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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA

CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS


BACHARELADO EM CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS

TÓPICOS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS


ORDINÁRIAS

PAULLA BORGES AVILA DA SILVA

CRUZ DAS ALMAS


2019
TÓPICOS DE EQUAÇÕES DIFERENCIAIS
ORDINÁRIAS

PAULLA BORGES AVILA DA SILVA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Colegiado do Curso de Bacharelado em Ciências
Exatas e Tecnológicas da Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia como parte dos requisitos para
obtenção do tı́tulo de Bacharel em Ciências Exatas e
Tecnológicas.

Orientador: Prof. Dr. Alex Santana dos Santos

Cruz das Almas


2019
Aos meus familiares, com
muito amor.
Agradecimentos

Primeiramente gostaria de agradecer à Deus, por ter me concedido a vida e estar


sempre ao meu lado traçando a minha trajetória e guiando todos os meus passos.
A minha mãe, por todo amor e carinho, por me apoiar em minhas decisões, está
presente e procurar dá sempre a melhor educação possı́vel, sendo o suporte fundamental
para que eu pudesse chegar até aqui.
A meu pai e aos meus avôs que estão sempre presentes e dispostos a ajudarem
da melhor maneira possı́vel.
As minhas irmãs Kamila, Rafaella e Marcella, por estarem ao meu lado dando
apoio, amor e compreensão.
Ao meu namorado Marcus Vinicius por todo amor e paciência, por fazer parte
de cada passo, de cada momento difı́cil e está sempre me motivando a acreditar cada vez
mais em mim, amo muito você.
Aos professores Adson Mota, Erikson Alexandre e Mariana Pinheiro por toda
contribuição para este trabalho.
Aos professores Alex Santana e Jarbas Fernandes, que me deram todo apoio para
o desenvolvimento deste trabalho, sempre com muita dedicação e paciência. Obrigada
por tudo.
Resumo

Neste trabalho foram estudados alguns tópicos de Equações Diferenciais Ordinárias (EDOs)
não usuais em um curso inicial de Cálculo Diferencial e Integral. Primeiramente, fo-
ram estudadas as EDOs de primeira ordem, em particular, demonstrou-se o teorema da
existência e unicidade para EDOs. Além disso, foi obtida uma solução para o problema da
propagação da podridão em maçãs. Posteriormente, foi abordado o método das séries de
potências para solução de EDO. Especificamente, encontram-se as soluções das equação
de Legendre, polinômios de Legendre e por fim o método de Frobenius.

Palavras-chave: Séries de Potência; Equação Diferencial Ordinária; Método das Séries


de Potências; Existência e Unicidade.
Abstract

In this work, we have studied some topics of Ordinary Differential Equations


(ODEs) that are not usual in an initial course of Differential and Integral Calculus. Firstly,
the first-order ODEs were studied, in particular, the existence and uniqueness theorem
was demonstrated for ordinary differential equations. In addition, a solution was obtained
for the problem of rot propagation on apples. Lastly, the power series method for ODEs
solution. Specifically, it was found the solutions of the Legendre equation, Legendre
polynomials, and finally the Frobenius method.

Keywords: Power Series; Ordinary Differential Equations; Power Series Method; Exis-
tence and Uniqueness.
Sumário

Introdução 1

1 Conceitos Básicos 4
1.1 Sequências e Séries Infinitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.1.1 Sequências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.1.2 Série Infinita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.1.3 Série de Potência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.1.4 Operações em Séries de Potências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

2 Equação Diferencial Ordinária 11


2.1 Equações Diferenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
2.2 Soluções de EDOs . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.3 Problema de Valor Inicial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2.4 Existência e Unicidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.5 Equação Logı́stica Contı́nua . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.5.1 Propagação da Podridão em Maçãs . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

3 Soluções para EDOs por Série 33


3.1 Método das Séries de Potências para Solução de EDO . . . . . . . . . . . . 33
3.1.1 A Ideia do Método das Séries de Potências . . . . . . . . . . . . . . 34
3.2 Classificação de pontos singulares de equações lineares homogêneas . . . . 35
3.2.1 Pontos ordinários e singular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
3.2.2 Ponto Singular Regular e Irregular . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
3.2.3 Existência de Soluções das EDOs em Séries de Potências . . . . . . 37
3.3 Equação de Legendre e Polinômios de Legendre . . . . . . . . . . . . . . . 37
3.3.1 Polinômios de Legendre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
3.4 Método de Frobenius . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

Conclusão 51
Introdução

Uma equação diferencial (ED) pode ser definida como sendo uma equação na
qual a incógnita é uma função, e possui uma relação com as derivadas desta função. As
equações diferenciais são utilizadas para modelar problemas da Matemática, por exemplo
são fundamentais para encontrar a taxa de variação com o tempo das grandezas que
caracterizam o problema, ou seja, a dinâmica temporal do sistema de interesse.
Com a resolução das equações diferenciais, que caracterizam determinados siste-
mas, consegue-se extrair informações importantes sobre os mesmos, podendo então prever
o seu comportamento. Sendo assim, a modelagem através de equações diferenciais fornece
o comportamento de alguns sistemas. Cabe salientar que a modelagem de um sistema
quase sempre é uma descrição aproximada e simplificada do processo real (Boyce and
DIPRIMA, 2010; Figueiredo, 2007).
Segundo Rooney (2012); Boyce and DIPRIMA (2010), nomes importantes no
estudo e desenvolvimento da teoria das equações diferenciais foram Isaac Newton (1642-
1727) e Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716). Mais tarde surgiram outros nomes, como
dos irmãos Bernoulli, Jakob (1654-1705) e Johann (1667-1748), que tiveram seus trabalhos
voltados para a formulação de métodos para resolver equações diferenciais.
Historicamente, tem-se que a evolução da Matemática, onde está inserido o estudo
das equações diferenciais, está atrelado com o desenvolvimento da Fı́sica, tornando-as
uma ferramenta de cálculo das equações de movimento da mecânica Newtoniana, do
eletromagnetismo e da fı́sica ondulatória (Figueiredo, 2007).
Os estudos das equações diferenciais se dividem em dois amplos campos de estu-
dos, o das Equações Diferenciais Ordinárias (EDOs) e o das Equações Diferenciais Parciais

1
(EDPs). Neste trabalho, será dada atenção somente às EDOs. As equações diferenciais
ordinárias ocorrem quando a função desconhecida depende de uma única variável inde-
pendente. No dias atuais, as equações diferenciais ordinárias são usadas em diversas áreas
do conhecimento tais como, Engenharia, Saúde e Ciências Sociais Aplicadas. Especifica-
mente, EDO tem sido aplicada com sucesso no estudo da dinâmica populacional, datação
por carbono radioativo, em sistema predador-presa ou propagação de epidemias. Além
disso, as equações diferenciais podem também ser aplicadas na Economia, no Comércio e
em outras áreas (Bassanezi, 2015; Boyce and DIPRIMA, 2010; Figueiredo, 2007).
Diversos problemas nas Ciências e Engenharia são descritos de forma matemática
por EDOs, que representam variações das quantidades fı́sicas que os descrevem. A maioria
desses problemas exige uma solução que satisfaça a uma dada condição inicial, chamados
problemas de valores iniciais (PVI) (Boyce and DIPRIMA, 2010; Figueiredo, 2007).
Existem diversos métodos analı́ticos para encontrar uma solução das EDOs, mas
muito deles são restritos às equações mais simples, o que engloba uma pequena quantidade
de problemas. Este trabalho tem como objetivo principal estudar tópicos de EDOs que
não são vistos em um curso Cálculo Diferencial e Integral. Especificamente, neste trabalho
é estudado o Teorema da Existência e Unicidade para EDOs. Além disso, é abordado um
método para solucionar tais equações. Precisamente, é estudado o método das séries de
potências para soluções de EDOs, visto que é uma alternativa para resolver este tipo de
equações por meio da teoria de séries de funções.
Vale ressaltar que este estudo é significativo devido à existência de uma série de
problemas nas Ciências e na Engenharia, tal como a propagação da podridão em maçãs.
Desta forma, este texto está dividido em três capı́tulos. No primeiro, Capı́tulo 1, foi feito
um breve estudo sobre alguns conceitos básicos fundamentais para o desenvolvimento do
trabalho, tais como definição de sequências, séries numéricas infinitas e séries de potências.
No Capı́tulo 2, foram realizados estudos sobre as equações diferenciais, especificamente
as equações diferenciais ordinárias, onde foi realizada a demonstração do teorema da
existência e unicidade. Além disso, foi resolvido o problema da propagação da podridão
em maçãs. No Capı́tulo 3, foi feito um estudo sobre o método das séries de potencias para

2
solução de EDOs, classificação dos pontos ordinários e singulares, Equação e Polinômio de
Legendre e o Método de Frobenius. Por fim, texto é finalizado com uma breve conclusão.

3
Capı́tulo 1

Conceitos Básicos

Ao longo deste capı́tulo serão apresentados conceitos e notações que servirão para
o desenvolvimento dos próximos capı́tulos. Precisamente, serão abordados os seguintes
tópicos: sequências, séries infinitas e séries de potências. Para um estudo mais detalhado
desses tópicos, são indicados as seguintes literaturas (Boyce and DIPRIMA, 2010; Munem,
1982; Kreyzig, 2009).

1.1 Sequências e Séries Infinitas

1.1.1 Sequências

Para iniciar o estudo sobre séries é de grande importância que seja realizada uma
breve discussão sobre as sequências. Quando fala-se em sequência numérica vem em mente
uma sucessão de números que são postos em uma ordem definida, sendo que cada número
da sequência é denominado de termo da mesma. Uma sequência que possui números
finitos de termos é denominada de sequência finita; já a que possui números infinitos de
termos é, portanto, uma sequência infinita. Para o estudo em questão, serão tratados
somente as sequências infinitas, que possuem diversas aplicações como em problemas que
envolvem progressões aritméticas ou geométricas.
Progressão aritmética (PA) é definida como sendo uma sequência de números onde
cada um de seus termos, a partir do segundo, é igual a soma do anterior por uma constante

4
r, denominada de razão da PA, sendo bastante presente em situações do cotidiano. Já a
progressão geométrica (PG) é uma sequência de números reais em que cada um de seus
termos, a partir do segundo, é igual ao produto do anterior por uma constante q, chamada
razão PG.
Matematicamente uma sequência é uma função f cujo domı́nio é o conjunto dos
números inteiros positivos. Dessa forma, o valor f (n) é denominado o n-ésimo termo da
sequência f . Aqui, a notação (an ) será utilizada como simbologia para as sequências que
possuem an como seu n-ésimo termo.
No estudo de sequências é de suma importância saber se a mesma converge ou
diverge. Dessa forma, escreve-se lim an = L e é dito que a sequência an converge para
n−→+∞
o limite L desde que, para cada número positivo ε exista um inteiro positivo N tal que

n≥N =⇒ |an − L| < ε.

Divergente é toda sequência que não é convergente. E escreve-se lim an = +∞


n−→+∞
quando a sequência é dita divergente, desde que para todo ε > 0 exista um natural n > N .
Pode ser observado que as definições anteriores são exatamente as mesmas quando trata-se
com limite de uma função f (n), para todo n −→ +∞, sendo assim, todas as propriedades
para lim f (n) = L podem ser aplicadas aqui.
n−→+∞

1.1.2 Série Infinita

Em conformidade com Munem (1982), uma soma de todos os termos de uma


sequência numérica infinita é chamada de série infinita, ou simplesmente série. Denota-se
uma série numérica infinita por ∞
P
k=1 ak . Os termos a1 , a2 , a3 , ... são os termos da série e

o termo an é o n-ésimo termo ou termo geral.


Literalmente não é possı́vel realizar a soma de uma série numérica infinita, mas
pode-se estudar a convergência da série por meio das sequências das somas parciais. Uma
sequência de somas parciais sn é a soma dos primeiros n termos de uma série nk=1 ak .
P

5
Em termos matemáticos, a soma parcial da série é dada por
n
X
sn = a1 + a2 + a3 + ... + an = ak .
k=1
P∞
Se a sequência sn das somas parciais da série infinita k=1 ak converge para um
limite S, então a série infinita é converge e sua soma é S, ou seja,

X
S= ak .
k=1

Se a série numérica infinita não converge, pode-se dizer que é divergente.

Exemplo 1.1. Dada a série



X
(1/2)n .
n=0
Vai-se verificar a convergência da série. Observa-se inicialmente que:

X 1 1 1 1 − (1/2)n+1 1
sn = (1/2)k = 1 + + 2 + ... + n = = 2 − n.
k=0
2 2 2 1 − 1/2 2
Como
S= lim sn = lim (2 − 1/2n ) = 2,
n−→+∞ n−→+∞

tem-se que a série é convergente.

Neste trabalho, a atenção será focada nas séries de potência que serão apresen-
tadas a seguir.

1.1.3 Série de Potência

Uma série de potência com variáveis e constantes reais é uma série infinita escrita
na seguinte forma

X
am (x − x0 )m = a0 + a1 (x − x0 ) + a2 (x − x0 )2 + ..., (1.1)
m=0

onde x é uma variável real e a0 , a1 , a2 , ... são constantes denominadas coeficientes da série
e x0 é uma constante denominada de centro da série. Em particular se x0 = 0 obtêm-se
uma série de potência expressa em termos de potências de x

X
am xm = a0 + a1 x + a2 x2 + ... (1.2)
m=0

6
Nas séries de potências (1.1) é possı́vel que sejam convergentes para alguns valores
de x, mas divergentes para outros.
Uma série de potência da forma da Eq. (1.1) é convergente num ponto x quando
o seguinte limite


X
lim am (x − x0 )m
m−→∞
m=0

existe. Claramente, para x = x0 , a série de potência converge e, ainda, seu limite é a0 .


De forma geral, pode-se investigar a convergência de uma série por meio do teste
da razão. Este teste se baseia no resultado que se

|am+1 (x − x0 )m+1 |
lim = r < 1,
m−→∞ |am (x − x0 )m |
então a série converge. Por outro lado, se

|am+1 (x − x0 )m+1 |
lim = r > 1,
m−→∞ |am (x − x0 )m |
então a série diverge.
Nos casos no qual r = 1 o critério não é conclusivo, devendo ser realizada uma
nova análise por meio de outro método (Guidorizzi, 2000).
Um conjunto I de todos os números x para os quais uma série de potência converge
é nomeado de intervalo de convergência. Para qualquer série de potência o intervalo de
convergência I sempre tem uma das seguintes formas:
1. A série da Eq. (1.1) sempre converge em x = x0 , pois todos os seus termos
são nulos. Em casos excepcionais, x = x0 pode ser o único x que haja a convergência da
Eq. (1.1).
2. Se existirem outros valores de x para os quais a série converge, esses valores
formam o intervalo de convergência. Se tal intervalo for limitado, ele possui em ponto
central x0 , de modo a ter a forma

|x − x0 | < R (1.3)

7
e a série da Eq. (1.1) converge para todo x tal que |x − x0 | < R e diverge para todo x
tal que |x − x0 | > R. Tem-se que o número R é chamado de raio de convergência da Eq.
(1.1). Além disso, obter-se R por meio de qualquer uma das fórmulas a seguir
am+1
R = 1/ lim | | (1.4)
n−→∞ am
ou
p
m
R = 1/ lim |am | (1.5)
n−→∞

desde que esses limites existam e não sejam nulos.


3. Existem casos em que o intervalo de convergência é infinito, ou seja, a série
da Eq. (1.1) converge para todo x. Então, escrevemos R = ∞.
Dessa forma, para cada x para o qual a série da Eq. (1.1) converge, ela é um
certo valor s(x). Pode-se dizer que a Eq. (1.1) representa a função s(x) no intervalo de
convergência

X
s(x) = am (x − x0 )m (|x − x0 | < R).
m=0
P∞
Teorema 1.1. Seja m=0 am (x−x0 )m uma série de potência com raio de convergência R.
an+1
Suponha que lim | | = L, onde L é ou um número real não-negativo ou L = +∞
n−→+∞ an
(i) Se L é um número real positivo, então R = 1/L;

(ii) Se L = 0, então R = +∞;

(iii) Se L = +∞, então R = 0.

O exemplo 1.2 ilustra a aplicação do Teorema 1.1.

Exemplo 1.2.

(i) No caso da série



X
m!xm = 1 + x + 2x2 + 6x3 + ...
m=0
tem-se que am = m! e pela Eq. (1.4),
am+1 (m + 1)!
= = m + 1 −→ ∞.
am m!
Portanto, essa série converge somente no centro x = 0.

8
(ii) Para as séries geométricas, tem-se

1 X
= xm = 1 + x + x2 + ... (|x| < 1).
1 − x m=0

Com efeito, am = 1 para todo m, da Eq. (1.4), obtém-se R = 1, ou seja, a série geométrica
converge e representa 1/(1 − x) quando |x| < 1.

(iii) No caso da série



X xm x2
ex = =1+x+ + ...
m=0
m! x!
tem-se que am = 1/m!. Logo, pela Eq. (1.4),
am+1 1/(m + 1)! 1
= = −→ 0,
am 1/m! m+1
a medida que m −→ ∞. De modo que a série converge para todo x ∈ R.

1.1.4 Operações em Séries de Potências

Duas séries de potências podem ser somadas termo a termo, se as séries possuı́rem
raios de convergências positivos. Considere as seguintes séries com raios de convergência
r1 e r2 positivos, respectivamentes para as séries:

X
f (x =) am (x − x0 )m
m=0
e

X
g(x) = bm (x − x0 )m
m=0

então

X
(am + bm )(x − x0 )m (1.6)
m=0

converge. Note que a Eq. (1.6) representa a f (x) + g(x) para cada x situado no interior
do intervalo de convergência de cada uma da séries.
Além da adição, pode ser definida a multiplicação termo a termo entre duas séries
de potências. Precisamente, supõem-se que as séries

X
f (x) = am (x − x0 )m
m=0

9
e

X
g(x) = bm (x − x0 )m
m=0
P∞ P∞
possuem raios de convergências positivos. A série m=0 am (x − x0 )m . m=0 bm (x − x0 )
m

obtida multiplicando-se cada termo da primeira por cada termo da segunda e agrupando-
se os termos de mesma potências de x − x0 , ou seja,

X ∞
X ∞
X
m m
am (x − x0 ) bm (x − x0 ) = (a0 bm + a1 bm−1 + ... + am b0 )(x − x0 )m
m=0 m=0 m=0
= a0 b0 + (a0 b1 + a1 b0 )(x − x0 ) + ...

que converge e representa f (x)g(x) para cada x no interior do intervalo de convergência


de cada uma das duas séries dadas.
Uma série de potências pode ser derivada termo a termo. Mas para isso

X
y(x) = am (x − x0 )m
m=0

deve convergir para |x − x0 | < R, onde R > 0,e a série obtida por derivação termo a termo
também convergirá para esses valores de x e representa a derivada y 0 de y para esses x,
ou seja,

X
0
y (x) = mam (x − x0 )m−1 (|x − x0 | < R)
m=1

e

X
y 00 (x) = m(m − 1)am (x − x0 )m−2 (|x − x0 | < R).
m=2

Uma função que pode ser representada por uma série de potência de centro x0 e
raio de convergência R é denominada de função analı́tica no ponto x0 .

10
Capı́tulo 2

Equação Diferencial Ordinária

Neste capı́tulo, serão apresentados conceitos importantes para o estudo das Equações
Diferenciais Ordinárias e para construção deste texto, foram usados as referências (Boyce
and DIPRIMA, 2010; Stewart, 2012; Zill, 2011). No entanto, o estudo feito nesse trabalho
foi direcionado para as Equações Diferencias Ordinárias.

2.1 Equações Diferenciais


Uma equação diferencial pode ser definida como sendo uma equação que contém
as derivadas ou diferenciais de uma ou mais variáveis dependentes em relação a uma ou
mais variáveis independentes.
As equações diferenciais possuem duas classificações: Equação Diferencial Or-
dinária (EDO) e Equação Diferencial Parcial (EDP). É classificada em EDO uma equação
diferencial que possui derivadas de uma ou mais variáveis dependentes em relação a uma
variável independente e em EDP quando a equação diferencial possui derivadas parciais
de uma ou mais variáveis dependentes de duas ou mais variáveis independentes.
Muitos problemas importantes da Engenharia, da Fı́sica, da Biologia e das Ciências
Sociais são formulados por equações diferenciais, tendo diversas aplicações, como no es-
tudo de tanques interligado, sistemas massa mola ou de um circuito RLC.
O próximo exemplo ilustra algumas EDOs e EDPs.

11
Exemplo 2.1. As seguintes equações são exemplos de EDO e EDP, respectivamente.

dy
+ 5y = e5 (2.1)
dx

∂ 2u ∂ 2u
+ 2 =0 (2.2)
∂x2 ∂t

A partir de agora, a atenção deste trabalho será dada às EDOs. As Equações
Diferencias podem ainda ser classificadas quanto à ordem e linearidade. Tais conceitos
são apresentados a seguir.

• Ordem e Linearidade

No estudo das equações diferenciais é de suma importância classificar uma EDO


quanto a sua ordem e linearidade, pois de acordo com sua classificação pode-se usar o
melhor método e as técnicas para a solução da mesma.
Define-se a ordem de uma equação diferencial como sendo a ordem da maior
derivada na equação. Quanto a linearidade, pode-se afirmar que uma EDO é dita linear
se é linear em relação a variável dependente e suas derivadas, caso contrário são ditas não
lineares.

Exemplo 2.2. Considere as seguintes equações diferenciais


d2 y dy 3
(a) + 5( ) − 4y = ex ;
dx2 dx
dy
(b) + 5y = ex ;
dx
(c) y 000 − 2y 0 + y = 0.

Pode ser observado que os itens a, b e c são exemplos de EDOs de segunda, primeira e
terceira ordem respectivamente.

Exemplo 2.3. As seguintes equações

d3 y dy
y 00 − 2y 0 + y = 0 e 3
+ x − 5y = ex
dx dx

12
serão respectivamente equações diferenciais ordinárias lineares de segunda e terceira or-
dem.
Observe que as equações a seguir são equações diferencias ordinárias não lineares
de primeira, segunda e quarta ordem, respectivamente.

d2 y d4 y
(1 − y)y 0 + 2y = ex , + sen y = 0 e + y 2 = 0.
dx2 dx4
Uma EDO de ordem n é expressa como segue

F (x, y, y 0 , ..., y (n) ) = 0, (2.3)

dn y
onde F é uma função de valores reais de n+2 variáveis, x, y, y 0 , ..., y (n) , e onde y (n) = .
dxn
A Eq. (2.3) pode ainda ser escrita das seguinte forma

dn y
n
= f (x, y, y 0 , ..., y (n−1) ), (2.4)
dx
onde f é uma função contı́nua de valores reais, a Eq. (2.4). Por exemplo, uma EDO de
primeira ordem é expressa por
dy
= f (x, y). (2.5)
dx
Finalmente, pode-se dizer que uma EDO de ordem n é linear se tiver a seguinte
forma
dy n dy n−1 dy
an (x) n
+ a n−1 (x) n−1
+ · · · + a1 (x) + a0 (x)y = g(x), (2.6)
dx dx dx
onde ai (x), i = 0, 1, . . . , n, g(x) são funções que dependem somente da variável x.

2.2 Soluções de EDOs


Uma função φ definida no intervalo I que tem pelo menos n derivadas contı́nuas
em I, as quais quando substituı́das em uma equação diferencial ordinária de ordem n
reduzem a equação a uma identidade, é denominada uma solução da equação diferencial
no intervalo I. Para ilustrar, dada a EDO

dy
= xy 1/2 , (2.7)
dx

13
a função

1 4
y= x (2.8)
16

é uma solução da seguinte EDO no intervalo (−∞, ∞).


De fato, derivando a Eq. (2.8), tem-se

1
y 0 = x3 . (2.9)
4

Substituindo y e y 0 na EDO, observa-se que

dy 1
= x3 (2.10)
dx 4

1
xy 1/2 = x3 . (2.11)
4

Então a função y = φ(x) é solução da EDO (2.7).

2.3 Problema de Valor Inicial


A maioria dos problemas que englobam as EDOs possui algumas condições auxi-
liares relativas à função y e suas derivavas, como o valor inicial para x ou sobre os valores
dos extremos do intervalo x ∈ [a, b].
Dessa forma, pode-se afirmar que um Problema de Valor Inicial (PVI) está relaci-
onado com a determinação de uma solução da equação diferencial que satisfaça condições
subsidiárias relativas a função y e as suas derivadas referentes a um valor inicial para
x. Por exemplo, sabe-se que um PVI para uma equação diferencial ordinária de n-ésima
ordem consiste em achar uma solução y = φ(x) de maneira que satisfaça as seguintes
condições,
 n
 d y = f (x, y, y 0 , ..., y n−1 ),
dxn (2.12)
 y(x ) = y , y 0 (x ) = y , ... y n−1 (x ) = y .
0 0 0 1 0 n−1

14
Em particular, o P V I para as equações diferenciais de primeira e segunda ordem são
respectivamente dados por

 dy = f (x, y),

dx (2.13)
 y(x ) = y ,
0 0

 2
 d y = f (x, y, y 0 ),
dx2 (2.14)
y(x0 ) = y0 , y 0 (x0 ) = y1 .

2.4 Existência e Unicidade


Quando vem em mente as equações diferenciais existem algumas perguntas que
podem ser feitas. Existe solução para a Equação Diferencial e quais as condições sobre f
para que uma solução da equação (2.5) exista? Se a solução existe, ela é única? Como
pode ser determinada uma solução de uma equação diferencial?
Para responder as duas primeira perguntas, será necessário utilizar o Teorema
(2.1), denominado Teorema da existência e unicidade ou Teorema de Picard. Aqui, apre-
sentaremos a demonstração do Teorema de Picard para o caso unidimensional. Esta
demonstração foi baseada nas seguintes literaturas (Guidorizzi, 2000; Figueiredo, 2007;
Malaquias, 2018).
Cabe salientar que existe uma versão mais geral do Teorema (2.1)que pode ser
encontrada no (Sotomayor, 1979). Aqui, será apresentada uma versão do Teorema de
Picard para R2 .
df
Teorema 2.1. Seja f : Ω ⊂ R2 −→ R, Ω aberto, e seja (x0 , y0 ) ∈ Ω. Suponha que f e
dy
sejam contı́nuas em Ω. Então existe uma única solução para o problema de valor inicial

y 0 = f (x, y), y(x0 ) = y0 .

Em outras palavras, o Teorema (2.1) garante as condições em que podem-se ter


a existência e a unicidade de uma equação diferencial ordinária.
Para a demonstração do Teorema (2.1) será apresentado um conjunto de lemas.

15
Lema 2.1. Considere a equação

y 0 = f (x, y), (2.15)

onde f : Ω ⊂ R2 −→ R é contı́nua no aberto Ω. Seja (x0 , y0 ) ∈ Ω. A partir destas


condições, y = y(x), x ∈ I, será uma solução satisfazendo a condição inicial y(x0 ) = y0 ,
com x0 no intervalo I, se, e somente se
Zx
y(x) = y0 + f (s, y(s))ds ∀x ∈ I.
x0

Demonstração. =⇒] Tem-se que f : Ω ⊂ R2 −→ R é contı́nua no aberto Ω. Suponha que


y = y(x), x ∈ I é solução da EDO y 0 = f (x, y). Isto é,

y 0 (x) = f (x, y(x)),

integrando de x0 a x a equação obtém-se


Zx Zx
0
y (x)dx = f (s, y(s))ds,
x0 x0

segue que pelo Teorema Fundamental do Cálculo a solução é dada por


Zx
y(x) = f (s, y(s))ds + c. (2.16)
x0

Sabendo que y(x0 ) = y0 , substituindo em (2.16), é encontrado que c = y0 . Assim,


Zx
y(x) = y0 + f (s, y(s))ds.
x0

⇐=]. Suponha que y(x) é dada por


Zx
y(x) = y0 + f (s, y(s))ds. (2.17)
x0

Deseja-se mostrar que (2.17) é solução do PVI

 dy = f (x, y)

dx
 y(x ) = y .
0 0

16
Assim,
Zx
0
(y(x)) = (y0 + f (s, y(s))ds)0
x0
0
y (x) = f (x, y(x)).

Supondo y(x) = y, tem-se y 0 = f (x, y).

∂f
Lema 2.2. Sejam f : Ω ⊂ R2 −→ R, Ω aberto, uma função contı́nua tal que é,
∂y
também, contı́nua em Ω e (x0 , y0 ) ∈ Ω. Suponha que Ω aberto, e, assim, existem a > 0 e
b > 0 tais que o retângulo

Q = {(x, y) | x0 − a ≤ x ≤ x0 + a, y0 − b ≤ y ≤ y0 + b}

está contido em Ω. Então f é Lipschitziana em relação a segunda variável sobre o


retângulo Q, ou seja, existe uma constante K > 0 tal que f satisfaz

| f (x, y1 ) − f (x, y2 ) |≤ K | y1 − y2 |, ∀(x, y1 ), (x, y2 ) ∈ Q.


∂f ∂f
Demonstração. Como é contı́nua em Ω, consequentemente é também contı́nua em
∂y ∂y
∂f
Q. Pelo Teorema de Weierstrass (Lima, 1976), se Q é fechado tem-se que é limitada,
∂y
logo existe uma constante K > 0 tal que

∂f
(x, y) ≤ K,
∂y

para todo (x, y) em Q. Agora são considerados dois pontos quaisquer (x, y1 ) e (x, y2 ) do
retângulo Q. Segue do Teorema do Valor Médio (Lima, 1976),
∂f
f (x, y1 ) − f (x, y2 ) = (x, s)(y1 − y2 ),
∂y
para algum s entre y1 e y2 . Aplicando o módulo em ambos os lados da igualdade teremos

∂f
| f (x, y1 ) − f (x, y2 ) |= (x, s) | y1 − y2 | .

∂y
Assim,
| f (x, y1 ) − f (x, y2 ) |≤ K | y1 − y2 | .

17
Lema 2.3. Seja f : Ω ⊂ R2 −→ R, Ω aberto, contı́nua e seja (x0 , y0 ) ∈ Ω. Considere
a > 0 e b > 0 tais que o retângulo

Q = {(x, y) | x0 − a ≤ x ≤ x0 + a, y0 − b ≤ y ≤ y0 + b}

esteja contido em Ω. Seja M > 0 tal que

| f (x, y) |≤ M, em Q

(Tal M existe, pois f é contı́nua em Q).


Considere r > 0, tal que

r≤a e M r ≤ b.

Seja yn−1 = yn−1 (x), x0 − r ≤ x ≤ x0 + r, contı́nua e cujo gráfico esteja contido


em Q, seja agora
yn = yn (x), x0 − r ≤ x ≤ x0 + r

dada por
Zx
yn (x) = y0 + f (s, yn−1 (s))ds.
x0

Com estas premissas, o gráfico de yn = yn (x) também está contido em Q.

Demonstração. Para demonstrar que o gráfico de yn está contido em Q, conforme Fig.


2.1, é suficiente provar que

| yn (x) − y0 |≤ b, ∀x ∈ [x0 − r, x0 + r].

Sabendo que para todo x no intervalo x0 − r ≤ x ≤ x0 + r


Zx
yn (x) − y0 = f (s, yn−1 (s))ds. (2.18)
x0

Aplicando módulo em ambos os lados da igualdade (2.18) encontra-se

x
Z

| yn (x) − y0 | = f (s, yn−1 (s))ds


x0
Zx
≤ |f (s, yn−1 (s))| ds. (2.19)
x0

18
Figura 2.1: Gráfico de yn contido no retângulo Q

Sabendo que para todo s ∈ [x0 − r, x0 + r]

(s, yn−1 (s)) ∈ Q.

Assim,

| f (s, yn−1 (s)) |≤ M, (2.20)

para todo [x0 − r, x0 + r]. Agora, integrando ambos os lados da inequação (2.20) e pela
desigualdade (2.19) encontra-se
x
Z

| yn (x) − y0 |≤ M ds ,


x0

para todo x ∈ [x0 − r, x0 + r]. Assim, para todo x no intervalo x0 − r ≤ x ≤ x0 + r, tem-se

| yn (x) − y0 |≤ M | x − x0 | .

Logo,
| yn (x) − y0 |≤ M r ≤ b.

Teorema 2.2 (Teorema da Existência). Sejam f : Ω ⊂ R2 −→ R, e (x0 , y0 ) ∈ Ω.


df
Supondo que f e são contı́nuas em Ω. Nestas condições, a equação
dy
y 0 = f (x, y),

admite uma solução y = y(x) definida em um intervalo [x0 − r, x0 + r] e satisfazendo a


condição inicial y(x0 ) = y0 .

19
Demonstração. Considere f : Ω ⊂ R2 −→ R, r > 0 e (x0 , y0 ) de acordo com Lema (2.3).
Seja a função constante

y0 (x) = y0 , x ∈ [x0 − r, x0 + r]. (2.21)

A função (2.21) é contı́nua e seu gráfico está contido em Q. Seja agora, a sequência
de funções, tal que (yn (x))n ≥ 0
Zx
y0 (x) = y0 e yn (x) = y0 + f (s, yn−1 (s))ds, n ≥ 1, (2.22)
x0

para todo x ∈ [x0 − r, x0 + r]. Nota-se que para todo n ≥ 1, o gráfico de yn está contido
em Q. A sequência definida em (2.22) é denominada sequência de Picard para o problema

 y 0 = f (x, y)
(2.23)
 y(x ) = y .
0 0

Para demonstrar a existência de solução para o problema (2.23), é necessário


mostrar que a sequência (2.22) converge uniformemente a função y = y(x), ∀ x ∈
[x0 − r, x0 + r], além disso a função y é solução de (2.23).
Com efeito, sejam f : Ω ⊂ R2 −→ R, Ω aberto e (x0 , y0 ) ∈ Ω. Suponha que f e
∂f
são contı́nuas em Ω. Considere r e Q como no Lema (2.3). Seja K segundo o Lema
∂y
(2.2). Buscando mostrar que a sequência de Picard (2.22) converge uniformemente em
[x0 − r, x0 + r], considera-se a série

+∞
X
y0 + [yn (x) − yn−1 (x)]. (2.24)
n=1
Tem-se que, para todo n ≥ 1,
n
X
yn (x) = y0 + [yk (x) − yk−1 (x)].
k=1

Assim, a sequência (2.22) será uniformemente convergente no intervalo [x0 −r, x0 +


r], caso a série (2.24) também seja (Guidorizzi, 2000).
Para isso, precisa-se provar que
+∞
X
[yn (x) − yn−1 (x)], (2.25)
n=1

20
é uniformemente convergente no intervalo [x0 − r, x0 + r].
De fato, considere M como o valor máximo de

| y1 (x) − y0 (x) |,

em [x0 − r, x0 + r]. Como y1 e y0 são contı́nuas fica garantida a existência desse máximo.
Assim, pode-se dizer que

| y1 (s) − y0 (s) |≤ M ∀ s ∈ [x0 − r, x0 + r]. (2.26)

Do Lema (2.2) tem-se

| f (x, yn (s)) − f (x, yn−1 (s)) |≤ K | yn (s) − yn−1 (s) |, (2.27)

para todo s ∈ [x0 − r, x0 + r].


Tendo
Zx
y2 (x) − y1 (x) = [f (s, y1 (s)) − f (s, y0 (s))]ds,
x0
segue que,
x
Z

| y2 (x) − y1 (x) | = [f (s, y1 (s)) − f (s, y0 (s))]ds

x0
Zx
≤ | f (s, y1 (s)) − f (s, y0 (s)) | ds,
x0

para todo x ∈ [x0 − r, x0 + r]. De (2.27),


x
Z

| y2 (x) − y1 (x) |≤ K | y1 (s) − y0 (s) | ds ,

x0

logo, por meio de (2.26) chega-se em

| y2 (x) − y1 (x) |≤ M K | x − x0 |, ∀x ∈ [x0 − r, x0 + r]. (2.28)

Tendo
Zx
y3 (x) − y2 (x) = [f (s, y2 (s)) − f (s, y1 (s))]ds,
x0

21
encontra-se,
x
Z

| y3 (x) − y2 (x) |≤ K | y2 (s) − y1 (s) | ds , ∀x ∈ [x0 − r, x0 + r].

x0

De (2.28), x
Z

| y3 (x) − y2 (x) |≤ KM K | s − x0 | ds


x0
x
Z

2

≤ M K | s − x0 | ds .

x0

Resolvendo a integral, chega-se em

| x − x0 |2
| y3 (x) − y2 (x) |≤ M K 2 ∀ x ∈ [x0 − r, x0 + r].
2

Continuando com o raciocı́nio, conclui-se que

| x − x0 |n−1
| yn (x) − yn−1 (x) |≤ M K n−1 ∀x0 − r ≤ x ≤ x0 + r.
(n − 1)!

Como no intervalo considerado | x − x0 |≤ r, encontrando

(Kr)n−1
| yn (x) − yn−1 (x) |≤ M ,
(n − 1)!

para todo n ≥ 1 e para todo x0 − r ≤ x ≤ x0 + r. A série numérica


+∞
X (Kr)n−1
,
n=1
(n − 1)!

é convergente, dessa forma pode-se dizer pelo teste de Weierstrass (Lima, 1976), que a
série
+∞
X
[yn (x) − yn−1 (x)],
n=1

é uniformemente convergente no intervalo [x0 − r, x0 + r].


Resulta que a sequência de Picard
Zx
yn (x) = y0 + f (s, yn−1 (s))ds, (2.29)
x0

22
converge uniformemente em [x0 − r, x0 + r].
Considere y = y(x), com x ∈ [x0 − r, x0 + r], dada por

y(x) = lim yn (x). (2.30)


n→∞

Para concluir basta demonstrar que


Zx
y(x) = y0 + f (s, y(s))ds, ∀x ∈ [x0 − r, x0 + r].
x0

De (2.29),
Zx
lim yn (x) = y0 + lim f (s, yn−1 (s))ds,
n→∞ n→∞
x0

logo,
Zx
y(x) = y0 + lim f (s, yn−1 (s))ds. (2.31)
n→∞
x0

Para permutar os sı́mbolos


Zx
lim e ,
n→∞
x0

é necessário mostrar a convergência uniforme da sequência

f (s, yn−1 (s)), n≥1

em [x0 − r, x0 + r]. O gráfico da função (2.30), y = y(x), com x ∈ [x0 − r, x0 + r] está


contido no retângulo Q, pois como yn (x) ∈ [y0 − b, y0 + b], para todo n natural e para todo
x ∈ [x0 − r, x0 + r], lembrando-se que y(x) é o limite de yn (x) quando n tende ao infinito.
Assim, de (2.27), tem-se

| f (x, yn−1 (s)) − f (x, y(s)) |≤ K | yn−1 (s) − y(s) |,

para todo n ≥ 1 e para todo s no intervalo [x0 − r, x0 + r]. A convergência uniforme


de f (x, yn−1 (s)) a f (x, y(s)) fica garantida pela convergência uniforme de yn−1 (s) a y(s).
Assim, a Eq. (2.31) se torna
Zx
y(x) = y0 + [ lim f (s, yn−1 (s))]ds.
n→∞
x0

23
Sabendo que
lim f (s, yn−1 (s)) = f (s, y(s)).
n→∞

Conclui-se
Zx
y(x) = y0 + f (s, y(s))ds ∀x ∈ [x0 − r, x0 + r]. (2.32)
x0

Pelo Lema (2.1) sabe-se que y = y(x) da forma (2.32), com x ∈ [x0 − r, x0 + r], é solução
da equação
y 0 = f (x, y),

e satisfaz a condição inicial y(x0 ) = y0 .

Teorema 2.3 (Teorema da Unicidade). Seja f : Ω ⊂ R2 −→ R, Ω aberto, e seja (x0 , y0 ) ∈


∂f
Ω. Supondo que f e contı́nuas em Ω. Então existe uma única solução para o problema
∂y
de valor inicial
 dy = f (x, y)

dx (2.33)
 y(x ) = y .
0 0

Demonstração. Sejam
y1 = y1 (x), x∈I

e
y2 = y2 (x), x∈J

onde I e J são intervalos abertos contendo x0 , duas soluções da equação

y 0 = f (x, y),

e tais que
y1 (x0 ) = y2 (x0 ) = y0 .

Querendo mostrar que existe um d > 0 tal que

y1 (x) = y2 (x) em [x0 − d, x0 + d].

Seja Q o retângulo dado por

Q = {(x, y) | x0 − a ≤ x ≤ x0 + a, y0 − b ≤ y ≤ y0 + b},

24
da continuidade de y1 e y2 segue que existe d1 > 0, com d1 ≤ a, tal que

(x, y1 (x)) e (x, y2 (x)),

pertencem ao retângulo Q, para todo x no intervalo [x0 − d1 , x0 + d1 ]. Pelo Lema (2.2),


tem-se que existe um K > 0 tal que

| f (x, y1 (s)) − f (x, y2 (s)) |≤ K | y1 (s) − y2 (s) |, (2.34)

para todo s ∈ [x0 − d1 , x0 + d1 ].


Considere d > 0 tal que

d ≤ d1 e Kd < 1. (2.35)

Como y1 = y1 (x) e y2 = y2 (x) são soluções do problema de valor inicial (2.33), então
y1 (x0 ) = y2 (x0 ) = y0 . Além disso, pelo Lema (2.1)
Zx
y1 (x) = y0 + f (s, y1 (s))ds (2.36)
x0

e
Zx
y2 (x) = y0 + f (s, y2 (s))ds, ∀ x ∈ [x0 − d, x0 + d]. (2.37)
x0

Fazendo a diferença das Eqs. (2.36) e (2.37), tem-se


Zx
y1 (x) − y2 (x) = [f (s, y1 (s)) − f (s, y2 (s))]ds. (2.38)
x0

Aplicando módulo na Eq. (2.38), obtém-se


x
Z

| y1 (x) − y2 (x) |= [f (s, y1 (s)) − f (s, y2 (s))]ds ,
(2.39)

x0

para todo x ∈ [x0 − d, x0 + d]. Sabendo que


x
Z Zx

[f (s, y1 (s)) − f (s, y2 (s))]ds ≤ | [f (s, y1 (s)) − f (s, y2 (s))] | ds ≤


x0 x0

25
x
Z

≤ | [f (s, y1 (s)) − f (s, y2 (s))] | ds
∀ x ∈ [x0 − d, x0 + d].

x0
Assim, x
Z

| y1 (x) − y2 (x) |≤ | [f (s, y1 (s)) − f (s, y2 (s))]ds | . (2.40)

x0

Das equações (2.34) e (2.40) tem-se


x
Z

| y1 (x) − y2 (x) |≤ K | y1 (s) − y2 (s) | ds . (2.41)

x0

Considere agora,

M1 = max{| y1 (x) − y2 (x) || x ∈ [x0 − d, x0 + d]}.

Assim,
| y1 (s) − y2 (s) |≤ M1 ∀s ∈ [x0 − d, x0 + d]. (2.42)

De (2.41) e (2.42),
| y1 (x) − y2 (x) |≤ KM1 | x − x0 |,

e, portanto,
| y1 (x) − y2 (x) |≤ KM1 d ∀x ∈ [x0 − d, x0 + d].

Logo,
M1 ≤ KdM1 ,

pois M1 é o máximo de | y1 (x) − y2 (x) | em [x0 − d, x0 + d].


Se M1 6= 0, resulta
1 ≤ Kd,

isso é um absurdo, visto que foi considerado que Kd < 1, consequentemente M1 = 0.


Logo,
| y1 (x) − y2 (x) |= 0,

em [x0 − d, x0 + d]. E, portanto,


y1 (x) = y2 (x),

neste intervalo.

26
Já para o último questionamento pode-se dizer que determinar uma solução de
uma equação diferencial é algo ”similar”ao cálculo de uma integral e sabe-se que há
integrais que não possuem primitivas, como por exemplo as integrais elı́pticas. Assim,
não é de esperar que todas as equações diferenciais possuam soluções explı́citas.
Vale destacar que este tópico de EDO foi estudado durante o projeto de iniciação
cientı́fica, Métodos Numéricos Aplicados na Engenharia, com a orientação do professor
Jarbas Alves Fernandes.
Na seção 2.6 estudou-se o problema da propagação da podridão em maçãs. Para
este fim, na próxima seção será estudada de forma sucinta a equação logı́stica contı́nua.

2.5 Equação Logı́stica Contı́nua


A equação logı́stica contı́nua possui um grande importância, pois modela diver-
sos problemas do cotidiano, como por exemplo a propagação da podridão em maçãs e na
dinâmica populacional. Sendo assim, tal formulação auxilia na resolução de tais proble-
mas, fazendo com que os mesmo sejam solucionados de maneira mais fácil e eficiente. A
equação logı́stica contı́nua é formulado da seguinte forma

 dy = ay(k − y)

dx (2.43)
 y(0) = y .
0

Rescrevendo a Eq. (2.43) tem-se

y 0 = aky − ay 2 . (2.44)

Claramente a Eq. (2.44) pertence à classe de equações diferenciais de Bernoulli 1 , que é


dada pela Eq. (2.45),

y 0 + p(x)y = q(x)y n , (2.45)

em que p(x) = −ak, q(x) = −a e n = 2.


1
A solução da equação de Bernoulli pode ser encontrada em (Guidorizzi, 2000)

27
Para obter uma solução da EDO de Bernoulli, multiplica-se a Eq. (2.45) por
(1 − n)y −n , o que resulta em

(1 − n)y −n y 0 + (1 − n)y 1−n p(x) = q(x)(1 − n).

Adotando

v(x) = y 1−n . (2.46)

Derivando implicitamente a Eq. (2.46) em relação x, obtém-se

v 0 = (1 − n)y −n y 0 . (2.47)

Fazendo p(x) = −ak, q(x) = −a e n = 2, tem-se

v 0 + akv = a. (2.48)

Resolvendo a EDO pelo método do fator integrante 2 , tem-se que


eakx /k + c eakx + kc
v= = .
eakx keakx
Sabendo que v = y 1−n = y 1−2 = y −1 , a solução da Eq. (2.43) é dada por
keakx
y= .
eakx + c
k
Encontrando a solução particular do PVI, tem-se que c = y0
− 1, logo
k
y= . (2.49)
1+ ( yk0 − 1)e−akx
Pode ser observado que na solução (2.49) da Eq. (2.43) tem-se

lim y(x) = k e lim y(x) = y0 , (2.50)


x−→+∞ x−→0

ou seja, quando x cresce muito então a variável y(x) tende a y = k e, para x = 0, tem-se
a condição inicial y(0) = y0 .
A seguir será apresentado um aplicação de EDOs em situações comuns do coti-
diano. Mais preciso, será abordado o problema da propagação da podridão em maçãs.
Cabe destacar que este problema foi inicialmente proposto no artigo (Bassanezi and Ju-
nior, 2005). Neste trabalho segue-se a formulação e solução apresentada em (Bassanezi
and Junior, 2005).
2
O método do fator integrante para EDO de primeira ordem pode ser encontrado em (Boyce and
DIPRIMA, 2010; Guidorizzi, 2000)

28
2.5.1 Propagação da Podridão em Maçãs

Segundo Bassanezi (2015), o armazenamento de maçãs normalmente é realizado


em câmaras frigorı́ficas, onde são depositadas em caixas de madeiras sobrepostas que
comportam cerca de 3000 frutas. Quando ocorre a contaminação de alguma maçã com a
podridão, a doença consegue se propagar de maneira rápida contaminado as frutas que
estão ao seu redor. Algumas estimativas afirmam que em cerca de 12 dias aproximada-
mente oitenta porcento das maçãs estarão contaminadas, comprometendo todo o estoque.
Veja a Fig. 2.2. A modelagem matemática, nesse problema, visa analisar a dinâmica da
propagação da doença.

Figura 2.2: Propagação da Podridão em Maçãs

Para realizar o estudo de tal problema serão considerado alguns dados e variáveis
importantes, sendo eles

1. M = M (t) é a quantidade de maçãs contaminadas no instante t;

2. t= tempo de propagação (dias);

3. T = quantidade total de maçãs em um bin ∼


= 3000 frutas;

4. Se o processo de dispersão da doença se inicia com uma maçã, então M0 = M (0) = 1


(condição inicial);

29
5. Quando a doença se inicia com uma fruta contaminada, então em 12 dias, oitenta
porcento das maçãs do bin estarão podres, isto é, M (12) = 0, 8T .

Hipótese: ”A velocidade de propagação da doença é proporcional à proximidade entre


maçãs sadias e contaminadas”.
Usando o modelo contı́nuo para a variação populacional, deve-se representar tal
variação por derivada, ou seja,

dM
= M0
dt
que representa a velocidade de propagação.
Como a quantidade total de maçãs T é constante, então tem-se que a população
de frutas sadias S(t) é dada por S(t) = T − M (t). Para modelar o encontro entre frutas
contaminadas e sadias, pode-se usar a seguinte expressão matemática

E = M S = M (T − M ).

Das hipóteses formuladas acima, tem-se o seguinte modelo matemático para pro-
pagação da epidemia da podridão da maçã

dS
= −βSM


 dt


dM (2.51)
= βSM


 dt
 M (0) = 1 e S + M = T,

onde β é taxa de contaminação.


O sistema (2.51) pode ainda ser reduzido a um problema de valor inicial com
apenas uma equação diferencial, tendo que S = T − M ,

 dM = βM (T − M )

dt (2.52)
 M (0) = 1.

Tem-se que o modelo (2.52) descrito é uma equação logı́stica contı́nua cuja solução foi
obtida na seção 2.5. Assim, a quantidade de maçãs contaminadas no instante t é

KT eβT t
M (t) = . (2.53)
1 + KeβT t

30
Agora, levando em consideração a condição inicial M0 = M (0) = 1, pode-se obter o valor
da constante arbitrária K. De fato,

1 1
M (0) = 1 =⇒ 1 + K = KT =⇒ K = ' ' 0, 00033.
T −1 T

Como uma consequência a solução particular é dada por

eβT t T eβT t T
M (t) = 1 βT t = = . (2.54)
1+ Te T + eβT t T e−βT t + 1

Usando a estimativa que em 12 dias aproximadamente oitenta porcento das maçãs são
contaminadas, isto é, M (12) = 0, 8T , e a taxa de contaminação β. Com efeito, usando
(2.54), tem-se
T
0, 8T = =⇒ 0, 8e−12βT = 0, 2.
T e−12βT +1
Aplicando o logaritmo, obtém-se
 1  1  1 
−12βT = ln =⇒ β = − ln ' 0, 000261.
4T 12T 4T

Portanto, a equação determinı́stica que permite fazer previsões de maçãs contaminas em


cada instante é

3000
M (t) = . (2.55)
3000e−0,783t + 1

Ademais, pode-se ainda obter a previsão do tempo t necessário para cada por-
centagem p de frutas contaminadas. Para isso, deve-se ter t em função de M (t) = pT ,
substituindo este valor na equação de M (t), obtém-se

T 1−p
pT = =⇒ pT e−βT t + p = 1 =⇒ e−βT t = .
T e−βT t + 1 pT

Aplicando o logaritmo natural em ambos os membros da última equação acima, obtém-se


1 − p
−βT t = ln .
pT

Logo,
1 1 − p
t=− ln .
βT pT

31
1 1
Sabe-se que o valor de β = − 12T ln 4T . Daı́, o tempo t necessário para cada porcentagem
p de frutas contaminadas é dado por

12 1 − p
t= ln com 0 < p < 1. (2.56)
ln1/4T pT

Na Fig. 2.3 pode-se analisar o comportamento da propagação da podridão em


maçãs, a medida que o tempo vai passando, todas as maçãs são contaminadas pela doença.
Por exemplo, se desejar o tempo necessário para que metade das maçãs estejam conta-
minadas, basta tomar p = 0, 5. Dessa forma, quando se tem 3000 maçãs metade estará
contaminada quando

Figura 2.3: Gráfico do Comportamento da Propagação da Podridão em Maçãs

12  1 
t= ln = (−1, 277) ∗ (−8, 006) = 10, 224dias.
ln1/4T 0, 5T

32
Capı́tulo 3

Soluções para EDOs por Série

Existem diversos métodos analı́ticos para solução de EDO, mas muito deles são
restritos. Muitos acabam falhando ou produzindo uma solução muito complexa para
ser facilmente manipulada. Quando isso acontece, uma alternativa para solucionar o
problema de maneira mais simples pode ser por meio das séries de potência, ao longo
deste capı́tulo será abordado tal método para solução de EDO. Cabe destacar que este
capı́tulo é inspirado nas seguintes referências (Kreyzig, 2009; Oliveira, 2010).

3.1 Método das Séries de Potências para Solução de


EDO
O método das séries de potências é definido como sendo o método-padrão de
resolução de EDOs lineares com coeficientes variáveis. Este método fornece solução na
forma de série de potência. Desta forma, ela pode ser utilizada para o cálculo de valores,
obtenção do gráfico de curvas e exploração de propriedades da solução. A seguir será
abordada uma visão geral do método das séries de potências para EDOs.

33
3.1.1 A Ideia do Método das Séries de Potências

A ideia do método das séries de potências para resolver as EDOs é simples e


natural. Dada EDO de segunda ordem, isto é,

y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = 0, (3.1)

em que p e q são representados através de séries de potências em torno de x0 = 0. Supõe-


se que exista uma solução y com coeficientes desconhecidos na forma de uma série de
potências em torno de x0 = 0, isto é,

X
y= am xm = a0 + a1 x + a2 x2 + a3 x3 + ... (3.2)
m=0

Derivando termo a termo a equação (3.2), tem-se



X
0
y = mam xm−1 = a1 + 2a2 x + 3a3 x2 + ... (3.3)
m=1

Agora pela derivação termo a termo da equação (3.3), obtém- se a segunda derivada da
função y que é expressada por

X
y 00 = m(m − 1)am xm−2 = 2a2 + 6a3 x + 12a4 x2 ... (3.4)
m=2

Substituindo-se as Eqs. (3.2), (3.3) e (3.4) na EDO (3.1), tem-se



X ∞
X ∞
X
m(m − 1)am xm−2 + p(x) mam xm−1 + q(x) am xm = 0, (3.5)
m=2 m=1 m=1

onde p e q podem ser representados em série de potências em torno de x0 = 0.


Em seguida, as potências de mesma ordem de x são agrupadas e iguala-se a zero
a soma dos coeficientes de cada potência observada de x. O procedimento é iniciado
com os termos constantes, em seguida os termos em x, x2 , e assim por diante. Através
de tal procedimento serão obtidas equações que fornecerão sucessivamente os coeficientes
desconhecidos da solução y, dada pela Eq. (3.2). Para fixar esses conceito, o exemplo a
seguir descreve a ideia do método de séries de potências mencionado acima.

34
Exemplo 3.1. Dada a EDO

y 0 = 2xy. (3.6)

Será usado o método método das séries de potências para encontra uma solução em torno
de x0 = 0. Com efeito, para solucionar este problema, usando primeiramente as Eqs.
(3.2) e (3.3) na EDO definida em (3.6). Assim, tem-se a seguinte igualdade

a1 + 2a2 x + 3a3 x2 + ... = 2x(a0 + a1 x + a2 x2 + a3 x3 + ...).

Agora, aplicando a propriedade distributiva, obtém- se

a1 + 2a2 x + 3a3 x2 + 4a4 x3 + 5a5 x4 + 6a6 x5 + ... = 2a0 x + 2a1 x2 + 2a2 x3 + 2a3 x4 + 2a4 x5 + ...

Note que a igualdade acima é válida se os coeficientes da mesma potência de x são iguais.
Como uma consequência,

a1 = 0, 2a2 = 2a0 , 3a3 = 2a1 , 4a4 = 2a2 , 5a5 = 2a3 , 6a6 = 2a4 , ...

Como uma consequência, se n é impar, tem-se an = 0. Por ouro lado, os coeficientes


ı́ndices pares são dados por
a2 a0 a4 a0
a2 = a0 , a4 = = , a6 = = , ...,
2 2! 3 3!
em que ao é qualquer número real. Desta maneira, a solução y por meio do método da
série de potência para a Eq. (3.2) é
x4 x6 x8 2
y = a0 (1 + x2 + + + + ...) = a0 ex .
2! 3! 4!
As próximas seções serão dedicadas a formalizar o método das séries de potências
para solução de EDOs.

3.2 Classificação de pontos singulares de equações li-


neares homogêneas
Nesta seção, o método de séries de potências será brevemente formalizado e algu-
mas definições importantes serão apresentadas. O leitor interessado em todo formalismo
matemático pode consultar (Boyce and DIPRIMA, 2010; Oliveira, 2010; Kreyzig, 2009).

35
3.2.1 Pontos ordinários e singular

Considere a EDO de segunda ordem

y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = 0. (3.7)

Oliveira (2010) afirma que o ponto x0 é um ponto ordinário da Eq. (3.1) se as funções
p(x) e q(x) forem analı́ticas em x0 , ou seja, se é possı́vel as representações

X
p(x) = pm (x − x0 )m , |x − x0 | < R1 , (3.8)
m=0

e

X
q(x) = qm (x − x0 )m , |x − x0 | < R2 , (3.9)
m=0

com R1 e R2 números positivos, caso contrário x0 é dito ponto singular da Eq. (3.1).

3.2.2 Ponto Singular Regular e Irregular

O ponto x0 é dito singular regular da Eq. (3.1) quando pelo menos uma das
funções p(x) e q(x) não é analı́tica em x0 , mas são analı́ticas as funções

p̃(x) = (x − x0 )p(x) (3.10)

q̃(x) = (x − x0 )2 q(x). (3.11)

Pode-se reescrever a Eq. (3.1) em termos de p̃(x) e q̃(x), encontrando

(x − x0 )2 y 00 + (x − x0 )p̃(x)y 0 + q̃(x)y = 0, (3.12)

onde p̃(x) e q̃(x) são funções analı́ticas em x0 . Por outro lado, um ponto singular irregular
é todo o ponto singular da Eq. (3.1) que não é um ponto singular regular.

36
3.2.3 Existência de Soluções das EDOs em Séries de Potências

Uma grande questão é saber se as EDOs podem ter soluções em forma de séries
de potências. Uma resposta simples é que se os coeficientes p e q e a função r do lado
direito da Eq.(3.13) possuı́rem representação em séries de potências, então a Eq. (3.13)
possui soluções em série de potências.

y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = r(x). (3.13)

Pode-se realizar a mesma verificação para na equação abaixo

h̃(x)y 00 + p̃(x)y 0 + q̃(x)y = r̃(x), (3.14)

se h̃, p̃, q̃, r̃ possuı́rem representação em séries de potências e h̃(x0 ) 6= 0.Tem-se que na
maioria dos casos os coeficientes das EDOs são polinômios, ou seja, séries de potências
com número finito de termos, de modo que as condições serão satisfeitas, quando r(x)
for também uma série de potência. Caso h̃ 6= 0, então a divisão da Eq. (3.14) por h̃(x)
resulta a Eq. (3.13) com p = p̃/h̃, q = q̃/h̃, r = r̃/h̃. Isto motiva o uso da notação da Eq.
(3.14). O próximo teorema apresenta a resposta do questionamento inicial.

Teorema 3.1 (Existência de Soluções por Séries de Potências). Se, em (3.13), p, q e r


forem analı́ticas em x = x0 , então toda solução da Eq. (3.13) é analı́tica em x = x0 ,
podendo então ser representada por meio de uma série de potência de em x − x0 , com um
raio de convergência R > 0. Logo, o mesmo se verifica se, em (3.14), h̃,p̃,q̃ e r̃ forem
analı́ticas em x = x0 e h̃ 6= 0.

A demonstração deste teorema pode ser encontrada em (Boyce and DIPRIMA,


2010; Ince, 1956).

3.3 Equação de Legendre e Polinômios de Legendre


De acordo com Rooney (2012), Adrien Marie Legendre nasceu em Toulouse em
18 de setembro de 1752, e morreu em Paris em 10 de janeiro de 1833. Pertenceu a uma
geração de grandes matemáticos a exemplo de Lagrange [1736-1813], Laplace [1749-1827]

37
e Gauss [1777-1855]. É conhecido pela transformação de Legendre, que é usada para ir da
Lagrangiana à formulação hamiltoniana na mecânica clássica. Ele também é o nominador
dos polinômios de Legendre, as soluções da equação diferencial de Legendre, que ocorrem
com freqüência na fı́sica e em aplicações de engenharia, como por exemplo na eletrostática.
Ele foi educado no Colégio Mazarin, uma das escolas mais avançadas do século XVII, em
Paris, durante cinco anos, de 1775 a 1780, trabalhou junto com Laplace, quando ambos
lecionavam na École Militaire de Paris.
A equação de Legendre é um equação dada por

(1 − x2 )y 00 − 2xy 0 + n(n + 1)y = 0 (3.15)

onde n é uma constante dada.


A equação de Legendre é uma equação de grande importância, pois surge em
diversos problemas. Tem-se que qualquer solução da Eq. (3.15) é denominada de função
de Legendre.
Se realizar a divisão da Eq. (3.15) pelo coeficiente 1 − x2 é possı́vel notar que os
coeficientes −2x/(1 − x2 ) e n(n + 1)/(1 − x2 ) da nova equação são analı́ticos em x = 0.
Portanto, pelo Teorema 1 tem-se que a equação de Legendre possui soluções em séries de
potências da forma

X
y= am x m . (3.16)
m=0

Substituindo a Eq. (3.16) e suas derivadas na Eq. (3.15) e denominado que a


constante k é igual a n(n + 1), obtém-se

X ∞
X ∞
X
2 m−2 m−1
(1 − x ) m(m − 1)am x − 2x mam x +k am xm = 0.
m=2 m=1 m=0

Daı́,

X ∞
X ∞
X ∞
X
m(m − 1)am xm−2 − m(m − 1)am xm − 2mam xm + kam xm = 0.
m=2 m=2 m=1 m=0
s
Para obter-se a mesma potência x em toda a equação, faz-se m − 2 = s na primeira série
e nas demais simplesmente substitui-se m por s, assim

X ∞
X ∞
X ∞
X
s s s
(s + 2)(s + 1)as+2 x − s(s − 1)as x − 2sas x + kas xs = 0.
s=0 s=2 s=1 s=0

38
Pode ser notado na primeira série que o somatório começa com s = 0. Tem-se
também que essa equação com o lado direito nulo deve ser uma identidade em x se a
Eq. (3.16) for uma solução da Eq. (3.15). Dessa forma, a soma dos coeficientes de cada
potência de x no lado esquerdo deve ser igual a zero, nota-se que x0 ocorre na primeira e
última série, daı́ tem-se

2 · 1a2 + ka0 = 0.

Logo,

2 · 1a2 + n(n + 1)a0 = 0. (3.17)

x1 ocorre na primeira, terceira e quarta séries, o que fornece

3 · 2a3 + [−2 + n(n + 1)]a1 = 0. (3.18)

As potências superiores x2 , x3 , ... ocorrem em todas as quatro séries, daı́

(s + 2)(s + 1)as+2 + [−s(s − 1) − 2s + n(n + 1)]as = 0.

Logo,

(s + 2)(s + 1)as+2 + [(n − s)(n + s + 1)]as = 0. (3.19)

Resolvendo a Eqs. (3.17) para a2 , (3.18) para a3 e (3.19) para as+2 , obtém-se a
fórmula geral

(n − s)(n + s + 1)
as+2 = − as . (3.20)
(s + 2)(s + 1)

onde s = 0, 1, 2...
A Eq. (3.20) é denominada de relação de recorrência ou fórmula de recursão.
Encontra-se sucessivamente

n(n + 1)
a2 = − a0
2!

(n − 1)(n + 2)
a3 = − a1
3!

39
(n − 2)(n + 3) (n − 2)n(n + 1)(n + 3)
a4 = − a2 = − a0
4.3 4!

(n − 3)(n + 4) (n − 3)(n − 1)(n + 2)(n + 4)


a5 = − a3 = − a1
5.4 5!

e assim por diante.


Se forem inseridas na Eq. (3.16) as expressões desses coeficientes obtém-se

y(x) = a0 y1 (x) + a1 y2 (x) (3.21)

onde tem-se que

n(n + 1) 2 (n − 2)n(n + 1)(n + 3) 4


y1 (x) = 1 − x + x − ... (3.22)
2! 4!

(n − 1)(n + 2) 3 (n − 3)(n − 1)(n + 2)(n + 4) 5


y2 (x) = x − x + x − ... (3.23)
3! 5!

Essas séries convergem para |x| < 1. Como a Eq. (3.22) contém apenas potências
pares e a Eq. (3.23) contêm potências impares de x tem-se que a razão de y1 /y2 não é
igual a uma constante, pois y1 e y2 não são proporcionais, sendo soluções linearmente
independentes entre si.

3.3.1 Polinômios de Legendre

Na maioria das aplicações as soluções das EDOs por série de potências são re-
duzidas a polinômios. Tem-se que para a equação de Legendre isso acontece quando o
parâmetro n é um inteiro não-negativo, pois o lado direito da Eq.(3.20) é nulo para s = n,
dai an+2 = 0, an+4 = 0, an+6 = 0, ... Portanto,se n for par y1 (x) se reduz a um polinômio
de grau n, e se for ı́mpar o mesmo ocorre para y2 (x). O polinômio de Lengendre (Pn (x))
é o nome dado a esses polinômios multiplicados por algumas constantes. Para escolher a
constante escolhe-se o coeficiente an da maior potência xn como

(2n)! 1.3.5...(2n − 1)
an = n 2
= , (3.24)
2 (n!) n!

40
onde n e um inteiro positivo e an = 1 se n = 0.
Então, calcula-se os outros coeficientes a partir da Eq. (3.20), que é resolvida
para as em termos de as+2 , logo

(s + 2)(s + 1)
as = − as+2 , (3.25)
(n − s)(n + s + 1)

onde s 5 n − 2.
A escolha da Eq. (3.24) faz Pn (1) = 1 para todo n, da Eq. (3.25) com s = n − 2
e a Eq. (3.24), obtém-se

n(n − 1) n(n − 1)(2n)!


an−2 = − an = − .
2(2n − 1) 2(2n − 1)2n (n!)2

Usando (2n)! = 2n(2n − 1)(2n − 2)!, n! = n(n − 1)!, e n! = n(n − 1)(n − 2)!,
obtém-se

n(n − 1)2n(2n − 1)(2n − 2)!


an−2 = −
2(2n − 1)2n n(n − 1)!n(n − 1)(n − 2)!

n(n − 1)2n(2n − 1) se cancela, daı́

(2n − 2)!
an−2 = − .
2n (n − 1)!(n − 2)!

Da mesma forma,

(n − 2)(n − 3) (2n − 4)!


an−4 = − an−2 = n ,
4(2n − 3) 2 2!(n − 2)!(n − 4)!

e assim por diante. De forma geral, quando n − 2n = 0

(2n − 2m)!
an−2m = (−1)m . (3.26)
2n m!(n − m)!(n − 2m)!

A solução da Eq. (3.15) é denominada de polinômio de Legendre de grau n. Da


Eq.(3.26), obtém-se
M
X (2n − 2m)!
Pn (x) = (−1)m nn−2m (3.27)
m=0
2n m!(n − m)!(n − 2m)!
(2n)! n (2n − 2)!
= n 2
x − n xn − 2+ ...,
2 (n!) 2 1!(n − 1)!(n − 2)!

onde M = n/2 ou (n − 1)/2, é número inteiro.

41
3.4 Método de Frobenius
Ferdinand Georg Frobenius foi Matemático e autor alemão nascido em Charlot-
tenburg, distrito de Berlim, Prússia, hoje Berlim, Alemanha, destaque no desenvolvimento
da teoria dos grupos, seus trabalhos versaram sobre a teoria algébrica dos grupos finitos
e sobre a sistematização da álgebra à luz axiomática e a lógica matemática . De uma
famı́lia de protestantes, era filho do pároco Christian Ferdinand Frobenius e de Christine
Elizabeth Friedrich, foi educado no Joachimsthal Gymnasium (1860-1867) (Escola).
O Teorema 3.2 pode ser visto como uma extensão do método de séries de potências,
chamado de Método de Frobenius. Este método tem sido útil nas soluções de EDOs devido
a sua utilização em programas de computadores.

Teorema 3.2 (Método de Frobenius). Considerando que b(x) e c(x) sejam funções
analı́ticas em x = 0, então tem-se que a EDO

b(x) 0 c(x)
y 00 + y + 2 y=0 (3.28)
x x
possui pelo menos uma solução que pode ser representada na forma

X
r
y(x) = x am xm = xr (a0 + a1 x + a2 x2 + ...) (3.29)
m=0

sendo que r pode ser qualquer número (real ou complexo) escolhido de forma que a0 6= 0.

A EDO (3.28) possui também uma segunda solução similar a Eq. (3.29), sendo
que essas duas soluções são linearmente independentes e a segunda solução possui valores
diferentes para r e para os coeficientes, ou ainda pode conter um termo logarı́tmico.
Na prática, para usar o método de Frobenius, é necessário determinar o ı́ndice r
e os coeficientes am . Estes valores podem ser obtidos como segue. Multiplicado-se a Eq.
(3.28) por x2 , chega-se a forma

x2 y 00 + xb(x)y 0 + c(x)y = 0. (3.30)

Expandindo inicialmente b = b(x) e c = c(x) em série de potências, tem-se

b(x) = b0 + b1 x + b2 x2 + ...

42
c(x) = c0 + c1 x + c2 x2 + ...

Então, derivando a Eq. (3.29) termo a termo, obtêm-se



X
0
y (x) = (m + r)am xm+r−1
m=0
= xr−1 [ra0 + (r + 1)a1 x + ...] (3.31)


X
00
y (x) = (m + r)(m + r − 1)am xm+r−2
m=0
r−2
= x [r(r − 1)a0 + (r + 1r)a1 x + ...]. (3.32)

Se forem inseridas todas essas séries acima na Eq. (3.30), encontra-se

xr [r(r − 1)a0 + (r + 1r)a1 x + ...] + (b0 + b1 x + ...)xr [ra0 + (r + 1)a1 x...]

+ (c0 + c1 x + ...)xr (a0 + a1 x + ...) = 0. (3.33)

Agrupando os termos da Eq. (3.33), obtém-se

xr [r(r − 1)a0 + b0 ra0 + c0 a0 ] + xr+1 [(r + 1)ra1 + (r + 1)a1 b1 + a1 c1 ] + ... = 0. (3.34)

Igualando a soma dos coeficientes de cada potência xr , xr+1 , xr+2 , ... a zero, encontra-se
um sistema de equações que envolvem os coeficientes desconhecidos am da Eq. (3.29).
Tem-se então a equação correspondente à potência xr sendo

[r(r − 1) + b0 r + c0 ]a0 = 0. (3.35)

Supondo que a0 6= 0, tem-se que a expressão da Eq.(3.35) deve ser igual a zero. O que
resulta em

r(r − 1) + b0 r + c0 = 0, (3.36)

sendo uma equação quadrática importante para a determinação do ı́ndice r da Eq. (3.29).
A Eq. (3.36) é referida como equação indicial da EDO (3.28).
Tem-se então que o método de Frobenius fornece uma base de soluções, no qual
uma das soluções possui a forma da Eq. (3.29), onde r será uma raiz da Eq. (3.36) e a
outra solução possuirá uma forma que é decorrente pela equação indicial. Dessa forma,
exitem três casos distintos, são eles

43
• Caso 1: Raı́zes distintas não se diferindo por números inteiros, isto é, se r1 e r2 são
raı́zes de 3.36, então não existe p inteiro tal que r1 = r2 + p;

• Caso 2: Uma raiz dupla;

• Caso 3: Raı́zes diferindo-se por números inteiros, ou seja, se r1 e r2 são raı́zes de


3.36, então existe p inteiro tal que r1 = r2 + p;;

Note que o caso 1 inclui raı́zes complexas, isto é, r1 = z1 + iz2 e r2 = z1 − iz2 ,

em que z1 , z2 ∈ R e i = −1. Com efeito, r1 − r2 = 2z2 i, logo não existe p inteiro tal que
r1 = r2 + p.
O próximo teorema estabelecerá uma base de soluções para Eq. 3.28, sem um te-
oria geral de convergência, porém em cada caso particular é possı́vel testar a convergência
das séries em questão (Kreyzig, 2009; Ince, 1956).

Teorema 3.3. Base de Soluções Considere que a EDO (3.28) satisfaça as condições
anteriores. As raı́zes da equação indicial (3.36) serão chamadas de r1 e r2 . Então tem-se
os seguintes possı́veis casos:
Caso 1. Raı́zes distintas não diferindo por um número inteiro: Uma base é
dada por
y1 (x) = xr1 (a0 + a1 x + a2 x2 + ...)

e
y2 (x) = xr2 (A0 + A1 x + A2 x2 + ...)

com os coeficientes obtidos sucessivamente da Eq. (3.34).


Caso 2. Raı́zes duplas: Uma base é dada por

y1 (x) = xr (a0 + a1 x + a2 x2 + ...) [r = 1/2(1 − b0 )]

e
y2 (x) = y1 (x)lnx + xr (A1 x + A2 x2 + ...).

Caso 3. Raı́zes diferenciando-se por um número inteiro: Uma base é

y1 (x) = xr1 (a0 + a1 x + a2 x2 + ...)

44
e
y2 (x) = ky1 (x)lnx + xr2 (A0 + A1 x + A2 x2 + ...),

onde as raı́zes são assim escritas de modo que se obtenha um resultado nulo.

Demonstração. Caso 1. Raı́zes distintas não diferindo por um inteiro Uma pri-
meira solução de (3.28) é da forma

y1 (x) = xr1 (a0 + a1 x + a2 x2 + ...)

e pode ser determinada como no método das séries de potências. Para uma demonstração
de que, nesse caso, a EDO (3.28) tem uma segunda solução independente, com a forma

y2 (x) = xr2 (A1 x + A2 x2 + ...),

pode-se consultar (Ince, 1956).


Caso 2. Raiz dupla A Eq. indicial (3.36) tem uma raiz dupla r se somente se
1
(b0 − 1)2 − 4c0 = 0, e com isso r = (1 − b0 ). Uma primeira solução
2

X 1
y1 (x) = am xm+r = xr (a0 + a1 x + a2 x2 + ...), r = (1 − b0 ), (3.37)
m=0
2

pode ser determinado como no Caso 1. Será mostrada uma segunda solução independente
que é dado na forma

y2 (x) = y1 lnx + xr (A1 x + A2 x2 + ...) (x > 0). (3.38)

Para isto, utilizando o método de redução de ordem 1 , será determinado u(x) de forma
que y2 (x) = u(x)y1 (x) seja uma solução da Eq. (3.28). Inserindo essa expressão e as
derivadas
y20 = u0 y1 + uy10 , y200 = u00 y1 + 2u0 y10 + uy100

na EDO (3.30), obtém-se

x2 (u00 y1 + 2u0 y10 + uy100 ) + xb(u0 y1 + uy10 ) + cuy1 = 0.


1
O método de solução de ordem pode ser encontrado em (Boyce and DIPRIMA, 2010; Kreyzig, 2009)

45
Segue que,
u(x2 y100 + xby10 + cy1 ) + x2 u00 y1 + 2x2 u0 y10 + xbu0 y1 = 0.

Como y1 é uma solução de (3.30), a soma dos termos envolvendo u vale zero, e essa
equação se reduz a
x2 y1 u00 + 2x2 y10 u0 + xby1 u0 = 0.

Dividindo por x2 y1 e inserindo a série de potências para b em torno de 0, tem-se


 y0 ∞
00 1X 
u + 2 +1
bm x u 0 = 0
m
y1 x m=0
 y0 ∞
b0 X 
u00 + 2 1+ + bm+1 xm u0 = 0. (3.39)
y1 x m=0

Agora, derivando a Eq. (3.37), obtém-se



X ∞
X ∞
X
y10 =x r−1
[r m
am x + m
mam x ] = x r−1
(r + m)am xm .
m=0 m=0 m=0

Logo,

y10 xr−1 [ra0 + (r + 1)a1 x + (r + 2)a2 x2 + ...]


= (3.40)
y1 xr [a0 + a1 x + a2 x2 + ...]
1  ra0 + (r + 1)a1 x + (r + 2)a2 x2 + ... 
= (3.41)
x a0 + a1 x + a2 x2 + ...
1 h r(a0 + a1 x + a2 x2 + ...) a1 x + 2a2 x2 + ... i
= + (3.42)
x a0 + a1 x + a2 x2 + ... a0 + a1 x + a2 x2 + ...
1h a1 x + 2a2 x2 + ... i
= r+ (3.43)
x a0 + a1 x + a2 x2 + ...
hr a1 + 2a2 x + ... i
= + . (3.44)
x a0 + a1 x + a2 x2 + ...

Portanto, pode-se escrever a Eq.(3.39) como


 2r + b ∞
00 0 a1 + 2a2 x + ... X 
u + +2 2
+ bm+1 x u0 = 0
m
(3.45)
x a0 + a1 x + a2 x + ... m=0

como r = (1 − b0 )/2, o termo (2r + b0 )/x vale 1/x, e, dividindo por u0 , tem-se então

u00 1 a1 + 2a2 x + ... X
m

=− +2 + bm+1 x .
u0 x a0 + a1 x + a2 x2 + ... m=0

46
Por integração, obtém-se
Z  ∞
0 a1 + 2a2 x + ... X
m

lnu = −lnx − 2 + b m+1 x dx. (3.46)
a0 + a1 x + a2 x2 + ... m=0

Então,
u0 = (1/x)e(I) ,
R a1 + 2a2 x + ... P∞ m

onde I = 2 + m=0 b m+1 x dx.
a0 + a1 x + a2 x2 + ...
Expandindo a função exponencial em potências de x e integrando novamente,
nota-se que u é da forma
u = lnx + k1 x + k2 x2 + ...

Inserindo isso em y2 = uy1 , obtém-se para y2 uma representação na forma da Eq. (3.38).
Caso 3. Raı́zes diferindo por um inteiro. Escrevendo r1 = r e r2 = r − p,
onde p é um inteiro positivo. Pode-se determinar uma primeira solução

y1 (x) = xr1 (a0 + a1 x + a2 x2 + ...) (3.47)

como nos casos anteriores. Será mostrado que uma segunda solução independente tem a
forma

y2 (x) = ky1 (x)lnx + xr2 (A0 + A1 x + A2 x2 + ...), (3.48)

onde pode-se ter k 6= 0 ou k = 0. Como no Caso 2, fazendo y2 = uy1 . Os primeiros passos


são literalmente os mesmos do Caso 2 e fornecem a equação, dada por
 2r + b ∞
00 0 a1 + 2a2 x + ... X 
u + +2 + b m+1 x m
u0 = 0. (3.49)
x a0 + a1 x + a2 x2 + ... m=0

Agora, pela álgebra elementar, o coeficiente b0 − 1 de r em (3.36) é igual ao negativo da


soma das raı́zes,
b0 − 1 = −(r1 + r2 ) = −(r + r − p) = −2r + p.

Dai,
2r + b0 = p + 1.

47
Fazendo a substituição da relação anterior na Eq. (3.49), tem-se

u00 p + 1 a1 + 2a2 x + ... X
m

= − + 2 + b m+1 x ,
u0 x a0 + a1 x + a2 x2 + ... m=0

a1 + 2a2 x + ... P∞ m
onde J = 2 + m=0 bm+1 x . Os passos subsequentes são como no
a0 + a1 x + a2 x2 + ...
caso 2. Integrando, encontra-se
Z
0
lnu = −(p + 1)lnx + Jdx.

Assim,
R
u0 = x−(p+1) e( Jdx)
.

Expandindo a função exponencial, obtém-se uma série da forma


1 k1 kp−1 kp
u0 = + + ... + 2 + + kp+1 + ...
xp+1 x p x x
Integrando mais uma vez. Escrevendo primeiro o termo logarı́tmico resultante, tem-se
1 kp−1
u = kp lnx + (− p
− ... − + kp+1 x + ...).
px x
Logo, de (3.47), tem-se para y2 = uy1 a fórmula
1
y2 = kp y1 lnx + xr1 −p (− − ... − kp−1 xp−1 + ...)(a0 + a1 x + ...).
p
Mas essa equação possui a forma da Eq. (3.48) com k = kp , visto que r1 − p = r2 e o
produto das duas séries envolve somente potências inteiras não-negativas de x.

Exemplo 3.2. Dada a EDO

(x2 − x)y 00 − gxy 0 + y = 0. (3.50)

Inserindo a Eq. 3.37 e suas derivadas na Eq. (3.50), obtém-se



X ∞
X ∞
X
2 m+r−2 m+r−1
(x − x) (m + r)(m + r − 1)am x −x (m + r)am x + am xm+r = 0.
m=0 m=0 m=0

Agora, simplificando a expressão e agrupando todos os termos de potência de xm+r , tem-se



X ∞
X
m+r
[(m + r)(m + r − 1) − (m + r) + 1]am x − (m + r)(m + r − 1)am xm+r−1 = 0.
m=0 m=0

48
Daı́,

X ∞
X
(m + r − 1)2 am xm + r − (m + r)(m + r − 1)am xm + r − 1 = 0.
m=0 m=0

Fazendo na primeira série m = s e na segunda m = s + 1, logo, s = m − 1. Então



X ∞
X
2 s+r
(s + r − 1) as x − (s + r + 1)(s + r)as+1 xs+r = 0. (3.51)
s=0 s=−1

A menor potência é xr−1 , fazendo s = −1 na segunda série que fornece a equação indicial

r(r − 1) = 0.

As raı́zes são r1 = 1 e r2 = 0. Elas se diferem por um número inteiro. Assim, pode-se


usar os resultados do caso 3. Da Eq. (3.51), com r = r1 = 1, tem-se

X
[s2 as − (s + 2)(s + 1)as+1 ]xs+1 = 0. (3.52)
s=0

Isso resulta na seguinte equação

s2
as+1 = .
(s + 2)(s + 1)as

Logo, a1 = 0, a2 = 0, .... Fazendo a0 = 1, tem-se como primeira solução y1 = xr1 a0 = x.


Aplicando a redução de ordem, tem-se

y2 = y1 u = xu.

Derivando a equação acima, encontra-se

y20 = xu0 + u

e
y200 = xu00 + 2u0 .

Substituindo essas equações na EDO (3.50), obtém-se

(x2 − x)(xu00 + 2u0 ) − x(xu0 + u) + xu = 0,

49
dai,
x3 u00 + 2x2 u0 − x2 u00 − 2xu0 − x2 u0 − xu + xu = 0,

dividindo por x e simplificando, resulta em

(x2 − x)u00 + (x − 2)u0 = 0,

2
Disso, usando frações parciais e integrando, tomando como zero a constante de inte-
gração, obtém-se

u00 x−2 2 1 0
x − 1
=− 2 =− + , lnu = ln 2 .

u 0 x −2 x 1−x x

Passando para a forma exponencial e integrando, tomando como zero a constante de


integração, obtém-se

x−1 1 1 1
u0 = 2
= − 2, u = lnx + , y2 = xu = xlnx + 1,
x x x x

y1 e y2 são linearmente independentes e y2 tem um termo logarı́tmico. Logo, y1 e y2


constituem uma base de soluções para todo x positivo.

2
O método das frações parciais pode ser encontrado em (Guidorizzi, 2000)

50
Conclusão

Desde o advento do Cálculo Diferencial e Integral, o estudo de EDOs tem sido


fonte de pesquisa tanto para matemáticos, fı́sicos e engenheiros. Além disso, inúmeros
modelos matemáticos baseados em EDOs e métodos de soluções foram propostos ao longo
do tempo. Este trabalho dedicou-se ao estudo de alguns tópicos de equações diferenci-
ais ordinárias que não são abordados no curso básico de Cálculo Diferencial e Integral.
Precisamente, foi estudado o Teorema da Existência e Unicidade, o método das séries
de potências e o método de Frobenius. Em termos práticos, estudou-se a solução da
Equação Logı́stica Contı́nua que foi aplicada para a solução do problema da propagação
da podridão em maçãs.
Com o desenvolvimento do trabalho foi possı́vel notar que tendo garantia da
existência da solução de uma EDO pelo Teorema da Existência e Unicidade, nem sempre
é possı́vel obter a solução na forma explı́cita usando as técnicas estudadas no curso básico
de Cálculo Diferencial e Integral. Mostrando a grande importância do estudo do método
das séries de potências, equação de Lengendre e o Método de Frobenius, pois através
de tais aplicações são possı́veis encontrar as soluções de PVIs que descrevem diversas
situações do cotidiano.
Pretende-se estudar outros métodos para solução de EDOs. Em particular, estu-
dar o método numérico de diferenças finitas para solução de problemas na Engenharia tal
como o problema da Viga de Euler. Ainda, será estudado com mais detalhes a teoria das
séries de funções e suas aplicações em EDOs.

51
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53

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