw)(x ′
),
Rn−1

de onde resulta F1 (γj u) = w, como se deseja demonstrar.


Prova-se, a seguir, que existe uma aplicação linear

Λ: (D(Γ))m → H m (Ω),
m−1
Y 1
contı́nua relativamente à topologia de H m−j− 2 (Γ), tal que γΛϕ = ϕ para todo ϕ em
j=0
m−1
Y 1
m
(D(Γ)) . Provada esta afirmativa, usa-se a densidade de (D(Γ)) em m
H m−j− 2 (Γ) para
j=0
estender Λ a este último espaço, sendo, obviamente, tal extensão, linear, contı́nua e uma
inversa à direita de γ. Dado w = (w0 , w1 , . . . , wm−1 ) em (D(Γ))m e para j = 0, 1, 2, . . . , m−1,
considere-se
Z
aj = t2j (1 + t2 )−(m+j) dt
R

e
1
1 (1 + ||x′ ||2 )m− 2 j
vj (x) = 1 xn (F1wj )(x′ ),
(2π)− 2 aj ij (1 + ||x′ ||2 )m+j
sendo x = (x′ , xn ) no Rn .
Da escolha de aj resulta:

1Z

1. (2π) 2 (it)j vj (x′ , t) dt = (F1 wj )(x′ )
R

e fazendo a mudança de variáveis xn = ht(1 + ||x′ ||2)1/2 segue


Z  x  2
n
2. (1 + ||x||2 )m vj x′ , dx ≤ C||wj ||2H mj (Γ) ,
R n h
116 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

m−1
Y 1
para todo j = 0, 1, 2, . . . , m−1, sendo C uma constante independente de w ∈ H m−j− 2 (Γ),
j=0
h = 1, 2, . . . , m.
Sejam Chj (h = 1, 2, . . . , m, j = 0, 1, . . . , m − 1), números reais tais que:

m
X 1 se j = k
3. Chk h j+1
= δjk = ·
h=1 0 se j 6= k

Considere u: Rn → K definida por


m−1
XX m  xn 
′ ′
4. u(x) = u(x , xn ) = Chk vk x, ,
k=0 h=1
h

5. e | Ω.
Λw = Fu
e ∈ H m (Rn ), logo Λw ∈ H m (Ω) e, além disso,
De 2. decorre que Fu

||Λw||H m(Ω) ≤ C||w||Qm−1 H m−j− 21 (Γ) .


j=0

Conclui-se, deste modo, que Λ é uma aplicação linear e contı́nua de (D(Γ))m , com a topo-
m−1
Y 1
logia H m−j− 2 (Γ), em H m (Ω). 0 Provar-se-á que γΛw = w ou, equivalentemente, que
j=0
F1 (γj Λw) = F1 wj , para j = 0, 1, 2, . . . , m − 1. Com efeito,
Z
− 21

F1 (γj Λw)(x ) = (2π) (it)j u(x′ , t) dt = (Lema 2.7.4)
m−1
X Xm Z R 
− 21 j ′ t
= (2π) Chk (it) vk (x , dt =
R h
k=0 h=1
XnX
m−1 m oZ
− 21 j+1
= (2π) Chk h (it)j vk (x′ , t) dt =
R
Zk=0 h=1
1
= (2π)− 2 (it)j vj (x′ , t) dt = (F1 wj )(x′ ),
R

concluindo, assim, a demonstração do Teorema 2.7.2. 


Considere, agora, Ω um aberto limitado do Rn , com fronteira Γ = ∂Ω bem regular, e
seja ν a normal unitária exterior em Γ. Escolhe-se um sistema de cartas locais

{(U1 , ϕ1 ), (U2 , ϕ2 ), . . . , (UN , ϕN )}


2.7. TEOREMAS DE TRAÇO 117

de Γ e funções testes no Rn , σ0 , σ1 , . . . , σN tais que


N
X
supp (σ0 ) ⊂ Ω, supp (σj ) ⊂ Uj , j = 1, 2, . . . , N, σj (x) = 1
j=0

para x em Ω, de modo que para toda função u definida em Γ e j = 1, 2, . . . , N vale a seguinte


relação:
∂  ∂
uj (ϕ−1 ′
j (y )) = − {uj · ϕ−1 ′
j } (y , 0), y ′ ∈ Σ0 ,
∂ν ∂xn
sendo uj = σj u e Σ0 = {(y ′, 0) | 0 ≤ yi ≤ 1, i = 1, 2, . . . , n}. A existência das cartas locais
{(U1 , ϕ1 ), (U2 , ϕ2 ), . . . , (UN , ϕN )} verificando a última igualdade está garantida pela noção
de vizinhança tubular, ver M.P. do Carmo [20].

∂j u
Para todo j = 1, 2, . . . , m − 1 e u ∈ D(Ω), seja γj u = ∂ν j
a derivada normal de
Γ
ordem j de u e γ0 u = u| Γ . Do Teorema 2.7.2 e com auxı́lio do sistema de cartas locais,
obtém-se o seguinte resultado para o caso de um aberto limitado Ω com fronteira bem regular
Γ.

Teorema 2.7.3 Existe uma única aplicação linear e contı́nua γ do espaço H m (Ω) sobre o
m−1
Y 1
espaço H m−j− 2 (Γ) com núcleo γ −1 (0) = H0m (Ω), verificando a seguinte condição:
j=0

γu = (γ0 u, γ1 u, . . . , γm−1 u), ∀ u ∈ D(Ω).

Tal aplicação admite uma inversa à direita linear e contı́nua.

Observação 23 O Teorema 2.7.3 é válido para Ω limitado do Rn com Ω de classe C m+1 .


Este fato decorre da demonstração do teorema.

Corolário 12 Seja u ∈ L2 (Ω), Ω aberto limitado bem regular do Rn , tal que ũ, prolonga-
mento de u ao Rn nulo fora de Ω, esteja em H m (Rn ). Então u pertence a H0m (Ω).

Demonstração: Seja (ϕk ) uma sucessão de funções testes no Rn convergente para ũ em


H m (Rn ). Considere um aberto limitado U do Rn , bem regular, tal que

U ⊂ CΩ e Γ = ∂Ω ⊂ ∂U = Σ.
118 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Sem perda de generalidade pode-se supor que ϕk (x) = 0 se x ∈ Σ\Γ, k = 1, 2, . . . . Sendo


(rΩ ϕk ) k ∈ N e (rU ϕk ) k ∈ N sucessões de vetores de D(Ω) e D(U), respectivamente, e
r Ωũ = u, r U ũ = 0, temos as seguintes convergências:

rΩ ϕ k converge para u em H m (Ω)


rU ϕ k converge para zero em H m (Σ),

portanto,
1
γj u = lim γj (rΩ ϕk ) em H m−j− 2 (Γ)
k→∞
1
0 = lim γj (rU ϕk ) em H m−j− 2 (Σ), j = 0, 1, . . . , m − 1.
k→∞
Sendo

j
∂ ϕk γj (rΩ ϕk ) em Γ
γj (rU ϕk ) = j
= ,
∂ν Σ 0 em Σ\Γ
conclui-se que γj u = 0 para j = 0, 1, 2, . . . , m − 1, logo u ∈ H0m (Ω).

Observação 24 O Corolário 12 também é verdadeiro no caso Ω = Rn+ , sendo análoga a


demonstração. Basta considerar

U = Rn− = {(x′ , xn ) | x′ ∈ Rn−1 , xn < 0}.

2.8 Traço da Derivada Normal


Tome-se Ω = Rn+ ou um aberto limitado do Rn , com fronteira bem regular, com normal
externa ν, de tal modo que a fórmula de Green
Z Z 
∂u ∂v 
(v∆u − u∆v) dx = v −u dΓ,
Ω Γ ∂ν ∂ν
seja verdadeira para todo par u, v de funções de C 2 (Ω).
Nesta seção prova-se que tomando u num espaço conveniente, fixado posteriormente,
∂u
resulta que o traço da derivada normal de u, isto é, o traço de pertence a determinado
∂ν
2.8. TRAÇO DA DERIVADA NORMAL 119

espaço de Sobolev H −s (Γ), s > 0. Este resultado é fundamental quando se estuda um


problema de contorno cujo dado na fronteira é a derivada normal, como o problema de
Neumann ou com vı́nculos unilaterais como problema de Signorini.
Considere o espaço vetorial H0 (Ω) dado por:

H0 (Ω) = {u ∈ L2 (Ω); ∆u ∈ L2 (Ω)}.

Definindo em H0 (Ω) o produto escalar

(u, v)H0 = (u, v)L2 (Ω) + (∆u, ∆v)L2 (Ω) ,

para todo par u, v ∈ H0 , resulta que ele é um espaço de Hilbert.

Proposição 2.8.1 D(Ω) é denso em H0 .

Demonstração: Dado um vetor u0 de H0 (Ω) ortogonal a D(Ω), devemos provar que u0 = 0.


Para tal, consideremos u1 = ∆u0 . As extensões ũ0 , ũ1 de u0 e u1 nulas, respectivamente,
fora de Ω, pertencem ao espaço L2 (Rn ). Prova-se que ũ1 ∈ H 2 (Rn ). Calcula-se ∆ũ1 no
sentido das distribuições. De fato, se ϕ pertence a D(Rn ), sua restrição Ω, isto é, ṽ = rΩ ϕ,
pertence a D(Ω), logo:
Z
h∆ũ1 , ϕi = u1 (x)∆ϕ(x) dx = (∆u0 , ∆ṽ)L2 (Ω) =

= (u0, ṽ)H0 − (u0 , ṽ)L2 (Ω) = h−ũ0 , ϕi.

Conclui-se que ∆ũ1 = −ũ0 , logo pertence a L2 (Rn ), portanto

(1 + ||x||2)F ũ1 = F (∆ũ1 + ũ1 ) ∈ L2 (Rn ),

de onde resulta que ũ1 ∈ H 2 (Rn ). Do Corolário 12 resulta que u1 ∈ H01 (Ω).
Para todo v em H0 (Ω) e ϕ em D(Ω), obtém-se:

(∆v, ϕ)L2 (Ω) = h∆v, ϕ̄i = hv, ∆ϕ̄i = (v, ∆ϕ)L2 (Ω) .
120 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

Sendo D(Ω) denso em H01 (Ω) e u1 um vetor deste espaço, tem-se:

(∆v, u1)L2 (Ω) = (v, ∆u1 )L2 (Ω) = −(v, u0)L2 (Ω)

para todo v em H0 (Ω). Resulta daı́ que

(v, u0)H0 = (v, u0)L2 (Ω) + (∆v, u1 )L2 (Ω) = 0

para todo v ∈ H0 (Ω), logo u0 = 0.

Observação 25 Quando considera-se H s (Γ), s > 0, como espaço normado real, representa-
se por H −s (Γ) o dual forte de H s (Γ). No caso complexo, dado f ∈ (H s (Γ))′ , dual forte de
H s (Γ), define-se o funcional conjugado f¯ por hf¯, ui = hf, ui para u em H s (Γ). Neste caso,
considera-se como H −s (Γ) o espaço vetorial constituı́do dos f¯ tais que f ∈ (H s (Γ))′ , munido
da norma:
¯ H −s(Γ) = sup |hf, ui|.
||f||
||u||=1

Note-se que L2 (Γ) ֒→ H −s (Γ) sendo a inclusão considerada no sentido seguinte: se


f ∈ L2 (Γ), identifica-se f ao funcional hf, ui = (f, u)L2 (Γ) , sendo u ∈ H s (Γ). Em particular,
se u ∈ D(Ω), então γ0 u, γ1 u podem ser considerados como vetores de H −s (Γ) para todo
s > 0.

Teorema 2.8.1 A aplicação


u → (γ0 u, γ1 u)

de D(Ω) em H −1/2 (Γ) × H −3/2 (Γ), prolonga-se, por continuidade, a uma aplicação linear e
contı́nua de H0 (Ω) em H −1/2 (Γ) × H −3/2 (Γ).

Demonstração: Seja γ o traço de ordem dois em Ω. Foi demonstrada a existência de uma


aplicação linear e contı́nua T de H 3/2 (Γ) × H 1/2 (Γ) em H 2 (Ω) tal que γ T w = w para todo
w em H 3/2 (Γ) × H 1/2 (Γ).
2.8. TRAÇO DA DERIVADA NORMAL 121

Fixemos u em D(Ω) e seja M o funcional definido em H 3/2 (Γ) × H 1/2 (Γ) por

Mw = (∆u, T w)L2(Ω) − (u, ∆T w)L2(Ω) .

Representando-se por C > 0 a norma de T como objeto de L(H 3/2 (Γ) × H 1/2 (Γ), H 2(Ω)),
obtém-se:

|Mw| ≤ 2C||u||H0(Ω) ||w||H 3/2(Γ)×H 1/2 (Γ)

para todo w ∈ H 3/2 (Γ) × H 1/2 (Γ).


Da fórmula de Green mencionada no inı́cio desta seção, verdadeira para todo v em
D(Ω); sendo D(Ω) denso em H 2 (Ω) e os traços γ0 , γ1 contı́nuos de H 2 (Ω) em L2 (Γ), tem-se:

(∆u, v)L2 (Ω) − (u, ∆v)L2(Ω) = (γ1 u, γ0v)L2 (Γ) − (γ0 u, γ1v)L2 (Γ)

para todo v em H 2 (Ω). Dado w = (w0 , w1 ) em H 3/2 (Γ) × H 1/2 (Γ), considere-se v = T w,
sendo γ0 v = w0 e γ1 v = w1 . Combinando a fórmula de Green anterior e a definição de M,
obtém-se a seguinte expressão:

M(w0 , w1 ) = hγ1 u, w0i − hγ0u, w1 i

para todo w0 ∈ H 3/2 (Γ) e w1 ∈ H 1/2 (Γ). Resulta, portanto,

|hγ1u, w0 i| = |M(w0 , 0)| ≤ 2C||u||H0(Ω) + ||w0||H 3/2 (Γ)


|hγ0u, w1 i = |M(0, w1 )| ≤ 2C||u||H0(Ω) + ||w1 ||H 1/2 (Γ)

Daı́ obtém-se:
||γ1u||H −3/2 (Γ) ≤ 2C||u||H0(Ω)
||γ0u||H −1/2 (Γ) ≤ 2C||u||H0(Ω)

Portanto, das desigualdades anteriores e da Proposição 88, conclui-se a demonstração do


teorema. 
122 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV

2.9 Fórmula de Green

Para todo u em H0 (Ω) e v em H 2 (Ω) é verdadeira a Fórmula de Green:

(∆u, v)L2 (Ω) − (u, ∆v)L2 (Ω) = hγ1 u, γovi − hγ0 u, γ1vi

onde h , i representa sempre dualidades. A demonstração resulta diretamente da fórmula de


Green para funções de D(Ω) e do Teorema 2.8.1. Observe que hγ1 u, γ0vi representa o valor
do funcional γ1 u ∈ H −3/2 (Γ) no vetor γ0 v ∈ H 3/2 (Γ), o que por abuso de notação também
escreve-se:
Z
∂u
v̄ dΓ,
Γ ∂ν
embora γ1 u não pertença a L2 (Ω).
Exercı́cio 1. Considere Ω = Rn+ e seja Λ a transformação linear descrita na terceira etapa
da demonstração do Teorema 2.7.2. Considere n = 2 e prove que existe uma constante C > 0
tal que

||Λ(w0, 0)||H 1(Ω) ≤ C||w0 ||H 1/2 (Γ) , ∀ w0 ∈ D(Γ).

Exercı́cio 2. No caso geral, Ω um aberto limitado do Rn , com fronteira Γ bem regular,


prove que se γ for a função traço de ordem dois em Ω, existe uma inversa à direita T de γ e
C0 > 0 tais que:

||T (w0, 0)||H 1 (Ω) ≤ C0 ||w0||H 1/2 (Γ)

para todo w0 ∈ H 1/2 (Γ).

Proposição 2.9.1 Se u ∈ H0 (Ω) ∩ H 1 (Ω), então γ1 u ∈ H −1/2 (Γ). Considerando H1 (Ω)


com a norma

||u||2H1(Ω) = ||u||2H 1(Ω) + ||∆u||2L2(Ω) ,

a aplicação γ1 é contı́nua de H0 (Ω) ∩ H 1 (Ω) em H −1/2 (Γ).


2.9. FÓRMULA DE GREEN 123

Demonstração: Observe, inicialmente, que para todo u ∈ H 1 (Ω) e v em H 2 (Ω) vale a


fórmula de Gauss ou primeira fórmula de Green:
n
X
(u, ∆v)L2 (Ω) = (γ0 u, γ1 v)L2 (Γ) − (Di u, Div)L2 (Ω) .
i=1

Se u ∈ H0 (Ω) ∩ H 1 (Ω) e ϕ ∈ D(Γ), seja v = T (ϕ, 0) ∈ H 2 (Ω). Então γo v = ϕ, γ1 v = 0 e


||v||H 1(Ω) ≤ C0 ||ϕ||H 1/2 (Γ) . Daı́, da fórmula de Green e do caso em que as funções pertencem
a D(Ω), obtém-se:
hγ1 u, ϕi = (∆u, v)L2(Ω) − (u, ∆v)L2 (Ω) =
Xn
= (∆u, v)L (Ω) +
2 (Di u, Di v) L2 (Ω) .
i=1

Resulta, portanto que

|hγ1 u, ϕi| ≤ ||u||H0∩H 1 (Ω) ||v||H 1 (Ω) ≤


≤ C0 ||u||H0∩H 1 (Ω) ||ϕ||H 1(Ω) ,

provando a proposição. 
A Proposição 2.9.1 é um caso particular de um resultado geral que será mostrado no
Capı́tulo 3.
124 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS DE SOBOLEV
Capı́tulo 3

Problemas Elı́ticos não Homogêneos

3.1 Introdução

No presente capı́tulo será feito um estudo introdutório dos problemas elı́ticos não
homogêneos. Embora limitando-se ao caso do Laplaciano, −∆, o método é geral podendo
ser adaptado a operadores elı́ticos mais gerais.
Seja Ω um aberto limitado do Rn com fronteira Γ regular. Representa-se por γ0 e γ1 ,
∂u
respectivamente, os traços em H m (Ω) da função u e de sua derivada normal · Note-se
∂ν
que ν é o vetor unitário da normal externa a Γ.
Pretende-se analisar os seguintes problemas de contorno:


−∆u = f em Ω −∆u + u = f em Ω
(P1 ) (P2 )
∂u
u=g sobre Γ =h sobre Γ
∂ν

O problema (P1 ) denomina-se de Dirichlet e o (P2 ) de Neumann.


Inicia-se estudando determinado espaço de Hilbert Y que desempenha pepel funda-
mental no que se segue. Realmente, define-se

Y = {u ∈ L2 ; ∆u ∈ H −1 (Ω)},

125
126 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

munido do produto escalar

(u, v)Y = (u, v) + (∆u, ∆v)H −1 (Ω) ,

com o qual Y é um espaço de Hilbert. Como foi estabelecido nos capı́tulos anteriores,
(u, v), |u| e ((u, v)), ||u|| denotarão o produto escalar e norma dos espaços L2 (Ω) e H01 (Ω)
respectivamente.

Observação 26 Considere-se a aplicação:

−∆: H01 (Ω) 7→ H −1 (Ω)

e seja
G = (−∆)−1 : H −1(Ω) 7→ H01 (Ω).

Dados os vetores u, v ∈ H −1(Ω), define-se a forma bilinear [ , ] em H −1 (Ω) por:

[u, v] = hGu, viH01(Ω)·H −1 (Ω) = ((Gu, Gv)).

Segue-se que [ , ] é um produto escalar em H −1 (Ω). O produto escalar definido em Y é


derivado do produto escalar em L2 (Ω) em H −1 (Ω) por [ , ]. 

A próxima etapa consiste em definir o traço γ0 para objetos de Y . Segue um método


análogo ao adotado no Capı́tulo 2 para se definir o traço em H0 (Ω). Consulte-se a notação
alı́ empregada.

Proposição 3.1.1 D(Ω) é denso em Y .

Demonstração: Embora semelhante a feita para H0 (Ω) no Capı́tulo 2, será feita sucinta-
mente. Tem-se que Y é um subespaço de Hilbert de L2 (Ω) × H −1(Ω). Considere uma forma
linear contı́nua M: Y → R. Se hM, ϕi = 0 para todo ϕ ∈ D(Ω) implicar M = 0, resulta que
f a extensão de
D(Ω) é denso em Y . É conseqüência do teorema de Hahn-Banach. Seja M
3.1. INTRODUÇÃO 127

M ao espaço L2 (Ω) × H −1 (Ω). Resulta da Observação 1 e do Teorema de Riesz-Frechet que


existe {f, h} ∈ L2 (Ω) × H01 (Ω) tal que

f, ξi = (f, ξ1 ) + hh, ξ2iH 1 (Ω)·H −1 (Ω) ,


hM 0

para todo ξ = {ξ1 , ξ2} ∈ L2 (Ω) × H −1 (Ω). Em particular, se u ∈ Y obtém-se:

hM, ui = (f, u) + hh, ∆uiH01 (Ω)·H −1 (Ω) . (3.1.1)

Sejam f˜, h̃ extensões de f e h nulas no complemento de Ω em relação ao Rn . Obtém-


se:
hf˜ + ∆h̃, ϕi = (f,
˜ ϕ) + h∆h̃, ϕi

para toda ϕ ∈ D(Rn ). Daı́, de (3.1.1) e da hipótese hM, ϕi = 0, resulta que

f˜ + ∆h̃ = 0 em D ′ (Rn ). (3.1.2)

Sendo f˜ ∈ L2 (Ω) obtém-se ∆h̃ ∈ L2 (Rn ). Logo h̃ e ∆h̃ pertencem a L2 (Rn ), portanto por
transformada de Fourier, resulta que h̃ ∈ H 2 (Rn ). Sendo Ω regular, obtém-se h ∈ H02 (Ω).
Seja (ϕµ ) uma sucessão com ϕµ ∈ D(Ω) tal que

ϕµ → h em H02 (Ω).

Para u ∈ Y resulta:
hϕµ , ∆uiH01 (Ω)·H −1 (Ω) = (∆ϕµ , u).

Logo, quando µ → ∞ obtém-se:

hh, ∆uiH01 (Ω)·H −1 (Ω) = (∆h, u).

Substituindo em (3.1.1) resulta:

hM, ui = (f, u) + (∆h, u) = (f + ∆h, u) = 0

para todo u ∈ Y , isto é, M = 0. 


128 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

Considere a aplicação T definida por:

H 3/2 (Γ) · H 1/2 (Γ) 7→ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω)

tal que {0, w} → v. Ela é linear e contı́nua.


Para todo u ∈ Y e w ∈ H 1/2 (Γ), considere-se a função numérica Su definida por:

hSu, wi = (u, ∆T w) − h∆u, T wiH −1(Ω)·H01 (Ω) . (3.1.3)

Tem-se que Su é uma forma linear em H 1/2 (Ω) para cada u ∈ Y . Prova-se que Su é contı́nua.
De fato, tem-se:

|hSu, wi| ≤ |u| |∆T w| + ||∆u||H −1(Ω) ||T w|| ≤


 1/2  
≤ |u|2 + ||∆u||2H −1 (Ω) |∆T w|2 + ||T w||2 ≤
≤ C||u||Y ||T w||H 2(Ω)∩H01 (Ω) ≤ C||T || ||u||Y ||w||H 1/2(Γ) .

Conclui-se que a forma linear Su é contı́nua em H 1/2 (Γ), logo um objeto de H −1/2 (Γ). Tem-
se, também,
||Su||H −1/2(Γ) ≤ C||T || ||u||Y . 

No que se segue dar-se-á sentido ao traço γ0 de um objeto de Y . Realmente, seja


u ∈ D(Ω) e w ∈ H 1/2 (Γ) sendo v = T w ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω). Devido à Fórmula de Green,
resulta:
hγ0 u, γ1vi = (u, ∆v) − (∆u, v) (3.1.4)

e γ0 em D(Ω) é uma forma linear contı́nua na norma de Y . Sendo D(Ω) denso em Y ,


resulta que a forma linear contı́nua γ0 possui uma única extensão, por continuidade, a Y ,
representada também por γ0 . Diz-se que esta extensão γ0 é o traço de ordem zero em Y .
Sendo v = T w, resulta de (3.1.4) que:

hγ0 u, wi = (u, ∆T w) − h∆u, T wiH −1(Ω)·H01 (Ω) ,

que comparando com (3.1.3) resulta que para todo u ∈ Y tem-se γ0 u ∈ T −1/2 (Γ). 
Um resumo do exposto vem dado no seguinte resultado:
3.2. PROBLEMA DE DIRICHLET 129

Teorema 3.1.1 A aplicação linear

u ∈ Y 7→ γo u ∈ H −1/2 (Γ)

é contı́nua e é válida a fórmula de Green

hγ0 u, γ1vi = (u, ∆v) − h∆u, vi, ∀ v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω). 

A seguir estuda-se o Problema (P1 ) com diferente escolha de regularidade para os dados f e
g.

3.2 Problema de Dirichlet

Reescrevendo, tem-se:

−∆u = f em Ω
(P1 )

u = g sobre Γ

Considere f e g não regulares. Uma das primeiras dificuldades que aparece no estudo de
(P1 ) nesse caso é definir uma solução u do problema.
Deduz-se, de forma heurı́stica, uma definição de solução de u de (P1 ) quando f e g
são não regulares. Claro está que uma das dificuldades é precisar em que espaços devem
habitar f e g. Nesta parte é que serão utlizados os resultados obtidos na Introdução.
Formalmente, obtém-se:
Z Z Z Z
∂u ∂v
(−∆u)v dx = u(−∆v) dx − v dΓ + u dΓ
Ω Ω Γ ∂ν Γ ∂ν

e levando em consideração (P1 ), resulta


Z Z Z Z
∂v ∂u
u(−∆v) dx = f v dx − g dΓ + v dΓ.
Ω Ω Γ ∂ν Γ ∂ν
130 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

∂u
Como não se tem nenhuma informação sobre é natural supor que v|Γ = 0. Portanto
∂ν Γ
Z Z Z
∂v
u(−∆v) dx = f v dx − g dΓ com v|Γ = 0.
Ω Ω Γ ∂ν

É natural considerar u ∈ L2 (Ω). Com esta hipótese, o primeiro membro da última


igualdade só faz sentido se ∆v ∈ L2 (Ω). Isto e a primeira restrição sobre v implicam
Z que
∂v
v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω), que por sua vez acarreta, γ1 v ∈ H 1/2 (Γ). Portanto, no termo g dΓ
Γ ∂ν
pode-se escolher g ∈ H −1/2 (Γ). Do exposto vem

(u, −∆v) = hf, vi − hg, γ1viH −1/2 (Γ)H 1/2 (Γ) , ∀ v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω).

Falta precisar em que espaço deve estar f . Se na última igualdade se tomar v ∈ D(Ω) resulta

h−∆u, vi = hf, vi

isto é, −∆u = f . Então o Problema (P1 ) com g ∈ H −1/2 (Γ) terá um sentido, isto é,
γ0 u ∈ H −1/2 (Γ), se por exemplo f ∈ H −1 (Ω) (ver Teorema 3.1.1 da Introdução).
O exposto motiva a seguinte definição: Sejam

f ∈ H −1(Ω) e g ∈ H −1/2 (Γ).

Uma função u ∈ L2 (Ω) que verifica

(u, −∆v) = hf, viH −1 (Ω)·H01 (Ω) − hg, γ1viH −1/2 (Γ)H 1/2 (Γ) ∀ v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω) (3.2.5)

é denominada uma solução definida por transposição do Problema (P1 ).


Divide-se o estudo da existência de soluções do Problema (P1 ) em três casos, segundo
os espaços de Sobolev onde serão tomadas as funções f e g.
Caso I. Suponha-se f ∈ H −1 (Ω) e g ∈ H −1/2 (Γ).
Tem-se o seguinte resultado
3.2. PROBLEMA DE DIRICHLET 131

Proposição 3.2.1 Para todo par {f, g} pertencente a H −1(Ω) × H −1/2 (Γ) existe um único
u ∈ L2 (Ω), solução definida por transposição de (P1 ). Tem-se, ainda mais, que a aplicação
linear
{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H −1/2 (Γ) 7→ u ∈ L2 (Ω)

é contı́nua, onde

−∆u = f em H −1 (Ω)
(3.2.6)

u = g em H −1/2 (Γ)

Demonstração: A aplicação linear

−∆: H 2 (Ω) × H01 (Ω) 7→ L2 (Ω) (3.2.7)

é uma isometria bijetiva, isto é,

||u||H 2(Ω)∩H01 (Ω) = |∆u|.

Daı́, o adjunto (−∆)∗ de −∆, definido por:

(−∆)∗ : L2 (Ω) 7→ (H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω))′ (3.2.8)

h(−∆)∗ u, vi = (u, −∆v), ∀ v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω) (3.2.9)

é, igualmente, uma isometria bijetiva.


Observe que (−∆)∗ é uma extensão de −∆, uma vez que D(−∆) ⊂ D((−∆)∗ ).
Considere L um objeto do dual (H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω))′ , definido por

hL, vi = hf, vi − hg, γ1vi, v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω) (3.2.10)

sendo γ1 o traço de ordem um em H 2 (Ω). Resulta de (3.2.8):




Existe um único u ∈ L2 (Ω) tal que


(−∆)∗ u = L, no sentido de (H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω))′
132 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

De modo equivalente tem-se:




Existe um único u ∈ L2 (Ω) tal que
(3.2.11)

hL, vi = h(−∆)∗ u, vi para todo v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω)

De (3.2.9), (3.2.10) e (3.2.11), obtém-se:

(u, −∆v) = hf, vi − hg, γ1vi (3.2.12)

para todo v ∈ H 2 (Ω) ∩H01 (Ω), isto é, u é uma solução definida por transposição do Problema
(P1 ). A unicidade de u segue notando que a aplicação (3.2.7) é sobrejetora.
• Mostra-se que −∆u = f em H −1 (Ω).
De fato, tomando v ∈ D(Ω) em (3.2.12) segue a afirmação.
• Verifica-se que γ0 u = g em H −1/2 (Γ).
Com efeito, como u ∈ L2 (Ω) e ∆u ∈ H −1(Ω) vem pelo Teorema 3.1.1 da Introdução
que γ0 u ∈ H −1/2 (Γ) e é válida a fórmula de Green:

hγ0u, γ1 vi = (u, ∆v) − h∆u, vi, ∀ v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω).

Por outro lado de (3.2.12) resulta

hg, γ1ui = (u, ∆v) − h∆u, vi, ∀ v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω).

As duas últimas igualdades acarretam o resultado desejado.


• Continuidade da aplicação

{f, g} ∈ H −1(Ω) × H −1/2 (Ω) × H −1/2 (Γ) 7→ u ∈ L2 (Ω)

u solução de (3.2.1).
Sejam h ∈ L2 (Ω) e v solução do problema


−∆v = h em Ω


u|Γ = 0
3.2. PROBLEMA DE DIRICHLET 133

Então v ∈ H 2 (Ω) ∩ H01 (Ω) e


||v||H 2(Ω)∩H01 (Ω) ≤ C|h|. (3.2.13)

De (3.2.12) resulta
(u, h) = hf, vi − hg, γ1vi.

Logo
|(u, h)| ≤ ||f ||H −1(Ω) ||v||H01(Ω) + ||g||H −1/2(Γ) ||γ1v||H 1/2 (Γ)

que implica de (3.2.13)


h i1/2
2 2
|(u, h)| ⊂ ||f ||H −1(Ω) + ||g||H −1/2(Γ) |h|.

Daı́ vem
h i1/2
|u|L2(Ω) ≤ C ||f ||2H −1(Ω) + ||g||2H −1/2(Γ)

provando a continuidade da aplicação. 


Da unicidade de soluções definidas por transposição de (P1 ) vem que os Problemas
(3.2.5) e (3.2.1) são equivalentes.
Caso II Considere-se f ∈ H −1 (Ω) e g ∈ H 1/2 (Γ).
Denomina-se solução de (P1 ), neste caso, a uma função u ∈ H 1 (Ω) tal que


((u, v)) = hf, vi para todo v ∈ H01 (Ω)
(3.2.14)

γ0 u = g em H 1/2 (Γ)

Demonstra-se, a seguir, existência, unicidade e dependência contı́nua, como foi feito


no Caso I.
De fato, considere a função

T : H 1/2 (Γ) 7→ H 1(Ω),

tal que T g = w sendo γo w = g, e γ0 o traço em H 1 (Ω). Daı́ resulta que o problema variacional


z ∈ H01 (Ω)
(3.2.15)

((z, v)) = hf, vi − ((w, v)) para cada v ∈ H01 (Ω)
134 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

é bem posto no sentido de Hadamard. Portanto u = z + w pertence a H 1 (Ω) é solução do


problema:

−∆u = f em H −1 (Ω)
(3.2.16)

γ0 u = g em H 1/2 (Γ)
que é o problema (3.2.14).
A unicidade segue de forma usual.
Resta provar a dependência contı́nua. Realmente, considere as sucessões (fν ) e (gν )
de H −1 (Ω) é H 1/2 (Γ), respectivamente, convergentes nos respectivos espaços para f e g.
Tem-se T gν = wν → T g em H 1 (Ω). Seja zν a solução de (3.2.15) correspondente ao par
{fν , gν }. Resulta que para cada µ, ν ∈ N, tem-se:

((zν − zµ , v)) = hfν − fν , vi − ((uν − uµ , v)), para cada v ∈ H01 (Ω).

Considerando-se v = zν − zµ em H01 (Ω), obtém-se:

||zν − zµ ||2H 1 (Ω) ≤ ||fν − fµ ||H −1 (Ω) ||zν − zµ ||H01 (Ω) +


0

+||wν − wµ ||H 1 (Ω) ||zν − zµ ||H01 (Ω) .


Daı́ resulta que (zν ) é de Cauchy em H01 (Ω). Logo converge para z ∈ H01 (Ω) e

((z, v)) = hf, vi − ((w, v)) para cada v ∈ H01 (Ω).

Portanto, uν = zν + wν → u = z + w em H 1 (Ω), provando-se que a aplicação linear

{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H 1/2 (Γ) → u ∈ H 1 (Ω),

sendo u solução de (16), é contı́nua. 


Caso III Neste caso examina-se a solução de (P1 ) quando f ∈ H −1 (Ω) e g ∈ H α (Γ), sendo
− 12 < α < + 12 · O método consiste em aplicar determinados resultados de interpolação de
espaços de Sobolev (cf. J.L. Lions - E. Magenes [11]).
De fato, foi demonstrado nos Casos I e II que as aplicações

{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H −1/2 (Γ) 7→ u ∈ H 1 (Ω), linear, contı́nua;


{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H 1/2 (Γ) 7→ u ∈ L2 (Ω), linear, contı́nua,
3.2. PROBLEMA DE DIRICHLET 135

sendo u solução do problema (P1 ), em cada caso. Interpolando-se os espaços, obtém-se:

1 1
[H 1/2 (Γ), H −1/2 (Γ)]θ = H (1−θ) 2 +θ(− 2 ) (Γ) = H (1/2)−θ (Γ)

1
sendo 0 ≤ θ ≤ 1. Portanto, tomando-se 2
− θ = α, obtém-se − 12 ≤ α ≤ 21 ·
Analogamente, obtém-se:

[H 1 (Ω), L2 (Ω)](1/2)−α = H (1/2)+α (Ω)

notando-se que L2 (Ω) = H 0 (Ω).


Conseqüentemente:

1 1
{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H α (Γ) → u ∈ H (1/2)+α (Ω), − ≤α≤ ,
2 2

é linear e contı́nua, sendo u a única solução do problema




−∆u = f em Ω
(3.2.17)

u = g sobre Γ

com f ∈ H −1 (Ω) e g ∈ H α (Γ), para − 21 ≤ α ≤ 21 · 


Análise da Aplicação Traço γ0 – Do Caso I resulta que

{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H −1/2 (Γ) 7→ u ∈ Y (3.2.18)

é uma aplicação linear e contı́nua. Ela é sobrejetiva por propriedades do traço γ0 . Pela
unicidade da solução do (P1 ), no Caso I, resulta que a aplicação (3.2.14) é injetiva. Do Caso
II, obtém-se, também, que a aplicação:

{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H 1/2 (Γ) 7→ u ∈ H 1 (Ω) (3.2.19)

é linear, contı́nua e bijetiva.


Aplicando-se resultados de interpolação resulta:

[H −1 (Ω) × H −1/2 (Γ), H −1 (Ω) × H 1/2 (Γ)](1/2)−α = H −1 (Ω) × H α (Γ)


136 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

e
[H 1 (Ω), Y ](1/2)−α = Yα = {u ∈ H (1/2)+α (Ω), ∆u ∈ H −1 (Ω)},

− 12 ≤ α ≤ 1
2
· Logo, de (3.2.18) e (3.2.19) e dos resultados de interpolação, acima fixados,
obtém-se:
1 1
{f, g} ∈ H −1 (Ω) × H α (Γ) 7→ u ∈ Yα , − ≤α≤ ,
2 2
sendo u solução do problema

−∆u = f em Ω


u = g sobre Γ,
é uma aplicação linear, contı́nua e bijetiva. Pelo Teorema do Gráfico Fechado, resulta que a
aplicação inversa:
1 1
u ∈ Yα → {f, g} ∈ H −1 (Ω) × H α (Γ), − ≤α≤ ,
2 2
é linear, contı́nua e bijetiva. Portanto a aplicação traço γ0 :
1 1
u ∈ Yα 7→ γ0 u ∈ H α (Γ), − ≤α≤ , (3.2.20)
2 2
é linear e contı́nua. 

Observação 27 Note que se u ∈ Y então u ∈ L2 (Ω). Conseguintemente, existe uma


sucessão (ϕµ ) de objetos de D(Ω) tal que ϕµ → u em L2 (Ω). Não se tem, entretanto,
necessariamente, que ϕµ → u em Y . De modo preciso, não resulta daı́, necessariamente,
que ∆ϕµ → ∆u em H −1 (Ω), pois isto acarretaria que (ϕµ ) seria uma sucessão de Cauchy
em H01 (Ω), logo u pertenceria a H01 (Ω). Logo não resulta, necessariamente, que γ0 ϕµ → γ0 u
em H −1/2 (Γ). Análogo raciocı́nio aplica-se ao espaço Y0 = {u ∈ H 1/2 (Ω); ∆u ∈ H −1 (Ω)}.
Neste caso, de (20) vem que γ0 u ∈ L2 (Γ), u ∈ Y0 . Note-se que D(Ω) é denso em H 1/2 (Ω),
cf. J.L. Lions - E. Magenes [11]. 

Caso IV Analisa-se, no presente parágrafo, o problema (P1 ) de Dirichlet, quando


f ∈ L2 (Ω). As conclusões, aqui obtidas, serão empregadas no estudo do Teorema de Traço
e da Fórmula de Green da Seção 3.4.
3.2. PROBLEMA DE DIRICHLET 137

Do resultado de regularidade de soluções de problemas elı́ticos, cf. H. Brezis [19],


resulta que se v for solução do problema:


−∆v = f em Ω, f ∈ L2 (Ω)


v = 0 sobre Γ

então v ∈ H 2 (Ω) e ||v||L2(Ω) ≤ C|f |, sendo C > 0 uma constante independente de f . Isto
acarreta, como feito no Caso II, que a aplicação

{f, g} ∈ L2 (Ω) × H 3/2 (Γ) 7→ u ∈ H 2 (Ω), (3.2.21)

sendo u solução do problema:



−∆u = f em Ω


γ0 u = g,
é linear, contı́nua e bijetiva. Considera-se (3.2.18). Observe-se que para 0 ≤ θ ≤ 1, tem-se:

[H 3/2 (Γ), H −1/2 (Γ)]θ = H (3/2)−2θ (Γ) (3.2.22)

e
[H 2 (Ω), L2 (Ω)]θ = H 2(1−θ) (Ω). (3.2.23)

Considere o espaço H0 , cf. Capı́tulo 2, paragrafo 2.8,

H0 = {u ∈ L2 (Ω); ∆u ∈ L2 (Ω)}, (3.2.24)

com a estrutura Hilberteana:

(u, v)H0 = (u, v) + (∆u, ∆v).

Resulta, portanto, de (3.2.22) e (3.2.23) que para 0 ≤ θ ≤ 1, tem-se:

[L2 (Ω) × H 3/2 (Γ), L2 (Ω) × H −1/2 (Γ)]θ = L2 (Ω) × H (3/2)−2θ (Γ)

e
[H 2 (Ω), H0 ]θ = H2(1−θ) .
138 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

Observe que Hα , 0 ≤ α ≤ 2, é o espaço de Hilbert

Hα = {u ∈ H α (Ω); ∆u ∈ L2 (Ω)} (3.2.25)

munido do produto escalar

(u, v)Hα = (u, v)H α(Ω) + (∆u, ∆v).

3
Considere α = 2(1 − θ). Então 2
− 2θ = − 12 + α. Decorre do exposto e por aplicação
de argumentos análogos aos empregados no Caso III, que a aplicação linear

{f, g} ∈ L2 (Ω) × H (−1/2)+α (Γ) 7→ u ∈ Hα , 0≤α≤2 (3.2.26)

sendo u a solução do problema




−∆u = f em Ω


u = g sobre Γ

é contı́nua e bijetiva. Também a aplicação traço γ0 :

u ∈ Hα 7→ γ0 u ∈ H (−1/2)+α (Γ), 0≤α≤2 (3.2.27)

é contı́nua. 

3.3 Problema de Neumann


No presente parágrafo investiga-se a solução do problema


−∆u + u = f em Ω
(P2 )
∂u
= h sobre Γ
∂ν
sendo f e h funções reais definidas, respectivamente, em Ω e sobre Γ.
De inı́cio, como foi feito no Problema de Dirichlet, vai-se definir solução de (P2 )
quando f e h são funções não regulares.
3.3. PROBLEMA DE NEUMANN 139

Procede-se de forma heurı́stica. Formalmente, obtém-se:


Z Z Z Z
∂u ∂v
(−∆u + u)v dx = u(−∆v + v) dx − v dΓ + u dΓ.
Ω Ω Γ ∂ν Γ ∂ν
∂v
Como não se tem informação sobre u restrito a Γ deve-se impor a condição = 0.
∂ν Γ
Supondo u ∈ L2 (Ω) vem que −∆v + v deve pertencer a L2 (Ω). Isto e a primeira restrição
implicam que v deve pertencer ao espaço

W = {v ∈ H 2(Ω); γ1 v = 0} (3.3.28)

que por sua vez acarreta v ∈ H 3/2 (Γ), portanto pode-se considerar h ∈ H −3/2 (Γ). Também
considere f ∈ L2 (Ω).
O anterior motiva a seguinte definição: Sejam

f ∈ L2 (Ω) e h ∈ H −3/2 (Γ).

Então u ∈ L2 (Ω) que verifica

(u, −∆v + v) = (f, v) + hh, γ0 viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ) (3.3.29)

para todo v ∈ W , é denominada solução definida por transposição do Problema (P2 ).

Proposição 3.3.1 Sejam


f ∈ L2 (Ω) e h ∈ H −3/2 (Γ).

Então o Problema (P2 ) possui uma única solução u ∈ L2 (Ω) definida por transposição. Além
disso, a aplicação linear

{f, h} ∈ L2 (Ω) × H −3/2 (Γ) 7→ u ∈ L2 (Ω)

onde u é solução do problema




−∆u + u = f em L2 (Ω)
(3.3.30)

γ1 u = h em H −3/2 (Γ),

é contı́nua.
140 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

Demonstração: Seja A o operador definido pela terna {H 1 (Ω), L2 (Ω), (u, v)H 1(Ω) }. Então
A = −∆ + I e como Ω é regular, vem que

D(A) = {u ∈ H 2 (Ω); γ1 u = 0} = W

onde W foi definido por (3.3.28). Também para cada f ∈ L2 (Ω) o problema de Neumann


−∆u + u = f em Ω
(3.3.31)
∂u
= 0 sobre Γ
∂ν
admite uma única solução u ∈ D(A), sendo

||u||H 2(Ω) ≤ C|f |, (3.3.32)

C uma constante independente de f e u (ver H. Brezis [19]). O espaço vetorial D(A) com o
produto escalar
(u, v)D(A) = (−∆u + u, −∆v + v)

é um espaço de Hilbert.
Do exposto vem
A: D(A) 7→ L2 (Ω) (3.3.33)

é uma isometria linear sobrejetiva. Resulta então que o adjunto

A∗ : L2 (Ω) 7→ D(A)′

é uma isometria sobrejetiva, sendo:

h(−∆ + I)∗ u, viD(A)′ D(A) = (u, −∆v + v). (3.3.34)

Define-se em D(A) a forma linear L dada por:

hL, vi = (f, v) + hh, γ0 viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ) , v ∈ D(A). (3.3.35)
3.3. PROBLEMA DE NEUMANN 141

Tem-se:
|hL, vi| ≤ |f | |v| + ||h||H −3/2 (Γ) ||γ0 v||H 3/2 (Γ)

que implica de (3.3.32)


h i1/2
|hL, vi| ≤ C |f |2 + ||h||2H −3/2 (Γ) ||v||D(A)

provando a continuidade de L em D(A), portanto L é um objeto de D(A)′ .


Decorre, daı́ e da sobrejetividade de A∗ , que existe u ∈ L2 (Ω) tal que

(−∆ + I)∗ u = L em D(A)′

ou
h(−∆ + I)∗ u, vi = hL, vi, ∀ v ∈ D(A). (3.3.36)

Combinando (3.3.34), (3.3.35) e (3.3.36) vem que

(u, −∆v + v) = (f, v) + hh, γ0viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ) , ∀ v ∈ D(A) (3.3.37)

isto é, u é uma solução definida por transposição de (P2 ). A unicidade de u é conseqüência
da sobrejetividade da aplicação A dada em (3.3.33).
• Mostra-se que −∆u + u = f em L2 (Ω).
Com efeito, considerando v ∈ D(Ω) obtém-se o resultado.
• Mostra-se que γ1 u = h em H −3/2 (Γ).
De fato, considera-se o espaço H0 , cf. Capı́tulo 2, parágrafo 2.7. Resulta dos resulta-
dos aı́ obtidos, que a aplicação traço γ

u ∈ H0 7→ γu = {γ0 u, γ1u} ∈ H −1/2 (Γ) × H −3/2 (Γ)

é linear e contı́nua e vale a seguinte fórmula de Green:

(−∆u, v) = (u, −∆v) − hγ1 u, γ0viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ) + hγ0 u, γ1viH −1/2 (Γ)H 1/2 (Γ)

para todo v ∈ H 2 (Ω) e u ∈ H0 .


142 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

Como u ∈ H0 vem então que γ1 u ∈ H −3/2 (Γ) e

(−∆u + u, v) = (u, −∆v + v) − hγ1 u, γ0 viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ)

para todo v ∈ D(A), ou

(f, v) = (u, −∆v + v) − hγ1u, γ0 viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ) , ∀ v ∈ D(A). (3.3.38)

De (3.3.37) e (3.3.38) vem o resultado desejado.


• Continuidade da aplicação linear

{f, h} ∈ L2 (Ω) × H −3/2 (Γ) 7→ u ∈ L2 (Ω)

onde u é solução de (3.3.30).


De fato, seja ξ ∈ L2 (Ω) e v solução de (3.3.30) com ξ em lugar de f . Da condição
(3.3.37) resulta
(u, ξ) = (f, v) + hh, γ0viH −3/2 (Γ)H 3/2 (Γ)

para todo v ∈ D(A). Da estimativa (3.3.32) obtém-se ||v||H 2(Ω) ≤ C|ξ|, portanto

|(u, ξ)| ≤ C||{f, g}||L2(Ω)×H −3/2 (Γ) ||v||H 2(Ω)


≤ C||{f, g}||L2(Ω)×H −3/2 (Γ) |ξ|

o que implica
|u| ≤ C||{f, g}||L2(Ω)×H −3/2 (Γ)

mostrando a continuidade da aplicação. 


Nota-se que pela unicidade das soluções definidas por transposição do Problema (P2 ),
os problemas (3.3.29) e (3.3.30) são equivalentes.

Observação 28 Tem-se que a aplicação linear

{f, h} ∈ L2 (Ω) × H −3/2 (Γ) 7→ u ∈ H0

onde u é a solução de (3.3.30), é contı́nua e bijetiva.


3.3. PROBLEMA DE NEUMANN 143

Considere-se, agora, f ∈ L2 (Ω) e h ∈ H 1/2 (Γ). Seja w ∈ H 2 (Ω) tal que γ1 u = h.


Então, do Teorema de Traço (cf. Capı́tulo 2, parágrafo 2.8), resulta que w pode ser escolhido
de modo que
||w||H 2(Ω) ≤ C||h||H 1/2 (Γ) . (3.3.39)

Para este w, seja v a solução do problema:




−∆v + v = f − ∆w − w em Ω

∂v
= 0 sobre Γ.
∂ν
Resulta que para esta escolha de w, a solução v ∈ H 2 (Ω) e de (3.3.32) e (3.3.39) obtém-se:

||v||H 2(Ω) ≤ C[|f | + |∆w| + |w|] ≤ C(|f | + ||h||H 1/2 (Γ) ). (3.3.40)

Tomando-se u = v + w, obtém-se:


−∆u + u = f em Ω
(3.3.41)
∂u
= h sobre Γ,
∂ν
resultando de (3.3.39) e (3.3.40) que

||u||H 2(Ω) ≤ C(|f | + ||h||H 1/2 (Γ) ).

Tem-se que u é única.


Conclui-se, portanto, que a aplicação linear

{f, g} ∈ L2 (Ω) × H 1/2 (Γ) 7→ u ∈ H 2 (Ω), (3.3.42)

sendo u solução de (3.3.41), é contı́nua e bijetiva. 

No que se segue, serão aplicados resultados de interpolação para a obtenção da solução


do problema de Neumann em outros espaços de Sobolev (cf. J.L. Lions - E. Magenes,[11]).
De fato, para 0 ≤ θ ≤ 1, obtém-se:

[H 1/2 (Γ), H −3/2 (Γ)]θ = H (1/2)−2θ (Γ)


144 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

e
[H 2 (Ω), L2 (Ω)]θ = H 2(1−θ) (Ω).

1
Seja α = 2(1 − θ) então 2
− 2θ = − 23 + α. Resulta da Proposição 3.3.1 e (3.3.42) que a
aplicação linear, com 0 ≤ α ≤ 2,

{f, h} ∈ L2 (Ω) × H (−3/2)+α (Γ) → u ∈ H α (Ω),

é contı́nua, sendo u a única solução do problema:




−∆u + u = f em Ω


γ1 u = h sobre Γ.

Igualmente da Proposição 3.3.1, (3.3.42) e do teorema do gráfico fechado, resulta que


a aplicação linear, com 0 ≤ α ≤ 2,

u ∈ Hα → {f, h} ∈ L2 (Ω) × H (−3/2)+α (Γ)

é contı́nua.
O espaço Hα foi definido em (3.2.25), isto é,

Hα = {u ∈ H α (Ω); ∆u ∈ L2 (Ω)}.

Resulta, daı́, que a aplicação traço γ1 dada por:

u ∈ Hα → γ1 u ∈ H (−3/2)+α (Γ) (3.3.43)

é contı́nua para 0 ≤ α ≤ 2.
Em particular, para α = 23 , conclui-se que o traço γ1 dado por:

u ∈ H3/2 → γ1 u ∈ L2 (Ω)

é contı́nua. 
3.4. TEOREMA DO TRAÇO. FÓRMULA DE GREEN 145

3.4 Teorema do Traço. Fórmula de Green


A notação desta seção será a que foi fixada na seção anterior. Verifique as notações
Hα , 0 ≤ α ≤ 2, γ0 e γ1 .

Teorema 3.4.1 A aplicação traço

u ∈ Hα → γu = {γ0 u, γ1u} ∈ H (−1/2)+α (Γ) H (−3/2)+α (Γ), (3.4.44)

para 0 ≤ α ≤ 2, é linear e contı́nua. Tem-se a seguinte Fórmula de Green:

(−∆u, v) = (u, −∆v) − hγ1 u, γ0viH (−3/2)+α (Γ) H (3/2)−α (Γ) + (3.4.45)

+hγ0u, γ1 viH (−1/2)+α (Γ) H (1/2)−α (Γ) ,

para 0 ≤ α ≤ 2, u ∈ Hα e v ∈ H2−α .

Demonstração: Reescrevendo (3.2.27), Caso IV, vem que a aplicação linear γ0

u ∈ Hα → γ0 u ∈ H (−1/2)+α (Γ), 0 ≤ α ≤ 2,

é contı́nua.
De (3.3.43), cf. Seção 3.3, Problema de Neumann, resulta que a aplicação linear γ1

u ∈ Hα → γ1 u ∈ H (−3/2)+α (Γ), 0 ≤ α ≤ 2,

é contı́nua.
Resulta que a aplicação traço γ = {γ1 , γ2} é linear e contı́nua de Hα em H (−1/2)+α (Γ)×
H (−3/2)+α (Γ), com 0 ≤ α ≤ 2. Permutando α por 2 − α em (3.4.44) resulta que a aplicação
traço γ = {γ1, γ2 }, tal que

v ∈ H2−α → γv = {γ0 v, γ1 v} ∈ H (3/2)−α (Γ) H (1/2)−α (Γ),

0 ≤ α ≤ 2, é contı́nua.
146 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS

Considere-se u e v em H 2 (Ω). Obtém-se:

(−∆u, v) = (u, −∆v) − (γ1 u, γ0 v)L2 (Γ) + (γ0 u, γ1v)L2 (Γ) . (3.4.46)

Note-se que:
(γ1 u, γ0 v)L2 (Γ) = hγ1 u, γ0viH (−3/2)+α (Γ) H (3/2)−α (Γ)

e
(γ0 u, γ1v)L2 (Γ) = hγ0 u, γ1viH (−1/2)+α (Γ) H (1/2)−α (Γ) .

Portanto, modifica-se (3.3.43), obtendo-se:

(−∆u, v) = (u, −∆v) = hγ1 u, γ0viH −(3/2)+α (Γ) H (3/2)−α (Γ) +


(3.4.47)
+hγ0u, γ1 viH (−1/2)+α (Γ) H (1/2)−α (Γ) , u, v ∈ H 2 (Ω).

Observe, também, que [H 2 (Ω), H0 ]1−(α/2) = Hα , com 0 ≤ α ≤ 2, implicando que H 2 (Ω) é


denso em Hα . Desta densidade e da continuidade de γ definida em (3.4.44), resulta que a
igualdade (3.4.47) é válida para todo u ∈ Hα e v ∈ H 2 (Ω). Aplicando, novamente, o mesmo
raciocı́nio a resultado obtido, conclui-se que (3.4.47) é válida para todo u ∈ Hα e v ∈ H2−α ,
que é a Fórmula de Green procurada. 
Considere-se o operador A definido na Seção 3.3, Problema de Neumann, isto é,
A = −∆ + I com domı́nio

D(A) = {u ∈ H 2 (Ω); γ1 u = 0}.

Sejam (wµ ) e (λµ ) os vetores próprios e valores próprios, respectivamente, de A. Note-se que
λµ ≥ 1 para todo µ ∈ N. Tem-se, para 0 ≤ α ≤ 1,
n ∞
X o
α 2 2α 2
D((−∆) ) = u ∈ L (Ω); (λµ − 1) |(u, wµ)| < ∞
µ=1

e

X
α
(−∆) u = (λµ − 1)α (u, wµ)wµ
µ=1

(cf. M. Milla Miranda [25]). É claro que D((−∆)α ) = D(Aα ), 0 ≤ α ≤ 1.


3.4. TEOREMA DO TRAÇO. FÓRMULA DE GREEN 147

Proposição 3.4.1 Tem-se:

(−∆u, v) = ((−∆)α u, (−∆)1−α v) − hγ1 u, γ0viH (−3/2)+α (Γ) H (3/2)−α (Γ) , (3.4.48)

1 1
para 0 ≤ α ≤ 2
e u ∈ H2α , v ∈ D(A). Para α = 2
, vale a fórmula:

(−∆u, v) = (∇u, ∇v) − hγ1 u, γ0viH −1/2 (Γ) H 1/2 (Γ) , (3.4.49)

sendo u ∈ H1 e v ∈ H 1 (Ω). (Esta expressão já foi obtida no Capı́tulo 2, Seção 2.5.2).

Demonstração: Seja v ∈ D(A). Da Fórmula de Green (3.4.45), obtém-se:

(−∆u, v) = (u, −∆v) = hγ1 u, γ0viH −(3/2)+α (Γ) H (3/2)−α (Γ) ,

1
para v ∈ H2α . Note-se queD(A) ⊂ D(A1−α ), e que para 0 ≤ α ≤ 2
, H2α ⊂ D(Aα ) =
H 2α (Ω). Então, sendo D(Aα ) = D((−∆)α ), 0 ≤ α ≤ 1, resulta que a última fórmula pode
1
ser escrita na forma (3.4.48). A expressão (3.4.49) é obtida aplicando (3.4.48) com α = 2
e
observando que D(A) ֒→ D(A1/2 ) = H 1 (Ω) e D(A) denso em D(A1/2 ). 
148 CAPÍTULO 3. PROBLEMAS ELÍTICOS NÃO HOMOGÊNEOS
Bibliografia

[1] M. Artola – Variational inequalities, Autumn course on mathematical and numerical


methods in fluid dynammics, Trieste, 1973.

[2] R.A. Cipolati – Uma aplicação do teorema de Lions-Stampacchia a um problmea de


elasticidade, Tese de Mestrado, IM-UFRJ, 1976.

[3] D.G. Figueiredo e F. Treves – Espaços vetoriais topológicos e distribuições, Notas de


Matemática n0 41, Rio de Janeiro.

[4] E. Gagliardo – Proprietà di alcune classi di funzioni in più variabili, Ricerce di Mat.
vol. VIII (1958), 102–137.

[5] D. Huet – Distributions and Sobolev spaces, University of Maryland, 1970.

[6] C.H. Hönig – Aplicações da topologia à análise, IMPA-CNPq (Projeto Euclides), Rio
de Janeiro, 1976.

[7] V.K. Khoan – Distributions, analyse de Fourier, opérateurs aux dérivées partielles,
Tome II, Vuibert, Paris 1972.

[8] J.L. Lions – Problèmes aux limites dans les équations aux dérivées partielles, Les Presses
de l’Université de Montreal, Montreal, 1965.

[9] J.L. Lions – Cours d’analyse numérique, Hermann, Paris, 1974.

149
150 BIBLIOGRAFIA

[10] J.L. Lions – Équations aux dérivées partielles et calcul des variations (Cours IHP) 1967,
Paris.

[11] J.L. Lions, E. Magenes – Problèmes aux limites non homogènes, Vol. I, Dunod, Paris,
1968.

[12] L.A. Medeiros e P.H. Rivera – Espaços de Sobolev e equações diferenciais parciais, IM-
UFRJ, 1965.

[13] R. Riesz, B.Sz. Nagy – Functional Analysis, F. Ungak, N.Y. 1955.

[14] L. Schwartz – Théorie des distributions, Vol. I, II, Hermann, Paris, 1951.

[15] S. Sobolev – Applications of functional analysis in mathematical physics, A.M.S. 1963.

[16] K. Yosida – Functional Analysis, Springer Verlag, 1965.

Bibliografia Complementar

[17] R.A. Adams – Sobolev Spaces, Academic Press, N.Y., 1975.

[18] J.A. Aubin – Approximation of Elliptic Boundary Value Problems, Wiley Interscience,
N.Y., 1972.

[19] H. Brezis – Analyse Fonctionelle (Théorie et Aplications), Masson, Paris, 1973.

[20] M.P. do Carmo – Differential Geometry of Curves and Surfaces, Prentice-Hall, N.J.,
USA, 1976.

[21] G. Chavant – Analyse Fonctionelle et Discretisation, INRIA, France, 1977.

[22] R. Dautray e J.L. Lions – Mathematical Analysis and Numerical Methods for Science
and Technology, V.3, Springer-Verlag, 1983.
BIBLIOGRAFIA 151

[23] S. Kesavan – Topics in Functional Analysis and Applications, Wiley Easten Limited,
New Delhi, 1990.

[24] N. Meyers and J. Serrin – H = W , Proceedings Nat. Acad. Sci. USA, 51 (1964), 1055–
1056.

[25] M. Milla Miranda – Análise Espectral em Espaços de Hilbert, IM-UFRJ, Rio de Janeiro,
RJ, Brasil, 1990.

[26] R. Temam – Navier-Stokes Equations (Theory and Numerical Analysis), North-Holland,


Amsterdam, 1979.

Instituto de Matemática, UFRJ


Caixa Postal 68530
CEP 21941–909, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Você também pode gostar