Você está na página 1de 588

ANÁLISE DO SINAL SÍSMICO

André Luiz Romanelli Rosa

Rio de Janeiro, 28 de setembro de 2004


2
i

Apresentação

Esta apostila procura preencher a lacuna, freqüentemente observada, entre os textos


teóricos publicados e a atividade rotineira dos geofı́sicos de exploração. Neste sentido,
busca auxiliar os responsáveis pela aquisição, processamento e interpretação de dados
sı́smicos a entender, de forma mais direta, como os problemas práticos podem ter im-
portantes vı́nculos com a teoria, facilitando assim o seu crescimento profissional. O
enfoque usado foi basicamente o de prover uma visão objetiva dos fundamentos fı́sicos e
matemáticos que propiciam esse entendimento.
A forma com que o texto foi elaborado possibilita ao leitor diferentes nı́veis de leitura,
desde a mais básica, de caráter eminentemente intuitivo, até um grau de profundidade
que favoreça a elaboração de um programa de computador. Assim, por exemplo, um
leitor que deseja se prender a uma análise global da geofı́sica pode passar sucessivamente
pelos seguintes itens: 2.1, 2.2, 2.5, 2.6, 2.8, 2.9, 3.1, 3.2, 3.3, 3.4, 3.7, 4.1, 4.3 e 4.4.
Já um leitor interessado em aprofundar seus conhecimentos a respeito da migração de
dados sı́smicos pode estudar, sucessivamente, os itens 1.2, 2.2, 2.3, 2.4, 2.7, 3.4, 3.5 e 3.6.
Deconvolução é um assunto que exige a leitura do Capı́tulo 1 e dos itens 2.8, 2.9, 3.1, 3.2
e 3.3.
A versão original da apostila, escrita em 1980 com a ajuda de José Tassini, servia como
texto de apoio para um curso interno da Petrobrás, voltado para o processamento e a
interpretação de seções de pseudo-impedâncias acústicas. A forma atual resultou de uma
evolução que espelha, de uma forma ou de outra, o que aconteceu com o conhecimento ao
longo de todos esses anos, não somente o conhecimento aplicado ao método sı́smico, mas
também à edição de textos. No que diz respeito ao método sı́smico, a própria apostila
deverá ser suficiente para que o leitor avalie esta evolução. No caso da edição de textos,
vale a pena relatar o que houve, no mı́nimo como curiosidade.
A primeira versão do texto foi datilografada em uma máquina de escrever IBM.
Para facilitar o trabalho da datilógrafa (evitando a troca das esferas que permitiam
incluir sı́mbolos), usamos fórmulas simplificadas, na forma de texto. Em 1985, já sem a
participação de Tassini, a apostila foi redatilografada em um microcomputador de uso
doméstico, um Microengenho II (clone brasileiro do Apple IIe), onde permaneceu sendo
alterada por dois anos. Foi depois transferida, também através de datilografia, para o
software Open Access. Até então, por causa das limitações dos dois editores usados, as
fórmulas continuavam na forma de texto.
Já no final dos anos 80, a apostila sofreu a maior evolução, ao ser transcrita eletronica-
mente para o mainframe IBM 3090. O editor de textos disponı́vel, Script, possibilitou a
fácil introdução de fórmulas e sı́mbolos gráficos, assim como figuras. Alguns anos depois,
ii

tomei uma decisão errada, ao passar a utilizar o editor de textos Word, da Microsoft,
basicamente por causa da aparente facilidade de uso que o caracteriza. Daquela época
até meados de 2001, sofri bastante com o tratamento das figuras e, principalmente, com
a edição e apresentação das equações, até o ponto de me sentir pouco incentivado a
introduzir modificações extensas no texto.
Foi então que a Petrobrás adquiriu o software MathType, o qual me possibilitou con-
verter todas as equações para o formato LATEX e iniciar uma nova fase na evolução da
apostila. Ao executar o trabalho de reformatação, percebi que os programas convencio-
nais de edição de texto, como o Word, não podem ser caracterizados como processadores
de texto. São apenas integradores de ferramentas que permitem a elaboração de do-
cumentos perfeitamente aceitáveis se o número de equações e figuras for relativamente
pequeno. A sensação que senti, ao penetrar no mundo LATEX, foi a de liberdade, uma
vez que passei a ter controle quase absoluto sobre o processo. Apesar de o LATEX não
se enquadrar no modelo what you see is what you get 1 (“o que você vê é o que você
obtém”), ele possibilita introdução e modificação estruturada de praticamente todos os
elementos do texto, caracterı́stica esta que, combinada com uma apresentação final de
melhor qualidade, tornam-o altamente indicado para um trabalho profissional.
Inúmeras pessoas contribuı́ram para a geração desta apostila. Eu gostaria de destacar
José Tassini, que foi o responsável pela primeira versão de vários trechos do texto. A
revisão passou por diversos colegas de trabalho, entre os quais estão Carlos Cunha Filho,
Carlos Lopo Varela, Eduardo Lopes de Faria e Vandemir de Oliveira, além das dezenas
de profissionais que, ao fazer os cursos baseados na apostila, descobriram uma grande
quantidade de pequenos erros, além de terem levado o autor a introduzir importantes
modificações. Devo mencionar também a contı́nua troca de idéias com Carlos Cunha Fi-
lho, Carlos Lopo Varela e o coordenador de várias versões desses cursos, Osvaldo Duarte,
que ajudaram a direcionar melhor meus esforços. As figuras foram, em grande parte,
geradas pelo pessoal da área de programação visual da Petrobrás, com destaque para
Cesar Fraga, Haroldo Ramos e Orlando Aquino. Sou muito grato a todas essas pessoas,
além daquelas que, mesmo não contribuindo diretamente para a elaboração da apostila,
me induziram a fazer descobertas que melhoraram a apresentação dos conceitos.

André

1
Há quem prefira a seguinte frase, citada por Leslie Lamport e atribuı́da por ele a Brian Reid e/ou
Brian Kernighan: what you see is all you’ve got (“o que você vê é tudo o que você tem”).
Índice

1 TRATAMENTO DE SINAIS 1
1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1.1 Amostragem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1.2 Transformada Z . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.1.3 Sistemas lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.1.4 Convolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.1.5 Correlação cruzada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
1.2 Transformada de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.2.1 Definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.2.2 Teoremas da transformada de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . 18
1.2.3 Funções especiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
1.2.4 Transformada bidimensional de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . 26
1.2.5 A prática da transformada de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . 29
1.3 Propriedades das Séries de Tempo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
1.3.1 Caracterı́sticas de fase dos sinais amostrados . . . . . . . . . . . 31
1.3.2 As séries aleatórias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.4 O Filtro Wiener-Hopf-Levinson . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
1.4.1 O filtro Wiener-Hopf . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
1.4.2 Aplicando o filtro Wiener-Hopf . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
1.4.3 A recursão Levinson . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
1.5 Fatoração Espectral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
1.5.1 O método das raı́zes de polinômios . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
1.5.2 O cepstrum . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
1.5.3 O método Kolmogoroff . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
1.5.4 O método Toeplitz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
1.6 Fontes de Consulta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
1.7 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59

2 MÉTODO SÍSMICO DIRETO 64


2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
2.1.1 Das partı́culas de rocha para as ondas sı́smicas . . . . . . . . . . . 64
2.1.2 A energia das ondas e as interfaces geológicas . . . . . . . . . . . 73
2.1.3 Fundamentos geométricos da propagação de ondas . . . . . . . . . 77
2.1.4 A função refletividade e o modelo convolucional . . . . . . . . . . 84
2.1.5 Distorções inerentes ao método sı́smico . . . . . . . . . . . . . . . 87
2.1.6 A técnica CDP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90

iii
iv ÍNDICE

2.2 O Princı́pio de Huygens e o Método Sı́smico . . . . . . . . . . . . . . . . 92


2.2.1 A geometria das reflexões e o refletor explosivo . . . . . . . . . . 92
2.2.2 As reflexões e a interferência de ondas acústicas . . . . . . . . . . 96
2.2.3 Uma descrição algébrica do princı́pio de Huygens . . . . . . . . . 102
2.2.4 Modelagem sı́smica com o princı́pio de Huygens . . . . . . . . . . 109
2.2.5 O conceito de recursão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110
2.3 A Influência do Afastamento Fonte-Receptor . . . . . . . . . . . . . . . . 113
2.3.1 A geometria das difrações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114
2.3.2 Uma simplificação do caso tridimensional . . . . . . . . . . . . . 120
2.3.3 A interferência de sinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
2.4 A Equação da Onda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130
2.4.1 Ondas acústicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130
2.4.2 Ondas elásticas em um corpo sólido . . . . . . . . . . . . . . . . . 139
2.5 O Tempo e a Amplitude ao Longo do Raio . . . . . . . . . . . . . . . . . 139
2.5.1 Noções básicas de teoria do raio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140
2.5.2 Estimativas de tempo de trânsito . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148
2.5.3 O espalhamento geométrico da energia . . . . . . . . . . . . . . . 160
2.6 Partição de Energia nas Interfaces . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 168
2.6.1 Partição acústica da energia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169
2.6.2 Partição elástica da energia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171
2.6.3 Predição da influência das propriedades elásticas . . . . . . . . . 174
2.6.4 O coeficiente de transmissão e as amplitudes . . . . . . . . . . . . 182
2.6.5 Impedância e refletividade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 183
2.7 Extrapolação de Campos de Ondas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188
2.7.1 O algoritmo de deslocamento de fase . . . . . . . . . . . . . . . . 188
2.7.2 A equação DSR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191
2.7.3 As diferenças finitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193
2.7.4 A integral de Kirchhoff . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 199
2.7.5 A aproximação Kirchhoff . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213
2.8 Fontes de Distorção do Sinal Sı́smico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 220
2.8.1 Absorção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 220
2.8.2 Múltiplas e reverberações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 227
2.8.3 As múltiplas e a aproximação Kirchhoff . . . . . . . . . . . . . . 234
2.8.4 O filtro estratigráfico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 239
2.8.5 A anisotropia de meios TI . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 245
2.9 O Pulso Sı́smico e seus Componentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 252
2.9.1 Assinatura da fonte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253
2.9.2 Instrumento e receptores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255
2.9.3 Os fantasmas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 260
2.9.4 Arranjos de tiro e receptor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 266
2.9.5 O pulso sı́smico e as convenções de polaridade . . . . . . . . . . . 267
2.10 Fontes de Consulta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 268
2.11 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 268
ÍNDICE v

3 MÉTODO SÍSMICO INVERSO 274


3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 274
3.1.1 O condicionamento dos dados sı́smicos . . . . . . . . . . . . . . . 274
3.1.2 A multiplicidade e as velocidades sı́smicas . . . . . . . . . . . . . 280
3.2 A Deconvolução da Assinatura Sı́smica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 298
3.2.1 Estimativas do pulso sı́smico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 300
3.2.2 Deconvolução determinı́stica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 304
3.2.3 Deconvolução de fase mı́nima . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 306
3.2.4 Deconvolução estatı́stico-determinı́stica . . . . . . . . . . . . . . . 311
3.2.5 Deconvolução de fase nula . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 315
3.2.6 Deconvolução iterativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 318
3.2.7 Técnicas baseadas em dados de poços . . . . . . . . . . . . . . . . 324
3.2.8 A restauração da cor da função refletividade . . . . . . . . . . . . 325
3.3 Correção dos Fatores de Propagação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 326
3.3.1 As diferenças de NMO e a atenuação das múltiplas . . . . . . . . 327
3.3.2 Atenuação de múltiplas com base na equação da onda . . . . . . . 329
3.3.3 Deconvolução preditiva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 335
3.3.4 Compensação Q . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 336
3.3.5 Compensação estratigráfica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 341
3.4 O Princı́pio de Huygens e a Migração . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 342
3.4.1 Migração geométrica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 342
3.4.2 A migração e a interferência de ondas acústicas . . . . . . . . . . 347
3.4.3 A álgebra da versão inversa do princı́pio de Huygens . . . . . . . 350
3.4.4 Migração por soma de difrações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 353
3.4.5 Migração em tempo versus profundidade . . . . . . . . . . . . . . 355
3.4.6 Introdução à migração recursiva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 360
3.5 Algoritmos de Migração . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 365
3.5.1 Migração Kirchhoff . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 365
3.5.2 Técnicas espectrais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 375
3.5.3 Diferenças finitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 378
3.5.4 Técnicas complementares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 393
3.5.5 Um pouco mais de detalhe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 397
3.6 Migração Pré-empilhamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 400
3.6.1 Introdução à migração pré-empilhamento . . . . . . . . . . . . . . 401
3.6.2 A correção de DMO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 419
3.6.3 Algoritmos de migração pré-empilhamento . . . . . . . . . . . . . 424
3.7 Técnicas Aproximadas de Inversão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 438
3.7.1 Parâmetros de AVO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 441
3.7.2 Inversão acústica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 446
3.7.3 Inversão elástica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 449
3.8 Fontes de Consulta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 455
3.9 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 455
vi ÍNDICE

4 INTERPRETAÇÃO 461
4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 461
4.1.1 Calibração dos dados sı́smicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 461
4.1.2 A representação sı́smica da geologia . . . . . . . . . . . . . . . . . 465
4.2 Noções de Petrogeofı́sica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 473
4.2.1 A elasticidade e os meios porosos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 474
4.2.2 A equação Biot-Gassmann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 478
4.2.3 O controle da velocidade e da razão de Poisson . . . . . . . . . . 480
4.2.4 A substituição de fluido . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 487
4.2.5 Fontes de dados para a modelagem petrofı́sica . . . . . . . . . . . 488
4.3 Indicadores Sı́smicos de Petróleo e Litologia . . . . . . . . . . . . . . . . 493
4.3.1 Bright-spots, flat-spots, dim-spots e AVO . . . . . . . . . . . . . . 494
4.3.2 Análise de AVO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 498
4.3.3 Aspectos práticos da análise de AVO . . . . . . . . . . . . . . . . 514
4.4 Quantificação Sı́smica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 521
4.4.1 Resolução vertical . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 521
4.4.2 Deconvolução transversa de mapas sı́smicos . . . . . . . . . . . . 527
4.4.3 Resolução horizontal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 531
4.4.4 Previsão de profundidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 533
4.4.5 Previsão de porosidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 538
4.5 Fontes de Consulta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 539
4.6 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 539

BIBLIOGRAFIA 542

APÊNDICE 556
A.1 Empilhamento Oblı́quo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 556
A.2 Versão Alternativa da Compensação Q . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 560
A.3 Melhorando o Algoritmo Implı́cito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 561
A.4 Obtenção dos Parâmetros de AVO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 567
A.5 Estimativas do Ângulo de Incidência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 569
A.6 Modelos de Pulso Sı́smico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 571

ÍNDICE REMISSIVO 573


Capı́tulo 1

TRATAMENTO DE SINAIS

1.1 Introdução
Discutem-se neste item conceitos considerados fundamentais para uma boa leitura desta
apostila. Um leitor já familiarizado com a teoria do método sı́smico deverá considerar
trivial o tratamento adotado. Entretanto, para quem passou muito tempo sem ler textos
teóricos, ou para quem quer começar a fazê-lo agora, a matéria discutida deverá ser útil,
no mı́nimo como uma referência rápida, que dispensa consulta a outros textos.

1.1.1 Amostragem
No método sı́smico digital, o traço sı́smico não é registrado continuamente em função do
tempo, t, mas amostrado segundo o intervalo constante ∆t. A este respeito, a pergunta
óbvia que se poderia fazer é: perde-se alguma informação com a amostragem digital?
A resposta é: depende do valor do intervalo de amostragem ∆t e da informação que se
deseja obter.
Para analisar o que representa a escolha do valor de ∆t, observe-se a Figura 1.1, onde
está representada uma senóide com freqüência de 50Hz, amostrada inicialmente a cada
4 milissegundos, ou 4ms (os cı́rculos menores representam as amplitudes amostradas).
Posteriormente, amostrou-se o mesmo dado a cada 16ms (nesse caso, as amostras estão
representadas pelos cı́rculos maiores). Observe-se que o sinal resultante da amostragem de
16ms, representado pela linha tracejada, corresponde a uma freqüência de 12.5Hz, quatro
vezes menor do que a correta. Este resultado permite concluir que o intervalo de amos-
tragem escolhido, 16ms, não é suficientemente pequeno para representar corretamente o
sinal original de 50Hz, resultando em uma freqüência errada.
O fenômeno exemplificado pela Figura 1.1 é denominado efeito de álias e consiste na
caracterização de um evento de alta freqüência na forma de um evento falso, de mais baixa
freqüência. No caso da amostragem ao longo do tempo, uma importante conseqüência do
fenômeno é o fato de que, se os dados tiverem sido inadequadamente amostrados, torna-se
quase impossı́vel identificar com segurança quais são os eventos falsos. Desta forma, é
fundamental estabelecer a faixa de freqüências que se deseja amostrar e, antes do registro
digital, atenuar os sinais com freqüência superior à máxima desejada. Caracteriza-se
assim o filtro anti-álias, aplicado com a finalidade explı́cita de evitar o fenômeno.
O limite entre as freqüências amostradas corretamente e aquelas que se apresentam

1
2 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.1: Senóide de freqüência igual a 50Hz, amostrada


de acordo com intervalos de 4 e 16ms.

em álias, para um dado intervalo de tempo ∆t, é a freqüência de Nyquist, ou freqüência


de álias, simbolizada por fN e definida pela seguinte expressão:

1
fN = (1.1.1)
2∆t

ou, em termos de freqüência angular (medida em radianos por segundo),


π
ωN = (1.1.2)
∆t

Este resultado é fundamentado no teorema da amostragem, de acordo com o qual exige-


se a amostragem de mais de dois pontos em cada ciclo da onda para que se registre
adequadamente um determinado componente de freqüência (ver o item 1.2 e Bracewell,
1986). Assim, no caso do intervalo de amostragem de 2ms, a máxima freqüência que se
pode amostrar corretamente é inferior a 250Hz.
Se não for aplicado um filtro anti-álias, uma freqüência f situada no intervalo f N <
f ≤ 2fN , será amostrada erroneamente como se fosse a freqüência fA , a qual é definida
pela seguinte expressão:
fA = |2fN − f | (1.1.3)
Em função da periodicidade envolvida no processo, o mesmo conceito pode ser aplicado
a uma freqüência superior ao intervalo citado, de acordo com a seguinte expressão:

fA = |2nfN − f | (1.1.4)

onde n é o número inteiro mais próximo da razão f /2fN . Considere-se, por exemplo, o
intervalo de amostragem de 4ms. No caso, os componentes de freqüência 240Hz, 260Hz,
490Hz e 510Hz levariam a um mesmo valor de fA , igual a 10Hz, para n igual a 1, 1, 2 e
2, respectivamente.
Nas situações tı́picas, a amostragem de dados sı́smicos envolve não somente o tempo
mas também a distância. Nestes termos, uma seção sı́smica pode ser vista como uma
coleção de registros dependentes do tempo, cada um deles obtido em uma posição espacial
diferente, na qual se situa hipoteticamente a fonte e a estação de geofones. Desta forma,
1.1. INTRODUÇÃO 3

além da amostragem temporal, o método sı́smico se caracteriza também pela amostragem


espacial, de acordo com o intervalo ∆x, que é a distância entre os traços, medida ao longo
do eixo x. A Figura 1.1 pode ser usada para ilustrar a idéia, desde que se substitua tempo
por distância e freqüência temporal por freqüência espacial.
Em um registro sı́smico tı́pico, a adequada caracterização da amostragem espacial
implica fixar o tempo de registro. Nestas condições, a distância horizontal entre um pico
e uma cavidade, medida em um mesmo tempo, corresponde à metade do comprimento
de onda aparente do sinal. O inverso desse comprimento de onda é a freqüência espacial
horizontal, a qual é definida com base na seguinte igualdade:
1 Kx
η= = (1.1.5)
λA 2π
onde η é a freqüência espacial, λA é o comprimento de onda aparente e Kx é a freqüência
angular horizontal, ou número de onda horizontal, todos relativos ao eixo horizontal, x.
Essa seqüência de idéias pode induzir o leitor a pensar na possibilidade de ocorrer
amostragem espacial precária, de forma semelhante à amostragem temporal. Na verdade,
este é um fenômeno muito comum, particularmente na presença de eventos com alta
declividade. Uma vez que as leis que regem a amostragem espacial são equivalentes às da
amostragem temporal, a freqüência angular espacial de álias, avaliada ao longo do eixo
x, é dada pela seguinte igualdade:
π
Kx N = ± (1.1.6)
∆x
onde ∆x é o intervalo de amostragem ao longo do eixo x. Observe-se que, ao contrário do
que ocorre com a freqüência temporal, admite-se um número de onda horizontal negativo.
Como no caso da amostragem temporal, pode-se estimar qual seria o comprimento de
onda falso, associado a um sinal registrado em álias espacial. O resultado é a seguinte
igualdade:
KxA = Kx − 2nKxN (1.1.7)
onde Kx é a freqüência angular espacial correta e n é o número inteiro mais próximo da
razão Kx /2KxN . A diferença entre as equações 1.1.4 e 1.1.7 está associada ao fato de
que, nesta última, a freqüência espacial pode ser negativa. Ver-se-á adiante o significado
prático desta possibilidade.
Uma visão mais profunda da amostragem dos dados sı́smicos exige uma análise de
como um determinado evento, ou componente de freqüência, varia no tempo e no espaço.
Para isto, deve-se levar em conta a velocidade aparente do sinal, ou sua vagarosidade
horizontal, a qual é definida com base na seguinte igualdade:
1 dt Kx
p= = = (1.1.8)
vA dx ω
onde vA é a velocidade aparente do sinal, definida com base na igualdade λA = 2πvA /ω,
enquanto p, ou dt/dx, é a correspondente vagarosidade. Ou seja, o inverso de p é uma
medida da rapidez com que um determinado evento avança na direção horizontal.
Combinando-se as equações 1.1.6 e 1.1.8, pode-se estabelecer qual é a máxima fre-
qüência angular temporal que pode ser registrada sem a influência de álias espacial. O
4 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.2: Amostragem espacial de uma senóide de 40Hz por receptores espaçados
de 100m entre si. Em cada receptor, o atraso no registro é estático, ou seja, não
se altera com o tempo. A velocidade usada para se construir a variação lateral do
atraso foi de 2000m/s. As coordenadas horizontais são dadas em metros.

resultado é a seguinte inequação:


π
ωc < (1.1.9)
|p∆x|
onde ωc é a máxima freqüência angular temporal de um evento com vagarosidade hori-
zontal p que pode ser amostrada sem o efeito de álias espacial, para um dado valor de
∆x. A expressão obtida pode também ser usada para se estabelecer qual é o intervalo
de amostragem espacial ∆x necessário para se registrar um determinado componente de
freqüência sem o efeito de álias espacial.
Com base nesta análise e na equação 1.1.7, pode-se dizer que um sinal caracterizado
por freqüência angular temporal imediatamente superior a ωc e número de onda ime-
diatamente superior a π/∆x será registrado como se fosse um evento com número de
onda negativo. Ou seja, ele será visto em um sismograma com uma declividade de sinal
contrário ao da declividade real. Adicionalmente, se a declividade correta for aumentada
de forma progressiva, o número de onda aparente passa a sofrer sucessivas alterações, na
forma prevista pela equação 1.1.7. Na Figura 1.2, apresenta-se um exemplo simples que
favorece a discussão do tema.
Observando sob diferentes ângulos a Figura 1.2, o leitor poderá perceber a presença
de outros eventos, além do que foi gerado, o qual é bem caracterizado na posição 1, onde
a declividade é igual a zero. Já na posição 2, percebe-se a coexistência de dois eventos
com mergulhos de igual módulo e sentidos opostos, o correto para a direita e o falso para
a esquerda. Na mesma posição, a distância entre um pico e uma cavidade é exatamente
igual a 100m e, portanto, a freqüência espacial correspondente é a de álias. Na posição
3, o evento falso apresenta declividade igual a zero, em função do aumento do número de
1.1. INTRODUÇÃO 5

onda correto, em relação à posição anterior. Na posição 4, onde a declividade do sinal


correto corresponde a uma freqüência espacial igual ao dobro da observada na posição 2,
percebe-se a presença de dois eventos falsos. Na mesma posição, o evento real só pode
ser distinguido porque é possı́vel identificar o tempo inicial correspondente.
A amostragem espacial inadequada, como as que se observam na Figura 1.2, pode ge-
rar os seguintes problemas: (1) criação de mergulho estrutural falso (menor e com sentido
dependente da intensidade do fenômeno); (2) registro de ruı́dos com comportamento es-
pacial similar ao dos sinais. Em termos práticos, estes dois problemas afetam a aplicação
de todos os processos multicanais, especialmente os filtros de velocidade e a migração dos
dados sı́smicos. Isto significa que a aquisição deve ser densa o suficiente para uma boa
amostragem, não somente das reflexões mas, também, dos ruı́dos.

1.1.2 Transformada Z
Uma forma conveniente de se representar dados sı́smicos regularmente amostrados envolve
a utilização da chamada transformada Z, a qual é representada pelo par

st ⇔ S(Z)

onde st é a série amostrada e S(Z) é a correspondente transformada Z.


A transformada Z direta1 é extremamente simples, já que corresponde simplesmente
a converter as medidas de amplitude e de tempo da série a transformar em um polinômio
em Z, dado por
S(Z) = s0 + s1 Z + s2 Z 2 + · · · + sn Z n (1.1.10)
Os coeficientes do polinômio correspondem às amplitudes do traço, enquanto cada um
dos subscritos e expoentes indica a posição relativa da amostra, ou seja, o número de
intervalos de amostragem a partir da origem.
Matematicamente, pode-se generalizar a transformada Z para o caso em que a série
temporal contenha informações antes de t = 0. Isto se aplica ao método sı́smico quando,
por conveniência, o tempo de origem está deslocado. Genericamente, portanto, a trans-
formada Z é dada por
X∞
S(Z) = sn Z n (1.1.11)
n=−∞

Obviamente, os valores mı́nimo e máximo do ı́ndice do somatório apenas indicam que


toda a série de tempo deve ser usada. Observe-se que a aplicação da fórmula a um traço
sı́smico amostrado digitalmente é direta, sem nenhuma etapa intermediária, respeitando-
se tão somente as posições e os valores das amplitudes.
Em função da forma como é definida, a transformada Z é indistintamente aplicá-
vel a qualquer tipo de amostragem, seja ela temporal, seja espacial. Assim, no caso da
amostragem feita ao longo do eixo x, em um determinado valor constante de tempo,
define-se a potência do operador Z em função do número de traços a partir da origem (a
coordenada x da fonte, por exemplo).
1
A forma rigorosa da transformada Z inversa não é trivial e, por ser pouco utilizada no método
sı́smico, não será discutida aqui.
6 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

A relação entre a potência do operador Z e o deslocamento, no tempo ou no espaço,


merece ser destacada. A este respeito, sabe-se que, se um polinômio em Z é multiplicado
por Z, a série correspondente sofre deslocamento de uma amostra, ou seja, o tempo de
cada amostra de uma série temporal é aumentado em um intervalo de amostragem. Por
esta razão, Z é chamado operador de atraso unitário. Em conseqüência, se a multiplicação
for feita por Z elevado a um expoente hipotético k, o atraso correspondente será de k
amostras.

1.1.3 Sistemas lineares


O conceito de sistema linear é de fundamental importância para o método sı́smico, par-
ticularmente nos processos de filtragem, discutidos em diversos dos itens que se seguem.
Um sistema linear pode ser definido com base em três propriedades, ilustradas na Figura
1.3:
1. O sistema é passivo (não cria informação) – os dados de saı́da são proporcionais aos
dados de entrada.
2. Um sistema linear independe do tempo – se os dados de entrada forem deslocados
de acordo com um certo intervalo de tempo, os dados de saı́da serão deslocados de
acordo com o mesmo intervalo.
3. Aplica-se aos sistemas lineares o princı́pio da superposição – somar dados indi-
viduais e submeter o resultado à ação do sistema equivale a submeter os dados
individuais à ação do sistema e somar os resultados.
Os sistemas lineares devem ser analisados de uma forma abrangente. Assim, embora
não o pareça, um processo de filtragem cujo operador muda com o tempo pode ser um
sistema linear. Talvez o melhor exemplo desta caracterı́stica seja a migração de dados
sı́smicos, cujo operador varia em função do tempo e do espaço e, ainda assim, pode ser
descrito como um sistema linear (ver os itens 3.4 a 3.6). Em casos como este, uma
caracterı́stica é comum: a recursividade, a qual é caracterizada pelo fato de a saı́da de
uma etapa do processo corresponder à entrada da etapa seguinte, o que possibilita ao
operador ser alterado em cada etapa, sem violar a linearidade.
Um sistema linear desconhecido pode ser avaliado com base na submissão do mesmo
à ação de um impulso unitário. Um exemplo de aplicação deste conceito é o teste de
pulso dos sismógrafos, realizado com a finalidade básica de se avaliar a atuação de seus
filtros. Outra aplicação muito comum é a determinação do operador de migração dos
dados sı́smicos: migrando-se um impulso unitário, o geofı́sico poderá perceber, com um
maior grau de segurança, a confiabilidade de um determinado algoritmo de migração (ver
os itens 3.4 a 3.6).

1.1.4 Convolução
Convolução é a operação de filtragem linear, normalmente simbolizada por ∗ e definida,
na aplicação a duas funções hipotéticas, r(t) e w(t), por
Z ∞
s(t) = r(t) ∗ w(t) = r(τ )w(t − τ )dτ (1.1.12)
−∞
1.1. INTRODUÇÃO 7

Figura 1.3: Propriedades dos sistemas lineares.

ou, no caso discreto, por



X
st = r t ∗ w t = rτ wt−τ (1.1.13)
τ =−∞

onde s(t) e st correspondem aos resultados das duas operações e τ é o tempo usado como
variável de integração. Na forma discreta, t e τ correspondem a ı́ndices que identificam as
amostras. Nesta mesma forma, o número total de pontos da série resultante é m + n − 1,
onde m e n são os números de coeficientes das séries convolvidas.
Para facilitar a compreensão das equações 1.1.12 e 1.1.13, escreve-se a última da
seguinte forma:

st = rt ∗ wt = · · · + r−2 wt+2 + r−1 wt+1 + r0 wt + r1 wt−1 + r2 wt−2 + · · · (1.1.14)

onde, para uma posição hipotética k, wt−k representa a série wt completa, mas deslocada,
no sentido dos tempos positivos, de acordo com o intervalo k∆t, sendo ∆t o intervalo
de amostragem. Nestas condições, cada coeficiente k da série rt é multiplicado por todos
os coeficientes da série wt−k . Em conseqüência, st corresponde a uma soma de séries
8 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.4: Aplicação da propriedade da superposição à convolução.

distintas, cada uma delas computada com base no atraso relativo de um coeficiente da
série rt .
Duas lições podem ser extraı́das da equação 1.1.14. Em primeiro lugar, ela representa
uma aplicação explı́cita do princı́pio da superposição de sistemas lineares, o que pode ser
percebido de forma ainda mais evidente através do exemplo da Figura 1.4. Em segundo
lugar, cada termo da soma, no lado direito da equação, pode ser descrito, em termos de
transformada Z, por rk W (Z)Z k , onde W (Z) é a transformada Z de st e Z k é o fator
correspondente ao atraso k∆t. Esta caracterı́stica permite definir a transformada Z da
equação 1.1.14 através da seguinte igualdade:

X
S(Z) = rn Z n W (Z) = R(Z)W (Z) (1.1.15)
n=−∞

Ou seja,
rt ∗ wt ⇔ R(Z)W (Z)
Em palavras: uma convolução, no domı́nio do tempo, corresponde a uma multiplicação,
no domı́nio da transformada Z.
Considere-se agora que, na aplicação da equação 1.1.13, cada um dos coeficientes da
série st seja representado através de uma soma envolvendo coeficientes isolados das séries
rt e wt . Aplicada a todos os coeficientes, esta representação permite a conclusão de que
a equação 1.1.13 equivale a uma multiplicação entre duas matrizes. A tı́tulo de exemplo,
pode-se utilizar duas séries curtas, como as da Figura 1.4. O resultado é a seguinte
1.1. INTRODUÇÃO 9

operação matricial:    
w0 w−1   s0
 w1 w0  r0 =  s1  (1.1.16)
r1
w2 w1 s2
Uma vez que a série wt não é definida para tempos menores do que zero, ou maiores do
que 2, tais amostras são tomadas como iguais a zero.
A forma de montar a operação matricial descrita pela expressão 1.1.16 é simples. O
vetor correspondente à série rt tem como primeira linha o primeiro valor da série, enquanto
a segunda linha é constituı́da do segundo coeficiente de rt , e assim sucessivamente. Na
matriz correspondente à série wt , a primeira amostra ocupa a primeira linha da primeira
coluna. A segunda linha da mesma coluna é ocupada pela segunda amostra, e assim
sucessivamente. Para atender à definição da convolução, dada anteriormente, o número
de linhas dessa matriz deve ser igual a m + n − 1. As outras colunas são ocupadas com
as mesmas amostras da primeira, deslocando-se uma posição para baixo, em relação à
anterior. Para ser possı́vel a operação matricial, o número de colunas da matriz da série
wt deve ser igual ao número de linhas da matriz da série rt .
Uma vez que a convolução é uma operação linear, aplicam-se a ela — além do princı́pio
da superposição — as seguintes propriedades especı́ficas, todas dedutı́veis a partir das
propriedades básicas dos sistemas lineares:
1. COMUTATIVIDADE
rt ∗ w t = w t ∗ r t
ou
R(Z)W (Z) = W (Z)R(Z)

2. ASSOCIATIVIDADE
rt ∗ (wt ∗ ft ) = (rt ∗ wt ) ∗ ft
ou
R(Z) [W (Z)F (Z)] = [R(Z)W (Z)] F (Z)

3. DISTRIBUTIVIDADE

rt ∗ (wt + ft ) = rt ∗ wt + rt ∗ ft

ou
R(Z) [W (Z) + F (Z)] = R(Z)W (Z) + R(Z)F (Z)

A convolução se aplica igualmente a funções complexas e reais, assim como a funções


multidimensionais. Neste caso, pode ser interessante apresentar o caso da convolução en-
tre duas funções bidimensionais, a qual é representada por ∗∗ e definida matematicamente
por
Z ∞Z ∞
s(a, b) = w(x, y) r(a − x, b − y)dxdy (1.1.17)
−∞ −∞

ou, no caso discreto, por



X ∞
X
sa,b = wx,y ra−x,b−y (1.1.18)
x=−∞ y=−∞
10 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

onde a e b correspondem a posições especı́ficas de s. A lógica envolvida nestas duas


equações é similar à das expressões 1.1.12 e 1.1.13. Ou seja, somam-se produtos obti-
dos em cada deslocamento relativo entre as duas funções envolvidas, deslocamento este
controlado, no caso 2-D, pela posição bidimensional desejada.
Isoladamente, a convolução representa o modelo matemático de maior aplicação no
método sı́smico, tanto na teoria quanto na prática. Isto se dá na forma de diferentes
aplicações de filtros, a mais comum das quais é representada pela seguinte expressão:

st ∗ f t = a t (1.1.19)

onde ft é o filtro linear, ou operador, que transforma o sinal st no sinal at . Filtros com essa
forma são, por exemplo, voltados para a atenuação seletiva de determinados componentes
de freqüência, ou, na deconvolução, para remover do traço sı́smico eventos indesejados
que foram, durante a aquisição, convolvidos com o sinal sı́smico.
Os mesmos conceitos são aplicados também a dados sı́smicos amostrados em função
da distância horizontal, para um tempo (ou uma freqüência) fixo. Neste caso, tem-se um
filtro espacial, como é o caso de um arranjo de campo, cuja ação pode ser simbolizada
por
sx ∗ f x = a x (1.1.20)
O objetivo de filtros desse tipo é normalmente o de atenuar ruı́dos, que amostrados em
função do eixo x, apresentam comprimento de onda menor — ou número de onda maior
— do que o do sinal.
Na forma bi ou tridimensional, os filtros são aplicados, por exemplo, na atenuação de
ruı́dos com faixa de velocidades aparentes bem definida, quando então são denominados
filtros de velocidade. São aplicados também, de forma nem sempre explı́cita, na migração
dos dados sı́smicos. Um exemplo representativo de convolução bidimensional é o da
seguinte expressão:
st,x = wt,x ∗ ∗rt,x (1.1.21)
onde o sı́mbolo ∗∗ denota convolução bidimensional envolvendo os eixos t e x.

1.1.5 Correlação cruzada


Correlação cruzada é a operação, normalmente simbolizada por ⊗, e definida, na aplica-
ção a duas funções hipotéticas, r(t) e w(t), por2 :
Z ∞
Φrw (τ ) = r(t) ⊗ w(t) = r(t)w(t − τ )dt (1.1.22)
−∞

ou, no caso discreto,



X
Φrw (τ ) = rt ⊗ wt = rt wt−τ (1.1.23)
t=−∞

2
O leitor deve estar atento para o fato de que, na literatura, a correlação cruzada é muitas vezes
representada por expressões diferentes. Em uma dessas representações, o núcleo da equação 1.1.22 é
substituı́do por r(t + τ )w(t). A importância desse tema está relacionada com o fato de que — como
se verá adiante — a correlação cruzada não é uma operação comutativa. Em conseqüência, o modelo
adotado para a correlação cruzada, qualquer que seja ele, deve ser usado de forma consistente.
1.1. INTRODUÇÃO 11

onde Φ representa o resultado da correlação cruzada entre duas funções hipotéticas r(t)
e w(t), ou duas séries rt e wt . Observe-se que a expressão 1.1.22 tem forma semelhante à
da equação 1.1.12, mas as variáveis de integração são diferentes: na correlação cruzada é
t, na convolução é τ .
Nas duas expressões que definem a correlação cruzada, o sı́mbolo τ indica um deslo-
camento de tempo. Assim, no caso discreto, quando τ = 0, as amostras das séries r t e wt
são multiplicadas sem qualquer deslocamento de tempo. A soma dos produtos obtidos,
nesse caso, corresponde ao coeficiente do deslocamento — em inglês, lag — igual a zero.
Por outro lado, um valor negativo de τ significa que as amostras das duas séries são
multiplicadas entre si depois que a série wt é deslocada na direção dos tempos menores.
No caso em que a segunda série correlacionada é invertida, com relação ao tempo, a
operação de correlação cruzada transforma-se em uma convolução. Para comprovar esta
caracterı́stica, basta, na equação 1.1.23, trocar o sinal do argumento do operador wt−τ ,
de forma a transformá-lo no operador wτ −t . O resultado é uma operação de convolução
já que, neste caso, a expressão 1.1.23 se transforma na 1.1.13. Portanto, aplica-se ao caso
a seguinte igualdade:
Φrw (τ ) = rt ∗ w−t = rt ⊗ wt (1.1.24)

Deve-se ressaltar que a troca de sinal do tempo, na segunda série correlacionada, faz com
que a operação de correlação cruzada não seja comutativa (obviamente, excetua-se o caso
em que as duas séries são simétricas). Por outro lado, quando as duas séries envolvidas
são complexas, a série w−t é substituı́da pelo conjugado complexo da série wt (ver o item
1.2).
Com base nas expressões 1.1.15 e 1.1.24 demonstra-se que, no domı́nio da transfor-
mada Z, a correlação cruzada, na forma da equação 1.1.23, é dada por

Φrw (Z) = R(Z)W (Z −1 ) (1.1.25)

onde o exponencial negativo de Z significa troca dos sinais dos expoentes do polinômio
W (Z). No domı́nio do tempo, a amostra de um determinado tempo t passa para o tempo
−t, mantendo o mesmo valor.
A forma da equação 1.1.25 torna óbvia uma importante propriedade da autocorrelação
de uma série qualquer (a correlação cruzada de uma série com ela mesma): a simetria,
em relação a τ = 0. Em outras palavras, quando uma série é correlacionada com ela
mesma, observa-se, na transformada Z obtida, a seguinte caracterı́stica: o coeficiente que
multiplica Z n , onde n é um ı́ndice qualquer, é igual ao coeficiente que multiplica Z −n .
Ver-se-á, neste e no Capı́tulo 3, que as funções de autocorrelação são muito aplicadas no
método sı́smico, em particular no caso da deconvolução.
Embora relativamente pouco usada nas aplicações sı́smicas, a forma mais geral da cor-
relação cruzada implica a inclusão de um fator de normalização igual à média geométrica
do deslocamento nulo das autocorrelações das duas funções, ou séries, envolvidas. O
resultado é:
R∞
−∞
r(t)w(t − τ )dt
Φrw (τ ) = hR R∞ i1/2 (1.1.26)
∞ 2 2
−∞
r (t)dt −∞ w (t)dt
12 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

e

P
rt wt−τ
t=−∞
Φrw (τ ) =  1/2 (1.1.27)

P ∞
P
rt2 wt2
t=−∞ t=−∞

O leitor familiarizado com as técnicas estatı́sticas deverá ter notado que estas duas ex-
pressões podem ser usadas para se calcular a covariância entre duas funções, ou séries,
desde que as médias de ambas já tenham sido previamente removidas. Ou seja, a co-
variância pode ser vista como uma correlação cruzada entre funções, ou séries, cujas
médias são iguais a zero.

1.2 Transformada de Fourier


O sinal sı́smico é normalmente representado em função do tempo e das coordenadas espa-
ciais. Entretanto, em muitas circunstâncias, torna-se altamente conveniente representar
o mesmo sinal no domı́nio da freqüência — seja ela temporal ou espacial —, para o quê se
faz uso da transformada de Fourier. Como exemplo desta conveniência, pode-se mencio-
nar que a equação da onda e suas aplicações geofı́sicas são mais facilmente compreendidas
no domı́nio freqüência-espaço do que no domı́nio tempo-espaço. Na mesma linha, concei-
tos fundamentais, como a integral de Kirchhoff, são bem mais facilmente demonstrados
com o auxı́lio das propriedades da transformada de Fourier. Por fim, muitos dos algo-
ritmos de processamento dos dados sı́smicos são conduzidos no domı́nio da freqüência.
Justifica-se assim uma análise minimamente detalhada do assunto, como a adotada neste
item.

1.2.1 Definições
Um traço sı́smico amostrado ao longo do tempo pode ser representado pela média de
um número finito de componentes senoidais e cossenoidais, cada um deles definido pela
freqüência, pela amplitude e pela fase, ou atraso de tempo, em relação à origem (tempo
igual a zero), como no exemplo da Figura 1.5, na qual este atraso é nulo. Para definir
a contribuição de cada componente, os dados, amostrados em função do tempo, são
convertidos para uma nova representação, com amostragem em função da freqüência.
Caracteriza-se assim a mudança do domı́nio do tempo para o domı́nio da freqüência,
o que é feito através da transformada de Fourier. Esta mudança de domı́nio pode ser
representada pelo par
st ⇔ S(ω)
ou pela igualdade
S(ω) = F{st }
onde F simboliza transformada de Fourier, st é a série de tempo e S(ω) é a função que,
no domı́nio da freqüência, equivale a st .
A transformada de Fourier é fundamentada no conceito de séries de Fourier, de acordo
com o qual pode-se representar cada valor de uma função através da soma dos termos de
séries trigonométricas convergentes. No caso de funções discretas, a expressão que define
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 13

a transformada de Fourier pode ser obtida de forma simples, através da generalização


da transformada Z. Para isto, define-se Z de forma a estabelecer uma relação entre o
domı́nio do tempo e o da freqüência, ou seja,

Z = exp(iω∆t) (1.2.1)

onde i é a unidade de números imaginários, definido por i = −1. Aplicando-se, a esta
relação, a fórmula de Euler, obtém-se:

Z = exp(iω∆t) = cos (ω∆t) + i sen (ω∆t) (1.2.2)

Na forma da expressão 1.2.2, o número Z é definido em termos de um componente


real e um imaginário, os quais são ortogonais entre si, já que sen (ω∆t + π/2) é igual
a cos (ω∆t). Esta relação de ortogonalidade permite representar o número Z em um
sistema cartesiano, no qual as ordenadas são os números imaginários e as abscissas são
os números reais, caracterizando o chamado plano complexo.
No plano complexo, para cada freqüência angular ω, o número Z pode ser repre-
sentado como um vetor, cuja amplitude é igual a 1 e cuja fase é dada por ω∆t, como
representado na Figura 1.6. Para a freqüência arbitrária escolhida, o vetor da figura é
uma represnetação gráfica da transformada de Fourier do impulso unitário situado no
tempo t = ∆t, que tem transformada Z exatamente igual a Z. Adicionalmente, percebe-
se que, no intervalo de freqüências 0 ≤ ω ≤ 2ωN , ou seja, entre as freqüências zero e
duas vezes a de Nyquist, os diversos vetores possı́veis definem um disco de raio igual a 1,
denominado disco unitário (ou cı́rculo unitário).
Na computação da transformada de Fourier de funções discretas com número ar-
bitrário de pontos, substitui-se, na equação 1.1.11, o valor de Z, obtendo-se a seguinte
expressão:

X
S(ω) = sn exp(iωn∆t) (1.2.3)
n=−∞

Uma vez que o número Z pode ser representado no plano complexo como um vetor, a
transformada de Fourier, nos termos da equação 1.2.3, pode ser representada, no mesmo
plano, e para cada freqüência, como uma soma vetorial. Nesta forma, cada termo do
polinômio em Z seria um vetor com amplitude |sn |, a ser adicionado aos anteriores, de
acordo com um ângulo, entre o vetor e o eixo real, dado por
 
sn π
θ = ωn∆t + 1 −
|sn | 2
onde θ é medido no sentido anti-horário. Observe-se que, se sn é negativo, acrescenta-se
o ângulo π a ωn∆t.
Na Figura 1.7, vê-se o exemplo da série dada por (3, 4, 5, 4, −6), a qual tem a primeira
amostra no tempo igual a zero. A transformada de Fourier da série, para o componente
de freqüência hipotético usado na figura, é representada pelo vetor resultante da soma.
Observe-se que o vetor correspondente ao coeficiente negativo, −6, é representado com
um deslocamento adicional de 1800 em relação aos demais.
Como em qualquer soma de vetores, a transformada de Fourier, para um determinado
componente de freqüência, pode ser estimada através da soma das projeções dos vetores
14 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

−400

−200
Tempo (ms)

200

400
0 10 20 30 40 S

Figura 1.5: Vinte e um componentes cossenoidais de freqüência de igual


amplitude e sua média, identificada pela letra S. Os números no eixo das
abscissas correspondem à freqüência em unidades de ciclos por segundo, ou
Hertz.

nos dois eixos cartesianos. Essa operação equivale à aplicação da fórmula de Euler à
equação 1.2.3, no que resulta:

X
S(ω) = sn [ cos (ωn∆t) + i sen (ωn∆t)] (1.2.4)
n=−∞

ou, substituindo-se o valor de ω por 2πf ,



X
S(f ) = sn [ cos (2πf n∆t) + i sen (2πf n∆t)] (1.2.5)
n=−∞

Separando-se os termos reais e imaginários, que correspondem às projeções nos dois eixos,
obtém-se: ∞
X
R(ω) = sn cos (ωn∆t) (1.2.6)
n=−∞
e ∞
X
I(ω) = sn sen (ωn∆t) (1.2.7)
n=−∞
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 15

Figura 1.6: Representação do número Z, no plano com-


plexo, para uma freqüência arbitrária.

Com estas expressões, a função S(ω) pode ser escrita da seguinte forma:

S(ω) = R(ω) + iI(ω)

Com o par de valores (R, I) obtido, pode-se agora calcular a amplitude A(ω) e a fase
φ(ω) do vetor correspondente à freqüência considerada, através da seguinte expressão:
p
A(ω) = |S(ω)| = R2 (ω) + I 2 (ω) (1.2.8)

e  
−1 I(ω)
φ(ω) = tan (1.2.9)
R(ω)
Na forma polar, tem-se:
S(ω) = A(ω) exp [iφ(ω)] (1.2.10)
ou seja,
S(ω) = A(ω) [ cos φ(ω) + i sen φ(ω)]
Se a amplitude e a fase forem computados para diversos valores de freqüência3 , pode-
se compor o que se convencionou chamar os espectros de amplitude e fase do sinal. Na
Figura 1.8, vê-se um exemplo desses espectros, juntamente com os componentes real,
R(ω), e imaginário, I(ω), em função da freqüência normalizada, f /2fN , ou ω/2ωN . A
figura representa também um exemplo do fato de que a transformada de Fourier de dados
3
Tipicamente, a transformada de Fourier de séries reais é computada apenas no intervalo de
freqüências 0 ≤ ω ≤ ωN .
16 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.7: Transformada de Fourier do sinal


(3, 4, 5, 4, −6) na forma vetorial, para uma freqüência ar-
bitrária.

discretos é periódica, ou seja, repete-se segundo um intervalo constante de freqüência,


igual a duas vezes a freqüência de Nyquist — uma decorrência natural das caracterı́sticas
das funções seno e cosseno. Assim, se uma série de tempo for real, como ocorre com
um traço sı́smico convencional, a correspondente transformada de Fourier apresenta as
seguintes propriedades:
A(ω) = A(2nωN − ω)
ou
R(ω) = R(2nωN − ω)
e
φ(ω) = −φ(2nωN − ω)
ou
I(ω) = −I(2nωN − ω)
onde n é o número inteiro mais próximo da razão ω/2ωN . Na aplicação destas expressões,
deve-se levar em conta que o espectro de amplitude e os componentes reais são funções
pares (simétricas em relação a ω = 0), enquanto o espectro de fase e os componentes
imaginários são funções ı́mpares (anti-simétricas em relação a ω = 0).
Até agora, falou-se da transformada de Fourier direta, ou seja, da passagem do domı́nio
do tempo para o da freqüência. A operação inversa, denominada transformada de Fourier
inversa, consiste em retornar ao domı́nio do tempo, a partir dos dados amostrados no
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 17

2.0

1.0
Amplitude

R
0

I
−1.0
−0.5
−1 0 0.5
1 1.0
2 1.5
3 2.0
4
Freqüência normalizada (número de ciclos)
2.0
Amplitude

1.0

0
−0.5 0 0.5 1.0 1.5 2.0
Freqüência normalizada (número de ciclos)
90

45
Fase (graus)

1.00

−45

−90
−0.5 0 0.5 1.0 1.5 2.0
Freqüência normalizada (número de ciclos)

Figura 1.8: Três representações da transformada de Fourier corres-


pondente ao binômio 1 − Z, em função da razão f /2f N , ou ω/2ωN : no
alto, os componentes real, R, e imaginário, I; no centro, o espectro de
amplitude; embaixo, o espectro de fase.

domı́nio da freqüência. Fisicamente, estima-se uma média dos diversos componentes de


freqüência, com as respectivas amplitude e fase, de forma a reconstituir o sinal original.
18 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Matematicamente, esta operação é semelhante à da transformada direta, e é definida por


N
X −1
1
st = N
S(n∆ω) exp(−in∆ωt) (1.2.11)
n=0

onde N é o número de pontos da função no domı́nio da freqüência e



∆ω =
N ∆t
É fácil estender a transformada de Fourier de dados discretos para o caso contı́nuo,
substituindo-se os somatórios das expressões 1.2.3 e 1.2.11 pelas integrais correspondentes,
que são
Z ∞
S(ω) = s(t) exp(iωt)dt (1.2.12)
−∞
e Z ∞
1
s(t) = 2π
S(ω) exp(−iωt)dω (1.2.13)
−∞

Deve-se destacar a convenção de sinal usada nestas duas expressões. Muitos autores
utilizam o expoente −iωt, em vez de iωt, na transformada direta (ver, por exemplo,
Sheriff e Geldart, 1985). Em termos práticos, entretanto, esta diferença reflete-se tão
somente em associar atraso a fase positiva (equações 1.2.12 e 1.2.13), ou atraso a fase
negativa (convenção de Sheriff e Geldart). O que realmente importa é utilizar de forma
consistente a convenção escolhida.

1.2.2 Teoremas da transformada de Fourier


Os teoremas fundamentais da transformada de Fourier são muito úteis em diversas áreas
da geofı́sica. Os principais deles, baseados no par

s(t) ⇔ S(ω)

são resumidos na Tabela 1.1 e discutidos em seguida.

1. Simetria
S(t) ⇔ 2π s(−ω) (1.2.14)
onde s representa a função anteriormente relacionada ao tempo, enquanto S re-
presenta a função anteriormente relacionada à freqüência. Este teorema pode ser
demonstrado com base em duas operações. Inicialmente, estima-se s(−t), a partir
de S(ω), com a equação 1.2.13:
Z ∞
2π s(−t) = S(ω) exp(iωt)dω
−∞

Trocando-se t por ω e vice-versa, a equação obtida não se altera. Logo,


Z ∞
2π s(−ω) = S(t) exp(iωt)dt
−∞
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 19

Teorema Tempo Freqüência


Simetria S(t) 2π s(−ω)
Constante as(t) aS(ω)
Soma r(t) + w(t) R(ω) + W (ω)
Deslocamento (a) s(t − a) S(ω) exp(iωa)
Deslocamento (b) s(t) exp(iat) S(ω + a)
Escala (a) s(at) S(ω/a)/ |a|
Escala (b) s(t/a)/ |a| S(aω)
Convolução (a) r(t) ∗ w(t) R(ω)W (ω)
Convolução (b) 2πr(t)w(t) R(ω) ∗ W (ω)
Correlação r(t) ⊗ w(t) R(ω)W ∗ (ω)
1
Modulação (a) s(t) cos (ω0 t) 2
[S(ω − ω0 ) + S(ω + ω0 )]
1
Modulação (b) 2
[s(t − t0 ) + s(t + t0 )] S(ω) cos (ωt0 )
R∞ 1
R∞
Parseval (Rayleigh) r(t)w(t)dt 2π
R(ω)W ∗ (ω)dω
−∞ −∞

Derivada (a) ds/dt −iωS(ω)


Derivada (b) it s(t) dS/dω
Rt
Integral (a) s(t)dt S(ω)/(−iω)
−∞

Integral (b) s(t)/it S(ω)dω
−∞

Tabela 1.1: Teoremas da transformada de Fourier.

2. Constante
as(t) ⇔ aS(ω) (1.2.15)
ou seja, multiplicar uma função de tempo por uma constante a e calcular a trans-
formada de Fourier do resultado equivale a calcular a transformada de Fourier da
mesma função e multiplicar o resultado pela mesma constante.

3. Soma
r(t) + w(t) ⇔ R(ω) + W (ω) (1.2.16)
ou seja, a transformada de Fourier é igual à soma das transformadas de Fourier das
duas funções.

4. Deslocamento (a)
s(t − a) ⇔ S(ω) exp(iωa) (1.2.17)
ou
s(t − a) ⇔ AS (f ) exp [φ(f ) + 2πf a]
20 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Para se demonstrar este teorema, considere-se a seguinte igualdade:


s1 (t) = s(t − a)
A correspondente transformada direta de Fourier é:
Z ∞
S1 (ω) = exp(iωa) s(t − a) exp [iω(t − a)] d(t − a)
−∞

ou seja, para t0 = t − a,
S1 (ω) = S(ω) exp(iωa)
Assim, demonstra-se que a transformada de Fourier de uma função atrasada no
tempo é igual à transformada de Fourier da função original, multiplicada por um
operador que tem amplitude igual a 1 e fase linear em relação à freqüência, com
declividade proporcional ao atraso. Tratando-se de funções amostradas, se o atraso
é de uma amostra (a = ∆t), o operador correspondente é exatamente Z, o operador
de atraso unitário. Perceba-se também que, na convenção usada nesta apostila, um
atraso introduz fase linear com declividade positiva.
Deslocamento (b)
s(t) exp(iat) ⇔ S(ω + a) (1.2.18)

5. Escala (a)
1
s(at) ⇔ S( ω ) (1.2.19)
|a| a
Para se demonstrar este teorema, considere-se a igualdade
s1 (t) = s(at), a>0

A correspondente transformada direta de Fourier é:


Z
1 ∞  ω 
S1 (ω) = s(at) exp i at d(at)
a −∞ a
ou seja, para t0 = at,
1
S1 (ω) = S( ωa )
a
Por outro lado, se s1 (t) = s(−at), segue-se que
1
S1 (ω) = S(− ωa )
a
Logo, para qualquer valor de a diferente de zero,
1
S1 (ω) = S( ωa )
|a|
Assim, demonstra-se que: comprimir uma função de tempo de acordo com a cons-
tante a equivale a expandir o espectro correspondente e reduzir a amplitude, de
acordo com a mesma constante. Uma importante aplicação desta propriedade é:
s(−t) ⇔ AS (f ) exp [−iφS (f )] = S ∗ (f )
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 21

ou seja, multiplicar o tempo de uma função por −1, que corresponde a inverter a
mesma função no tempo, equivale, no domı́nio da freqüência, a trocar o sinal de
sua fase, ou, ainda, à obtenção do conjugado complexo da transformada de Fourier
da mesma função (define-se conjugado complexo de um número complexo como o
resultado da troca do sinal do componente imaginário do mesmo número).
Escala (b)
1 t
s( ) ⇔ S (aω) (1.2.20)
|a| a
6. Convolução (a)
r(t) ∗ w(t) ⇔ R(ω)W (ω) (1.2.21)
Para se demonstrar este teorema, toma-se s(t) = r(t) ∗ w(t), aplica-se a equação
1.1.12 e calcula-se a transformada de Fourier do resultado, o que leva a:
Z ∞Z ∞
S(ω) = r(τ )w(t − τ )dτ exp(iωt)dt
−∞ −∞

ou Z ∞ Z ∞
S(ω) = r(τ ) exp(iωτ )dτ w(t − τ ) exp [iω(t − τ )] dt
−∞ −∞

ou ainda
Z ∞ Z ∞
S(ω) = r(τ ) exp(iωτ )dτ w(t − τ ) exp [iω(t − τ )] dt
−∞ −∞

Logo,
S(ω) = R(ω)W (ω)
Assim, como no caso da transformada Z, uma convolução no domı́nio do tempo
equivale a uma multiplicação no domı́nio da freqüência. A expressão 1.2.21 pode
também ser escrita da seguinte forma:

r(t) ∗ w(t) ⇔ AR (ω)AW (ω) exp {i [φR (ω) + φW (ω)]}

ou seja, uma convolução, no domı́nio do tempo, corresponde, no domı́nio da fre-


qüência, ao produto dos espectros de amplitude e à soma dos espectros de fase das
funções envolvidas.
Convolução (b)
2πr(t)w(t) ⇔ R(ω) ∗ W (ω) (1.2.22)

7. Correlação
r(t) ⊗ w(t) ⇔ R(ω)W ∗ (ω) (1.2.23)
onde ∗ denota conjugado complexo. A mesma expressão equivale a

r(t) ⊗ w(t) ⇔ AR (ω)AW (ω) exp {i [φR (ω) − φW (ω)]} (1.2.24)

Este teorema pode ser demonstrado seguindo-se a mesma seqüência adotada na


demonstração do teorema da convolução. Para isto, substitui-se a equação 1.1.12
pela 1.1.22 e leva-se em conta que, no caso, t é a variável de integração.
22 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Com base na expressão 1.2.24, na qual se observa a subtração da fase da primeira


função pela da segunda, explica-se porque a autocorrelação é uma função simétrica,
ou seja, tem fase igual a zero. Em outras palavras, como a multiplicação de um
número complexo pelo seu conjugado complexo gera um número real, a transfor-
mada de Fourier da autocorrelação de um sinal (ou seja, o espectro de potência do
sinal) não tem componentes imaginários.
8. Modulação (a)
s(t) cos (ω0 t) ⇔ 21 [S(ω − ω0 ) + S(ω + ω0 )] (1.2.25)
Este teorema será deduzido adiante, com base na função delta de Dirac.
Modulação (b)
1
[s(t − t0 ) + s(t + t0 )] ⇔ S(ω) cos (ωt0 ) (1.2.26)
2
9. Parseval Z ∞ Z ∞
1
r(t)w(t)dt ⇔ 2π
R(ω)W ∗ (ω)dω (1.2.27)
−∞ −∞
Este é um resultado que decorre da aplicação das expressões 1.1.22, 1.2.13 e 1.2.23,
tomando-se, na primeira, τ = 0. O mesmo teorema é também atribuı́do a Rayleigh,
já que a versão original, de Parseval, foi definida apenas para o caso discreto.
10. Derivada (a)
ds
⇔ −iω S(ω) (1.2.28)
dt
Este teorema pode ser demonstrado derivando-se a expressão 1.2.13 com relação ao
tempo. Uma forma alternativa de apresentá-lo é:
ds
⇔ 2πf S(f ) exp(−i π2 )
dt
De acordo com o teorema da derivada, derivar uma função com relação ao tempo
equivale, no domı́nio da freqüência, a multiplicar o seu espectro de amplitude por
ω e subtrair 90 graus do seu espectro de fase. Para dados discretos, derivar uma
função equivale, no domı́nio do tempo, à seguinte operação:
dst
= st ∗ dt
dt
Nesta convolução, dt é um filtro definido por
cos (πt) 1 sen (πt)
dt = − (1.2.29)
t t πt
onde t é o ı́ndice da amostra. Ressalte-se que, no limite, o operador de derivada é
igual a zero, na amostra de ı́ndice zero. Nas demais amostras, o termo envolvendo
o seno é igual a zero.
Derivada (b)

dS
it s(t) ⇔ (1.2.30)

1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 23

Função Tempo Freqüência


Sinal sgn(t) = t/ |t| 2/(−iω)
Quadratura q(t) i sgn(ω) = sgn(ω) exp(iπ/2)
Delta s(t)δ(t − a) s(a) exp(iωa)
Degrau (Heaviside) u(t) πδ(ω) + 1/(−iω)

P ∞
P
Pente p(t) = δ(t − n∆t) ωR δ(ω − mωR )
n=−∞ m=−∞

Caixa (Box ) bτ (t) τ sinc(πf τ ) = τ sen (πf τ )/(πf τ )

Tabela 1.2: Funções especiais e suas transformadas de Fourier.

11. Integral (a)


Z t
S(ω)
s(t)dt ⇔ (1.2.31)
−∞ −iω
Este teorema pode ser demonstrado integrando-se a expressão 1.2.13 com relação
ao tempo. Uma forma alternativa de apresentá-lo é:
Z t
S(f )
s(t)dt ⇔ exp(i π2 )
−∞ 2πf

De acordo com o teorema da integral, integrar uma função de tempo equivale a


dividir seu espectro de amplitude por ω e somar 90 graus ao seu espectro de fase.
Integral (b) Z ω
s(t)
⇔ S(ω)dω (1.2.32)
it −∞

1.2.3 Funções especiais


Como os teoremas da transformada de Fourier, existem algumas funções especiais que
também são utilizadas em diversas áreas da geofı́sica. A definição das principais dessas
funções e as correspondentes transformadas de Fourier são resumidas na Tabela 1.2 e
apresentadas em seguida.

1. Sinal
t 2
sgn(t) = ⇔ (1.2.33)
|t| −iω

onde sgn(t) é igual a 1 para t > 0, é igual a −1 para t < 0 e não é definida para t = 0
(embora possa ser considerada igual a 0). Em uma multiplicação, aplicando-se o
teorema da convolução e a expressão 1.2.33, tem-se:

s(t)sgn(t) ⇔ iS(ω) ∗ q(ω)


24 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

onde q(ω) é o filtro de quadratura, usado na computação da chamada transformada


Hilbert (ver o item 1.5) e definido por
1
q(ω) = (1.2.34)
πω
ou, no caso discreto, por
1
qω = (1 − cos πω) (1.2.35)
πω
onde ω é o ı́ndice da amostra. Observe-se que, quando ω tende a zero, qω também
tende a zero. Ver-se-á em seguida que o filtro de quadratura aplica deslocamento
de fase igual a 90 graus em uma função.
2. Quadratura
q(t) ⇔ isgn(ω) = sgn(ω) exp(i π2 ) (1.2.36)
onde sgn(ω) é igual ω/ |ω| e q(t) é o filtro de quadratura, ou seja, o filtro definido
por
1
q(t) = (1.2.37)
πt
ou, no caso discreto, por
1
qt = (1 − cos πt) (1.2.38)
πt
onde t é o ı́ndice da amostra. Observe-se que, quando t tende a zero, qt também
tende a zero.
3. Delta
s(t)δ(t − a) ⇔ s(a) exp(iωa) (1.2.39)
onde a função δ, denominada delta de Dirac e genericamente representada por
δ(t − a), é igual a zero quando t 6= a e não é definida quando t = a. Ou seja, é
igual a zero quando t − a 6= 0 e não é definida quando t − a = 0. Aplica-se ao caso
a propriedade de enquadramento da função δ, na forma da seguinte equação:
Z ∞
δ(t − a)f (t)dt = f (a) (1.2.40)
−∞
ou Z ∞
s(t)δ(t − a) exp(iωt)dt = s(a) exp(iωa) (1.2.41)
−∞
Vê-se assim que, em uma integral, como é o caso da transformada de Fourier, a
função δ(t − a) faz com que o resultado seja dado pelo valor de f (t), na posição
t = a. Aplicando-se a função δ na direção oposta à da expressão 1.2.41, obtém-se:
F (ω0 ) exp(−iω0 t) ⇔ 2πF (ω)δ(ω − ω0 ) (1.2.42)
A versão discreta da função delta4 , que será muito usada nos capı́tulos 2 e 3, é
definida da seguinte forma:

1, t = a
δt−a =
0, t 6= a
4
A função delta foi originalmente proposta por L. Kronecker (1823-1891) na forma discreta. Nesta
forma, é freqüentemente representada por δij , onde os ı́ndices i e j exercem papel equivalente ao da
diferença t − a. Ou seja, i = j equivale a t − a = 0.
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 25

onde t e a são tratados como ı́ndices. Observe-se que ambas as versões da função
delta são iguais a zero quando t 6= a mas, quando t = a, a função delta discreta é
definida e tem valor igual a 1, enquanto a sua versão contı́nua, na mesma situação,
é indefinida. Aplica-se à função delta discreta a versão discreta da propriedade
expressa pela equação 1.2.40.
A função delta de Dirac é fundamental para a dedução do teorema da modulação,
que é representado pela expressão 1.2.25. Para isto, faz-se uso do teorema da
convolução e da seguinte aplicação da transformada inversa de Fourier, obtida com
base na fórmula de Euler:
Z ∞
1
cos (ω0 t) = 2π π [δ(ω − ω0 ) + δ(ω + ω0 )] exp(−iωt)dω (1.2.43)
−∞

Na demonstração, leva-se ainda em conta que S(ω − ω0 ) = δ(ω − ω0 ) ∗ S(ω) e que


S(ω + ω0 ) = δ(ω + ω0 ) ∗ S(ω).

4. Degrau (Heaviside)
1
u(t) ⇔ πδ(ω) + = U (ω) (1.2.44)
−iω
onde u(t) é a função degrau (step, ou Heaviside), definida por
1 1
u(t) = + sgn(t) (1.2.45)
2 2
Ou seja, u(t) é igual a zero para t < 0, é igual a 1/2 para t = 0 e é igual a 1 para
t > 0. Em uma forma mais geral, a função degrau é definida por

 1, t > a
1
u(t − a) = , t=a
 2
0, t < a

Por outro lado, a seguinte propriedade relaciona as funções delta e degrau:


du
= δ(t) (1.2.46)
dt
Deve-se destacar que as funções delta e degrau não são funções comuns, mas sim
de distribuição, como é o caso, por exemplo, do operador de derivada, d/dt.
Da mesma forma que a função delta, a função degrau tem uma versão discreta,
dada por 
1, t > a
ut−a =
0, t < a
onde t e a são tratados como ı́ndices. Na amostra de ı́ndice t = 0, a versão discreta
da função degrau pode assumir valor igual a 1, ou 1/2, dependendo da situação.

5. Pente ∞ ∞
X X
p(t) = δ(t − n∆t) ⇔ ωR δ(ω − mωR ) (1.2.47)
n=−∞ m=−∞
26 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Função Expressão algébrica


 
2πt
Hamming f (t) = 0.54 + 0.46 cos
τ
 
2πt
Hanning f (t) = 0.5 + 0.5 cos
τ
   
2πt 4πt
Blackman f (t) = 0.42 + 0.50 cos + 0.08 cos
τ τ
 α
2|t|
Triângulo modificada f (t) = 1 −
τ

Tabela 1.3: Algumas funções usadas no truncamento de séries de tempo.


O valor mı́nimo de t é igual a −τ /2, enquanto o máximo é τ /2; fora deste
intervalo, f (t) = 0. Na função “triângulo modificada”, α é um parâmetro
que controla a forma resultante: se for igual a 1, o resultado é a função
triângulo; se for igual a ∞, o resultado é a função caixa.

onde

ωR =
∆t
A função pente, multiplicada por uma função contı́nua, resulta na versão discreta
da mesma função. Ou seja,
st = p(t)s(t)

6. Caixa (Box )  
sen (πf τ )
bτ (t) ⇔ τ sinc(πf τ ) = τ (1.2.48)
πf τ
onde b é a função caixa (box ), a qual é igual a 1 para tempos entre −τ /2 e τ /2,
sendo τ um tempo qualquer, e é igual a zero para as demais posições. Por sua
vez, a função sinc apresenta zeros nas freqüências iguais a n/τ , sendo n um número
inteiro, e é igual a 1 para a freqüência zero. A autoconvolução da função caixa dá
origem à função triângulo, cuja transformada de Fourier é dada por τ 2 sinc2 (πf τ ).

As funções caixa e triângulo (também denominada Bartlett) são usadas no trunca-


mento de séries de tempo, operação esta que corresponde, no domı́nio da freqüência, a
uma suavização dos correspondentes espectros de amplitude. Outras funções da mesma
famı́lia são apresentadas na Tabela 1.3 (ver Oppenheim e Schafer, 1989).

1.2.4 Transformada bidimensional de Fourier


Até agora, a transformada de Fourier foi aplicada a funções de tempo. A mesma análise
pode ser estendida para o caso de um evento amostrado espacialmente, em um tempo
constante, substituindo-se o valor de Z, na forma da expressão 1.2.1, pela seguinte igual-
dade:
Z = exp(−iKx ∆x) (1.2.49)
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 27

onde Kx é a freqüência angular espacial associada ao eixo horizontal e definida com base
na equação 1.1.5.
A transformada de Fourier espacial tem diversas aplicações no processamento de dados
sı́smicos, em especial no cálculo da transformada bidimensional de Fourier (ω-Kx). Na
forma contı́nua e direta, esta transformada é definida por
Z ∞Z ∞
S̃(Kx , ω) = s(x, t) exp(iωt) exp(−iKx x)dtdx (1.2.50)
−∞ −∞

O leitor pode estar se questionando a respeito do sinal diferente nos dois expoentes dentro
da integral. Na verdade, trata-se apenas de uma convenção, igual à de Claerbout (1985),
a qual, se usada consistentemente, em nada afeta os resultados.
A operação inversa à da equação 1.2.50 é a transformada bidimensional inversa de
Fourier, dada por
Z ∞Z ∞
1
s(x, t) = (2π)2 S̃(Kx , ω) exp(−iωt) exp(iKx x)dωdKx (1.2.51)
−∞ −∞

Nas aplicações práticas da transformada de Fourier 2-D, obedece-se normalmente à


seguinte seqüência de operações: (1) tomando-se a matriz de dados s(x, t), calcula-se a
transformada de Fourier de cada traço sı́smico, que corresponde a uma coluna (tempo
variável, coordenada horizontal constante), obtendo-se como resultado uma nova matriz
S(x, ω), onde cada linha é agora uma coleção de componentes complexos de freqüência;
(2) tomando-se os dados de cada linha dessa nova matriz como entrada (freqüência cons-
tante, coordenada horizontal variável), calcula-se nova transformada de Fourier, obtendo-
se como resultado a matriz desejada S̃(Kx , ω). As freqüências angulares de álias, envol-
vidas nesse processo, são dadas por ωN = π/∆t e KxN = π/∆x, onde ∆t e ∆x são os
respectivos intervalos de amostragem.
É interessante ressaltar o que representa, no domı́nio tempo-distância, um impulso
unitário, amostrado no domı́nio ω-Kx. Considere-se, por exemplo, a parte superior da
Figura 1.9, na qual se vê um impulso unitário em uma posição particular do espectro
de freqüências. Na parte inferior da mesma figura, vê-se que o sinal correspondente,
no domı́nio t-x, é um evento com mergulho, freqüência espacial e freqüência temporal
constantes. Isto evidencia que uma operação qualquer sobre uma amostra isolada, no
domı́nio ω-Kx, afeta toda uma famı́lia de eventos com o mesmo mergulho, no domı́nio
tempo-distância.
No caso de uma matriz real, s(x, t), cuja transformada bidimensional de Fourier é
S̃(Kx , ω), observam-se algumas interessantes propriedades de simetria, relacionadas às
caracterı́sticas das funções seno e cosseno, propriedades estas sintetizadas através das
seguintes igualdades:
S̃(Kx , ω) = S̃ ∗ (−Kx , −ω) (1.2.52)
e
S̃(−Kx , ω) = S̃ ∗ (Kx , −ω) (1.2.53)
onde ∗ denota conjugado complexo.
A influência do efeito de álias sobre a transformada bidimensional de Fourier merece
uma discussão especı́fica. Considere-se, como exemplo, um sinal com declividade positiva
28 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.9: Impulso unitário no domı́nio freqüência-


distância (no alto) e sua transformada inversa de Fourier
(abaixo).

(Kx /ω > 0), situado na posição do espectro definida por ω < ωN . No caso em que
Kx = KxN + ∆Kx , onde ∆Kx < KxN , tem-se:

S̃(KxN + ∆Kx , ω) ⇒ S̃(−KxN + ∆Kx , ω)

Ou seja, S̃ é posicionado no quadrante II em vez do I. Na Figura 1.2 (página 4), pode-se


ver um exemplo da situação descrita, junto à posição identificada com o número 2.
Os filtros anti-álias temporal fazem parte do próprio equipamento de registro e, por
isto, os sinais em álias temporal são drasticamente atenuados. O mesmo não acontece no
caso da amostragem espacial que, por razões econômicas, tende a ser inadequada. Por
outro lado, como é possı́vel amostrar valores negativos de Kx , torna-se possı́vel aplicar,
durante o processamento, técnicas de reamostragem de dados em álias espacial, desde
1.2. TRANSFORMADA DE FOURIER 29

que o número de onda real não ultrapasse duas a três vezes o valor de KxN . Nas mesmas
circunstâncias, é também possı́vel atenuar ruı́dos em álias espacial.

1.2.5 A prática da transformada de Fourier


Nas atividades rotineiras, para se economizar tempo de processamento, a transformada de
Fourier, seja ela mono, bi ou trimensional, é normalmente executada através da chamada
FFT (Fast Fourier Transform), algoritmo que, utilizando algumas caracterı́sticas da
transformada de Fourier de dados discretos, permite reduzir substancialmente o número
de operações envolvidas. Inicialmente aplicável somente a número de pontos que fosse
potência de dois, a FFT evoluiu de forma a aceitar diversas outras opções.
A FFT introduz algumas diferenças com relação ao resultado esperado. Uma delas é
relacionada à causalidade: a FFT de uma função é computada como se todas as funções
fossem causais. Em conseqüência, a FFT inversa de uma função de fase nula (ou a
FFT inversa de qualquer função não causal) é tal que a primeira amostra do resultado
corresponde ao tempo igual a zero, enquanto a última corresponde ao tempo −∆t. Como
exemplo, suponha-se que uma FFT inversa de L pontos, onde L é par, gerou como
resultado a função f . Para se obter a função não causal s, com as posições das amostras
corrigidas, podem-se usar as seguintes expressões:
s (n + L/2) = f (n)
s(n) = f (n + L/2)

onde n é um número inteiro tal que 1 ≤ n ≤ L/2. As mesmas expressões são válidas
também para um número L ı́mpar, desde que se considere apenas a parte inteira da razão
L/2 e se tome o número n no intervalo 1 ≤ n ≤ L/2 + 1.
Um aspecto importante a discutir é a influência das operações, conduzidas no do-
mı́nio da freqüência, sobre os correspondentes resultados, no domı́nio do tempo. Neste
particular, é fundamental respeitar as propriedades de simetria da transformada de Fou-
rier. Assim, para se ter certeza de que o resultado das operações entre funções reais (não
complexas) é também real, é necessário garantir que, no domı́nio da freqüência, os com-
ponentes reais sejam simétricos e que os componentes imaginários sejam anti-simétricos,
nos dois casos em relação a ω = 0. Cuidados especiais devem ser tomados no que diz
respeito às freqüências ω = 0 e ω = ωN , cujos componentes imaginários, no mesmo caso,
devem ser anulados.
Uma distorção associada às operações no domı́nio da freqüência é o wraparound.
Trata-se do fenômeno gerado quando, no mesmo domı́nio, aumenta-se implicitamente
o comprimento dos dados originais, além do máximo previsto durante a transformada
direta de Fourier. Neste caso, a posterior transformada inversa de Fourier faz com que os
sinais adicionais apareçam em posições aparentemente inesperadas, dependendo de seu
comprimento. Assim, se o acréscimo for pequeno e introduzido artificialmente no final
do traço original, o número insuficiente de coeficientes da transformada de Fourier faz
com que os sinais correspondentes sejam superpostos às amostras situadas no inı́cio do
traço. Esta é uma distorção também associada à ciclicidade envolvida na versão discreta
da transformada de Fourier.
Outra distorção é observada quando se tenta representar uma descontinuidade através
das séries de Fourier. O normalmente reduzido número de termos faz com que a mesma
30 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

descontinuidade não seja corretamente representada, o que dá origem ao fenômeno Gibbs.
Este é um fenômeno bem definido no caso da função u(t), que é transformada em uma
nova função, na qual o degrau original é mantido, mas deformado por uma oscilação
cuja amplitude cai com a distância da descontinuidade. O leitor poderá associar esta
caracterı́stica à relação entre a função caixa, definida no domı́nio da freqüência, e sua
transformada inversa de Fourier, que é uma função sinc. Para ilustrar a idéia, considere-
se que a versão discreta da função δ(t − t0 ) seja numericamente integrada com relação
ao tempo e que esta operação seja conduzida no domı́nio da freqüência. No domı́nio do
tempo, o resultado desejado deveria ser a versão discreta da função u(t−t 0 ). Entretanto, o
truncamento implı́cito na escolha de um número finito de coeficientes para a transformada
de Fourier faz com que o resultado envolva a convolução com uma função sinc definida
com base na freqüência de Nyquist, a qual representa o limite das harmônicas usadas no
processo. Na Figura 2.23 (página 105), apresenta-se um exemplo do fenômeno.
As caracterı́sticas das funções sinc e caixa são muito utilizadas na interpolação de
séries de tempo ou espaço. Um exemplo: quando se deseja reamostrar uma série para
um intervalo de amostragem igual à metade do original, estende-se o correspondente
espectro de freqüências até o dobro da freqüência de Nyquist, garante-se que o intervalo
estendido seja igual a zero e retorna-se ao domı́nio do tempo com o dobro do número de
pontos original. Respeitadas as propriedades de simetria da transformada de Fourier, o
resultado é o sinal reamostrado5 . No domı́nio do tempo, a mesma reamostragem pode
ser feita através da convolução entre a série original, intercalada com zeros, e a função
sinc cuja transformada de Fourier é a função caixa responsável por anular a região acima
da freqüência de Nyquist original.
A mesma lógica pode ser utilizada para se ilustrar o teorema da amostragem, de
Shannon, apresentado no subitem 1.1.1. No caso, considerando-se uma harmônica iso-
lada, f0 , é claro que, no domı́nio do tempo, ela só pode ser integralmente reconstituı́da
através de interpolação se o intervalo de amostragem original for menor do que 1/2f 0 . Se
esta condição não fosse satisfeita, a mesma harmônica estaria situada na região anulada
pela técnica descrita no parágrafo anterior e, portanto, não poderia ser adequadamente
reconstituı́da.

1.3 Propriedades das Séries de Tempo


O conhecimento das propriedades das séries de tempo é fundamental para o desenvol-
vimento de processos inversos que, aplicados aos dados sı́smicos, objetivam obter in-
formações sobre a subsuperfı́cie. Temas como o comportamento da fase e da amplitude
de um sinal, assim como as propriedades estatı́sticas dos ruı́dos e da série de coeficientes
de reflexão, representam a base para a aplicação de inúmeros conceitos, o mais importante
dos quais é a deconvolução.

5
Para demonstrar a validade do processo, basta observar que, no domı́nio da freqüência, o mesmo
resultado seria obtido se a transformada de Fourier da série original, amostrada com o intervalo desejado,
fosse multiplicada por uma função caixa que anulasse a região acima da metade da freqüência de Nyquist.
1.3. PROPRIEDADES DAS SÉRIES DE TEMPO 31

1.3.1 Caracterı́sticas de fase dos sinais amostrados


Os sinais podem ser classificados em função das propriedades de seu espectro de fase. No
caso dos sinais causais, ou seja, aqueles definidos apenas para tempos não negativos, a
fase pode ser classificada em três tipos básicos: mı́nima, misturada e máxima. Para que
se possa caracterizar melhor as propriedades de fase citadas, faz-se uso de um modelo do
traço sı́smico baseado em transformada Z.
Sabe-se que, como qualquer polinômio, a transformada Z de um sinal pode ser fa-
torada nos seus diversos binômios. Desta forma, é possı́vel a utilização de um modelo
segundo o qual um traço sı́smico pode ser reconstituı́do através da multiplicação entre
binômios em Z obtidos a partir da fatoração da transformada Z do traço. No domı́nio
do tempo, isto significa que o traço sı́smico pode ser reconstituı́do pela convolução en-
tre as funções discretas de dois pontos correspondentes aos binômios, ou pelo seguinte
produtório de binômios em Z:
N
Y
S(Z) = cBn (Z) (1.3.1)
n=1

onde c é um fator de escala e n é o ı́ndice que identifica cada binômio.


Por outro lado, sabe-se que, no domı́nio da freqüência, a fase do traço sı́smico pode
ser reconstituı́da pela soma das fases correspondentes aos binômios. Ou seja,
N
X
φS (ω) = φn (ω) (1.3.2)
n=1

onde n se refere ao ı́ndice que identifica o binômio.


Assim sendo, verifica-se que uma melhor compreensão da fase do traço sı́smico passa
por uma boa análise do que ocorre com cada um dos binômios. Tomando-se um binômio
hipotético B(Z), tem-se:
B(Z) = β + Z
onde β pode ser um número complexo ou real. Assume-se, por enquanto, que se trata de
um número real.
No domı́nio da freqüência, tem-se:

B(ω) = β + exp(iω∆t) = β + cos ω∆t + i sen ω∆t

Como β é um número real, a fase de B(ω) pode ser descrita por


 
−1 sen ω∆t
φB (ω) = tan (1.3.3)
β + cos ω∆t

Sabendo-se que o operador Z define no plano complexo um cı́rculo unitário (ver o


item 1.2), ou seja, que a amplitude é constante e igual a 1, deve-se analisar o binômio
B(Z) de acordo com dois casos: (1) |β| < 1 e; (2) |β| > 1. Nos dois casos, variando-se a
freqüência entre zero e duas vezes a freqüência de Nyquist, o que corresponde ao intervalo
0 ≤ ω∆t ≤ 2π, pode-se obter um modelo de comportamento da fase, em função do valor
de β.
32 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.10: Representação do binômio 0.5 + Z no plano


complexo (no alto) e o correspondente espectro de fase (em-
baixo).

No primeiro caso, ilustrado na Figura 1.10, assume-se que β = 1/2. Para alguns
componentes de freqüência, obtêm-se os seguintes valores de fase: ω∆t = 0, φ = 0;
ω∆t = π, φ = π; ω∆t = 2π, φ = 2π. Assim, para β real e |β| < 1, pode-se afirmar,
quanto à fase do binômio:
φ(ωN ) = φ(0) + π
ou seja, a fase na freqüência de Nyquist (ω∆t = π) é igual à fase na freqüência zero mais
1.3. PROPRIEDADES DAS SÉRIES DE TEMPO 33

π. No caso mais genérico, para β qualquer, inclusive complexo, o modelo geral para a
fase desse tipo de binômio é:
φ(2ωN ) = φ(0) + 2π
O binômio analisado, que tem raiz dentro do cı́rculo unitário (Z = −1/2), apresenta
caracterı́sticas de fase máxima. Ou seja, a fase atinge a máxima variação possı́vel no
intervalo 0 ≤ ω∆t ≤ 2π. Observe-se que, quando β é real, a equação 1.3.3 garante esta
caracterı́stica, já que: (1) se β tender a zero, a fase tenderá a ω∆t; (2) nos pontos em
que ω∆t é múltiplo de π, a fase é igualmente múltipla de π, para qualquer valor de β
com módulo menor do que 1.
No segundo caso, ilustrado na Figura 1.11, assume-se que β = 2. Para alguns com-
ponentes de freqüência, obtêm-se os seguintes valores de fase: ω∆t = 0, φ = 0; ω∆t = π,
φ = 0; ω∆t = 2π, φ = 0. Assim, para β real e |β| > 1 , pode-se afirmar, quanto à fase do
binômio:
φ(ωN ) = φ(0)
ou seja, a fase na freqüência de Nyquist (ω∆t = π) é igual à fase na freqüência zero. No
caso mais genérico, para β qualquer, inclusive complexo, o modelo geral para a fase desse
tipo de binômio é:
φ(2ωN ) = φ(0)
O segundo binômio analisado, que tem raiz fora do cı́rculo unitário (Z = −2), apre-
senta caracterı́sticas de fase mı́nima. Ou seja, a fase atinge a mı́nima variação possı́vel
no intervalo 0 ≤ ω∆t ≤ 2π. Observe-se que, quando β é real, a equação 1.3.3 garante
esta caracterı́stica, já que: (1) o denominador correspondente tem sempre o mesmo si-
nal e é sempre diferente de zero, fazendo com que a fase se restrinja a dois quadrantes
(900 > φ > −900 , para β positivo e 2700 > φ > 900 , para β negativo); (2) tanto para
ω = 0 quanto para ω = ωN e ω = 2ωN , o numerador é igual a zero.
A fase está intimamente associada ao atraso, de acordo com o que estabelece o teorema
do atraso da energia, de E. Robinson. De acordo com o mesmo teorema, para dois sinais
com a mesma energia total, um de fase mı́nima, outro de fase máxima, a energia do
sinal de fase mı́nima concentra-se nos tempos iniciais, enquanto a energia do sinal de fase
máxima concentra-se nos tempos finais. No caso dos dois binômios analisados, constata-
se esta caracterı́stica através de simples inspeção dos valores dos coeficientes envolvidos.
Assim, fase mı́nima pode ser considerada sinônimo de atraso mı́nimo, o que, por sua vez,
conduz à idéia de maior concentração de energia no inı́cio do sinal.
Com base nas expressões 1.3.1 e 1.3.2, pode-se generalizar esses conceitos para um
sinal com qualquer número de pontos. Assim, se um sinal qualquer for constituı́do apenas
por binômios de fase mı́nima, ele terá fase também mı́nima. No caso oposto, o de um
sinal constituı́do apenas por binômios de fase máxima, ele terá fase também máxima. A
mistura de binômios de fase mı́nima e máxima em um sinal dá origem à fase misturada.
Na Figura 1.12, vêem-se exemplos dos três tipos de sinal, todos com o mesmo espectro
de amplitude. Percebe-se, na figura, a maior concentração de energia no inı́cio do sinal
de fase mı́nima, em comparação com os outros dois.
Na geração da Figura 1.12, todos os binômios usados apresentam raı́zes reais, o
que resultou em uma série de tempo também real. Em uma situação mais realista,
podem ocorrer binômios com raı́zes imaginárias. Neste caso, para que a série resultante
seja real é necessário que a cada binômio com raiz imaginária, eventualmente existente,
34 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.11: Representação do binômio 2.0 + Z no plano


complexo (no alto) e o correspondente espectro de fase (em-
baixo).

corresponda outro, cuja raiz seja o conjugado complexo da raiz do primeiro. Nestas
condições, o produto dado pela equação 1.3.1 não daria origem a coeficientes complexos
na transformada Z resultante. Como resultado, um sinal real de fase mı́nima teria fase na
freqüência de Nyquist igual à fase na freqüência zero, como no segundo binômio analisado
acima.
Até agora, analisou-se a fase de sinais causais, ou seja, as funções que não apresentam
informação em tempos negativos. Além da aplicação a diversos temas discutidos nos
próximos itens, o conceito de causalidade pode ser muito útil na caracterização da fase
das séries de tempo, especialmente quando se analisam as correspondentes inversas. No
caso do binômio de fase máxima, 0.5 + Z, a inversa pode ser dada por

1
= 2 − 4Z + 8Z 2 − · · ·
0.5 + Z
1.3. PROPRIEDADES DAS SÉRIES DE TEMPO 35

Amplitude

Mínima Máxima Misturada


0 16 0 16 0 16
Tempo (intervalos de amostragem)

Figura 1.12: Três pulsos com o mesmo espectro de amplitude e dife-


rentes caracterı́sticas de fase, gerados através de binômios de fase mı́nima
definidos por Bn (Z) = 1 + (−1)n−1 0.95n Z e binômios de fase máxima
definidos por Bn (Z) = (−1)n−1 0.95n + Z, onde n variou entre 1 e 16.

ou, alternativamente, por


1 1
= = Z −1 − 0.5Z −2 + 0.25Z −3 − · · ·
0.5 + Z Z (1 + 0.5Z −1 )

É interessante observar que, nesta última forma, um binômio de fase máxima é visto
como o conjugado complexo de um binômio de fase mı́nima, deslocado no tempo em
uma amostra. Por outro lado, uma análise das duas diferentes inversas permite induzir
que a primeira delas não converge e, por isto, não tem qualquer valor prático, enquanto a
segunda, que é anti-causal, é uma série convergente. Caracteriza-se assim uma importante
propriedade dos sinais de fase máxima: apresentam inversas causais instáveis e inversas
anti-causais estáveis.
No caso do binômio de fase mı́nima 2 + Z, a inversa pode ser dada por
1
= 0.5 − 0.25Z + 0.125Z 2 − · · ·
2+Z
ou, alternativamente, por
1 1
= = Z −1 − 2Z −2 + 8Z −3 − · · ·
2+Z Z (1 + 2Z −1 )

Uma análise das duas diferentes inversas permite induzir que a primeira delas, cau-
sal, é convergente, enquanto a segunda, anti-causal, não converge, ou seja, é instável.
Caracteriza-se assim uma importante propriedade dos sinais de fase mı́nima: apresentam
inversas causais estáveis e inversas anti-causais instáveis.
Portanto, os binômios de fase máxima e mı́nima podem ser separados também com
base em suas inversas: os binômios de fase mı́nima, causais, apresentam inversas conver-
gentes também causais, ao contrário dos binômios de fase máxima, causais, cujas inversas
36 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

convergentes são anti-causais. Generalizando-se, para o caso de qualquer raiz, as inversas


estáveis dos binômios de fases máxima e mı́nima são dadas por
1
−1
Bmax (Z) = = Z −1 − βZ −2 + β 2 Z −3 − · · · , (1.3.4)
β+Z
para |β| < 1, e
1 1 1 1
−1
Bmin (Z) = = − 2 Z + 3 Z2 − · · · , (1.3.5)
β+Z β β β
para |β| > 1.
Com o conceito de causalidade, é possı́vel prever a existência de séries reais, cujos
espectros de fase satisfazem a propriedade φ(ωN ) = φ(0) e que não são de fase mı́nima.
Para que isto seja possı́vel, é necessário que estas séries sejam não causais, ou seja, tenham
amostras significativas em tempos negativos. Por outro lado, uma série não causal pode
ser analisada como uma série causal, isolando-se o efeito do deslocamento de tempo
em relação à origem, que corresponde a um simples componente linear de fase (ver as
propriedades da transformada de Fourier, no item 1.2).
As funções de fase nula, que não são causais, apresentam uma particularidade que
merece destaque: são funções simétricas em relação a t = 0. Para que uma série de
tempo seja simétrica, em relação a um tempo qualquer, e não só à origem, é necessário
que sua transformada Z possa ser fatorada em binômios de dois tipos: (1) binômios de
fase mı́nima com raı́zes dadas por β, sendo |β| > 1; (2) binômios de fase máxima, com
raı́zes dadas por 1/β. Adicionalmente, a transformada Z de uma série simétrica deve ter
igual número de binômios de cada um dos dois tipos. Em conseqüência, a fase de uma
série simétrica será caracterizada por um componente linear, associado ao tempo entre a
amostra central da série e a origem. Obviamente, se a amostra central coincidir com a
origem, ela terá fase igual a zero.
Uma importante propriedade da fase dos sinais deve ser destacada: conhecendo-se o
espectro de amplitude de um sinal, é possı́vel determinar o equivalente espectro de fase
mı́nima, desde que não ocorram componentes de freqüência com amplitude igual a zero.
Em outras palavras, é possı́vel determinar um sinal com caracterı́sticas de fase mı́nima, a
partir de qualquer espectro de amplitude que não tenha valores nulos. No item 1.5, serão
discutidas algumas técnicas desenvolvidas com essa finalidade.

1.3.2 As séries aleatórias


Uma série de tempo pode ser analisada com base em dois diferentes enfoques. No pri-
meiro, procura-se representá-la como o resultado de um processo determinı́stico. Isto
equivale a dizer que o valor correspondente a um determinado coeficiente da série é exa-
tamente previsı́vel. Um exemplo: se deixarmos cair uma pedra, o espaço percorrido por
ela pode ser descrito na forma de uma série de tempo cujos coeficientes são g(k∆t) 2 /2,
onde g é a constante gravitacional, k é o ı́ndice de cada termo da série e ∆t é o intervalo
de tempo entre medidas. É fácil induzir que, na representação determinı́stica de uma
série de tempo, a única chance de erro reside no modelo empregado e nos parâmetros que
definem cada um de seus termos.
Em inúmeras circunstâncias, um processo não pode ser descrito de forma determi-
nı́stica, seja porque ainda não se dispõe de um modelo adequado, seja porque o número
1.3. PROPRIEDADES DAS SÉRIES DE TEMPO 37

de parâmetros necessários para descrevê-lo é exageradamente grande. Fortuitamente,


muitos processos desse tipo podem ser tratados, de forma relativamente bem-sucedida,
com base na teoria da probabilidade6 . Esta é a base para a definição dos chamados
processos estocásticos, nos quais uma variável pode ser estimada apenas através de uma
distribuição probabilı́stica.
Para se analisar o assunto, considere-se que seja possı́vel acionar uma fonte de ruı́do
infinitas vezes. Considere-se ainda que, a cada acionamento da fonte, seja possı́vel regis-
trar um valor isolado do ruı́do em uma mesma posição espacial, no mesmo tempo t0 , o
qual é medido a partir do acionamento da fonte. O conjunto de todos os valores possı́veis,
assim obtidos, recebe em inglês o nome de ensemble.
Assumindo-se que o processo responsável pela geração de um ruı́do seja estocástico,
segue-se que um valor isolado da ensemble correspondente, identificado como uma variável
aleatória, deve ser estimado com base no valor esperado, o qual é definido por
E(x) = µ (1.3.6)
onde E(x) é o valor esperado para x e µ é a média verdadeira de toda a população,
ambos referentes ao ruı́do. Um exemplo simples: o valor médio das rendas das famı́lias
brasileiras representa o valor esperado para a renda de uma famı́lia.
A igualdade 1.3.6 é fundamental para o entendimento dos conceitos sumarizados na
Tabela 1.4, os quais se aplicam a séries aleatórias ou a processos estocásticos em geral.
Representam-se na tabela conceitos relativos a uma população completa e a uma amos-
tragem de N indivı́duos da mesma população. Observe-se que a média da população total
corresponde a uma média ponderada pela freqüência de ocorrência, a qual é dada pela
função de densidade probabilı́stica, p(x). Em muitos casos, esta função não é conhecida,
embora comumente se assuma que ela pode ser descrita pela seguinte equação, obtida
por DeMoivre e usada, na teoria da probabilidade, por Gauss:
 
1 (x − µ)2
p(x) = √ exp − (1.3.7)
σ 2π 2σ 2
onde σ é o desvio padrão. Neste caso, as infinitas variáveis aleatórias da população
assumem valores cuja freqüência de ocorrência é caracterizada por uma distribuição dita
normal, ou gaussiana.
No exemplo da fonte de ruı́dos, apresentado acima, admitiu-se que as medidas foram
feitas em um tempo constante. No método sı́smico, a situação mais comum é diferente,
já que, normalmente, o conjunto de amostras é uma função do tempo. Nestas condições,
assume-se que as séries aleatórias são geradas por um processo ergódico, ou seja, um
processo ao qual se aplica a seguinte igualdade (ver, por exemplo, Kanasewich, 1975):
Z ∞ Z
1 0
µ= xp(x)dx = lim f (t)dt (1.3.8)
−∞ T →∞ T −T

onde T é o tempo envolvido na amostragem e f (t) é a função temporal correspondente


à população representada por x. De acordo com esta expressão, pode-se estimar o valor
de uma variável aleatória com base na amostragem feita ao longo do tempo passado.
6
A este respeito, vale a pena registrar uma frase de Arthur Weglein: “Devemos apelar para a estatı́stica
somente quando estivermos cansados.” Ou seja, em muitos casos, o tratamento estatı́stico é fruto da
ausência de esforço na busca de um modelo determinı́stico teoricamente possı́vel.
38 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Conceito População total Amostragem Relação


R∞ N
P
Média µ= xp(x)dx x̄ = N1 xk E(x̄) = µ
−∞ k=1
R∞ 1
N
P
Variância σ2 = (x − µ)2 p(x)dx d2 = N −1
(xk − x̄)2 E(d2 ) = σ 2
−∞ k=1
R∞ N
P
1
20 momento µ2 = x2 p(x)dx x̄2RM S = N
x2k E(x̄2RM S ) = µ2
−∞ k=1
R∞ N
P
Potência Π= x2 dx P = x2k E(P ) = Π
−∞ k=1

Tabela 1.4: Conceitos empregados na análise de séries aleatórias, com ou sem amos-
tragem. Legenda: p(x) é a função de densidade probabilı́stica, N é o número de pontos
da amostragem e x̄RM S é a média RM S, ou Root Mean Square.

Operação Valor esperado Variância


Soma E(x + y) = µx + µy σx2 + σy2
Diferença E(x − y) = µx − µy σx2 + σy2
Média E(x̄) = µx σx2 /N
Constante E(kx) = kE(x) = kµx k 2 σx2

Produto E(xy) = E(x)E(y) = µx µy σx2 σy2 + σx2 µ2y + σy2 + σy2 (µ2x + σx2 )
Quadrado E (x2 ) = µ2x + σx2 σx4 + 2σx2 (µ2x + σx2 )

Tabela 1.5: Operações envolvendo séries aleatórias. Observação: x e y represen-


tam populações independentes, ou amostragens independentes da mesma população
(neste caso, σx2 = σy2 ).

A igualdade 1.3.8 é freqüentemente aplicada em conjunto com o conceito de estaci-


onariedade. De acordo com este conceito, uma série é estacionária se suas propriedades
estatı́sticas não variam com o tempo. Em termos práticos, isto significa que a média e
a variância de uma série, em um dado intervalo de tempo, devem ser iguais à média e à
variância da mesma série em outro intervalo de tempo. Pode-se assim dizer que o valor
esperado para um coeficiente de uma série estacionária não depende da origem da mesma
série.
Com esses conceitos, parte dos quais foram incluı́dos na Tabela 1.4, pode-se deduzir7
as propriedades apresentadas na Tabela 1.5 (ver Mack, 1975). As duas tabelas resumem o
conhecimento necessário para se avaliar o resultado de importantes operações envolvendo
séries aleatórias de tempo. Este é o caso das operações de correlação cruzada apresenta-
das na Tabela 1.6, as quais podem ser consideradas representativas de muitas situações
práticas.
7
Com agradecimentos a Reneu Rodrigues.
1.3. PROPRIEDADES DAS SÉRIES DE TEMPO 39

Operação Resultado TF
1 xt ⊗ xt Px δ τ Px
2 xt ⊗ (−xt ) −Px δτ −Px
3 xt ⊗ y t 0 0
4 (xt + st ) ⊗ (xt + st ) Px δτ + Φss (τ ) Px + S(ω)S ∗ (ω) = Px + |S(ω)|2
5 (xt + st ) ⊗ (yt + st ) Φss (τ ) S(ω)S ∗ (ω) = |S(ω)|2
6 (xt ∗ wt ) ⊗ (xt ∗ wt ) Px Φww (τ ) Px W (ω)W ∗ (ω) = Px |W (ω)|2

Tabela 1.6: Correlações cruzadas e as correspondentes transformadas de


Fourier (TF) envolvendo duas séries de ruı́do aleatório (x t e yt ) e uma de sinal
(st ). As médias das três séries são iguais a zero e as duas séries de ruı́do repre-
sentam amostragens independentes de um mesmo processo aleatório. Legenda:
⊗ denota correlação cruzada, P representa a potência da série identificada pelo
subscrito, wt é um filtro qualquer, δ é a versão discreta da função delta e τ é
o deslocamento da função de correlação cruzada, Φ.

Os conceitos resumidos pelas tabelas 1.5 e 1.6 são extremamente importantes para o
entendimento de três assuntos em particular: a deconvolução de dados sı́smicos, a razão
sinal/ruı́do e a atenuação dos ruı́dos aleatórios. O primeiro desses temas será discutido
com algum detalhe no item 1.4 e no Capı́tulo 3. Os outros dois assuntos merecem uma
análise especı́fica neste item já que, nos demais, serão tratados de forma superficial.
Considere-se que se deseja estimar a razão sinal/ruı́do, ou seja, a razão entre a potência
do sinal, Ps , e a do ruı́do aleatório, Pn , de um determinado traço sı́smico a, tomando-se
o vizinho, b, como referência. Para isto, assume-se que: (1) cada traço é o resultado da
soma do sinal, s, e do ruı́do respectivo, na , ou nb ; (2) o sinal é o mesmo nos dois traços e
a média correspondente é igual a zero; (3) as médias das duas séries de ruı́do são iguais
a zero e; (4) as duas séries de ruı́do apresentam a mesma variância ou, em função da
premissa anterior, a mesma potência, Pn .
Levando em conta que a média de cada um dos traços sı́smicos a e b é igual a zero,
o coeficiente de correlação entre os dois traços — a razão entre a covariância e a raiz
quadrada do produto das duas variâncias — pode ser escrito da seguinte forma:
P
(s + na )k (s + nb )k
Φab (0) k
r= = 1/2  1/2 (1.3.9)
[Φaa (0)Φbb (0)]1/2 P 2 P 2
(s + na )k (s + nb )k
k k

onde Φ(0) denota o deslocamento nulo da correlação cruzada entre as funções identificadas
pelos subscritos. Aplicando-se a esta expressão os resultados de número 4 e 5 da Tabela
1.6 e levando em conta as premissas adotadas, o coeficiente de correlação passa a ser
dado por
Ps
r=
Ps + P n
40 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Uma vez que a razão sinal/ruı́do é dada por R = Ps /Pn , segue-se que r = R/(R + 1).
Tem-se assim a seguinte expressão para a razão sinal/ruı́do:
r
R= (1.3.10)
1−r
O último tema a discutir neste item é a atenuação dos ruı́dos aleatórios. A este
respeito, pode-se perguntar como um ruı́do aleatório de média igual a zero, que contamina
um conjunto de N traços sı́smicos, é afetado pela aplicação da média, amostra a amostra,
ao mesmo conjunto de traços. A resposta a esta pergunta fundamenta-se na propriedade
da média, apresentada na Tabela 1.5, de acordo com a qual o valor esperado para a
variância correspondente é dado por σ 2 /N , onde σ 2 é a variância do ruı́do. Este resultado
permite a seguinte e importante conclusão: se um conjunto de N traços, contaminados por
ruı́do
√ aleatório, for submetido a uma média aritmética, a média RMS do ruı́do resultante
é N vezes menor do que a original. Este é um conceito fundamental para o sucesso da
técnica CDP.

1.4 O Filtro Wiener-Hopf-Levinson


Os filtros mais aplicados no método sı́smico são agrupáveis em duas famı́lias distintas.
Na primeira delas, o cálculo do operador não depende diretamente dos dados a serem
filtrados. Um exemplo é o dos filtros passa-banda, que são especificados com base em
modelos para o comportamento espectral do sinal sı́smico. Na segunda famı́lia, o operador
é estimado com base nos próprios dados a serem filtrados. Este é o caso do filtro Wiener-
Hopf-Levinson (WHL).
No método sı́smico, o filtro WHL exerce um papel especial. Sua forma original foi
desenvolvida por Norbert Wiener e Eberhard Hopf ainda nos anos 1930. No final dos
anos 1940, Norman Levinson enriqueceu profundamente a técnica, introduzindo um al-
goritmo que permite correlacioná-la diretamente com processos fı́sicos que afetam o sinal
sı́smico. Ver-se-á neste item e nos capı́tulos 2 e 3 que o filtro WHL é fundamental para
o entendimento e o tratamento do sinal sı́smico.

1.4.1 O filtro Wiener-Hopf


Na aplicação de um filtro de forma, procura-se obter um determinado sinal, dt , a partir
de um sinal conhecido, st . Isto quer dizer que é necessário calcular o filtro ft tal que

st ∗ f t = d t

Em situações realistas, o resultado da aplicação do filtro ft à série st corresponde geral-


mente a uma aproximação do sinal dt . O erro remanescente é dado por

et = d t − a t (1.4.1)

onde
at = f t ∗ s t
Pode-se agora apresentar o problema fundamental do filtro Wiener-Hopf: como esti-
mar o filtro ft que, aplicado à série st , gera uma série de erro, et , com a menor potência
1.4. O FILTRO WIENER-HOPF-LEVINSON 41

possı́vel? Fortuitamente, aplica-se muito bem ao caso o conceito de mı́nimos quadrados,


de acordo com o qual um coeficiente arbitrário do filtro ft satisfaz a seguinte igualdade:
∂I
=0 (1.4.2)
∂fj

onde j é o ı́ndice que identifica o coeficiente do filtro e I é a potência do erro et , ou seja,


X X
I= e2t = (dt − at )2 (1.4.3)
t t

Uma equação equivalente à 1.4.2 é obtida tantas vezes quantos coeficientes o filtro
tiver. No caso de um filtro com n + 1 coeficientes, define-se um sistema de n + 1 equações
lineares com n + 1 incógnitas, cuja solução dá origem aos coeficientes desejados. As
equações correspondentes, denominadas equações normais, podem ser representadas da
seguinte forma:
∂I ∂ P
= (dt − at )2 = 0
∂f0 ∂f0 t
∂I ∂ P
= (dt − at )2 = 0
∂f1 ∂f1 t (1.4.4)
..
.
∂I ∂ P
= (dt − at )2 = 0
∂fn ∂fn t
Para se obter a solução das equações normais, substitui-se at , na equação 1.4.4, pela
operação de convolução ft ∗ st , na forma definida através da expressão 1.1.13. No caso
de um coeficiente arbitrário, j, tem-se a seguinte expressão:
 !2 
m+n n
∂I ∂  X X
= dt − fk st−k  = 0 (1.4.5)
∂fj ∂fj t=0 k=0

onde m é o número de pontos da série st . Resolvendo, obtém-se:


m+n n
!
∂I X X
= 2 dt − fk st−k (−st−j ) = 0 (1.4.6)
∂fj t=0 k=0

ou !
m+n
X m+n
X n
X
− dt st−j + fk st−k (st−j ) = 0 (1.4.7)
t=0 t=0 k=0

Este resultado pode ser escrito e, com base na equação 1.1.23, interpretado da seguinte
forma:
X n m+n
X m+n
X
fk st−k st−j = dt st−j (1.4.8)
k=0
|t=0 {z } |t=0 {z }
Φss (j−k) gds (j)

onde Φss é a autocorrelação da série dada e gds é a correlação cruzada entre a série
desejada e a série dada. Uma vez que j ≥ 0, pode-se ainda dizer, com base na equação
42 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

1.1.13, que o lado esquerdo desta equação corresponde a uma versão parcial da convolução
entre a autocorrelação de st e o filtro ft .
A interpretação da expressão 1.4.8, aliada à troca do ı́ndice j pelo deslocamento (ou
lag) τ e do ı́ndice k pelo tempo t, permite obter a seguinte equação:

n∆t
X
Φss (τ − t)ft = gds (τ ), para τ ≥ 0 (1.4.9)
t=0

onde ∆t é o intervalo de amostragem. Este resultado equivale à versão discreta da equação


Wiener-Hopf, a qual é definida pela seguinte igualdade (ver Kanasewich, 1975):
Z ∞
C(τ − t)f (t) dt = gds (τ ), para τ ≥ 0 (1.4.10)
0

onde C é a autocorrelação do sinal que se deseja filtrar, s(t).


A equação 1.4.9 é o coração do chamado filtro Wiener-Hopf. Sua extensão para o caso
de múltiplos valores do deslocamento τ pode ser apresentada na seguinte forma matricial:

[C] [f ] = [g] (1.4.11)

ou
    
c0 c1 · · · cn−1 cn f0 g0

 c1 c0 · · · cn−2 cn−1 
 f1  
  g1 

 .. .. .. .. ..  ..   .. 
 . . . . .  . = .  (1.4.12)
    
 cn−1 cn−2 · · · c0 c1   fn−1   gn−1 
cn cn−1 · · · c1 c0 fn gn

onde a matriz [C] é formada pelos coeficientes da autocorrelação da série dada, s t , e o


vetor [g] é construı́do com a parte de deslocamentos não negativos da correlação cruzada
entre dt e st . Nos dois casos, o subscrito identifica o número de amostras correspondente
ao deslocamento.
Para a solução da equação 1.4.11, ou 1.4.12, há necessidade de inverter a matriz de
autocorrelação, [C], a qual apresenta duas propriedades fundamentais: (1) é simétrica, em
relação à diagonal principal e; (2) cada uma das diagonais é constituı́da por coeficientes
idênticos. Esta última propriedade, identificada como Toeplitz, é fundamental para a
inversão da matriz de autocorrelação com base na recursão Levinson, discutida no subitem
1.4.3.

1.4.2 Aplicando o filtro Wiener-Hopf


Uma boa discussão a respeito da aplicação do filtro Wiener-Hopf deve começar com um
exemplo simples. Para isto, considere-se, por exemplo, que se deseja obter um filtro
inverso de dois coeficientes, ft , capaz de transformar o sinal st = (1, 0.5) no sinal definido
por dt = (1, 0). Na forma de uma operação matricial, o problema proposto se reduz
1.4. O FILTRO WIENER-HOPF-LEVINSON 43

a calcular o filtro ft no seguinte sistema de equações, obtido através da aplicação da


equação 1.4.11:     
1.25 0.5 f0 1
=
0.5 1.25 f1 0
Resolvendo o sistema, obtêm-se os valores dos coeficientes do filtro: f0 = 20/21 e f1 =
−8/21. Convolvendo-se o filtro obtido com o sinal dado, obtém-se: ft ∗ st = (20/21, 2/21,
–4/21). Vê-se que o resultado obtido é um pouco diferente do sinal desejado, com um
erro médio quadrático, determinado através da expressão 1.4.3, igual a 1/21, o qual pode
ser considerado suficientemente pequeno para aceitar o filtro como válido.
No caso particular da eficácia do processo, deve-se destacar que, quanto maior o
filtro calculado, mais próximo do desejado estará o resultado obtido. Para usufruir desta
propriedade, pode-se simplesmente acrescentar zeros à matriz de autocorrelação e ao
vetor de correlação cruzada da equação 1.4.11. No caso do filtro inverso do sinal usado
como exemplo, se se desejasse um operador com três pontos, em vez de dois, ter-se-ia a
seguinte equação:     
1.25 0.5 0.0 f0 1
 0.5 1.25 0.5   f1  =  0 
0.0 0.5 1.25 f2 0
Com esta alteração, obtém-se um melhor resultado, ainda preservando as caracterı́sticas
da matriz de autocorrelação.
Nas aplicações práticas do filtro Wiener-Hopf, uma particularidade deve ser desta-
cada: se uma constante positiva for adicionada ao deslocamento nulo da autocorrelação,
a eficácia do filtro resultante é diminuı́da. A razão para isto está relacionada diretamente
com a inversão da matriz [C] da equação 1.4.11, ou, indiretamente, com a divisão es-
pectral envolvida no filtro Wiener-Hopf (ver a equação 1.5.29). A este respeito, sabe-se
que um impulso unitário e, por extensão, uma constante isolada, tem todos os compo-
nentes de freqüência com igual amplitude. Portanto, o acréscimo de um valor positivo
ao deslocamento nulo da autocorrelação, denominado luz branca, equivale a adicionar
uma constante ao espectro de potência da série de entrada, em todos os componentes de
freqüência, fazendo com que o filtro obtido tenha seu espectro amortecido. Como se verá
no Capı́tulo 3, este conceito está intimamente relacionado com o nı́vel de ruı́do aleatório
presente nos dados sı́smicos (ver também a operação 4 da Tabela 1.6, na página 39).
O mesmo conceito é empregado no cálculo rotineiro do filtro Wiener-Hopf, quan-
do normalmente se adiciona uma constante de pequeno valor ao deslocamento nulo da
autocorrelação, com o fim de se evitar problemas com componentes de freqüência even-
tualmente ausentes. Valores tı́picos desse tipo de luz branca oscilam entre 0.01% e 1%
da autocorrelação, no deslocamento igual a zero.
Viu-se no item 1.3 que o filtro inverso de um binômio causal de fase mı́nima, estimado
através de uma divisão polinomial no domı́nio da transformada Z, tende rapidamente
a zero, ou seja, é estável. Já no caso do filtro inverso de um binômio de fase máxima
com igual autocorrelação, o resultado seria instável se nada fosse feito para adequar o
processo ao problema especı́fico. Observe-se que, aplicada aos dois casos, a equação 1.4.11
resultaria em um só operador, em vez de dois, o qual seria estável e teria fase mı́nima,
como se verá adiante. Isto se explica pelo fato de o filtro inverso depender apenas da
autocorrelação da série de entrada. Desta forma, se convolvido com o binômio de fase
44 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

máxima, o operador calculado levaria a um resultado diferente do desejado, o qual é um


impulso unitário.
Neste ponto, o leitor pode estar se perguntando: não haveria uma forma de se obter,
com a equação 1.4.11, filtros inversos estáveis de séries de fase máxima, ou misturada,
que levem ao resultado desejado? A resposta é sim, já que, como se mostrou no item 1.3,
existem filtros inversos estáveis de binômios de fase máxima, desde que se trabalhe com
operadores não causais.
Para demonstrar que o mesmo conceito se aplica ao filtro Wiener-Hopf, deve-se, ini-
cialmente, lembrar que a inversão de séries de fase mı́nima é fundamentada em uma
série desejada dt em que se localiza um coeficiente isolado na origem (t = 0), onde o
deslocamento (lag) é igual a zero. No caso de uma série de fase máxima, considere-se,
como exemplo, o binômio (0.5, 1), cuja inversa estável pode ser obtida através da seguinte
operação:
Z 1
F (Z) = = = 1 − 0.5Z −1 + 0.25Z −2 − · · ·
0.5 + Z 1 + 0.5Z −1

Observe-se que o filtro obtido é anti-causal e tende rapidamente a zero. Observe-se ainda
que o numerador corresponde a um coeficiente isolado no tempo t = ∆t, em vez do
tempo t = 0. Neste caso, é óbvio que o deslocamento adequado é igual a uma amostra,
que corresponde ao tempo final do binômio. Isto significa que a convolução do filtro
obtido com a série dada levará a um coeficiente isolado no tempo equivalente a uma
amostra.
O mesmo conceito pode ser generalizado, para o caso de uma série qualquer, o que
leva à seguinte conclusão: o deslocamento ótimo depende do número de binômios de
fase máxima e de fase mı́nima que a série contém. Entretanto, nas aplicações práticas,
a mesma informação não está diretamente disponı́vel. Para contornar esta dificuldade,
emprega-se freqüentemente uma técnica em que se procura determinar simultaneamente
o filtro e o deslocamento que levam ao menor erro encontrado na comparação entre a série
desejada e a obtida com o filtro escolhido (ver Robinson e Treitel, 1980). Na Figura 1.13,
apresenta-se um exemplo tı́pico do resultado obtido através da aplicação de um filtro
inverso a um filtro passa-banda. Observe-se que o resultado, obtido com um operador de
comprimento igual ao dobro do comprimento do pulso, foi deslocado de forma a que o
deslocamento ótimo coincida com a origem.
A noção de causalidade é também importante na aplicação de um caso particular de
filtro de forma: o que altera o espectro de fase de uma série mas mantém intocado o
seu espectro de amplitude. Nas aplicações tı́picas, o operador correspondente inclui a
presença de componentes de antecipação, ou seja, coeficientes que possibilitam deslocar
energia para tempos inferiores ao do inı́cio da série a filtrar. Na Figura 1.14, apresenta-se
um exemplo de aplicação desta idéia a um filtro passa-banda. Como no caso da Figura
1.13, o número de pontos do filtro foi de aproximadamente o dobro do comprimento da
série filtrada.
Até agora, discutiram-se aplicações do filtro Wiener-Hopf voltadas para a deter-
minação de filtros inversos e de forma. A mesma técnica pode também ser empregada
na previsão de eventos futuros, com base na ciclicidade de eventos passados e presentes.
Para isto, usa-se o conceito de filtro de predição, o qual é baseado na idéia de que a
autocorrelação de uma função estacionária — ou seja, uma função cujas propriedades
1.4. O FILTRO WIENER-HOPF-LEVINSON 45

Figura 1.13: Aplicação de um filtro inverso a um pulso


passa-banda de fase diferente de zero.

estatı́sticas não se alteram com o tempo — pode ser utilizada para se estimar o valor da
função em um tempo futuro.
Considere-se, por exemplo, que se deseja estimar como uma série estacionária se com-
portará no futuro, a partir do tempo t0 + m∆t, onde t0 é o tempo presente, usando-se
apenas o conhecimento atual da série. Neste caso, a versão discreta da equação Wiener-
Hopf, dada pela expressão 1.4.9, assume a seguinte forma:

n∆t
X
Φss (τ − t)ft = Φss (τ + m∆t), para τ ≥ 0 (1.4.13)
t=0

onde Φss é a autocorrelação da série dada e ft é o filtro de predição. O aspecto mais


importante desta aplicação da equação 1.4.9 é o fato de que a correlação cruzada da série
desejada com a série de entrada é considerada igual à autocorrelação da série s t , a partir
do deslocamento dado por m∆t. Esta é uma interpretação diretamente dependente da
premissa de que a série st é estacionária.
46 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Figura 1.14: Aplicação de filtro de forma ao mesmo pulso


da Figura 1.13. A fase do resultado é nula.

O filtro obtido com base na expressão 1.4.13, se aplicado à série st , leva a uma nova
série que inclui informações sobre a parte previsı́vel do futuro, informações estas baseadas
nas caracterı́sticas de ciclicidade presentes na série st . Este enfoque é aplicado em diversas
situações. Um exemplo é o da previsão do comportamento das ações na bolsa de valores.
Outro é o da geração de malhas espaciais regulares a partir de medidas esparsas de uma
grandeza qualquer como, por exemplo, a profundidade do topo de uma camada. Na
literatura geológica, esta última idéia recebe o nome genérico de krigging.
No método sı́smico, além da deconvolução rotineira (ver o Capı́tulo 3), o filtro Wiener-
Hopf vem sendo utilizado também em problemas que envolvem o espaço, os quais são
normalmente resolvidos no domı́nio f -x, ou freqüência-distância (ver Treitel, 1974). Entre
estas aplicações, inclui-se a interpolação de traços sı́smicos (Spitz, 1991) e a atenuação
de ruı́dos aleatórios, ambas baseadas na capacidade de predição do filtro Wiener-Hopf ou
suas extensões (ver Canales, 1984). Neste último caso, para cada freqüência individual,
estimam-se eventos previsı́veis ao longo do eixo x, os quais são considerados sinais, o que
possibilita atenuar os eventos que não se pode prever, considerados ruı́dos. No Capı́tulo
3, será discutida um pouco mais a aplicação de filtros preditivos, particularmente na
1.4. O FILTRO WIENER-HOPF-LEVINSON 47

deconvolução rotineira.

1.4.3 A recursão Levinson


As caracterı́sticas da matriz de autocorrelação da equação 1.4.12, discutidas no subitem
1.4.1, levaram N. Levinson (in Robinson e Treitel, 1980; Claerbout, 1976) a desenvolver
uma técnica recursiva para a sua inversão, a qual evita os processos convencionais de
solução do sistema de equações normais, tornando mais rápido o processo e, além disso,
possibilitando correlacioná-lo diretamente com fenômenos fı́sicos, particularmente no que
diz respeito ao papel da fase. Em seguida, apresenta-se o algoritmo de acordo com uma
seqüência baseada nas usadas por Robinson e Treitel e por Claerbout.
Como sugere o nome, a recursão Levinson é uma seqüência de operações que, a partir
de um filtro com um número arbitrário de coeficientes, permite calcular, de forma recur-
siva, um filtro mais longo. Considere-se inicialmente o caso particular em que a equação
1.4.12 é aplicada à determinação de um filtro inverso, ou seja, a série g é definida por um
impulso unitário na origem. No caso, a mesma equação é substituı́da por
    
c0 c1 · · · cn−1 cn 1 αn

 c1 c0 · · · cn−2 cn−1 
 a1 


 0 

 .. .. .. .. ..  ..   .. 
 . . . . .  .  = .  (1.4.14)
    
 cn−1 cn−2 · · · c0 c1   an−1   0 
cn cn−1 · · · c1 c0 an n
0

onde o subscrito n do vetor [a] significa a ordem da recursão. Em outros termos, n é o


máximo valor do ı́ndice t de cada elemento do filtro an,t .
Observe-se, na equação 1.4.14, que o filtro an,t é dado pela normalização do filtro
inverso ft com o valor de f0 , o que implicou a divisão do lado direito da equação 1.4.12
pelo mesmo valor. Observe-se ainda que o sinal de αn é, por definição, sempre positivo,
para qualquer ordem n. Esta caracterı́stica torna-se mais clara quando se leva em conta
o fato de que, ao se aplicar a equação 1.4.12 ao caso de um filtro inverso, c0 e gds (0) são
sempre positivos (ver também a equação 1.5.30).
Considere-se agora um caso mais genérico em que se dispõe, inicialmente, de um filtro,
fn,t , com n+1 pontos — em termos de transformada Z, Fn (Z) —, o qual transforma uma
série dada em outra desejada. Ou seja, no caso, fn,t não é simplesmente um filtro inverso.
Além disso, conhecem-se a série an,t , ou An (Z), definida anteriormente, e os parâmetros
αn , βn e γn , os dois últimos dos quais são definidos adiante.
Suponha-se agora que se deseja calcular um filtro com n + 2 pontos, fn+1,t , usando o
filtro conhecido, fn,t . Para isto, deve-se, em primeiro lugar, aumentar a série an,t em um
coeficiente, o que leva à seguinte modificação da equação 1.4.14:
    
c0 c1 · · · cn cn+1 1 αn

 c1 c0 · · · cn−1 cn 
 a1  
  0 

 .. .. .. .. ..  ..   .. 
 . . . . .  . = .  (1.4.15)
    
 cn cn−1 · · · c0 c1   an   0 
cn+1 cn · · · c1 c0 0 βn
48 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Em relação à equação 1.4.14, acrescentou-se um coeficiente igual a zero na série an,t . O


resultado dessa modificação é a introdução de um erro no lado direito da equação, erro este
dado por βn , o qual é, em módulo, sempre menor do que αn , por causa das caracterı́sticas
da função de autocorrelação, a qual tende a zero com o aumento no deslocamento. Além
disso, c0 é sempre maior do que o módulo de qualquer um dos demais coeficientes da
série.
Atinge-se em seguida o ponto mais importante do algoritmo de Levinson. Utili-
zando as propriedades especiais da matriz de autocorrelação, pode-se escrever a seguinte
equação:     
c0 c1 · · · cn cn+1 0 βn
 c1 c0 · · · cn−1 cn    an   0 
   

 .. .. .. .. ..   ..  =  .. 
 . . . . .  (1.4.16)
 .   . 
   

 cn cn−1 · · · c0 c1   a 1   0 
cn+1 cn · · · c1 c0 1 αn
Percebe-se que, sem alterar a matriz de autocorrelação, obteve-se uma nova equação
em que os dois vetores da equação 1.4.15 foram invertidos, em relação ao tempo. Pode-se
agora combinar as equações 1.4.15 e 1.4.16:
     
c0 c1 · · · cn cn+1   1 0 

 c1  
 c0 · · · cn−1 cn   
 a 1 
  
 a n 
  

 .. .. . . .
. .
.   .
.   .
. 
 . . . . .   .  + kn  .  =
     
 cn cn−1 · · · c0 c1    a n   a 1  


 
cn+1 cn · · · c1 c0 0 1 
   

 α n β n 


  0   0  

   
 ..   .. 
 .  + kn  .  (1.4.17)

    



 0    


 β α 
n n

onde kn é um fator ainda por determinar.


Comparando-se as equações 1.4.14 e 1.4.17, percebe-se a necessidade de se cancelar,
na última, o erro representado por βn , para que se obtenha o seguinte resultado:
    
c0 c1 · · · cn cn+1 1 αn+1
 c1 c0 · · · cn−1 cn    a1 
   0 
  
 .. .. . . .. ..   ..   .. 
 . . . . .  = .  (1.4.18)
 . 
 
  
 cn cn−1 · · · c0 c1   an   0 
cn+1 cn · · · c1 c0 an+1 n+1 0

onde o subscrito n + 1 do vetor [a] indica uma nova série de tempo, correspondente à
etapa n + 1 da recursão. Para eliminar o erro βn na equação 1.4.17, basta que se leve em
consideração a seguinte igualdade:

βn + k n α n = 0
1.4. O FILTRO WIENER-HOPF-LEVINSON 49

ou
βn
kn = − (1.4.19)
αn
Em conseqüência, pode-se agora determinar o novo vetor [a]n+1 a partir do vetor [a]n ,
com      
1 1 0
 a1   a1   an 
     
 ..   ..   .. 
 .  =  .  + kn  .  (1.4.20)
     
 an   an   a1 
an+1 n+1 0 1
ou, em termos de transformada Z,

An+1 (Z) = An (Z) + kn Z n+1 An (Z −1 ) (1.4.21)

Pode-se também calcular os seguintes parâmetros:

αn+1 = αn + kn βn (1.4.22)

ou, levando em conta a equação 1.4.19,


n
Y
αn+1 = α0 (1 − ki2 ) (1.4.23)
i=0

e  
1

 a1 

βn+1 = [cn+2 cn+1 · · · c1 ]  ..  (1.4.24)
 . 
an+1 n+1

Com base na equação 1.4.18, conclui-se que ainda não se obteve o filtro desejado, já
que o lado direito da mesma equação não corresponde ao vetor de correlação cruzada
[g]. Entretanto, a série at obtida pode ser utilizada na determinação do filtro ft desejado,
seguindo-se a mesma lógica usada na dedução da equação 1.4.17. O resultado é a seguinte
expressão:
      
c0 c1 · · · cn cn+1   f 0 a n+1 

 c1  
 c0 · · · cn−1 cn   
 f1 
  
 an  
  

 .. .. . .. .
.. .   . 
..   ..  + qn  ..  . 
 . . =
       
 cn cn−1 · · · c0 c1     fn   a1   

 

cn+1 cn · · · c1 c0 0 1 n+1
   

 g 0 0 

 



 g 1



 0 



 ..   .. 
 .  + qn  .  (1.4.25)

    
 gn 


 0  

 γ αn+1 
n

onde qn é um fator a ser determinado.


50 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Observe-se, na equação 1.4.25, que foi novamente empregado o truque de inverter os


vetores, o que somente é possı́vel por causa das propriedades da matriz de autocorrelação.
Foi também introduzido o erro γn , o qual, para ser removido, exige que
γn + qn αn+1 = gn+1
ou seja,
gn+1 − γn
qn = (1.4.26)
αn+1
onde gn+1 é conhecido, já que se trata de um coeficiente do vetor calculado [g].
Pode-se agora determinar o filtro procurado, através da seguinte expressão:
     
f0 f0 an+1
 f1   f1   an 
     
 ..   ..   .. 
 .  =  .  + qn  .  (1.4.27)
     
 fn   fn   a1 
fn+1 n+1 0 1

ou, em termos de transformada Z,


Fn+1 (Z) = Fn (Z) + qn Z n+1 An+1 (Z −1 ) (1.4.28)
Em cada etapa — por exemplo, a de número n + 1 — o erro γ é estimado com base
na seguinte operação:
 
f0
 f1 
 
γn+1 = [cn+2 cn+1 · · · c1 ]  ..  (1.4.29)
 . 
fn+1 n+1

A recursão Levinson pode ser repetida ad infinitum, conforme a precisão desejada no


cálculo do filtro. Esta linha de raciocı́nio sugere que o processo começa com uma única
amostra. Neste caso, sabe-se que:
a0,0 = 1 , α0 = c0 , β0 = c1 ,
f0,0 = g0 /c0 , γ0 = f0,0 c1
Os passos posteriores da recursão podem ser calculados de acordo com a seguinte
seqüência de operações, extraı́da das equações obtidas (ver Robinson e Treitel, 1980):
1. kn = −βn /αn
2. An+1 (Z) = An (Z) + kn Z n+1 An (Z −1 )


 an+1,0 = an,0

 an+1,1 = an,1 + kn an,n
ou, no domı́nio do tempo, ..


 .
 a
n+1,n+1 = kn an,0

onde o primeiro ı́ndice da série a relaciona-se à etapa da recursão, enquanto o


segundo corresponde à posição do coeficiente.
1.4. O FILTRO WIENER-HOPF-LEVINSON 51

3. αn+1 = αn + kn βn
n+1
P
4. βn+1 = an+1,i cn+2−i
i=0

5. qn = (gn+1 − γn ) /αn+1
6. Fn+1 (Z) = Fn (Z) + qn Z n+1 An+1 (Z −1 )


 fn+1,0 = fn,0 + qn an+1,n+1

 n+1,1 = fn,1 + qn an+1,n
f


ou, no domı́nio do tempo, ..
 .

 fn+1,n = fn,n + qn an+1,1


 f
n+1,n+1 = qn an+1,0

n+1
P
7. γn+1 = fn+1,i cn+2−i
i=0

Neste ponto, é interessante analisar as caracterı́sticas de fase do filtro a t . Para isto,


deve-se levar em conta que, de acordo com a equação 1.4.23, o módulo de k é sempre
menor do que 1. Isto porque, como se viu anteriormente, o valor de α, em qualquer etapa
da recursão, é — por definição — sempre positivo. Alternativamente, pode-se dizer que,
de acordo com a equação 1.4.19, o módulo de k é sempre menor do que 1 porque o módulo
de β é sempre menor do que α.
Por outro lado, se for levado em conta que a função A(Z) corresponde ao conjugado
complexo de A(Z −1 ), a equação 1.4.21 pode ser escrita, no domı́nio da freqüência, da
seguinte forma:
An+1 (ω) = An (ω) {1 + kn exp [iω(n + 1)∆t − i2φn ]} (1.4.30)
onde ∆t é o intervalo de amostragem e φn é a fase do filtro An (ω). A fase do operador
entre chaves, que corresponde à variação ∆φn na fase φn , é dada por
 
−1 kn sen [ω(n + 1)∆t − 2φn ]
∆φn = tan (1.4.31)
1 + kn cos [ω(n + 1)∆t − 2φn ]
Observe-se, na equação 1.4.31, que: (1) por causa do valor do módulo de kn (menor
do que 1), o denominador é sempre maior do que zero, em todo o espectro de freqüências
e para qualquer valor de n, o que significa que a variação na fase φ está sempre restrita
ao intervalo −900 < ∆φ < +900 e; (2) nas freqüências iguais à de Nyquist e a zero,
o numerador é igual a zero, para qualquer valor de n, uma vez que, nestas mesmas
freqüências, a forma inicial da série A(Z) apresenta fase φ0 igual a zero e a expressão
ω(n + 1)∆t corresponde a um valor cujo seno é igual a zero.
Com base nestas observações e na discussão apresentada no item 1.3, pode-se afirmar
que o operador entre chaves na equação 1.4.30 corresponde à transformada de Fourier de
um binômio com raiz fora do cı́rculo unitário — portanto, um binômio de fase mı́nima.
Uma vez que a série inicial a0,t é um impulso unitário, pode-se deduzir, com base na
mesma discussão, que todas as formas sucessivas, an,t , também apresentam caracterı́sticas
de fase mı́nima. Generalizando-se a aplicação da equação 1.4.14, pode-se dizer que os
filtros inversos estimados com a recursão Levinson são sempre de fase mı́nima.
52 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

1.5 Fatoração Espectral


Dada uma autocorrelação qualquer, a transformada de Fourier correspondente, ou seja,
o espectro de potência, pode corresponder a um infinito número de espectros de fase
distintos. Em outras palavras, existe um infinito número de funções com o mesmo espectro
de amplitude. Entretanto, o mesmo espectro de potência pode corresponder a: (a) uma,
e somente uma, função com espectro de fase mı́nima; (b) uma, e somente uma, função
com espectro de fase máxima; (c) uma, e somente uma, função com espectro de fase nula.
A determinação de uma função de fase nula a partir de uma autocorrelação qualquer é
um processo simples: basta extrair a raiz quadrada do espectro de potência e retornar ao
domı́nio do tempo. Por outro lado, nas mesmas circunstâncias, a determinação de uma
função de fase mı́nima não é trivial. Considerando a importância desse tipo de função
para o processamento sı́smico, justifica-se analisar o tema um pouco mais a fundo.
O processo de determinação de uma função de fase mı́nima a partir de uma função
com qualquer caracterı́stica de fase é genericamente denominado fatoração espectral.
Dentre as técnicas dedicadas a esta tarefa, as mais conhecidas são (ver Claerbout, 1976):
o cálculo de raı́zes de polinômios, o método Kolmogoroff e o método Toeplitz. As três
técnicas serão discutidas em seguida, com o apoio parcial da teoria do cepstrum.

1.5.1 O método das raı́zes de polinômios


No método das raı́zes de polinômios, parte-se da transformada Z da autocorrelação dada,
a qual corresponde a um polinômio em função de Z. Considere-se, como exemplo, a
autocorrelação de uma série hipotética st , cuja transformada Z é dada por

Rs (Z) = 2Z −1 + 5 + 2Z

Para se fatorar esta função, a primeira providência consiste em multiplicá-la por Z e


igualar o resultado a zero:
Rs0 (Z) = 2 + 5Z + 2Z 2 = 0

Desta forma, a transformada Z da função de autocorrelação é transformada em um


polinômio comum. Pode-se agora calcular as duas raı́zes correspondentes, as quais são,
no caso, −2 e −1/2. Isto significa que a função Rs (Z) pode ser tanto a autocorrelação
do binômio Z + 2, que é de fase mı́nima, quanto do binômio 2(Z + 1/2), que é de fase
máxima. Com base na teoria discutida nos itens anteriores, sabe-se que, a menos de um
fator de escala, um binômio do tipo Z − b tem espectro de amplitude igual ao de um
binômio do tipo Z − 1/b. No caso, o binômio Z + 2 tem o mesmo espectro de amplitude
do binômio 2(Z + 1/2). Assim, pode-se dizer que o primeiro deles é a função de fase
mı́nima correspondente à autocorrelação dada.
O procedimento descrito pode ser generalizado para uma autocorrelação com qual-
quer número de raı́zes. Isto significa que, antes de se calcular as raı́zes, a função de
autocorrelação Rs (Z) deve ser multiplicada por Z N , onde N é igual à metade do número
de raı́zes possı́veis, obtendo-se um polinômio convencional que deve ser igualado a zero.
Ressalte-se que para uma função de autocorrelação ser válida — particularmente quanto
à simetria — as raı́zes do polinômio obtido através dessa operação devem formar pares
1.5. FATORAÇÃO ESPECTRAL 53

do tipo b e 1/b. O resultado desta seqüência de operações é:


N  
N
Y 1
Rs0 (Z) = Z Rs (Z) = k (Z − bn ) Z − =0 (1.5.1)
n=1
bn

onde k é um fator de escala.


Com base na extensão do exemplo dado anteriormente, pode-se dizer que, a menos de
um fator de escala, o produto de um dado número de binômios do tipo Z −bn tem espectro
de amplitude igual ao produto do mesmo número de binômios do tipo Z − 1/bn . A partir
desta propriedade, pode-se obter uma função de fase mı́nima que tenha autocorrelação
igual a Rs (Z), independentemente das caracterı́sticas de fase da série original, st . Isto
é feito selecionando-se, entre as raı́zes obtidas, aquelas que se situam fora do cı́rculo
unitário. A função resultante, mt , pode ser descrita, em termos de transformada Z, por

M (Z) = c(Z − m1 )(Z − m2 ) · · · (Z − mN ) (1.5.2)

onde c é um fator de escala que garante a igualdade entre Rm (0) e Rs (0).


O método das raı́zes de polinômios, embora conceitualmente simples, tem imple-
mentação prática relativamente difı́cil, particularmente no caso de funções longas, difi-
cultando o seu uso e tornando-o útil apenas para finalidades didáticas.

1.5.2 O cepstrum
O cepstrum (anagrama de spectrum, a palavra inglesa para espectro) de uma função
qualquer é definido como a transformada inversa de Fourier do logaritmo da transformada
de Fourier direta da função. Assim, no caso da transformada de Fourier do cepstrum da
função contı́nua s(t), tem-se (ver Oppenheim e Schafer, 1989):

Ŝ(ω) = ln S(ω) (1.5.3)

onde S(ω) é a transformada de Fourier de s(t). Usando-se a igualdade 1.2.10, tem-se:

Ŝ(ω) = ln A(ω) + iφ(ω) (1.5.4)

A partir da equação 1.5.4, o cepstrum da função s(t), simbolizado por ŝ(t), pode ser
definido por n o
ŝ(t) = F −1 Â(ω) + iφ(ω) (1.5.5)

onde F −1 representa transformada inversa de Fourier e

Â(ω) = ln A(ω)

Por sua vez, a função s(t) pode ser computada, a partir da transformada inversa de
Fourier do cepstrum, através da seguinte expressão:
n h io
s(t) = F −1 cexp Ŝ(ω) (1.5.6)

onde cexp significa exponencial complexo.


54 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

À primeira vista, as equações 1.5.4 e 1.5.5 pouco dizem a respeito da função estudada.
Entretanto, é possı́vel estimar o cepstrum correspondente de forma a se obter uma ex-
pressão mais informativa. Adotando-se a condição inicial φ(ω) = 0, para ω = 0, pode-se
apresentar a equação 1.5.3 da seguinte forma (ver Tribolet, 1977; Oppenheim e Schafer,
1989): Z ω
d ln S
Ŝ(ω) = dω
−∞ dω
onde S = S(ω). A expressão obtida pode ser reescrita da seguinte forma:
Z ω
1 dS
Ŝ(ω) = dω
−∞ S dω

O último resultado permite, com o auxı́lio dos teoremas da convolução, da derivada e


da integração (ver a Tabela 1.1, na página 19), obter a seguinte expressão para o cepstrum
da função s(t):
1
ŝ(t) = [t s(t)] ∗ s−1 (t) (1.5.7)
t
onde s−1 (t) é o filtro inverso de s(t), ou seja, a transformada inversa de 1/S(ω). Observe-
se que, se S(ω) não tiver zeros, o filtro inverso s−1 (t) é uma função finita e, consequen-
temente, ŝ(t) também é finita8 .
O cepstrum apresenta uma importante propriedade: uma convolução, no domı́nio do
tempo, equivale a uma simples soma, no domı́nio do cepstrum (o que pode ser demons-
trado através dos teoremas da transformada de Fourier). Com base nesta propriedade,
conclui-se que, se a transformada Z de uma função discreta for fatorada em binômios
(equação 1.3.1), o cepstrum da função pode ser visto como a soma dos cepstra dos mes-
mos binômios, na forma da seguinte expressão:
X
ŝt = δt ln(c) + b̂n (1.5.8)
n

onde c é um fator de escala e b̂ é o cepstrum do binômio identificado pelo subscrito n.


Imagine-se agora que o cepstrum de cada binômio da equação 1.5.8 seja reescrito na
forma da versão discreta da equação 1.5.7. Com base na teoria apresentada no item
1.3, conclui-se facilmente que: (1) já que o filtro inverso de um binômio de fase mı́nima
é causal, segue-se que o cepstrum do mesmo binômio também é causal; (2) já que o
filtro inverso de um binômio de fase máxima é anti-causal, segue-se que o cepstrum do
mesmo binômio também é anti-causal. Combinando-se estas observações com a expressão
1.5.8, conclui-se que, nos tempos positivos do cepstrum, concentram-se componentes de
fase mı́nima, enquanto que, nos tempos negativos, concentram-se componentes de fase
máxima.

1.5.3 O método Kolmogoroff


Com base no que foi exposto no subitem 1.5.2, pode-se supor que a parte causal do
cepstrum de uma função corresponde ao cepstrum da função de fase mı́nima equivalente
8
Nas aplicações práticas, a equação 1.5.7 esbarra em algumas dificuldades. Entretanto, como se verá
adiante, a dependência do filtro inverso torna a mesma expressão muito útil para se analisar como as
caracterı́sticas de fase de uma função afetam o cepstrum correspondente.
1.5. FATORAÇÃO ESPECTRAL 55

à função original. Embora esta idéia possa parecer aceitável, sua aplicação não garante a
conservação da energia. Isto pode ser demonstrado a partir da separação da contribuição
dos espectros de amplitude e de fase da função original, para a formação do cepstrum, o
que leva à seguinte igualdade (ver as equações 1.5.4 e 1.5.5):

ŝ(t) = â(t) + p̂(t) (1.5.9)

ou, alternativamente,
ŝ(−t) = â(−t) + p̂(−t) (1.5.10)
onde
â(t) ⇔ ln A(ω)
e
p̂(t) ⇔ iφ (ω)
Vê-se que o cepstrum de s(t) corresponde a uma soma de duas funções, a primeira
delas correspondente ao cepstrum da função de fase nula equivalente a s(t) e a segunda
à transformada inversa de Fourier do espectro de fase de s(t).
Sabe-se que â(t) é uma função par, já que A(ω) também o é. Por sua vez, p̂(t) é uma
função ı́mpar, já que φ(ω) também o é. Ou seja:

â(t) = â(−t)

e
p̂(t) = −p̂(−t)
Substituindo-se estas duas igualdades na equação 1.5.10, obtém-se:

ŝ(−t) = â(t) − p̂(t) (1.5.11)

Com as equações 1.5.9 e 1.5.11, pode-se obter as seguintes formas para as funções â(t)
e p̂(t):
ŝ(t) + ŝ(−t)
â(t) = (1.5.12)
2
e
ŝ(t) − ŝ(−t)
p̂(t) = (1.5.13)
2
Viu-se anteriormente que o cepstrum de uma função de fase mı́nima é causal. Além
disso, uma função qualquer e a função de fase mı́nima equivalente devem ter, ambas, o
mesmo espectro de amplitude. Assim, para se estimar o cepstrum desejado, m̂(t), deve-se
simultaneamente garantir que: (1) a função m̂(t) seja causal e; (2) uma única função â(t)
seja comum a ŝ(t) e a m̂(t). Estas condições levam a:

m̂(t) = â(t) + ĝ(t), para t > 0, (1.5.14)

m̂(t) = â(t), para t = 0 (1.5.15)


e
m̂(t) = â(t) + ĝ(t) = 0, para t < 0, (1.5.16)
56 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

onde â(t) é a transformada inversa de Fourier do logaritmo do espectro de amplitude de


s(t) e ĝ(t) é a transformada inversa do espectro de fase mı́nima procurado.
Com base na equação 1.5.16, deduz-se que ĝ(t) = −â(t), para t < 0 e, como ĝ(t)
deve ser uma função ı́mpar, segue-se que ĝ(t) = â(t), para t > 0. Combinando-se os dois
resultados com as equações 1.5.14, 1.5.15 e 1.5.16, obtém-se a seguinte forma da função
m̂(t), para qualquer valor de t:

m̂(t) = â(t) + â(t)sgn(t) (1.5.17)

ou
m̂(t) = 2â(t) u(t) (1.5.18)
onde sgn(t) é a função sinal, e u(t) é a função degrau (Heaviside). Nas duas expressões,
percebe-se que m̂(t) é igual a 2â(t) nos tempos positivos, é igual a â(t) no tempo igual
a zero e é igual a zero, nos tempos negativos. Ou seja, m̂(t) é causal e depende somente
do espectro de amplitude de s(t).
Aplicando-se o teorema da convolução juntamente com a transformada de Fourier
de u(t), pode-se obter a expressão correspondente à equação 1.5.18, no domı́nio da
freqüência:  
1 1
M̂ (ω) = Â(ω) ∗ πδ(ω) + (1.5.19)
π −iω
ou  
i
M̂ (ω) = Â(ω) ∗ δ(ω) + (1.5.20)
πω
Isolando-se o filtro de quadratura 1/πω e levando-se em conta que δ(ω) é um impulso
unitário na origem (ω = 0), a equação 1.5.20 pode ser reescrita da seguinte forma:
 
1
M̂ (ω) = Â(ω) + i Â(ω) ∗ (1.5.21)
πω

ou
M̂ (ω) = ln A(ω) + iφM (ω) (1.5.22)
onde φM (ω) é o espectro de fase mı́nima desejado e A(ω) é o espectro de amplitude da
função original. Pode-se, portanto, estimar o espectro da função de fase mı́nima m(t)
através da seguinte equação: h i
M (ω) = cexp M̂ (ω) (1.5.23)
ou seja,
M (ω) = A(ω) exp [iφM (ω)] (1.5.24)
Em resumo, o método Kolmogoroff é aplicado através das seguintes operações: (1)
calcula-se o logaritmo do espectro de amplitude da função dada e retorna-se ao domı́nio
do tempo; (2) aplica-se ao resultado a equação 1.5.18, ou seja, anulam-se as amostras nos
tempos negativos, dobram-se as amostras nos tempos positivos e mantém-se inalterada a
amostra situada no tempo igual a zero; (3) calcula-se a transformada direta de Fourier do
resultado e aplica-se a equação 1.5.23, o que leva ao espectro da função de fase mı́nima
desejada.
1.5. FATORAÇÃO ESPECTRAL 57

O método Kolmogoroff confunde-se com a chamada técnica Hilbert, a qual pode ser
sintetizada pela equação 1.5.21. Ou seja, o espectro de fase mı́nima desejado é obtido
através da convolução do logaritmo do espectro de amplitude com o filtro de quadratura.
Esta operação equivale também a uma aplicação da transformada Hilbert direta, a qual
é muito usada na análise do traço sı́smico complexo.

1.5.4 O método Toeplitz


Para se demonstrar a validade do método Toeplitz, é necessário caracterizar o espectro de
fase do filtro inverso obtido com base na equação Wiener-Hopf. O primeiro passo desse
processo consiste em definir a seguinte versão da expressão 1.4.10, aplicada ao caso do
filtro inverso de uma função hipotética, s(t):
Z ∞
C(τ − t)f (t) dt = δ(τ ), para τ ≥ 0 (1.5.25)
0

onde C é a autocorrelação de s(t), δ(τ ) é um impulso unitário na origem (τ = 0) e f (t)


é o filtro inverso que se procura obter.
O filtro f (t), estimado com base na equação 1.5.25, apresenta as seguintes carac-
terı́sticas: (a) é causal (a aplicação da integral se restringe ao intervalo 0 ≤ τ ≤ ∞ e os
limites correspondentes são 0 e ∞); (b) tem espectro de amplitude igual ao inverso do
espectro de amplitude da função s(t) e; (c) seu espectro de fase não depende da fase de
s(t) (é estimado com base em uma função de autocorrelação, cuja fase é nula).
A caracterização direta do espectro de fase do filtro f (t) depende da transformação,
para o domı́nio da freqüência, da equação 1.5.25. Entretanto, esta não é uma tarefa
simples, principalmente porque a função C envolve um argumento, τ − t, que pode ser
negativo. Como alternativa, adota-se uma seqüência de artifı́cios, o primeiro dos quais
consiste em aplicar, à autocorrelação da função s(t), um filtro inverso não necessariamente
causal, e(t). Define-se assim a seguinte convolução:
Z ∞
C(τ − t) e(t) dt = δ(τ ), para − ∞ ≤ τ ≤ ∞ (1.5.26)
−∞

Ou seja, e(t) é o filtro que, convolvido com a autocorrelação de s(t), a transforma em um


impulso unitário. Neste caso, é possı́vel aplicar diretamente o teorema da convolução e
obter a transformada de Fourier correspondente, a qual é dada por

A2 (ω)E(ω) = 1 (1.5.27)

onde A(ω) é o espectro de amplitude da função s(t) e E(ω) é a transformada de Fourier


de e(t).
O próximo passo, no processo de obtenção do espectro de fase do filtro f (t), consiste
em aplicar o logaritmo neperiano à expressão 1.5.27 e retornar ao domı́nio do tempo. O
resultado, que corresponde ao cepstrum da equação 1.5.26, é:

2â(t) + ê(t) = 0 (1.5.28)

onde 2â(t) e ê(t) são os cepstra correspondentes à autocorrelação da função s(t) e ao filtro
inverso e(t).
58 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

Neste ponto, pode-se perguntar qual é o resultado do produto entre a equação 1.5.28
e a função degrau, ou Heaviside, u(t). De acordo com a discussão apresentada no su-
bitem 1.5.3, sabe-se que o produto 2â(t) u(t) corresponde ao cepstrum de uma função
que apresenta as seguintes caracterı́sticas: (1) é causal; (2) tem o mesmo espectro de
amplitude de s(t) e; (3) tem espectro de fase mı́nima independente da fase de s(t). Em
conseqüência, o produto ê(t) u(t), que é igual a −2â(t) u(t), equivale ao cepstrum de um
filtro inverso de fase mı́nima cujo espectro de amplitude é igual ao inverso do espectro de
amplitude de s(t).
O leitor atento deve ter percebido que o produto entre a equação 1.5.28 e a função
degrau corresponde ao cepstrum da equação 1.5.25 e, conseqüentemente, que o filtro f (t),
cujo cepstrum é igual a ê(t) u(t), tem espectro de fase mı́nima. Com base nesta conclusão
e na teoria apresentada no subitem 1.5.3, pode-se obter, no domı́nio da freqüência, a
seguinte igualdade:
1
F (ω) = (1.5.29)
M (ω)
onde M (ω) corresponde à transformada de Fourier da função de fase mı́nima equivalente
a s(t), enquanto F (ω) é o filtro inverso correspondente. No caso discreto, a mesma
expressão transforma-se na seguinte transformada Z:
1
F (Z) = (1.5.30)
M (Z)

Em resumo, pode-se dizer que o filtro inverso f (t), estimado com base na equação
1.5.25, apresenta espectro de fase mı́nima e que este é um resultado propiciado pela
causalidade implı́cita na mesma equação. Conclui-se ainda que f (t) corresponde ao filtro
inverso da função de fase mı́nima equivalente à função que se procura inverter, s(t).
Estes conceitos representam os fundamentos do método Toeplitz. Para ilustrar sua
aplicação, considere-se que se deseja estimar uma série de fase mı́nima, mt , cujo espectro
de amplitude seja igual ao de uma série conhecida, st . Para isto, executam-se as seguintes
operações:

1. Calcula-se o filtro inverso de st , com a equação 1.4.11, ou 1.4.12. Ou seja, estima-se


o filtro ft que satisfaz à seguinte versão discreta da equação Wiener-Hopf:
n∆t
X
Φss (τ − t)ft = δτ , para τ ≥ 0 (1.5.31)
t=0

onde Φss é a autocorrelação de st , δτ é um impulso unitário na origem (τ = 0), n é


o número de pontos do filtro e ∆t é o intervalo de amostragem.

2. Em seguida, calcula-se o filtro inverso de ft , identificado por mt , o qual satisfaz à


seguinte versão da equação Wiener-Hopf:
n∆t
X
Φf f (τ − t)mt = δτ , para τ ≥ 0 (1.5.32)
t=0

onde Φf f é a autocorrelação de ft e δτ é um impulso unitário na origem (τ = 0).


1.6. FONTES DE CONSULTA 59

Uma análise rápida das expressões 1.5.31 e 1.5.32 permitiria dizer que, no domı́nio da
freqüência, as operações correspondentes equivalem grosseiramente a:
1
F (ω) ∼
=
S(ω)
e
1
M (ω) ∼
=
F (ω)
Ou seja,
M (ω) ∼ −1
= 1/ [S(ω)] = S(ω) (1.5.33)
De acordo com este resultado, o filtro mt deveria ser equivalente a st . Isto pode não ser
verdade porque, como se demonstrou acima, um filtro inverso, estimado com a técnica
Wiener-Hopf, tem sempre fase mı́nima e, na aplicação das equações 1.5.31 e 1.5.32, ne-
nhuma informação a priori sobre a fase é fornecida, exceto a de que ela é mı́nima. Assim,
pode-se dizer que mt é a função de fase mı́nima equivalente à função dada, st , inde-
pendentemente de suas caracterı́sticas de fase. Ou seja, st pode ser uma função de fase
máxima, misturada ou mı́nima, mas mt é uma função de fase mı́nima.

1.6 Fontes de Consulta


Como textos de referência para os temas tratados neste capı́tulo, recomendam-se os li-
vros de Oppenheim e Schafer (1989), Sheriff e Geldart (1982, 1985) e Leite (1998). No
que diz respeito à transformada de Fourier, sugerem-se especificamente os livros de She-
riff e Geldart (1985) e Bracewell (1986). Quanto a deconvolução e filtro Wiener-Hopf,
recomendam-se Robinson e Treitel (1980) e as coletâneas de artigos editadas por Webster
(1978) e por Robinson e Osman (1996). Para uma boa discussão sobre as caracterı́sticas
de fase das séries de tempo e sobre o tema fatoração espectral, recomenda-se o livro de
Claerbout (1976). Os leitores interessados em versões Fortran dos algoritmos citados neste
capı́tulo podem recorrer aos livros de Claerbout (1976, 1985) e de Robinson (1967a). Para
eventuais definições dos termos técnicos usados, neste e nos demais capı́tulos, sugere-se
o dicionário de Sheriff (1991) e o de Duarte (2003).

1.7 Exercı́cios
1. Se uma senóide sen (ωt + φ) é amostrada, a partir de t = 0, de acordo com o intervalo
∆t = 4ms, mostre como a freqüência de 125Hz é representada se a fase φ for: (a) 0;
(b)π/4; (c) π/2. O que se pode concluir?

2. Convolva e correlacione os sinais (2, 3, 1) e (2, −3, 1), considerando que o tempo inicial é
igual a zero, no primeiro, e ∆t no segundo.

3. Suponha que as transformadas de Fourier de duas funções sejam R(ω) e S(ω). Mostre
que
|R(ω)| + |S(ω)| 6= R(ω) + S(ω)
Em que circunstâncias esta desigualdade é falsa?
60 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

4. Calcule a transformada de Fourier, na forma vetorial, do sinal que tem transformada Z


dada por A(Z) = 1 − 2Z + Z 2 , para uma freqüência arbitrária. Repita o exercı́cio após
deslocar o mesmo sinal de acordo com o intervalo de tempo ∆t.

5. Calcule os espectros de amplitude e fase do sinal a t dado por (1, 1), o qual apresenta tempo
igual a zero em sua primeira amostra. Aumente o tempo de a t em uma amostra e estime
os espectros correspondentes. (Sugestão: tente representar a transformada de Fourier na
forma polar, usando a igualdade Z 1/2 = exp(iω∆t/2) e a fórmula de Euler. No processo,
procure descrever o espectro de amplitude através de uma função trigonométrica).

6. Estime os espectros de amplitude e fase das funções 1 − Z e (Z −1 − Z)/2. Em seguida,


compare os resultados com os espectros teóricos do operador de derivada. O que se pode
extrapolar a partir da comparação? (Sugestão: a mesma do exercı́cio anterior).

7. Se a transformada de Fourier de uma série tem amplitude igual a zero, quando ω = 0,


o que se pode dizer da soma de todos os coeficientes da série? (Sugestão: use a equação
1.2.3).

8. Qual operação representa, no domı́nio da freqüência, a transformada inversa de Fourier


(equação 1.2.11), para o tempo igual a zero?

9. Demonstre que
dn s(t)
⇔ (−iω)n S(ω)
dtn
10. Viu-se, no item 1.2, como uma operação de derivada pode ser apresentada na forma
de uma convolução. Faça o mesmo com a operação de integração e discuta o papel do
componente de freqüência igual a zero. (Sugestão: use a equação 1.2.44 e considere o
caso discreto).

11. Demonstre que


δ(t) ∗ s(t) = s(t)
a(t) ∗ s(t) 6= a(t) s(t)
onde a(t) é constante e igual a a0 . (Sugestão: use a definição da convolução e as propri-
edades da função δ).

12. Obtenha o resultado das seguintes operações, usando tanto as definições da convolução e
da correlação cruzada quanto a transformada Z: (a) s(t)∗δ(t); (b) δ(t)∗s(t); (c) s(t)⊗δ(t)
e; (d) δ(t) ⊗ s(t).

13. Represente matematicamente a convolução de um pulso sı́smico p(t) com um par de


coeficientes de reflexão, ambos com o mesmo módulo e polaridades opostas, separados
entre si de acordo com uma espessura em tempo dada por e. (Sugestão: use a função δ e
a definição de convolução).

14. Represente, em termos matemáticos, a propriedade ilustrada pela Figura 1.9 (página 28).

15. Considere a seguinte função:


s(x, t) = δ(t − px)
onde p é constante. Demonstre que a correspondente transformada de Fourier, a menos
de um fator de escala, é
S̃(Kx , ω) = δ(Kx − ωp)
1.7. EXERCÍCIOS 61

e que
Kx dt
p= = (1.7.1)
ω dx
16. Demonstre que, a menos de um fator de escala, a transformada de Fourier de s(z, t) =
δ(t − qz), onde q é constante, é dada por

S̃(Kz , ω) = δ(Kz − ωq)

e que
Kz dt
q= = (1.7.2)
ω dz

17. Demonstre que, a menos de um fator de escala, a transformada de Fourier de r(x, z) =


δ(z − x tan θ) é dada por

R̃(Kz , Kx ) = δ(Kx − Kz tan θ)

e que
Kx dz
tan θ = = (1.7.3)
Kz dx

18. Interprete os três exercı́cios anteriores em termos geométricos, representando as funções


nos dois domı́nios envolvidos em cada exercı́cio. O que representam p, q e tan θ?

19. Demonstre que a transformada inversa de Fourier de exp(iφ 0 ), onde φ0 é uma fase cons-
tante, é um filtro passa-tudo dado por
 
1 − cos πt
ft = δt cos φ0 + sen φ0 (1.7.4)
πt

onde t é o ı́ndice da amostra. Perguntas: (a) o que ocorre quando t = 0? (b) quais são
as formas de ft quando φ0 é igual a 0, π/2 e π? (Sugestão: a transformada inversa de
Fourier pode ser obtida através da decomposição do processo em duas partes, a primeira
entre ω = −π e ω = 0, a segunda entre ω = 0 e ω = π, levando em conta a anti-simetria
da fase).

20. Represente, nos quatro quadrantes do plano ω-K x , um evento real (não complexo), regis-
trado em álias espacial, cuja declividade é dada por

K xN
p0 = 2.5
ωN

onde KxN e ωN são as freqüências de álias espacial e temporal, respectivamente. (Su-


gestão: use as propriedades de simetria da transformada bidimensional de Fourier e ob-
serve que ω = 0.4ωN , para Kx = KxN ).

21. Qual a fase, na freqüência de Nyquist, de uma série real que tem fase igual a zero na
freqüência f = 0 e que pode ser decomposta em 10 binômios de fase máxima e cinco
binômios de fase mı́nima?

22. Analise a Figura 1.12 e responda: como seria a distribuição relativa de energia nos três
pulsos se, nos binômios usados, o número 0.95 fosse substituı́do por 0.5?
62 CAPÍTULO 1. TRATAMENTO DE SINAIS

23. Ache as funções de fase nula e de fase máxima que têm o mesmo espectro de amplitude
de ft = (4, 4, 1). Com base no resultado, generalize a relação entre uma função de
fase mı́nima e outra de fase máxima, no caso em que ambas têm o mesmo espectro de
amplitude.

24. Reescreva a equação 1.3.3 para o caso em que β é um número complexo e, com base no
resultado, estabeleça o comportamento geral do espectro de fase de uma função de fase
mı́nima e o de uma função de fase máxima.

25. Analise o binômio B(Z) = 1 − Z. Ele tem fase mı́nima ou máxima? Calcule sua inversa
usando divisão de polinômios. O que se pode concluir?

26. Mostre que os binômios a + bZ e b + aZ têm o mesmo espectro de amplitude. Qual


seria a diferença entre os correspondentes filtros inversos, se eles fossem estimados com a
deconvolução Wiener-Hopf-Levinson?

27. Use a equação 1.5.30 para obter o filtro inverso, com dois coeficientes, do sinal s t = (1, 0.5)
e calcule o erro médio quadrático correspondente. Compare os resultados com os do filtro
apresentado na página 43 e explique as diferenças encontradas.

28. Calcule o filtro inverso do sinal s t = (1, 0.5) usando a recursão Levinson. Compare
o resultado com o apresentado na página 43. Compare também, entre si, as versões
normalizadas das séries at e ft . O resultado desta última comparação seria o mesmo se a
série desejada, dt , fosse, por exemplo, igual a (1, 1), em vez de (1, 0)? O que significa a
série at , em qualquer caso?

29. Calcule o filtro inverso de st = (0.5, 1): (a) usando a recursão Levinson; (b) com divisão
polinomial. Em ambos os casos, calcule apenas dois coeficientes e estime os erros. Com-
pare o resultado do primeiro caso com o filtro obtido quando s t = (1, 0.5). O que você
conclui?

30. Compare as equações 1.3.9 e 1.4.11 e diga qual pode ser, nos termos do filtro Wiener-Hopf,
o significado da primeira.

31. Demonstre que uma convolução, no domı́nio do tempo, corresponde a uma soma, no
domı́nio do cepstrum.

32. Analise a convolução incluı́da na equação 1.5.21 e diga quais são os valores de φM (ω)
quando ω = 0 e ω = ωN , no caso em que A(ω) é o espectro de amplitude de uma função
real. (Sugestão: use as propriedades de simetria de A(ω) e de 1/πω).

33. Quais devem ser as propriedades de simetria de um traço sı́smico complexo (não real),
amostrado em função do tempo, para que sua transformada de Fourier seja puramente
real?

34. Imagine um traço sı́smico complexo definido por

h(t) = s(t) + iy(t)

tal que sua transformada de Fourier, H(ω), seja igual a zero para ω menor do que zero.
Demonstre que h(t), conhecido como o sinal analı́tico pertencente a s(t), pode ser obtido
com base na transformada Hilbert, ou seja:

h(t) = s(t) + i [s(t) ∗ q(t)] (1.7.5)


1.7. EXERCÍCIOS 63

onde q(t) é o filtro de quadratura e o resultado da convolução s(t) ∗ q(t) é o traço de


quadratura. (Sugestão: use o resultado do exercı́cio anterior e a dedução da equação
1.5.20, neste caso apenas como um modelo).

35. Com base no exercı́cio anterior, diga como obter a amplitude e a fase instantâneas cor-
respondentes a um traço sı́smico e qual o significado dessas duas funções.
Capı́tulo 2

MÉTODO SÍSMICO DIRETO

2.1 Introdução
Neste item, apresentam-se de forma resumida conceitos básicos associados à geração e à
propagação do sinal sı́smico. O enfoque adotado foi o de fornecer ao leitor um estoque
mı́nimo de informações que favoreçam um entendimento mais intuitivo de alguns dos itens
subseqüentes. Com este objetivo, parte-se, no subitem 2.1.1, da análise da interação entre
as ondas sı́smicas e as partı́culas das rochas, até atingir o ponto, no subitem 2.1.6, em
que se apresenta a técnica CDP. Entre um extremo e outro, discutem-se temas como a
geração das reflexões, princı́pios de ótica geométrica e as deformações a que está sujeito
o sinal sı́smico registrado.

2.1.1 Das partı́culas de rocha para as ondas sı́smicas


Duas famı́lias de ondas interessam ao método sı́smico: as ondas superficiais, ou seja, as
ondas que viajam junto à superfı́cie da terra; e as ondas de corpo (body waves), que
viajam pelo corpo das rochas, independentemente da posição. As ondas superficiais, pre-
dominantemente do tipo Rayleigh, são tratadas como ruı́do pelos geofı́sicos de exploração.
Já as ondas de corpo apresentam interesse econômico, uma vez que são responsáveis pelo
sinal útil presente nos dados sı́smicos.
As ondas de corpo são de dois tipos (ver a Figura 2.1):

1. Ondas P (primárias, ou compressionais, ou longitudinais) – Nestas ondas, as partı́-


culas de rocha vibram na mesma direção em que se dá a propagação. Este é o caso,
por exemplo, das ondas sonoras, viajando pelo ar.

2. Ondas S (secundárias, ou cisalhantes, ou transversais) – Nestas ondas, a vibração


é perpendicular à direção de propagação, de acordo com duas classificações, em
relação ao sistema de aquisição: (a) ondas SV - como nas ondas P, as partı́culas
vibram no plano que inclui a fonte de energia, o ponto de reflexão e o geofone; (b)
ondas SH - as partı́culas vibram na direção perpendicular ao plano descrito.

Em termos práticos, as ondas P são mais importantes, representando a grande maioria


dos dados sı́smicos adquiridos, pelas seguintes razões: (1) no caso da aquisição marinha
tı́pica, não é possı́vel gerar diretamente ondas S, que não se propagam em fluidos; (2) as

64
2.1. INTRODUÇÃO 65

Figura 2.1: Tipos de onda de corpo. As setas ligadas aos cı́rculos


pretos indicam a direção e os sentidos com que vibram as partı́culas
de rocha.

ondas P apresentam maior velocidade de propagação do que as ondas S, o que favorece


a qualidade do registro correspondente; (3) os equipamentos de geração de ondas P são
mais simples do que os de ondas S.

Esforço e deformação
Como se verá adiante, a geração e a propagação de uma onda sı́smica, seja ela do tipo
P ou S, depende fundamentalmente da relação entre o esforço introduzido pela onda
e a conseqüente deformação. Na teoria da elasticidade, deformação corresponde a uma
variação relativa de volume ou comprimento, ou seja, trata-se de uma razão adimensional.
Já o esforço tem dimensão de força por unidade de área e é equivalente, no caso de um
fluido, à pressão. Neste subitem, o esforço é normalmente considerado compressivo.
Este é o contexto em que se aplicam as diversas formas da lei de Hooke, de acordo
com a qual o esforço é diretamente proporcional à deformação gerada por ele. No que
diz respeito à propagação de ondas, o aspecto mais importante da lei de Hooke é a
premissa de que o meio é perfeitamente elástico, o que implica considerar temporárias
as deformações. Ou seja, passado o efeito do esforço sobre uma partı́cula qualquer, ela
retorna às condições originais.
Para analisar o tema, pode-se fazer uso de um corpo infinitesimal, submetido a esforços
similares aos introduzidos por uma onda sı́smica. Imagine-se, inicialmente, que o corpo
infinitesimal hipotético tenha forma descrita por um paralelepı́pedo de comprimento l e
dimensões laterais iguais a s. Considere-se agora que o mesmo corpo seja submetido a
quatro diferentes situações ou estados, criados em função da propagação de uma onda
sı́smica:
a. Esforço hidrostático, exercido uniformemente sobre toda a superfı́cie do corpo.
b. Deformação uniaxial, distribuı́da uniformemente ao longo do eixo longitudinal l.
c. Esforço uniaxial, exercido uniformemente ao longo do eixo longitudinal l.
d. Esforço transversal, exercido sobre um dos limites do corpo, transversalmente ao
eixo longitudinal l.
66 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.2: Um corpo submetido a diferentes esforços e deformações: (a) esforço hi-
drostático; (b) deformação uniaxial e; (c) esforço uniaxial. Para facilitar a visualização,
as deformações foram representadas de forma exagerada.

No estado de esforço hidrostático, ilustrado na Figura 2.2a, a alteração relativa de


volume é distribuı́da uniformemente nos três eixos. A proporção com que esta variação
ocorre depende da compressibilidade do material, C, a qual é definida como uma medida
da facilidade com que um corpo pode mudar seu volume, em função da variação na
pressão a que ele está submetido. Alternativamente, pode-se descrever a variação relativa
de volume em função do módulo bulk do material, Kb , que corresponde ao inverso da
compressibilidade. Aplica-se ao caso a seguinte forma da lei de Hooke:

∆V 1 ∆V
∆p = −Kb =− (2.1.1)
V C V
onde V e p são, respectivamente, o volume infinitesimal e a pressão a que o corpo está
submetido.
No estado de deformação uniaxial, ilustrado na Figura 2.2b, apenas o comprimento l
do corpo é alterado. A proporção com que a deformação longitudinal ocorre depende da
compressibilidade uniaxial Cm ou, alternativamente, do módulo da onda P, identificado
por M . A expressão matemática correspondente é:

∆l 1 ∆l
∆p = −M =− , ∆s = 0 (2.1.2)
l Cm l
A situação assim descrita corresponde à deformação introduzida por uma onda compres-
sional plana, que altera as dimensões do corpo infinitesimal apenas ao longo do eixo em
que ocorre a propagação.
No estado de esforço uniaxial, ilustrado na Figura 2.2c, a deformação do corpo infi-
nitesimal ocorre sem restrições laterais, já que os esforços em outras direções são nulos.
Estas são as condições em que se definem o módulo de Young e a razão de Poisson.
O primeiro corresponde à razão entre o esforço e a correspondente deformação, ambos
medidos na mesma direção. Ou seja,

∆l
∆pl = −E , ∆ps = 0 (2.1.3)
l
2.1. INTRODUÇÃO 67

onde E é o módulo de Young, enquanto ∆pl e ∆ps são esforços unidirecionais compressivos
— forças por unidade de área — aplicados independentemente ao longo dos eixos l e s.
Ressalte-se que, por definição, existem dois eixos s.
Para definir a razão de Poisson, considere-se que o corpo infinitesimal hipotético seja
constituı́do de puro gás e envolvido por um material perfeitamente flexı́vel. Considere-se
ainda que o volume do corpo seja inicialmente igual a ls2 . Como não existe restrição
lateral, a deformação introduzida pelo esforço uniaxial não deve alterar o volume total
de gás. Isto ocorre desde que a seguinte igualdade seja satisfeita:
∂V ∂V
∆V = ∆l + ∆s =0
∂l ∂s
Resolvendo, obtém-se a seguinte igualdade:

s2 ∆l + 2sl∆s = 0

ou
l ∆s 1
− = (2.1.4)
s ∆l 2
A expressão algébrica, no lado esquerdo da equação 2.1.4, corresponde à razão de Pois-
son, σ, a qual é definida pelo negativo da razão entre a deformação lateral e a deformação
longitudinal sofridas por um corpo submetido a um esforço na direção longitudinal. Ma-
tematicamente, portanto, tem-se:
∆s/s
σ=− (2.1.5)
∆l/l
Percebe-se, assim, que o resultado numérico da equação 2.1.4 corresponde à razão de
Poisson do gás, a qual, como no caso de qualquer fluido, é igual a 0.5.
Considere-se agora que o esforço uniaxial seja aplicado a um corpo sólido homogêneo.
Neste caso, a expressão 2.1.5 leva a valores de razão de Poisson tı́picos entre 0 e 1/2,
dependendo das caracterı́sticas do material (ressalte-se que o limite inferior teórico é
igual a −1, e não 0). Ou seja, em um corpo sólido, um esforço compressivo leva quase
certamente a uma redução no volume total. Isto se explica pelo fato de que, em um sólido,
as partı́culas não apresentam a mesma independência de movimentos que se observa em
um fluido, fazendo com que os esforços não se distribuam de forma homogênea.
A relação entre a rigidez de um sólido e a lei de Hooke exige a análise de como um corpo
é deformado em função da aplicação de um esforço transversal. Este é o caso ilustrado
na Figura 2.3a, na qual uma força, ∆fs , é aplicada na direção transversal ao eixo l, ao
longo de uma das faces do corpo, enquanto a face oposta é mantida artificialmente fixa.
A deformação resultante, dada pela razão ∆s/l, corresponde também ao ângulo α, em
função de a diferença ∆s ser proporcionalmente pequena. Além disso, não implica alterar
o volume do corpo.
A intensidade da deformação transversal, ou tangencial, é controlada pelo módulo
de rigidez do material, µ, o qual é definido, com base na lei de Hooke, pela seguinte
expressão:
∆fs ∆s
= −µ = µα (2.1.6)
Al l
onde Al é a área envolvida, medida transversalmente à direção em que a força é aplicada.
68 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.3: Um corpo sólido homogêneo submetido a um esforço trans-


versal: (a) mantendo-se fixa uma das faces; (b) todas as faces com liber-
dade de movimento. Para facilitar a visualização, as deformações foram
representadas de forma exagerada.

Como se mencionou acima, uma das faces do corpo infinitesimal representado em


corte na Figura 2.3a foi mantida fixa. Em condições mais gerais, a mesma face pode se
movimentar livremente, como se pode ver no exemplo da Figura 2.3b. Observe-se na
figura que a deformação passou a ser representada por dois ângulos (θ1 e θ2 ), em vez
de apenas um (α), em função da introdução de um novo esforço, ∆fl /As . Esta é uma
modificação resultante da necessidade de conservação do momento, o qual é igual a zero,
uma vez que, ao final, o corpo deve retornar à posição original [∆(mv) = 0]. A mesma
necessidade é responsável pela igualdade |∆fl /As | = |∆fs /Al |, onde As é a área do corpo
medida na direção transversal à força ∆fl .
Pode-se agora estabelecer a relação entre as deformações representadas nas figuras
2.3a e 2.3b. Uma vez que as duas deformações se diferenciam apenas pela diferença na
rotação do corpo infinitesimal, conclui-se facilmente que α = θ1 + θ2 . Se se admitir que
a rotação que diferencia as duas deformações é tal que θ1 6= θ2 , deduz-se também que a
diferença, φ, é igual a (θ1 − θ2 )/2. Com base na primeira destas relações, pode-se definir o
módulo de rigidez de forma alternativa, como se faz no item 2.4. Entretanto, o resultado
é equivalente ao definido pela expressão 2.1.6.

A propagação de ondas P
Pode-se agora analisar como a propagação das ondas depende da elasticidade dos mate-
riais em que elas viajam. Considere-se inicialmente a propagação em um fluido. Neste
caso, os módulos M e Kb são idênticos e identificados adiante pelo sı́mbolo B. Esta
igualdade se deve ao fato de que, nesse tipo de material, a independência de movimento
das partı́culas faz com que, sob uma mesma variação de pressão, a alteração relativa de
volume seja idêntica nos estados envolvidos na definição dos dois módulos.
O primeiro passo na análise proposta consiste em determinar como o módulo Kb , ou
B, influencia a velocidade com que a onda avança. A relação algébrica entre as duas
grandezas pode ser obtida a partir da aplicação da segunda lei de Newton à propagação
2.1. INTRODUÇÃO 69

da onda. Para isto, imagine-se que uma onda plana, propagando-se com velocidade vP ,
atinja um corpo infinitesimal de volume V definido por

V = Al = AvP t (2.1.7)

onde A é a área e l é o comprimento do corpo, a primeira medida transversalmente e o


segundo na direção de propagação, enquanto t é o tempo infinitesimal correspondente a
l.
Considere-se agora que a onda é de compressão e que, portanto, exerce uma força
positiva sobre o corpo, reduzindo assim o seu volume. Ou seja, com base na equação
2.1.7, o volume infinitesimal V sofre uma variação ∆V . Aplicada ao caso, a segunda lei
de Newton — força é igual a massa vezes aceleração — estabelece que

(ρ∆V )a = (ρAvP ∆t)a = ∆pA

ou

ρvP a∆t = ∆p (2.1.8)


onde ∆p é a variação positiva de pressão causada pela onda, a qual provoca uma ace-
leração a nas partı́culas de uma fração da massa do corpo, cuja densidade é igual a ρ.
Por sua vez, ∆t é o intervalo de tempo correspondente à redução no comprimento l do
corpo, definida por ∆l e causada pela variação de pressão ∆p.
Uma vez que a força exercida pela onda é positiva e ∆l é negativo, pode-se considerar
a aceleração a igual a −(∆l/∆t)/t e, na seqüência, obter a seguinte igualdade:

∆lAvP ∆V
a∆t = − =− v (2.1.9)
AvP t V P

Criam-se assim condições para transformar a equação 2.1.8 na seguinte expressão:


∆V
∆p = −vP2 ρ (2.1.10)
V
Combinando este resultado com a equação 2.1.1 e levando em conta que, no caso de um
fluido, Kb = B, obtém-se:
B = vP2 ρ (2.1.11)
Ou seja, s r
B 1
vP = = (2.1.12)
ρ ρC
Ressalte-se que a mesma lógica empregada na dedução desta expressão aplica-se ao caso
de um sólido submetido a uma deformação uniaxial. O resultado é a igualdade
s
M
vP = (2.1.13)
ρ

onde M é o módulo da onda P , definido com base na equação 2.1.2.


70 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

A equação 2.1.10 representa a base para um bom entendimento da propagação de


ondas compressionais planas. Para isto, entretanto, convém alterá-la um pouco. Em
primeiro lugar, deve-se levar em conta que a variação de pressão ∆p corresponde a uma
diferença em relação à pressão ambiente. Isto significa que, na ausência de uma onda,
um sensor piezoelétrico, que transforma variação de pressão em eletricidade, registraria
um valor igual a zero. Esta caracterı́stica permite substituir ∆p por p. Similarmente, a
grandeza ∆l, presente na equação 2.1.9, corresponde a uma variação no deslocamento de
partı́culas e não ao próprio deslocamento de partı́culas, deslocamento este que passa a
ser identificado pelo sı́mbolo u. Por fim, para simplificar a análise, adapta-se a equação
2.1.10 ao caso da propagação de uma onda horizontal ao longo do eixo das profundidades,
z. O resultado dessas alterações pode ser apresentado na forma da seguinte expressão:

∆u
p = −vP2 ρ (2.1.14)
∆z
onde ∆u é a variação no deslocamento de partı́culas ao longo do eixo das profundidades
e ∆z é a dimensão vertical do volume infinitesimal afetado pela onda. Observe-se que a
área não é alterada no processo porque se trata de uma onda plana.
Como ∆z equivale ao trajeto infinitesimal percorrido pela onda, pode-se dizer que
∆z = vP ∆t. Esta igualdade permite escrever a equação 2.1.14 da seguinte forma:

∆u
p = −vP ρ (2.1.15)
∆t
ou, fazendo com que ∆t tenda a zero,

∂u
p = −vP ρ (2.1.16)
∂t
onde ∂u/∂t é a velocidade com que as partı́culas são deslocadas.
Com base na equação 2.1.16, percebe-se que a variação de pressão, p, é proporcional
ao produto entre a velocidade de partı́culas, ∂u/∂t, e a impedância acústica local do meio,
definida pelo produto vP ρ. A este respeito, deve-se destacar que, na aquisição sı́smica,
a variação de pressão e a velocidade de partı́culas são medidas, respectivamente, através
do hidrofone e do geofone. Este tema será explorado com maior profundidade nos itens
2.4 e 2.9.
Para ilustrar a relação entre a teoria apresentada e a propagação das ondas, consi-
dere-se o caso de um pulso sı́smico gerado por uma fonte compressional que, viajando
em um fluido, atinge uma determinada partı́cula a. De acordo com a equação 2.1.16,
o esforço exercido pela parte frontal da onda sobre a partı́cula faz com que ela sofra
um deslocamento com velocidade proporcional à variação na pressão. Nesse processo, o
esforço é transmitido para uma partı́cula adjacente b, situada mais adiante, na direção
em que se processa a propagação. Na posição de máximo deslocamento da partı́cula a,
ela pára e começa a recuar, em função da instalação de uma fase de distensão. Este
processo de avanço e recuo da partı́cula se repete até que ela entre em repouso, o que se
dá quando o pulso sı́smico atravessa completamente a posição em que ela se encontra.
A Figura 2.4 pode ser usada como exemplo de um conjunto de medidas de variação de
pressão, geradas por um pulso sı́smico real e obtidas através de um hidrofone fixo.
2.1. INTRODUÇÃO 71

Figura 2.4: Variação de pressão, em função do tempo, medida


em relação à pressão ambiente e obtida através do registro de
um pulso sı́smico gerado no mar. A fonte e o receptor foram um
arranjo de air-gun e um hidrofone, situados nas profundidades de
5m e 180m, respectivamente.

Nesta discussão, é interessante destacar que um observador hipotético, com o olhar


fixado em uma partı́cula isolada, não saberia com que velocidade a onda se propaga, já
que ele somente veria a partı́cula se deslocando para frente e para trás, com velocidade
variável, até retornar ao repouso. Isto se deve ao fato de que a velocidade de propagação
é uma descrição de quão rapidamente a deformação de uma partı́cula é transmitida para
outra e não uma medida da velocidade com que cada partı́cula se move.

O papel da rigidez
Intuitivamente, percebe-se que, da mesma forma com que o módulo bulk, ou de onda P,
afeta a velocidade de propagação de uma onda compressional em um fluido, o módulo de
rigidez afeta a velocidade de propagação da onda cisalhante em um sólido. Ou seja, em
um meio menos rı́gido, a transmissão dos esforços transversais deve se dar de forma mais
lenta. Também com base na segunda lei de Newton, pode-se obter a seguinte igualdade:

∆fs ∆s
= −vS2 ρ (2.1.17)
Al l

ou, com base na equação 2.1.6,


µ = vS2 ρ (2.1.18)
Ou seja,
r
µ
vS = (2.1.19)
ρ

onde vS é a velocidade de propagação da onda cisalhante.


A linha de raciocı́nio que vem sendo seguida leva à seguinte pergunta: como a rigidez
afeta a velocidade de propagação das ondas compressionais em um sólido? Para responder
a esta pergunta, recorre-se à generalização da lei de Hooke, que permite descrever de
forma global todas as combinações possı́veis entre diferentes esforços e as corresponden-
tes deformações, inclusive em meios anisotrópicos. No caso de um meio mais simples,
72 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

isotrópico, esta tarefa permite obter o seguinte resultado (ver o item 2.4 e Kolsky, 1963):
s
Kb + 43 µ
vP = (2.1.20)
ρ

Na mesma linha de raciocı́nio, obtém-se a relação entre as velocidades P e S:


s
vP 1−σ
= 1 (2.1.21)
vS 2
−σ

Combinando as equações 2.1.18, 2.1.20 e 2.1.21, obtém-se:


3Kb − 2µ
σ= (2.1.22)
6Kb + 2µ

(Um exercı́cio para o leitor: analise essas três equações no caso particular de um fluido.)

As interfaces e as ondas P e S
O conjunto de conceitos já apresentados permite caracterizar razoavelmente bem impor-
tantes diferenças entre a propagação de ondas S e a de ondas P. No caso, duas observações
são fundamentais: (1) ao contrário das ondas P, uma onda S não afeta o volume do corpo
em que ela se propaga, apenas o deforma localmente (comparem-se as figuras 2.2b e
2.2d) e; (2) a ausência de contato direto entre as partı́culas sólidas de um corpo impede
a propagação de ondas S. A segunda observação é fundamental para que se entendam os
fenômenos que ocorrem na interface entre um sólido e um lı́quido.
Imagine-se uma onda S que se propaga verticalmente em um sólido, ou seja, as
partı́culas vibram na direção horizontal. Imagine-se agora que a onda atinja uma in-
terface, também horizontal, entre o sólido e um fluido qualquer. Em função da ausência
de acoplamento entre os dois materiais, as vibrações que ocorrem no sólido, junto à inter-
face, não são transmitidas para o fluido, fazendo com que a onda seja apenas refletida 1 .
Em contrapartida, se a direção de propagação fosse oblı́qua à interface, a projeção ver-
tical dos deslocamentos de partı́cula do sólido introduziria variação de pressão no fluido
e, conseqüentemente, levaria à geração de ondas denominadas convertidas (no caso, de S
para P).
A situação oposta à descrita também merece alguns comentários. No caso, tem-se
uma onda compressional viajando para baixo no fluido até atingir a interface horizontal
com o sólido. Como a direção em que a onda se propaga é perpendicular à interface,
não se criam deformações tangenciais. Isto significa que a energia da onda compressional
incidente é repartida na forma de uma onda refletida compressional e uma onda trans-
mitida, também compressional, ambas com amplitude afetada pela interface. Ou seja,
nenhuma onda cisalhante é criada. Por outro lado, se a onda compressional incidente
for oblı́qua à interface, os esforços passam a ter uma projeção horizontal e, desta forma,
1
Na verdade, esta é uma afirmação apenas parcialmente válida, uma vez que, em um meio realista,
não homogêneo, a alteração na forma das partı́culas na interface transmite para o fluido uma pequena
fração da energia.
2.1. INTRODUÇÃO 73

criam-se condições para que parte da energia se propague no sólido na forma de uma
onda cisalhante. A influência da interface, sobre as amplitudes das ondas geradas por
ela, é um tema analisado com relativa profundidade no item 2.6 e, no caso particular da
incidência normal, no subitem 2.1.2.

2.1.2 A energia das ondas e as interfaces geológicas


Para uma boa compreensão de como a energia das ondas é transmitida, exige-se a adoção
de um modelo que permita descrever como o deslocamento de partı́culas varia em função
do tempo. O modelo a adotar apresenta duas caracterı́sticas importantes. Em primeiro
lugar, deve admitir formas de onda complexas, como a da Figura 2.4. Em contrapartida,
o mesmo modelo deve garantir que a forma de onda, mesmo complexa, não se modifique
ao longo do trajeto em um meio homogêneo e isotrópico, no qual não ocorre dissipação
de energia. Nesses termos, um pulso sı́smico como o da Figura 2.4 teria a mesma forma
em qualquer posição de observação, ainda que as amplitudes correspondentes possam ser
multiplicadas por um fator de escala.
O modelo indicado tem a forma da função f (ωz/v−ωt), onde ω é a freqüência angular,
v é a velocidade de propagação da onda, z é a distância vertical percorrida e t é o tempo
de trajeto. Para simplificar a análise, assume-se que a função f depende de um valor
constante da diferença z/v − t e não do valor isolado de t ou z. Isto significa admitir que
a forma de onda não se altera ao longo do trajeto. Esta mesma caracterı́stica, aliada ao
tempo (em tese) sempre crescente, faz com que o sinal aplicado a z indique o sentido da
propagação. Assim, para se descrever uma onda descendente, mantém-se o sinal positivo
para z, sinal este que deve ser trocado no caso de uma onda ascendente.
Outra caracterı́stica do modelo a adotar é a ciclicidade. Esta é uma caracterı́stica
fundamentada na lei de Hooke, de acordo com a qual a deformação introduzida pela
onda não é permanente. Ou seja, se uma partı́cula é deslocada por uma onda, ela avança
e recua algumas vezes, passando pela posição original, onde, algum tempo depois, ela
retorna ao repouso. Conciliando-se esta idéia com o modelo f (ωz/v − ωt), pode-se adotar
a seguinte expressão para o deslocamento de partı́culas, u, no caso de um valor especı́fico
de ω:
u = s cos (ωz/v − ωt) (2.1.23)

onde s é uma amplitude constante para cada valor de ω. Nestes termos, a variação no
deslocamento de partı́culas é concentrada no fator que envolve o cosseno.
O leitor poderá estar se perguntando como uma função de comprimento teoricamente
infinito, como a 2.1.23, pode ser considerada representativa da variação no deslocamento
de partı́culas, um fenômeno de curta duração. Esta dúvida desaparece quando se leva em
conta o fato de o sinal sı́smico ser constituı́do por uma soma de diversas funções u, uma
para cada valor de ω. Desta forma, pode-se obter qualquer distribuição de amplitudes
em função do tempo e, em conseqüência, um sinal transiente, como é o caso de um pulso
sı́smico (ver o item 1.2).
Com base na igualdade 2.1.23, pode-se analisar como as ondas transmitem energia.
Inicialmente, define-se a energia cinética de uma onda, K, como a energia associada à
74 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

velocidade com que as partı́culas se deslocam. Tem-se, no caso, a seguinte expressão:


 2
1 ∂u
K= 2
m (2.1.24)
∂t

onde ∂u/∂t é a velocidade de partı́culas. Por sua vez, a energia potencial da onda,
U , é definida em função do produto entre a força exercida pela onda e a variação no
deslocamento de partı́culas. Considerando o deslocamento no intervalo entre u = 0 e um
valor arbitrário u, tem-se a seguinte integral:
Z u  2 
∂ u
U =− m du (2.1.25)
0 ∂t2

onde a força é definida pelo produto entre a massa e a aceleração, a qual é negativa. Com
base na equação 2.1.23, sabe-se que ∂ 2 u/∂t2 = −ω 2 u. Neste caso, a energia potencial
pode ser descrita por Z u
U= mω 2 udu = 12 mω 2 u2 (2.1.26)
0

As equações 2.1.24 e 2.1.26 representam a base para se avaliar como flui a energia
das ondas. Para isto, deve-se levar em conta que, nas duas equações, a massa é dada
pela igualdade m = vρ∆tA, onde A e ∆t são a área e o intervalo de tempo envolvidos
na propagação da onda em uma distância infinitesimal e ρ é a densidade do meio. Desta
forma, conclui-se que a razão (K + U )/(∆tA) — energia por unidade de tempo e unidade
de área — corresponde a uma medida do fluxo da energia. Em termos algébricos, tem-se
a seguinte expressão: "  #
2
∂u
F = 21 vρ + ω 2 u2 (2.1.27)
∂t

onde F é a intensidade da onda, ou seja, a potência transmitida pela onda em cada


unidade de área.
Substituindo-se a equação 2.1.23 na expressão 2.1.27 e levando-se em conta que cos 2 +
sen 2 = 1, a intensidade da onda passa a ser dada por

F = 12 vρω 2 s2 (2.1.28)

Neste resultado, que corresponde também ao fluxo de energia cinética em um perı́odo


da freqüência ω, um aspecto deve ser destacado: a intensidade da onda é proporcional
ao quadrado da amplitude, independentemente da grandeza medida, seja pressão, seja
velocidade de partı́culas. Esta afirmação torna-se evidente quando se leva em conta a
expressão 2.1.16.
Os conceitos apresentados neste subitem são fundamentais para se analisar como as
ondas sı́smicas são afetadas pelas interfaces geológicas. Considere-se o caso mais simples:
um meio constituı́do de duas camadas homogêneas e isotrópicas, separadas por uma
interface horizontal e caracterizadas por impedâncias acústicas distintas, v1 ρ1 e v2 ρ2 ,
onde v é a velocidade de propagação da onda P e ρ é a densidade do meio. Suponha-se
agora que uma onda compressional, viajando na direção vertical dentro da camada 1,
2.1. INTRODUÇÃO 75

atinja a interface entre as duas. Nestas circunstâncias, parte da energia é refletida e


parte é transmitida de acordo com as seguintes igualdades:

aR = raI (2.1.29)

e
aT = T a I (2.1.30)
onde a denota amplitude e os subscritos I, R e T identificam as ondas incidente, refletida
e transmitida. Por sua vez, r e T são os coeficientes de reflexão e de transmissão.
A interface descrita, apesar de ser caracterizada por uma descontinuidade acústica do
meio, não envolve descontinuidades no deslocamento das partı́culas e nos esforços envol-
vidos. Existem duas razões para isto. Em primeiro lugar, se houvessem descontinuidades
no deslocamento e, conseqüentemente, na velocidade de partı́culas, criar-se-iam condições
para a formação de cavidades, o que implicaria violar a lei de Hooke. Em segundo lugar,
a ausência de continuidade nos esforços implica dizer que novas forças passariam a atuar
e, desta forma, a conservação da energia não seria garantida.
Estabelecem-se assim as seguintes condições de contorno: (a) a variação no desloca-
mento de partı́culas no meio 1 deve igualar o deslocamento de partı́culas no meio 2, o
que garante a continuidade dos deslocamentos; (b) a variação de pressão no meio 1 deve
igualar a variação de pressão no meio 2, o que garante a continuidade dos esforços. Ou
seja, aplicam-se ao caso as seguintes igualdades:

uI − u R = u T (2.1.31)

e
pI + p R = p T (2.1.32)
onde u é o deslocamento de partı́culas, medido em relação ao sentido da propagação, e p
é a variação de pressão, medida em relação à pressão ambiente, ambos introduzidos pela
onda incidente.
A respeito das equações 2.1.31 e 2.1.32, o leitor pode estar se perguntando porque
a primeira dessas equações envolve uma diferença e não uma soma, como ocorre com a
segunda. Para explicar porque isto ocorre, suponha-se que tanto a onda refletida quanto
a incidente sejam de compressão. Neste caso, a variação de pressão, na parte frontal
da onda, é sempre positiva, tanto para a onda incidente quanto para a refletida. Nas
mesmas condições, uma partı́cula é deslocada para baixo, no caso de uma onda incidente,
e deslocada para cima, no caso de uma onda refletida. Uma vez que o deslocamento de
partı́culas é referenciado ao sentido da propagação, cria-se a necessidade do sinal negativo
na equação 2.1.31. Por outro lado, como p já é uma variação de pressão (em relação à
pressão ambiente), justifica-se o sinal positivo da equação 2.1.32.
Com a equação 2.1.23, na qual se considera s = 1, pode-se definir os deslocamentos
de partı́culas das expressões 2.1.31 e 2.1.32 através das seguintes equações:

uI = cos (ωz/v1 − ωt) , (2.1.33)

uR = r cos (−ωz/v1 − ωt) (2.1.34)


76 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

e
uT = T cos (ωz/v2 − ωt) (2.1.35)
Combinando-se estas expressões com a 2.1.16, obtém-se a seguinte forma para as pressões
pI , pR e p T :
pI = −v1 ρ1 ω sen (ωz/v1 − ωt) , (2.1.36)

pR = −rv1 ρ1 ω sen (−ωz/v1 − ωt) (2.1.37)


e
pT = −T v2 ρ2 ω sen (ωz/v2 − ωt) (2.1.38)
Nas expressões 2.1.33 a 2.1.38, a seguinte convenção, implı́cita na equação 2.1.31, foi
adotada: o sinal do coeficiente de reflexão, r, deve indicar o sentido do deslocamento de
partı́culas na frente da onda, em relação ao sentido da propagação. Ou seja, o sinal de
r deve indicar se o tipo de onda, compressão ou distensão, foi alterado pela interface.
As mesmas expressões permitem transformar as equações 2.1.31 e 2.1.32 nas seguintes
igualdades:

cos (ωz/v1 − ωt) − r cos (−ωz/v1 − ωt) = T cos (ωz/v2 − ωt) (2.1.39)

v1 ρ1 ω sen (ωz/v1 − ωt) + rv1 ρ1 ω sen (−ωz/v1 − ωt) = T v2 ρ2 ω sen (ωz/v2 − ωt) (2.1.40)

Adotando-se um valor arbitrário z = 0, que não afeta o resultado obtido, as três


funções do tipo cos (−ωt), na equação 2.1.39, passam a ser iguais. O mesmo ocorre
com as funções do tipo sen (−ωt), na equação 2.1.40. Pode-se assim eliminar os fatores
comuns nas duas equações e obter as seguintes igualdades:

1−r =T (2.1.41)

e  
v2 ρ2
1+r = T (2.1.42)
v1 ρ1
A partir deste resultado, obtêm-se as seguintes fórmulas para os coeficientes de reflexão
e transmissão:
v2 ρ2 − v 1 ρ1
r= (2.1.43)
v2 ρ2 + v 1 ρ1
e
2v1 ρ1
T = (2.1.44)
v2 ρ2 + v 1 ρ1
Pode-se agora estabelecer a relação entre o fluxo de energia através de uma interface
e os correspondentes coeficientes de reflexão e transmissão. Para isto, leva-se em conta
que a energia da onda incidente deve ser igual à soma das energias das ondas refletida
e transmitida. Combinando-se este conceito com a equação 2.1.28, obtém-se a seguinte
igualdade:
1
v ρ ω 2 s2 = 12 v1 ρ1 r 2 ω 2 s2 + 12 v2 ρ2 T 2 ω 2 s2
2 1 1
2.1. INTRODUÇÃO 77

Figura 2.5: O avanço de uma onda no espaço, de acordo com o


princı́pio de Huygens. Os sı́mbolos T e V equivalem, no texto, a
t e v, sendo T o tempo de trajeto e V a velocidade de propagação
da onda.

ou, eliminando-se os fatores comuns,


 
2 v2 ρ2
1−r = T2 (2.1.45)
v1 ρ1

Este resultado, que corresponde ao produto entre as equações 2.1.41 e 2.1.42, fornece uma
medida relativa da energia que atravessa a interface. (Um exercı́cio para o leitor: o que
representa o resultado da divisão da equação 2.1.42 pela 2.1.41?)

2.1.3 Fundamentos geométricos da propagação de ondas


A ligação entre a geometria das ondas sı́smicas e o movimento das partı́culas responsável
por elas é um tema que, no tratamento adotado nesta apostila, depende fundamental-
mente do princı́pio de Huygens. A Figura 2.5 ilustra de maneira simples o princı́pio, que
pode ser resumido da seguinte forma: “Em um dado tempo t, todos os pontos em uma
frente de onda2 podem ser considerados como fontes pontuais secundárias para a geração
de novas ondas. Após um acréscimo de tempo ∆t, a frente de onda pode ser definida
pelo envelope tangente às ondas geradas no tempo t.”
2
Define-se frente de onda como a linha que conecta, na posição frontal da onda, todos os pontos
que estão na mesma fase, ou seja, ocupando a mesma posição relativa (um pico, ou uma cavidade, por
exemplo). Por sua vez, o raio é a linha ao longo da qual a fase da onda se altera de forma mais rápida.
Assim, em um meio isotrópico, o raio é perpendicular à frente de onda e indica a direção da propagação
da onda.
78 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

O princı́pio de Huygens, originalmente dirigido para a propagação da luz, baseia-se no


conceito de interferência entre ondas. Para ilustrar a idéia, deve-se extrapolar o exemplo
da Figura 2.5 para o caso de um número infinito de ondas secundárias geradas nas
posições correspondentes ao tempo t. Nestas condições, induz-se que, na posição da frente
de onda principal observada no tempo t + ∆t, um grande número de ondas secundárias
se superpõem com pequeno atraso relativo entre si. Observa-se ainda que, no mesmo
tempo t + ∆t em que é feita a observação, a diversificação nos atrasos relativos aumenta
na direção da posição em que as ondas secundárias foram geradas. Em conseqüência,
pode-se dizer que as ondas secundárias geradas no tempo t somam-se em fase na posição
da frente de onda principal correspondente ao tempo t + ∆t, ao mesmo tempo em que
tendem a se cancelar nas demais posições do espaço, nas quais diferentes posições da
forma da onda interferem entre si3 .
De acordo com o princı́pio de Huygens, a forma da frente de onda que avança depende
da fonte primária e das caracterı́sticas do meio. Portanto, pode-se deduzir que, se a fonte
primária for pontual e se o meio for homogêneo e isotrópico, a frente de onda será circular,
como a gerada por uma pedra atirada em uma lagoa de águas plácidas. O mesmo exemplo
é útil para descrever o que ocorre quando uma onda esférica atinge uma descontinuidade
pontual nas propriedades do meio ou, no caso, quando a onda gerada pela pedra atinge
uma estaca visı́vel na superfı́cie da lagoa. Nestas circunstâncias, tudo se passa como se
uma nova pedra, de menor porte, tivesse sido atirada na posição da estaca. Gera-se assim
uma nova onda, de frente também circular, que interfere com a onda original mas que,
mesmo assim, pode ser individualizada.
Este exemplo representa uma ilustração do elemento fundamental da propagação de
ondas baseada em uma extensão do princı́pio de Huygens, introduzida por Fresnel: a
difração, ou seja, o evento produzido quando uma onda atinge uma descontinuidade
pontual4 . Com este conceito, pode-se ver a propagação de ondas como um processo de
produção recursiva de difrações, processo este perceptı́vel a partir de uma análise da
Figura 2.5. Esta contribuição foi tão importante, para o subseqüente desenvolvimento
da fı́sica, que muitos autores preferem a denominação “princı́pio de Huygens-Fresnel”.
Analisando-se de forma mais abrangente o princı́pio de Huygens, pode-se relacioná-lo
com a lei de Hooke, de acordo com a qual o deslocamento de partı́culas introduzido por
uma onda não é permanente, ou seja, a amplitude associada à freqüência igual a zero é
também igual a zero. Esta é uma idéia que pode ser inferida a partir de uma análise da
Figura 2.4 (página 71), na qual se observa a tendência de, com o aumento de tempo,
a amplitude do pulso se reduzir a zero. Levando-se em conta o resultado do exercı́cio
7 do item 1.7, pode-se, portanto, afirmar que a soma de todas as variações de pressão
introduzidas pela onda, em uma mesma posição, é igual a zero. Esta caracterı́stica ajuda
a compreender o funcionamento do princı́pio de Huygens, já que uma soma como esta
está implı́cita em sua proposição.
O mesmo conceito ajuda a responder a seguinte pergunta: por quê a propagação
3
Sugere-se ao leitor usar a forma de onda da Figura 2.4 (página 71) para analisar os fenômenos de
interferência envolvidos no processo.
4
Ressalte-se que Christiaan Huygens (1629-1695) não incluiu as difrações como parte de sua teoria
para a propagação da luz, embora o mesmo fenômeno já tivesse sido descoberto por Francesco Grimaldi
(1618-1663). Somente mais de um século depois da morte de Huygens, as difrações foram incorporadas
ao seu princı́pio, o que se deve a Augustin Fresnel (1788-1827).
2.1. INTRODUÇÃO 79

da onda em um meio homogêneo e isotrópico não está associada à geração de frentes


de ondas que se propagam também no sentido oposto ao que se observa? Ou seja, por
quê cada posição da frente de onda não gera uma onda que se propaga para trás? Esta
pergunta, que será analisada de forma rigorosa no item 2.7, tem uma resposta de caráter
intuitivo: a combinação das ondas secundárias que avançam envolve um só sentido de
propagação, o que favorece a interferência construtiva junto à frente da onda principal;
por sua vez, as ondas secundárias que recuam combinam-se não somente com outras
ondas do mesmo tipo mas também com ondas que, vindo mais de trás, ainda avançam,
desta forma generalizando a interferência destrutiva.
O entendimento do princı́pio de Huygens pode ser aprofundado através da avaliação
dos fenômenos envolvidos na propagação de uma onda entre dois pontos quaisquer, A
e B. Independentemente da distância entre eles, uma infinidade de diferentes trajetos
está disponı́vel para a onda. Entretanto, de acordo com o princı́pio de Huygens, apenas
um conjunto restrito de trajetos é privilegiado: aquele em que se concentram os menores
atrasos relativos entre os dois pontos, ou, em outras palavras, aquele que favorece, no
ponto B, a interferência construtiva das ondas secundárias geradas no ponto A e suas
vizinhanças. Esta idéia é fundamental para se estabelecer a ligação entre os princı́pios de
Huygens e Fermat.
De acordo com o princı́pio de Fermat, o trajeto entre os dois pontos mencionados,
A e B, deve ser tal que a variação de primeira ordem (derivada) do tempo de percurso,
com relação à variação no trajeto, é igual a zero. Para isto, o tempo de percurso deve ser
mı́nimo, ou máximo, ou não se modificar, sendo que, na maioria dos casos, é mı́nimo. É
fácil perceber que o trajeto que satisfaz a esta condição representa o centro de uma região
em que se observa um pequeno atraso relativo entre as diversas ondas secundárias que,
partindo do ponto A e suas vizinhanças, atingem o ponto B. Nestes termos, pode-se dizer
que o princı́pio de Fermat representa um conceito implı́cito no princı́pio de Huygens5 .
A descrição do trajeto percorrido pela onda entre dois pontos quaisquer torna-se
substancialmente mais simples com o recurso ao conceito de parâmetro de raio. Para se
deduzir a correspondente expressão, considere-se um meio homogêneo e isotrópico qual-
quer, no qual viaja uma onda plana, de acordo com a situação da Figura 2.6. Na figura6 ,
vê-se que a onda viaja obliquamente em relação à superfı́cie e atinge sucessivamente dois
geofones espaçados de acordo com a distância horizontal ∆x. O intervalo de tempo ∆t,
que a onda leva para viajar de um geofone para o outro, é dado por

sen θ
∆t = ∆x
v
onde v é a velocidade com que a onda se propaga no meio e θ é o ângulo entre a direção
do raio e a direção vertical, ou entre a frente de onda e a direção horizontal. No limite,
para ∆x tendendo para zero, pode-se dizer:

dt sen θ
p= = (2.1.46)
dx v
5
Registre-se que o princı́pio proposto por Pierre de Fermat (1601-1665) foi apresentado alguns anos
antes do princı́pio de Huygens.
6
Atenção: a onda plana da figura, com inclinação de aproximadamente 45 graus, representa um caso
particular que pode induzir relações geométricas não generalizáveis.
80 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.6: A geometria de uma onda plana, amostrada por dois


geofones.

onde p é o parâmetro de raio.


Na equação 2.1.46, vê-se que o parâmetro de raio p mede a variação do tempo com
relação à distância horizontal e, portanto, corresponde ao inverso da velocidade aparente
com que a onda viaja na mesma direção, ou à vagarosidade horizontal. Por outro lado,
observa-se a seguinte relação entre a velocidade aparente horizontal e a freqüência angular
espacial Kx (ver a equação 1.7.1):

1 dt Kx
= = (2.1.47)
vA dx ω
onde ω é a freqüência angular temporal e vA é a velocidade aparente. Assim, pode-se
também dizer:
dt sen θ Kx
p= = = (2.1.48)
dx v ω
ou ainda,
dt vKx
sen θ = vp = v = (2.1.49)
dx ω
A mesma seqüência de raciocı́nio, aplicada ao eixo z, leva à dedução da vagarosidade
vertical, q (ver a equação 1.7.2), a qual é definida da seguinte forma:

dt cos θ Kz
q= = = (2.1.50)
dz v ω
ou
dt vKz
cos θ = vq = v = (2.1.51)
dz ω
Com base na relação entre a variação no tempo e a variação nas coordenadas espaciais,
onde a primeira é sempre positiva, induz-se facilmente que o sentido da propagação afeta
2.1. INTRODUÇÃO 81

o sinal do resultado obtido através da aplicação das equações 2.1.48 a 2.1.51. Assim,
no caso particular do eixo z, se a onda estiver subindo, segue-se que dt/dz < 0, o que
equivale a substituir θ por π − θ, já que cos (π − θ) = − cos θ. O oposto ocorre no caso
de uma onda descendente, ou seja, dt/dz > 0.
A Figura 2.6 permite estabelecer uma relação entre as vagarosidades horizontal e
vertical e a velocidade de propagação. Para isto, aplica-se inicialmente o teorema de
Pitágoras, que relaciona da seguinte forma as distâncias envolvidas na figura:

(v∆t sen θ)2 + (v∆t cos θ)2 = (v∆t)2

Substituindo-se sen θ e cos θ de acordo com as expressões 2.1.49 e 2.1.51, e alterando-se


a convenção de derivada para derivada parcial, obtém-se:
 2  2
∂t ∂t 1
+ = (2.1.52)
∂x ∂z v2

A expressão 2.1.52 é um caso especial da chamada equação iconal7 , discutida com


maior profundidade no item 2.5. É interessante observar, na mesma expressão, que, se
as vagarosidades forem substituı́das pelos seus equivalentes em termos de freqüência,
obtém-se a relação de dispersão da equação da onda (equação 2.4.21):
 2  2
Kx Kz 1
+ = (2.1.53)
ω ω v2

O termo “relação de dispersão” vem do fato de este resultado descrever a relação entre
a velocidade de propagação e a freqüência do sinal, relação esta que está no âmago da
definição de dispersão: um sinal apresenta dispersão quando componentes de freqüência
diferentes apresentam velocidades de propagação diferentes (ver o item 2.8).
Imagine-se agora uma interface horizontal que separa dois meios homogêneos e iso-
trópicos, mas diferentes entre si. Considere-se também que os dois meios, 1 e 2, são
caracterizados pelas correspondentes velocidades de propagação, v1 e v2 . A interface hi-
potética assim descrita representa um conjunto de descontinuidades pontuais nas propri-
edades acústicas do meio, as quais são separadas por uma distância infinitesimal. Nestas
condições, se uma onda plana, viajando no meio 1, atingir a interface, cada uma das
descontinuidades pontuais fará com que parte da energia retorne para o meio 1, enquanto
o restante da energia passa a se propagar no meio 2.
O princı́pio de Huygens permite demonstrar que, em função do fato de a onda incidente
ser plana, tanto o sinal que retorna para o meio 1 quanto o que é transmitido para o meio
2 são caracterizados por ondas também planas, sendo a primeira delas definida como uma
reflexão. Como se viu anteriormente — e se discutirá com maior profundidade no item
2.6 —, as amplitudes das ondas refletidas e transmitidas na interface são modificadas
pelos correspondentes coeficientes de reflexão e transmissão.
No que diz respeito à energia refletida, é possı́vel demonstrar, com o princı́pio de
Huygens, que o ângulo de incidência (o ângulo entre o raio incidente e a direção normal
7
Com agradecimentos a Adelson Oliveira, que chamou a atenção do autor para o fato de que existe,
em português, uma palavra equivalente a eikonal.
82 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

à interface) é igual ao ângulo de reflexão (o ângulo entre o raio refletido e a direção nor-
mal à interface). Assim, se uma onda plana, horizontal, atingir uma interface também
horizontal, a onda refletida tem a mesma direção e sentido oposto, em relação à onda
incidente. Por outro lado, se uma onda plana inclinada para leste atinge a mesma in-
terface horizontal, a reflexão gerada é uma onda plana inclinada para oeste, mas ambas
apresentam mergulho de módulo igual. Com base nesta descrição, conclui-se que, se o
raio for tratado como um vetor, a seguinte relação é válida:

θR = π − θ I (2.1.54)

onde θI e θR são, respectivamente, os ângulos que o raio incidente e o raio refletido fazem
com o eixo das profundidades. Este é um resultado que deve ser levado em conta nas
aplicações da equação 2.1.51.
Considere-se agora a parte da energia incidente que é transmitida através da interface.
Se os dois meios apresentarem velocidades diferentes, ocorre o fenômeno da refração, de
acordo com o qual a onda que atravessa a interface mantém o sentido mas tem direção
alterada, em relação à onda incidente. A Figura 2.7 pode ser usada para ilustrar o
conceito. Na figura, o ângulo de incidência é identificado por θ1 , enquanto o ângulo de
refração (o ângulo entre o raio refratado e a direção normal à interface) é identificado por
θ2 .
Na Figura 2.7, as frentes de onda foram traçadas com base no princı́pio de Huygens,
levando em conta as velocidades de propagação nos dois meios. Percebe-se na figura que,
no intervalo de tempo ∆t, a onda se deslocou do ponto D até o ponto E, ainda no meio
1. No mesmo intervalo de tempo, a onda se deslocou do ponto B até o ponto C, já no
meio 2. Configuram-se assim dois triângulos, um no meio 1, outro no meio 2. Como o
segmento de reta BE é comum aos dois triângulos, pode-se dizer:
1 sen θ1 sen θ2
= =
BE v1 ∆t v2 ∆t
Eliminando-se o termo comum, ∆t, obtém-se a lei de Snell:

sen θ1 sen θ2
= (2.1.55)
v1 v2

onde θ1 é o ângulo de incidência e θ2 é o ângulo de refração.


A lei de Snell pode também ser deduzida com base no princı́pio de Fermat. Para isto,
mantêm-se constantes as posições da fonte e do ponto de observação, uma em cada lado
da interface, e estima-se a derivada do tempo entre os dois pontos com relação a uma
posição, na interface, que defina o trajeto. O tempo mı́nimo, prescrito pelo princı́pio de
Fermat, corresponde à posição em que a derivada obtida é igual a zero. Tomando-se a
Figura 2.7 como exemplo, aplica-se ao caso a seguinte equação:
 
dt d AB BC
= + =0 (2.1.56)
dxB dxB v1 v2

onde xB é a coordenada horizontal do ponto B, coordenada esta que se relaciona às


distâncias AB e BC através do teorema de Pitágoras. Derivando-se e transformando as
2.1. INTRODUÇÃO 83

Figura 2.7: A aplicação do princı́pio de Huygens, na presença de uma


interface acústica.

razões obtidas em funções trigonométricas, obtém-se a lei de Snell, já que o resultado
dessas operações é:
dt sen θ1 sen θ2
= − =0
dxB v1 v2
Um caso particular da lei de Snell ocorre quando o ângulo de incidência é igual ao
chamado ângulo crı́tico, θc , cujo seno é definido por
v1
sen θc = sen θ1 = (2.1.57)
v2
Neste caso, a onda refratada viaja no meio 2, junto à interface entre os dois meios, já que
θ2 = 900 . Estas são também as condições em que é gerada a chamada onda frontal (head
wave), que viaja no meio 1, a partir da interface, de acordo com o mesmo ângulo θ c .
A lei de Snell é fundamental para se rastrear o raio em um meio heterogêneo, com
múltiplas camadas. Supondo-se que todas as interfaces sejam horizontais e que as cama-
das sejam homogêneas e isotrópicas, a lei de Snell assume a seguinte forma:

sen θ1 sen θn
p= = ··· = (2.1.58)
v1 vn
onde p é o parâmetro de raio e θ é o ângulo de incidência na base da camada identificada
pelo subscrito. Com base nesta expressão, percebe-se que, em toda a trajetória de um
raio que percorre um meio como o descrito, pode-se associar os ângulos de incidência em
todas as interfaces a um único valor de p.
Considerando um meio em que as camadas assumem qualquer atitude, como no exem-
plo da Figura 2.8, a lei de Snell deve ser aplicada, em cada interface, de acordo com a
84 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.8: Um raio sı́smico, no caso de um meio heterogêneo.

equação 2.1.55, em vez da equação 2.1.58. A mesma figura pode também ser usada para
ilustrar o princı́pio da reciprocidade. De acordo com este princı́pio, um sinal emitido no
ponto A e registrado no ponto B é igual a um sinal emitido no ponto B e registrado no
ponto A. A aplicação mais imediata do princı́pio da reciprocidade ao método sı́smico é
a possibilidade de intercambiar, sem prejuı́zo, as posições de um ponto de tiro e de uma
estação de geofones. Obviamente, neste caso, devem-se desconsiderar fenômenos proxi-
mais, associados às condições de acoplamento, ao sistema de aquisição dos dados sı́smicos
e à superfı́cie livre (interface terra-ar).

2.1.4 A função refletividade e o modelo convolucional


Nos subitens anteriores, discutiram-se processos envolvidos na geração e na propagação de
ondas sı́smicas. No que diz respeito às aplicações do método sı́smico, esses processos são
fundamentais para o entendimento de como a geologia influencia as reflexões registradas,
as quais representam as informações que o geofı́sico usa para aplicar o processo inverso,
ou seja, o da descrição da geologia responsável pelas reflexões registradas. Ver-se-á nos
itens subseqüentes que este tema pode se tornar muito complexo, o que justifica tratá-lo
na forma de aproximações sucessivas, iniciando com um modelo simples.
Considere-se uma sucessão de camadas horizontais superpostas, com interfaces carac-
terizadas pelos correspondentes coeficientes de reflexão e transmissão. Suponha-se que se
deseja registrar um traço sı́smico em uma situação real semelhante à do mesmo modelo,
assumindo-se que as posições da fonte de energia e do receptor são coincidentes. Com
algumas simplificações, os processos envolvidos na geração desse traço sı́smico podem ser
vistos como a seguinte seqüência de operações:

1. Na superfı́cie, emite-se o pulso sı́smico, que viaja para baixo.

2. Ao atingir a primeira interface, a amplitude de cada uma das amostras do pulso


sı́smico é multiplicada pelo coeficiente de reflexão e a forma de onda resultante
retorna à superfı́cie, onde é registrada.

3. Na mesma interface, parte da energia do pulso, representada pelo produto entre


2.1. INTRODUÇÃO 85

suas amplitudes e o coeficiente de transmissão, atravessa a interface e continua a


descer.
4. A fração de energia transmitida atinge sucessivamente as interfaces subseqüentes,
repetindo-se em cada uma delas o que ocorreu na primeira.
5. No trajeto ascendente, repetem-se, no sentido inverso, os fenômenos descritos nas
etapas 2, 3 e 4. Nestas condições, os sinais refletidos para baixo representam a
origem dos eventos múltiplos.
6. O sinal que viaja para cima é registrado na superfı́cie. Na gravação correspondente,
acumulam-se as diversas reflexões, cada uma delas definida em função do tempo
decorrido após a emissão do pulso sı́smico. Isto significa que, freqüentemente, é
difı́cil isolar a contribuição individual de um refletor.
Na Figura 2.9, representa-se a geração de um traço sı́smico hipotético de acordo com
o processo descrito, desprezando-se o coeficiente de transmissão, os eventos múltiplos e
outros fatores discutidos mais adiante. A curva na extrema esquerda da figura representa
o perfil de impedâncias acústicas em função do tempo, It , ou ρt vt , correspondente a um
modelo de seis camadas, a partir do qual foi gerado o traço de coeficientes de reflexão,
ou seja, a função refletividade, identificada pelo sı́mbolo rt . Os traços de números 1 a
5 representam as contribuições individuais de cada uma das cinco interfaces do modelo
usado. Na extrema direita da figura, representa-se o resultado da soma dos cinco traços,
st , resultado este que corresponde a um traço sı́smico idealmente registrado nas condições
descritas.
Uma comparação com a Figura 1.4 (página 8) levaria o leitor a observar que o pro-
cesso sintetizado na Figura 2.9 corresponde à representação gráfica de uma convolução,
detalhada na forma do princı́pio da superposição. Ou seja, trata-se de uma aplicação, na
ausência de ruı́dos, do chamado modelo convolucional do traço sı́smico para incidência
vertical, o qual é descrito matematicamente pela seguinte equação:
st = p t ∗ r t + n t (2.1.59)
onde pt é o pulso sı́smico, rt é a série de coeficientes de reflexão — a função refletividade
— e nt é o ruı́do, todos definidos em função do tempo, t. Basicamente, é este o modelo
empregado no cômputo do sismograma sintético sem múltiplas, o qual, como o nome
indica, procura reproduzir um sismograma. Desta forma, a Figura 2.9 pode ser tomada
como um exemplo simples de sismograma sintético, válido para o afastamento fonte-
receptor igual a zero.
Em termos de transformada Z, o modelo convolucional é apresentado da seguinte
forma:
S(Z) = P (Z)R(Z) + N (Z) (2.1.60)
ou, no domı́nio da freqüência,
S(f ) = P (f )R(f ) + N (f ) (2.1.61)
Desprezando-se o ruı́do, pode-se reescrever a última equação em função da amplitude, A,
e da fase, φ (ver o item 1.2). O resultado é:
AS (f ) = AP (f )AR (f ) (2.1.62)
86 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

It rt 1 2 3 4 5 st
0.00

+ + + + =

0.25
Tempo (s)

0.50

Figura 2.9: Geração de um traço sı́smico através do modelo convolu-


cional.

e
φS (f ) = φP (f ) + φR (f ) (2.1.63)

Ou seja, multiplicam-se os espectros de amplitude e somam-se os de fase.


Na aplicação do modelo convolucional, assume-se normalmente que os refletores são
horizontais. Com algumas ressalvas, pode-se estender o mesmo conceito a camadas mer-
gulhantes, desde que a posição das reflexões corresponda ao tempo vertical correto entre
a superfı́cie e os refletores, independentemente do mergulho das camadas. Entretanto, o
mesmo modelo não se aplica a um traço sı́smico cuja posição das reflexões não foi cor-
rigida; ou seja, o modelo convolucional 1-D não incorpora as distorções verificadas no
trajeto.
É possı́vel analisar o modelo convolucional sob uma ótica diferente, que permite enri-
quecê-lo. Para isto, suponha-se que, em cada interface, exista uma fonte de energia, com
amplitude proporcional ao coeficiente de reflexão correspondente. Suponha-se também
que a energia de todas as “fontes” possı́veis seja liberada no mesmo instante t = 0, atin-
gindo a superfı́cie no tempo t = R/vH , onde R é a distância de cada ponto da interface
até o receptor, e vH é a metade da velocidade de propagação do som no meio. Neste caso,
o sinal registrado seria o resultado da soma das contribuições de todas as interfaces, exa-
2.1. INTRODUÇÃO 87

tamente como na Figura 2.9. Com esta concepção, o modelo convolucional transforma-se
no modelo do refletor explosivo, idealizado por J. Sherwood (Loewenthal et al., 1976), o
qual permite incorporar fenômenos associados à propagação da onda em duas ou em três
dimensões, parte dos quais são discutidos neste item.

2.1.5 Distorções inerentes ao método sı́smico


Na construção da Figura 2.9, desprezaram-se inúmeras distorções sofridas pelo sinal
sı́smico, distorções estas que podem ser agrupadas da seguinte forma: (a) perda de am-
plitude causada pelo espalhamento geométrico da energia; (b) perda de amplitude por
transmissão através das interfaces; (c) influência negativa de múltiplas e reverberações;
(d) distorções de amplitude e fase causadas por múltiplas de camadas finas e de outros es-
palhadores de energia; (e) distorções de amplitude e fase causadas por absorção inelástica
da energia; (f) deformações na geometria das reflexões, causadas pela anisotropia; (g) de-
formações na geometria, na amplitude e na fase das reflexões, causada pela distribuição
das velocidades do meio e pela curvatura das interfaces, incluindo a dos próprios re-
fletores de interesse; (h) deformações de amplitude e fase das reflexões, causadas pela
interferência de reflexões verticalmente adjacentes; (i) conversão de modo; (j) presença
de ruı́dos diversos, que não serão discutidos neste subitem e; (k) distorções na forma do
pulso sı́smico.
Este conjunto de distorções deve ser analisado com base nos principais objetivos do
método sı́smico, que são os de determinar com segurança as propriedades elásticas e a
posição das camadas geológicas. Neste sentido, há que se mencionar outro problema:
mesmo em condições ideais, como aquelas em que se gerou a Figura 2.9, as únicas in-
formações disponı́veis para o intérprete são o tempo e a amplitude. Em tese, estas
informações, combinadas com o conhecimento do pulso sı́smico, poderiam ser suficientes
para que ele estimasse as profundidades dos refletores e as propriedades elásticas das
camadas a eles relacionadas, as quais são cruciais para a perfuração de poços de petróleo.
Entretanto, se forem levadas em conta as demais fontes de distorção já citadas, pode-se
dizer que esta é uma tarefa impossı́vel sem o recurso a dados adicionais.
Ver-se-á, nos itens 2.2 a 2.7 e no Capı́tulo 3, que a determinação das profundida-
des e das propriedades elásticas das rochas está intimamente relacionada com a correção
de diversas deformações do sinal sı́smico registrado. Em particular, sabe-se que o co-
nhecimento das velocidades das camadas é importante não somente para se converter
informações de tempo em profundidade mas também para se corrigir as distorções causa-
das pela própria geometria dos refletores, o que inclui a interferência lateral das reflexões.
Idealmente, ambos os temas devem ser tratados no mesmo contexto, ou seja, o da mi-
gração e inversão dos dados sı́smicos (ver os itens 3.4 a 3.7). Ressalte-se ainda que todas
as distorções de uma forma ou de outra associadas à velocidade de propagação das ondas,
como as causadas pela anisotropia, devem ser tratadas no mesmo contexto.
Entre as demais distorções sofridas pelo sinal sı́smico, inclui-se a perda de amplitude
causada pelo espalhamento geométrico da energia, fenômeno este que, em um meio ho-
mogêneo e isotrópico, é denominado divergência esférica. A este respeito, sabe-se que a
amplitude de um sinal sı́smico tende a cair com o aumento na distância percorrida por
ele. Para justificar cientificamente esta observação empı́rica, considere-se a propagação de
um sinal na forma de uma superfı́cie esférica que se expande. Nestas condições, a energia
88 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

somente é conservada se o produto entre a área da mesma superfı́cie e a intensidade da


onda, definida na forma da equação 2.1.28, se mantiver constante. Para isto, o aumento
na área deve necessariamente ser seguido pela redução na intensidade da onda. Uma vez
que a intensidade da onda é proporcional ao quadrado da amplitude, conclui-se que o
fator de perda de amplitude é inversamente proporcional à distância percorrida, a qual é
igual ao raio da esfera, R. Aplica-se, portanto, a seguinte igualdade:
D1 R1 A
= = (2.1.64)
D R A1
onde D é o fator de divergência esférica — equivalente ao fator de perda de amplitude
por espalhamento geométrico da energia em um meio homogêneo e isotrópico — e A é a
amplitude, enquanto o subscrito 1 indica uma posição de referência (por exemplo, a fonte
da energia). No item 2.5, este tema será tratado com maior profundidade.
Grande parte das distorções sofridas pelo sinal sı́smico dependem do mesmo fator que
favorece a utilização do método sı́smico: a presença de interfaces elásticas, ou da partição
de energia, discutida no item 2.6. Entre as distorções geradas por este fator, a mais
simples e talvez menos danosa de todas é a perda de amplitude causada pelo coeficiente
de transmissão, cuja forma aplicada à incidência normal é dada pela expressão 2.1.44.
A conversão de modo, ou seja, a transformação de ondas P em S, e vice-versa, pode
ser ainda menos importante mas também pode, em algumas circunstâncias, ser bastante
prejudicial. Na mesma famı́lia, inclui-se uma distorção muito mais expressiva: a causada
pelas múltiplas, reverberações e fantasmas.
Uma vez que as ondas refletidas e transmitidas viajam em sentidos opostos, induz-se
facilmente que uma sucessão de interfaces, como a da Figura 2.9, produz a propagação
simultânea de diversas ondas ascendentes (U ) e descendentes (D). Estas são condições
básicas para se distinguir os eventos primários dos múltiplos. Assim, se uma onda se
refletir em uma interface geológica e, no trajeto de ida e volta entre a superfı́cie de
registro e a interface, não se refletir em qualquer outra interface, o evento resultante é
definido como uma reflexão primária. Por outro lado, define-se uma múltipla como a
onda que é refletida pelo menos duas vezes antes do registro.
Vê-se, na Figura 2.10, o trajeto tı́pico de quatro eventos múltiplos, representados na
presença de afastamento entre a fonte e o receptor: (a) o fantasma da fonte, combinado
com uma reflexão primária; (b) uma múltipla de primeira ordem; (c) uma múltipla peg leg
e; (d) uma múltipla interna. Deve-se ressaltar a distinção entre as múltiplas da superfı́cie
livre as quais, mesmo quando são do tipo peg leg, envolvem a superfı́cie, e as múltiplas
internas, que não envolvem a superfı́cie. No item 2.8, este tema será novamente discutido.
É na famı́lia das múltiplas internas que se situam as múltiplas de camadas finas e
o microespalhamento da energia entre descontinuidades espacialmente distribuı́das, os
quais introduzem, no sinal sı́smico, significativas distorções de amplitude e fase. Em par-
ticular, nota-se a redução da banda espectral com o tempo de percurso, assim como a
dependência entre velocidade e freqüência. Distorções similares são observadas na pre-
sença de absorção, ou seja, da transformação de energia elástica em calor, fenômeno este
causado pelo atrito entre partı́culas de rocha. Tomando-se a expressão 2.1.28 como de-
finição da intensidade da onda, F , pode-se dizer que, em um meio homogêneo e isotrópico,
ocorre absorção quando a seguinte inequação é satisfeita: ∂(F A)/∂t < 0, onde A é a área
abrangida pela frente de onda. Em termos práticos, não é fácil caracterizar esta condição,
2.1. INTRODUÇÃO 89

Figura 2.10: Representação esquemática de diferentes tipos de


eventos associados à reflexão primária: (a) reflexão combinada
com o fantasma da fonte; (b) múltipla de primeira ordem; (c)
múltipla peg leg; (d) múltipla interna (entre camadas).

o que torna difı́cil isolar as distorções causadas pela absorção daquelas devidas às des-
continuidades elásticas. Este tema é discutido com maior profundidade no item 2.8.
Diversas distorções inerentes ao método sı́smico concentram-se na relação entre a
banda espectral disponı́vel e as espessuras das camadas. A Figura 2.9 pode ser usada para
ilustrar o conceito: observe-se que o pulso sı́smico usado tem fase igual a zero e espectro
de amplitude controlado, o que pode ser percebido analisando-se as reflexões isoladas dos
traços 1 a 5. Mesmo nestas condições favoráveis, pode-se observar, no resultado final,
que a clara distinção entre interfaces verticalmente vizinhas, como a quarta e a quinta da
figura, é relativamente difı́cil, em função da interferência das reflexões correspondentes.
Em condições reais, os fatores que influenciam a análise desse tema são, principalmente,
a absorção, as múltiplas internas das camadas finas — ambos já mencionados — e os
pulsos sı́smicos reais, que são relativamente mais complexos do que o usado na Figura
2.9, à semelhança do exemplo apresentado na Figura 2.11.
Nem sempre é fácil distinguir distorções associadas à propagação em subsuperfı́cie
das deficiências espectrais da assinatura da fonte sı́smica. Entretanto, sabe-se que, se
forem desconsiderados os fenômenos cuja origem se situa abaixo da fonte e dos recepto-
res, apenas os seguintes fatores devem afetar a forma do pulso sı́smico registrado: (a)
a assinatura da fonte sı́smica propriamente dita; (b) o acoplamento entre a fonte, ou o
receptor, e o terreno; (c) os fantasmas e; (d) os próprios equipamentos de recepção e
registro, responsáveis pela transformação do sinal elástico em impulsos elétricos digitali-
zados. Com base na comparação entre as figuras 2.11 e 2.4, percebe-se que os fantasmas
90 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.11: Exemplo de pulso sı́smico que emula, a partir do


pulso da Figura 2.4, as condições reais de aquisição de dados no
mar. A fonte e o receptor foram um arranjo de air-gun e um hi-
drofone, situados nas profundidades de 5m e 10m, respectivamente
(ver o item 2.9).

merecem um lugar destacado nesta análise já que um deles, o do receptor, foi o único
responsável pelas diferenças entre as duas figuras. No item 2.9, esse tema será explorado
com maior profundidade.

2.1.6 A técnica CDP


O quadro descrito no subitem 2.1.5 é compatı́vel com a adoção de uma técnica que:
(a) forneça os dados básicos para a transformação de registros sı́smicos reais em traços
sı́smicos similares aos que se obteriam nas condições quase ideais da Figura 2.9 e; (b)
permita ao intérprete localizar com relativa segurança os refletores de interesse. Esta foi
uma das razões que levou à criação da técnica CDP8 (Common Depth Point), de acordo
com a qual se procura amostrar um mesmo ponto em subsuperfı́cie diversas vezes, cada
uma delas com um afastamento fonte-receptor distinto, levando a um conjunto de traços
denominado agrupamento CMP (Common MidPoint).
Em um agrupamento CMP, o tempo correspondente a uma dada reflexão pode ser
aproximado pela seguinte equação (ver os itens 2.3 e 3.1):
x2
t2 = t20 + (2.1.65)
vE2
onde x é o afastamento fonte-receptor, t0 é o tempo de ida e volta do sinal até o refletor
no afastamento fonte-receptor igual a zero (x = 0) e vE é uma estimativa da velocidade
de propagação no meio. Considerando-se um sistema de coordenadas, em vez do simples
afastamento fonte-receptor, tem-se a seguinte equação:
 2  2
2 2 xg − x s yg − y s
t = t0 + + (2.1.66)
vE vE
8
A técnica CDP, implementada em escala de produção a partir da década de 1960, foi idealizada por
Harry Mayne no inı́cio dos anos 1950, embora um conceito similar tenha sido aplicado por Cecil Green
já na década de 1930 (Dobrin, 1976).
2.1. INTRODUÇÃO 91

onde os subscritos s e g referem-se à fonte e ao receptor, respectivamente, enquanto x e


y são coordenadas superficiais.
A multiplicidade inerente à técnica CDP faz com que os traços sı́smicos de um agru-
pamento CMP possam ser empilhados de forma a reforçar as reflexões. Para isto, cada
amostra, registrada no tempo de reflexão t, é deslocada para o tempo t0 e acumulada
no traço de saı́da, o qual se situa na posição do ponto médio entre a fonte e o receptor.
Os traços sı́smicos resultantes desse processo seriam, em princı́pio, equivalentes aos que
se obteriam na ausência de afastamento entre a fonte e o receptor, com a vantagem de
serem menos ruidosos. Uma simples inspeção da equação 2.1.65 permite induzir que,
neste processo, a velocidade de empilhamento é um fator crucial. Para a sua deter-
minação, utilizam-se as chamadas análises de velocidade, as quais correspondem a testes
de empilhamento com velocidades distintas.
No processo de empilhamento, os ruı́dos aleatórios são atenuados de forma proporcio-
nal à raiz quadrada da cobertura da famı́lia CMP, ou seja, do número de traços sı́smicos
que a compõem. Processo similar, embora não tão facilmente quantificável, ocorre com
as múltiplas, principalmente aquelas geradas em locais com grande crescimento da velo-
cidade com o tempo (ver os itens 3.1 e 3.3). Estas caracterı́sticas positivas favorecem e,
ao mesmo tempo, exigem a obtenção de uma boa velocidade de empilhamento a qual,
com freqüência, se aproxima da velocidade de propagação do meio. Criam-se, assim,
condições para se obter estimativas razoáveis da profundidade dos refletores e, ao mesmo
tempo, seções sı́smicas empilhadas de boa qualidade, o que justifica plenamente o sucesso
da técnica CDP.
O traço sı́smico resultante do empilhamento de um agrupamento CMP pode realmente
representar um traço de afastamento igual a zero, desde que algumas premissas importan-
tes sejam respeitadas: (1) o coeficiente de reflexão não depende do ângulo com que a onda
atinge a interface, o que, como se verá no item 2.6, é apenas uma aproximação, embora
aceitável em muitas circunstâncias; (2) a geometria da curva tempo-distância, correspon-
dente a uma reflexão em um agrupamento CMP, pode ser descrita por uma hipérbole (a
velocidade não varia, ou varia pouco, na distância abrangida pelo agrupamento CMP); (3)
não existe mergulho, ou ele é pequeno e; (4) as deformações de amplitude e fase, sofridas
pelo sinal sı́smico, não são significativas ou podem ser tratadas de forma aproximada.
Ao longo dos anos 1970, percebeu-se que os dados sı́smicos, adquiridos com base na
técnica CDP, poderiam receber tratamentos adicionais extremamente poderosos, todos
eles relacionados, de uma forma ou de outra, com a inadequação das premissas citadas.
Em primeiro lugar, foi introduzido, no final dos anos 1970, um algoritmo que compensa
parte das deficiências da técnica: a correção de DMO, criada por J. Sherwood, que
procura transformar o traço sı́smico obtido em um afastamento fonte-receptor qualquer
em seu equivalente de afastamento igual a zero. Na mesma época, buscando-se alter-
nativas que levassem a uma melhor imagem estrutural, introduziu-se a migração pré-
empilhamento. Paralelamente a esses esforços, desenvolveram-se conceitos que associam
a resposta sı́smica, obtida na presença de afastamento entre a fonte e os receptores, às
litologias e ao fluido que as satura, o que levou à necessidade de um tratamento mais
correto para a amplitude do sinal sı́smico. Esse conjunto de temas será discutido no
Capı́tulo 3, com base na teoria apresentada nos itens subseqüentes deste capı́tulo.
92 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

2.2 O Princı́pio de Huygens e o Método Sı́smico


Neste item, a aplicação do princı́pio de Huygens à propagação de ondas sı́smicas é dis-
cutida com base no modelo do refletor explosivo, o qual, como se viu no item 2.1, pode
ser empregado, com algumas ressalvas, ao caso de uma seção sı́smica empilhada. A
mesma idéia fundamenta a discussão de versões simplificadas da modelagem sı́smica
sem múltiplas e sem o efeito de fenômenos como a perda por transmissão e a absorção,
fenômenos estes que serão analisados mais adiante.

2.2.1 A geometria das reflexões e o refletor explosivo


A maneira mais simples de se analisar uma seção sı́smica empilhada consiste em se supor
um sistema de aquisição em que a fonte e o receptor são coincidentes. Ou seja, considera-se
que os ângulos de incidência e reflexão, em cada interface, são iguais a zero. Para descrever
a geometria envolvida no assunto, imagine-se um difrator situado nas coordenadas (x 0 , z0 )
e um sistema fonte-receptor posicionado nas coordenadas (x, z = 0). No caso 2-D, com
superfı́cie de registro horizontal, a distância, R, entre esses dois pontos, é dada pela
seguinte expressão:
R2 = (z − z0 )2 + (x − x0 )2 (2.2.1)
ou, como z = 0,
R2 = z02 + (x − x0 )2 (2.2.2)
Se o meio for homogêneo e isotrópico, o tempo duplo, gasto no trajeto entre o difrator
e o sistema fonte-receptor, é dado por t = 2R/v, onde v é a velocidade de propagação.
Combinando-se este resultado com a equação 2.2.1, tem-se:
4
t2 = t20 + (x − x0 )2 (2.2.3)
v2
onde t é o tempo duplo medido nas coordenadas (x, z = 0), enquanto t0 é o tempo duplo
vertical, dado por t0 = 2z0 /v.
Uma seção empilhada pode ser analisada de forma alternativa, através do modelo do
refletor explosivo, idealizado por John Sherwood (Loewenthal et al., 1976) e parcialmente
discutido no item 2.1. De acordo com este modelo, um refletor é tratado como um
conjunto de fontes isoladas de energia, que “explodem” simultaneamente no tempo t =
0. O sinal correspondente a cada fonte é registrado na superfı́cie, no tempo dado por
t = R/vH , onde vH é igual à metade da velocidade de propagação correta, o que permite
reescrever a equação 2.2.3 da seguinte forma:

(x − x0 )2
t2 = t20 + 2
(2.2.4)
vH

O modelo do refletor explosivo, aliado ao princı́pio de Huygens, pode ser usado na


geração da geometria da resposta sı́smica a algumas situações geológicas exemplares.
Considere-se, inicialmente, o caso de um difrator isolado, em um meio homogêneo e
isotrópico. Na Figura 2.12, ilustram-se as geometrias envolvidas na propagação e no
registro da difração correspondente. Vê-se na figura que, embora a onda se propague
na forma de uma semi-esfera, a geometria do registro correspondente, representada em
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 93

0.6 t1
Tempo (s)
0.8

1.0 t2
1.2
0
Profundidade (km)

0.2 t2
0.4 t1
0.6
DIFRATOR
0.8
0 0.5 1.0 1.5 2.0
Coordenada horizontal (km)
Figura 2.12: A relação geométrica entre a propagação da onda gerada
por um difrator (embaixo) e a correspondente difração, registrada na su-
perfı́cie (no alto). Os sı́mbolos t 1 e t2 representam tempos de propagação
iguais a 0.6s e 1s. A velocidade do meio é 2000m/s (v H = 1000m/s).

função do tempo e da distância, é hiperbólica. Este é um resultado óbvio, incluı́do na


equação 2.2.3, e que se deve à geometria de aquisição, a qual implica um corte em uma
profundidade constante.
Considere-se agora que se deseja sintetizar a geometria da resposta sı́smica a uma
interface geológica, usando o modelo do refletor explosivo e o princı́pio de Huygens.
De acordo com os dois conceitos, sabe-se que a tangente às frentes de onda individuais,
geradas no conjunto de difratores que caracteriza o refletor, define a geometria da reflexão
registrada. Levando-se em conta o resultado da Figura 2.12, conclui-se que a mesma
geometria poderia ser sintetizada, diretamente no domı́nio da distância e do tempo, pela
tangente às próprias difrações registradas. O exemplo de um refletor plano e mergulhante,
em um meio homogêneo e isotróprico, pode ser visto na Figura 2.13, na qual é evidente
uma importante distorção: por causa da geometria de registro, o mergulho real, dado
pela linha que liga os ápices das hipérboles, não é visto na seção registrada, enquanto a
reflexão registrada apresenta um ângulo de mergulho falso, dado pela seguinte expressão:
v dt dt
tan ψ = = vH (2.2.5)
2 dx dx
onde ψ e dt/dx são o mergulho aparente e a vagarosidade horizontal correspondentes à
reflexão.
Viu-se, no item 2.1, que o parâmetro de raio, ou a vagarosidade horizontal de um
evento qualquer, é dado pela razão entre o seno do ângulo, que a frente de onda faz
com a direção horizontal, e a velocidade do meio. Sabe-se também que a vagarosidade
94 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

0
ψ
θ
0.5
Tempo (s)

m
1.0
r

1.5

R
M
2.0
0 1 2 3
Coordenada horizontal (km)

Figura 2.13: Geometria da resposta sı́smica de um refletor inclinado,


com base no princı́pio de Huygens. Os sı́mbolos identificam: R e M ,
uma reflexão e a interface geológica responsável por ela; r e m, um ponto
da reflexão e a correspondente posição no refletor; θ e ψ, os mergulhos
real e aparente. A velocidade do meio é 2000m/s (v H = 1000m/s).

horizontal de uma reflexão, em uma seção sı́smica empilhada, é o dobro da medida em


um sismograma. Combinando-se esses conceitos com a equação 2.2.4, obtém-se a seguinte
igualdade:
dt 2 sen θ sen θ x − x0
p= = = = 2
(2.2.6)
dx v vH vH t
Já no caso da vagarosidade vertical, tem-se:

dt 2 cos θ cos θ z − z0
q= = = = 2 (2.2.7)
dz v vH vH t

Observe-se que, de acordo com o que foi discutido no item 2.1, as duas vagarosidades
podem ser negativas, dependendo do sentido em que a onda avança. Assim, por exemplo,
uma onda ascendente leva a um valor negativo para dt/dz. Esta idéia torna-se mais clara
quando se estima o valor de dt/dz com base na equação 2.2.1, levando-se em conta que
R = vH t e que, no caso, z < z0 .
Considerando-se um refletor plano e um meio homogêneo e isotrópico, observa-se, com
base no modelo do refletor explosivo, que a onda plana correspondente é paralela ao refle-
tor, ainda que o registro em tempo apresente resultado diferente. Nestas circunstâncias,
o ângulo θ, nas equações 2.2.6 e 2.2.7, é também o ângulo de mergulho real do refletor.
Assim, combinando-se as expressões 2.2.5 e 2.2.6, obtém-se um importante resultado, que
será explorado mais profundamente no item 3.4:

tan ψ = sen θ (2.2.8)


2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 95

0.5

1.0
Tempo (s)

1.5

2.0

2.5
0 1 2 3 4 5 6 7
Distância (km)
Figura 2.14: Geometrias de um modelo geológico (linha pontilhada) e
da resposta sı́smica correspondente (linha cheia). O meio é homogêneo
e isotrópico, com velocidade de 2000m/s (v H = 1000m/s).

Ou seja, a tangente do ângulo de mergulho aparente é igual ao seno do ângulo de mergulho


real, resultado este que também pode ser deduzido a partir da Figura 2.13, uma vez que:
(1) as duas linhas tracejadas que conectam a superfı́cie aos pontos r e m apresentam
igual comprimento; (2) a segunda linha mencionada, que caracteriza o raio normal, é
perpendicular ao refletor M .
Em meios geometricamente complexos, as frentes de onda sofrem distorções mais
acentuadas do que a apresentada na Figura 2.13, conduzindo muitas vezes a respostas
sı́smicas que pouco têm a ver com o modelo geológico original. Veja-se, por exemplo, a
Figura 2.14, que representa um modelo geológico (linha pontilhada) e a geometria da
resposta sı́smica correspondente (linha cheia), geometria esta construı́da estimando-se o
tempo de propagação ao longo do raio normal. No caso particular do sinclinal, tem-se,
como resultado, o fenômeno conhecido por foco enterrado, ou seja, o raio correspondente
à curvatura local do refletor tem comprimento inferior à profundidade. À semelhança de
um espelho côncavo com foco localizado antes do observador, observa-se a inversão da
imagem9 .
Imagine-se agora que a velocidade varie no espaço. Neste caso, a curva tempo-
distância definida pela equação 2.2.3 não mais reproduz a realidade, o que leva à ne-
cessidade de se incluir, no processo de estimativa da curva tempo-distância, a influência
da lei de Snell. Em conseqüência, a frente de onda deixa de ser circular e passa a adotar
forma imposta pelas caracterı́sticas reais do meio. Este fenômeno é exemplificado na
Figura 2.15, através de um difrator situado em um meio onde ocorre variação lateral
9
Associado ao foco enterrado está também o fenômeno denominado triplicação, o qual é caracterizado
pela obtenção, em uma mesma coordenada superficial, de três amostras oriundas de posições distintas
de um mesmo refletor.
96 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

1.5

2.0
Tempo (s)

2.5

3.0
0

0.5
Profundidade (km)

1500m/s
1.0 3500m/s

1.5

2.0
DIFRATOR

1 2 3 4
Coordenada horizontal (km)
Figura 2.15: Modelo geológico com velocidade variável e um difrator
(embaixo) e a geometria da correspondente difração, registrada na su-
perfı́cie (no alto). No modelo, a linha pontilhada representa o chamado
raio imagem, ou seja, o raio que atinge a superfı́cie na direção vertical.
Na resposta sı́smica, o registro do mesmo raio é identificado pelo sı́mbolo
⊕.

de velocidade. Observe-se na figura que a geometria da correspondente difração é dife-


rente de uma hipérbole e que o ápice, caracterizado pela incidência vertical na superfı́cie,
aparece deslocado em relação à posição real da fonte pontual em subsuperfı́cie.

2.2.2 As reflexões e a interferência de ondas acústicas


Até agora, procurou-se descrever a propagação de ondas através de um enfoque puramente
geométrico. Uma análise mais profunda passa pelo estudo dos fenômenos de interferência
envolvidos no processo. Para isto, imagine-se qual seria a resposta sı́smica do refletor
representado na Figura 2.16, supondo-se que a fonte e o receptor sejam coincidentes
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 97

A x
SUPERFÍCIE

λ

4 lambda/4 porque é metade da
crista da onda

O
z0 REFLETOR

z
Figura 2.16: Representação esquemática dos elementos envolvi-
dos na aplicação do princı́pio de Huygens à obtenção da reflexão
correspondente a um refletor horizontal.

e estejam localizados no ponto A. De acordo com o princı́pio de Huygens, a resposta


sı́smica esperada é o resultado da soma das contribuições de todos os pontos situados no
refletor, encabeçadas pela contribuição do ponto O, já que o trajeto entre os pontos O e
A é o menor possı́vel.
Nestas condições, considere-se o seguinte experimento: partindo-se do ponto O, au-
menta-se progressivamente a área do refletor que contribui para o sinal obtido no ponto
A. O resultado deste experimento, parcialmente ilustrado através da Figura 2.17, é
aos poucos, lentamente
uma forma de onda que é paulatinamente alterada, em função da expansão da área de
contribuição, até o limite em que assume a forma final da reflexão. Admitindo-se que
o pulso sı́smico tenha uma forma senoidal (à semelhança do utilizado na construção da
figura), o primeiro pico do sinal observado no ponto A adquire seu valor definitivo no
limite em que o tempo entre cada posição do refletor e o mesmo ponto apresenta um
atraso máximo, em relação ao trajeto OA, igual a um quarto do perı́odo da reflexão
obtida 10 (T /4). Caracteriza-se assim a primeira zona de Fresnel (Sheriff, 1980a). O
mesmo raciocı́nio pode ser estendido para outras fases do pulso, o que leva à definição
das zonas de Fresnel subseqüentes, todas envolvendo atrasos múltiplos de T /4.
Em um meio homogêneo e isotrópico, a região circular correspondente à primeira zona
de Fresnel tem seu raio definido, com base nos elementos da Figura 2.16, pela seguinte

10
Ver-se-á adiante que o mesmo atraso corresponde à metade do perı́odo da difração hipoteticamente
gerada em cada ponto do refletor.
98 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

50
Tempo (ms)

100

0 1/4 1/2 3/4 1 5/4


Atraso máximo (fração do período)
Figura 2.17: Sintetização de uma reflexão de forma senoidal (20Hz), em um ponto
da superfı́cie, através da soma progressiva de sinais oriundos de um refletor horizon-
tal. No eixo das abscissas, os números representam o atraso máximo, em relação ao
trajeto vertical, envolvido na soma que gerou o traço correspondente. Parâmetros:
v = 4000m/s (vH = 2000m/s), z = 100m, ∆d = 5m, ∆x = ∆y = 2.5m.

igualdade: s 2
λ
d= z0 + − z02
4
onde λ é o comprimento de onda e z0 é a profundidade do refletor. Considerando-se

z0 λ λ2
>> ,
2 16
pode-se obter um valor aproximado para o raio da primeira zona de Fresnel, o qual é
dado por
r
1
d∼= λz0 (2.2.9)
2
Na dedução da equação 2.2.9, assumiu-se um atraso de valor especı́fico, T /4, ava-
liado em relação ao trajeto vertical entre os pontos O e A. Para que os fenômenos
de interferência que afetam a amplitude e a fase do sinal registrado possam ser melhor
compreendidos, é conveniente analisar o caso de um atraso infinitesimal arbitrário, ∆t,
independentemente da direção do trajeto de referência. Uma boa forma de investigar o
assunto consiste em se estabelecer qual é a área infinitesimal, ∆S, avaliada em um refletor
horizontal, que contribui para o registro do sinal sı́smico dentro do intervalo de tempo
∆t. Para isto, considere-se, inicialmente, a seguinte versão tridimensional da equação
2.2.1, aplicada a uma famı́lia de pontos situados a uma distância constante, R, do par
fonte-receptor:
x2 + y 2 + z 2 = R 2 (2.2.10)
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 99

onde (x, y, z) correspondem às coordenadas dos pontos escolhidos. Como no caso da
Figura 2.16, assume-se que o par fonte-receptor se situa no ponto A, cujas coordenadas
coincidem com as da origem (xA = 0, yA = 0, zA = 0).
A equação 2.2.10 descreve a geometria da superfı́cie de uma semi-esfera de raio R. No
caso de um meio homogêneo e isotrópico, o mesmo raio corresponde a um tempo duplo
de propagação, t, o qual é constante e dado por
R
t=
v
onde v é igual à metade da velocidade de propagação correta (v = v H ).
Considere-se agora que a superfı́cie definida pela equação 2.2.10 seja seccionada por
um refletor horizontal, como o da Figura 2.18. Uma vez que a correspondente profun-
didade é constante, a equação 2.2.10 é transformada na seguinte equação de um cı́rculo:

x2 + y 2 = R2 − z02 (2.2.11)
onde z0 é a profundidade constante. A área correspondente é dada por

S = π R2 − z02 (2.2.12)

Derivando-se este resultado com relação ao tempo t e levando em conta que R = vt,
obtém-se o seguinte resultado:
∂S ∂S ∂R
= = 2πvR (2.2.13)
∂t ∂R ∂t
Discretizando-se a equação 2.2.13, obtém-se a seguinte fórmula para a área infinite-
simal cujos pontos contribuem para uma reflexão em um dado intervalo de tempo ∆t:

∆S = 2πvR∆t (2.2.14)
ou
∆S = 2πv 2 t∆t (2.2.15)
Em termos da distância R, estes resultados equivalem a

∆S = 2πR∆R (2.2.16)

ou, com base na Figura 2.18, a


∆S = 2πd∆d (2.2.17)
As equações 2.2.14 a 2.2.17 descrevem algebricamente a área do anel de largura ∆d
representado na Figura 2.18, na qual são gerados os eventos que atingem o ponto A
dentro de um mesmo intervalo de tempo ∆t. Observe-se que as três primeiras delas
podem ser utilizadas para se demonstrar a expressão 2.2.9. Para isto, basta considerar,
na equação 2.2.16, R = z0 , ∆R = λ/4 e ∆S = πd2 .
Nas aplicações práticas da equação 2.2.9 (ou 2.2.16, ou 2.2.14), dois aspectos devem
ser destacados. Em primeiro lugar, no caso de uma seção empilhada, a velocidade a usar
na determinação do comprimento de onda, dado por vT , ou v/f , deve ser metade da
correta, se o perı́odo, T , for definido em tempo duplo. Além disso, a expressão 2.2.9 é
100 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.18: Geometria envolvida na relação entre a área infinitesimal na superfı́cie


de um refletor horizontal e o sinal obtido na superfı́cie, em perspectiva (e) e em corte
(d).

particularmente indicada para estudos de resolução espacial (ver o Capı́tulo 4), já que,
através dela, pode-se caracterizar a capacidade de se isolar duas feições lateralmente
adjacentes.
Na análise dos fenômenos de interferência conduzida até agora, adotou-se implicita-
mente a alteração do princı́pio de Huygens proposta por Fresnel, de acordo com a qual a
combinação de diversas difrações, dispostas no mesmo tempo e em posições lateralmente
adjacentes, levaria à geração de uma reflexão horizontal. O exemplo sintético da Figura
2.19, inspirada em uma figura do livro Claerbout (1985), ilustra o conceito: observe-se
que, à medida que diminui a separação lateral entre as difrações, forma-se uma reflexão.
No caso em que, em vez de um refletor, existe em subsuperfı́cie apenas um difrator, o
evento correspondente é uma difração isolada, como a da Figura 2.20.
No contexto da primeira zona de Fresnel, a Figura 2.19 permite duas importantes
observações, ambas relacionadas com a construção das figuras 2.16 e 2.17. Em primeiro
lugar, observa-se que o perı́odo da freqüência dominante da reflexão é, aproximadamente,
o dobro daquele que caracteriza a difração, de tal forma que o limite de λ/4, válido para
a reflexão, corresponde, no caso da difração, a λ/2. Em segundo lugar, induz-se que, se
o refletor, ao invés de horizontal, fosse curvo, o atraso diferencial, que leva à definição da
primeira zona de Fresnel, passaria a depender da curvatura do refletor.
Analisando-se os fenômenos de interferência envolvidos nas diferentes geometrias pos-
sı́veis para o refletor, pode-se concluir que, considerando-se estruturas tı́picas, o raio
da primeira zona de Fresnel é maior no caso de um sinclinal, em comparação com um
anticlinal, ou uma interface plana. Este conceito explica porque as reflexões geradas
em sinclinais tendem a ser mais fortes do que aquelas geradas em anticlinais ou em
interfaces planas. Na Figura 2.21, pode-se ver um exemplo da importância desta idéia.
Observe-se, na figura, que o sinal obtido verticalmente acima do eixo do sinclinal apresenta
amplitude substancialmente maior do que a do sinal correspondente ao trecho horizontal
e, principalmente, do que as das reflexões geradas nos flancos do sinclinal, os quais são
convexos para cima. É também digna de menção a distorção de fase nos traços que
concentram a maior parte da energia.
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 101

Figura 2.19: Resposta sı́smica sintética de um modelo geológico formado por


um conjunto de difratores com espaçamento lateral variável. Parte superior:
modelo geológico, em escala de profundidade. Parte inferior: resposta sı́smica
correspondente (2-D), seguida de filtragem temporal (8-40Hz), em escala de
tempo. Parâmetros: v = 2000m/s (vH = 1000m/s), z = 512m, ∆x = 25m.

Figura 2.20: Uma difração obtida com modelagem sı́smica 2-D, se-
guida de filtragem temporal de fase nula (8-40Hz). Parâmetros: v =
2000m/s (vH = 1000m/s), z = 512m, ∆x = 25m.

Um caso extremo de concentração de energia, similar ao observado na Figura 2.21,


ocorre quando, em um meio homogêneo e isotrópico, para um afastamento fonte-receptor
igual a zero, a superfı́cie do refletor corresponde à de uma semi-esfera centrada na posição
102 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.21: Resposta sı́smica sintética bidimensional, obtida a partir


de uma interface formada por um coeficiente de reflexão lateralmente
constante e um sinclinal na parte central (eixo na coordenada horizontal
igual a 5000m). Parâmetros: v = 2000m/s (v H = 1000m/s), ∆x = 25m.
O pulso sı́smico é um filtro passa-banda (8-40Hz).

da fonte e do geofone, como na equação 2.2.10. Na mesma circunstância, observa-se


também forte distorção de fase, capaz de induzir interpretações errôneas a respeito da
interface. Ambos são efeitos diretos do fato de que, neste caso, não existe o atraso que
caracteriza as zonas de Fresnel.

2.2.3 Uma descrição algébrica do princı́pio de Huygens


Os conceitos empregados na geração das figuras 2.20, 2.19 e 2.21 correspondem a uma
continuação matematicamente rigorosa do princı́pio de Huygens, ou Huygens-Fresnel,
aplicado ao caso 2-D. Para compreender tais conceitos, pode-se partir de uma apro-
ximação matemática do próprio princı́pio de Huygens, a qual se baseia no modelo em-
pregado na dedução da expressão 2.2.9.
Considere-se, inicialmente, a Figura 2.22, que descreve um meio homogêneo e isotró-
pico e um refletor horizontal isolado, situado na profundidade z = zB . Suponha-se agora
que se deseja avaliar como a reflexão correspondente seria registrada nas coordenadas x A ,
yA e zA = 0, por um sistema de aquisição em que a fonte e o receptor são coincidentes. A
resposta obtida deve ser uma combinação da contribuição dos diversos pontos do refletor,
cada um deles situado a uma distância R do ponto A, dada por
p
R = |~r| = (xA − x)2 + (yA − y)2 + (zA − z)2 (2.2.18)

onde zA é igual a zero e z = zB .


Assumindo-se que não existe contribuição de outros pontos, a resposta sı́smica dese-
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 103

Figura 2.22: Geometria envolvida na geração de


uma reflexão sı́smica sintética, no caso de um refle-
tor horizontal.

jada poderia ser aproximada pela seguinte soma ao longo do refletor:


XX
p(xA , yA , zA = 0, t) = m(x, y, zB , t − τ ) (2.2.19)
y x

onde a função m corresponde aos coeficientes de reflexão, avaliados na profundidade


z = zB , enquanto p corresponde ao traço sı́smico, registrado na profundidade z = 0. Por
sua vez, τ é o tempo gasto no trajeto entre cada ponto do refletor e o ponto A, ou seja,
τ = R/v, onde v é igual à metade da velocidade de propagação correta (v = v H ).
Na equação 2.2.19, os sı́mbolos τ e t significam, respectivamente, tempos de trajeto,
estimados no processo, e tempos de reflexão, correspondentes aos sinais obtidos no ponto
A ou medidos na superfı́cie do refletor. Aplicando-se, à mesma equação, o modelo do
refletor explosivo, segue-se que o tempo correspondente a cada coeficiente de reflexão
deve ser tomado como igual a zero. Isto significa que, de acordo com o termo t − τ da
mesma equação, cada coeficiente de reflexão é deslocado para o tempo t = τ , antes de
se executar o somatório. Ou seja, o sinal registrado no ponto A corresponde à soma de
pulsos sı́smicos gerados simultaneamente em todos os pontos do refletor que está sendo
considerado.
Para avaliar a validade da equação 2.2.19, considere-se o caso simples em que os
coeficientes de reflexão, dispostos horizontalmente e descritos pela função m, são late-
ralmente constantes. Como está sendo aplicado o modelo do refletor explosivo e o meio
é homogêneo e isotrópico, segue-se que a correspondente frente de onda, observada na
superfı́cie, é também horizontal. Com base na discussão do item 2.1, sabe-se que, nestas
condições, a amplitude da onda não deve ser alterada. Ou seja, não se observa perda de
amplitude por divergência esférica durante a propagação de uma onda plana.
104 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Pode-se concluir portanto que, no caso da Figura 2.22, se o pulso sı́smico utilizado
for um impulso unitário, o traço sı́smico registrado no ponto A deve ser uma reflexão
isolada, no tempo t = t0 = zB /v, descrita com base na seguinte igualdade:
p(xA , yA , zA = 0, t = t0 ) = m(xA , yA , zB )
Ou seja, o processo de geração de um traço sı́smico sintético na posição (x A , yA ), no caso
de um refletor horizontal e coeficiente de reflexão constante, deve cancelar o efeito dos
coeficientes situados em posições diferentes de (xA , yA ).
A aplicação da equação 2.2.19 ao problema do refletor horizontal não leva ao resultado
esperado, mas sim ao sinal da Figura 2.23a, o qual é caracterizado por uma forma de onda
cuja amplitude cresce linearmente com o tempo e que é limitada por uma descontinuidade
situada no tempo t = t0 , a qual corresponde ao inı́cio do sinal oriundo do refletor. Percebe-
se assim que o resultado da aplicação da equação 2.2.19 está longe do esperado.
Com a Figura 2.18, pode-se compreender melhor o resultado da aplicação da equação
2.2.19. Observe-se, na figura, que o sinal registrado no ponto A, em um mesmo tempo de
trajeto, dado por R/v, corresponde à contribuição dos pontos do refletor situados em uma
área infinitesimal e de forma anelar, ∆S, a qual é dada pela equação 2.2.16. Aplicando-se
o princı́pio da reciprocidade, pode-se considerar uma frente de onda plana atingindo o
refletor, a partir do ponto A, de tal forma que, definindo-se ∆S em termos do produto
∆x∆y, ao longo do anel da Figura 2.18, tem-se:
XX
∆S = ∆x∆y = 2πvR∆R (2.2.20)
y x

onde x, y e R se relacionam através da equação 2.2.18. Com base na equação 2.2.15,


obtém-se a seguinte igualdade, após trocar t por τ (ver discussão acima):
XX
∆S = ∆x∆y = 2πv 2 τ ∆τ (2.2.21)
y x

onde ∆τ é o intervalo de tempo em que se concentram os dados obtidos na área infinite-


simal ∆S, ou seja, ∆R = v∆τ .
Sabendo-se que m é lateralmente constante, a expressão que descreve ∆S permite
descrever o resultado da aplicação da equação 2.2.19 através da seguinte função do tempo:
 
2πv 2 t
p(xA , yA , zA = 0, t) = m0 u(t − t0 )∆τ (2.2.22)
k
onde k e m0 são constantes, a primeira com dimensão de superfı́cie e a segunda igual
ao valor de m, enquanto u é a função degrau. A partir da expressão obtida, podem ser
explicitadas duas distorções na equação 2.2.19:
1. A partir do tempo t = t0 , a amplitude do sinal estimado com a equação 2.2.19 cresce
continuamente com o tempo, o que está de acordo com o resultado apresentado na
Figura 2.23a.
2. A equação 2.2.19 inclui implicitamente uma integração com relação ao tempo,
já que, através das equações 1.2.31 e 1.2.44, percebe-se que, se for desprezada a
freqüência igual a zero, a função degrau tem espectro de freqüências equivalente ao
de um operador de integração.
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 105

a
t0
Tempo

Figura 2.23: Traços resultantes da aplicação de cinco diferentes versões algébricas do


princı́pio de Huygens a um refletor horizontal: (a) equação 2.2.19; (b) equação 2.2.24; (c)
equação 2.2.25; (d) equação 2.2.26; (e) equação 2.2.27. As oscilações de alta freqüência
em torno das descontinuidades devem-se ao fato de o processo ter sido aplicado no
domı́nio da freqüência (trata-se de um exemplo do fenômeno Gibbs). Parâmetros: v =
4000m/s (vH = 2000m/s), ∆x = 5m, ∆y = 5m, zB = 100m e ∆t = 2ms. Para facilitar
a visualização, o traço a teve sua amplitude multiplicada por uma constante.

Para compensar o crescimento de amplitude com o tempo, leva-se em conta que cada
amostra do sinal sı́smico — obtida no ponto A e oriunda de um anel como o representado
na Figura 2.18 — se concentra em um intervalo de tempo constante ∆t. Nestas condições,
a mesma amostra pode ser obtida através da seguinte média ponderada pela área:
X X m(x, y, zB , t − τ )∆x∆y
p(xA , yA , zA = 0, t) = (2.2.23)
y x
∆S

Levando em conta a expressão 2.2.21 e assumindo-se um valor de ∆τ constante e igual a


106 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

∆t, criam-se condições para substituir a equação 2.2.19 por


X X  1  
1
p(xA , yA , zA = 0, t) = 2π m(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.2.24)
y x
vR∆t

Na Figura 2.23b, vê-se o resultado da aplicação da equação 2.2.24 ao mesmo problema


do refletor horizontal. Observe-se que a divisão por 2πvR∆t representou uma alteração
capaz de compensar o crescimento da amplitude com o tempo e que este resultado foi
obtido mesmo com a utilização de um valor constante ∆t. Isto se deve ao fato de que
a largura ∆d do anel, associado à contribuição do refletor para a obtenção de cada
amostra, reduz-se com o aumento do tempo de trajeto τ , fazendo com que ∆τ seja
mantido constante e igual a ∆t.
Mesmo eliminando o crescimento da amplitude com o tempo, a equação 2.2.24 ainda
não levou à resposta desejada, ou seja, uma reflexão isolada, já que o traço sı́smico da
Figura 2.23b pode ser conceitualmente descrito pela seguinte expressão:

p(xA , yA , zA = 0, t) = m0 u(t − t0 )

Ou seja, ainda restou a integração implicitamente introduzida pela função degrau.


Com base nessas observações e considerando que a operação oposta à integração é
a diferenciação, pode-se concluir que a equação 2.2.24 deveria ter sido aplicada sobre
a razão ∆m/∆t, em vez da razão m/∆t. Introduzindo-se esta modificação na mesma
equação e fazendo ∆t tender a zero, obtém-se:
X X  1 ∂  
1
p(xA , yA , zA = 0, t) = 2π m(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.2.25)
y x
vR ∂t

Na equação 2.2.25, está implı́cita a idéia de que m é tratado como um campo de ondas
que flui através da superfı́cie S (definida pela profundidade constante zB ), de acordo com
a taxa ∂m/∂t, e não como um conjunto estático de coeficientes de reflexão. Com base
nesta idéia e no fato de que o refletor que vem sendo utilizado é horizontal, pode-se
facilmente induzir que uma amostra isolada, obtida através da mesma equação, depende
do fluxo vertical do sinal através da superfı́cie S.
O resultado da aplicação da equação 2.2.25 a um sinal plano e horizontal, apresentado
na Figura 2.23c, é claramente aceitável. Entretanto, se o sinal m correspondesse a uma
onda mergulhante, fluindo através da superfı́cie horizontal S, a taxa ∂m/∂t seria maior
do que a correta na posição em que o tempo de trajeto até o ponto A é mı́nimo. Tendo em
vista que o sinal correspondente à mesma posição tende a predominar sobre os demais,
conclui-se que a amplitude prevista no ponto A, com base na equação 2.2.25, seria também
maior do que a correta.
Justifica-se, assim, a aplicação de uma correção que elimine a influência do mergulho
sobre a estimativa de amplitude do sinal. Com base em uma análise da Figura 2.18,
é fácil concluir que esta correção consiste simplesmente em projetar a derivada ∂m/∂t
sobre a normal à frente de onda hipotética definida no trajeto entre a superfı́cie S e o
ponto A ou, alternativamente, em projetar a área medida na mesma superfı́cie, ∆x∆y,
sobre a mesma frente de onda. Neste caso, os sinais mergulhantes seriam tratados de
forma equivalente aos horizontais.
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 107

Assumindo-se, por enquanto, que o ângulo α não varia no intervalo de tempo ∆t,
deduz-se que o fator de correção desejado, denominado fator de obliqüidade, é dado por
cos α. Com este resultado, pode-se transformar a equação 2.2.25 na seguinte expressão:
XX 
1 ∂
 
1
p(xA , yA , zA = 0, t) = 2π cos α m(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.2.26)
y x
vR ∂t

A aplicação da equação 2.2.26 ao problema do refletor horizontal leva ao sinal da


Figura 2.23d. Apesar do bom resultado obtido, deve-se destacar que, numa observação
cuidadosa da mesma figura, é possı́vel perceber que as amostras situadas logo após o
tempo t = t0 não são exatamente iguais a zero, como seria desejável, e que, neste as-
pecto, o resultado da Figura 2.23c é ligeiramente melhor. Ou seja, a introdução do fator
cos α, apesar de estar na direção teoricamente correta, gerou uma perturbação adicio-
nal, associada à esfericidade da frente de onda, a qual não vem sendo adequadamente
considerada.
Para entender melhor a distorção introduzida pelo fator de obliqüidade, observe-se
inicialmente que, em função da curvatura da frente de onda, o ângulo α varia com a
distância R dentro do intervalo de tempo ∆t, de forma inversamente proporcional à
distância entre o refletor e o ponto A. O resultado prático desta variação é o de fazer com
que o operador de derivada com relação ao tempo atue sobre o produto m cos α, em vez
de apenas os coeficientes de reflexão. Ou seja, a equação 2.2.26 inclui, implicitamente,
um termo associado à derivada de cos α com relação ao tempo, o qual é definido na forma
da seguinte igualdade:
mk+1 cos αk+1 − mk cos αk ∂
lim = (m cos α)
∆t→0 ∆t ∂t
Resta, portanto, corrigir a distorção criada indiretamente pela derivada do fator de obli-
qüidade. Para determinar a sua forma, faz-se uso das relações cos α = z/R e R = vt e se
aplica a regra da cadeia à derivada do produto m cos α:
1 ∂ cos α ∂m m cos α
(m cos α) = −
vR ∂t vR ∂t R2
Com este resultado, pode-se eliminar o termo implicitamente criado no processo, o que
permite transformar a equação 2.2.26 na seguinte expressão:
XX 
1 1 ∂
 
1
p(xA , yA , zA , t) = 2π cos α 2
+ m(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.2.27)
y x
R vR ∂t

O resultado da aplicação desta equação ao problema do refletor horizontal elimina a


pequena distorção introduzida pelo fator de obliqüidade, como se pode perceber na Figura
2.23e.
O termo adicional da equação 2.2.27, em relação à 2.2.26, é denominado “termo de
campo próximo”, por ser proporcionalmente mais importante em distâncias menores.
Na verdade, se for levada em conta a forma, no domı́nio da freqüência, do operador de
derivada com relação ao tempo, que é dada por −iω, conclui-se que a importância relativa
do termo de campo próximo depende, na verdade, do produto ωτ , ou ωR/v. Neste caso,
108 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

ele se torna menos importante quando o mesmo produto é muito maior do que 1. Isto
significa que, para as freqüências vizinhas a zero, o mesmo termo pode ser importante
em distâncias não tão próximas quanto sugere o termo “campo próximo”.
A partir das equações 2.2.26 e 2.2.27, pode-se obter outras duas equações que permi-
tem uma correlação mais clara com o princı́pio de Huygens. Inicialmente, deve-se levar
em conta que o traço sı́smico obtido no ponto A depende do fluxo do sinal através do
plano horizontal definido pela profundidade zB . Deve-se também levar em conta que este
sinal poderia incluir não somente os coeficientes de reflexão ali situados mas também o
campo de ondas oriundo de profundidades maiores. Isto significa que os coeficientes de
reflexão, descritos pela função m, podem ser substituı́dos por um campo de pressões p,
avaliado na mesma profundidade zB , o qual representa uma combinação dos coeficientes
de reflexão com o sinal vindo de baixo. Assim, a equação 2.2.27 pode ser reescrita da
seguinte forma:

XX 
1 1 ∂
 
1
p(xA , yA , zA , t) = 2π
cos α 2
+ p(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.2.28)
y x
R vR ∂t

A mesma alteração pode ser feita na equação 2.2.26. Por outro lado, sabe-se que, com
base na regra da cadeia,
∂p ∂p ∂t
=
∂z ∂t ∂z
e que, de acordo com a equação 2.2.7, aplicada a um campo de ondas ascendente,
∂t cos α
=−
∂z v
Desta forma, pode-se transformar a equação 2.2.26 na seguinte expressão:

X X  1 ∂  
1
p(xA , yA , zA , t) = − 2π p(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.2.29)
y x
R ∂z

Ressalte-se que a equação 2.2.29 poderia ser deduzida de forma independente, com
base na Figura 2.18, na qual é possı́vel observar que a distância v∆τ é igual a ∆z cos α.
Segue-se daı́ que, para se eliminar o crescimento de amplitude com o tempo e introduzir
o fator de obliquidade, seria necessário aplicar a seguinte igualdade:
   
1 ∆p 1 ∆p 1 ∆p
cos α = − cos α = −
2πR v∆τ 2πR ∆z cos α 2πR ∆z

onde o sinal negativo foi incluı́do em função da propagação ascendente, a qual implica
aumento no tempo e redução na profundidade. Observe-se que, no limite em que ∆z
tende a zero, o resultado obtido corresponde a uma medida da taxa de variação da pressão
através da superfı́cie S. Observe-se ainda que o fator cos α é totalmente eliminado e,
portanto, não influencia diretamente a mesma taxa.
Desta forma, conclui-se que, ao contrário do que ocorreu com a equação 2.2.26, ne-
nhuma distorção adicional existe na expressão 2.2.29. Isto significa que, aplicadas ao
problema do refletor horizontal, as equações 2.2.28 e 2.2.29 levam ao mesmo sinal sı́smico
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 109

obtido com a expressão 2.2.27. Ver-se-á no item 2.7 que este resultado somente é possı́vel
no caso de superfı́cies planas, como a empregada na presente discussão, ainda que o si-
nal que as atravessa possa assumir qualquer geometria. Ou seja, a superfı́cie plana diz
respeito apenas à forma com que o fluxo do sinal é avaliado e não ao sinal em si.
Assim, pode-se dizer que, no caso em estudo, as equações 2.2.28 e 2.2.29 são duas
diferentes representações matemáticas do princı́pio de Huygens, já que ambas podem
ser interpretadas na forma de uma única operação que interage um campo de ondas
ascendentes com a resposta, ao impulso, do meio, permitindo a obtenção do campo de
ondas em uma posição mais avançada.
No caso da equação 2.2.29, percebe-se que a resposta, ao impulso, do meio implica a
presença do operador ∂/∂z, além do espalhamento da energia de acordo com amplitude
proporcional a 1/R e atraso de tempo τ . Nestas condições, se o campo de pressões,
correspondente à profundidade zB , fosse um impulso unitário, o resultado da aplicação
da mesma equação seria uma difração com forma de onda controlada pelo operador e pelo
espalhamento descritos. Por extensão, se vários desses impulsos fossem combinados na
forma de uma reflexão horizontal, o resultado, avaliado na profundidade zA , seria outra
reflexão também horizontal. Aliás, isto é exatamente o que sugere a generalização da
Figura 2.23e para o caso de múltiplos pontos A, todos na profundidade zA .

2.2.4 Modelagem sı́smica com o princı́pio de Huygens


Na modelagem sı́smica, procura-se sintetizar o registro de uma seção sı́smica (ou um
volume sı́smico) na superfı́cie, a partir de um modelo geológico definido por uma matriz
(ou um volume), de constantes elásticas, em função da profundidade e das coordenadas
horizontais. O modelo sı́smico desejado é uma matriz (ou um volume) com valores de
amplitude, teoricamente medidos na superfı́cie, em função do tempo e das coordenadas
horizontais. As figuras 2.20, 2.19 e 2.21 são exemplos de seções sı́smicas sintéticas
geradas com algoritmos de modelagem baseados na versão 2-D da equação da onda.
O princı́pio de Huygens, na forma matemática apresentada acima, pode ser usado
na modelagem sı́smica tridimensional, desde que se admitam as restrições do modelo
do refletor explosivo11 . No formalismo da equação 2.2.27, sintetiza-se um traço sı́smico
isolado, na posição (xA , yA , zA = 0), a partir da contribuição de múltiplos difratores. O
mesmo resultado prático poderia ser obtido de acordo com outra seqüência de operações,
determinando-se a influência de um difrator isolado na resposta de vários traços sı́smicos.
Nesta última opção, é mais clara a correlação com o modelo convolucional.
No caso 3-D, pode-se executar a modelagem sı́smica de forma aproximada, com base no
modelo do refletor explosivo, através da seguinte seqüência de operações, correspondentes
à generalização da equação 2.2.26:
1. Calculam-se os coeficientes de reflexão em todas as amostras do modelo geológico,
obtendo-se o volume r(x, y, z).

2. Assume-se que cada coeficiente de reflexão do modelo fornecido é um difrator. As-


sim, escolhido um deles, estimam-se os tempos de trajeto do sinal até os diversos
11
Nesta e em outras formas discutidas adiante, a modelagem sı́smica seria mais propriamente denomi-
nada demigração, a qual não inclui múltiplas e normalmente despreza a influência de diversos fatores de
propagação.
110 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

pontos da superfı́cie, através da expressão τ = R/v, onde a distância R é dada pela


equação 2.2.18. Observe-se que a velocidade a usar é metade da correta.

3. Calcula-se a amplitude da difração, em cada posição da curva tempo-distância


correspondente (x-y-τ ), multiplicando-se o valor do coeficiente de reflexão escolhido
pelo fator W , que é dado por
cos α
W3D = ∆x∆y
2πvR
onde cos α = z/R e R = vτ .

4. Cada uma das amplitudes obtidas na etapa 3 é somada aos valores já existentes na
matriz do modelo sı́smico, na posição correspondente, (x, y, τ ).

5. Repetem-se as etapas 2 a 4, para todas as amostras do volume de coeficientes de


reflexão do modelo geológico.

6. Derivam-se os traços resultantes com relação ao tempo. Esta operação compensa a


integração do pulso sı́smico, envolvida indiretamente nas etapas 2 a 5.

7. Convolve-se cada traço do modelo sı́smico resultante com um pulso sı́smico qualquer
(por exemplo, um filtro passa-banda).

No esquema descrito, uma informação é crucial: a curva tempo-distância associada à


difração e à velocidade correspondente. Em um meio homogêneo e isotrópico, a veloci-
dade e os tempos, determinados com base na distância dada pela expressão 2.2.18, são
obviamente exatos. Na eventualidade de a velocidade variar apenas na direção vertical,
os tempos determinados da mesma forma podem ainda ser aceitáveis, desde que se utilize
uma velocidade média adequada, como a velocidade de empilhamento (isenta do efeito
do mergulho). Entretanto, sabe-se que a variação vertical na velocidade do meio leva à
geração de curvas tempo-distância não hiperbólicas, fazendo com que a velocidade média
correspondente dependa do afastamento lateral entre o difrator e os receptores. Portanto,
a utilização de velocidade de empilhamento, mesmo isenta do efeito do mergulho, deve
ser considerada apenas uma aproximação. Este tema será aprofundado em seguida.

2.2.5 O conceito de recursão


A definição do princı́pio de Huygens estabelece que cada ponto ao longo da frente de
onda corresponde a uma fonte secundária de energia. Nesses termos, a propagação de
ondas é um processo em que a saı́da de uma etapa equivale à entrada da etapa seguinte,
o que define um processo recursivo. É fácil concluir, portanto, que a sintetização de uma
reflexão em uma única etapa, do refletor até a superfı́cie, como foi discutido anteriormente,
corresponde, na verdade, a uma simplificação, que visa facilitar a compreensão de muitos
conceitos.
Na aplicação literal do princı́pio de Huygens, cada posição da frente de onda é estabe-
lecida em um tempo determinado, como numa fotografia que registra a onda gerada por
uma pedra atirada em uma lagoa (ver a Figura 2.5, na página 77). Ou seja, o avanço da
onda se dá no domı́nio x-z, ou x-y-z. Por sua vez, o registro dos dados sı́smicos é feito
2.2. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E O MÉTODO SÍSMICO 111

no domı́nio x-t, ou x-y-t, normalmente a uma profundidade constante. Isto significa que,
para uma boa análise do sinal sı́smico registrado, é conveniente interpretar o conceito de
recursão de outra forma, simulando-se a situação em que as fontes e geofones, situadas
inicialmente em uma dada profundidade constante, são progressivamente deslocadas para
cima.
O conceito descrito é fundamental para se entender a chamada extrapolação direta de
campos de onda. Na Figura 2.24, procura-se mostrar, sob o ponto de vista geométrico, o
que ocorre durante a extrapolação de uma difração, da profundidade de “registro” z 1 até
a profundidade z2 . Na figura, podem ser vistas as geometrias das difrações que seriam
obtidas nas duas profundidades citadas, mas com um deslocamento de tempo relativo que
leve ambas as difrações a apresentarem os ápices no mesmo ponto. Ou seja, na mesma
figura, as duas difrações apresentam origens diferentes, no que diz respeito ao eixo dos
tempos.
Também na Figura 2.24, pode-se ver a geometria dos operadores de extrapolação,
aplicados a alguns pontos. Cada um dos operadores é calculado de forma a descrever
a propagação do sinal entre o difrator secundário situado na posição (x, z 1 ) e a nova
superfı́cie de “registro”, situada na profundidade z2 (na figura, podem ser vistos alguns
dos raios envolvidos, no caso do difrator secundário identificado por D1 ). Ou seja, cada
ponto da difração, obtida na profundidade z1 , é tomado como uma fonte secundária para
a geração de uma nova difração, correspondente ao trajeto do sinal até profundidade z 2 ,
exatamente como prescreve o princı́pio de Huygens. Assim, se a velocidade é constante,
o operador apresenta a mesma geometria em qualquer posição horizontal e em qualquer
tempo. Também como prescreve o princı́pio de Huygens, a combinação das diversas
difrações secundárias leva a uma nova difração principal, com flancos menos ı́ngremes e
abrangendo uma área maior do que a difração principal anterior.
O processo descrito pode ser representado na forma de duas expressões algébricas
muito simples. Para isto, basta estabelecer, na Figura 2.24, o deslocamento em distância
e tempo, ∆X e ∆T , que sofrem todas as amostras, por exemplo, no trajeto entre os
pontos D1 e D2 . O resultado, que pode ser generalizado para todos os demais pontos e
trajetos, é:
∆X = ∆z tan θ (2.2.30)
e
∆z
∆T = (2.2.31)
v cos θ
ou, aplicando-se o teorema de Pitágoras,
s 2  2
∆z ∆X
∆T = + (2.2.32)
v v

onde θ é o ângulo entre o trajeto da onda e a direção vertical, ∆z é o módulo da diferença


entre as profundidades das duas superfı́cies de “registro” e v é a velocidade correspondente
ao mesmo intervalo. Ou seja, a velocidade usada nada tem a ver com as profundidades
maiores do que z1 .
Nas expressões 2.2.30 e 2.2.31, o ângulo θ é responsável pelo sinal do deslocamento
introduzido pelo operador de extrapolação, já que ∆z é, por definição, positivo. Assim,
de acordo com a convenção em uso, um valor negativo do mesmo ângulo, correspondente a
112 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

D2 x
z2
θ

z1
D1

t 1 2

Figura 2.24: Representação esquemática dos elementos envolvidos na


extrapolação de uma difração obtida na profundidade z 1 para a profun-
didade z2 .

um deslocamento no sentido anti-horário, faz com que ∆X se torne negativo. No caso em


que θ é positivo, o deslocamento horizontal é também positivo. Quanto ao deslocamento
de tempo ∆T , ele é sempre positivo, por causa das propriedades de simetria da função
cosseno. Deve-se ainda levar em conta que, em um meio homogêneo e isotrópico, o
módulo do ângulo θ é sempre menor do que 900 , fazendo com que, no intervalo de ângulos
definido por −900 < θ < 900 , o operador de extrapolação, correspondente a uma difração
secundária, assuma uma forma hiperbólica.
Não é fácil perceber como seria a aplicação numérica das equações 2.2.30 e 2.2.31
a dados sı́smicos reais, já que, além de tempo e posição, também a amplitude está en-
volvida. Uma forma relativamente simples de tratar este tema consiste em conduzir a
mesma operação no domı́nio ω-Kx . Para isto, considere-se o caso de uma reflexão isolada,
registrada na profundidade z e descrita pela função p(x, z, t), a qual tem transformada
bidimensional de Fourier dada por P̃ (Kx , z, ω). Suponha-se agora que se deseja deslocar
a profundidade de registro de z para z − ∆z. No domı́nio tempo-distância, esta operação
é executada através da aplicação das equações 2.2.30 e 2.2.31 a cada ponto da reflexão.
No domı́nio ω-Kx, a mesma tarefa equivale à multiplicação da transformada de Fourier
da reflexão pelos dois fatores de deslocamento de fase correspondentes (ver o item 1.2),
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 113

o que leva a

P̃ (Kx , z − ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp (−iKx ∆X) exp (iω∆T )

ou  
∆z
P̃ (Kx , z − ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp (−iKx ∆z tan θ) exp iω
v cos θ
Sabendo-se que Kx = (ω/v) sen θ, pode-se alterar este resultado para
 ω 
P̃ (Kx , z − ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp i ∆z cos θ (2.2.33)
v

Percebe-se, assim, que o deslocamento total sofrido pelo sinal pode ser descrito, no
domı́nio ω-Kx, através de um único deslocamento de fase, controlado pela distância ∆z.
Este tema será aprofundado no subitem 2.7.1.
Considere-se agora que se queira aplicar o conceito descrito à modelagem sı́smica de
uma difração. Para iniciar o processo, estima-se o campo de ondas que seria obtido,
por exemplo, em uma dada profundidade, z, pouco acima do difrator. Tomando-se o
resultado obtido como fonte secundária, estima-se o campo de ondas que seria obtido em
uma nova profundidade, acima da anterior e dada por z − ∆z, onde ∆z é um intervalo
de profundidade fixo, de forma similar à ilustrada na Figura 2.24. Repete-se várias
vezes o mesmo processo, até que a profundidade de “registro” seja igual a zero, sempre
tomando como dado de entrada o resultado da etapa anterior. Obter-se-ia assim a difração
“registrada” na superfı́cie.
A correlação entre a recursão descrita e o princı́pio de Huygens exige a ressalva de que,
em cada etapa da recursão, as fontes secundárias estejam situadas em uma superfı́cie em
que a profundidade é constante mas o tempo é variável. Assim, cada amplitude registrada
na mesma superfı́cie, em um dado tempo, atua como uma fonte secundária de energia
para a geração de uma onda registrada no nı́vel seguinte. Em conseqüência, pode-se
dizer: (a) um traço sı́smico “registrado” em uma dada coordenada horizontal e uma dada
profundidade apresenta múltiplas fontes secundárias de energia, cada uma delas em seu
respectivo tempo; (b) as múltiplas fontes assim definidas estão associadas a um único
operador de extrapolação para o nı́vel superior, uma vez que a posição espacial de todas
elas é uma só. Adicionalmente, se existe um difrator exatamente na profundidade em que
se obteve o traço, este difrator deve ser considerado como uma fonte primária de energia
que “explode” no tempo igual a zero.

2.3 A Influência do Afastamento Fonte-Receptor


Viu-se nos subitens 2.1.5 e 2.1.6 que a aquisição de dados sı́smicos envolve a presença de
afastamento lateral entre a fonte e o receptor. No que diz respeito ao princı́pio de Huygens,
a fı́sica envolvida no processo pode ser discutida de forma equivalente à empregada no
item 2.2, bastando, para isto, levar em conta a maior complexidade de caráter geométrico,
inerente à geometria dos sistemas de aquisição mais representativos. Este é o tema deste
item.
114 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

2.3.1 A geometria das difrações


Tipicamente, a aquisição de dados sı́smicos na presença de afastamento entre a fonte
e o receptor tem, ao longo dos anos, assumido configurações as mais diversas. A mais
caracterı́stica delas corresponde a um experimento fı́sico constituı́do de uma fonte de
energia s, cujo acionamento dá origem ao sinal registrado através de um conjunto de
receptores g, na forma do que se convencionou denominar um sismograma. Observe-se que
embora tratados aqui como elementos individuais, os receptores e fontes correspondem
na verdade a arranjos de comprimento e largura limitados.
A mais simples configuração de aquisição sı́smica é linear, ou seja, as fontes e recep-
tores são posicionados na superfı́cie — tanto quanto possı́vel ao longo de uma reta — na
forma da chamada “linha sı́smica”. Este tipo de aquisição consiste no registro de uma
série de sismogramas, cada um deles caracterizado por uma distância constante entre re-
ceptores e separado dos adjacentes por uma distância, também constante, entre as fontes
correspondentes.
A Figura 2.25, aplicada ao registro de uma difração em particular, pode ser usada
para ilustrar a geometria descrita. No eixo vertical, acima da superfı́cie, representa-se
a distribuição das fontes e, no horizontal, a dos receptores, ressalvando-se que, no caso,
ambas envolvem uma única dimensão superficial, x. Para facilitar a análise, optou-se por
uma distância entre fontes igual à distância entre grupos de receptores.
A Figura 2.25, que é uma versão da chamada “folha de programação”, inclui, explı́cita
ou implicitamente, alguns elementos fundamentais para a compreensão da aquisição de
dados sı́smicos na presença de afastamento entre a fonte e os receptores. Entre outros
aspectos desse tema, destaca-se a caracterização de diferentes agrupamentos de traços
sı́smicos, a qual pode ser feita com base nos seguintes elementos:

1. A posição da fonte, xs . Um conjunto de traços sı́smicos definido por

xs = constante

é denominado agrupamento de fonte comum, ou CS (do inglês Common Shot).

2. A posição do receptor, xg . Um conjunto de traços sı́smicos definido por

xg = constante

é denominado agrupamento de receptor comum, ou CG (do inglês Common Geo-


phone).

3. A posição do ponto médio entre fonte e receptor, xm , definida por

xm = 21 (xg + xs ) (2.3.1)

Um conjunto de traços sı́smicos definido por

xm = constante

é denominado agrupamento de ponto médio comum, ou CMP (do inglês Common


MidPoint).
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 115

Figura 2.25: Esquema representativo da aquisição de uma seqüência


de sismogramas, aplicada ao registro de uma difração isolada, ao longo
de uma linha sı́smica. No eixo vertical, acima da superfı́cie, representa-se
a distribuição horizontal das fontes, simbolizadas por cı́rculos, e, no ho-
rizontal, a dos receptores, simbolizados por triângulos. As coordenadas
x são relativas.

4. A metade do afastamento entre a fonte e o geofone, h, definida por

h = 21 (xg − xs ) (2.3.2)

Um conjunto de traços definido por

h = constante

é denominado agrupamento de afastamento comum, ou CO (do inglês Common


Offset).

Considere-se agora que se deseja descrever como seriam as curvas tempo-distância cor-
respondentes ao difrator da Figura 2.25, não somente no agrupamento de fonte comum,
mas também nas outras configurações possı́veis. Em um meio com qualquer distribuição
de velocidades, o tempo de trajeto entre a fonte, o difrator e o receptor é dado por

t = ts + tg (2.3.3)

onde t é o tempo total de trajeto, enquanto ts e tg correspondem aos tempos envolvidos no


trajeto entre a fonte e o difrator e entre este e o receptor. Nas aplicações de modelagem,
estes tempos podem ser estimados, por exemplo, através de técnicas de traçamento de
raios.
116 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Assuma-se, por enquanto, que o meio é homogêneo e isotrópico. Isto significa que, no
caso, os tempos de reflexão podem ser obtidos através da seguinte expressão analı́tica:
Rs Rg
t = ts + tg = + (2.3.4)
v v
onde v é a velocidade de propagação correta (ou seja, não se trata de meia velocidade,
como no caso do modelo do refletor explosivo). Por sua vez, Rs e Rg são, respectivamente,
as distâncias envolvidas no trajeto entre a fonte e o difrator e entre este e o receptor.
Matematicamente, as mesmas distâncias são definidas por
q
Rs = (z0 − zs )2 + (x0 − xs )2 (2.3.5)

e q
Rg = (zg − z0 )2 + (xg − x0 )2 (2.3.6)
onde o par de coordenadas (x0 , z0 ) representa a posição espacial do difrator, enquanto zs
e zg representam as profundidades da fonte e do receptor, respectivamente.
Substituindo-se as expressões 2.3.5 e 2.3.6 na equação 2.3.4, obtém-se a seguinte des-
crição algébrica do tempo de trânsito entre a fonte, um difrator e o receptor, no caso de
um meio homogêneo e isotrópico:
s 2  2 s 2  2
z0 − z s x0 − x s zg − z 0 xg − x 0
t = ts + tg = + + + (2.3.7)
v v v v

ou, com base nas equações 2.3.2 e 2.3.3, sabendo-se que xs = xm − h e que xg = xm + h,
s 2  2 s 2  2
z0 − z s x0 − (xm − h) zg − z 0 (xm + h) − x0
t= + + + (2.3.8)
v v v v

Por causa de sua forma, esta equação representa a base para a definição da chamada
equação DSR, ou “raiz quadrada dupla” (em inglês, Double Square Root). Este tema
será discutido no item 2.7, no contexto da extrapolação de campos de ondas.
Com as equações 2.3.7 e 2.3.8, criam-se condições para calcular os tempos de reflexão
associados aos diversos tipos de agrupamento. Para uma visão mais abrangente do tema,
pode-se representar os resultados na forma de um mapa como o da Figura 2.26, no
qual cada curva representa um valor especı́fico de tempo de reflexão. Observe-se que
a geometria dos contornos obtidos é a de uma pirâmide arredondada, forma esta que
justifica a denominação “pirâmide de Queops” (Claerbout, 1985). De acordo com a
lógica empregada na geração da figura, cada ponto da reta identificada pela sigla CO
representa a posição de uma fonte isolada, coincidente com a de um receptor isolado.
Ao longo da linha horizontal que passa pela mesma posição, situam-se os receptores do
agrupamento de fonte comum correspondente. De acordo com a mesma lógica, os tempos
de reflexão associados a cada agrupamento de elemento comum situam-se ao longo de
retas paralelas às indicadas pelas siglas CS, CO, CG e CMP.
As figuras 2.25 e 2.26 e a equação 2.3.7 permitem entender melhor como uma difração
isolada influencia diferentes agrupamentos de dados sı́smicos. No caso mais simples, o do
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 117

Figura 2.26: Contorno em milésimos de segundo dos tempos envol-


vidos no trajeto entre a fonte, um difrator isolado e os receptores cor-
respondentes aos diversos sismogramas de um trecho de linha sı́smica.
A configuração usada é similar à da Figura 2.25, mas os afastamentos
fonte-receptor podem ser tanto negativos quanto positivos. A linha CO
corresponde aos afastamentos fonte-receptor iguais a zero, ou seja, às
posições das fontes. Parâmetros: v = 2000m/s, z 0 = 250m, zs = zg = 0.

agrupamento de fonte comum, CS, o tempo ts é constante, e apenas o tempo tg varia.


Assim, a curva tempo-distância correspondente a uma difração, em um agrupamento CS,
pode ser obtida através da equação 2.3.7, fixando-se o termo relativo a ts . Este caso é
similar ao do agrupamento de receptor comum, CG, que pode ser analisado através da
troca dos papéis correspondentes à fonte e ao receptor.
A Figura 2.27 representa a geometria envolvida no registro de uma difração em um
agrupamento CS, no caso em que a fonte não está situada sobre o difrator. Na Figura
2.26, a mesma situação corresponde a um conjunto de tempos de reflexão distribuı́dos
ao longo de uma linha paralela à — mas não coincidente com — a reta identificada pela
sigla CS. Deve-se observar que, no trajeto entre o difrator e os receptores, a geometria
da frente de onda é semicircular, como no modelo do refletor explosivo. Adicionalmente,
o tempo de trânsito, medido nos receptores, inclui uma parcela de tempo variável, tg ,
associado à mesma geometria, e um atraso constante, correspondente ao trajeto entre
a fonte e o difrator, ts0 . Como a superfı́cie de registro é horizontal, isto significa que a
118 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.27: Geometria envolvida no registro de uma difração,


em um agrupamento de fonte comum (CS).

geometria da difração registrada corresponde à de uma hipérbole deslocada para baixo


de acordo com o atraso ts0 .
Um tipo de agrupamento particularmente importante para o processamento dos dados
sı́smicos é o de afastamento fonte-receptor comum, CO. Neste tipo de organização dos
dados, as coordenadas horizontais da fonte e do receptor variam na mesma direção, de
acordo com igual incremento. Assim, tanto o tempo entre a fonte e o difrator quanto
o tempo entre o difrator e o receptor variam, de tal forma que o tempo total pode ser
estimado com a expressão 2.3.8, fixando-se o valor do meio afastamento fonte-receptor,
h, e variando o da coordenada do ponto médio, xm .
Um exemplo de curva tempo-distância em um agrupamento de afastamento fonte-
receptor comum pode ser visto na Figura 2.28. Comparada com a difração da Figura
2.12 (página 93), ou com a da Figura 2.27, a principal diferença é o “achatamento” no
topo da geometria obtida, o qual é tão mais evidente quanto maior for o valor de h. A
mesma tendência pode ser percebida na Figura 2.26, ao se analisar as diversas possı́veis
linhas paralelas à identificada pela sigla CO.
No agrupamento de ponto médio comum, CMP, as coordenadas horizontais da fonte
e do receptor variam em direções opostas, de acordo com incremento de igual módulo,
enquanto a coordenada do ponto médio comum se mantém constante. Como no agrupa-
mento CO, tanto o tempo entre a fonte e o difrator quanto o tempo entre o difrator e o
receptor variam, de tal forma que o tempo total é obtido, com base na expressão 2.3.8,
fixando-se a coordenada do ponto médio comum, xm , e variando o valor do afastamento
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 119

Figura 2.28: Geometria envolvida no registro de uma difração,


em um agrupamento de afastamento fonte-receptor comum (CO).

fonte-receptor, 2h.
Em um agrupamento CMP, a geometria de uma difração assume formas similares, até
certo ponto, às observadas em um agrupamento de afastamento fonte-receptor comum, o
que pode ser depreendido a partir de uma análise da Figura 2.26, levando-se em conta que
ambos os tempos ts e tg variam. Por causa de sua influência sobre a técnica CDP, um caso
em particular merece discussão à parte: um difrator situado junto à superfı́cie, em uma
posição qualquer ao longo da linha sı́smica. A curva tempo-distância correspondente
obedece a três padrões diferentes, em função da coordenada do difrator (x0 , z0 = 0),
da coordenada do ponto médio (xm0 ) e do máximo valor do afastamento fonte-receptor
2hmax , padrões estes descritos da seguinte forma:
1. |x0 − xm0 | > hmax : o difrator situa-se em uma posição fora do intervalo entre as
fontes e os receptores. Neste caso, o tempo de registro, nos diversos traços sı́smicos
incluı́dos no intervalo, é o mesmo, já que cada acréscimo no tempo t s é compensado
por um decréscimo de mesmo valor no tempo tg , e vice-versa.

2. x0 −xm0 = 0: o difrator situa-se exatamente no ponto médio do agrupamento CMP.


Neste caso, a geometria da difração corresponde a um “V” invertido, com ápice na
posição do ponto médio.

3. |x0 − xm0 | < hmax 6= 0: o difrator situa-se em uma posição qualquer diferente
do ponto médio. Neste caso, a geometria da difração é uma combinação dos dois
padrões anteriores.
Para avaliar como a técnica CDP é influenciada por esse tipo de evento, basta ob-
servar que, na primeira situação descrita, as difrações, em um agrupamento CMP, não
apresentam variação de NMO (Normal MoveOut), o que as leva a serem tratadas de
120 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

forma semelhante à de uma reflexão com alta velocidade de empilhamento. Este assunto
foi discutido em um interessante trabalho de Larner et al. (1983).
Embora as equações de tempo de trânsito apresentadas neste item tenham sido de-
duzidas para o caso de um meio homogêneo e isotrópico, elas podem ser aplicadas a um
meio em que a velocidade varia apenas na direção vertical, ou seja, um meio classificado
como v(z). Neste caso, emprega-se uma velocidade média que satisfaça, com base no
conceito de mı́nimo erro médio quadrático, os diversos trajetos envolvidos, o que leva a
uma velocidade equivalente à de empilhamento, discutida no item 3.1.
No caso em que a velocidade varia também na direção lateral, não é fácil estabele-
cer expressões analı́ticas para o tempo de trânsito, sendo necessário recorrer a técnicas
de traçamento do raio, ou a soluções da equação iconal (ver o item 2.5). Os efeitos
do fenômeno tornam-se mais drásticos quando a velocidade varia substancialmente na
distância lateral abrangida pela difração, distância esta que, em termos de modelagem
e migração, caracterizam a chamada abertura do operador. A Figura 2.15 (página 96),
mesmo tendo sido elaborada no contexto do refletor explosivo, pode ser usada como um
exemplo, aplicável a um agrupamento de fonte comum. Para isto, de acordo com o que se
discutiu anteriormente, basta levar em conta que o tempo de reflexão deveria ser dividido
por dois e, em seguida, sofrer um acréscimo constante, associado ao trajeto entre a fonte e
o difrator. Desta forma, a deformação na geometria da difração não seria muito diferente
da que se observa na Figura 2.15.

2.3.2 Uma simplificação do caso tridimensional


No caso tridimensional, em um meio homogêneo e isotrópico, o tempo envolvido no
trajeto da onda, na forma da equação 2.3.4, é calculado com base nas seguintes versões
das equações 2.3.5 e 2.3.6:
q
Rs = (z0 − zs )2 + (x0 − xs )2 + (y0 − ys )2 (2.3.9)

ou q
Rs = (z0 − zs )2 + [x0 − (xm − h)]2 + (y0 − ys )2 (2.3.10)
e q
Rg = (zg − z0 )2 + (xg − x0 )2 + (yg − y0 )2 (2.3.11)
ou q
Rg = (zg − z0 )2 + [(xm + h) − x0 ]2 + (yg − y0 )2 (2.3.12)
Considere-se agora que se deseja estabelecer qual seria a região, em subsuperfı́cie, cujos
sinais atingem o receptor em um mesmo tempo de reflexão t, nas mesmas condições em
que se obtiveram as equações 2.3.9 e 2.3.11. No caso de um meio homogêneo e isotrópico,
esta região pode ser também caracterizada em função de uma distância constante a, a
qual pode ser definida da seguinte forma:
Rs + R g
a= (2.3.13)
2
ou
vt
a= (2.3.14)
2
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 121

onde Rs e Rg variam de forma a manter a e t constantes, ou seja, as coordenadas dos


difratores que compõem o refletor, nas equações 2.3.9 e 2.3.11, variam.
Com o fim de simplificar a análise, assume-se que a fonte e o receptor se encontram na
superfı́cie, sobre o eixo x, e que as coordenadas horizontais do ponto médio são iguais a
zero (xm = 0, ym = 0). Neste caso, com base na equação 2.3.13, pode-se obter a seguinte
versão tridimensional da equação 2.3.8:
q q
2a = z + (x + h) + y + z 2 + (h − x)2 + y 2
2 2 2 (2.3.15)
onde a e h são constantes e (x, y, z) representam as coordenadas do refletor.
Na equação 2.3.15, não se percebe facilmente qual é a geometria do refletor que estaria
associada a um tempo de reflexão constante. Para se obter uma expressão mais simples
e, desta forma, facilitar esta percepção, deve-se eliminar as duas raı́zes quadradas. Isto
é feito através das seguintes operações: (1) separam-se os dois termos que incluem raiz
quadrada, posicionando cada um deles em um lado da equação; (2) eleva-se o resultado
ao quadrado, o que gera uma expressão com um só termo envolvendo raiz quadrada; (3)
isola-se o mesmo termo em um dos lados da expressão obtida; (4) eleva-se o resultado ao
quadrado. Com essas operações, obtém-se a seguinte equação:
x2 y 2 + z 2
+ =1 (2.3.16)
a2 a2 − h2
ou
x2 y 2 + z 2
+ =1 (2.3.17)
a2 b2
onde √
b = a2 − h2 (2.3.18)
A equação 2.3.16, ou 2.3.17, corresponde à descrição analı́tica de um elipsóide de
revolução, ou um esferóide alongado, resultante da rotação de uma elipse em torno de seu
maior eixo, a. Conclui-se assim que, em um meio homogêneo e isotrópico, tridimensional,
a superfı́cie do mesmo elipsóide, representado em corte na Figura 2.29, descreve a famı́lia
de pontos cuja reflexão atinge o receptor em um mesmo tempo de trajeto t. Na literatura
geofı́sica, esta famı́lia de pontos é conhecida como superfı́cie aplanática.
No caso em que y = 0, a equação 2.3.16 e, conseqüentemente, a superfı́cie aplanática,
é transformada na descrição de uma elipse, o que representa uma premissa da aquisição
bidimensional. Um caso mais complexo ocorre quando a linha que une fontes e receptores
se situa transversalmente à que une os pontos médios comuns, o que caracteriza um
azimute de aquisição igual a noventa graus12 . Neste caso, a equação 2.3.16 é transformada
na descrição de um cı́rculo com raio definido pela equação 2.3.18, já que x = 0.
A equação 2.3.16 pode ser alterada de forma a se poder extrair algumas lições adicio-
nais. Uma simples manipulação algébrica, baseada na substituição de a por vt/2, permite
transformá-la na seguinte igualdade (ver Claerbout, 1985):
(z − z0 )2 + (y − y0 )2 (x − x0 )2
t2 = 2 + 2
(2.3.19)
2 h vH
vH − 2
t
12
Define-se azimute de aquisição como a direção sobre a qual se situam os pares fonte-receptor. Ao
longo de uma mesma linha sı́smica, podem ser observados múltiplos azimutes.
122 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.29: Geometria correspondente ao refletor que leva a um


tempo de reflexão constante em um meio tridimensional homogêneo e
isotrópico, na presença de afastamento entre a fonte e o receptor: (a)
corte ao longo do eixo x (ou seja, y = 0); (b) corte ao longo do eixo y
(ou seja, x = 0).

ou
" #
2 2 2 2
(x − x 0 ) + (y − y 0 ) h (x − x 0 )
t2 = t20 + 2
+ 2 1− 2 2
(2.3.20)
vH vH vH t

onde t0 é o tempo de reflexão no afastamento fonte-receptor igual a zero e vH é igual à


metade da velocidade de propagação correta.
Observe-se, nas equações 2.3.19 e 2.3.20, que as coordenadas espaciais passaram a
ser descritas como deslocamentos em relação a um ponto arbitrário, em vez da origem.
Nesta forma, as duas equações podem ser usadas para se descrever: (1) a geometria do
refletor (fixando-se o valor de t e tomando-se como ponto de referência o centro do modelo,
como foi feito no caso da equação 2.3.16), ou; (2) a curva tempo-distância associada a
uma difração em um agrupamento de afastamento fonte-receptor comum, avaliada em
uma profundidade qualquer (fixando-se o ponto de referência na posição do difrator e
tomando-se as coordenadas x e y como sendo as do ponto médio). Observe-se ainda
que, em ambas as equações, o tempo de reflexão não pode ser explicitado, o que torna
conveniente, para o seu cálculo, o recurso à equação 2.3.15.
Na equação 2.3.19, o quadrado da razão h/t, no denominador do termo que envolve a
profundidade, exerce o papel de aumentar o tempo correspondente ao ápice da difração,
levando, no caso bidimensional, a uma curva tempo-distância que Claerbout denominou
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 123

uma “hipérbole achatada” (ver a Figura 2.28). Pode-se ainda observar que, no caso em
que h é igual a zero e y = y0 , a equação 2.3.20 passa a descrever uma hipérbole simples,
equivalente à da equação 2.2.3. Percebe-se também que, com o aumento do tempo, o
termo entre colchetes tende a 1, fazendo com que a curva tempo-distância correspondente
tenda à forma de um hiperbolóide com ápice deslocado de forma dependente da razão
h/vH .
A análise desse tema pode ser aprofundada com base nas equações que definem as
vagarosidades horizontais e vertical, as quais são obtidas com base na derivada da equação
2.3.19 com relação a x, y, h e z. O resultado é:
 
h2
1− 2 2
∂t x − x0   vH t 

= 2  2 , (2.3.21)
∂x vH t  2
h (x − x0 ) 
1− 4 4
vH t
 

∂t y − y0  1 
 
= 2  2 , (2.3.22)
∂y vH t  2
h (x − x0 ) 
1− 4 4
vH t
 
(x − x0 )2
1− 2 2
∂t h   vH t 

= 2  2 , (2.3.23)
∂h vH t  2
h (x − x0 ) 
1− 4 4
vH t
e  

∂t z − z0  1 
 
= 2  2 (2.3.24)
∂z vH t  2
h (x − x0 ) 
1− 4 4
vH t
O leitor poderá observar que, se o afastamento entre a fonte e o receptor for igual a zero,
as equações 2.3.21 e 2.3.24 tornam-se equivalentes às expressões 2.2.6 e 2.2.7.
Com base na equação 2.3.24, demonstra-se que a vagarosidade vertical — uma medida
de quão lentamente o campo de ondas se propaga na direção vertical — é reduzida pelo
afastamento fonte-receptor. Ou seja, a propagação vertical de uma difração, avaliada
em um afastamento fonte-receptor acentuado, é mais rápida do que no caso em que
h = 0. Este comportamento tende a ser invertido junto à posição em que x − x0 = h,
especialmente quando o valor de h é proporcionalmente alto, como se pode ver no exemplo
da Figura 2.30. Observe-se ainda que, em torno da mesma posição, o módulo de ∂ 2 t/∂x2
apresenta o valor máximo.

2.3.3 A interferência de sinais


Sabe-se que, de acordo com o princı́pio de Huygens, na forma modificada por Fresnel,
uma reflexão pode ser construı́da a partir da combinação de difrações adjacentes. Este
conceito, já explorado no contexto do refletor explosivo, aplica-se, com pequenos ajustes
124 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

1.27

1.0
1

0.5

0.
0
0 500 1000 1238
Afastamento entre o difrator e o ponto médio (m)

Figura 2.30: Vagorosidades horizontal e vertical, ∂t/∂x (linha fina) e ∂t/∂z


(linha média), juntamente com o tempo de reflexão (linha espessa), t, corres-
pondentes a uma difração em um agrupamento CO. As vagarosidades são
dadas em segundos por quilômetro e o tempo em segundos. Parâmetros:
y = y0 = 0, z = 250m, v = 2000m/s, h = 625m.

de caráter geométrico, a dados registrados na presença de afastamento entre a fonte e


o receptor. Para aprofundar a análise, recorre-se a uma extensão da discussão sobre a
primeira zona de Fresnel.
Considere-se a interseção entre o elipsóide descrito pela equação 2.3.16, ou 2.3.17, e
um refletor horizontal, situado na profundidade z0 , de acordo com o esquema da Figura
2.31. Como a profundidade do refletor é constante, pode-se transformar a expressão
2.3.17 na seguinte equação de uma elipse:
x2 y2
 2
+   =1 (2.3.25)
z z2
a2 1 − 20 b2 1 − 02
b b
onde a e b foram definidos pelas equações 2.3.13 e 2.3.18.
A equação 2.3.25 permite estabelecer a área do refletor horizontal responsável por
todas as reflexões que atingem o receptor em um mesmo intervalo de tempo ∆t. Esta
mesma área, identificada na Figura 2.31 por ∆S, pode ser determinada com base na área
da elipse, S, a qual, no caso da equação 2.3.25, é definida pela seguinte expressão:
 
z02
S = πab 1 − 2 (2.3.26)
b
Com esta fórmula e as equações 2.3.14 e 2.3.18, pode-se obter a derivada da área, S, com
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 125

Figura 2.31: Geometria envolvida no registro da reflexão gerada


por uma interface horizontal, em um meio tridimensional homogêneo
e isotrópico, na presença de afastamento entre a fonte e o receptor.

relação ao tempo, t, a qual é dada por


" #
∂S πv 2a4 + h2 (h2 + z02 − 3a2 )
= (2.3.27)
∂t 2 (a2 − h2 )3/2

Discretizando-se este resultado, obtém-se a expressão que define a área desejada:


" #
πv∆t 2a4 + h2 (h2 + z02 − 3a2 )
∆S = (2.3.28)
2 (a2 − h2 )3/2

No caso em que o afastamento fonte-receptor é igual a zero, esta expressão se reduz à


seguinte versão da equação 2.2.15:
2
∆S = 2πvH t∆t (2.3.29)

onde vH é a metade da velocidade de propagação correta.


Na Figura 2.32, vê-se como a área ∆S varia com o tempo, no caso de um modelo
cuja profundidade é a mesma do difrator da Figura 2.26, para três diferentes valores
de afastamento entre a fonte e o receptor. Observe-se que, quando o afastamento fonte-
receptor é igual a zero, a área cresce linearmente com o tempo, exatamente como se
pode observar na Figura 2.23a (página 105). Nos demais casos, ocorre uma distorção no
valor de ∆S junto ao tempo mı́nimo correspondente, distorção esta que se acentua com
o aumento no valor do afastamento fonte-receptor.
Através da equação 2.3.28, pode-se obter uma expressão para a área que efetivamente
contribui para o registro de uma reflexão correspondente a um refletor horizontal, na
presença de afastamento entre a fonte e o receptor. Para isto, considere-se que o pulso
126 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Área (milhares de metros quadrados)


20

15

10

5
h=0 h=312.5 h=625.0

0
0 250 500 750 1000 1250 1500
Tempo (ms)

Figura 2.32: Área ∆S que influencia o registro de uma amostra, em função


do tempo, para três diferentes valores de h (em metros). O refletor é horizontal
e os seguintes parâmetros foram usados: z = 250m, v = 2000m/s, ∆t = 2ms.

sı́smico seja um impulso unitário, de tal forma que, de acordo com o princı́pio de Huygens-
Fresnel, a reflexão correspondente seja também um impulso unitário.
A Figura 2.31 pode ser usada para ilustrar o problema proposto, tomando-se como
referência o ponto O, situado verticalmente abaixo do ponto médio entre a fonte s e o
receptor g, o qual é identificado pela letra B. De acordo com o princı́pio de Huygens-
Fresnel, sabe-se que a resposta sı́smica esperada no receptor g é o resultado da soma das
contribuições de todos os pontos do refletor, encabeçada pela contribuição do ponto O,
já que o trajeto sO + Og é o menor possı́vel. Por outro lado, sabe-se que, no mesmo
trajeto, a seguinte igualdade é aplicável:

a2 = z02 + h2 (2.3.30)

Substituindo-se este resultado na equação 2.3.28, obtém-se a seguinte expressão para a


área desejada:  
h2
∆SF = πv∆tz0 1 + 2 (2.3.31)
z0
No caso em que o afastamento fonte-receptor é igual a zero, tem-se:

∆SF = πv∆tz0 (2.3.32)

ou
∆SF = 2πvH ∆tz0 (2.3.33)
onde vH é igual à metade da velocidade correta.
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 127

As equações 2.3.31 e 2.3.32 merecem alguns comentários. Em primeiro lugar, deve-se


ressaltar que, no caso de dados amostrados, o intervalo de tempo ∆t equivale à metade
do perı́odo do sinal na freqüência de Nyquist. De acordo com a demonstração da equação
2.2.9, se for levado em conta que o tempo de reflexão é duplo, isto significa que o limite
externo da área ∆SF é também o limite externo da segunda zona de Fresnel, para sinais
com comprimento de onda definido pela freqüência de Nyquist. Desta forma, a área ∆S F
engloba as duas primeiras zonas de Fresnel, as quais envolvem atrasos de até metade do
comprimento de onda, em relação ao tempo do trajeto mı́nimo, definido com base na
equação 2.3.30.
Outra conclusão que se pode extrair é que a área ∆SF aumenta com o afastamento
fonte-receptor. Esta conclusão leva à sugestão de que a resolução horizontal, ou seja, a ca-
pacidade de se caracterizar descontinuidades na direção horizontal, piora com o aumento
no afastamento entre a fonte e o receptor. Observação similar pode ser feita através de
uma análise da geometria da difração da Figura 2.28, embora se deva ressaltar que este
é um caso extremo, já que o afastamento fonte-receptor usado na geração da figura foi
cinco vezes maior do que a profundidade.
No caso de um agrupamento CO, a relação entre a interferência de difrações e a
geometria de aquisição pode ser ilustrada, em termos mais realistas, pelas figuras 2.33
e 2.34, a primeira das quais foi construı́da nos mesmos moldes da Figura 2.19 (página
101). Observe-se que, à medida em que a distância entre difratores diminui, forma-
se uma reflexão, mas a caracterização da difração exige uma distância entre difratores
substancialmente maior do que no caso da Figura 2.19, o que evidencia a influência
negativa do afastamento fonte-receptor sobre a resolução horizontal.
Na Figura 2.34, vê-se uma difração sintética isolada, também correspondente a um
agrupamento CO. Duas particularidades são dignas de nota. Em primeiro lugar, a ge-
ometria de “hipérbole achatada”, mencionada anteriormente. Em segundo lugar, o fato
de que a maior amplitude da difração não se situa junto ao ápice correspondente mas
sim nas vizinhanças dos dois pontos médios comuns em que ou a fonte, ou o receptor, se
situa verticalmente acima do difrator. Este padrão resulta da necessidade lógica de as
maiores amplitudes de uma difração se concentrarem em torno das posições de máxima
curvatura, a qual, como se pode inferir com base na Figura 2.30, coincide com a mesma
região. Se assim não o fosse, a amplitude de um sinal plano, tangente à difração no ponto
de maior curvatura, seria menor do que a correta, em função da interferência destrutiva
mais intensa em torno da mesma posição. Em outras palavras, o princı́pio de Huygens,
na forma modificada por Fresnel, não seria respeitado.
Na Figura 2.35, vê-se o equivalente da Figura 2.33, aplicado ao caso de um agru-
pamento de fonte comum (CS). Observe-se que as difrações apresentam flancos mais
ı́ngremes do que a reflexão formada por elas e que o ápice de cada difração é registrado
no receptor situado verticalmente acima do difrator. O resultado é similar ao da Figura
2.19, com uma importante diferença: no agrupamento CS, o atraso vertical depende de
dois trajetos diferentes, já que a fonte e o receptor não são coincidentes (ver também
a Figura 2.27). Observe-se ainda que a caracterização de uma difração isolada é uma
tarefa mais difı́cil do que no caso da Figura 2.19, o que reforça a influência negativa do
afastamento fonte-receptor sobre a resolução horizontal.
Na geração das figuras 2.33 e 2.35, assim como na análise que permitiu a dedução
da equação 2.3.31, assumiu-se que o meio é homogêneo e isotrópico e que o refletor é
128 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.33: Resposta sı́smica sintética (2-D), em um agrupamento de afas-


tamento fonte-receptor comum (CO), correspondente a um modelo geológico
formado por um conjunto de difratores com espaçamento variável. Parte su-
perior: modelo geológico, em escala de tempo vertical. Parte inferior: res-
posta sı́smica, após filtragem temporal (8-40Hz). Parâmetros: v = 2000m/s,
z = 512m, h = 625m, ∆xm = 25m.

Figura 2.34: Difração sintética (2-D) em um agrupamento de afasta-


mento fonte-receptor comum (CO), após filtragem temporal (8-40Hz).
Parâmetros: v = 2000m/s, z = 250m, h = 625m, ∆x m = 25m.
2.3. A INFLUÊNCIA DO AFASTAMENTO FONTE-RECEPTOR 129

Figura 2.35: Resposta sı́smica sintética (2-D), em um agrupamento de


fonte comum (CS), correspondente a um modelo geológico formado por
um conjunto de difratores com espaçamento variável. Parte superior:
modelo geológico, em escala de tempo vertical. Parte inferior: resposta
sı́smica, após filtragem temporal (8-40Hz). O sı́mbolo • identifica a
coordenada horizontal da fonte. Parâmetros: v = 2000m/s, z = 512m,
∆xg = 50m.

Figura 2.36: Resposta sı́smica sintética (2-D), em um agrupa-


mento de ponto médio comum (CMP), após filtragem temporal
(8-40Hz), correspondente a um refletor de forma elipsoidal cons-
truı́da com base na equação 2.3.16. A coordenada horizontal, h, é
dada em metros. Parâmetros: v = 2000m/s, z = 600m no centro
do modelo, ∆h = 25m.

horizontal. Imagine-se agora que, para um meio com as mesmas propriedades, o refletor
da Figura 2.31 seja curvo. É fácil concluir que, no caso, a variação da amplitude em
130 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

função da curvatura do refletor dependeria do afastamento fonte-receptor.


A Figura 2.36, correspondente aos traços sı́smicos sintéticos de um agrupamento de
ponto médio comum (CMP), pode ser usada para ilustrar o conceito. Na reflexão da
figura, não existe o efeito do espalhamento geométrico e o coeficiente de reflexão não
varia com o ângulo de incidência. Nestas condições, se o refletor fosse horizontal, a
amplitude do sinal deveria ser igual em todos os traços sı́smicos obtidos. Isto significa
que o crescimento de amplitude com o afastamento fonte-receptor, observado na figura,
é devido exclusivamente à geometria do refletor, a qual foi elaborada de forma a garantir
que a amplitude fosse propositadamente maior nos receptores mais afastados da fonte.
Este exemplo indica que a curvatura dos refletores pode ter um profundo impacto sobre
a análise de AVO, tema este que será discutido nos capı́tulos 3 e 4.

2.4 A Equação da Onda


Em muitos dos itens que se seguem, a propagação de ondas é tratada como um problema
acústico. Uma versão elástica da equação da onda é usada apenas implicitamente na
dedução de alguns conceitos, entre os quais se inclui a variação do coeficiente de reflexão
em função do ângulo de incidência. Por outro lado, quando a propagação de ondas é tra-
tada através da integral de Kirchhoff, pode-se facilmente incorporar fenômenos elásticos
ao processo, mesmo sem envolver diretamente a equação elástica da onda (ver o item
2.7). Se satisfeito com este contexto, o leitor poderá concentrar sua leitura no subitem
2.4.1. No caso contrário, é conveniente ler também o subitem 2.4.2, no qual se discute a
versão elástica da equação da onda. Nos dois casos, é fundamental o conhecimento dos
conceitos apresentados no item 2.1.

2.4.1 Ondas acústicas


A matemática da propagação do sinal sı́smico pode ser razoavelmente bem entendida
considerando-se um meio puramente acústico, no qual não se propagam ondas trans-
versais. Em particular, o significado da equação da onda — que é fundamental para
um entendimento mais profundo do próprio método sı́smico — revela-se um conceito
relativamente simples.

A equação acústica da onda


No caso de um fluido, a lei de Hooke, apresentada no item 2.1, estabelece que

δV
p = −B (2.4.1)
∆V
onde p é a pressão exercida pela onda e δV é a conseqüente variação de volume, enquanto
∆V é o volume original de fluido. Ressalte-se que a pressão p corresponde, na verdade, a
uma variação de pressão, a qual, ao contrário da pressão ambiente, pode ser medida por
um hidrofone. Por sua vez, B é o módulo de elasticidade do meio acústico, dado por (ver
a equação 2.1.11)
B = v2ρ (2.4.2)
2.4. A EQUAÇÃO DA ONDA 131

onde ρ e v são a densidade e a velocidade relativas ao meio original, sem deformação.


Na equação 2.4.1, o volume δV pode ser escrito da seguinte forma:

δV = (∆x + δux )(∆y + δuy )(∆z + δuz ) − ∆x∆y∆z


onde u denota o deslocamento de partı́culas provocado pela onda, enquanto o produto
∆x∆y∆z corresponde ao volume original ∆V . Se os termos de menor valor forem des-
prezados, a variação de volume transforma-se na seguinte aproximação:

δV ∼
= δux ∆y∆z + δuy ∆x∆z + δuz ∆x∆y
Dividindo este resultado pelo volume ∆V , tem-se:

δV ∼ δux δuy δuz


= + + (2.4.3)
V ∆x ∆y ∆z

ou, fazendo δV tender a zero,

∂ux ∂uy ∂uz


∆= + + (2.4.4)
∂x ∂y ∂z

onde ∆ é a chamada dilatação e representa a deformação relativa sofrida pelo corpo


infinitesimal.
Combinando-se as equações 2.4.3, 2.4.4 e 2.4.1, obtém-se a seguinte versão da lei de
Hooke:  
∂ux ∂uy ∂uz
p = −B + + (2.4.5)
∂x ∂y ∂z
ou, na forma vetorial,
p = −B∇ • ~u (2.4.6)
onde • denota produto escalar, ~u é o vetor de deslocamento de partı́culas e ∇ é o operador
vetorial del, definido por
∂ ∂ ∂
∇ ≡ ~i + ~j + ~k
∂x ∂y ∂z
A aplicação da lei de Hooke à propagação de ondas pode ser facilmente compreendida
no caso 1-D. Para isto, considere-se uma onda plana viajando ao longo do eixo z. Neste
caso, a lei de Hooke assume a seguinte forma (ver também o item 2.1):

∂u
p = −B (2.4.7)
∂z
onde u é o deslocamento das partı́culas ao longo do eixo z, ou seja, u = uz .
A variação de pressão introduzida pela onda está relacionada ao deslocamento de
partı́culas também através da segunda lei de Newton, ∆F = ∆ma. Ou seja, a força
exercida pela propagação da onda é dada por

∂2 u
∆pA = −ρA∆z
∂t2
132 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

onde A é área, ∆pA é a força e ρA∆z é a massa deslocada. Rearranjando-se os termos e


fazendo com que ∆z tenda a zero, tem-se:
∂p ∂2 u
= −ρ 2 (2.4.8)
∂z ∂t
Ressalte-se que, nas equações 2.4.7 e 2.4.8, o sinal negativo aparece porque uma
variação de pressão positiva reduz o volume do corpo a ela submetido. No caso da
equação 2.4.7, a redução de volume equivale a dizer que ∂u/∂z é negativa. Quanto à
equação 2.4.8, a redução de volume implica a diminuição local da velocidade com que as
partı́culas se deslocam, ou seja, a aceleração é negativa. Desta forma, no caso de variação
de pressão positiva, o sinal negativo é cancelado em ambas as equações.
Para a dedução da equação da onda, assume-se, por enquanto, que B e ρ não são
funções de z. Assim, substituindo-se, na equação 2.4.8, as expressões 2.4.7 e 2.4.2, obtém-
se a versão 1-D da equação escalar da onda acústica, válida para um meio com densidade
constante:
∂2u 1 ∂2u
= (2.4.9)
∂z 2 v 2 ∂t2
Também através da lei de Hooke e da segunda lei de Newton, pode-se deduzir a
equação da onda para a pressão, seguindo-se procedimentos ligeiramente diferentes: (1)
deriva-se a equação 2.4.8 com relação a z, podendo-se, neste caso, aceitar que a densidade
varie com a profundidade; (2) deriva-se duas vezes a equação 2.4.7, com relação ao tempo,
lembrando que B não varia com o tempo. Os dois resultados podem ser combinados de
forma a eliminar o deslocamento de partı́culas, o que leva à seguinte versão da equação
escalar da onda para a pressão:
 
∂ 1 ∂p 1 ∂2p
= (2.4.10)
∂z ρ ∂z B ∂t2

ou, no caso de a densidade ser constante,


∂2p 1 ∂2p
= (2.4.11)
∂z 2 v 2 ∂t2
Neste ponto, é interessante discutir o significado fı́sico da equação da onda. Tome-
se como exemplo o caso da pressão, para o qual a equação da onda estabelece a forma
como as medidas de pressão, em uma dada posição, no tempo e no espaço, se relacionam
com as medidas de pressão vizinhas. Ou seja, a equação da onda é a lei que governa o
avanço do campo de pressões, no tempo e no espaço. Por outro lado, como a equação
da onda é baseada em diferenciais, a solução correspondente deve ser vista como uma
forma de explicitar o avanço do campo de pressões, a partir de medidas feitas em uma
dada posição. No caso da equação 2.4.11, diversas soluções do tipo f (Kz − ωt) podem
explicitar o avanço do campo de pressões, uma das quais é:
p = sen (Kz − ωt)
onde ω é a freqüência angular, medida ao longo do eixo dos tempos, e K é a freqüência
angular espacial, medida ao longo do eixo z. Outra solução possı́vel é:
p = cos (Kz − ωt)
2.4. A EQUAÇÃO DA ONDA 133

Uma alternativa que engloba ambas as soluções apresentadas é:


p = exp [i(Kz − ωt)] (2.4.12)
O mesmo tipo de solução se aplica à equação 2.4.9, ou seja:
u = exp [i(Kz − ωt)] (2.4.13)
Se a solução 2.4.12, ou 2.4.13, for substituı́da na equação correspondente, obtém-se o
seguinte resultado:
ω
K=∓ (2.4.14)
v
Em um meio sem dispersão, esta é exatamente a relação entre as freqüências temporal e
espacial. Conclui-se, portanto, que a solução proposta é válida.
Observe-se que, nas equações 2.4.12 e 2.4.13, da mesma forma que t representa um
deslocamento de tempo, z representa um deslocamento de profundidade. Pode-se con-
siderar este deslocamento em relação à posição em que a onda foi gerada. No caso, z
poderia ser substituı́do por z − z0 , onde z0 é constante, sem perda de generalidade.
Sabe-se que, na ausência de dispersão, a forma de onda deve se manter constante
com o passar do tempo. Ou seja, se o observador pudesse manter os olhos fixos em
uma posição qualquer da onda (um pico, por exemplo), ele veria que o valor relativo da
amplitude se mantém constante com o passar do tempo. Para que isto seja possı́vel, é
necessário que Kz − ωt se mantenha constante. Desta forma, considerando-se o tempo
como crescente e o sinal de K como positivo, as equações 2.4.12 e 2.4.13 descrevem o
avanço da onda no sentido descendente, ou de aumento na profundidade z. O oposto
ocorre se o sinal de K for tomado como negativo. Já que ambas as soluções são possı́veis,
pode-se dizer que as equações da onda, dadas pelas expressões 2.4.9, 2.4.10 e 2.4.11,
governam a propagação simultânea de eventos ascendentes e descendentes. Uma equação
da onda 1-D, unidirecional, seria:
∂p 1 ∂p
=∓ (2.4.15)
∂z v ∂t
No caso 2-D, também acústico, a lei de Hooke é descrita por
 
∂ux ∂uz
p = −B + (2.4.16)
∂x ∂z
onde ux e uz são o deslocamento de partı́culas nas direções x e z, sendo x o eixo horizontal.
Por sua vez, a segunda lei de Newton, aplicada aos dois eixos espaciais, é dada por
∂p ∂ 2 ux
= −ρ 2 (2.4.17)
∂x ∂t
e
∂p ∂ 2 uz
= −ρ 2 (2.4.18)
∂z ∂t
Seguindo-se procedimentos similares ao adotado no caso 1-D, as duas leis permitem
a obtenção da versão bidimensional da equação escalar da onda, a qual, no caso de
densidade constante, é dada por

∂2p ∂2p 1 ∂2p


+ = 2 2 (2.4.19)
∂x2 ∂z 2 v ∂t
134 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

A equação bidimensional da onda apresenta diversas soluções semelhantes, todas do


tipo p = f (Kx x + Kz z − ωt). Uma delas é:
p = exp [i(Kx x + Kz z − ωt)] (2.4.20)
onde Kx e Kz são as freqüências angulares espaciais medidas ao longo dos eixos x e z.
Substituindo-se esta solução na equação 2.4.19, obtém-se a expressão 2.1.53, ou seja,
 2  2
Kx Kz 1
+ = 2 (2.4.21)
ω ω v
A expressão 2.4.21, que é conhecida como a relação de dispersão da equação da onda,
permite estimar Kz a partir das outras freqüências angulares:
s  2
ω vKx
Kz = ∓ 1− (2.4.22)
v ω

ou, com base na equação 2.1.51,


ω
Kz = ∓ cos θ (2.4.23)
v
onde θ é o ângulo que a frente de onda faz com a direção horizontal.
A equação 2.4.20 descreve o avanço da onda nas direções z e x, simultaneamente.
Como no caso 1-D, para que não ocorra dispersão, o expoente da mesma expressão
deve se manter constante com o passar do tempo. Portanto, considerando-se o tempo
como crescente, se Kz e Kx forem tomados como positivos, a equação 2.4.20 descreve o
avanço da onda no sentido x e z crescentes (o que equivale a dt/dx e dt/dz positivos, nas
equações 2.1.48 e 2.1.50). Também como no caso 1-D, ondas ascendentes e descendentes
são simultaneamente contempladas na equação da onda, o que significa a inclusão de
múltiplas.
A versão 3-D da equação da onda pode ser obtida a partir da equação 2.4.19, a-
crescentando-se a derivada segunda da pressão com relação ao eixo y. O resultado é:

∂2p ∂2p ∂2p 1 ∂2p


+ + = (2.4.24)
∂x2 ∂y 2 ∂z 2 v 2 ∂t2
ou, representando as derivadas espaciais através do operador laplaciano ∇2 ,
1 ∂2p
∇2 p = (2.4.25)
v 2 ∂t2
A solução correspondente à versão tridimensional da equação acústica da onda é
virtualmente a mesma da expressão 2.4.20, com a inclusão do termo relativo à freqüência
angular espacial Ky . Tem-se, no caso, a seguinte igualdade:
p = exp [i(Kx x + Ky y + Kz z − ωt)] (2.4.26)
Substituindo-se esta solução na expressão 2.4.24, obtém-se a versão tridimensional da
relação de dispersão da equação da onda, a qual é dada por
 2  2  2
Kx Ky Kz 1
+ + = 2 (2.4.27)
ω ω ω v
2.4. A EQUAÇÃO DA ONDA 135

Até agora, a equação da onda foi apresentada em função do tempo, t. A versão


monocromática correspondente, ou seja, para uma freqüência constante ω, pode ser obtida
aplicando-se a transformada de Fourier à equação 2.4.24. Para isto, transforma-se a
pressão p para o domı́nio da freqüência e aplica-se o teorema da derivada (ver a Tabela
1.1, na página 19). No caso 3-D, o resultado é:

p(x, y, z, t) ⇔ P (x, y, z, ω)

e
∂2p
⇔ −ω 2 P (x, y, z, ω)
∂t2
Substituindo-se ambos os resultados na equação 2.4.24, obtém-se a equação da onda
acústica 3-D, no domı́nio da freqüência, ou seja,

ω2
∇2 P = − P (2.4.28)
v2

onde P = P (x, y, z, ω). Nesta forma, a equação da onda é aplicada individualmente a


cada componente de freqüência.
A transformada de Fourier pode ser estendida para os eixos espaciais o que, como se
verá depois, facilita o entendimento dos conceitos discutidos até agora. No caso 3-D, para
se obter a equação da onda no domı́nio ω-Kx -Ky , transforma-se o campo de pressões e
aplica-se novamente o teorema da derivada ao longo dos eixos x e y, o que leva a

∂ 2 P̃ ω2
−Kx2 P̃ − Ky2 P̃ + = − 2 P̃ (2.4.29)
∂z 2 v
onde P̃ = P̃ (Kx , Ky , z, ω).
Demonstrar-se-á no item 2.7 que, no domı́nio ω-Kx -Ky , o campo de pressões permite
a seguinte igualdade:
∂ 2 P̃
= −Kz2 P̃
∂z 2
Com esta alteração, a pressão passa a multiplicar os quatro termos da equação 2.4.29,
o que possibilita obter, de uma forma alternativa, a versão tridimensional da relação de
dispersão da equação da onda, a qual é dada pela expressão 2.4.27.

A relação entre pressão e velocidade de partı́culas


Uma relação importante, usada na aplicação da integral de Kirchhoff (item 2.7), é a
segunda lei de Newton, na forma que associa a derivada da pressão, com relação à pro-
fundidade, e a velocidade de partı́culas. No caso do eixo vertical, ela pode ser obtida a
partir da seguinte igualdade:
∂p ∂ 2 uz
= −ρ 2 (2.4.30)
∂z ∂t
Explicitando-se a velocidade de partı́culas, obtém-se:
 
∂p ∂ ∂uz
= −ρ (2.4.31)
∂z ∂t ∂t
136 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

onde ∂uz /∂z é a velocidade de partı́culas medida ao longo do eixo vertical.


Para se obter a segunda lei de Newton no domı́nio da freqüência, aplica-se, à expressão
2.4.31, o teorema da derivada. O resultado é:
∂P
= iωρVz (2.4.32)
∂z
onde P e Vz são a pressão e a velocidade de partı́culas no domı́nio da freqüência. Se
forem considerados os três eixos, a equação 2.4.32 é transformada na seguinte igualdade:
~
∇P = iωρV (2.4.33)

As expressões 2.4.31 e 2.4.32 podem ser usadas de duas formas: (1) conhecendo-se
a pressão em duas profundidades vizinhas, pode-se obter uma estimativa da velocidade
de partı́culas na profundidade intermediária (a partir da transformação da derivada em
uma razão entre diferenças); (2) ou, se a medida disponı́vel for a velocidade de partı́culas,
pode-se convertê-la na derivada da pressão com relação à profundidade.
Para se estabelecer uma relação mais direta entre a pressão e a velocidade de partı́culas,
deve-se fazer uso da seguinte versão da lei de Hooke, aplicada ao caso bidimensional (ver
a equação 2.4.16):  
2 ∂ux ∂t ∂uz ∂t
p = −v ρ + (2.4.34)
∂t ∂x ∂t ∂z
onde ux = u sen θ e uz = u cos θ, sendo u a solução da equação da onda dada por

u = exp [iω(x/v) sen θ + iω(z/v) cos θ − iωt] (2.4.35)

Combinando-se esta expressão com a 2.4.34, tem-se a seguinte igualdade:


 
2 1 2 1 2
p=v ρ sen θ + cos θ (iωu) (2.4.36)
v v

Observe-se que este resultado é válido também para uma onda ascendente já que, neste
caso, ∂t/∂z < 0 e uz = u cos (π − θ). Por outro lado, como iωu = −∂u/∂t, pode-se
transformar o mesmo resultado na seguinte relação entre a pressão e o deslocamento de
partı́culas:
∂u
p = −vρ (2.4.37)
∂t
Deve-se ressaltar que, na forma como foi definido, o deslocamento de partı́culas é avaliado
ao longo da direção em que a onda se propaga.

A equação acústica da onda na presença de uma fonte


Até agora, tratou-se a equação da onda assumindo uma fonte remota, o que atende a uma
visão global da propagação de ondas. No entanto, ver-se-á no item 2.7 que é necessário
utilizar a equação da onda na presença de uma fonte, para a compreensão da matemática
do princı́pio de Huygens. Em particular, uma fonte será considerada no tratamento de
cada ponto de uma frente de onda como fonte secundária para a geração de nova frente
de onda.
2.4. A EQUAÇÃO DA ONDA 137

Na presença de uma fonte, a segunda lei de Newton, aplicada ao eixo x, estabelece


que
∂ 2 ux
∆pAx + ∆φ Ax = −ρAx ∆x 2 (2.4.38)
∂t
onde ∆p é a variação de pressão independente da existência de uma fonte, ∆φA x é a
força devida exclusivamente à fonte, a qual é considerada pontual, enquanto A x é a área
na direção perpendicular ao eixo x. Simplificando e fazendo com que ∆x tenda a zero,
tem-se:
∂p ∂ 2 ux ∂φ
= −ρ 2 − (2.4.39)
∂x ∂t ∂x
O mesmo raciocı́nio, aplicado aos demais eixos, leva a:

∂p ∂ 2 uy ∂φ
= −ρ 2 − (2.4.40)
∂y ∂t ∂y
e
∂p ∂ 2 uz ∂φ
= −ρ 2 − (2.4.41)
∂z ∂t ∂z
Para se deduzir a equação da onda para a pressão, na presença de uma fonte, segue-se
procedimento semelhante ao usado na dedução da equação 2.4.19. Inicialmente, derivam-
se as equações 2.4.39 a 2.4.41 com relação aos respectivos eixos espaciais, assumindo-se
que a densidade é constante. Os resultados podem ser combinados e apresentados na
forma vetorial, no que resulta:

∂ 2 ~u
∇2 p = −ρ∇ • − ∇ • ∇φ (2.4.42)
∂t2
onde • denota produto escalar.
O passo seguinte, na dedução da equação da onda, consiste em derivar duas vezes a
lei de Hooke (equação 2.4.6), com relação ao tempo, no que resulta:

∂2p ∂ 2 ~u
= −B∇ • 2 (2.4.43)
∂t2 ∂t
onde B é definido pela equação 2.4.2.
Combinando-se as equações 2.4.42, 2.4.43 e 2.4.2, tem-se:

2 1 ∂2p
∇ p − 2 2 = −∇ • ∇φ (2.4.44)
v ∂t
ou, no domı́nio da freqüência,

ω2
∇2 P + P = −∇ • ∇Φ (2.4.45)
v2
onde P e Φ são funções das coordenadas espaciais e da freqüência.
Integrando-se a equação 2.4.45, em um dado volume infinitesimal V , obtém-se:
Z   Z
2 ω2
∇ P + 2 P dV = − ∇ • ∇ΦdV (2.4.46)
v
V V
138 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Aplicando-se, ao lado direito do resultado, o teorema de Gauss, ou teorema da divergência


(ver o subitem 2.7.4), obtém-se:
Z I
N = − ∇ • ∇ΦdV = − ∇Φ • ~n dS (2.4.47)
V S

onde ~n é o vetor normal à superfı́cie S, a qual envolve o volume V , enquanto N é o fluxo


do vetor ∇Φ.
Considere-se agora que a fonte, situada no ponto hipotético A, possa ter um campo
de ondas descrito, a menos de uma constante, pelo potencial Φ = (1/R)F (ω), onde R é
o raio de um cı́rculo centrado em A e dado por
q
R = |~r| = (x − xA )2 + (y − yA )2 + (z − zA )2 (2.4.48)
onde
~r = (x − xA )~i + (y − yA ) ~j + (z − zA ) ~k
Neste caso, o vetor ∇Φ, que corresponde a uma força, é dado por
~r
∇Φ = − F (ω) (2.4.49)
R3
Com esta versão do vetor ∇Φ, pode-se demonstrar que o lado direito da equação
2.4.47 transforma-se em (ver Wylie, 1975, páginas 676-677):
I 
0, ponto A fora do volume V
N = − ∇Φ • ~ndS = (2.4.50)
4πF (ω), ponto A dentro do volume V
S

Combinando-se este resultado com as expressões 2.4.46 e 2.4.47, obtém-se:


Z   
2 ω2 0, ponto A fora do volume V
∇ P + 2 P dV = (2.4.51)
v 4πF (ω), ponto A dentro do volume V
V

O integrando do lado esquerdo da equação 2.4.51 pode ser estimado com base na
propriedade de enquadramento da função delta de Dirac, δ, discutida no item 1.2. O
resultado é a equação da onda na presença de uma fonte, ou seja,

ω2
∇2 P + P = 4πF (ω)δ(x − xA )δ(y − yA )δ(z − zA ) (2.4.52)
v2
Também com base nas propriedades da função delta, conclui-se que a equação da onda
dada pela expressão 2.4.28 somente é válida na região do espaço que não inclui a fonte.
Na posição em que se situa a fonte, a equação da onda não é definida.
A fonte sı́smica incluı́da na equação 2.4.52 apresenta um espectro de freqüências ar-
bitrário. Para se isolar a resposta, ao impulso, do meio, ou seja, para excluir a influência
da forma de onda da fonte, deve-se substituir esta última por um impulso unitário e o
escalar P pela função de Green G = G(x − xA , y − yA , z − zA , ω), o que leva à equação
de Helmoltz, ou seja,

2 ω2
∇ G + 2 G = 4πδ(x − xA )δ(y − yA )δ(z − zA ) (2.4.53)
v
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 139

A solução desta equação é muito simples, se o meio for homogêneo e isotrópico. Nestas
condições, a função de Green é dada por13

1
G(x − xA , y − yA , z − zA , ω) = exp(iωτ ) (2.4.54)
R

ou, no domı́nio do tempo, por

1
g(x − xA , y − yA , z − zA , t) = δ(t − τ ) (2.4.55)
R
onde τ = R/v e R é dado pela equação 2.4.48.
Observe-se que as equações 2.4.54 e 2.4.55 descrevem uma forma de onda com ampli-
tude proporcional a 1/R, nos pontos em que R = vτ , o que inclui a perda de amplitude
causada pelo espalhamento esférico da energia (ver o item 2.5). Nas demais posições do
espaço, a amplitude é igual a zero. A geometria correspondente é a de uma forma esferoi-
dal, de raio igual a vτ , expandindo-se no espaço, com o aumento no tempo. Ressalte-se
ainda que, com base na equação 2.4.52, a forma de onda gerada por uma fonte sı́smica
pontual e isotrópica, viajando em um meio homogêneo, sem absorção e também isotrópico,
poderia ser descrita, no domı́nio da freqüência, pelo produto entre a função G e o espectro
de freqüências do pulso sı́smico correspondente.

2.4.2 Ondas elásticas em um corpo sólido


Neste item, apresentam-se as equações que governam a propagação de ondas elásticas
no interior de corpos sólidos. Na abordagem do tema, optou-se por seguir a seqüência
adotada por Kolsky (1963), com algumas modificações de pequeno porte.

Versão generalizada da lei de Hooke


TEXTO NÃO DISPONÍVEL

A equação elástica da onda


TEXTO NÃO DISPONÍVEL.

2.5 O Tempo e a Amplitude ao Longo do Raio


No item 2.4, a equação da onda foi tratada em um contexto de múltiplas freqüências,
no qual os fenômenos associados à propagação de ondas são analisados de forma global.
Em muitas circunstâncias, este contexto impede uma melhor compreensão de fenômenos
fı́sicos isolados. Para contornar esta dificuldade, usa-se freqüentemente a teoria do raio,
a qual permite analisar, de forma independente, o efeito de fenômenos especı́ficos. Neste
13
Ver-se-á no próximo item que uma solução similar se aplica a qualquer meio, desde que a freqüência
seja alta e a velocidade varie no espaço de forma suave.
140 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

item, apresentam-se parcialmente os fundamentos da teoria14 , juntamente com uma dis-


cussão sobre o tempo de trajeto e a amplitude ao longo de um raio, neste caso descon-
siderando o papel dos coeficientes de reflexão e transmissão nas interfaces, assim como o
de outros fatores de propagação.

2.5.1 Noções básicas de teoria do raio


No tratamento da propagação de ondas com base na teoria do raio, o primeiro passo
consiste em obter uma solução assintótica para a equação da onda, através da qual se
deduzem equações fundamentais para a teoria do raio. Estes são os principais temas deste
subitem.

A solução assintótica da equação da onda


Considere-se a seguinte equação da onda, no domı́nio da freqüência, a qual corresponde
a uma versão, com densidade variável, da equação 2.4.28:
 
1 ω2
∇• ∇P + P = 0 (2.5.1)
ρ B

onde P = P (x, y, z, ω) e B foi definido pela equação 2.4.2.


A equação 2.5.1 apresenta a seguinte solução por séries:

X
P = exp(iωτ ) (iω)−k Ak (2.5.2)
k=0

onde τ é o tempo de trajeto da onda e A é a amplitude associada a cada termo da série.


A solução assintótica (de ordem zero) é obtida desprezando-se, na equação 2.5.2,
os termos da série para os quais k > 0. Esta aproximação, também conhecida como
WKBJ15 , leva ao seguinte resultado:

P = A exp(iωτ ) (2.5.3)

onde A = A0 . Sugere-se ao leitor comparar esta equação com a 2.4.54.


Substituindo-se a equação 2.5.3 na equação 2.5.1 e eliminando-se os termos comuns,
obtém-se, como parte real,
1 1 2  ω2
∇ • ∇A + ∇ A − ω 2 A(∇τ )2 + A = 0 (2.5.4)
ρ ρ B
e, como parte imaginária,
 
1 iω 
iωA ∇ • ∇τ + 2∇τ • ∇A + A∇2 τ = 0 (2.5.5)
ρ ρ
14
Em alguns trechos deste item, o texto foi parcialmente baseado nos livros de Cerveny e Ravindra
(1971), de Cerveny et al. (1977) e de Bleistein (1984).
15
A sigla WKBJ é a reunião das iniciais de Wentzel, Kramers, Brillouin e Jeffreys, os cientistas
responsáveis pelas soluções da equação da onda baseadas nas premissas de que a freqüência é alta e a
velocidade varia de forma suave ao longo do espaço (ver Aki e Richards, 1980).
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 141

A equação 2.5.4, após alguma manipulação, transforma-se na seguinte versão da e-


quação iconal dependente da freqüência:
 
ρ 1 1
2
∇• ∇A − (∇τ )2 + 2 = 0 (2.5.6)
ω A ρ v

Observe-se que, para ω 2 A >> ρ, esta equação se reduz à equação iconal tradicional:

1
(∇τ )2 = (2.5.7)
v2

Este resultado, cuja versão 2-D foi apresentada no item 2.1 (expressão 2.1.52), pode ser
reescrito como:
1
|∇τ | = (2.5.8)
v
Por sua vez, a equação 2.5.5 pode ser reduzida à seguinte versão da chamada equação
de transporte:
 2 
A
∇• ∇τ = 0 (2.5.9)
ρ
Uma análise da equação iconal permite perceber que é possı́vel obter, isoladamente, o
tempo de trajeto, τ , da onda, desde que a freqüência considerada seja substancialmente
alta, condição esta em que a equação 2.5.7 é válida. Nas aplicações das equações 2.5.7 e
2.5.9, as soluções correspondentes são normalmente obtidas através de técnicas numéricas,
como a das diferenças finitas, mas também através do traçamento do raio, o qual, na sua
forma dinâmica, possibilita computar tempo e amplitude ao longo do percurso.

As equações fundamentais do raio


No traçamento de raios, é conveniente adotar um sistema de coordenadas próprio, dado
pelos ângulos γ1 e γ2 e pela distância s. Como se pode ver na Figura 2.37, os dois
ângulos são medidos na origem do raio, em relação aos eixos vertical, z, e horizontal,
x, respectivamente, enquanto s se refere à distância percorrida ao longo do raio. Nesse
contexto, a frente de onda é definida pelos pontos em que τ é igual, o que equivale, apenas
no caso de um meio homogêneo e isotrópico, aos pontos em que s é igual.
O tempo de percurso τ é uma grandeza escalar. Assim, pode-se dizer que o avanço
da onda define um campo escalar, cujas superfı́cies eqüipotenciais, definidas por τ = τ0 ,
caracterizam a frente de onda. Adicionalmente, no contexto de um meio isotrópico, o
gradiente do mesmo campo, dado por ∇τ , define a direção local do raio, ou seja,

p~ = ∇τ (2.5.10)

onde p~ é o vetor vagarosidade. Isto significa que o vetor unitário, normal à frente de
onda, é dado por
p~ ∇τ
~n = =
|~
p| |∇τ |
ou, com base na equação 2.5.8,
~n = v~p (2.5.11)
142 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.37: O sistema de coordenadas do raio.

onde v é a velocidade intervalar local.


Ao longo do raio, a posição relativa de um ponto qualquer, com coordenadas (x, y, z),
pode ser representada pelo seguinte vetor:

~r = (x − x1 )~i + (y − y1 ) ~j + (z − z1 ) ~k

onde o subscrito 1 se refere à fonte. Em um meio homogêneo e isotrópico, o mesmo vetor


se relaciona à distância percorrida pelo raio de acordo com a seguinte igualdade:

~r = s~n

onde, no caso, o vetor unitário normal à frente de onda é dado por

~n = ( sen γ1 cos γ2 ) ~i + ( sen γ1 sen γ2 ) ~j + ( cos γ1 ) ~k (2.5.12)

Em um meio com qualquer distribuição de velocidades, o tempo de percurso τ pode


ser associado à distância s, medida ao longo do raio, através da seguinte expressão:
Z
1
τ= ds
v
ou seja,
∂τ 1
= (2.5.13)
∂s v
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 143

Para traçar os raios, são também usadas as equações caracterı́sticas da equação iconal,
que são também chamadas de equações do raio. A primeira delas pode ser obtida a partir
da seguinte igualdade, válida para um pequeno trecho do trajeto do raio:

d~r = ds ~n = ds v~p

onde ~r é um vetor infinitesimal que descreve o deslocamento local do raio, enquanto ~n é


o vetor normal à frente de onda. Assim, tem-se:
∂~r
= v~p (2.5.14)
∂s
Outra equação do raio é obtida a partir da seguinte expressão:
 
∂~
p ∂ ∂τ
= (∇τ ) = ∇
∂s ∂s ∂s
Este resultado, combinado com a equação 2.5.13, pode ser alterado para:
∂~
p 1
= − 2 ∇v (2.5.15)
∂s v
onde a velocidade intervalar local, v, corresponde a um escalar, exatamente como a função
τ.

A função J
Considere-se um raio em um meio homogêneo e isotrópico, emitido de acordo com os
ângulos γ1 e γ2 . Com base no mesmo raio, pode-se definir um tubo infinitesimal hi-
potético, o qual corta a frente de onda de forma a gerar uma interseção dada pela seguinte
área (ver a Figura 2.38):
∆S1 = (s∆γ1 )(s sen γ1 ∆γ2 )
ou
∆S1 = s2 sen γ1 ∆γ1 ∆γ2
onde o subscrito 1 se refere à posição da fonte e sen γ1 tem o papel de projetar a distância
s sobre a direção horizontal. A expressão obtida, no caso em que as distâncias e ângulos
envolvidos tendem a zero, pode ser escrita da seguinte forma:

dS1 = J1 dγ1 dγ2

onde a função J1 é dada por


J1 = s2 sen γ1 (2.5.16)

A mesma idéia permite a seguinte extrapolação, para um meio qualquer:

dS = Jdγ1 dγ2 (2.5.17)

onde J é uma função, ainda a determinar, que representa uma espécie de taxa de variação
da área com relação aos ângulos que definem, na origem, o raio.
144 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.38: O sistema de coordenadas e o tubo infinitesimal do raio.

Para se obter uma expressão mais geral para dS e J, considere-se uma fonte de energia
em profundidade e os receptores na superfı́cie (ver Cerveny et al., 1977). Com um par
de ângulos γ1 e γ2 , medidos na posição da fonte, traça-se um raio que atinge a superfı́cie
em uma posição definida com base no vetor ~r. Em seguida, mantendo-se γ2 constante,
muda-se γ1 para γ1 + ∆γ1 e traça-se outro raio, o qual atinge a superfı́cie de acordo com
um deslocamento puramente horizontal, ∆~r1 , em relação ao primeiro raio. Ainda a partir
deste último, obtém-se um terceiro raio, neste caso mantendo γ1 constante e alterando
γ2 para γ2 + ∆γ2 , o que resulta em outro vetor diferença, também na direção horizontal,
∆~r2 . Pode-se assim definir um vetor infinitesimal de área, na superfı́cie, aproximado por

∆~a ∼
= ∆~r1 × ∆~r2 (2.5.18)

onde × denota produto vetorial.


Viu-se acima que a área dS deve ser medida sobre a frente de onda. Isto significa que,
para se obter uma aproximação para dS, o vetor ∆~a deve ser projetado sobre a frente de
onda. Assim, tem-se:
∆S ∼= ~n • (∆~r1 × ∆~r2 )
onde o produto escalar pelo vetor unitário ~n tem o papel de projetar o vetor de área ∆~a
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 145

sobre a frente de onda.


Uma vez que ∆~r1 foi obtido através da variação isolada de γ1 e ∆~r2 foi obtido através
da variação isolada de γ2 , pode-se escrever:
 
∆~r 1 ∆~
r 2
∆S ∼
= ~n • × ∆γ1 ∆γ2
∆γ1 ∆γ2
No limite em que as quantidades infinitesimais envolvidas tendem a zero, tem-se:
 
∂~r ∂~r
dS = ~n • × dγ1 dγ2
∂γ1 ∂γ2
Comparando-se este resultado com a equação 2.5.17, obtém-se a seguinte expressão para
a função J:
 
∂~r ∂~r
J = ~n • × (2.5.19)
∂γ1 ∂γ2
ou, na forma discreta, com base na definição do produto vetorial,
∆~r1 ∆~r2
J∼
= sen ε cos α (2.5.20)
∆γ1 ∆γ2
onde ε é o ângulo formado entre os vetores infinitesimais ∆~r1 e ∆~r2 . Observe-se que o
produto por cos α equivale, na equação 2.5.19, ao produto escalar pelo vetor normal à
superfı́cie, já que α é o ângulo entre a frente de onda e a superfı́cie.
A equação 2.5.19 é uma das formas em que a função J é aplicável a meios em que a
velocidade pode variar vertical e lateralmente. Outra forma, baseada nas equações 2.5.11
e 2.5.14, é dada por  
∂~r ∂~r ∂~r
J= • × (2.5.21)
∂s ∂γ1 ∂γ2
Ver-se-á adiante que a função J pode fornecer informações sobre o espalhamento da
energia propagada em meios em que a velocidade varia livremente.

A curvatura da frente de onda


Em um meio homogêneo e isotrópico, a frente de onda tem forma circular, fazendo com
que o correspondente raio de curvatura, R, seja descrito pela distância linear entre cada
ponto da onda e a fonte que a gerou. Em um meio qualquer, a curvatura da frente de
onda pode ser definida como sendo localmente igual à de um cı́rculo hipotético de raio
R. Para estimar o valor de R nesse tipo de meio, é necessário aplicar as leis de curvatura
das frentes de onda. Na discussão que se segue, seguiu-se em grande parte a linha de
raciocı́nio adotada por Shah (1973).
A lei de curvatura mais simples é a da transmissão: em um meio de velocidade
constante, o aumento no raio de curvatura da frente de onda, associado ao trajeto entre
dois pontos, é dado simplesmente pelo produto entre a velocidade e o tempo de trajeto
entre os dois pontos. De forma semelhante, a lei da reflexão é também muito simples: no
ponto de reflexão, o raio de curvatura da onda incidente é igual ao raio de curvatura da
onda refletida. O caso da lei da refração é um pouco mais complexo.
146 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.39: Geometria envolvida na definição do raio de cur-


vatura da frente de onda em uma interface plana entre dois meios
homogêneos e isotrópicos. Observação: as escalas foram deforma-
das para facilitar a visualização.

Considere-se a Figura 2.39, na qual se representa o trajeto de uma onda que atravessa
a interface entre dois meios distintos, um denominado incidente, I, caracterizado pela
velocidade vI e o segundo denominado refratado, T , caracterizado pela velocidade vT .
Na interface entre os dois meios, o desvio do raio pode ser descrito com base na seguinte
versão da lei de Snell:
sen α sen β
=
vI vT
onde α e β são os ângulos de incidência e de refração, respectivamente. Na figura,
aplicam-se as seguintes igualdades: O1 A = RI , O2 A = RT e AB = ∆r, sendo RI e RT
os raios de curvatura da onda incidente e refratada, respectivamente.
Derivando-se a lei de Snell com relação a r e transformando o resultado em diferenças
discretas infinitesimais, tem-se:
cos α ∆α cos β ∆β
= (2.5.22)
vI ∆r vT ∆r
Como ∆α e ∆β são grandezas infinitesimais, pode-se dizer que
RI ∆α = ∆r cos α
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 147

ou
∆α cos α
= (2.5.23)
∆r RI
e que
RT ∆β = ∆r cos β
ou
∆β cos β
= (2.5.24)
∆r RT
As equações 2.5.23 e 2.5.24 permitem transformar a equação 2.5.22 na expressão
algébrica que define a lei da refração:

RT cos 2 β vI
= (2.5.25)
RI cos 2 α vT

As leis de curvatura da frente de onda assim definidas são suficientes para estimar
o raio de curvatura em um meio constituı́do de camadas com velocidade constante e
separadas por interfaces planas e mergulhantes. Considere-se, nesse tipo de meio, um
raio normal associado a uma determinada interface, ou seja, o raio que, saindo da fonte
na superfı́cie, atinge perpendicularmente a mesma interface e retorna para a mesma
posição em que se situa a fonte. No caso de três camadas, ou duas interfaces, o raio de
curvatura pode ser estimado através dos seguintes procedimentos:

1. Aplica-se a lei da transmissão para calcular o raio de curvatura da frente de onda


descendente na base da camada 1:
v 1 t1
RI,1 =
2

2. Para se determinar o raio de curvatura no topo da camada 2, aplica-se a lei da


refração:    
cos 2 β1 v1 1 cos 2 β1 v12 t1
RT,1 = RI,1 =
cos 2 α1 v2 v2 cos 2 α1 2

3. Aplica-se a lei da transmissão para calcular o raio de curvatura da frente de onda


descendente na base da camada 2:
 
1 cos 2 β1 v12 t1 v 2 t2
RI,2 = 2
+
v2 cos α1 2 2

onde t2 é o tempo percorrido na camada 2.

4. Aplicam-se as leis da reflexão e da transmissão para se obter o raio de curvatura no


topo da camada 2:  
1 cos 2 β1 v12 t1
RI,−1 = + v 2 t2
v2 cos 2 α1 2
Observe-se que, em relação ao raio de curvatura da etapa 3, foi adicionada a
distância v2 t2 /2, equivalente ao trajeto ascendente na camada 2.
148 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

5. Aplica-se a lei da refração no topo da camada 2, para se obter o raio de curvatura


na base da camada 1:
   
cos 2 α1 v2 1 v12 t1 2 cos 2 α1
RT,−1 = RI,−1 = + v 2 t2
cos 2 β1 v1 v1 2 cos 2 β1

6. Com a lei da transmissão, aplicada ao trajeto ascendente na camada 1, obtém-se o


raio de curvatura na superfı́cie:
 
1 2 2 cos 2 α1
R0 = v 1 t1 + v 2 t2
v1 cos 2 β1

Determinou-se assim o raio de curvatura correspondente a um raio normal em um


meio de duas interfaces planas mergulhantes. A generalização do processo descrito para
qualquer número de camadas dá origem à seguinte expressão:

N k−1
1 X 2 Y cos 2 αj
R0 = v k tk (2.5.26)
v1 j=1
cos 2 βj
k=1

No caso em que as camadas são horizontais, os dois ângulos envolvidos tornam-se iguais
a zero e a expressão obtida se reduz a

N
1 X 2
R0 = v tk (2.5.27)
v1 k=1 k

A descrição algébrica do raio de curvatura da frente de onda em um meio qualquer


pode se tornar relativamente mais complexa do que a equação 2.5.26. Em um grau de
complexidade crescente, o primeiro elemento a considerar é a curvatura das interfaces
entre camadas (ver Cerveny e Ravindra, 1971; Cerveny et al., 1977). Por outro lado,
mesmo em sua forma mais simples, a expressão que define o raio de curvatura pode ser
muito útil no caso em que se deseja caracterizar a relação entre o tempo de reflexão
e a distância horizontal entre a fonte e o receptor. Pode também ser útil para uma
compreensão de caráter intuitivo do espalhamento geométrico da energia.

2.5.2 Estimativas de tempo de trânsito


Uma das aplicações mais comuns da teoria do raio consiste na obtenção dos tempos de
trânsito associados às reflexões. Na forma clássica, esta tarefa envolve o traçamento
do raio, desde a fonte até o receptor, aplicando-se, em cada interface, a lei de Snell.
Caracteriza-se assim o chamado “traçamento do raio entre dois pontos” (two-point ray
tracing). No caso, o principal problema a resolver consiste em garantir que um mesmo raio
abandone a fonte e atinja exatamente a posição do receptor. Uma alternativa, comum nas
aplicações à migração de dados sı́smicos, consiste em resolver numericamente a equação
iconal e, desta forma, obter diferentes tempos de trajeto para diferentes receptores e uma
única posição da fonte.
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 149

O traçamento de raios e a aplicação numérica da equação iconal envolvem o conhe-


cimento explı́cito da distribuição das velocidades intervalares em subsuperfı́cie. Por esta
razão, estas são técnicas aplicadas em situações particulares, como na modelagem, na
migração em profundidade e na inversão de dados sı́smicos. Na forma convencional do
processamento e da interpretação de dados sı́smicos, é conveniente a aplicação de técnicas
dependentes de velocidades médias, preferencialmente na forma de expressões analı́ticas.
Discutem-se neste subitem algumas soluções para este problema, a começar pelo caso
da variação linear da velocidade com a profundidade, o qual permite a obtenção de ex-
pressões exatas, muito úteis na análise das soluções aproximadas, parte delas discutidas
logo adiante.

O caso da variação linear de velocidade


Considere-se um meio em que a velocidade varia com a profundidade. Considere-se ainda
que a equação 2.1.58 seja aplicável, ou seja, o meio é lateralmente homogêneo e isotrópico
e, portanto, o parâmetro de raio, p, não varia ao longo do trajeto de um raio. Nestas
condições, o tempo de percurso, τ , o afastamento lateral, h, e o comprimento total, s,
todos relativos ao trajeto descendente — sem reflexão — percorrido por um raio que parte
da superfı́cie, podem ser descritos com base nas relações ∆τ = ∆z/v cos β, ∆h = ∆z tan β
e ∆s = ∆z/ cos β, onde β é o ângulo que o raio faz com a direção vertical na profundidade
z. Integrando-se estas relacões, obtêm-se as seguintes expressões:
Z z Z z
dz dz
τ= = p , (2.5.28)
0 v cos β 0 v 1 − p2 v 2
Z z Z z
sen β dz pv dz
h= = p (2.5.29)
0 cos β 0 1 − p2 v 2
e Z Z
z z
dz dz
s= = p (2.5.30)
0 cos β 0 1 − p2 v 2
onde
dτ sen β
p= =
dh v
De acordo com observações de caráter empı́rico, sabe-se que a compactação de se-
dimentos clásticos tende a induzir um comportamento linear para a distribuição das
velocidades intervalares em função da profundidade (ver Slotnick, 1959). Aplica-se ao
caso a seguinte expressão:
v = v0 + az (2.5.31)
onde v é a velocidade intervalar e v0 é a velocidade na superfı́cie. Sabe-se também que o
valor tı́pico de a, em uma bacia com caracterı́sticas distensivas, é da ordem de 0.6s −1 , ou
0.6m/s por metro de profundidade.
Com a expressão 2.5.31, Slotnick (1959) demonstrou que é possı́vel obter soluções
analı́ticas compactas para as integrais 2.5.28, 2.5.29 e 2.5.30. Para isto, troca-se a variável
de integração z por pv — ou dz por d(pv)/ap — e, após substituir v pela expressão 2.5.31,
150 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

avaliam-se as três integrais no intervalo entre pv0 e pv. Com estas operações, obtêm-se
os seguintes resultados16 :
h p i
1 + 1 − p 2v2 v
1 (1 + cos β0 ) v 1 0
τ = ln = ln h p i , (2.5.32)
a (1 + cos β) v0 a 1 + 1 − p2 v 2 v 0

q 
1 1 2 2
p
2 2
h= ( cos β0 − cos β) = 1 − p v0 − 1 − p v (2.5.33)
ap ap
e  
1 vβ v 0 β0 1  
s= − = cos −1 (pv0 ) − cos −1 (pv) (2.5.34)
a sen β sen β0 ap
onde β0 é o ângulo que o raio faz com a direção vertical na superfı́cie. Ou seja, no contexto
das equações fundamentais do raio, β0 equivale a γ1 (ver a Figura 2.37, na página 142).
A equação 2.5.32 pode ser escrita de uma forma interessante, proposta por Carlos
Cunha Filho, de acordo com a qual se separam os tempos correspondentes ao trajeto
vertical, τ0 , e ao acréscimo introduzido pelo afastamento lateral. Para isto, aplicam-se
propriedades do logaritmo neperiano, o que permite transformar a mesma equação no
seguinte resultado:
p
1 1 + cos β0 1 1 + 1 − p2 v02
τ = τ0 + ln = τ0 + ln p (2.5.35)
a 1 + cos β a 1 + 1 − p2 v 2

onde τ0 = ln(v/v0 )/a.


É possı́vel definir o tempo de trajeto de forma independente do parâmetro de raio, p,
o qual pode ser representado de forma explı́cita. Para isto, o primeiro passo consiste em,
na equação 2.5.33, isolar um dos termos envolvendo raiz quadrada e elevar o resultado ao
quadrado. O mesmo truque é repetido com o resultado obtido. Na seqüência, obtém-se
a seguinte expressão:
2h
p= q (2.5.36)
2 2 2 2 2 2
a (h + z ) + 4v0 v (h + z )
Este resultado, substituı́do na expressão 2.5.32, permite a obtenção da seguinte igualdade:

1  √ 
τ= 2
ln R + R − 1 (2.5.37)
|a|

ou
1
τ= cosh −1 (R) (2.5.38)
|a|
onde
a2 (h2 + z 2 )
R=1+
2v0 v
16
Estas três equações são válidas para o trajeto entre a superfı́cie e o ponto em que o raio se torna
horizontal. Além deste ponto, as mesmas equações podem ser utilizadas, mas com suas variáveis alteradas
de forma a simular um trajeto no sentido oposto.
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 151

Slotnick (1959) demonstrou também que a geometria do trajeto percorrido pelo raio
em um meio como o descrito é equivalente à de um cı́rculo com raio igual a 1/ap e centro
nas coordenadas h = cos β0 /ap e z = −v0 /a. Isto pode ser verificado através da elevação,
ao quadrado, da equação 2.5.33, o que leva à seguinte expressão:
 2 
cos β0 v0  2 1
h− + z+ = 2 2 (2.5.39)
ap a a p

Neste resultado, estão implı́citas as coordenadas da posição de máxima penetração do


raio, a qual corresponde ao ponto mais profundo do cı́rculo que define o trajeto, onde
β = 900 . Com base na expressão 2.5.33, estas coordenadas podem ser explicitadas,
levando a
cos β0 v0
hmax = = (2.5.40)
ap a tan β0
e, fazendo h = hmax na equação 2.5.39,
 
v0 1
zmax = −1 (2.5.41)
a sen β0

onde hmax é medida a partir da posição em que o raio é emitido.


A expressão 2.5.39, além de descrever a geometria do raio, pode também ser trans-
formada na equação iconal, em sua versão bidimensional. Demonstra-se esta afirmação
multiplicando ambos os lados da mesma expressão por a2 p2 /v 2 , no que resulta a seguinte
forma da equação 2.1.52:
 2
cos β 1
+ p2 = 2
v v
ou seja,
 2  2
dτ dτ 1
+ =
dz dh v2
Em um meio em que a velocidade cresce linearmente com a profundidade, a geometria
da frente de onda correspondente não é a de um cı́rculo centrado na fonte. Esta é uma
caracterı́stica que pode ser demonstrada a partir da equação 2.5.38, cuja forma inversa é:

2v0 v ( cosh aτ − 1) = a2 h2 + z 2 (2.5.42)

ou, elevando ao quadrado e considerando que senh 2 aτ = cosh 2 aτ − 1,


h v0 i2 v 2
h2 + z − ( cosh aτ − 1) = 02 senh2 aτ (2.5.43)
a a
onde τ é o tempo de trajeto que, em uma frente de onda, é fixo. Observe-se que este resul-
tado é a representação algébrica de um cı́rculo cujo raio é dado por (v 0 senh aτ )/a. Entre-
tanto, seu centro não está na fonte mas sim nas coordenadas h = 0 e z = v0 ( cosh aτ −1)/a.
Na Figura 2.40, pode-se ver um exemplo de aplicação das equações apresentadas até
aqui. Destaca-se na figura a geometria circular das frentes de onda, com centros situa-
dos abaixo da fonte. São também dignos de destaque os dois raios emitidos de acordo
com |β0 | = 600 , os quais caracterizam o fenômeno conhecido por “ondas mergulhantes”
152 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Profundidade (km) 0

1
0.5s

3 1.0s

−2 −1 0 1 2
Distância da fonte (km)

Figura 2.40: Geometrias de duas frentes de onda e cinco raios, em um meio


em que a velocidade cresce linearmente com a profundidade. Parâmetros:
v0 = 1800m/s e a = 1.0s−1 . Os raios, representados por linhas tracejadas,
foram gerados com valores de β0 iguais a −600 , −300 , 00 , 300 e 600 . Os dois
sı́mbolos • indicam os centros dos cı́rculos que representam as frentes de onda
nos tempos simples iguais a 0.5s (junto à fonte) e 1s.

(em inglês, diving waves), ou seja, os sinais que, em função do crescimento vertical da
velocidade, apresentam penetração limitada. Percebe-se, assim, que um ângulo de pro-
pagação maior, ou um afastamento fonte-receptor maior, não implica necessariamente
alcance lateral maior, o que pode ser explicado com base nas equações 2.5.40 e 2.5.41.
Ver-se-á adiante que a chamada velocidade RMS (Root Mean Square) é utilizada
em inúmeras circunstâncias. No caso particular em que a velocidade intervalar varia
linearmente com a profundidade, o trabalho de Slotnick (1959) possibilita obter expressões
compactas para a velocidade RMS, incluindo ainda a variação do parâmetro de raio. Para
isto, considere-se, inicialmente, a seguinte generalização do conceito:
Z
2 1 τ 2
vRM S (p) ≡ v dτ (2.5.44)
τ 0

Levando em conta que τ é dado pela expressão 2.5.28 e que, com base na equação 2.5.30,
dτ = ds/v, pode-se facilmente resolver esta integral. O resultado é:
q 
2 1 1 p
vRM S (p) = 2 ( cos β0 − cos β) = 2 1 − p2 v02 − 1 − p2 v 2 (2.5.45)
ap τ ap τ

No caso em que p = 0, a mesma integral se reduz à seguinte versão analı́tica da velocidade


2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 153

RMS convencional:
2 1 
vRM S = v0 z + 12 az 2 (2.5.46)
τ0
ou
2 v02
vRM S = [exp (2aτ0 ) − 1] (2.5.47)
2aτ0
onde τ0 é o tempo vertical simples, calculado com a expressão τ0 = ln(v/v0 )/a.

A expansão em séries do tempo de reflexão


Viu-se anteriormente que, em um meio geológico em que a velocidade intervalar varia line-
armente com a profundidade, é possı́vel determinar de forma analı́tica o tempo de trajeto
ao longo do raio. Considere-se agora um meio apenas um pouco mais complexo, caracte-
rizado por uma pilha de camadas, cada uma delas com uma velocidade constante. Neste
tipo de meio, não é possı́vel obter uma relação matemática compacta entre as velocidades
e o tempo de reflexão obtido na presença de afastamento entre a fonte e o receptor. Por
esta razão, os esforços têm se concentrado na busca de soluções aproximadas, às quais se
associa freqüentemente o nome de Dix (1955). Existem diversos trabalhos nesta linha,
entre os quais listam-se: C. Bolshix (1956, in Castle, 1994); Taner e Koehler (1969); A.
Malovichko (1978, 1979, in Castle, 1994) e; Hake et al. (1984). Na dedução que se segue,
adota-se em parte o trabalho de Hake et al. (1984), o que leva a um resultado equivalente
aos obtidos por Bolshix e por Taner e Koehler.
Admita-se, por um momento, que a relação entre o tempo de reflexão e as velocidades
do meio possa ser representada na forma de uma série Taylor. No modelo adotado por
Hake et al. (1984), esta série é

X
2
k
t = lim Ak x2 − x20 (2.5.48)
x→x0
k=0

onde t é o tempo de reflexão, x é o afastamento entre a fonte e o receptor, x 0 é um


afastamento arbitrário e
1 dk (t2 )
Ak = (2.5.49)
k! (dx2 )k
Na presença de valores expressivos de x0 , a convergência da série representada pela
equação 2.5.48 não é garantida. De acordo com Ghosh e Kumar (2002), ela converge
apenas até um restrito número de termos, a partir do qual tende a divergir. Observações
de caráter empı́rico reforçam esta conclusão e induzem à conveniência de se restringir
o número de termos a três, o que equivale a limitar em 2 o máximo valor de k. Neste
caso, a introdução de correções adicionais, como a proposta por Ghosh e Kumar (2002),
ou a que se discute adiante, pode levar a resultados aceitáveis. Para apresentar a idéia,
parte-se da dedução de expressões analı́ticas para A0 , A1 e A2 . Aplicam-se, no caso, as
seguintes igualdades: !2
X
A0 = ∆ti , (2.5.50)
i
2
dt 2t dt t
A1 = = = p (2.5.51)
dx2 2x dx x
154 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

e    
1 d dt2 1 d t
A2 = = p
2 dx2 dx2 4x dx x
ou  
2
 t + p − pt 
1  
A2 = (2.5.52)
4x  dx x x2 
x
dp
onde ∆ti é o tempo duplo de trajeto na camada i e p é o parâmetro de raio correspondente,
ou seja, p = dt/dx. Por sua vez, t, x e dx/dp são definidos pelas seguintes expressões,
obtidas a partir das versões discretas das equações 2.5.28 e 2.5.29, com base nas igualdades
t = 2τ e x = 2h:
X ∆z X
t= p i = ∆ti , (2.5.53)
i vi 1 − p2 vi2 i

X 2pvi ∆zi X
x= p
2
= pvi2 ∆ti (2.5.54)
2
1 − p vi
i i
e
dx X 2 X p2 v 4 ∆ti X dvi2
i
= vi ∆ti + + p∆ti (2.5.55)
dp i i
1 − p2 vi2 i
dp

onde vi e ∆zi são a velocidade intervalar e a espessura da camada i.


No limite em que x tende a x0 e x0 = 0, p torna-se igual a zero, o que permite
transformar as equações 2.5.50 a 2.5.52 nas seguintes expressões:

A0 = t20 , (2.5.56)

t0
A1 = P (2.5.57)
vi2 ∆t0,i
i
e !
A4 1 1 X 4 1X
A2 = 12 − v i ∆t 0,i − Hi ∆t0,i (2.5.58)
4t0 A21 t0 i t0 i

onde t0 é o tempo de reflexão no afastamento fonte-receptor igual a zero, ∆t0,i é o tempo


vertical na camada i e
1 dvi2
Hi = lim
x→0 p dp

Com as expressões 2.5.48 e 2.5.56 a 2.5.58, pode-se obter a equação que aproxima o
tempo de reflexão em um meio acamadado, na presença de afastamento entre a fonte e
o receptor. Desprezando-se a variação da velocidade com o parâmetro de raio — a qual
possibilita incorporar a anisotropia (ver Hake et al., 1984) —, o resultado é:
 
2 x2 x4 µ4
t = t20 + + 22 1− 2 (2.5.59)
µ2 4µ2 t0 µ2
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 155

onde µ2 e µ4 correspondem ao segundo e ao quarto momentos da velocidade intervalar,


avaliados em função do tempo, ou seja,
1 X 2 1
µ2 = vi ∆t0,i = (2.5.60)
t0 i A1

e
1X 4
µ4 = v ∆t0,i (2.5.61)
t0 i i
Observe-se que µ2 é igual ao quadrado da velocidade RMS (Root Mean Square) e que a
razão µ4 /µ22 pode ser usada como um indicador da qualidade da conhecida aproximação
hiperbólica, usada na técnica CDP convencional. No caso, os melhores resultados são
obtidos quando a mesma razão se aproxima de 1.
Mesmo sendo a equação 2.5.59 uma versão truncada da série dada pela expressão
2.5.48, é possı́vel melhorar sua qualidade sem acrescentar mais termos17 . Para isto, ela é
inicialmente reescrita da seguinte forma:
   
2 2 x2 x2 µ4
t = t0 + 1+ 1− 2 +··· (2.5.62)
µ2 4µ2 t20 µ2

Para valores tı́picos de velocidade e afastamento fonte-receptor, o segundo termo da


expressão entre colchetes é menor do que 1. Isto significa a possibilidade de melhorar a
qualidade da equação obtida, o que é feito transformando a mesma expressão no inverso
de um binômio. O resultado é:
x2
t2 = t20 + 2
  (2.5.63)
x µ4
µ2 − 2 1− 2
4t0 µ2

Na equação 2.5.63, o termo que divide x2 atua como o quadrado de uma velocidade
dependente do valor de x. Para explicitar melhor esta caracterı́stica, parte-se da seguinte
expressão:
dµ2 (p) 1 dµ2 (p) dp
2
= (2.5.64)
dx 2x dp dx
2
Levando em conta que µ2 (p) = vRM S (p), pode-se aplicar a versão discreta da expressão
2.5.44 e, desprezando-se dv 2 /dp, obter

dµ2 (p) 1 X pvi4 ∆ti 1X 2 X pv 2 ∆ti


i
= 2
− 2 vi ∆ti
dp 2
t i 1 − p vi t i i
1 − p2 vi2

Este resultado e as expressões 2.5.53, 2.5.54 e 2.5.55, substituı́dos na equação 2.5.64,


permitem fazer com que, no limite em que x tende a zero, ela se transforme em
 
dµ2 (p) 1 µ4
lim = 2 −1 (2.5.65)
x→0 dx2 2t0 µ22
17
A idéia apresentada em seguida foi desenvolvida como parte de um trabalho feito em conjunto com
Carlos Cunha Filho.
156 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Combinando-se esta igualdade com a expressão 2.5.63, obtém-se a relação desejada, que

x2
t2 = t20 + (2.5.66)
µ2 + αx2

onde
1 dµ2 (p)
α= lim (2.5.67)
2 x→0 dx2
Percebe-se agora, de forma mais clara, a relação entre a velocidade e o afastamento fonte-
2
receptor, x, já que µ2 = vRM S e α é igual à metade da derivada de µ2 (p) com relação a
2
x , no limite em que x tende a zero.
Uma versão alternativa para as equações 2.5.59, 2.5.63 e 2.5.66, também baseada na
expansão em séries do tempo de reflexão, foi obtida por A. Malovichko (1978 e 1979, in
Castle, 1994) e aplicada por de Bazelaire (1988) e Castle (1994). Neste caso, assume-se
que, em um agrupamento CMP qualquer, a geometria de uma reflexão pode ser descrita
por uma hipérbole deslocada no tempo, cuja descrição algébrica, na forma proposta por
de Bazelaire, é a seguinte expressão:

x2
(t + tp − t0 )2 = t2p + (2.5.68)
vs2

onde tp = t0 /S, vs2 = SvRM 2 2 4


S e S = µ4 /µ2 = µ4 /vRM S . Observe-se que, para S = 1, ou
tP = t0 , esta expressão se reduz à aproximação hiperbólica, ou seja, à versão truncada,
no segundo termo, da equação 2.5.59.
As equações 2.5.59, 2.5.66 e 2.5.68 são normalmente aplicadas no contexto da técnica
CDP, discutida no item 3.1. Para ilustrar sua efetividade teórica, foi construı́da a Fi-
gura 2.41, na qual se vêem erros dos tempos de reflexão, incluindo os obtidos com a
aproximação hiperbólica. O modelo escolhido foi o de crescimento linear de velocidade,
dado pela equação 2.5.31, o qual possibilita, através da expressão 2.5.37, obter tempos
exatos, assim como, através da equação 2.5.46, o valor correto de µ2 . Os parâmetros
usados foram iguais aos de Castle (1994) e os correspondentes valores teóricos de t0 ,
vRM S , (µ4 )1/4 e α são, respectivamente, 1343.6ms, 2248.5m/s, 2279.0m/s e 0.00753s −2 .
Percebe-se claramente, na figura, a qualidade superior das equações 2.5.59 e 2.5.66.

A relação entre tempo, distância e curvatura

Na dedução das equações 2.5.59 e 2.5.66, assumiu-se um modelo de camadas horizontais,


cada uma delas com uma velocidade constante. Considere-se agora que as interfaces
sejam planas e mergulhantes, o que representa um modelo igual ao usado na dedução da
equação 2.5.26. Considere-se ainda que se deseja estimar o tempo de reflexão na presença
de um pequeno afastamento entre a fonte e o receptor, ilustrado de forma simplificada
na Figura 2.42. Assumindo-se que não é possı́vel estimar analiticamente o tempo de
reflexão, aplica-se ao caso a seguinte versão da série Taylor, escrita de forma a isolar os
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 157

2 A B

1
Erro (ms)

−1

−2 C D

−3

−4
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
Ângulo de incidência (graus)

Figura 2.41: Erro, em função do ângulo de incidência, do tempo de reflexão


estimado com: (A) aproximação hiperbólica (ou seja, na equação 2.5.66, α =
0); (B) equação 2.5.68; (C) equação 2.5.59 e; (D) equação 2.5.66. O modelo
usado é o de variação linear da velocidade com a profundidade. Parâmetros:
v0 = 1800m/s, a = 0.62s−1 e z = 1500m.

afastamentos negativos e positivos:

t(0) ∂t h2 ∂ 2 t h3 ∂ 3 t h4 ∂ 4 t
t(h) = −h + − + − ···
2 ∂h 2! ∂h2 3! ∂h3 4! ∂h4
(2.5.69)
2 2 3 3 4 4
t(0) ∂t h ∂ t h ∂ t h ∂ t
+ +h + 2
+ 3
+ +···
2 ∂h 2! ∂h 3! ∂h 4! ∂h4

onde h é igual à metade do afastamento entre a fonte e o receptor e t(0) é o tempo de


reflexão para o caso em que h = 0, no ponto médio entre a fonte e o receptor.
Observe-se, na equação 2.5.69, que os sinais dos termos com expoente ı́mpar fazem
com eles sejam cancelados. Nestas condições, ela se transforma na seguinte expressão:

∂2t h4 ∂ 4 t
t(h) = t(0) + h2 + +··· (2.5.70)
∂h2 12 ∂h4
Elevando este resultado ao quadrado, obtém-se:
" 2 #
∂2t ∂2t t(0) ∂ 4 t
t2 (h) = t2 (0) + 2t(0)h2 2 + h4 + +··· (2.5.71)
∂h ∂h2 6 ∂h4
158 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.42: Geometria de um raio que percorre o trajeto entre


a fonte, o refletor e o receptor, na presença de um afastamento
infinitesimal, 2h, entre a fonte e o receptor.

As derivadas parciais presentes na expressão 2.5.71 podem ser estimadas com base na
Figura 2.43 e nas seguintes relações (ver também o item 2.1):
∆t ∂t sen β0
lim = = (2.5.72)
∆h→0 ∆h ∂h v1
e
∆β0 ∂β0 cos β0
lim = = (2.5.73)
∆h→0 ∆h ∂h Rh
onde Rh é o raio de curvatura referente ao trajeto simples entre o refletor e a superfı́cie,
enquanto β0 é o ângulo de emergência, ou seja, o ângulo entre o raio e a direção vertical,
na superfı́cie. Com estas derivadas, pode-se obter a derivada segunda do tempo com
relação a h, a qual é dada por

∂2t ∂ 2 t ∂β0 cos 2 β0


= = (2.5.74)
∂h2 ∂h∂β0 ∂h v1 Rh
As derivadas de mais alta ordem podem ser obtidas de forma similar, ou seja, através da
combinação da derivada de ordem anterior com a derivada do ângulo de emergência com
relação à distância h.
Considere-se agora que, na equação 2.5.71, os termos com expoente maior do que 2
possam ser desprezados. Neste caso, substituições com base na expressão 2.5.74 e nas
igualdades x = 2h e R0 = 2Rh permitem transformar a mesma equação no seguinte
resultado:  
2
2 2 2 t(0) cos β0
t (x) = t (0) + x (2.5.75)
v1 R0
onde x é o afastamento entre a fonte e o receptor e R0 é o raio de curvatura correspondente
ao tempo duplo.
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 159

Figura 2.43: A relação entre o raio de curvatura da frente de


onda, Rh , e o ângulo de emergência, β0 .

Na forma da equação 2.5.75, o tempo de trajeto do sinal é uma função de três


parâmetros, além do tempo correspondente ao raio normal, t(0): a velocidade da camada
superficial, o raio de curvatura da frente de onda e o ângulo de emergência correspon-
dente. Ou seja, tudo se passa como se o tempo de reflexão não dependesse da velocidade
do meio subjacente. Esta idéia é explorada por Peter Hubral e seu grupo na aplicação do
conceito de Common Reflection Surface, ou CRS (Müller, 1998), de acordo com o qual
pode-se obter uma seção sı́smica de afastamento fonte-receptor igual a zero a partir do
registro em um conjunto de afastamentos quaisquer.
Optando-se pelo tratamento convencional, ou seja, explicitamente dependente da ve-
locidade de propagação, a equação 2.5.75 deve ser considerada uma versão da expressão
que permite estimar o tempo de reflexão com base na aproximação hiperbólica, a qual é
dada por
x2
t2 (x) = t2 (0) + 2 (2.5.76)
vN M O
onde vN M O é a chamada velocidade NMO (Normal MoveOut).
Combinando-se as equações 2.5.75 e 2.5.76 com a expressão 2.5.26, que define o raio
de curvatura R0 , obtém-se a seguinte igualdade:
N k−1
Y cos 2 αj
2 1 X
2
vN MO = v t k (2.5.77)
t(0) cos 2 β0 k=1 k j=1 cos 2 βj

onde vk e tk são a velocidade intervalar e o tempo de trajeto na camada k. Por sua vez, as
grandezas αk e βk são o ângulo de incidência e o de refração em cada interface, enquanto
160 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

β0 é o ângulo de emergência na superfı́cie. No caso em que o mergulho das camadas é


igual a zero, tem-se o seguinte resultado:

N
2 1 X 2
vRM S = v tk (2.5.78)
t(0) k=1 k

onde vRM S é a velocidade RMS. Por outro lado, se as interfaces forem mergulhantes e
paralelas, observa-se a seguinte igualdade:
vRM S
vN M O = (2.5.79)
cos β0

2.5.3 O espalhamento geométrico da energia


Em um meio homogêneo e isotrópico, a onda gerada por uma fonte pontual propaga-se
na forma de uma esfera que se expande. Viu-se, no item 2.1, que, neste caso, a amplitude
do sinal gerado é reduzida de forma inversamente proporcional à distância percorrida,
a qual é igual ao raio da esfera, R. Ou, ainda, a perda de amplitude é inversamente
proporcional ao tempo de percurso. No caso, obtém-se a seguinte expressão, equivalente
à equação 2.1.64:
D1 R1 t1 A
= = = (2.5.80)
D R t A1
onde D é o fator de divergência esférica e A é a amplitude, enquanto o subscrito 1 indica
uma posição de referência (por exemplo, a fonte da energia).
Observe-se que, de acordo com a equação 2.5.80, existe, em um meio homogêneo e
isotrópico, uma relação inversa entre a amplitude do sinal e a distância percorrida pela
onda. Esta afirmação, que é uma conseqüência direta do princı́pio da conservação da
energia, não pode ser generalizada para qualquer tipo de meio, já que uma complexa
distribuição das velocidades intervalares pode até mesmo fazer com que, pelo menos
localmente, a amplitude do sinal cresça com o aumento da distância percorrida pelo
sinal.
Nestas condições, um termo mais apropriado do que divergência esférica é espalha-
mento geométrico, em função da necessidade de expandir a aplicabilidade do conceito
para meios complexos, nos quais a geometria da frente de onda não corresponde a um
cı́rculo. Esta situação pode ser ilustrada através de um exemplo simples, como o da
Figura 2.44. Observe-se no caso b que, após atravessar a interface, o trajeto do sinal é
substancialmente alterado, o que se deve ao fato de a velocidade v2 ser bem maior do que
a v1 .
A súbita mudança de velocidade, representada na Figura 2.44 pelo acentuado desvio
dos raios, faz com que aumente o espalhamento geométrico da energia, fenômeno este
dependente do ângulo que o raio faz com a interface. Nestas condições, uma descrição da
perda de amplitude causada pelo espalhamento geométrico do sinal exige o conhecimento
das propriedades do raio, em cada posição do percurso. Este é o principal tema do texto
que se segue, o qual discute os fundamentos para uma boa compreensão das aproximações
usadas no processamento sı́smico rotineiro, uma das quais é discutida no final deste item.
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 161

Figura 2.44: Espalhamento da onda após um dado tempo


de propagação: (a) em um meio homogêneo e isotrópico de
velocidade v1 e; (b) na presença de uma interface entre dois
meios de velocidades v1 e v2 .

A amplitude do sinal ao longo do raio


O princı́pio da conservação da energia pode ser associado à amplitude do sinal, em um
meio qualquer, com base na equação de transporte e na função J, definidas no inı́cio deste
item (equações 2.5.9 e 2.5.19). Para isto, considere-se um segmento da versão cônica do
tubo infinitesimal que envolve o raio, na forma da Figura 2.45. O mesmo segmento
apresenta um volume δV limitado por uma superfı́cie δS, por sua vez constituı́da pela
soma δS1 + δS2 + δS3 e cuja normal é dada pelo vetor local ~n.
Com base nesse contexto, pode-se utilizar a equação de transporte para se definir como
a amplitude do sinal é alterada, dentro do tubo do raio, à medida que a onda se propaga
(ver Bleistein, 1984). Para isto, observe-se inicialmente que a equação de transporte, na
forma da expressão 2.5.9, representa a divergência de um vetor. Aplicando-se a mesma
equação, combinada com o teorema de Gauss, ao segmento representado na Figura 2.45,
obtém-se a igualdade
Z  2  Z 2
A A
∇• ∇τ dV = ∇τ • ~ndS = 0 (2.5.81)
ρ ρ
δV δS

ou seja,
Z  2  Z Z Z
A A2 A2 A2
∇• ∇τ dV = ∇τ • ~ndS1 + ∇τ • ~ndS2 + ∇τ • ~ndS3 = 0
ρ ρ ρ ρ
δV δS1 δS2 δS3

Observe-se que, com base na Figura 2.45, a contribuição da superfı́cie δS3 é igual
a zero, pelo fato de, na mesma superfı́cie, aplicar-se a seguinte igualdade, baseada nas
propriedades do produto escalar entre vetores:

∇τ • ~n = 0 (2.5.82)
162 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.45: Áreas e vetores unitários no tubo infinitesi-


mal do raio.

Este resultado se deve ao fato de que ∇τ é paralelo ao raio, portanto perpendicular ao


vetor ~n, na superfı́cie δS3 . Por outro lado, nas superfı́cies δS1 e δS2 , o mesmo produto
escalar corresponde, respectivamente, a

1
∇τ • ~n = − (2.5.83)
v1
e
1
∇τ • ~n = (2.5.84)
v2
O sinal diferente, nas duas equações, se explica pelo fato de o vetor ~n apresentar sentidos
opostos, nas superfı́cies δS1 e δS2 .
Substituindo-se as equações 2.5.82, 2.5.83 e 2.5.84 na equação 2.5.81, e considerando-
se superfı́cies infinitesimais, obtém-se a seguinte expressão:

A22 A2
dS2 = 1 dS1
v2 ρ2 v1 ρ1

ou, generalizando-se, para uma posição qualquer ao longo do raio,

A2 A2
dS = 1 dS1 (2.5.85)
vρ v1 ρ1
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 163

Com a equação 2.5.17, pode-se transformar este resultado em uma forma dependente da
função J, ou seja,
A2 J A 2 J1
= 1 (2.5.86)
vρ v1 ρ1
onde J, v e ρ são válidos em uma posição arbitrária do raio. Conclui-se de imediato que
a amplitude A é inversamente proporcional à função J.
As equações 2.5.85 e 2.5.86 representam a base para uma boa análise da conservação
da energia. Se for levada em conta toda a área S abrangida pela propagação em um dado
instante, a expressão 2.5.85 pode ser transformada na seguinte igualdade:
Z 2
A
dS = CONSTANTE (2.5.87)

S

Observe-se que este resultado é válido para medidas de pressão. No caso em que se deseja
representá-lo em função da velocidade de partı́culas, aplica-se a equação 2.4.37, o que leva
à seguinte igualdade: Z
A2v vρdS = CONSTANTE (2.5.88)
S
onde Av é a velocidade de partı́culas medida na direção da propagação.
De acordo com as equações 2.5.87 e 2.5.88, a energia do sinal é mantida em todo
o trajeto. Análise similar pode ser feita com base na expressão 2.5.86, a qual permite
a dedução de uma versão adicional da equação de transporte. Para obter esta versão,
deriva-se a mesma expressão com relação a s. Como, na posição definida pelo subscrito
1, os parâmetros envolvidos são constantes, o resultado da operação é:
s !
∂ J
A =0 (2.5.89)
∂s vρ

O significado da expressão obtida deve ser ressaltado: o fator A2 J/vρ deve se manter
constante ao longo do raio, o que equivale a garantir a conservação da energia.
Aplicando-se os conceitos apresentados até aqui, é possı́vel deduzir a expressão corres-
pondente à amplitude gerada por uma fonte pontual, após um dado tempo de propagação
τ . Neste caso, uma aplicação direta da equação 2.5.86 não é possı́vel, já que, na posição
da fonte, J1 = 0. Desta forma, torna-se necessário estimar uma constante c0 , válida nas
vizinhanças da fonte e definida com base na seguinte versão da equação 2.5.86:
r
v1 ρ1
A1 = c 0 (2.5.90)
J1
Ressalte-se que c0 pode ter um valor finito e diferente de zero, dependendo de como se
comportem A1 e J1 .
Em um meio heterogêneo, a determinação da constante c0 é uma tarefa muito difı́cil.
Entretanto, pode-se considerar que o meio é homogêneo e isotrópico em uma região
infinitesimalmente próxima da fonte. Nestas condições, aplicando-se a equação 2.5.16,
pode-se transformar a equação 2.5.90 na seguinte igualdade:
r
c0 v1 ρ1
A1 = (2.5.91)
s sen γ1
164 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

A equação 2.5.91 representa a amplitude do sinal gerado por uma fonte pontual, em
um meio homogêneo e isotrópico. Estas também são as condições em que se obteve a
equação 2.4.54, que corresponde à solução da equação da onda na presença de uma fonte.
Na mesma solução, vê-se que a amplitude é representada por A = 1/R, ou, na convenção
usada aqui, A = 1/s. Assim, igualando-se os valores de amplitude dados pelas equações
2.4.54 e 2.5.91, tem-se: r
1 c0 v1 ρ1
=
s s sen γ1
e, portanto, r
sen γ1
c0 = (2.5.92)
v1 ρ1
Pode-se agora obter a expressão geral para a amplitude do sinal gerado por uma fonte
pontual, o que é feito através da substituição das equações 2.5.91 e 2.5.92 na expressão
2.5.86. O resultado é: r r
sen γ1 vρ
A= (2.5.93)
J v1 ρ1
Na forma da equação 2.5.93, o valor da amplitude A é composto pela multiplicação
de dois fatores, um deles associado à impedância acústica do meio e o outro devido ao
espalhamento geométrico da energia. Assim, a mesma expressão pode ser escrita da
seguinte forma: r
1 vρ
A= (2.5.94)
D v1 ρ1
onde D é o fator de espalhamento geométrico, ou seja,
s
J
D= (2.5.95)
sen γ1

(Um exercı́cio para o leitor: a expressão 2.5.94 é válida para medidas de pressão. Use a
equação 2.4.37 para obter a forma equivalente para medidas de velocidade de partı́cula,
no caso da propagação vertical).
É interessante observar que, geralmente, o valor da função J aumenta com o tempo
de reflexão. Entretanto, em meios heterogêneos, o valor de J pode também diminuir,
podendo até mesmo se tornar negativo, em função do modelo de velocidades e da cur-
vatura das interfaces elásticas. Esta eventualidade leva à obtenção de valores complexos
(não reais) para a função D, o que pode ocorrer quando a frente de onda ultrapassa as
chamadas cáusticas, para as quais J = 0, e que correspondem a pontos de cruzamento
dos raios que caracterizam uma frente de onda. Um exemplo de cáustica ocorre no foco
enterrado, discutido parcialmente no item 2.2.

O espalhamento geométrico em meios v(z)


Em meios heterogêneos, o cálculo do fator de espalhamento geométrico, D, na forma da
expressão 2.5.95, pode-se tornar substancialmente complexo, a julgar pela definição da
função J (equação 2.5.19). Entretanto, nas situações práticas, observa-se com freqüência
a existência de meios para os quais é possı́vel assumir que a velocidade não varia na direção
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 165

lateral, os quais são genericamente denominados “meios v(z)”. Nestas condições, pode-se
obter expressões analı́ticas relativamente simples para se estimar o fator de espalhamento
geométrico.
Com o fim de ilustrar como isto é possı́vel, considere-se inicialmente que, em um meio
lateralmente homogêneo e isotrópico, a fonte está situada em uma profundidade arbitrária
z1 e o receptor plantado na superfı́cie (z = 0). Suponha-se agora que, nas condições
propostas, um raio tenha sido emitido de acordo com os ângulos γ1 e γ2 , estabelecidos
na posição da fonte, e que atinja o receptor a uma distância horizontal, rH , da fonte,
como se pode ver na Figura 2.46. Nas condições estabelecidas, as seguintes expressões,
baseadas na aproximação hiperbólica, são aplicáveis:
2
rH
t2 = t20 + , (2.5.96)
v2

∂t r sen γ1
p= = H = (2.5.97)
∂rH v2t v1
e
∂p ∂2t t2
= 2 = 20 3 (2.5.98)
∂rH ∂rH v t
onde t é o tempo de trajeto entre a fonte e o receptor, t0 é o tempo vertical, v é a velocidade
média que permite reproduzir a curva tempo-distância medida, v1 é a velocidade intervalar
na fonte e p é o parâmetro de raio (ver o subitem 2.5.2).
Suponha-se agora que se introduza uma pequena variação isolada no ângulo γ 1 . O
resultado é um novo raio que atinge a superfı́cie de acordo com um deslocamento, em
relação ao raio anterior, dado pelo vetor horizontal ∆~r1 . Já que o meio é lateralmente
constante, conclui-se que este deslocamento apresenta o mesmo sentido e direção da
projeção horizontal do vetor ~r, o qual liga a fonte ao receptor. Isto significa que o módulo
do vetor ∆~r1 é igual a |∆rH |, o que permite obter a seguinte igualdade:
∆~r1 ∆rH ∆rH ∆p
= =
∆γ1 ∆γ1 ∆p ∆γ1
Fazendo ∆γ1 tender a zero, tem-se, após as substituições apropriadas, feitas com base
nas expressões 2.5.97 e 2.5.98:
 2 −1
∂~r ∂rH ∂ t cos γ1
= = 2
(2.5.99)
∂γ1 ∂γ1 ∂rH v1
Por outro lado, uma pequena variação isolada do ângulo γ2 leva a um deslocamento
horizontal ∆~r2 o qual, no caso em que ∆γ2 tende a zero, é ortogonal a ∆~r1 . Isto se deve à
homogeneidade lateral do meio, que leva rH , para um mesmo valor de γ1 e qualquer valor
de γ2 , a se manter constante e se comportar como o raio de um cı́rculo. Conseqüentemente,
a seguinte aproximação é válida:
|∆~r2 | ∼
= rH |∆γ2 |
Portanto, no limite em que ∆γ2 tende a zero, tem-se:
∂~r
= rH (2.5.100)
∂γ2
166 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.46: Geometria do tubo infinitesimal de um raio que se pro-


paga desde uma fonte em subsuperfı́cie até a superfı́cie, em um meio
lateralmente homogêneo e isotrópico.

Substituindo-se, na equação 2.5.19 (ou 2.5.20), as derivadas de ~r com relação a γ1 e


γ2 , dadas pelas expressões 2.5.99 e 2.5.100, e lembrando que as duas são ortogonais entre
si, obtém-se a seguinte expressão para a função J:
 −1
∂2t cos γ1
J= r cos α (2.5.101)
2
∂rH v1 H

onde α é o ângulo que a frente de onda faz com a superfı́cie ao atingir o receptor (ou o
ângulo que o raio faz com a direção vertical na mesma posição).
A aproximação hiperbólica da equação 2.5.96 permite definir rH em função da vagaro-
sidade ∂t/∂rH (equação 2.5.97), assim como implica a existência de uma forma analı́tica
para ∂ 2 t/∂rH
2
(equação 2.5.98). A substituição dos resultados correspondentes na equação
2.5.101 leva à seguinte forma para J, aplicável a um meio lateralmente homogêneo e
isotrópico:
 2 2 2
v t
J= cos γ1 cos α sen γ1 (2.5.102)
v 1 t0
Assume-se agora que a fonte e o receptor estejam ambos na superfı́cie e que o tempo
obtido inclua o trajeto entre a fonte, o refletor e o receptor. Nestas condições, já que o
meio é lateralmente homogêneo e isotrópico, segue-se que

cos γ1 = cos α
2.5. O TEMPO E A AMPLITUDE AO LONGO DO RAIO 167

e que, portanto,
 2
v 2 t2
J= cos 2 α sen γ1 (2.5.103)
v 1 t0
Com a função J obtida, pode-se agora determinar o fator de espalhamento geométrico,
D, no caso em que a fonte e o receptor se situam na superfı́cie. Para isto, combinam-se
as equações 2.5.103 e 2.5.95, o que leva à seguinte expressão:

v 2 t2
D(rH , t) = cos α (2.5.104)
v 1 t0

No limite em que o afastamento fonte-receptor tende a zero, tem-se:

v 2 t0
D(t0 ) = (2.5.105)
v1

Conforme se afirmou anteriormente, v é, nas duas equações, a velocidade que melhor
reproduz a curva tempo-distância. Na segunda delas, corresponde à velocidade NMO, ou
RMS (ver o subitem 2.5.2).
Existem, na literatura, outras formas para o fator de espalhamento geométrico, D(t),
baseadas nas mesmas premissas adotadas na dedução da equação 2.5.104. Duas delas,
menos compactas embora matematicamente equivalentes a ela, são as de Newman (1973)
e a de Ursin (1990). Uma versão mais abrangente, obtida por Tygel et al. (1992), depende
da disponibilidade de uma matriz de tempos de trajeto, e permite estimar o espalhamento
geométrico em um meio qualquer, sem a necessidade de se calcular a função J, de forma
aplicável a dados com qualquer afastamento fonte-receptor.
No caso do fator D(t0 ), uma expressão igual à 2.5.105 foi obtida por Newman (1973)
e por Shah (1973), neste caso definindo o raio de curvatura da frente de onda no mesmo
tipo de meio. Ou seja, com base no trabalho de Shah, aplica-se a seguinte igualdade:

D(t0 ) = R0 (2.5.106)

onde R0 é o raio de curvatura da frente de onda associada à reflexão, na ausência de


afastamento entre a fonte e o receptor, definido pela expressão 2.5.27 e relacionado à
velocidade RMS através da equação 2.5.78.
Na prática, em muitas circunstâncias, o espalhamento geométrico leva a perdas pouco
maiores do que 6dB por segundo18 . Ressalte-se, contudo, que estas perdas são medidas
relativas, tomadas após tempos de percurso relativamente longos, tornando-se pouco
representativas dos fenômenos que ocorrem nas vizinhanças da fonte. Como exemplo,
tome-se o caso extraı́do do perfil sônico de um poço, situado em águas profundas, na Bacia
de Campos: a perda de amplitude, devida ao espalhamento geométrico, é de 13.1dB, no
intervalo de profundidades entre 1186m e 3504m, ou no intervalo de tempo entre 1.474s e
3.136s. Se o meio fosse homogêneo e isotrópico, a perda causada pela divergência esférica
seria de 9.4dB.
Nesse exemplo, utilizou-se a equação 2.5.105, assumindo incidência vertical. Na pre-
sença de afastamento fonte-receptor, é conveniente aplicar a equação 2.5.104, como se
18
Observação: dB, ou deciBel, é uma unidade definida por 20 log10 R, onde R é a razão entre duas
medidas de amplitude.
168 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

4
Fator D (normalizado)

0
200 500 1000 1500 2000
Tempo vertical (ms)

Figura 2.47: Fator de espalhamento geométrico estimado no afastamento


fonte-receptor igual a 2000m, usando-se as equações 2.5.104 (linha espessa) e
2.5.105, neste caso substituindo-se o tempo de reflexão vertical pelo total. A
velocidade usada varia linearmente entre 1500m/s, na superfı́cie, e 2380m/s,
no tempo vertical de 2200ms. A normalização foi feita com relação ao valor
de D estimado, com a equação 2.5.105, no tempo vertical de 100ms.

pode perceber com base na Figura 2.47. Na construção da figura, usou-se um modelo
geológico de camadas horizontais, no qual a velocidade de empilhamento cresce linear-
mente com a profundidade, e se estimaram tempos de reflexão no afastamento fonte-
receptor constante de 2000 metros, até o tempo vertical máximo de 2200ms. O cálculo
do fator de espalhamento geométrico foi feito com as equações 2.5.104 e 2.5.105, neste
último caso substituindo-se o tempo vertical da fórmula pelo tempo de reflexão total,
o que foi feito com o fim de permitir uma comparação isenta. Observe-se no resultado
obtido que, para um mesmo afastamento fonte-receptor, a diferença entre as equações
2.5.104 e 2.5.105 tende a ser reduzida com o aumento do tempo de reflexão. Entretanto,
nos tempos menores, a diferença é significativa.

2.6 Partição de Energia nas Interfaces


Ver-se-á, no item 2.7, que é possı́vel extrapolar campos de onda, com os algoritmos de
diferenças finitas, de forma a que o próprio processo crie reflexões e múltiplas, além de
provocar mudanças de amplitude e fase, em função da variação espacial das proprie-
dades elásticas do meio. Este enfoque, embora matematicamente elegante, apresenta o
inconveniente de dificilmente poder ser aplicado na forma inversa. Por outro lado, o
conhecimento explı́cito dos fenômenos envolvidos em uma interface entre camadas é fun-
damental não somente para a interpretação sı́smica mas também para o entendimento
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 169

das aplicações diretas e inversas da aproximação Kirchhoff (ver o item 2.7). Justifica-se
assim a necessidade de aprofundar a discussão sobre os mesmos fenômenos.

2.6.1 Partição acústica da energia


Imagine-se que uma onda plana, viajando em um fluido, atinja uma descontinuidade
puramente acústica, ou seja, caracterizada exclusivamente pela variação na velocidade P,
na densidade, ou no produto entre ambas. Assumindo que a interface assim definida seja
horizontal e que a onda incida sobre ela de forma oblı́qua, a aplicação da lei de Hooke e do
princı́pio da conservação da energia leva a duas condições de contorno: (1) continuidade
do deslocamento na direção normal à interface e; (2) continuidade do esforço. Ou seja,

(uI − uR ) cos θ1 = uT cos θ2 (2.6.1)

e
pI + p R = p T (2.6.2)
onde u é o deslocamento de partı́culas, p é a pressão e os subscritos I, R e T indicam
incidência, reflexão e transmissão, respectivamente. Os sı́mbolos θ1 e θ2 identificam os
ângulos de propagação da onda descendente, com relação à direção vertical, no meio em
que a onda incide, 1, e no meio em que a onda refrata, 2, respectivamente19 . Os mesmos
ângulos se relacionam, de acordo com a lei de Snell, na forma da seguinte igualdade (ver
o item 2.1):
sen θ1 sen θP1 v1
= = (2.6.3)
sen θ2 sen θP2 v2
ou seja, s  2
v2
cos θ2 = 1− sen 2 θ1
v1
Na aplicação das equações 2.6.1 e 2.6.2, os deslocamentos de partı́culas podem ser
definidos com base na solução da equação bidimensional da onda. Adotando-se uma de
suas possı́veis soluções, na forma discutida no item 2.4, tem-se20 :

uI = cos [ω(x/v1 ) sen θ1 + ω(z/v1 ) cos θ1 − ωt] , (2.6.4)

uR = r cos [ω(x/v1 ) sen θ1 − ω(z/v1 ) cos θ1 − ωt] (2.6.5)


e
uT = T cos [ω(x/v2 ) sen θ2 + ω(z/v2 ) cos θ2 − ωt] (2.6.6)
Os deslocamentos de partı́culas assim definidos, combinados com a equação 2.4.37, per-
mitem obter as seguintes expressões para as pressões pI , pR e pT :

pI = −v1 ρ1 ω sen [ω(x/v1 ) sen θ1 + ω(z/v1 ) cos θ1 − ωt] , (2.6.7)


19
Em termos vetoriais, o ângulo que o raio refletido faz com o eixo z é igual a π − θ 1 , o que permite
explicar algebricamente o sinal negativo na equação 2.6.1 (ver também o subitem 2.1.2).
20
Ressalte-se que a solução u = exp [iω(x/v) sen θ + iω(z/v) cosθ − iωt] levaria a resultados equivalen-
tes.
170 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

pR = −rv1 ρ1 ω sen [ω(x/v1 ) sen θ1 − ω(z/v1 ) cos θ1 − ωt] (2.6.8)


e
pT = −T v2 ρ2 ω sen [ω(x/v2 ) sen θ2 + ω(z/v2 ) cos θ2 − ωt] (2.6.9)
Observe-se que se adotou, para o coeficiente de reflexão, a mesma convenção de polaridade
da equação 2.1.43. Ou seja, um coeficiente de reflexão positivo significa que o sentido em
que as partı́culas da frente de onda vibram, em relação ao sentido da propagação, não é
alterado pela interface correspondente.
Aplicando-se a lei de Snell, na forma da igualdade 2.6.3, percebe-se, nas expressões
2.6.4 a 2.6.9, que os termos do tipo (1/v) sen θ são todos iguais. Por outro lado, sabe-se
que, se se adotar um valor arbitrário z = 0, as mesmas expressões continuam válidas.
Desta forma, pode-se transformar as condições de contorno 2.6.1 e 2.6.2 nas seguintes
expressões:  
cos θ2
1−r = T (2.6.10)
cos θ1
e  
v2 ρ2
1+r = T = γη T (2.6.11)
v1 ρ1
onde γ = v2 /v1 e η = ρ2 /ρ1 .
As expressões 2.6.10 e 2.6.11 permitem obter as seguintes fórmulas para os coeficientes
de reflexão e transmissão em um meio acústico:

v2 ρ2 / cos θ2 − v1 ρ1 / cos θ1
r= (2.6.12)
v2 ρ2 / cos θ2 + v1 ρ1 / cos θ1
ou
γη cos θ1 / cos θ2 − 1
r= (2.6.13)
γη cos θ1 / cos θ2 + 1
e
2v1 ρ1 / cos θ2
T = (2.6.14)
v2 ρ2 / cos θ2 + v1 ρ1 / cos θ1
ou
2 cos θ1 / cos θ2
T = (2.6.15)
γη cos θ1 / cos θ2 + 1
Na forma da equação 2.6.12, a impedância acústica, definida no item 2.1 pelo produto
vρ, passa a ser generalizada pela expressão vρ/ cos θ, onde θ corresponde ao ângulo entre
a normal à interface e o raio que define a onda plana incidente. Em contrapartida, o leitor
poderá observar que, no caso em que o ângulo de incidência é igual a zero, as equações
2.6.12 e 2.6.14 reduzem-se às expressões 2.1.43 e 2.1.44. Ou seja, elas se transformam nas
seguintes igualdades, válidas também para uma interface entre sólidos:
v2 ρ2 − v 1 ρ1
r= , para θ1 = 0 (2.6.16)
v2 ρ2 + v 1 ρ1
e
2v1 ρ1
T = , para θ1 = 0 (2.6.17)
v2 ρ2 + v 1 ρ1
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 171

Pode-se agora estabelecer a relação entre os coeficientes de reflexão e o fluxo de energia


através da interface. Levando-se em conta que a energia da onda incidente é igual à soma
das energias das ondas refletida e transmitida e, além disso, que o fluxo de energia deve
ser avaliado na direção normal à interface, pode-se escrever a seguinte igualdade, baseada
na equação 2.1.28:
v1 ρ1 cos θ1 = r 2 v1 ρ1 cos θ1 + T 2 v2 ρ2 cos θ2

ou     
2 cos θ2 v2 ρ2 2 cos θ2
1−r = T = γη T2 (2.6.18)
cos θ1 v1 ρ1 cos θ1
Este resultado, que equivale ao produto entre as equações 2.6.10 e 2.6.11, representa uma
medida relativa da energia que flui, na direção vertical, através da interface.

2.6.2 Partição elástica da energia


Em um meio sólido, a relação entre esforço e deformação (lei de Hooke) é bem mais com-
plexa do que no caso de um fluido, tornando possı́vel a propagação de ondas cisalhantes,
ou S, que são caracterizadas pela vibração das partı́culas na direção perpendicular à
direção de propagação, ou seja, tangencialmente à frente de onda. Como se viu no item
2.1, a propagação de deformações tangenciais à frente de onda depende fundamentalmente
da rigidez da rocha. Viu-se ainda, no mesmo item, que a velocidade de propagação das
ondas S pode ser calculada a partir da velocidade P e da razão de Poisson, através da
seguinte expressão:
s
vP 1−σ
q= = 1 (2.6.19)
vS 2
−σ

onde o subscrito identifica o tipo de onda, compressional, P, ou cisalhante, S. Com base


no que se viu no item 2.1, sabe-se que, no caso de fluidos, para os quais a razão de Poisson
é 0.5, a velocidade S é zero.
As ondas cisalhantes podem ser geradas através de fontes apropriadas, como os vi-
bradores horizontais, mas podem também resultar da partição de energia nas interfaces
entre camadas. Assim, quando uma onda plana do tipo P incide em uma interface sólida
de acordo com um ângulo de incidência maior do que zero, a energia é fracionada não só
em ondas refletidas e refratadas do tipo P, mas também em ondas refletidas e refratadas
do tipo SV. Caracteriza-se assim uma das formas da conversão de modo, que somente se
aplica às ondas que, ao atingir a interface, apresentam componentes de deformação no
plano que inclui os raios incidente, refletido e refratado e o ponto de reflexão ou trans-
missão. Ou seja, considerando um modelo 2-D, apenas as ondas P e SV estão sujeitas ao
mesmo fenômeno, que não se aplica às ondas SH.
A Figura 2.48 ilustra os tipos de onda envolvidos em uma interface entre sólidos,
na qual incide uma onda compressional P. Os diversos ângulos ilustrados na figura se
relacionam através da seguinte versão da lei de Snell (ver o item 2.1):

sen θP1 sen θS1 sen θP2 sen θS2


= = = (2.6.20)
v P1 v S1 v P2 v S2
172 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.48: A lei de Snell em uma interface elástica.

Devem ser acrescentados ainda os dois ângulos crı́ticos, obtidos a partir dos ângulos
definidos acima:
vP
sen θCP = 1
v P2
e
vP
sen θCS = 1
v S2
Os dois ângulos crı́ticos definem as situações em que uma onda incidente P dá origem
a ondas que viajam no meio 2, junto à interface, as quais, por sua vez, geram as corres-
pondentes ondas frontais (head waves). Em dados sı́smicos convencionais, o ângulo crı́tico
associado à conversão de modo para ondas SV somente é observado em situações parti-
culares, tais como áreas em que ocorrem camadas de alta velocidade junto à superfı́cie
(por exemplo, a Bacia do Paraná, na qual afloram basaltos).
Se o ângulo de incidência em uma interface for inferior ao crı́tico, uma única onda
compressional gera quatro diferentes ondas: as refletidas, dos tipos P e SV e as refratadas,
também dos tipos P e SV. Cada uma dessas ondas é gerada com amplitude proporcional
à amplitude da onda incidente e ao respectivo coeficiente de reflexão ou transmissão. Ou
seja, nestas condições, existem quatro diferentes coeficientes, que dependem não só das
propriedades elásticas dos dois meios envolvidos, mas também do ângulo de incidência.
Como no caso acústico, as expressões que definem os quatro coeficientes são baseadas nas
condições de contorno, neste caso mais abrangentes: (1) continuidade do deslocamento
vertical; (2) continuidade do esforço vertical; (3) continuidade do deslocamento tangencial
e (4) continuidade do esforço tangencial.
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 173

Ao contrário do caso acústico, o modelo elástico de uma interface, que inclui on-
das P e SV, não leva a expressões simples para os coeficientes envolvidos. A aplicação
das condições de contorno descritas à solução da equação da onda resulta nas chamadas
equações de Zoeppritz, que contêm os diversos coeficientes na forma implı́cita. Expressões
explı́citas para esses coeficientes, em função do ângulo de incidência, podem ser encon-
tradas em Cerveny e Ravindra (1971) e Aki e Richards (1980). No caso de uma onda
incidente compressional, os quatro coeficientes de reflexão e transmissão correspondentes
são dados pela seguinte versão das equações obtidas por Cerveny e Ravindra:

A−B
r= , (2.6.21)
A+B

2C
T = , (2.6.22)
A+B

2D
rS = (2.6.23)
A+B
e
2E
TS = (2.6.24)
A+B
onde o subscrito S indica presença de conversão de modo para onda cisalhante. As
variáveis A, B, C, D e E são dadas por
A = 4Q2 P1 P2 P3 P4 sen 2 θ + γηP1 P4 + γ 2 X 2 P1 P2 ,
B = γ 2 Z 2 sen 2 θ + Y 2 P3 P4 + γηP2 P3 ,
C = P1 (γXP2 + Y P4 ),
D = −P1 sen θ (2QY P3 P4 + γ 2 XZ/q2 )
e
E = −P1 sen θ (2QP2 P3 − γZ/q1 )
onde θ é o ângulo de incidência da onda compressional, ou seja, na Figura 2.48, θ = θP1 .
Os demais elementos destas equações são definidos da seguinte forma:
γ = v2 /v1 ,
η = ρ2 /ρ1 , √
P1 = cos θP1 = p cos θ = 1 − sen 2 θ,
P2 = cos θS1 = p1 − sen 2 θ/q12 ,
P3 = cos θP2 = p1 − γ 2 sen 2 θ,
P4 = cos θS2 = 1 − γ 2 sen 2 θ/q22 ,
Q = γ 2 η/q22 − 1/q12 ,
X = η − 2Q sen 2 θ,
Y = 1 + 2Q sen 2 θ
e
Z = η − 1 − 2Q sen 2 θ
onde v é a velocidade21 correspondente à onda P e q é a razão entre as velocidades P
e S do meio identificado pelo subscrito, na forma da equação 2.6.19. Observe-se que os
21
Em diversos trechos desta apostila, a ausência de um subscrito associado à variável v significa que
ela se refere à propagação de ondas compressionais.
174 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

coeficientes de reflexão e transmissão não dependem dos valores isolados das velocidades
P e das densidades dos dois meios mas sim das razões γ e η.
Independentemente do tipo de onda, sua intensidade pode ser definida pela equação
2.1.28. Combinando-se esta propriedade com os coeficientes de reflexão e transmissão,
é possı́vel avaliar o fluxo vertical de energia através de cada unidade de área de uma
interface elástica. Para isto, deve-se respeitar o princı́pio da conservação da energia, ou
seja, a energia da onda incidente deve igualar a soma das energias de todas as ondas
refletidas e transmitidas. Levando em conta a projeção dos diversos fluxos envolvidos
sobre a direção vertical, obtém-se a seguinte igualdade:
v1 ρ1 v2 ρ2
v1 ρ1 cos θP1 = v1 ρ1 cos θP1 r 2 + cos θS1 rS2 + cos θS2 TS2 + v2 ρ2 cos θP2 T 2
q1 q2

onde as velocidades S foram substituı́das com base na razão vP /vS , ou seja, q. O resultado
obtido pode ser escrito da seguinte forma:
     
2 1 cos θS1 2 γη cos θS2 2 cos θP2
1−r − rS − TS = γη T2 (2.6.25)
q1 cos θP1 q2 cos θP1 cos θP1

O leitor poderá perceber que a equação 2.6.18 corresponde a um caso particular da


expressão 2.6.25. Na mesma linha de raciocı́nio, poderá também perceber que a energia
compressional transmitida através de uma interface elástica é fortemente controlada pela
conversão de modo. Isto significa que, ao contrário do que ocorre no caso acústico, a
energia compressional transmitida através de uma interface elástica não depende exclusi-
vamente do coeficiente de reflexão de ondas compressionais. Esta é uma observação que
restringe bastante a idéia de se usar esse coeficiente para se estimar a pseudo-impedância
elástica do meio (ver discussão no Capı́tulo 3).

2.6.3 Predição da influência das propriedades elásticas


Os conceitos discutidos no subitem 2.6.2 podem ser usados não somente na modelagem
sı́smica mas também na construção de modelos que permitam prever de forma simples
a resposta sı́smica em função das propriedades elásticas. Considerem-se, inicialmente,
alguns exemplos teóricos. No que diz respeito ao coeficiente de reflexão P-P, ou seja,
ondas incidente e refletida do tipo P, a Figura 2.49 ilustra dois casos de aplicação da
equação 2.6.21, em função das quatro propriedades elásticas, γ, η, σ1 e σ2 . O primeiro
caso da figura, identificado pela curva a, corresponde a uma interface caracterizada por
um arenito saturado de gás, sotoposto a um folhelho. O segundo caso, identificado pelas
curvas b e c, corresponde ao contato gás-água, para o mesmo arenito. Observe-se que,
no primeiro caso, o valor absoluto do coeficiente de reflexão cresce continuamente com o
ângulo de incidência.
No segundo caso, correspondente à curva b da Figura 2.49, ocorre o ângulo crı́tico,
o qual é caracterizado por uma descontinuidade da derivada dos coeficientes de reflexão
com relação ao ângulo de incidência. Após o ângulo crı́tico, o coeficiente de reflexão
torna-se complexo, passando a ser representado por um valor de amplitude e outro de
fase, sendo este representado pela curva c da Figura 2.49, o que se deve ao fato de o
fator P3 , na equação 2.6.21, se tornar complexo na mesma região. Isto significa que, se
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 175

Figura 2.49: Amplitude e fase do coeficiente de reflexão para ondas compressio-


nais, r, correspondente ao topo e à base de um arenito saturado de gás. Observação:
a convenção de fase é diferente da adotada no Capı́tulo 1.

o ângulo de incidência for maior do que o ângulo crı́tico, o pulso sı́smico tem sua fase
modificada.
Como ilustração da conversão de modo em uma interface, a Figura 2.50 representa
a curva de coeficientes de reflexão, correspondente à conversão de ondas do tipo P para
SV, em um modelo simples. Vê-se que, para ângulos de incidência próximos de zero, a
amplitude refletida é insignificante, crescendo com o afastamento até nı́veis relativamente
importantes. No caso, o valor absoluto da amplitude refletida, no ângulo de 28 graus, é
cerca de 86% do valor do coeficiente de reflexão P-P, para incidência vertical. Observe-se
também a mudança de fase, que ocorre a partir do ângulo crı́tico (41.8 graus).
É fácil induzir que as implicações desse fenômeno são mais importantes nas camadas
mais rasas, para as quais é facilmente possı́vel atingir-se grandes ângulos de incidência.
Por outro lado, o acréscimo da velocidade com a profundidade, que é relativamente
comum, faz com que os ângulos de incidência, para um mesmo raio, tendam a se tornar
proporcionalmente maiores em grandes profundidades, por causa da lei de Snell22 . Desta
forma, o fenômeno não deve ser desconsiderado a priori, mesmo quando se interpretam
refletores profundos.
Com base nos exemplos das figuras 2.49 e 2.50, o leitor pode perceber que é vir-
tualmente impossı́vel prever o comportamento dos coeficientes r e rS através da simples
inspeção visual das equações 2.6.21 e 2.6.23. Esta é uma conseqüência natural da comple-
xidade das duas equações, a qual dificulta a percepção de como cada uma das propriedades
elásticas influencia a distribuição dos coeficientes em função do ângulo de incidência. Por
outro lado, Rosa (1976) constatou, no caso particular das equações 2.6.21 e 2.6.22, que
a análise desse tema torna-se substancialmente mais simples se for baseada na derivada
22
A Figura 2.40, na página 152, pode ser usada como ilustração desta caracterı́stica.
176 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.50: Amplitude e fase do coeficiente de reflexão, r S , como ilustração da


conversão de modo em uma interface. Observações: (1) r = r S ; (2) a convenção de
fase é diferente da adotada no Capı́tulo 1.

dos coeficientes com relação a cada uma das propriedades elásticas.


Na Figura 2.51, vêem-se as curvas das derivadas do coeficiente de reflexão r, com
relação às quatro propriedades elásticas, calculadas no caso de uma interface sem reflexão,
em função do quadrado do seno do ângulo de incidência. As curvas da figura dão uma idéia
do que ocorreria com o coeficiente de reflexão se as propriedades elásticas fossem mudadas.
Assim, uma derivada positiva e crescente, em função do ângulo de incidência, indica que,
se o parâmetro em questão aumentar, o coeficiente de reflexão tende a aumentar com o
ângulo de incidência.
Na mesma figura, gerada na condição em que σ1 = σ2 = 1/4, observa-se uma impor-
tante constatação: a influência das duas razões de Poisson obedece a um padrão simétrico,
em relação ao eixo dos ângulos de incidência. Isto significa que a variação em uma delas
pode compensar a variação na outra. Em um processo inverso, esta situação caracteriza
a possibilidade de mais de uma solução para os mesmos dados. Ver-se-á depois que a
diferença entre as duas razões de Poisson é mais importante do que o valor isolado de
cada uma delas.
As derivadas parciais podem ser usadas para a obtenção de expressões aproximadas
dos coeficientes de reflexão e transmissão, em função do ângulo de incidência, através de
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 177

Figura 2.51: Derivadas do coeficiente de reflexão para ondas compressionais, r,


em relação às propriedades elásticas em uma interface sem reflexão. A escala do
eixo horizontal é linear com relação a sen 2 θ.

expansão Taylor. No caso do coeficiente de reflexão P-P, a expansão Taylor, incluindo


apenas os termos que envolvam derivadas de primeira ordem, a partir do modelo implı́cito
na Figura 2.51, é dada por
∂r ∂r ∂r ∂r
r∼
= (γ − 1) + (η − 1) + (σ1 − 14 ) + (σ2 − 14 ) (2.6.26)
∂γ ∂η ∂σ1 ∂σ2
Assim, pode-se computar o coeficiente de reflexão em cada ângulo de incidência, com
a expressão 2.6.26, utilizando-se as derivadas estimadas no mesmo ângulo, para as propri-
edades elásticas desejadas. Observe-se que, na mesma expressão, o ângulo de incidência
178 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

não aparece. Por outro lado, na Figura 2.51, vê-se que as derivadas parciais com relação
a três das propriedades elásticas são definidas por retas, em função do quadrado do seno
do ângulo de incidência. Além disso, no caso de γ, a derivada parcial é definida aproxi-
madamente por uma reta, no caso em que o ângulo de incidência tende a zero. Ou seja,
nas condições da Figura 2.51, pode-se obter, usando-se expansão Taylor, as seguintes
expressões para as derivadas parciais em função do ângulo de incidência:

∂r ∼ 1 5
= − sen 2 θ,
∂γ 2 6

∂r ∼ 1 2
= − sen 2 θ,
∂η 2 3
∂r ∼ 16
= − sen 2 θ
∂σ1 9
e
∂r ∼ 16
= sen 2 θ
∂σ2 9
onde θ é o ângulo de incidência. Substituindo-se estas expressões na equação 2.6.26,
obtém-se a seguinte aproximação para o coeficiente de reflexão P-P, em função do ângulo
de incidência:
 
1 16 5 2 3
r∼= (γ + η) − 1 + (σ2 − σ1 ) − γ − η + sen 2 θ
2 9 6 3 2
ou    
1 ∆v ∆ρ 16 5 ∆v 2 ∆ρ
r∼
= + + ∆σ − − sen 2 θ (2.6.27)
2 v ρ 9 6 v 3 ρ
onde ∆ indica a variação, na interface, do parâmetro elástico respectivo. Assim, por
exemplo, ∆v = v2 − v1 .
A expressão 2.6.27 foi obtida com o valor da razão de Poisson da camada 1 igual a
1/4, o que limita sua aplicação. Existem na literatura aproximações de melhor qualidade
para as equações de Zoeppritz, todas elas de uma forma ou de outra similares à expressão
2.6.27. A mais bem-sucedida dessas aproximações, inspirada no trabalho pioneiro de
Bortfeld (1961), foi proposta por Richards e Frasier (1976) e se tornou mais conhecida
através do livro de Aki e Richards (1980). Ressalte-se que, como no caso da expressão
2.6.27, essas aproximações são válidas para ângulos de incidência relativamente pequenos,
em geral menores do que 40 graus, e para pequenas variações nas propriedades elásticas.
Fortuitamente, ambas as circunstâncias tendem a ser encontradas na prática.
A aproximação de Richards, Frasier e Aki leva, na maioria dos casos, a resultados mais
próximos do correto do que a equação 2.6.27. Uma das possı́veis formas de apresentação
da expressão obtida por eles é:
 
∼ 1 ∆ρ ∆ρ v̄S2 ∆vS v̄S2 1 ∆vP 1
r= − 2 2
+4 2
sen 2 θ̄ + (2.6.28)
2 ρ̄ ρ̄ v̄P v̄S v̄P 2 v̄P cos 2 θ̄

onde vS e vP são as velocidades de onda cisalhante, S, e compressional, P. A barra, sobre


cada uma das variáveis, significa que o valor correspondente é uma média dos valores
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 179

acima e abaixo da interface. Assim, por exemplo, ρ̄ = (ρ1 + ρ2 )/2. O mesmo se aplica às
velocidades P e S. No caso do ângulo θ̄, adota-se a seguinte igualdade:

θ̄ = sen −1 (pv̄P ) (2.6.29)

onde p é o parâmetro de raio, definido com base na expressão 2.1.46.


A expressão 2.6.28 pode ser modificada de diversas formas, sem alterar o resultado.
Uma dessas formas baseia-se no fato de que 1/ cos 2 = 1 + tan 2 (ver Swann, 1993), o que
permite transformá-la em
   
∼ 1 ∆vP ∆ρ ∆ρ v̄S2 ∆vS v̄S2 1 ∆vP
r= + − 2 2
+4 2
sen 2 θ̄ + tan 2 θ̄ (2.6.30)
2 v̄P ρ̄ ρ̄ v̄P v̄S v̄P 2 v̄P

Na mesma linha, considerando que tan 2 = sen 2 + sen 2 tan 2 , obtém-se:


   
∼ 1 ∆vP ∆ρ 1 ∆vP ∆ρ v̄S2 ∆vS v̄S2 1 ∆vP
r= + + −2 2
−4 2
sen 2 θ̄ + sen 2 θ̄ tan 2 θ̄
2 v̄P ρ̄ 2 v̄P ρ̄ v̄P v̄S v̄P 2 v̄P
(2.6.31)
Uma terceira forma, proposta por Fatti et al. (1994), baseia-se no isolamento das contri-
buições das velocidades P e S na equação 2.6.30 e é dada por
   
∼ 1 ∆vP ∆ρ 2
 v̄S2 ∆vS ∆ρ
r= + 1 + tan θ̄ − 4 2 + sen 2 θ̄
2 v̄P ρ̄ v̄P v̄S ρ̄  (2.6.32)
1 ∆ρ 2 v̄S2 2
− tan θ̄ − 4 2 sen θ̄
2 ρ̄ v̄P

A equação 2.6.31 é freqüentemente resumida, com base na redefinição de seus termos,


através da seguinte expressão:

r∼
= A + B sen 2 θ̄ + C sen 2 θ̄ tan 2 θ̄ (2.6.33)

onde  
1 ∆vP ∆ρ ∼
A= + = r(0), (2.6.34)
2 v̄P ρ̄
1 ∆vP
C= (2.6.35)
2 v̄P
e    
∆vS 1 + k ∆ρ
B =A−k + (2.6.36)
v̄S 2k ρ̄
ou, após alguma manipulação,
 
∆vP ∆vS
B = −kA + (1 − k)C + k − , (2.6.37)
v̄P v̄S

sendo k um parâmetro definido por

v̄S2
k=4 (2.6.38)
v̄P2
180 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Na linha do trabalho de Shuey (1985), a expressão 2.6.37 pode ser alterada de forma
a incluir o efeito da razão de Poisson, em vez da velocidade S. Para isto, considere-se a
seguinte aproximação:  
v̄S2 ∼ 12 − σ̄
=
v̄P2 1 − σ̄
Estimando-se diferenças nesta expressão, obtém-se:

v̄S v̄S2 ∼ 1 ∆σ
2∆vS − 2∆v P 3 = −
v̄P2 v̄P 2 (1 − σ̄)2

Rearranjando-se os termos e introduzindo-se o parâmetro k, estabelece-se a seguinte


relação entre a razão de Poisson e as velocidades P e S:
 
∆vP ∆vS ∆σ
k − = (2.6.39)
v̄P v̄S (1 − σ̄)2

Com base neste resultado, a expressão 2.6.37 pode ser reescrita da seguinte forma:
∆σ
B = −kA + (1 − k) C + (2.6.40)
(1 − σ̄)2

À semelhança da equação 2.6.31, a expressão 2.6.32 também merece ser condensada.


O resultado é:
r∼= A(1 + tan 2 θ̄) + D sen 2 θ̄ − E sen 2 θ̄ tan 2 θ̄ (2.6.41)
onde A já foi definido. Por sua vez, E e D são dados por
1 ∆ρ
E= (2.6.42)
2 ρ̄
e    
∆vS 1 + k ∆ρ
D = −k + (2.6.43)
v̄S 2k ρ̄
ou  
∆vP ∆vS
D = −2kA + (k − 1)E + k − (2.6.44)
v̄P v̄S
ou, ainda,
∆σ
D = −2kA + (k − 1)E + (2.6.45)
(1 − σ̄)2
Para facilitar a análise da relação entre os parâmetros B e D, preparou-se a Tabela 2.1.
Com base nela, o leitor poderá observar que B = D + A. Poderá também observar que
o parâmetro D é proporcional ao que se poderia denominar uma “refletividade S”, tendo
em vista que, normalmente, o fator (1 + k)/2k oscila em torno de 1.
Por causa de sua simplicidade, as diferentes versões da equação de Frasier, Richards
e Aki são muito úteis, em particular na análise da influência dos fluidos sobre o com-
portamento dos coeficientes de reflexão (ver o item 4.3). Juntamente com as curvas de
derivadas parciais, estas expressões permitem as seguintes constatações, algumas delas
discutidas por Koefoed em 1955:
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 181

B D
       
∆vS 1 + k ∆ρ ∆vS 1 + k ∆ρ
A−k + −k +
v̄S 2k ρ̄ v̄S 2k ρ̄
     
∆vP ∆vS k − 1 ∆ρ ∆vP ∆vS
−kA + (1 − k)C + k − −2kA + +k −
v̄P v̄S 2 ρ̄ v̄P v̄S
 
∆σ k − 1 ∆ρ ∆σ
−kA + (1 − k) C + −2kA + +
(1 − σ̄)2 2 ρ̄ (1 − σ̄)2

Tabela 2.1: Três diferentes versões dos parâmetros B e D.

1. Mesmo que não haja mudança de impedância acústica em uma interface (γη = 1),
é possı́vel a existência de uma reflexão. Para isto, basta que σ1 6= σ2 , ou que, para
γ 6= 1, γ = 1/η. Em ambos os casos, o coeficiente de reflexão seria igual a zero,
na incidência vertical, e cresceria em valor absoluto, com o aumento no ângulo de
incidência.

2. Se a razão de Poisson do meio 2 for muito inferior à do meio 1, o coeficiente de


reflexão da interface tende a decrescer com o aumento do ângulo de incidência.
O caso de uma areia saturada de gás, cuja razão de Poisson está em torno de
0.10 a 0.25, pode ser incluı́do nesta situação, já que os sedimentos sobrepostos são
freqüentemente folhelhos, com razão de Poisson tipicamente maior do que 0.3 (ver
o Capı́tulo 4). Ressalte-se que, para os ângulos de incidência mais comuns nos
registros sı́smicos (entre 0 e 30 graus), este fenômeno torna-se particularmente mais
importante quando, para γη < 1, observa-se que γη → 1. Nestas circunstâncias, o
valor absoluto de r pode crescer de forma expressiva, com o aumento no ângulo de
incidência.

3. Para interfaces tı́picas, sem anomalias de razão de Poisson, o valor absoluto do


coeficiente de reflexão tende a decrescer até uma certa faixa de ângulos de incidência
(dependente do valor de γη), quando então cresce mais rapidamente até o ângulo
crı́tico, no caso em que γ > 1, ou até 90 graus, no caso em que γ < 1, para o qual
não ocorre ângulo crı́tico.

4. A influência da razão entre as densidades, η, diminui com o aumento no ângulo de


incidência. O mesmo ocorre com γ, embora neste caso ocorra inversão da tendência
para ângulos mais acentuados.

5. A variação do coeficiente de reflexão com o ângulo de incidência é relativamente


lenta, nos ângulos de incidência menores. Isto se deve à seguinte propriedade, que
pode ser deduzida a partir da equação 2.6.31:

∂r(0)
=0
∂θ
ou seja, a declividade da curva de r(θ) é zero, para θ = 0. Esta propriedade favorece
182 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

a aplicabilidade da técnica CDP, já que, nas condições operacionais mais usuais, os
ângulos de incidência são relativamente pequenos.
Uma seqüência de raciocı́nio semelhante à seguida acima pode levar também a uma
aproximação para o coeficiente de transmissão P-P, em função do ângulo de incidência.
Na forma obtida por por Aki e Richards, tem-se a seguinte expressão:
 
∼ 1 ∆vP ∆ρ 1 ∆v
T =1− + + tan 2 θ̄ (2.6.46)
2 v̄P ρ̄ 2 v̄

ou, com base nas expressões 2.6.34 e 2.6.35,


T ∼
= 1 − A + C tan 2 θ̄ (2.6.47)
Observe-se que o coeficiente de transmissão não depende da razão de Poisson para
pequenos ângulos de incidência e pequena variação nas propriedades elásticas, condições
em que a aproximação é válida. Nas mesmas circunstâncias, a razão ∆ρ/ρ̄ não afeta a
forma da curva de T , atuando apenas como uma constante.

2.6.4 O coeficiente de transmissão e as amplitudes


Considerando a complexidade natural dos meios geológicos, as perdas de amplitude de-
vidas à transmissão do sinal, através das interfaces, devem ser analisadas de acordo com
dois enfoques. No primeiro deles, discutido em seguida, o fenômeno se restringe às ca-
madas espessas, que podem ser individualizadas em dados sı́smicos e portanto permitem,
pelo menos em princı́pio, um tratamento determinı́stico. No segundo enfoque, discutido
no item 2.8, juntamente com o conceito de filtro estratigráfico, o fenômeno envolve as
camadas muito finas, as quais podem não ser detectadas até mesmo em perfis de poços
e, por isso, exigem uma abordagem estatı́stica.
A equação 2.6.46 descreve o fator de perda de amplitude causada pelo coeficiente de
transmissão em uma única interface. Mesmo em um meio em que as propriedades elásticas
não variam lateralmente, uma descrição mais completa do fenômeno exige a análise de um
modelo multiacamadado. Considerando a presença de afastamento lateral entre a fonte
e o receptor e propagação nos dois sentidos, ou seja, descendente e ascendente, este tipo
de meio permite adaptar a equação 2.6.47 de forma a se obter a seguinte aproximação
para o coeficiente de transmissão:
N h
Y 2 i
TN (θ̄) ∼
= 2
1 − Ak − Ck tan θ̄k (2.6.48)
k=1

onde N é o número de interfaces, k é o ı́ndice da interface, A e C são definidos pelas


equações 2.6.34 e 2.6.35 e θ̄ é o ângulo médio que o raio faz com a direção vertical na
mesma posição, tanto no sentido descendente quanto no ascendente.
Estimando-se o logaritmo neperiano da equação 2.6.48 e submetendo o resultado ao
exponencial na base e, obtém-se a seguinte expressão:
( N )
X h 2 i
TN (θ̄) ∼
= exp 2
ln 1 − Ak − Ck tan θ̄k (2.6.49)
k=1
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 183

Levando-se em conta que, para pequenos valores de x, ln(1 − x) ∼ = −x, este resultado
pode ser alterado para a seguinte forma:
" N #
X  2
TN (θ̄) ∼
= exp − Ak − Ck tan 2 θ̄k (2.6.50)
k=1

No caso em que o ângulo de incidência é igual a zero, ou seja, θ = 0, a expressão 2.6.48


pode ser substituı́da pela forma exata da equação que define o coeficiente de transmissão
em um meio acamadado, a qual é dada por

N
Y 
TN = 1 − rk2 (2.6.51)
k=1

onde r é o valor exato do coeficiente de reflexão. Usando os mesmos artifı́cios que per-
mitiram a obtenção da equação 2.6.50, pode-se obter a seguinte função exponencial:
" N #
X 
TN = exp ln 1 − rk2 (2.6.52)
k=1

A expansão em séries do termo que envolve o logaritmo neperiano permite substituir este
resultado por
" N  #
X 1 1
TN = exp −rk2 + rk4 − rk6 + · · · (2.6.53)
2 3
k=1

ou, na forma aproximada, por


N
!
X
TN ∼
= exp − rk2 (2.6.54)
k=1

Viu-se anteriormente que a descrição correta para a perda por transmissão é relativa-
mente complexa, exigindo a aplicação recursiva da expressão 2.6.22, a qual não admite
uma descrição compacta como a da 2.6.48. Entretanto, nas condições em que a equação
2.6.48 é aplicável, ou seja, quando a mudança das propriedades elásticas através das diver-
sas interfaces não é muito acentuada, a influência do coeficiente de transmissão torna-se
relativamente pequena.
Como exemplo de perda por transmissão na direção vertical, pode-se usar o poço
1-RJS-316, perfurado na Bacia de Campos: no intervalo entre 1186m e 3504m, a perda
total, ida-e-volta, estimada com base nos perfis sônico e de densidade, foi de 8.9dB.
Obviamente, a perda nas camadas finas, não amostradas pelos perfis, não está incluı́da.

2.6.5 Impedância e refletividade


Até agora, a relação entre os coeficientes de reflexão e as propriedades elásticas do meio
foi analisada de forma puramente causal e determinı́stica, ainda que levando em conta
algumas aproximações. Este enfoque, embora básico para a compreensão das técnicas
184 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

de inversão discutidas no Capı́tulo 3, não é suficiente para um bom entendimento da


deconvolução Wiener-Hopf-Levinson, apresentada nos itens 1.4 e 3.2. Exige-se ainda uma
análise do comportamento espectral da série de coeficientes de reflexão, o qual obviamente
depende do comportamento espectral das impedâncias, acústicas e elásticas.
Na teoria da elasticidade, define-se impedância como a razão entre o esforço, ou
pressão, e a velocidade de partı́culas (Aki e Richards, 1980). No caso acústico e camadas
horizontais, de acordo com as equações 2.6.12 e 2.6.14, a impedância é dada pela razão
ρv/ cos θ, onde v é a velocidade P, ρ é a densidade e θ é o ângulo entre o raio e a direção
vertical. No caso elástico, a impedância é relativamente mais complexa e, como se verá
no Capı́tulo 3, não pode ser explı́cita e exatamente associada às propriedades elásticas
do meio. Apesar dessas diferenças, as duas impedâncias podem, como uma aproximação
de primeira ordem, ser analisadas com base na impedância acústica.
Considere-se um meio de camadas horizontais empilhadas, cada uma delas caracteri-
zada por um único par de velocidade P e densidade. A análise de um modelo como este é
favorecida pela transformação dos coeficientes de reflexão, descritos em função de tempo
e distância, para o domı́nio τ -p, no qual τ e p se relacionam através da seguinte equação
(ver o Apêndice A.1):
τ = t − px (2.6.55)
onde p = dt/dx, t é o tempo duplo de reflexão e τ é o tempo de interseção, ou seja, a
projeção da reta de declividade p na posição x = 0.
Uma caracterı́stica importante do domı́nio τ -p, aplicado ao modelo em questão, é o
fato de que o trajeto de um raio pode ser descrito em função de um único valor de p. Esta
caracterı́stica torna possı́vel simular uma série de coeficientes de reflexão, r τ (p), cada um
deles definido pela expressão 2.6.12. À mesma série, se associa outra: a das impedâncias
acústicas, Iτ (p), cada uma delas definida pelo fator vρ/ cos θ, onde θ é o ângulo que o
raio faz com a direção vertical (e que apresenta seno dado por pv).
A relação entre os espectros de freqüências das duas séries pode ser mais facilmente
estabelecida no sentido inverso, ou seja, a partir da construção da série de impedâncias
acústicas a partir da função refletividade. Para isto, o primeiro passo consiste em se
determinar a impedância acústica da segunda camada, a partir do coeficiente de reflexão
associado a seu topo, através de uma inversão da equação 2.6.12, aplicada a um parâmetro
de raio especı́fico:
1 + r1
I2 = I 1 (2.6.56)
1 − r1
Extrapolando-se a expressão obtida para o caso de várias interfaces, obtém-se:
τY
−1
1 + rn
Iτ = I 1 (2.6.57)
n=1
1 − rn
onde a impedância acústica Iτ é função do parâmetro de raio p e o tempo τ é tratado
como um ı́ndice.
A expressão 2.6.57 pode ser adaptada, de forma a substituir, na recursão, o produtório
por um somatório, o que pode ser feito através do uso do logaritmo neperiano, aplicado
aos dois lados da equação:
τ −1  
X 1 + rn
ln Iτ = ln I1 + ln (2.6.58)
n=1
1 − rn
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 185

O logaritmo neperiano dentro do somatório pode ser expandido por séries, resultando em
1 + rn 2 2
ln = 2rn + rn3 + rn5 + · · · (2.6.59)
1 − rn 3 5
Nos casos em que a série de coeficientes de reflexão apresenta valores reduzidos em
módulo23 , ou seja, menores do que 0.2 ou 0.3, a expressão 2.6.59 pode ser simplificada,
desprezando-se os termos com expoente maior do que 1. Substituindo-se o resultado na
expressão 2.6.58 e aplicando-se o exponencial na base neperiana, obtém-se:
τ −1
!
X
Iτ ∼
= I1 exp 2 rn (2.6.60)
n=1

A simples inspeção das equações 2.6.57 e 2.6.60 não permite induzir como o espectro de
freqüências da função refletividade se relaciona com o da série das impedâncias acústicas.
Isto se torna possı́vel através de uma aproximação adicional da equação 2.6.60, dada por
τ −1
!
X
Iτ ∼
= I1 1 + 2 rn (2.6.61)
n=1

Invertendo-se este resultado, pode-se transformar a equação 2.6.12 na seguinte con-


volução:
rτ ∼
= lτ ∗ a τ (2.6.62)
onde aτ é o operador de dois pontos dado por (1, −1), ou, em termos de transformada Z,
por
A(Z) = 1 − Z (2.6.63)
Por sua vez, lτ é uma versão normalizada da série de impedâncias acústicas, dada por
 
1 Iτ
lτ ≡ −1 (2.6.64)
2 I1
ou seja, de acordo com a equação 2.6.61,
τ −1
X
lτ ∼
= rn (2.6.65)
n=1

Pode-se dizer, portanto, que, para uma série de coeficientes de reflexão caracterizada
por uma baixa média de valores absolutos, os espectros de freqüências de rτ e de lτ se
relacionam de forma proporcional ao espectro de aτ . Ou seja, no domı́nio da freqüência,
tem-se:
R(f ) ∼
= A(f )L(f ) (2.6.66)
onde h  π i
A(f ) = |2 sen (πf ∆τ )| exp i πf ∆τ − (2.6.67)
2
23
Com efeito, uma análise dos dados de alguns poços na plataforma continental brasileira permitiu
concluir que a média RMS dos coeficientes de reflexão, no caso em que a incidência é vertical, tende a
ser realmente baixa, em torno de 0.03, enquanto a sua média aritmética se aproxima de zero (Rosa e
Ulrych, 1991).
186 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

ou     
ω∆τ ω∆τ π
A(ω) = 2 sen exp i − (2.6.68)
2 2 2
É possı́vel perceber que, no limite em que o intervalo de amostragem tende a zero,
a razão aτ /∆τ se transforma em um operador de derivada com relação ao tempo. Ob-
servação similar já foi feita na literatura geofı́sica em diversas oportunidades (ver, por
exemplo, Walden e Hosken, 1985). Por outro lado, comparando-se a equação 2.6.67 com
as expressões 2.9.15 e 2.9.16 (item 2.9), percebe-se que aτ equivale ao operador de um
fantasma com atraso igual a uma amostra. O espectro de amplitude correspondente não
apresenta um notch 24 , já que a amplitude sobe sempre, até a freqüência de Nyquist, onde
atinge o valor máximo, dado por
π
2 sen (πfN ∆τ ) = 2 sen =2
2
Com base nesses resultados, uma análise da expressão 2.6.66 permite concluir que, se
o espectro de amplitude de lτ fosse plano, o espectro de rτ teria a forma geral do espectro
de aτ , a menos das oscilações que ocorrem em pequenos intervalos de freqüência. Por
outro lado, se a série de coeficientes de reflexão tivesse espectro de luz branca, o espectro
das impedâncias acústicas teria a forma geral do inverso do espectro dado pela equação
2.6.67, também a menos das oscilações que ocorrem em pequenos intervalos de freqüência.
Esta é a premissa normalmente adotada na deconvolução de fase mı́nima, discutida no
item 3.2.
Esta linha de raciocı́nio leva às seguintes perguntas: (1) a série de coeficientes de
reflexão tem realmente espectro de luz branca? (2) qual é o efeito do aumento no valor
do parâmetro de raio, p? (3) o que ocorre no caso elástico? Para que se obtenham
respostas aceitáveis para estas perguntas, é essencial a utilização de algum tipo de modelo
descritivo para a cor da função refletividade, como o de Rosa e Ulrych (1991). Este
modelo, elaborado com base em dados de poços da plataforma brasileira, fundamenta-se
na seguinte forma da chamada decomposição de Wold25 :

rτ ∼
= cτ ∗ f τ (2.6.69)

onde cτ é uma série aleatória, ou branca. Por sua vez, fτ é um filtro de cor, cuja
transformada de Fourier é:
F (f ) = [A(f )]α (2.6.70)
onde α é uma constante e A(f ) é dado pela equação 2.6.67. Em termos de transformada
Z, fτ corresponde a
1 1
F (Z) = 1 − αZ + α(α − 1)Z 2 − α(α − 1)(α − 2)Z 3 + · · · (2.6.71)
2! 3!
Com base na equação 2.6.69 e no espectro de aτ , dado pela equação 2.6.67, o valor de
α pode ser usado como um indicador da cor de rτ , de acordo com três casos: (1) se α > 0,
24
Define-se notch como uma cavidade no espectro de amplitude.
25
De acordo esta decomposição, um sinal qualquer pode ser descrito através da convolução entre uma
série aleatória e uma forma de onda de pequeno comprimento — um pulso (Robinson, 1967b; Kanasewich,
1975).
2.6. PARTIÇÃO DE ENERGIA NAS INTERFACES 187

Figura 2.52: Espectros de amplitude da função refletividade de um poço da Bacia


de Campos e do filtro de cor correspondente (α = 0.53), no caso da incidência
vertical, ou seja, p = 0.

a cor de rτ é azul, ou pseudo-azul, o que caracteriza um espectro com predominância de


altas freqüências; (2) se α = 0, o espectro de rτ é branco e; (3) se α < 0, rτ tem cor
vermelha, ou pseudo-vermelha, caracterizando um espectro com predominância de baixas
freqüências.
Nos poços analisados no trabalho de Rosa e Ulrych, o qual se restringiu ao caso
da incidência vertical (p = 0), encontraram-se valores de α entre 0.25 e 0.6, indicando
que, nas condições analisadas, a série de coeficientes de reflexão é azul, ou pseudo-azul,
como no exemplo da Figura 2.52, para o qual α = 0.53. A fase correspondente tende
a ser maior do que −500 , se aproximando de zero com o aumento da freqüência. Estes
resultados estão perfeitamente de acordo com os de trabalhos anteriores, como os de
Walden e Hosken (1985) e de Sá (1985), que também reportam funções refletividade com
predominância de altas freqüências.
Para avaliar a influência isolada do parâmetro de raio, supõe-se, inicialmente, que a
velocidade não varia e que o coeficiente de reflexão não depende do ângulo de incidência.
Estas premissas, aliadas à equação 2.1.50, permitem escrever: eτ = e0 cos θ, onde e0 é
o tempo vertical entre reflexões sucessivas em um traço sı́smico de afastamento fonte-
receptor igual a zero (ou p = 0) e eτ é o tempo entre as mesmas reflexões no parâmetro
de raio correspondente ao ângulo θ. Nestas condições, pode-se concluir, com base no
188 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

teorema da escala (item 1.2), que

Rτ (f ) = cos θ R (f cos θ) (2.6.72)

onde R é a transformada de Fourier da função refletividade no caso da incidência vertical


e Rτ corresponde à mesma transformada no caso em que o ângulo de propagação é igual
a θ.
Na equação 2.6.72, o fator cos θ exerce o papel de deslocar cada componente de
freqüência de R(f ) para uma freqüência mais alta de Rτ (f ), ao mesmo tempo em que
reduz sua amplitude. Nestas condições, considerando as caracterı́sticas da função F (f ),
pode-se esperar que, se a velocidade não variar com a profundidade e o coeficiente de
reflexão não variar com o ângulo de incidência, a cor da função refletividade tende a se
tornar mais azul com o aumento isolado no parâmetro de raio. Afirmação equivalente
se aplica com igual propriedade no caso em que a função refletividade é amostrada em
função do afastamento entre a fonte e os receptores. As conseqüências práticas desse
tema, particularmente no que diz respeito à correção de NMO, serão melhor exploradas
no item 3.1.

2.7 Extrapolação de Campos de Ondas


A equação da onda e sua solução propiciam os fundamentos para o desenvolvimento
de conceitos especı́ficos, inúmeros dos quais participam da rotina de um geofı́sico de
exploração. Além disso, as pesquisas vêm se desenvolvendo de forma a envolver a equação
da onda em todo o fluxo do processamento sı́smico, e não somente em algumas etapas, o
que deve propiciar maior fidelidade dos algoritmos aos fenômenos da natureza. O exemplo
mais importante dessa idéia, que abriu caminho para outros processos, é a migração dos
dados sı́smicos a qual, no passado, era puramente geométrica e que, a partir da década
de 1970, passou a ser fundamentada na equação da onda, em grande parte em função do
trabalho pioneiro de Claerbout (1970).
Na modelagem e na migração de dados sı́smicos, assim como em outras técnicas
baseadas na equação da onda, um conceito é fundamental: o da extrapolação de campos
de onda. Este é o processo que, na forma inversa, permite estimar como seriam os dados
sı́smicos obtidos em diferentes profundidades de registro, a partir de medidas feitas na
superfı́cie. É também o processo que, no sentido oposto, permite sintetizar uma seção
sı́smica, hipoteticamente registrada na superfı́cie, a partir de um dado modelo geológico.
Neste item, discute-se a extrapolação direta e sua aplicação à modelagem sı́smica.

2.7.1 O algoritmo de deslocamento de fase


Dentre os diversos algoritmos usados na extrapolação de campos de onda, talvez o mais
simples seja aquele conhecido pela denominação “deslocamento de fase” (phase shift),
apresentado em seguida. Considere-se, inicialmente, o caso 1-D. A solução da equação
da onda correspondente, para uma freqüência arbitrária ω0 , é:

p(z, t) = exp [i (Kz z − ω0 t)] (2.7.1)


2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 189

onde Kz é função de ω0 . Se esta é uma solução da equação da onda, a seguinte expressão


é também uma solução:
N −1
1 X
p(z, t) = exp [i(Kz z − ωn t)] (2.7.2)
N n=0

onde Kz é função de ωn . Observe-se que a solução proposta corresponde à transformada


inversa de Fourier da seguinte expressão:
N
X −1
P (z, ω) = δω−ωn exp(iKz z) (2.7.3)
n=0

Aplicando-se a propriedade de enquadramento da função δ (ver o item 1.2), obtém-se:

P (z, ω) = exp(iKz z) (2.7.4)

onde Kz é, agora, função de ω.


Na equação 2.7.4, dois pontos merecem destaque: (1) o sinal, gerado na superfı́cie
(z = 0), tem espectro de amplitude plano e fase constante e igual a zero; (2) o sinal
obtido na profundidade z também tem espectro de amplitude plano, mas o espectro de
fase correspondente é dado por Kz z. Ou seja, a equação 2.7.4 corresponde a um simples
deslocamento de fase do sinal, no domı́nio da freqüência espacial Kz .
De um ponto de vista mais abrangente, a equação 2.7.4 pode ser considerada um
algoritmo de extrapolação de campos de onda. Suponha-se, por exemplo, que se deseja
propagar o sinal, registrado em uma profundidade z, para uma profundidade z −∆z. Para
isto, basta aplicar, à transformada de Fourier do sinal registrado, o termo de deslocamento
de fase associado à diferença de profundidade. Ou seja,

P (z − ∆z, ω) = P (z, ω) exp(−iKz ∆z) (2.7.5)

Observe-se que, no caso 1-D, a extrapolação de campos de onda corresponde a um simples


deslocamento de tempo, já que, neste caso, Kz = ∓ω/v.
A dedução da equação 2.7.5 pode ser facilmente estendida para os casos 2-D ou 3-D,
o que equivale, no primeiro deles, a estimar a equação 2.4.20 no domı́nio ω-Kx. Neste
domı́nio, como se viu no item 1.2 e na Figura 1.9 (página 28), uma operação sobre um
ponto isolado afeta todo um conjunto de eventos com o mesmo mergulho, no domı́nio
t-x. Por outro lado, sabe-se que a freqüência espacial Kz pode ser estimada a partir das
freqüências ω e Kx , através da expressão 2.4.22. Portanto, pode-se supor que, a partir de
medidas efetuadas nos eixos x e t, é possı́vel explicitar o deslocamento da onda ao longo
do eixo z, no domı́nio ω-Kx, de maneira relativamente mais simples do que no domı́nio
t-x. A solução correspondente é:

P̃ (Kx , z − ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp(−iKz ∆z) (2.7.6)

onde P̃ (Kx , z, ω) corresponde à transformada de Fourier dos dados registrados na pro-


fundidade z. Com base na equação 2.4.22, pode-se alterar este resultado para:
 ω 
P̃ (Kx , z − ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp i ∆z cos θ (2.7.7)
v
190 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Observe-se que a escolha do sinal de Kz , na equação 2.4.22, implica a opção por ondas
somente ascendentes (sinal negativo) ou somente descendentes (sinal positivo). Isto sig-
nifica que a equação 2.7.6 não permite a geração e a adequada extrapolação de eventos
múltiplos.
A expressão 2.7.6 descreve o algoritmo de extrapolação por deslocamento de fase
(Gazdag, 1978) e corresponde também à transformada de Fourier do algoritmo de extra-
polação Kirchhoff (ver Schneider, 1978). A relação entre os dois algoritmos e a geome-
tria das difrações pode ficar mais clara quanto se comparam as equações 2.7.7 e 2.2.33.
Percebe-se que a última expressão, deduzida no subitem 2.2.5 com base na geometria de
uma hipérbole, é idêntica à primeira. Esta constatação permite concluir que, no domı́nio
tempo-distância, o operador exp (−iKz ∆z) apresenta forma hiperbólica. No caso de um
meio homogêneo e isotrópico, esta é também a geometria do operador de extrapolação
Kirchhoff, discutido adiante.
Por causa de sua precisão na aplicação a meios lateralmente homogêneos, o algoritmo
de deslocamento de fase é muito usado na modelagem sı́smica, na forma denominada de-
migração, como uma ferramenta de suporte a testes de outros algoritmos de extrapolação
de campos de ondas. Nas aplicações bidimensionais, no contexto do refletor explosivo, o
processo é conduzido no domı́nio ω-Kx, através da seguinte seqüência de operações:
1. Calculam-se os coeficientes de reflexão em todas as amostras do modelo geológico,
em função de distância e profundidade, obtendo-se a matriz r(x, z).
2. Como a propagação é feita de baixo para cima, seleciona-se a máxima profundidade,
para iniciar o processo. Adicionalmente, assume-se que a transformada do campo
de pressões, na profundidade z = zmax , é inicialmente igual a zero, ou seja,
P̃ (Kx , z = zmax , ω) = 0

3. Transformam-se os coeficientes de reflexão situados exatamente na profundidade z


para o domı́nio Kx , o que equivale à aplicação da correspondência definida por
r(x, z) ⇔ R̃(Kx , z)

4. Pode-se agora atualizar o campo de pressões P̃ (Kx ,z,ω), adicionando-se ao mesmo,


para todas as freqüências ω, o valor obtido na etapa anterior, através da operação
caracterizada por
P̃ (Kx , z, ω) + R̃(Kx , z) ⇒ P̃ (Kx , z, ω)
Como R̃(Kx , z) não depende de ω, esta operação equivale, no domı́nio tempo-
distância, a somar, no tempo t = 0 do campo de pressões, p(x, z, t), estimado
na profundidade z, os coeficientes de reflexão calculados exatamente na mesma
profundidade.
5. Para se extrapolar o campo de ondas para a profundidade z − ∆z, aplica-se a
equação 2.7.6, calculando-se Kz com a equação 2.4.22. Ressalte-se que, para o mo-
delo do refletor explosivo ser aplicável, Kz deve ser negativo. Da mesma forma,
a velocidade v deve ser metade da velocidade intervalar correta. Adicionalmente,
como as operações descritas são conduzidas no domı́nio freqüência-distância, a ve-
locidade não pode variar lateralmente. Na direção vertical, entretanto, a velocidade
pode variar a cada novo valor de profundidade.
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 191

Figura 2.53: A representação do ângulo da reta tangente à frente


de onda e da região de ondas evanescentes no plano ω -K x .

6. Atualiza-se o valor corrente da profundidade z, substituindo-a por z − ∆z.

7. Repetem-se as etapas 3 a 6, até que o menor valor de z, ou seja, z = 0, seja atingido,


quando então se obtém P̃ (Kx ,z = 0,ω). A transformada inversa de Fourier do
resultado corresponde ao campo de pressões no domı́nio tempo-distância, ou seja,
p(x, z = 0, t).

8. Para se obter a forma final do modelo sı́smico desejado, convolve-se cada traço da
seção obtida com um pulso sı́smico qualquer (por exemplo, um filtro passa-banda).

É interessante observar que o valor de Kz , dado pela equação 2.4.22, pode ser com-
plexo, desde que vKx /ω > 1. Esta eventualidade significa, com base na equação 2.1.48,
que dt/dx > 1/v, ou seja, trata-se de energia que viaja com velocidade inferior à veloci-
dade de corpo do meio. Os eventos correspondentes, denominados ondas evanescentes,
são atenuados de forma exponencial, durante a propagação, já que, na equação 2.7.6, o
expoente complexo torna-se real e negativo. Na Figura 2.53, pode-se ver a relação entre
a região de ondas evanescentes e o ângulo correspondente à tangente à frente de onda.
Observe-se que a mesma região corresponde a ângulos de propagação maiores do que 90
graus.
A aplicação da equação 2.7.6 à extrapolação de campos de ondas apresenta uma grande
vantagem e um grande defeito, ambos expressos em uma única caracterı́stica: a de não
permitir a geração e a adequada propagação de eventos múltiplos. Ao mesmo tempo em
que esta propriedade é uma desvantagem, ela permite, por outro lado, extrapolar campos
de onda sem criar múltiplas indesejadas. Uma limitação importante da técnica é sua
incapacidade de tratar meios com velocidade lateralmente variável.

2.7.2 A equação DSR


Suponha-se um meio em que a velocidade não varia lateralmente e que um evento iso-
lado tenha sido registrado, em uma profundidade z, através de uma série de registros
192 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

bidimensionais de fonte comum, ou CS (Common Shot). Para representar, no domı́nio


da freqüência, o mesmo conjunto de dados, faz-se uso do conceito de “pirâmide de Que-
ops”, de acordo com a qual os dados sı́smicos constituem um volume cujas dimensões
são representadas pelo eixo da coordenada horizontal da fonte, pelo eixo da coordenada
horizontal do receptor e pelo eixo do tempo de reflexão (ver a Figura 2.26, na página
117). Tem-se, assim, a seguinte equivalência:

p(xs , xg , z, t) ⇔ P̃ (Kxs , Kxg , z, ω)

onde xs e xg são as coordenadas das fontes e dos receptores, Kxs e Kxg são os correspon-
dentes números de onda e z é a profundidade de registro. Por sua vez, p e P̃ representam
os dados sı́smicos registrados e sua transformada de Fourier.
Suponha-se agora que se deseja estimar como seria o registro do mesmo evento em uma
profundidade hipotética, z − ∆z. Para se obter a expressão que possibilita esta operação,
segue-se uma seqüência de raciocı́nio similar à adotada na dedução da equação 2.2.33. Ou
seja, a extrapolação do evento obtido é baseada na aplicação, no domı́nio da freqüência,
das operações equivalentes aos deslocamentos de distância e tempo envolvendo as fontes
(∆Xs e ∆Ts ) e os receptores (∆Xg e ∆Tg ). Com base nas propriedades da transformada
de Fourier (ver o item 1.2), sabe-se que estas operações podem ser descritas através da
seguinte igualdade:

P̃ (Kxs , Kxg , z − ∆z, ω) = P̃ (Kxs , Kxg , z, ω) [exp (−iKxs ∆Xs ) exp (iω∆Ts ) 
(2.7.8)
exp −iKxg ∆Xg exp (iω∆Tg )

Levando em conta que, na forma geral, vKx /ω = sen θ, ∆T = ∆z/v cos θ e ∆X =


∆z tan θ, a mesma lógica usada na demonstração da equação 2.2.33 permite reescrever a
expressão 2.7.8 da seguinte forma:

P̃ (Kxs , Kxg , z − ∆z, ω) = P̃ (Kxs , Kxg , z, ω) exp (−iKzs ∆z) exp −iKzg ∆z (2.7.9)

onde, para uma onda ascendente,


r
ω2 cos θs ∂ts
Kz s = − 2
− Kx2s = −ω =ω (2.7.10)
v v ∂z
e r
ω2 cos θg ∂tg
Kz g = − 2
− Kx2g = −ω =ω (2.7.11)
v v ∂z
Nestas igualdades, θs e θg representam os ângulos que o raio faz com a direção vertical
na posição da fonte e do receptor, enquanto ts e tg são equivalentes a Ts e Tg .
Por causa das expressões que definem os números de onda Kzs e Kzg , as quais en-
volvem raı́zes quadradas, a equação 2.7.9 recebeu, na literatura especializada, a deno-
minação DSR (do inglês Double Square Root). Na linha seguida por Claerbout (1985),
a mesma equação pode ser deduzida de uma forma muito interessante, que justifica sua
apresentação. Considere-se inicialmente a seguinte operação, baseada na equação 2.4.20:
 
∂pz ∂pz ∂t ∂pz ∂ts ∂tg
=− =− + (2.7.12)
∂z ∂t ∂z ∂t ∂z ∂z
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 193

onde pz representa os dados sı́smicos registrados na profundidade z. Aplicando-se o


teorema da derivada da transformada de Fourier e levando em conta as equações 2.7.10
e 2.7.11, a versão discreta desta operação pode ser reescrita, no domı́nio da freqüência,
da seguinte forma:
 
∆P̃z Kz s Kz g
= iω P̃z +
∆z ω ω
ou, levando em conta que ∆P̃z /P̃z = ∆ ln P̃z ,
 
Kz s Kz g
ln P̃z − ln P̃z−∆z = iω∆z +
ω ω

Aplicando-se a este resultado o exponencial neperiano, pode-se obter a forma que permite
a propagação do sinal entre as profundidades z e z−∆z. No caso de uma onda ascendente,
o resultado, equivalente à equação 2.7.9, é:

P̃z−∆z = P̃z exp (−iKzs ∆z) exp −iKzg ∆z (2.7.13)

Observe-se que, para garantir a propagação causal de uma onda ascendente, é necessária
a opção pelo sinal negativo para Kzs e Kzg .
A equação 2.7.13, ou 2.7.9, não é uma boa opção para a modelagem sı́smica, por
que, entre outras razões, não permite a variação lateral de velocidades. Entretanto,
pode ser usada com finalidades didáticas, particularmente nos casos da demigração e
da extrapolação de campos de onda entre nı́veis horizontais. Para isto, segue-se uma
série de procedimentos similares aos descritos no subitem 2.7.1, bastando levar em conta
o acréscimo de uma dimensão. Na versão tridimensional, ter-se-ia, na verdade, duas
dimensões a mais, uma vez que cada agrupamento de fonte comum, ou de receptor comum,
seria representado por um volume em que as coordenadas horizontais seriam pares (x g , yg ),
ou (xs , ys ). Ressalte-se, entretanto, que levantamentos sı́smicos com estas caracterı́sticas
são relativamente raros.

2.7.3 As diferenças finitas


De acordo com a equação da onda, a propagação de um sinal sı́smico poderia ser descrita
com base nas derivadas do mesmo sinal com relação ao tempo e às coordenadas espa-
ciais. Isto significa que, em tese, um campo de ondas, em uma dada posição, pode ser
estimado através do conhecimento do mesmo campo e de suas derivadas em uma posição
vizinha. Insinua-se nesta frase a idéia de uma integração, ou de uma expansão Taylor,
ambas passı́veis de serem implementadas através da técnica de diferenças finitas, a qual
é fundamentada na substituição das derivadas por aproximações numéricas.
Nas aplicações da técnica das diferenças finitas à propagação de ondas, dois enfoques
alternativos são normalmente empregados. O primeiro envolve a discretização da própria
equação da onda. O segundo fundamenta-se na derivada da solução da equação da onda
com relação à variável ao longo de cujo eixo é feita a extrapolação. Para ilustrar a
aplicação do segundo enfoque, tome-se, como exemplo, a solução da equação da onda
1-D, na forma da equação 2.7.4. Suponha-se agora que se deseja propagar o campo de
194 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

ondas ao longo do eixo das profundidades, z. Para isto, faz-se uso da derivada da mesma
equação com relação à profundidade, a qual é dada por
∂P
= iKz P
∂z
onde P = P (Kx , z, ω). A derivada com relação a z pode ser substituı́da por uma razão
entre diferenças, correspondente a uma aproximação de primeira ordem da derivada. O
resultado é:
Pz − Pz−∆z ∼
= iKz Pz
∆z
onde P representa, no caso 1-D, a transformada de Fourier de um traço sı́smico obtido
na profundidade indicada pelo subscrito. Ou seja, a derivada é estimada a partir da
diferença entre amostras dos traços obtidos em duas profundidades sucessivas, para cada
freqüência. Rearranjando-se os termos, obtém-se:

Pz−∆z ∼
= (1 − iKz ∆z)Pz (2.7.14)

Para reforçar o fato de que a equação 2.7.14 permite a extrapolação de um campo de


ondas entre duas profundidades vizinhas, basta verificar que ela corresponde a uma boa
aproximação da equação 2.7.5, desde que |Kz ∆z| seja suficientemente próximo de zero.
Ou seja,
Pz exp(−iKz ∆z) ∼ = (1 − iKz ∆z)Pz (2.7.15)
Com base nesta aproximação, pode-se afirmar que, nas aplicações recursivas da equação
2.7.14, não apenas a precisão mas também a estabilidade numérica é afetada pela di-
mensão relativa do fator 1 − iKz ∆z. Isto se deve ao fato de que, para |Kz ∆z| > 0, o
mesmo fator, que é complexo, apresenta módulo sistematicamente superior a 1. O mesmo
não ocorre com a expressão 2.7.5, já que o módulo de exp(−iKz ∆z) é sempre igual a 1,
independentemente do valor de Kz ∆z, desde que Kz seja real (não complexo).
Na expressão 2.7.14, se o valor de Kz for substituı́do por −ω/v, onde v é a velocidade
de propagação, pode-se obter a expressão equivalente, no domı́nio do tempo, aplicando-se
o teorema da derivada da transformada de Fourier. O resultado é:
∆z ∂pz
pz−∆z ∼
= pz − (2.7.16)
v ∂t
onde pz é o traço sı́smico, em função do tempo, obtido na profundidade z. Ressalte-se
que a derivada com relação ao tempo também pode ser calculada através da razão entre
diferenças. Entretanto, neste caso, introduz-se uma aproximação desnecessária, se for
levada em conta a simplicidade do caso 1-D.
As versões bi e tridimensional da equação 2.7.14 podem ser obtidas de forma similar.
No caso 3-D, o resultado é:

P̃ (Kx , Ky , z − ∆z, ω) ∼
= (1 − iKz ∆z)P̃ (Kx , Ky , z, ω) (2.7.17)

onde Kz é definido com base na equação 2.4.27, que representa a versão tridimensional
da relação de dispersão da equação da onda. Observe-se que, neste caso, a transformação
para o domı́nio do tempo já não é tão simples, já que Kz envolve uma raiz quadrada.
Este é um tema relativamente bem explorado no item 3.5.
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 195

Como no caso do algoritmo de deslocamento de fase, a expressão 2.7.17 não permite


a geração e a adequada extrapolação de eventos múltiplos. Para que isto seja possı́vel,
é necessário considerar tanto as ondas ascendentes quanto as descendentes. Isto implica
discretizar a derivada segunda da pressão com relação a z, a qual não contém informações
explı́citas sobre o sentido da onda e, portanto, admite propagação bidirecional. O resul-
tado é dado por
∂ 2 P̃
= −Kz2 P̃ (2.7.18)
∂z 2
Como uma aproximação de primeira ordem, a derivada segunda da pressão, com relação
à profundidade, corresponde a:

P̃z+∆z − 2P̃z + P̃z−∆z ∼


= −Kz2 P̃z
∆z 2
Rearranjando-se os termos, obtém-se:

P̃z−∆z ∼
= (2 − Kz2 ∆z 2 )P̃z − P̃z+∆z (2.7.19)

onde P̃z e Kz são funções de Kx , Ky e ω.


Combinando-se a equação 2.7.19 com a relação de dispersão da equação da onda,
pode-se gerar e extrapolar adequadamente eventos múltiplos. Observe-se entretanto que,
diferentemente do caso unidirecional, a propagação de sinais para uma determinada pro-
fundidade exige a manipulação simultânea dos sinais obtidos em pelo menos duas outras
profundidades, assim como exige a utilização das velocidades de propagação reais e não
sua metade.
Como a equação 2.7.19 é definida no domı́nio ω-Kx -Ky , ela é inadequada para descre-
ver a propagação de ondas em um meio em que a velocidade varia lateralmente. Nestas
circunstâncias, é conveniente transformá-la para o domı́nio ω-x-y, para o quê é necessário
recorrer à relação de dispersão da equação da onda. O resultado é:
 2 
2 ∂ Pz ∂ 2 Pz ω 2
Pz−∆z = 2Pz − Pz+∆z − ∆z + + 2 Pz (2.7.20)
∂x2 ∂y 2 v
onde o campo P e as derivadas espaciais são funções de x, y e ω, para o valor especı́fico
de z indicado pelo subscrito, enquanto a velocidade, v, varia livremente ao longo dos três
eixos espaciais. Com este resultado, pode-se, a partir dos sinais sı́smicos obtidos em duas
profundidades vizinhas, estimar o registro correspondente em uma profundidade menor.
O leitor atento deverá ter percebido que a equação 2.7.20 corresponde também a
uma discretização parcial da transformada de Fourier, ao longo do tempo, da equação
2.4.24. Ou seja, partindo-se da solução da equação da onda, chegou-se ao primeiro enfoque
mencionado acima — a aplicação da técnica das diferenças finitas através da discretização
da própria equação da onda. Em outras oportunidades, o leitor perceberá que, apesar de
percorrer um caminho mais tortuoso, o enfoque baseado na solução da equação da onda
pode ser muito útil, especialmente no que diz respeito ao entendimento das diferenças
entre propagação uni e bidirecional.
Na modelagem sı́smica, a técnica das diferenças finitas é normalmente aplicada com o
objetivo de simular a aquisição sı́smica real, a qual envolve a extrapolação de campos de
ondas ao longo do eixo dos tempos. No caso acústico e tridimensional, a forma mais geral
196 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

do algoritmo responsável por esta extrapolação, fundamentada na versão com densidade


variável da equação 2.4.24, é descrita pela seguinte expressão:
      
2 2 ∂ 1 ∂pt ∂ 1 ∂pt ∂ 1 ∂pt
pt+∆t = 2pt − pt−∆t + v ρ∆t + + (2.7.21)
∂x ρ ∂x ∂y ρ ∂y ∂z ρ ∂z

onde a velocidade, v, a densidade, ρ, os três campos de pressão e as derivadas espaciais


variam com as coordenadas x, y e z. Em termos mais práticos, pt representa o volume
tridimensional de dados sı́smicos obtidos no tempo t, ou seja, pt = p(x, y, z, t), onde t é
constante. O mesmo se aplica aos campos pt−∆t e pt+∆t , nos tempos respectivos.
Nas aplicações práticas da equação 2.7.21, as derivadas espaciais são estimadas nume-
ricamente, ressalvando-se que melhores resultados são obtidos se elas forem computadas
no domı́nio dos três números de onda envolvidos, Kx , Ky e Kz . Neste domı́nio, as versões
numéricas dos operadores ∂/∂x, ∂/∂y e ∂/∂z, que se transformam em produtos por iK x ,
iKy e iKz , são estimadas sem a necessidade de se recorrer a aproximações26 . Descreve-se
assim a chamada técnica Fourier.
O sucesso da tarefa representada pela equação 2.7.21 envolve a óbvia existência de um
campo de ondas previamente gerado. Isto significa que, para aplicar a mesma equação à
modelagem sı́smica, é necessário incluir o efeito de uma fonte de energia, o que implicaria
substituir a equação 2.4.24 pela transformada inversa de Fourier da equação 2.4.52. O
processo correspondente pode ser simplificado se o efeito da fonte for incluı́do através de
uma simples atualização do campo de pressões pt . No caso de uma fonte pontual, esta
tarefa se reduz à seguinte expressão:

pt (x = xs , y = ys , z = zs ) + f (xs , ys , zs , t) ⇒ pt (x = xs , y = ys , z = zs ) (2.7.24)
26
Neste caso, a relação de dispersão correspondente à equação 2.7.21 é estimada com base no teorema
da derivada da transformada de Fourier e na aproximação de primeira ordem para ∂ 2 p/∂t2 . Se o meio
for considerado homogêneo e isotrópico, o resultado obtido é:
 
2 2 2 4 2 ω∆t
Kx + Ky + Kz = 2 2 sen (2.7.22)
v ∆t 2
Para se obter este resultado, levou-se em conta que o módulo da transformada de Fourier do ope-
rador de primeira ordem da derivada segunda com relação ao tempo, (1, −2, 1)/∆t 2, é dado por
4 sen 2 (ω∆t/2)/∆t2 .
A expressão 2.7.22 pode ser usada com o fim de se avaliar a dispersão e a estabilidade nas aplicações
numéricas da equação 2.7.21. No primeiro caso, deve-se ressaltar que, no limite em que o produto ω∆t
tende a zero, a mesma expressão torna-se equivalente à forma correta da relação de dispersão da equação
da onda. Induz-se assim que, para reduzir a dispersão numérica em casos representativos, é recomendável
diminuir, tanto quanto possı́vel, o valor de ∆t. A este respeito, é comum a referência a pelo menos 10
amostras por perı́odo da máxima freqüência a extrapolar.
Resta discutir a estabilidade numérica, a qual é garantida se, na expressão 2.7.22, o valor numérico de
sen 2 (ω∆t/2) não ultrapassar 1. Desta forma, para os valores máximos de v, K x , Ky e Kz , a seguinte
inequação deve ser respeitada:
 
ω∆t  v 2 ∆t2
sen 2 = Kx2N + Ky2N + Kz2N max ≤1 (2.7.23)
2 4

onde KxN = π/∆x, KyN = π/∆y, KzN = π/∆z e vmax é a máxima velocidade intervalar do modelo
usado. Assim, com a escolha adequada dos valores de ∆x, ∆y, ∆z e ∆t, pode-se garantir que a recursão
implı́cita na equação 2.7.21 não leve ao crescimento indevido das amplitudes.
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 197

onde f (xs , ys , zs , t) representa o pulso sı́smico emitido nas coordenadas espaciais xs , ys e


zs .
A modelagem sı́smica baseada nas equações 2.7.21 e 2.7.24 é conduzida através da
seguinte seqüência de operações:

1. Constrói-se o modelo geológico, na forma dos volumes de velocidade, v(x, y, z) e


densidade, ρ(x, y, z). Neste processo, deve-se levar em conta a necessidade de ate-
nuar o efeito das bordas, as quais podem gerar reflexões indesejadas. Uma das
técnicas aplicadas com esta finalidade consiste em expandir os volumes de veloci-
dade e densidade, assim como o do sinal extrapolado, de forma a acrescentar, junto
às bordas, uma região de amortecimento.

2. Constrói-se o termo da fonte, f (xs , ys , zs , t), para todos os valores de tempo, t, que
a caracterizam. No caso de um arranjo de tiro, a tarefa é repetida nas diferentes
posições espaciais envolvidas.

3. O processo é iniciado considerando-se nulos os campos de onda pt e pt−∆t , em todas


as coordenadas espaciais, (x, y, z), do modelo.

4. Atualizam-se os valores do volume pt apenas na posição da fonte sı́smica, aplican-


do-se a expressão 2.7.24.

5. Computam-se os volumes correspondentes às três derivadas espaciais da equação


2.7.21, preferencialmente através de operações conduzidas no domı́nio da freqüência,
envolvendo isoladamente os operadores iKx , iKy e iKz .

6. Aplica-se a equação 2.7.21 para se obter o campo de ondas pt+∆t .

7. Trocam-se t + ∆t e t por t e t − ∆t. Isto implica transformar os volumes pt e pt+∆t


em pt−∆t e pt , respectivamente.

8. Extraem-se as amplitudes que, no campo pt , situam-se nas profundidades dos recep-


tores (tipicamente, z = 0). O resultado é armazenado no volume de dados sı́smicos
desejados, no mesmo tempo t.

9. Repetem-se os passos 4 a 8 até que o máximo valor de tempo desejado seja atingido.

O resultado da aplicação da seqüência descrita é um volume de amplitudes definido em


função das coordenadas superficiais e do tempo, já que as profundidades escolhidas para
o “registro” dos dados sı́smicos não variam durante o processo. Trata-se, no caso, de um
sismograma tridimensional, o qual poderia ser caracterizado pela função s(xg , yg , zg , t),
onde xg , yg e zg são as coordenadas espaciais dos receptores. Um importante subproduto
da técnica é o chamado instantâneo (em inglês, snapshot), o qual corresponde a uma
imagem do campo de ondas definido, em um tempo qualquer, em função das coordenadas
espaciais x, y e z. Sua geração consiste simplesmente em se copiar, para um volume a ser
preservado, o campo de ondas obtido quando, na etapa 8 da seqüência descrita, o valor
de t for igual ao tempo desejado.
Na Figura 2.54, pode-se ver um instantâneo construı́do de acordo com a seqüência
descrita. Como o processo foi conduzido em três dimensões e o pulso sı́smico usado tem
198 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Profundidade (m)

500

−400 −200 0 200 400


Distância da fonte (m)

Figura 2.54: Instantâneo em um tempo de propagação igual a 220ms,


gerado com a aplicação das equações 2.7.21 e 2.7.24 a um modelo tri-
dimensional constituı́do de uma interface horizontal situada na profun-
didade de 200m. Parâmetros: velocidades iguais a 2000m/s na camada
superior e 2500m/s na inferior; ∆x = 10m; ∆z = 4m; ∆t = 0.5ms; a
densidade é constante. A fonte sı́smica é pontual, situa-se na profundi-
dade de 4m e a correspondente forma de onda é um filtro passa-banda
de fase nula (8-60Hz).

fase nula, todas as variações de amplitude e forma observadas na figura foram geradas
pela própria modelagem. A este respeito, deve-se ressaltar que, se a mesma modelagem
fosse conduzida com a versão bidimensional da equação da onda, o pulso sı́smico efe-
tivo resultaria da convolução entre o filtro passa-banda escolhido e a função de Green
bidimensional, a qual, em um meio homogêneo e isotrópico, tem fase igual a −450 (ver
discussão a respeito da integral de Rayleigh II, na página 208).
Observe-se, na Figura 2.54, que o tempo de propagação foi suficiente para que a
reflexão, gerada na interface entre as duas camadas do modelo, atingisse a superfı́cie na
região central e desse origem a uma múltipla, a qual é caracterizada com base na troca
de polaridade e no sentido descendente da propagação. Além disso, merecem destaque:
(1) a atuação do coeficiente de reflexão, responsável pela menor amplitude da reflexão,
em relação à da onda transmitida; (2) a variação do coeficiente de reflexão com o ângulo
de incidência, que modificou lateralmente a amplitude da reflexão; (3) a influência do
fantasma da fonte, o qual é responsável pela deformação do pulso sı́smico e pelas menores
amplitudes da onda direta nos ângulos de propagação próximos de 90 graus (ver o item
2.9) e; (4) a mudança no comprimento efetivo do pulso sı́smico depois que ele atravessa
a interface, o que se deve à diferença entre as duas velocidades envolvidas.
Com base na teoria apresentada até aqui, assim como no exemplo da Figura 2.54,
percebe-se que, na modelagem sı́smica baseada na expressão 2.7.21, incluem-se automa-
ticamente as reflexões e diversos dos fatores de propagação, os quais não são tratados de
forma adequada no caso em que se aplica o modelo do refletor explosivo. Assim, reflexões
e múltiplas surgem como um subproduto natural, a cada vez em que a onda incide sobre
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 199

Figura 2.55: Modelo para a aplicação da integral de Kirchhoff.

um meio em que as propriedades elásticas são diferentes das anteriores. De forma simi-
lar, as perdas por transmissão e espalhamento geométrico também são automaticamente
incluı́das. Adicionalmente, se a equação acústica da onda for substituı́da por sua similar
elástica, a propagação passa a incluir também a conversão de modo e a influência da
razão de Poisson na variação dos coeficientes de reflexão e transmissão com o ângulo de
incidência.

2.7.4 A integral de Kirchhoff


Embora pouco se tenha dito nesse sentido, as equações 2.2.28 e 2.2.29, discutidas no item
2.2, correspondem a algoritmos de extrapolação de campos de onda. Na sua dedução,
adotou-se uma linha de raciocı́nio sustentada por intuição e empirismo. Considerando-se
que o objetivo foi o de aprofundar os conceitos envolvidos no princı́pio de Huygens, a linha
adotada pode ser considerada satisfatória. Entretanto, se o objetivo for uma descrição
mais completa da propagação da onda, conclui-se ser necessária uma dedução rigorosa.
Para isto, exige-se o recurso ao teorema de Green.
Para apresentar o teorema de Green, segue-se abaixo parte da mesma seqüência usada
por Weglein e Stolt (1990), a qual se apoia no teorema fundamental do cálculo integral
(TFCI):
Z b
f 0 (x)dx = f (b) − f (a)
a
0
onde f (x) é a derivada da função f (x) com relação a x.
Observe-se que, no TFCI, o valor da integral não depende dos pontos situados no
intervalo entre x = a e x = b. Ou seja, apenas os limites do intervalo definem o valor
da integral. Este conceito é fundamental para a compreensão do teorema de Green. O
mesmo conceito, no caso 3-D, está implı́cito no teorema de Gauss, cujo enunciado, em
termos matemáticos, é: Z I
N = ∇ • ~adV = ~a • ~ndS (2.7.25)
V S

onde o sı́mbolo • denota produto escalar, N é o fluxo do vetor ~a, enquanto ~n é o vetor
unitário normal à superfı́cie S, a qual envolve o volume V (ver a Figura 2.55).
Como uma versão 3-D do TFCI, o teorema de Gauss permite integrar uma função
em um volume V , usando-se informações contidas exclusivamente na superfı́cie S, que
200 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

envolve o volume. Em suas aplicações, ~a é normalmente o gradiente de um campo escalar


qualquer, ou seja, ~a = −∇Φ, onde Φ é uma grandeza escalar. Considere-se agora o caso
em que o mesmo vetor é definido por

~a ≡ P ∇G − G∇P (2.7.26)

onde P e G são grandezas escalares dependentes da freqüência e das coordenadas espaci-


ais, ou seja, P = P (x, y, z, ω) e G = G(x − xA , y − yA , z − zA , ω). Neste caso, a divergência
do vetor ~a é dada por

∇ • ~a = P ∇2 G + ∇P • ∇G − G∇2 P − ∇G • ∇P

ou
∇ • ~a = P ∇2 G − G∇2 P
onde ∇2 é o operador laplaciano. Combinando-se este resultado com a definição do vetor
~a, pode-se transformar o teorema de Gauss na seguinte versão do teorema de Green:
Z I
2 2
(P ∇ G − G∇ P )dV = (P ∇G − G∇P ) • ~ndS (2.7.27)
V S

De acordo com o teorema de Green, é possı́vel obter-se informações sobre um campo


de ondas dentro de um dado volume, a partir de medidas do mesmo campo efetuadas na
superfı́cie que envolve o volume. Outra versão do teorema de Green permite demonstrar
que, para um campo de ondas qualquer, a variação da energia do campo dentro do volume
V , em um determinado intervalo de tempo, é igual à energia que flui através da superfı́cie
S que envolve o volume, no mesmo intervalo de tempo (ver Berkhout, 1987).
Observe-se que, na forma da equação 2.7.27, o teorema de Green está associado à
equação da onda, já que P e G satisfazem às equações 2.4.28 e 2.4.53, as quais são dadas
por
ω2
∇2 P = − 2 P (2.7.28)
v
e
ω2
∇2 G = − 2 G + 4πδ(x − xA )δ(y − yA )δ(z − zA ) (2.7.29)
v
A equação 2.7.28 governa a propagação da onda gerada por fontes situadas fora do
volume V , enquanto a equação 2.7.29 governa a propagação da onda gerada dentro do
volume V , ou, mais especificamente, da superfı́cie S para o ponto A. Nos termos do
princı́pio de Huygens, o campo P representa a onda que excita o meio na superfı́cie S, a
qual é responsável pela geração de ondas secundárias cuja interação é observada no ponto
A.
É interessante ressaltar que, na equação 2.7.29, a fonte de energia está situada no
ponto A, em vez da posição esperada, que é a superfı́cie S. Esta aparente contradição
é contornada com base no princı́pio da reciprocidade. Ou seja, a equação 2.7.29 pode
também ser usada para descrever a propagação do sinal gerado por uma famı́lia de fontes
secundárias de energia, situadas na superfı́cie S, até o ponto de observação A. Discutir-
se-á, mais adiante, o significado prático desta afirmação.
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 201

Substituindo-se as equações 2.7.28 e 2.7.29 na expressão 2.7.27, obtém-se:


Z I
4πδ(x − xA )δ(y − yA )δ(z − zA )P dV = (P ∇G − G∇P ) • ~ndS (2.7.30)
V S

Sabe-se que o ponto A está contido no volume V , que a variação de volume dV é


igual a dxdydz e que P é função de x, y e z. Assim, a aplicação da propriedade de
enquadramento da função δ reduz a integral volumétrica ao valor de P no ponto A, ou
seja, P (xA , yA , zA , ω). Como resultado, a equação 2.7.30 transforma-se na seguinte versão
da integral de Kirchhoff:
I
1
P (xA , yA , zA , ω) = 4π
(P ∇G − G∇P ) • ~ndS (2.7.31)
S

Ressalte-se que a expressão obtida é válida no caso em que não existem (ou são des-
consideradas) outras fontes de energia dentro do volume V , além das fontes secundárias
situadas na superfı́cie S. São desconsiderados também, pelo menos por enquanto, even-
tuais refletores situados na mesma superfı́cie.
Na Figura 2.56, vê-se um corte vertical do modelo em que se baseia a aplicação da
integral de Kirchhoff à propagação de ondas ascendentes. Trata-se de um volume V ,
limitado pela superfı́cie S a qual, por sua vez, é fragmentada em quatro partes: S1 , S2 ,
S3 e S4 . Com base nesse modelo, procura-se avaliar o sinal sı́smico, dentro do volume V ,
no ponto de registro identificado pela letra A, a partir de medidas efetuadas na superfı́cie
S1 , na qual incide um campo de ondas ascendente. Para isto, dois enfoques têm sido
adotados na literatura, o segundo dos quais pode ser considerado mais correto (Weglein
e Stolt, 1990):

1. Consideram-se as superfı́cies S2 , S3 e S4 tão afastadas do ponto A quanto necessário


para que as suas contribuições tornem-se desprezı́veis.

2. Como o campo P é puramente ascendente na superfı́cie S1 e a função de Green


é causal, ou seja, implica avanço no tempo, a superfı́cie S2 não contribui para a
observação no ponto A. Por sua vez, as superfı́cies S3 e S4 podem ser consideradas
afastadas o suficiente para que sua contribuição seja desprezada.

Nos dois enfoques, considera-se que não existe qualquer descontinuidade elástica den-
tro do volume V , incluindo a superfı́cie de registro. Ou seja, não existem fontes primárias
de energia associadas à mesma superfı́cie. Nestas condições, independentemente do enfo-
que escolhido, a resposta sı́smica no ponto A pode ser obtida a partir de medidas feitas
exclusivamente na superfı́cie S1 , o que permite transformar a integral de Kirchhoff em:
Z
1
P (xA , yA , zA , ω) = 4π (P ∇G − G∇P ) • ~ndS1 (2.7.32)
S1

A expressão 2.7.32 pode ser simplificada de forma a permitir aplicação prática mais
fácil. Para isto, assume-se que a superfı́cie S1 é horizontal, ou seja, o vetor unitário ~n faz
um ângulo de 00 com o eixo z. Nestas condições, o produto escalar ~n • ~k, onde ~k é o vetor
202 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.56: Modelo para a aplicação da integral de Kirchhoff à propagação


de ondas sı́smicas da superfı́cie horizontal S 1 até o ponto A.

unitário que caracteriza o eixo z, é igual a 1. Em conseqüência, obtêm-se as seguintes


igualdades:
∂P
∇P • ~n =
∂z
e
∂G
∇G • ~n =
∂z
Incluindo estes resultados e substituindo-se dS1 por dxdy na equação 2.7.32, a integral
de Kirchhoff passa a ser reescrita da seguinte forma:
Z Z  
1 ∂G ∂P
P (xA , yA , zA , ω) = 4π
P −G dxdy (2.7.33)
∂z ∂z zB
Ly Lx

onde zB > zA e o sı́mbolo L denota integral de linha. Ou seja, o integrando é uma função
que deve ser avaliada ao longo dos eixos x e y.
Na forma da equação 2.7.33, a integral de Kirchhoff se aplica a ondas ascendentes,
em função da relação entre o sentido do vetor unitário que caracteriza a superfı́cie de
integração, ~n, e o eixo vertical, z. No caso de uma onda descendente, o mesmo vetor
apresenta sentido ascendente, portanto oposto ao do vetor unitário ~k. Uma vez que,
nestas condições, o produto escalar ~n • ~k é igual a −1, o sinal da equação 2.7.33 deve
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 203

ser trocado. Conclui-se assim que o sentido da propagação ao longo do eixo z controla o
sinal da integral de Kirchhoff.
A integral de Kirchhoff é uma ferramenta de extrapolação de campos de onda, exata-
mente como os demais algoritmos discutidos anteriormente. Assim, a partir do campo de
ondas medido em uma profundidade qualquer, é possı́vel estimar, com a equação 2.7.33,
como seria o campo de pressões em uma profundidade menor. A técnica de modela-
gem sı́smica apresentada no item 2.2 corresponde a uma aplicação do mesmo conceito.
Discutir-se-á adiante como a equação 2.2.26, usada naquela oportunidade, pode ser obtida
a partir da integral de Kirchhoff.

A integral de Kirchhoff: uma convolução


Tomando-se a Figura 2.56 como referência, considere-se um campo de ondas, gerado
fora do volume V , que se propaga para cima, até atingir a superfı́cie S1 . Este campo é
representado, no domı́nio da freqüência, por P e ∂P/∂z. No caso da pressão P , tem-se a
transformada de Fourier dos dados sı́smicos medidos através dos hidrofones. Por sua vez,
a transformada de Fourier da derivada da pressão com relação à profundidade, ∂P/∂z,
pode ser definida em termos da velocidade de partı́culas, que é medida pelos geofones,
através da seguinte versão da segunda lei de Newton (ver o item 2.4):

∂P
= iωρVz (2.7.34)
∂z
sendo ρ a densidade original do meio e Vz a transformada de Fourier da velocidade de
partı́culas. Nas aplicações práticas, a densidade do meio é normalmente tomada como
constante.
Ao atingir a superfı́cie S1 , o campo de ondas incidente, que vem de baixo, é filtrado
pelas funções G e ∂G/∂z, que representam a resposta, ao impulso, do meio situado entre
cada ponto situado na superfı́cie S1 e o ponto A. Essa filtragem, ou convolução, que é
representada matematicamente pela integral de Kirchhoff, gera como resultado o campo
de pressões no ponto A.
É possı́vel tornar ainda mais claro estes conceitos se a integral de Kirchhoff for reescrita
de forma a explicitar a convolução mencionada. Para isto, deve-se analisar a relação entre
o princı́pio da reciprocidade e a derivada ∂G/∂z, a qual pode, com base na equação 2.4.54,
ser apresentada da seguinte forma:
   
∂G ∂ 1 1 iω ∂τ
= exp(iωτ ) = − 2 + exp(iωτ ) (2.7.35)
∂z ∂z vτ vτ vτ ∂z

onde v é a velocidade e τ = R/v, sendo R a distância correspondente ao trajeto entre o


ponto A e um ponto qualquer na profundidade zB , distância esta definida por
p
R = |~r| = (xA − x)2 + (yA − y)2 + (zA − zB )2 (2.7.36)

Considere-se agora a aplicação da equação 2.7.35 à expressão 2.7.33. A este respeito,


sabe-se que, no caso de uma onda secundária ascendente, a derivada ∂τ /∂z deve ser menor
do que zero. Se, para um ponto A fixo, a equação 2.7.35 for avaliada na profundidade
zB , esta condição não é satisfeita, já que um aumento na profundidade zB equivale a um
204 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

aumento no tempo τ . Chega-se, assim, a um aparente impasse, já que a derivada ∂G/∂z
deveria, pelo menos em tese, ser avaliada na profundidade zB .
Para resolver este impasse, deve-se lembrar que a dedução da integral de Kirchhoff
baseou-se na interação de dois campos de ondas: o campo ascendente P e a função de
Green descendente, G, correspondente a uma fonte no ponto A. A utilização desta função
de Green decorre da dificuldade de se associar o sinal gerado por múltiplas fontes na
superfı́cie S ao observado em um único ponto A. Viu-se que esta dificuldade é contornada
com base no princı́pio da reciprocidade, o qual permite substituı́-las por múltiplos pontos
de observação do sinal gerado no ponto A.
Nos termos da equação 2.7.35, a substituição da função de Green ascendente por uma
descendente leva à necessidade de, nas aplicações da integral de Kirchhoff, trocar o sinal
de ∂τ /∂z, como se ∂G/∂z fosse igual a ∂G/∂zA . Garante-se desta forma a condição de
onda secundária ascendente no ponto A, assim como a de onda secundária descendente
no ponto A0 (ver a Figura 2.56). Torna-se também possı́vel a transformação de ∂G/∂z
em uma medida de como varia a função de Green, em um ponto de observação fixo, com
relação à variação na profundidade da fonte secundária de energia, z B . Tem-se, no caso
do ponto A, a seguinte igualdade:

∂G ∂G(xA − x, yA − y, zA − zB , ω)
=− (2.7.37)
∂z ∂zB
Com a relação 2.7.37, pode-se apresentar a integral de Kirchhof de uma forma alter-
nativa, substituindo-se a equação 2.7.33 por

1
R R ∂G(xA − x, yA − y, zA − zB , ω)
P (xA , yA , zA , ω) = − 4π P (x, y, zB , ω) dxdy
Ly Lx ∂zB
1
R R ∂P (x, y, zB , ω)
− 4π G(xA − x, yA − y, zA − zB , ω) dxdy
Ly Lx ∂zB
(2.7.38)
onde zB > zA .
Uma rápida inspeção permite concluir que a expressão 2.7.38 corresponde a uma
convolução bidimensional, ao longo dos eixos x e y (a coordenada z não varia), para cada
harmônica individual, ω. Ou seja, os campos de pressão e da derivada da pressão com
relação à profundidade são realmente convolvidos com a função de Green e com a sua
derivada com relação à profundidade. Se for considerada uma coleção de pontos situados
na profundidade constante zA , em vez de um único ponto A, pode-se escrever:
 
1 ∂G ∂P
P (x, y, zA , ω) = − 4π P ∗∗ +G∗∗ (2.7.39)
∂zB ∂zB

onde ∗∗ denota convolução bidimensional, envolvendo os eixos horizontais, e z B > zA .

Da integral de Kirchhoff para as de Rayleigh


Uma das formas empregadas na dedução das integrais de Rayleigh implica transformar a
equação 2.7.38 para o domı́nio ω-Kx -Ky , o que significa considerar a função de Green, G,
lateralmente constante. Neste domı́nio, as derivadas do campo de pressões e da função
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 205

de Green, com relação à profundidade, obedecem às seguintes correspondências, obtidas


a partir da aplicação do teorema da derivada ao eixo z:
∂P
⇔ −i|Kz |P̃ (2.7.40)
∂zB
e
∂G
⇔ iKz G̃ (2.7.41)
∂zB
onde P̃ e G̃ são o campo de pressões e a função de Green no domı́nio ω-Kx -Ky e Kz é
obtido com base na equação 2.4.27, ou seja,
s  2  2
ω vKx vKy
Kz = ∓ 1− − (2.7.42)
v ω ω

As equações 2.7.40 e 2.7.41 merecem comentários adicionais. Observe-se, na primeira


expressão, que o sinal negativo e o módulo de Kz aparecem porque está sendo analisada
a propagação ascendente. Neste caso, sabe-se que, no instante em que são geradas as
ondas secundárias, o campo de pressões P é exclusivamente ascendente na superfı́cie S 1 .
Isto faz com que Kz se torne menor do que zero (ver os itens 2.1 e 2.4).
Quanto à função de Green, a propagação pode teoricamente ser tanto ascendente
quanto descendente e, portanto, o sinal de Kz pode ser tanto negativo quanto positivo.
Na aplicação desta idéia, deve-se ressaltar que, com a igualdade 2.7.37, uma mesma
relação entre o sentido da propagação e o sinal de Kz aplica-se indistintamente à função
de Green, G, e ao campo de pressões, P . Para se obter o mesmo resultado com a
transformada de Fourier da expressão 2.7.33 (em vez da 2.7.38), é necessário utilizar a
relação ∂G/∂z ⇔ −iKz G̃, em função da aplicação do princı́pio da reciprocidade.
Com as transformadas de Fourier de ∂P/∂z e ∂G/∂z e a aplicação do teorema da
convolução (item 1.2), obtém-se a seguinte forma para a transformada de Fourier da
equação 2.7.38:  
1
P̃ (zA ) = 4π −iKz G̃P̃ + i|Kz |P̃ G̃ (2.7.43)
zB

Este resultado, apesar de válido apenas para meios homogêneos, é bastante útil para uma
melhor compreensão da propagação de ondas, além de permitir, como se verá abaixo, a
dedução das integrais de Rayleigh. Ressalte-se que, dependendo da forma como a equação
2.4.53 é deduzida, o fator 4π pode ser incorporado à função de Green e, neste caso, não
seria explicitado na equação 2.7.43.
Neste ponto, o leitor poderia perguntar: se a função de Green pode ser descendente
a partir da superfı́cie S1 , não haveria a geração de um campo de ondas adicional, a ser
obtido no ponto A0 da Figura 2.56? Esta pergunta caracteriza um problema clássico do
princı́pio de Huygens, segundo o qual cada ponto da frente de onda poderia gerar ondas
secundárias que se propagam não somente no sentido em que a onda avança, mas também
no sentido oposto.
É possı́vel demonstrar que o problema descrito é resolvido pela equação 2.7.43. Para
isto, deve-se lembrar que, quando a função de Green é descendente, Kz é maior do
que zero. Em conseqüência, o lado direito da equação 2.7.43 é cancelado, o que leva à
impossibilidade de se obter um campo de ondas no ponto A0 . Em contrapartida, quando
206 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

a função de Green é ascendente, Kz é menor do que zero. Neste caso, a equação 2.7.43
transforma-se em:  
1
P̃ (zA ) = 2π i|Kz |P̃ G̃ (2.7.44)
zB

Comprova-se assim que cada ponto da frente da onda primária atua efetivamente como
fonte secundária apenas no sentido em que a onda avança (no caso, o ascendente), já que
a propagação no sentido oposto é cancelada. Ressalte-se que este resultado somente é
possı́vel por causa da atuação combinada dos dois termos da integral de Kirchhoff e porque
não existem coeficientes de reflexão no intervalo de profundidades envolvido. O resultado
obtido pode ser generalizado na forma do chamado teorema da extinção. Aplicado ao caso,
este teorema estabelece que, na ausência de fontes primárias de energia, ou difratores, as
ondas secundárias que se propagam no sentido oposto ao da onda primária são canceladas.
As integrais de Rayleigh são deduzidas a partir da equação 2.7.44, a qual permite
duas transformadas de Fourier inversas, uma vez que o operador i |Kz | pode ser aplicado
indistintamente a G̃ ou a P̃ , sem que se altere o resultado numérico. A primeira opção
equivale à adoção da condição de contorno de Dirichlet, a qual implica considerar G = 0
e ∂G/∂z 6= 0 na superfı́cie S1 . Já a segunda equivale à adoção da condição de contorno
de Neumann, a qual implica considerar G 6= 0 e ∂G/∂z = 0 na mesma superfı́cie. As
duas condições, ao contrário da dedução seguida aqui, exigem a escolha de funções de
Green particulares27 (ver Berkhout, 1980).
Quando se aplica o operador i |Kz | a P̃ , a transformada inversa de Fourier da equação
2.7.44 para o domı́nio ω-x-y, no caso de um ponto isolado A, corresponde à integral de
Rayleigh I, ou seja,
Z Z  
1 ∂P
P (xA , yA , zA , ω) = − 2π G dxdy (2.7.45)
∂zB
Ly Lx

onde zB > zA .
Por sua vez, quando se aplica o operador i |Kz | a G̃, obtém-se, nas mesmas condições,
a integral de Rayleigh II, ou seja,
Z Z  
1 ∂G
P (xA , yA , zA , ω) = − 2π P dxdy (2.7.46)
∂zB
Ly Lx

onde zB > zA .
27
De acordo com a condição de contorno de Dirichlet, a função de Green corresponde a um dipolo e é
dada por
1 1
G = exp(iωR/v) − 0 exp(iωR0 /v)
R R
0 ~
onde R e R são os módulos dos vetores ~r e r (ver a Figura 2.56). Este resultado, substituı́do na
0

expressão 2.7.33, dá origem à integral de Rayleigh II, uma vez que, no caso, G = 0 e ∂G/∂z B 6= 0
(observe-se que R = R0 , mas ∂R/∂zB = −∂R0 /∂zB ). Se a condição de contorno for a de Neumann, a
função de Green é
1 1
G = exp(iωR/v) + 0 exp(iωR0 /v)
R R
função esta que, substituı́da na expressão 2.7.33, dá origem à integral de Rayleigh I.
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 207

Percebe-se assim que a integral de Kirchhoff se reduz à integral de Rayleigh I, ou


à integral de Rayleigh II, desde que o meio seja homogêneo e que a superfı́cie S 1 seja
horizontal. A primeira dessas premissas não invalida a generalidade da dedução. Isto
significa que as integrais de Rayleigh podem ser aplicadas a meios heterogêneos, desde que
os dados estejam no domı́nio ω-x-y, ou t-x-y, e que a função de Green seja adequadamente
computada. A segunda premissa é mais rigorosa já que, se a superfı́cie de integração não
for horizontal, ou pelo menos plana, as duas integrais deixam de ser equivalentes, o que
exige a utilização da integral de Kirchhoff, ou algum tipo de aproximação, caso esta seja
uma tarefa muito difı́cil.

A integral de Rayleigh II no domı́nio do tempo


Na forma da equação 2.7.46, a integral de Rayleigh II é aplicada no domı́nio da freqüência.
Uma versão temporal da mesma equação pode ser facilmente obtida. Para isto, parte-se
da seguinte forma da expressão 2.7.35, aplicada à profundidade zB :
 
∂G v iω ∂τ
=− − exp(iωτ )
∂zB R2 R ∂zB

onde τ = R/v. A derivada ∂τ /∂zB é obtida com base na equação 2.7.36, levando em
conta que zB > zA . O resultado é a seguinte igualdade28 :

∂τ cos α
=
∂zB v
onde cos α é dado por
|zA − zB |
cos α = (2.7.47)
R
Pode-se, assim, obter a seguinte versão da derivada da função de Green com relação à
profundidade zB :  
∂G 1 iω
= − cos α − exp(iωτ ) (2.7.48)
∂zB R2 vR
Com a equação 2.7.48, a integral de Rayleigh II, na forma da equação 2.7.46, trans-
forma-se na seguinte igualdade:
Z Z    
1 1 iω
P (xA , yA , zA , ω) = 2π cos α − exp(iωτ )P (x, y, zB , ω) dxdy (2.7.49)
R2 vR
Ly Lx

onde R e cos α são dados pelas equações 2.7.36 e 2.7.47, respectivamente.


Na versão da equação 2.7.49, a integral de Rayleigh II aplica-se indistintamente à
propagação unidirecional de ondas ascendentes ou descendentes, uma vez que o sinal da
derivada da função de Green com relação a zB já foi incluı́do. Por outro lado, pode-se
facilmente obter uma versão da mesma equação no domı́nio tempo-distância. Para isto,
28
Vale a pena destacar que, apesar de a derivada ∂τ /∂zB ser positiva, a condição de onda secundária
ascendente é garantida pelo sinal negativo da equação 2.7.37, o qual foi incorporado na expressão 2.7.46.
Ou seja, ao final, tudo se passa como se ∂τ /∂z fosse realmente uma grandeza negativa.
208 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

aplica-se a transformada inversa de Fourier à equação 2.7.49, com base nos teoremas da
derivada e do deslocamento (ver a Tabela 1.1, na página 19), ou seja,


⇔ −iω
∂t
e
p(x, y, z, t − τ ) ⇔ P (x, y, z, ω) exp(iωτ )
As substituições apropriadas levam à seguinte versão da integral de Rayleigh II (com-
parar com a equação 2.2.28):
Z Z    
1 1 1 ∂
p(xA , yA , zA , t) = 2π cos α + p(x, y, zB , t − τ ) dxdy (2.7.50)
R2 vR ∂t
Ly Lx

Nas aplicações práticas, o termo t − τ significa que os dados situados na profundidade z B


devem ter seu tempo aumentado de acordo com o intervalo τ , para a avaliação numérica
da integral.
Com base na equação 2.7.50, percebe-se que o sinal estimado na posição definida por
(xA , yA , zA ) é composto pela soma de duas parcelas, ambas proporcionais a cos α, que
é o chamado fator de obliqüidade. A primeira delas (campo próximo) é inversamente
proporcional ao quadrado da distância, o que a torna mais importante nas vizinhanças
do difrator, ou do refletor. A segunda das parcelas (campo remoto) inclui a derivada
do sinal com relação ao tempo e é inversamente proporcional a vR, fazendo com que
predomine a longas distâncias do difrator ou do refletor. Nas situações em que ωτ >> 1,
pode-se desprezar o termo de campo próximo, o que permite transformar a expressão
2.7.50 em:
Z Z    
1 1 ∂
p(xA , yA , zA , t) = 2π cos α p(x, y, zB , t − τ ) dxdy (2.7.51)
vR ∂t
Ly Lx

ou, na versão discreta,

XX 
1 ∂
 
1
p(xA , yA , zA , t) = 2π
cos α p(x, y, zB , t − τ ) ∆x∆y (2.7.52)
y x
vR ∂t

Observe-se que esta aproximação equivale também a desprezar a derivada da ampli-


tude da função de Green com relação à profundidade a qual, na maioria das circunstâncias
práticas, é relativamente pequena.

A integral de Rayleigh II - Versão 2-D


No caso bidimensional, Berkhout (1980, 1987) mostra que a integral de Rayleigh II pode
ser deduzida a partir da equação 2.7.49, assumindo que o campo de pressões não varia
ao longo do eixo y. Uma dedução alternativa baseia-se na versão 2-D da equação 2.7.44,
a qual pode ser obtida considerando P̃ e G̃ constantes ao longo do eixo y e fazendo com
que Ky = 0. A transformada inversa de Fourier do resultado, adotando-se a condição de
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 209

contorno de Dirichlet, leva à seguinte versão 2-D da integral de Rayleigh II, aplicável a
ondas ascendentes: Z  
1 ∂G
P (xA , zA , ω) = − 2π P dx (2.7.53)
∂zB
Lx

para zB > zA .
O campo de pressões P satisfaz a versão 2-D da equação da onda dada pela equação
2.7.28, enquanto a função de Green é a solução da seguinte equação da onda:

∂2G ∂2G ω2
+ + 2 G = 4πδ(x − xA )δ(z − zA ) (2.7.54)
∂x2 ∂z 2 v
A solução desta equação, razoavelmente mais complicada do que a do caso 3-D, é
(1)
G(x, z, ω) = iπH0 (ωτ ) (2.7.55)

ou
G(x, z, ω) = iπ [J0 (ωτ ) + iY0 (ωτ )] (2.7.56)
(1)
onde H0 é a função de Hankel do primeiro tipo e ordem zero, enquanto J0 e Y0 são
funções de Bessel, caracterizadas por polinômios envolvendo a função Gama (ver Wylie,
1975). Por sua vez τ = R/v, sendo R dado por
p
R = |~r| = (xA − x)2 + (zA − zB )2 (2.7.57)

Para se aplicar a integral de Rayleigh II na sua versão 2-D, é necessário estimar a


derivada da função de Green (equação 2.7.55), com relação a zB . Para isto, aplica-se,
como antes, a regra da cadeia, sabendo-se que (ver Wylie, 1975, página 411):

∂ h (1) i
(1)
H0 (ωτ ) = −ωH1 (ωτ )
∂τ
(1)
onde H1 é a função de Hankel de primeiro tipo e primeira ordem, ou seja,
(1)
H1 (ωτ ) = J1 (ωτ ) + iY1 (ωτ ) (2.7.58)

Na seqüência, sabendo-se que, para uma onda ascendente gerada na profundidade z B ,


∂τ /∂zB = cos α/v (ver nota de rodapé 28, na página 207), obtém-se a derivada da versão
2-D da função de Green com relação a zB , a qual é dada por

∂G iωπ h i
(1)
=− cos α H1 (ωτ )
∂zB v

onde cos α = |zA − zB | /R.


Substituindo-se este último resultado na equação 2.7.53, tem-se a seguinte versão da
integral de Rayleigh II, no domı́nio ω-x:
Z
1 n cos α h (1)
i o
P (xA , zA , ω) = iωH1 (ωτ ) P (x, zB , ω) dx (2.7.59)
2 v
Lx
210 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

(1)
É interessante observar que, para ωτ >> 1, a função de Hankel H1 pode se tornar
substancialmente mais simples (ver Press et al., 1986; Wylie, 1975), já que assume a
seguinte forma: r  
2v 3π
H1 (ωτ ) ∼
(1)
= exp iωτ − i
πωR 4
Aplicando-se este resultado à equação 2.7.59, obtém-se a seguinte versão da integral de
Rayleigh II:
Z  r   
ω π
P (xA , zA , ω) = cos α exp iωτ − i P (x, zB , ω) dx (2.7.60)
2πvR 4
Lx

ou, na versão discreta, já no domı́nio do tempo,


X  cos α 
p(xA , zA , t) = dt ∗ √ p(x, zB , t − τ ) ∆x (2.7.61)
x 2πvR

onde ∗ denota convolução e


√ √  π
dt ⇔ −iω = ω exp −i (2.7.62)
4
Ou seja, o operador dt corresponde, no domı́nio da freqüência, à raiz quadrada da trans-
formada de Fourier do operador de derivada.
A aproximação representada pela expressão 2.7.61 é o equivalente 2-D da equação
2.7.52. Em ambos os casos, despreza-se a derivada da amplitude da função de Green com
relação à profundidade. Adicionalmente, por causa da condição ωτ >> 1, a derivada da
pressão, com relação ao tempo, na equação 2.7.52, poderia ser deslocada para fora do
somatório, como foi feito com a convolução envolvendo o operador d t , no caso 2-D.

Outras versões das integrais de Rayleigh


Existem outras versões das integrais de Rayleigh, reunidas em dois tipos: (1) formas
diversas da integral de Rayleigh I e (2) versões que permitem aplicar a integral de Rayleigh
II a campos de velocidade de partı́cula.
No caso da integral de Rayleigh I, dada pela equação 2.7.45, outra versão pode ser
obtida substituindo-se G pela expressão 2.4.54 e a derivada da pressão pela equação
2.7.34. Obtém-se assim a seguinte expressão:
Z Z  
iωρ 1
P (xA , yA , zA , ω) = − exp(iωτ )Vz (x, y, zB , ω) dxdy (2.7.63)
2π R
Ly Lx

onde Vz é a velocidade de partı́culas medida ao longo do eixo z.


Para se obter a versão 2-D da integral de Rayleigh I, utiliza-se a solução da equação
da onda dada pela expressão 2.7.55. Combinando-se esta solução com a expressão 2.7.34,
altera-se a versão 2-D da equação 2.7.45 para
Z
ωρ h (1) i
P (xA , zA , ω) = H0 (ωτ )Vz (x, zB , ω) dx (2.7.64)
2
Lx
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 211

À semelhança da integral de Rayleigh II, versão bidimensional, a equação 2.7.64


também pode se tornar mais simples, no caso em que ωτ >> 1. Nestas condições,
obtém-se a seguinte versão da integral de Rayleigh I:
Z "r #
ωvρ2  π
P (xA , zA , ω) = exp iωτ − i Vz (x, zB , ω) dx (2.7.65)
2πR 4
Lx

Como no caso da integral de Rayleigh II, as versões temporais da integral de Rayleigh


I podem ser obtidas aplicando-se propriedades fundamentais da transformada de Fourier
(ver a equação 2.2.29 e comparar com a equação 2.7.63, usando a equação 2.7.34). No
domı́nio do tempo ou da freqüência, a principal diferença entre as integrais de Rayleigh
I e II está no fator de obliqüidade cos α, que a primeira não inclui. A razão para esta
diferença é simples: a velocidade de partı́culas já inclui o fator cos α.
Para se obter a integral de Rayleigh que permite extrapolar campos de velocidade
de partı́culas, parte-se da equação 2.7.63. Inicialmente, deve-se levar em conta que a
equação 2.7.34 permite estimar a velocidade de partı́culas através da derivada do campo
de pressões com relação a z. Desta forma, para se obter a velocidade de partı́culas no
ponto A, deve-se derivar a equação 2.7.63, com relação a z, no mesmo ponto. O resultado
é: Z Z    
∂P iωρ ∂ 1
=− exp(iωτ ) Vz (x, y, zB , ω) dxdy (2.7.66)
∂ zA 2π ∂zA R
Ly Lx

Observe-se que este resultado é possı́vel porque a derivada com relação a z, no ponto A,
não depende do campo de velocidade de partı́culas estimado na profundidade zB . Por
outro lado, levando em conta que R é definido pela expressão 2.7.36, pode-se transformar
a equação 2.7.66 em
Z Z    
∂P iωρ 1 iω
= cos α − exp(iωτ )Vz (x, y, zB , ω) dxdy (2.7.67)
∂ zA 2π R2 vR
Ly Lx

onde cos α é dado pela equação 2.7.47.


Substituindo-se, na equação 2.7.67, a derivada do campo de pressões com relação a z
pela expressão 2.7.34, obtém-se a seguinte igualdade:
Z Z    
1 1 iω
Vz (xA , yA , zA , ω) = 2π cos α − exp(iωτ )Vz (x, y, zB , ω) dxdy (2.7.68)
R2 vR
Ly Lx

Observe-se que este resultado corresponde à própria integral de Rayleigh II, aplicada a
campos de velocidade de partı́culas. Isto significa que se pode usar a integral de Rayleigh
II também para se extrapolar dados sı́smicos terrestres.

A integral de Kirchhoff na presença da fonte


Na dedução da equação 2.7.33, assumiu-se que não existem fontes no volume envolvido na
extrapolação do campo de ondas entre as profundidades zB e zA . Considere-se agora que
o mesmo volume inclui a fonte pontual de energia s, situada na profundidade zs , fonte
212 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

esta que deu origem ao campo de ondas registrado na profundidade zB . Considere-se


ainda que se deseja estimar o campo de pressões na profundidade zA , a qual é maior do
que a profundidade em que se situa a fonte primária e menor do que a profundidade de
registro zB , ou seja, zB > zA > zs . Para isto, faz-se uso da equação 2.7.27 e das seguintes
equações da onda, correspondentes às expressões 2.4.52 e 2.4.53:

ω2
∇2 P = − P + 4πF (ω)δ(x − xs )δ(y − ys )δ(z − zs ) (2.7.69)
v2
e
ω2
∇2 G = − G + 4πδ(x − xA )δ(y − yA )δ(z − zA ) (2.7.70)
v2
onde s é o subscrito que identifica a fonte de energia e F (ω) é o espectro de freqüências do
pulso correspondente. Observe-se que a primeira equação governa a propagação completa
do campo de pressões gerado pela fonte primária de energia, o que inclui a onda direta e os
demais eventos registrados na profundidade zB . Por sua vez, a segunda equação governa
a propagação das ondas geradas nas fontes secundárias, situadas na profundidade z B .
A substituição dessas equações da onda na expressão 2.7.27 leva à necessidade de se
avaliar duas integrais volumétricas, uma envolvendo a fonte primária, situada na profun-
didade zs , e a outra as fontes secundárias, situadas na superfı́cie de registro zB . Com
base nas propriedades da função delta de Dirac, obtém-se:
Z
4πP (xA , yA , zA , ω) = 4πδ(x − xA )δ(y − yA )δ(z − zA )P dV (2.7.71)
V

e
Z
4πF (ω)Gs (xA − xs , yA − ys , zA − zs , ω) = 4πF (ω)δ(x − xs )δ(y − ys )δ(z − zs )GdV
V
(2.7.72)
onde Gs é a função de Green associada ao trajeto entre a fonte primária e o ponto A.
Observe-se que o resultado da segunda equação corresponde à onda direta gerada pela
fonte e “registrada” no ponto A.
As expressões 2.7.69 a 2.7.72 permitem transformar a equação 2.7.27 na seguinte
expressão: I
1
P (xA , yA , zA , ω) = F (ω)Gs + 4π (P ∇G − G∇P ) • ~ndS (2.7.73)
S

ou, já que a superfı́cie de integração, S1 , é horizontal,


Z Z  
1 ∂G ∂P
P (xA , yA , zA , ω) = F (ω)Gs + 4π
P −G dxdy (2.7.74)
∂z ∂z zB
Ly Lx

Deduz-se assim que o campo de pressões no ponto A pode ser descrito pela soma de
dois componentes: (1) a onda direta gerada pela fonte e; (2) o resultado da extrapolação
do sinal registrado na profundidade zB . Isto significa que, na ausência de uma fonte de
energia no volume de integração, as equações 2.7.33 e 2.7.74 tornam-se iguais, ou seja, a
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 213

primeira é um caso particular da segunda. Esta caracterı́stica leva a uma pergunta óbvia:
o campo de ondas avaliado na profundidade zB não inclui a onda direta? E, se este for o
caso, não haveria uma distorção na resposta obtida?
Esta aparente contradição pode ser resolvida com base na mesma linha de raciocı́nio
empregada na dedução da equação 2.7.44. Uma vez que a fonte primária de energia
está situada acima dos receptores, pode-se dizer que a onda direta é exclusivamente
descendente na superfı́cie S1 , ao longo da qual é feita a integração. Por outro lado,
sabe-se também que a função de Green G, empregada na mesma integração, é causal.
Combinadas com o fato de que o ponto A se situa acima da superfı́cie S1 , estas duas
propriedades fazem com que a integração cancele a onda direta obtida na profundidade
zB , o que representa uma aplicação do teorema da extinção. Assim, no ponto A, a
contribuição direta da fonte passa a depender exclusivamente do termo que envolve a
função de Green Gs .
Pode ser instrutivo analisar o que ocorreria se a fonte primária de energia se situasse
abaixo da superfı́cie S1 . Neste caso, a fonte não estaria contida no volume de integração
e, em conseqüência, a onda direta faria parte do campo ascendente na mesma superfı́cie.
Isto significa simplesmente que a equação 2.7.73, ou 2.7.74, não mais seria aplicável, sendo
necessário recorrer à expressão 2.7.32, ou 2.7.33.
Até agora nada foi dito a respeito da superfı́cie livre, situada acima da fonte. Em
condições realistas, a mesma superfı́cie faz com que se introduza, no interior do volume
de integração V , novas fontes de energia, levando à introdução de outros fenômenos, como
é o caso dos fantasmas. Nestas condições, deve-se alterar as funções de Green G e G s , o
que, para a inclusão dos fantasmas, implica transformá-las em formas de onda dipolares.
Além disso, a mesma superfı́cie é responsável também pelas múltiplas da superfı́cie livre,
a serem discutidas no item 2.8.

2.7.5 A aproximação Kirchhoff


Os diversos algoritmos de extrapolação direta apresentados até aqui podem ser empre-
gados tanto para a modelagem sı́smica baseada no modelo do refletor explosivo quanto
para simular a aquisição na presença de afastamento entre a fonte e os receptores. No
último caso, os algoritmos mais abrangentes são baseados em técnicas de diferenças fi-
nitas, ou elementos finitos. Entretanto, estes algoritmos apresentam a impossibilidade
de tratar, de forma isolada, fenômenos como a variação do coeficiente de reflexão com
o ângulo de incidência, ou alguns dos fatores de propagação discutidos nos itens 2.5 e
2.8. A mesma dificuldade não existe no caso em que se aplica a chamada aproximação
Kirchhoff (Bleistein, 1984).
A Figura 2.57 pode ser usada para ilustrar as condições em que se aplica a apro-
ximação Kirchhoff na modelagem sı́smica. No caso, deseja-se avaliar, no receptor g, a
resposta sı́smica, do refletor distribuı́do ao longo da superfı́cie S, à emissão de um sinal
pela fonte s. Aplica-se ao caso a seguinte versão da equação 2.7.31, a qual foi adaptada
para a obtenção do sinal sı́smico, P (xs , ys , xg , yg , zA , ω), no receptor hipotético g:
I
1
P (xs , ys , xg , yg , zA , ω) = 4π
(P ∇G − G∇P ) • ~n dS (2.7.75)
S
214 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

s g SUPERFÍCIE
zA

rs rg

θ
θ

B
zB S
n

Figura 2.57: Modelo para a aplicação da aproximação Kirchhoff a um


refletor distribuı́do ao longo de uma superfı́cie hipotética S.

onde ~n é o vetor unitário normal à superfı́cie S, P é o campo de ondas que incide na


mesma superfı́cie e G é a função de Green correspondente ao trajeto entre o refletor e o
ponto de registro, o qual está situado na profundidade zA .
Na equação 2.7.75, tudo se passa como se a integral de Kirchhof fosse aplicada para
se transferir o sinal que atinge a superfı́cie S para a posição do receptor. Com base na
teoria apresentada no subitem 2.7.4, sabe-se que esta tarefa somente seria bem-sucedida
se: (1) na ausência de uma descontinuidade elástica na superfı́cie S, o receptor estivesse
situado abaixo da mesma superfı́cie ou; (2) para um receptor situado acima da superfı́cie
S, esta apresentasse uma descontinuidade elástica. No primeiro caso, de acordo com o
teorema da extinção, o sinal ascendente seria cancelado, de tal forma que nenhum sinal
atingiria um receptor situado na profundidade zA . Já no segundo caso, uma reflexão
ascendente seria gerada. Ver-se-á adiante como o correspondente coeficiente de reflexão
é introduzido no processo.
Considere-se agora que a fonte s esteja também situada na profundidade de registro
e seja caracterizada por um impulso unitário. O sinal correspondente, avaliado em um
hipotético ponto B da superfı́cie S, pode ser descrito com base na seguinte aproximação
de alta freqüência para a função de Green:

GD
s (x − xs , y − ys , zB − zA , ω) = As Cs (ω) exp [iωτs + iφs (ω)] (2.7.76)

onde D denota sentido descendente e o subscrito s identifica a fonte. Por sua vez, As e
τs são, respectivamente, a amplitude e o tempo envolvidos no trajeto, enquanto Cs (ω) e
φs (ω) representam as demais distorções de amplitude e fase sofridas pelo sinal.
Da mesma forma, os fenômenos envolvidos no trajeto entre o ponto B e o receptor
podem ser descritos com base na seguinte na seguinte aproximação de alta freqüência
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 215

para a função de Green:


GUg (xg − x, yg − y, zA − zB , ω) = Ag Cg (ω) exp [iωτg + iφg (ω)] (2.7.77)
onde U denota sentido ascendente e o subscrito g identifica o receptor. Por sua vez, A g
e τg são, respectivamente, a amplitude e o tempo envolvidos no trajeto, enquanto Cg (ω)
e φg (ω) representam as demais distorções de amplitude e fase sofridas pelo sinal.
Observe-se que tanto a equação 2.7.76 quanto a 2.7.77 podem incorporar todos os
fatores de propagação envolvidos nos trajetos respectivos29 . Isto significa que os espectros
de freqüência das duas funções já podem incluir as perdas de amplitude e as distorções
de fase associadas, por exemplo, à absorção e, até mesmo, aos fenômenos associados ao
pulso sı́smico (ver o item 2.9). Observe-se ainda que, em muitos casos, é conveniente
adotar uma versão mais simples das duas equações, restringindo as distorções às perdas
de amplitude causadas pelo espalhamento geométrico.
Criam-se assim as condições básicas para definir a aproximação Kirchhoff (ver Bleis-
tein, 1984). Esta aproximação se baseia em uma pergunta simples: como incorporar os
coeficientes de reflexão e as duas funções de Green descritas à equação 2.7.75? Isto é feito
com base na seguinte aproximação para o campo P , avaliado na superfı́cie S:
P (x, y, zB , ω) ∼
= r(x, y, zB , θ)GD (x − xs , y − ys , zB − zA , ω)
s (2.7.78)
onde r é o coeficiente de reflexão, o qual pode ser complexo, quando o ângulo de incidência,
θ, ultrapassa o crı́tico. De acordo com a Figura 2.57, este ângulo é definido, no refletor,
pela metade do módulo do ângulo entre o raio que vem da fonte e o que vai para o
receptor. Ou seja, aplica-se a lei da reflexão independentemente da geometria do refletor.
Ver-se-á depois a implicação desta definição sobre o resultado obtido.
Levando em conta a interação entre o campo de ondas definido pela equação 2.7.78 e a
função de Green dada pela expressão 2.7.77, pode-se agora, com base na equação 2.7.75,
obter a seguinte forma para a estimativa da resposta sı́smica em um receptor arbitrário,
situado na posição (xg , yg , zA ):
I

1
P (xs , ys , xg , yg , zA , ω) = − 4π rGD U U D
s ∇Gg − rGg ∇Gs • ~n dS (2.7.79)
S

Nesta equação, o coeficiente de reflexão é tratado como constante, ou seja, para cada
ponto difrator ele não varia durante a integração, embora possa variar com o ângulo de
incidência. Observe-se ainda que o sinal negativo da integral aparece porque, apesar de
o campo P ser descendente na profundidade zB , procura-se obter o sinal ascendente na
profundidade zA , a qual é menor do que zB . Desta forma, garante-se a correta polaridade
do sinal obtido (ver discussão sobre a integral de Kirchhoff).
A equação 2.7.79 pode ser simplificada se, com base no princı́pio da reciprocidade, a
função de Green associada à fonte for considerada também ascendente. Desconsideran-
do-se o caso em que a superfı́cie S assume formas muito complexas, o mesmo princı́pio
permite afirmar que a única implicação dessa mudança é a troca do sinal do gradiente da
mesma função de Green, o que permite obter a seguinte versão da equação 2.7.79:
I
1
P (xs , ys , xg , yg , zA , ω) = − 4π (rGs ∇Gg + rGg ∇Gs ) • ~n dS (2.7.80)
S
29
No caso das múltiplas da superfı́cie livre, adota-se um tratamento à parte, discutido no item 2.8.
216 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

onde as duas funções de Green são consideradas ascendentes. Ou seja, ainda de acordo
com a aproximação de alta freqüência,

Gs = Gs (xs − x, ys − y, zA − zB , ω) = As Cs (ω) exp [iωτs + iφs (ω)] (2.7.81)

e
Gg = Gg (xg − x, yg − y, zA − zB , ω) = Ag Cg (ω) exp [iωτg + iφg (ω)] (2.7.82)
A equação 2.7.80 corresponde à seguinte forma da aproximação Kirchhoff:
I
1
P (xs , ys , xg , yg , zA , ω) = − 2π r∇G • ~n dS (2.7.83)
S

Nesta expressão, r varia com o ângulo de incidência e G é dado por

G = 21 Gs Gg (2.7.84)

onde Gs e Gg podem ser definidas pelas equações 2.7.81 e 2.7.82, ou alternativamente, es-
timadas de forma a considerar uma faixa de freqüências representativa dos dados sı́smicos.
Como, na forma apresentada aqui, a propagação de ondas é um processo linear, o
modelo da equação 2.7.83 pode ser generalizado de forma a incluir múltiplos pontos
difratores. Neste caso, pode-se aplicar isoladamente a mesma equação a cada difrator
e acumular a sua contribuição no volume final, ou, alternativamente, pode-se aplicar a
equação 2.7.83 a múltiplos difratores, representados na forma de uma soma de produtos
entre coeficientes de reflexão e funções de Green. Ou seja, como se trata de um processo
convolutivo, a ordem da operação não afeta o resultado. Esta idéia é explorada na
discussão sobre as múltiplas da superfı́cie livre (item 2.8).

Modelagem sı́smica com a aproximação Kirchhoff


A aproximação Kirchhoff pode ser facilmente usada na sintetização de um traço sı́smico
em um meio tridimensional. Aplica-se ao caso a seguinte seqüência de operações, baseada
na equação 2.7.83:
1. Constrói-se um modelo de camadas, cada uma delas caracterizada pelo conjunto
de propriedades elásticas velocidade de onda compressional, velocidade de onda
cisalhante (ou razão de Poisson) e densidade, parâmetros estes que podem variar
lateralmente.
2. Adota-se a condição inicial definida por

P (xs , ys , xg , yg , z = 0, ω) = 0

onde P corresponde à transformada de Fourier do traço sı́smico que se deseja obter,


o qual envolve uma fonte na posição (xs , ys ) e um receptor na posição (xg , yg ),
ambos situados na superfı́cie.
3. Escolhe-se um ponto situado em uma das interfaces do modelo, nas coordenadas
(x, y, z) e determinam-se os parâmetros que caracterizam o correspondente vetor
unitário, ~n.
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 217

4. Calculam-se os seguintes parâmetros das funções de Green, relativos ao trajeto entre


a fonte e o ponto escolhido e entre este e o receptor: (a) os tempos de trânsito, τ s
e τg ; (b) as amplitudes, As e Ag e; (c) os ângulos, αs e αg , que os dois trajetos
fazem com a direção normal ao refletor, na posição do ponto escolhido. Aplica-se,
no último caso, a seguinte convenção: medido acima do refletor, o ângulo α cresce
no sentido horário.

5. Calcula-se o peso W , dado por


As Ag  cos αs cos αg 
W = + ∆S
4π v v
onde v é a velocidade intervalar na base da camada sobreposta ao refletor e ∆S é
a área do refletor que representa o ponto avaliado. Observe-se que, no caso de um
meio homogêneo e isotrópico, As e Ag são dadas por 1/Rs e 1/Rg , onde Rs e Rg se
referem às distâncias entre a fonte e o difrator e entre este e o receptor.

6. Estima-se o ângulo de incidência com a expressão θ = (αs − αg )/2, sem levar em


conta o mergulho do refletor.

7. Calcula-se o coeficiente de reflexão na interface, usando-se as propriedades elásticas


locais, o ângulo de incidência, θ, e a equação 2.6.21. O resultado é r(x, y, z, θ).

8. Atualiza-se a transformada de Fourier do traço sı́smico a obter com base na seguinte


operação, aplicada a cada componente de freqüência:

P (xs , ys , xg , yg , z = 0, ω) − iωW r(x, y, z, θ) exp(iωτ ) => P (xs , ys , xg , yg , z = 0, ω)

onde o fator −iω é a transformada de Fourier do operador de derivada com relação


ao tempo e τ = τs + τg .

9. Repete-se a etapa 8 para todos os componentes de freqüência, até ω = ωmax , a qual


representa a última harmônica livre da influência de álias espacial.

10. Repetem-se as etapas 3 a 9 para todos os pontos da interface do modelo geológico.

11. Repetem-se as etapas 3 a 10 para todas as interfaces do modelo geológico.

12. Multiplicam-se as transformadas de Fourier do traço sı́smico obtido, P , e do pulso


sı́smico desejado. Esta operação equivale, no domı́nio do tempo, a uma convolução.

13. Calcula-se a transformada inversa de Fourier do resultado, para se obter o traço


sı́smico desejado, de acordo com a correspondência

s(xs , ys , xg , yg , z = 0, t) ⇔ P (xs , ys , xg , yg , z = 0, ω)

onde s é o traço sı́smico resultante.

Deve-se observar que, no processo descrito, as duas funções de Green foram tratadas na
forma da aproximação de alta freqüência e, além disso, desprezaram-se os correspondentes
termos de campo próximo. Como alternativa de melhor qualidade, pode-se utilizar o
218 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

modelo geológico dado para se estimar, em um contexto de banda limitada de freqüências,


as funções G e ∇G, em vez dos parâmetros citados nas etapas 4 e 5 da seqüência descrita.
Neste caso, também as etapas subseqüentes seriam modificadas. Ressalte-se que a função
de Green e seu gradiente não dependem diretamente do afastamento fonte-receptor. Desta
forma, um mesmo volume de funções de Green é empregado para se obter respostas
sı́smicas na presença de diferentes afastamentos fonte-receptor.
Pode-se agora tecer algumas considerações a respeito dos efeitos práticos da aplicação
da aproximação Kirchhoff à modelagem sı́smica. Com base no princı́pio de Huygens,
pode-se afirmar que o sinal resultante da aplicação da equação 2.7.83 a qualquer modelo
geológico será aquele composto pelos trajetos em que o atraso relativo é mı́nimo, enquanto
os demais sinais são cancelados no processo. Nos termos do princı́pio de Fermat, o sinal
preservado será aquele para o qual a derivada do tempo de trânsito com relação ao
trajeto tende a zero. Observe-se que estas idéias correspondem, em termos matemáticos,
à solução da equação 2.7.83 com base no conceito de fase estacionária (ver Bleistein,
1984).
Os princı́pios de Huygens e Fermat são fundamentais para se entender a influência do
ângulo de incidência, θ, sobre a amplitude do sinal estimado com base na aproximação
Kirchhoff. No caso, o aspecto mais fundamental a destacar é o fato de que o sinal
preservado no processo é aquele cujo ângulo de incidência na interface é adequado ao
mergulho do refletor e à geometria de aquisição utilizada, enquanto os demais sinais
são cancelados durante a integração. Isto significa que os sinais associados a ângulos
de incidência próximos do que se prevê com base na lei da reflexão atuam de forma
construtiva, enquanto os demais tendem a ser destruı́dos. Uma vez que as correspondentes
amplitudes são ponderadas pelos coeficientes de reflexão aplicáveis aos mesmos ângulos,
pode-se concluir que o sinal estimado com a equação 2.7.83 inclui, de forma adequada, a
influência da variação do coeficiente de reflexão com o ângulo de incidência.
A mesma linha de raciocı́nio permite também entender como o espalhamento geométri-
co da energia é tratado pela equação 2.7.83. Considere-se como exemplo que, na ausência
de afastamento fonte-receptor, deseja-se obter a resposta sı́smica correspondente a um
refletor horizontal, situado em um meio homogêneo e isotrópico, o qual é caracterizado
por um coeficiente de reflexão lateralmente constante, m. Imagine-se agora que se deseja
aplicar ao caso o modelo do refletor explosivo, na forma da equação 2.2.27. Conforme
se demonstrou no subitem 2.2.3, sabe-se que — desconsiderando-se o termo de campo
próximo — o fator multiplicativo cos α/2πvR, presente na mesma equação, compensa a
integração, ao longo do refletor horizontal, do produto (∂m/∂t)∆x∆y, de forma a manter
constante o valor de m. Isto significa que, nas condições estabelecidas, as amplitudes
obtidas na superfı́cie são iguais aos coeficientes de reflexão, m, medidos nas mesmas
coordenadas horizontais, resultado este devido ao fato de que uma onda plana não sofre
perda de amplitude por espalhamento geométrico.
Aplicada ao problema proposto, a equação 2.7.83 gera um resultado diferente. Para
analisar o tema, deve-se levar em conta que, no caso, o gradiente ∇G se transforma na
derivada ∂G/∂z, já que a superfı́cie do refletor, S, é horizontal. Observa-se também que
Rs = Rg , uma vez que o afastamento fonte-receptor é nulo. Isto significa que, comparada
com a expressão 2.2.26, a equação 2.7.83 apresenta um fator multiplicativo adicional, dado
por 1/2R, onde R = Rs = Rg . Com base no princı́pio de Fermat e, em particular, na lei
da reflexão, conclui-se que o sinal gerado pela aplicação da equação 2.7.83 tem amplitude
2.7. EXTRAPOLAÇÃO DE CAMPOS DE ONDAS 219

proporcional à razão 1/2R0 — onde R0 é a profundidade do refletor horizontal — e,


portanto, inclui a perda pelo espalhamento geométrico30 . Ainda mantendo a condição
de meio homogêneo e isotrópico, pode-se expandir o mesmo conceito para o caso em que
existe mergulho. A correspondente amplitude registrada seria proporcional ao inverso do
menor valor da distância Rs + Rg , o qual, como o mergulho é nulo, é observado quando
Rs = R g .
Um importante aspecto, a respeito da modelagem sı́smica baseada na aproximação
Kirchhoff, é a possibilidade de isolar fenômenos. Pode-se com ela, por exemplo, obter uma
resposta sı́smica que deixe no sinal estimado apenas a variação do coeficiente de reflexão
em função do ângulo de incidência e as distorções associadas à geometria do refletor,
devidamente tratadas pela integral de Kirchhoff. Pode-se também obter uma resposta
sı́smica que inclua tão somente o efeito do espalhamento geométrico, sem a variação do
coeficiente de reflexão com o ângulo de incidência. Pode-se ainda, se desejado, incluir os
efeitos associados aos componentes do pulso sı́smico, discutidos no item 2.9. Por outro
lado, ainda que seja possı́vel, não é fácil aplicar a mesma técnica à propagação ao longo
do tempo (ver a equação 2.7.21).

As difrações e a modelagem sı́smica

A flexibilidade da aproximação Kirchhoff é ampla o suficiente para, com uma simples troca
da função de Green empregada no processo, possibilitar a modelagem sı́smica baseada
no modelo do refletor explosivo. Neste caso, as equações 2.7.52 e 2.7.61 poderiam ser
vistas como casos particulares da equação 2.7.83 e, desta forma, ser utilizadas para uma
descrição das caracterı́sticas de uma difração em seções empilhadas, caracterı́sticas estas
que não são evidentes quando se analisa a expressão 2.7.83.
Com base na equação 2.7.52, pode-se dizer que uma difração em um meio tridimensi-
onal homogêneo, observada longe do difrator, apresenta as seguintes caracterı́sticas: (1)
a amplitude é inversamente proporcional à distância percorrida, o que inclui a perda pelo
espalhamento da energia; (2) a amplitude é diretamente proporcional ao cosseno de α, o
que introduz o fator de obliqüidade; (3) no domı́nio da freqüência, a amplitude é propor-
cional à freqüência e a fase é deslocada em −900 , ambas estas caracterı́sticas associadas
à presença da operação de derivada.
No caso 2-D, a integral de Rayleigh, na forma da equação 2.7.61, implica uma difração
com as seguintes caracterı́sticas: (1) a amplitude é inversamente proporcional à raiz
quadrada da distância percorrida, o que inclui a perda pelo espalhamento da energia; (2)
a amplitude é diretamente proporcional ao cosseno de α, ou ao fator de obliqüidade; (3)
no domı́nio da freqüência, a amplitude é multiplicada pela raiz quadrada da freqüência
e a fase é deslocada em −450 . Estas caracterı́sticas permitem compreender melhor a
amplitude e a fase das formas de onda incluı́das nas figuras 2.20 e 2.19 (página 101), que
foram geradas através da versão 2-D da integral de Rayleigh II. Percebe-se, na Figura
2.20, que a amplitude cai com o aumento do tempo e, neste caso de forma menos evidente,
a fase do sinal é de −450 , ao invés de zero, que foi a fase do pulso empregado na geração
da figura.
30
Este resultado pode ser demonstrado matematicamente com base na aplicação, à equação 2.7.83, do
conceito de fase estacionária (Bleistein, 1984).
220 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Na presença de grandes afastamentos entre a fonte e o receptor, as difrações apresen-


tam padrões geometricamente mais complexos, como no exemplo da Figura 2.34 (página
128). Nas mesmas circunstâncias, o ângulo de incidência crı́tico pode ser ultrapassado,
fazendo com que o sinal sı́smico seja substancialmente alterado. A Figura 2.58 pode
ser usada para ilustrar a idéia. No alto, vê-se uma difração obtida de acordo com a
seqüência descrita nas páginas 216-217, nas mesmas condições cinemáticas das usadas na
construção da Figura 2.34. Observe-se na mesma difração que, nas posições correspon-
dentes aos tempos menores, a fase e a amplitude do sinal são bastante diferentes daquelas
obtidas na difração da Figura 2.34. Isto se deve ao fato de que, nas mesmas posições,
o ângulo de incidência ultrapassa o crı́tico, o qual é igual a 65.40 . Esta condição, que
afetou o módulo e a fase do coeficiente de reflexão, no caso da Figura 2.58, não foi levada
em conta na construção da Figura 2.34.
Na parte baixa da Figura 2.58, vê-se como o fenômeno ilustrado pela difração, apre-
sentada na parte alta da mesma figura, influencia a resposta sı́smica a um refletor que
apresenta dois trechos planos, um horizontal e outro inclinado, neste caso com mergulho
de 310 graus. Observe-se no trecho mergulhante que, como o ângulo de incidência é menor
do que o crı́tico, o sinal correspondente não apresenta distorções de fase e amplitude. Já
no trecho horizontal, o ângulo de incidência (68.20 ) é superior ao crı́tico (65.40 ), o que
levou à alta amplitude e ao deslocamento de fase observados no sinal sı́smico correspon-
dente.

2.8 Fontes de Distorção do Sinal Sı́smico


Até agora, admitiu-se que as distorções sofridas pelo sinal sı́smico são de caráter pura-
mente elástico e, além disso, envolvem apenas as ondas primárias em um meio isotrópico.
Esta análise deve ser complementada por uma discussão a respeito de três importantes
famı́lias de fenômenos: (1) a absorção inelástica da energia; (2) as múltiplas e rever-
berações e; (3) a anisotropia de meios tipo transversalmente isotrópicos, ou TI. Inclui-se
no segundo caso o filtro estratigráfico que, gerado pelas múltiplas de camadas finas, pode
introduzir no sinal sı́smico distorções similares às causadas pela absorção, assim como, no
caso de incidência oblı́qua, às observadas na presença de anisotropia em meios TI. Estes
são os temas deste item.

2.8.1 Absorção
Define-se absorção como a perda de amplitude e a deformação na fase do sinal, associadas
ao comportamento apenas parcialmente elástico das rochas, que oferecem resistência à
vibração das partı́culas e, consequentemente, à propagação da onda. A absorção pode,
portanto, ser analisada como dois fenômenos diferentes, atuando sobre o espectro do pulso
sı́smico: a atenuação, que deforma o espectro de amplitude, e a dispersão, que deforma
o espectro de fase. Ver-se-á adiante como esses dois fenômenos se relacionam.
A absorção é um fenômeno contı́nuo, ou seja, a cada trecho infinitesimal de percurso
de um pulso qualquer, a forma de onda é alterada. É fácil induzir que, para uma boa
análise do tema, é conveniente o recurso à equação da onda. Para isto, considere-se a
solução da equação da onda unidimensional, dada pela equação 2.7.4, aplicada ao caso
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 221

Figura 2.58: Difração (no alto) e reflexão (embaixo) obtidas com a apro-
ximação Kirchhoff (2-D), no caso de um agrupamento de afastamento fonte-
receptor comum, após filtragem temporal (8-40Hz). O refletor correspon-
dente à reflexão apresenta dois trechos planos, um horizontal e outro inclinado
(mergulho de 310 graus), com vértice na coordenada horizontal indicada pelo
sı́mbolo •. Observe-se a forte distorção de fase e amplitude na região do ápice
da difração, a qual se deve ao fato de o coeficiente de reflexão ser complexo
na mesma região. Parâmetros: v1 = 2000m/s, v2 = 2200m/s, z = 250m,
h = 625m, ∆xm = 25m.

em que se reduz o valor de z:

P (z, ω) = exp(−iKz) (2.8.1)

Para que a propagação inclua o fenômeno da absorção, transforma-se a freqüência


222 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

angular espacial K na seguinte função complexa (não real):


ω 
K=− + iα (2.8.2)
c
onde α, medido em unidades de distância inversa, é o coeficiente de atenuação, ou de
absorção, e c é a velocidade de propagação correspondente a cada freqüência, ou seja,
c = c(ω). Com esta nova versão do número de onda K, obtém-se a expressão que descreve
a extrapolação do campo de ondas na presença de absorção:
 ω 
P (z, ω) = exp(−αz) exp i z (2.8.3)
c
Vê-se, na equação 2.8.3, que α é a constante responsável pela atenuação do sinal.
Isolando-se o espectro de amplitude, na mesma equação, pode-se definir α em função
da derivada da amplitude de um determinado componente de freqüência, com relação à
profundidade:
1 dA
α=−
A dz
onde A = exp(−αz) = A(ω), ou seja, assume-se que α varia com a freqüência. Usando-se
a propriedade dA/A = d ln A e, apresentando-se o resultado em termos discretos, obtém-
se a seguinte expressão:
∆ ln A 1 A2
α=− =− ln (2.8.4)
∆z z2 − z 1 A1
onde os subscritos 1 e 2 indicam medidas em posições sucessivas da onda. Como o
logaritmo de uma razão qualquer caracteriza o néper, segue-se que a constante α mede a
atenuação em népers por unidade de distância (1 néper = 8.686dB).
Se ∆z for exatamente igual a um comprimento de onda, α passa a ser função do
decremento logarı́tmico, δ, que é a perda de amplitude por ciclo, medida em népers por
ciclo. Neste caso, tem-se:
A2 αc 2παc
δ = − ln = αλ = = (2.8.5)
A1 f ω

onde λ é o comprimento de onda.


A atenuação pode também ser medida através do fator de qualidade Q, que é definido
como 2π vezes a razão entre a energia armazenada e a energia dissipada em um ciclo.
A mesma constante pode ser definida grosseiramente como π vezes o número de ciclos
necessários para que a atenuação atinja 1 néper. Assim, Q, δ e α se relacionam através
da seguinte expressão:
δf πf ω
α= = = (2.8.6)
c cQ 2cQ
Estudos teóricos e dados de laboratório sugerem que a atenuação é linearmente pro-
porcional à freqüência (ver a coletânea de artigos editada por Johnston, 1981). Esse
resultado está de acordo com o que sugere a intuição, já que maiores freqüências impli-
cam maior número de ciclos por unidade de distância percorrida e, consequentemente,
maior atenuação. Por outro lado, o mesmo resultado significa que o fator de qualidade Q é
aproximadamente constante, pelo menos na faixa de freqüências sı́smicas. Assim, parece
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 223

lógico que, por ser pelo menos aproximadamente constante, o fator Q é mais conveniente
do que α, para se representar o efeito da absorção sobre o pulso sı́smico.
O segundo fenômeno associado à absorção é a dispersão. Caracteriza este fenômeno
o fato de cada componente de freqüência viajar com velocidade própria, denominada
velocidade de fase. Nestas condições, o tempo de percurso, dado na equação 2.8.3 por
z/c, depende da freqüência, fazendo com que a forma de onda mude com o passar do
tempo. Em conseqüência, se um observador fixar o olho em um pico da forma de onda
que se propaga, ele verá que a posição do pico, em relação ao inı́cio da forma de onda,
muda com o tempo.
Para se descrever conjuntamente a atenuação e a dispersão, é necessário selecionar
uma freqüência de referência, cuja velocidade c0 represente a velocidade de propagação
do meio. Segundo o modelo de Futterman (1962), esta freqüência é próxima de zero, de tal
forma que praticamente todos os componentes de freqüência propagam-se com velocidades
maiores do que a do componente de referência. O mesmo fenômeno pode ser descrito de
forma alternativa, aceitando-se que a freqüência de referência seja arbitrária, podendo-se
utilizar, por exemplo, a freqüência de pico do sinal, ou a freqüência de Nyquist. Nesses
termos, a velocidade de fase c, com que cada componente de freqüência se propaga, pode
ser definida em função da freqüência de referência e do fator de qualidade Q, através da
seguinte equação (ver Kolsky, 1956; Futterman, 1962; Robinson, 1979):
c0
c∼= (2.8.7)
1 ω
1− ln
πQ ω0
onde ω0 é a freqüência angular de referência.
É possı́vel, agora, tratar a absorção como um todo, agrupando-se a atenuação e a
dispersão do sinal em uma única expressão. Assim, combinando-se as equações 2.8.3, 2.8.6
e 2.8.7, e substituindo-se a profundidade percorrida z por seu equivalente τ c0 , obtém-se
a expressão que descreve a propagação em um meio cujas propriedades dissipativas são
descritas pelo fator Q:
P (τ, ω) = B(τ, ω) exp(iωτ ) (2.8.8)
onde B(τ, ω), o operador de absorção, é dado por
   
ωτ ωτ ω
B(τ, ω) = exp − exp −i ln (2.8.9)
2Q πQ ω0
Ressalte-se que, na dedução desta equação, foi feita uma aproximação, no caso especı́fico
da amplitude, com base na premissa segundo a qual as freqüências sı́smicas satisfazem à
seguinte inequação:
2 ω
Q >> ln
ω ω0
a qual implica, na equação 2.8.6, a aproximação
ω
α∼ =
2c0 Q
Outra versão do operador de absorção B(τ, ω) pode ser obtida através da substituição
de ω por 2πf na equação 2.8.9. O resultado é
   
πf τ 2f τ f
B(τ, f ) = exp − exp −i ln (2.8.10)
Q Q f0
224 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

ou seja, os espectros de amplitude e fase de B(τ, f ) são dados por


 
πf τ
|B(τ, f )| = exp − (2.8.11)
Q
e
2f τ f
φB (τ, f ) = − ln (2.8.12)
Q f0
De acordo com a expressão 2.8.12, percebe-se que, na freqüência de referência, f0 ,
a fase do operador de absorção torna-se igual a zero. Adicionalmente, de acordo com a
convenção usada aqui, os sinais com freqüência inferior à freqüência de referência apresen-
tam fase positiva (atraso), enquanto aqueles com freqüência mais alta apresentam fase
negativa (antecipação). Na Figura 2.59, vêem-se os espectros de amplitude e fase do
operador de absorção correspondente a um valor de τ igual a 1s, freqüência de referência
de 125Hz e valores de Q iguais a 50, 100 e 200. (Uma pergunta para o leitor: o que ocorre
com o pulso de absorção e sua transformada de Fourier quando Q tende a ∞?).
A equação 2.8.8 pode ser aplicada de forma similar à do algoritmo de deslocamento
de fase. Assim, torna-se possı́vel extrapolar campos de onda na presença de absorção, no
caso 1-D, de forma mais correta do que a simples convolução com a transformada inversa
de Fourier do operador definido pela equação 2.8.9. A expressão correspondente é:
   
πf ∆τ 2f ∆τ f
P (τ − ∆τ, f ) = P (τ, f ) exp − exp −i ln exp(iω∆τ ) (2.8.13)
Q Q f0

onde τ é o equivalente em tempo da profundidade e ∆τ é o intervalo entre amostras


sucessivas. A aplicação da técnica descrita por esta equação é muito semelhante à do
algoritmo de deslocamento de fase discutido no item 2.7, bastando levar em conta que,
neste caso, se trabalha com o caso 1-D e o equivalente em tempo da profundidade. Ou
seja, τ equivale a uma pseudo-profundidade, tudo se passando como se os refletores se
distribuı́ssem ao longo de uma escala de profundidade dividida pela velocidade.
A Figura 2.60 é um exemplo de aplicação da técnica a um modelo com três refletores
isolados, situados nas pseudo-profundidades τ = 1s, τ = 2s e τ = 3s. Na construção
da figura, assumiu-se um valor de Q constante e igual a 100 e freqüência de referência
de 125Hz. Para complementar a análise, gerou-se também a Figura 2.61, na qual se
vê o resultado da convolução de versões subamostradas dos três operadores de absorção
obtidos com o pulso sı́smico da Figura 2.11 (página 90).
Podem ser constatadas, nas figuras 2.60 e 2.61, duas deformações proporcionais ao
tempo de propagação: (1) redução da amplitude (visı́vel apenas na Figura 2.60) e perda
das altas freqüências, associadas à atenuação; (2) atraso relativo na posição do pico
principal, associado à dispersão. Não está incluı́da, na Figura 2.61, a perda de amplitude
absoluta; ou seja, os pulsos obtidos foram normalizados. Percebe-se ainda, na Figura
2.60, que existem sinais válidos nos tempos relativos imediatamente inferiores a zero.
Isto se deve ao fato de que as harmônicas com freqüência superior a 125Hz apresentam
fase negativa, como se pode perceber na Figura 2.59, o que, de acordo com a equação
2.8.7, significa velocidade de propagação maior do que a da freqüência de referência.
Para ilustrar quantitativamente o fenômeno, dois exemplos podem ser extraı́dos do
mesmo modelo geológico usado anteriormente, para o qual o fator Q é constante e igual
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 225

100

75
Amplitude (%)

Q=200

50
Q=100

25 Q=50

0
0 25 50 75 100 125 150
Freqüência (Hz)

100

75 Q=50

50 Q=100
Fase (graus)

Q=200
25

−25

−50

−75
0 25 50 75 100 125 150
Freqüência (Hz)

Figura 2.59: Espectros de amplitude e de fase do operador de absorção


para τ = 1s e três valores de Q.

a 100: (1) o componente de freqüência de 25Hz apresenta atenuação, no tempo de 3s,


13.6dB maior do que a 1s; (2) no tempo constante de 1s, o componente de freqüência
de 200Hz apresenta atenuação 47.8dB maior do que o componente de 25Hz. No caso de
baixos valores de Q, a mesma análise pode levar a atenuações superiores à faixa dinâmica
dos instrumentos de registro usuais.
Deve-se destacar a relação entre o valor de Q e a litologia presente na seção geológica.
Assim, por exemplo, citam-se os diabásios, que apresentam normalmente Q elevado,
podendo atingir mais de 1000, e os clásticos em geral, cujo valor representativo de Q é
menor do que 200-300, podendo chegar a 10-20. Ressalte-se, contudo, que a relação entre
a absorção e as propriedades fı́sicas dos materiais nem sempre é direta e simples. Assim,
por exemplo, a absorção na água é muito baixa (Q muito acima de 1000), enquanto é
226 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

1.0
Amplitude normalizada
1s

0.5 2s

3s

0.0
0 50 100 150
Tempo (ms)

Figura 2.60: Pulsos correspondentes à absorção, em um meio cujo


valor de Q é igual a 100, para uma freqüência de referência igual a 125Hz
e três valores de τ : 1s, 2s e 3s. Os sinais obtidos foram amostrados a cada
milissegundo e representados da seguinte forma: (1) o tempo de reflexão
foi subtraı́do do valor de τ associado a cada pulso; (2) a amplitude foi
normalizada com base na máxima amplitude do pulso correspondente a
τ = 1s.

Figura 2.61: Formas de onda normalizadas, correspondentes à con-


volução do pulso sı́smico da Figura 2.11 (página 90) com versões suba-
mostradas dos pulsos de absorção apresentados na Figura 2.60. O valor
de Q é 100 e os de τ são: 1s (no alto), 2s (no centro) e 3s (embaixo).
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 227

relativamente alta em um arenito pouco consolidado.

2.8.2 Múltiplas e reverberações


As múltiplas podem ser classificadas de acordo com duas famı́lias: (1) as geradas na
superfı́cie livre e; (2) as múltiplas internas, geradas nas interfaces entre camadas. Para
ilustrar a primeira famı́lia, no caso 1-D, considere-se um meio espaço envolvendo um re-
fletor horizontal isolado e a superfı́cie livre, também horizontal, a qual é caracterizada por
um coeficiente de reflexão, válido para ondas ascendentes, igual a −1. Suponha-se agora
que se deseja estabelecer o correspondente comportamento das múltiplas, assumindo que
o pulso sı́smico, gerado na superfı́cie, propaga-se na direção vertical. Na ausência de
qualquer outra interface acústica, as múltiplas da superfı́cie livre podem ser descritas por
uma série de tempo, ou um filtro, definido por

ft = δ t − p t + p t ∗ p t − p t ∗ p t ∗ p t + · · · (2.8.14)

onde δt é um impulso unitário na origem (t = 0) e pt é o evento primário, constituı́do por


uma reflexão isolada, sem a influência do pulso sı́smico.
A lógica envolvida na construção da equação 2.8.14 é baseada na seguinte seqüência:
(1) quando a reflexão primária atinge a superfı́cie livre31 , ela tem sua polaridade trocada,
gerando um evento que viaja para baixo; (2) este evento incide sobre o refletor e é refletido
por ele; (3) o sinal múltiplo resultante atinge a superfı́cie e inicia um novo ciclo. Ao final,
tudo se passa como se cada trem de eventos múltiplos descendentes fosse uma espécie de
pulso sı́smico alongado que incide sobre o refletor e é refletido por ele, o que explica as
autoconvoluções presentes na equação.
Em termos de transformada Z, a equação 2.8.14 transforma-se na seguinte igualdade:

F = 1 − P + P2 − P3 + ··· (2.8.15)

onde F = F (Z) e P é a transformada Z do evento primário, dada por

P = P (Z) = rZ 2m (2.8.16)

Nesta expressão, r é o coeficiente de reflexão e m é o número de amostras correspondente


ao tempo simples, ambos relativos ao evento primário.
Considere-se agora um traço sı́smico registrado nas mesmas condições, ou seja, na
presença de uma reflexão isolada e da superfı́cie livre, ainda sem a influência do pulso
sı́smico. No domı́nio do tempo, o mesmo traço, identificado por st , corresponde à con-
volução do filtro ft com a reflexão primária, pt . Em termos de transformada Z, ter-se-ia:

S = PF = P − P2 + P3 − P4 + ··· (2.8.17)
onde S é a transformada Z de st , ou seja, S = S(Z).
Deve-se observar que, embora a expressão 2.8.17 tenha sido deduzida a partir de um
coeficiente de reflexão isolado, o sinal P pode ser constituı́do por toda uma sucessão de
eventos primários, o que decorre da simples aplicação do modelo convolucional. Nestas
31
Ver-se-á adiante que a superfı́cie livre funciona como uma fonte secundária de energia, ativada a
cada vez em que um evento ascendente a atinge.
228 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

condições, o sinal S representa a transformada Z da soma das convoluções entre cada um


dos eventos primários e todos os possı́veis filtros responsáveis pelas múltiplas da superfı́cie
livre. Na verdade, é exatamente isto o que ocorre em um registro sı́smico comum, muito
embora o efeito de algumas interfaces, como o fundo do mar, tenda a se destacar.
A equação 2.8.17 pode ser reapresentada de duas formas muito interessantes. Em
primeiro lugar, uma simples manipulação algébrica permite transformá-la na seguinte
igualdade32 :
S = P (1 − S) (2.8.18)
Em segundo lugar, levando em conta que a equação 2.8.15 equivale à expansão binomial
da razão 1/(1+P ), criam-se condições para reescrever a equação 2.8.17 da seguinte forma:

P
S= (2.8.19)
1+P

Com base neste resultado, conclui-se que, no caso 1-D, as múltiplas geradas na superfı́cie
livre podem ser obtidas através do filtro inverso correspondente ao termo 1 + P .
A simplicidade do caso de uma interface isolada é fundamental para avaliar a influência
das diversas ordens das múltiplas da superfı́cie livre. No mesmo sentido, justifica-se anali-
sar, no domı́nio da freqüência, o operador descrito pela expressão 2.8.14. A transformada
de Fourier correspondente pode ser facilmente obtida com base na seguinte forma da
expressão 2.8.15, obtida com base na expansão binomial já mencionada:

1
F (Z) = (2.8.20)
1 + rZ 2m
Generalizando-se a expressão 2.8.20 para o caso em que o coeficiente de reflexão da
interface superior pode assumir qualquer valor, o que inclui as múltiplas internas entre
duas interfaces quaisquer, tem-se:

1
Fij (Z) = (2.8.21)
1 + ri rj Z 2m

onde os subscritos i e j identificam as duas interfaces, sendo i o ı́ndice da superior,


ou seja, aquela em que a onda é ascendente, enquanto 2m é o número de amostras
correspondente ao tempo duplo entre as duas. Ressalte-se que o coeficiente de reflexão
da interface superior é válido para a propagação descendente. Em outras palavras, o sinal
negativo, que torna o mesmo coeficiente válido para a incidência ascendente, já foi levado
em consideração.
Os casos 2-D e 3-D são substancialmente mais complexos do que o 1-D, particular-
mente se houver mergulho e afastamento entre a fonte e os receptores. Neste caso, a
periodicidade das múltiplas não se restringe apenas à dimensão do tempo. Considere-se,
por exemplo, o caso mais simples, em que as camadas são horizontais e não existe variação
lateral de velocidade, o que caracteriza o chamado “meio 1.5D”. Nestas condições, a geo-
metria envolvida faz com que uma múltipla de primeira ordem seja registrada não apenas
32
Uma pergunta para o leitor: como obter os eventos primários P usando apenas o traço sı́smico
registrado?
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 229

no dobro do tempo mas também no dobro do afastamento fonte-receptor, em relação à


reflexão primária.
O meio 1.5D apresenta uma particularidade favorável à análise das múltiplas: ao
longo de todo o trajeto percorrido por cada uma delas, o parâmetro de raio, p, ou seja,
dt/dx, é constante (ver o item 2.1). Desta forma, torna-se possı́vel gerar, no domı́nio da
freqüência, a seguinte versão da equação 2.8.21:
1
Fij (ω) = (2.8.22)
1 + ri rj exp(2iωqd)
onde 2qd = 2m∆t, sendo ∆t o intervalo de amostragem, d a espessura da camada res-
ponsável pela múltipla e q a vagarosidade vertical. Esta é uma grandeza caracterizada,
a partir das equações 2.1.52, 2.1.50 e 2.1.48, por
r
dt cos θ 1
q= = = − p2
dz v v2
onde v é a velocidade intervalar e θ é o ângulo de propagação (ver a Figura 2.6).
A equação 2.8.22 corresponde à transformada de Fourier de um filtro de múltiplas
representado no domı́nio τ -p (ver o Apêndice A.1). Neste domı́nio, para cada valor
constante de p, as duas dimensões, tempo e distância horizontal, são tratadas como se
fossem uma só, já que a vagarosidade vertical q exerce o papel de projetar os dados sobre
o eixo do tempo τ , permitindo, assim, descrever as múltiplas como um sinal periódico.
Em outras palavras, o trajeto percorrido pelas reflexões múltiplas em cada camada se
dá em um intervalo de tempo múltiplo de ∆τ = 2qd. Deve-se lembrar, entretanto, a
premissa de que as velocidades, mesmo sendo diferentes em cada camada, não variam
lateralmente.
Com a equação 2.8.22, pode-se deduzir facilmente as expressões que descrevem os
espectros de amplitude e fase correspondentes, as quais, em um meio 2-D de camadas
horizontais, sem variação lateral de velocidade, são dadas, em função da freqüência f ,
por (ver Backus, 1959; Meissner, 1965)
1
Aij (f ) = q (2.8.23)
1 + (ri rj )2 + 2ri rj cos (4πf qd)
e  
−1 ri rj sen (4πf qd)
φij (f ) = tan − (2.8.24)
1 + ri rj cos (4πf qd)
A expressão 2.8.23 permite prever crescimento expressivo de amplitude, que caracte-
riza o fenômeno de ressonância, nas freqüências definidas por
n
fn = , para ri rj < 0 (2.8.25)
2qd
e
2n − 1
fn = , para ri rj > 0 (2.8.26)
4qd
Este último é o caso tı́pico das reverberações geradas entre a superfı́cie da água e o
piso oceânico, nas operações marı́timas, para o qual ri = 1 (valor válido para incidência
descendente).
230 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

1.0

0.5
Amplitude

−0.5
0 100 200 300 400 500 600
Tempo (ms)
Figura 2.62: Forma de onda da reverberação gerada na camada de
água, no caso em que o piso oceânico se encontra a uma profundidade
de 75m. O correspondente coeficiente de reflexão é igual a 0.5. O espa-
lhamento geométrico da energia foi desprezado.

Por sua vez, a equação 2.8.24 apresenta o seguinte comportamento: (1) o denominador
é sempre maior do que zero, já que o módulo de ri rj é sempre menor do que 1, portanto
restringindo a fase ao intervalo −900 < φ < 900 ; (2) nas freqüências iguais a 1/2qd e a
zero, a fase é igual a zero. De acordo com o que se viu no item 1.3, estas são caracterı́sticas
de um binômio com raiz fora do cı́rculo unitário, o que permite caracterizar as múltiplas
como um fenômeno de fase mı́nima.
Na Figura 2.62, vê-se um exemplo de operador que representa o efeito de filtragem
das reverberações, ou das múltiplas, no caso em que o coeficiente de reflexão do piso
marinho é igual a 1/2, a lâmina d’água tem 75m e o afastamento fonte-receptor é igual a
zero. Os correspondentes espectros de amplitude e de fase, matematicamente estimados,
podem ser vistos na Figura 2.63. Observe-se o caráter limitado da fase e a ressonância
nas freqüências de 5Hz, 15Hz, 25Hz, etc, as quais são identificadas com base na seguinte
forma da expressão 2.8.26:
(2n − 1)v
fn = (2.8.27)
4d
onde a velocidade v equivale a 1/q, uma vez que, no caso, a incidência é vertical (p = 0).

A distinção entre múltiplas e reverberações da superfı́cie livre depende do compri-


mento relativo do pulso sı́smico. Assim, um pulso muito curto, semelhante a um impulso
unitário, convolvido com um filtro do tipo definido pela expressão 2.8.14, pode dar origem
a eventos isolados que, se analisados em uma janela de tempo relativamente pequena, não
produzirão o padrão de ressonância apresentado na Figura 2.63. Esta situação carac-
teriza uma múltipla, em oposição a uma reverberação, a qual implica a interferência de
eventos múltiplos sucessivos.
Em contrapartida, se os ângulos de incidência forem muito inferiores ao crı́tico, múl-
tiplas internas de ordem ainda relativamente baixa podem se tornar desprezı́veis, basica-
mente por causa dos baixos módulos dos coeficientes de reflexão mais tı́picos e da faixa
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 231

2.0

1.5
Amplitude

1.0

0.5

0
0 10 20 30 40 50
Freqüência (Hz)
30

15
Fase (graus)

−15

−30
0 10 20 30 40 50
Freqüência (Hz)
Figura 2.63: Espectros de amplitude e de fase correspondentes à forma de
onda da Figura 2.62.

dinâmica dos instrumentos de registro. No caso de dois coeficientes de reflexão iguais a


0.01, por exemplo, o quarto termo da série, representada pela equação 2.8.17, apresenta
uma perda de 160dB, em comparação com o primeiro, impedindo o seu registro pelos
instrumentos usuais.
Genericamente, cada par de coeficientes de reflexão existente em uma dada seção
geológica, independentemente da posição, dá origem a um filtro do tipo apresentado na
Figura 2.62. Ou seja, também as múltiplas internas, entre duas camadas quaisquer,
podem ser tratadas da mesma forma. Ressalte-se, entretanto, que o destaque com que se
tratam as múltiplas da superfı́cie livre, em relação às múltiplas internas, deve-se ao alto
valor do módulo do coeficiente de reflexão na superfı́cie da terra, o qual normalmente se
aproxima de 1.
A relação entre as múltiplas e os ângulos crı́ticos merece uma análise especı́fica, en-
volvendo dados sı́smicos não empilhados. Para isto, selecionou-se o exemplo da Figura
232 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.64: Perfil de ruı́dos obtido na Bacia do Paraná. A escala vertical é dada em
segundos e as letras P e S identificam, respectivamente, eventos puramente compressio-
nais e eventos gerados por conversão de modo. (Figura extraı́da do relatório de Tassini
e Rosa, 1982).

2.64, a qual representa o resultado de um perfil de ruı́dos obtido na Bacia do Paraná33 .


Observem-se, na figura, as duas séries de eventos lineares muito fortes, identificados pelas
letras P e S, a primeira das quais poderia ser inadvertidamente associada a ondas fron-
tais34 . Na verdade, são reflexões geradas por ondas que trafegam de acordo com altos
ângulos de propagação nas camadas de basalto que ocorrem na área, pouco abaixo da
superfı́cie. Em função desses ângulos de propagação, apresentam velocidades aparentes
dependentes das máximas velocidades P e S dos mesmos basaltos, os quais apresentam
uma importante caracterı́stica: a distribuição bimodal das velocidades P (ou S), gerada
em função da intercalação de camadas de basalto maciço e vugular.
O esquema da Figura 2.65 permite induzir como os eventos vistos na Figura 2.64
são controlados pelos sedimentos superficiais e pelos basaltos subjacentes. No caso dos
eventos P, o resultado é compatı́vel com sinais que se propagam todo o tempo como on-
das compressionais. O correspondente ângulo de emergência — equivalente, no caso, ao
ângulo de incidência no topo dos basaltos — situa-se na vizinhança inferior do primeiro
ângulo crı́tico, o qual é controlado pelo contraste entre a velocidade P dos sedimentos e
a máxima velocidade P dos basaltos. Já os eventos S correspondem a ondas convertidas
33
Denomina-se perfil de ruı́dos o agrupamento de traços sı́smicos obtidos com a finalidade de amostrar
adequadamente os ruı́dos de uma área qualquer.
34
No caso de ondas frontais (head waves), a perda de amplitude devida ao espalhamento geométrico
da energia é inversamente proporcional ao quadrado da distância percorrida (Meissner, 1965), portanto
substancialmente maior do que a observada na propagação de uma reflexão.
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 233

Figura 2.65: Modelos construı́dos para explicar os eventos observados na Figura


2.64, assumindo que as camadas são horizontais, homogêneas e isotrópicas: eventos
P, no alto, eventos S, embaixo. A letra x identifica o afastamento fonte-receptor. As
camadas representadas são: (1) sedimentos (v P = 2180m/s); (2) camada de basalto
de alta velocidade (vP = 4800m/s e vS = 2600m/s); (3) camada de basalto de baixa
velocidade (vP = 3500m/s e vS = 1900m/s). (Figura extraı́da do relatório de Tassini e
Rosa, 1982).

de acordo com o padrão P-S-P, ou seja, são ondas compressionais nos sedimentos e cisa-
lhantes nos basaltos. Neste caso, o ângulo de emergência se aproxima do ângulo crı́tico
correspondente ao contraste entre a velocidade P dos sedimentos e a máxima velocidade
S das camadas de basalto.
Uma modelagem simples, baseada na teoria do raio, permite demonstrar que os sinais
oriundos de uma interface entre duas camadas de basalto apresentam concentração de
energia nas vizinhanças inferiores dos dois ângulos crı́ticos citados (Tassini e Rosa, 1982).
Nos dois casos, os coeficientes de transmissão no topo dos basaltos são expressivos e, como
as reflexões internas envolvem altos ângulos de incidência, os correspondentes coeficientes
também o são. Levando-se ainda em conta que um grande número de eventos — primários
e múltiplos — é assim gerado, entende-se porque as velocidades aparentes observadas na
Figura 2.64 tendem a se aproximar das máximas velocidades P e S do basalto, as quais
controlam os ângulos crı́ticos mencionados.
Esta linha de raciocı́nio permite entender apenas em parte as caracterı́sticas dos even-
tos vistos na Figura 2.64, uma vez que somente as intercalações das camadas de basalto
não são suficientes para explicar o forte padrão reverberante observado. A este respeito,
papel fundamental é exercido pelas caracterı́sticas da camada de sedimentos, em primeiro
lugar pelo fato de que as duas séries de eventos, P e S, apresentam ressonância evidente
234 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Fonte Receptor Superfície


Água
Sedimentos

Figura 2.66: Exemplo de trajeto de um evento espúrio com-


plexo, gerado em um vale submarino.

em freqüências similares, mesmo envolvendo tempos de propagação diferentes. Além


disso, aplicando-se a equação 2.8.26 aos parâmetros da camada de sedimentos, observam-
se resultados perfeitamente compatı́veis com os dados sı́smicos. Em particular, a primeira
harmônica prevista para as reverberações observadas na Figura 2.64, nos afastamentos
fonte-receptor próximos de zero, situa-se entre 5Hz e 10Hz, o que permite prever um
padrão similar ao da Figura 2.63.
Até agora, as múltiplas foram discutidas no contexto de um meio horizontal, sem
variação lateral de velocidade. Embora estas condições possam ser aplicáveis em muitas
circunstâncias, há que se considerar situações mais complexas, nas quais eventos espúrios
de difı́cil tratamento são gerados. A Figura 2.66 — que não corresponde a uma múltipla
convencional — pode ser usada como um exemplo de como tais eventos podem ser com-
plexos, mesmo no caso em que a velocidade não varia ao longo da região abrangida pela
propagação. O caso representado pode ser particularmente danoso, em função dos altos
coeficientes de reflexão que caracterizam o piso oceânico tı́pico.

2.8.3 As múltiplas e a aproximação Kirchhoff


Dois grupos de pesquisadores distintos, o de Weglein (Weglein et al., 1997; Carvalho, 1992)
e o de Berkhout (Verschuur et al., 1988; Berkhout e Verschuur, 1997a,b), demonstraram
que é possı́vel deduzir uma versão bi ou tridimensional da expressão 2.8.14, sem qualquer
aproximação, ou seja, respeitando a teoria da propagação de ondas. Neste caso, as
autoconvoluções unidimensionais dos eventos primários, presentes na mesma equação,
são transformadas em convoluções bi ou tridimensionais. Uma forma relativamente fácil
de entender o conceito, apresentada em seguida, baseia-se na aproximação Kirchhoff 35 .
Imagine-se um sistema de aquisição bidimensional constituı́do de uma fonte pontual
s0 , situada na superfı́cie livre (z = 0), cuja forma de onda seja caracterizada por um
impulso unitário na origem dos tempos. Considere-se agora a situação hipotética em
que o sinal gerado pela fonte s0 , depois de viajar pelo meio subjacente, dê origem a
um sismograma em que todos os eventos ainda não tenham sido afetados pela superfı́cie
livre, o que implica excluir também o efeito dos fantasmas. No domı́nio da freqüência
35
Com agradecimentos a Paulo M. Carvalho.
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 235

angular temporal, ω, o resultado é descrito pela função Ps0 (x, ω), onde x representa as
coordenadas da linha de receptores, no centro da qual se situa a fonte, na coordenada
x = x s0 .
Nestas condições, os eventos presentes no sismograma teoricamente obtido são todos
gerados em subsuperfı́cie, sem qualquer outra restrição. Ou seja, incluem não somente re-
flexões, mas também múltiplas internas como, por exemplo, aquelas geradas em situações
como a da Figura 2.66. Adicionalmente, cada um desses eventos pode, também sem qual-
quer restrição, ter sido afetado por todos os fatores de propagação atuantes abaixo da
superfı́cie36 .
Levando em conta que a fonte é um impulso unitário e se situa na superfı́cie, pode-se
assumir que a função Ps0 corresponde, simultaneamente, à transformada de Fourier de
dois diferentes campos: (1) o campo de ondas que, gerado pela fonte s0 , interage com o
meio subjacente e retorna à superfı́cie livre e; (2) a função de Green associada ao trajeto
entre a fonte s0 , os espalhadores elásticos existentes em subsuperfı́cie e os receptores. Para
ilustrar o conceito, tome-se o exemplo de uma difração isolada: ela é, simultaneamente,
o campo de ondas ascendentes e a resposta, ao impulso, do meio. O mesmo se aplica a
uma soma de difrações.
Aprofundando-se a idéia, imagine-se ainda que um conjunto de sismogramas como o
descrito tenha sido adquirido ao longo de uma linha sı́smica e que na posição de cada
receptor exista também uma fonte. Neste caso, é possı́vel dizer que, em cada uma das
posições superficiais envolvidas no levantamento, existe um campo de ondas ascendentes
e uma função de Green a ela associados, ambos hipoteticamente isentos de qualquer
fenômeno devido à superfı́cie livre.
Considere-se agora que se deseja estimar as múltiplas da superfı́cie livre corresponden-
tes a um sismograma em particular. Levando em conta que se conhece o campo de eventos
primários e todas as funções de Green necessárias, conclui-se que a versão geométrica do
problema proposto poderia ser resolvida com base no princı́pio de Huygens. Aplicado
ao caso, este princı́pio implica tratar as funções de Green como “ondas secundárias”, as
quais são geometricamente idênticas às “ondas primárias”. No processo, a superfı́cie livre
corresponde a um refletor que, interagindo com o campo de ondas incidentes, dá origem
ao sinal refletido, sinal este que, no caso, é “registrado” na própria superfı́cie livre.
Para ilustrar a discussão, parte-se de um meio 1.5-D, ou seja, um meio em que os
diferentes sismogramas obtidos ao longo de uma linha sı́smica são todos iguais. Esta
foi a condição em que se construiu a Figura 2.67, na qual se percebe que a tangente
às ondas secundárias — geradas com a geometria da reflexão primária — corresponde
à múltipla de primeira ordem produzida pela superfı́cie livre. Conclui-se portanto que,
em um sismograma registrado em um meio 1.5-D, a geometria de uma múltipla pode ser
reproduzida exclusivamente com base na geometria da reflexão primária responsável por
ela.
A Figura 2.67, ainda que geometricamente correta, obviamente nada diz sobre as
amplitudes e as formas de onda. Para que estas caracterı́sticas sejam levadas em conta,
faz-se uso da aproximação Kirchhoff (subitem 2.7.5), a qual possibilita, através da integral
36
Obviamente, o sismograma descrito é hipotético, uma vez que a Natureza não permite isolar
fenômenos até este nı́vel. Entretanto, sabe-se que é conceitualmente possı́vel gerar um sismograma
sintético que inclua todos os fatores de propagação e, ao mesmo tempo, exclua os efeitos da superfı́cie
livre. Trata-se de um artifı́cio teórico fundamental para a dedução que se segue.
236 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

1
M1
RP
Tempo (s)

4
−10 −5 0 5 10
Afastamento da fonte (km)
Figura 2.67: Representação esquemática da aplicação do princı́pio de Huygens
à geração, em um sismograma, de uma múltipla de primeira ordem (M1 ), a
partir da reflexão primária correspondente (RP) e de suas equivalentes obtidas em
outros sismogramas. Cada sı́mbolo • indica um ponto do sismograma usado para
a geração de uma onda secundária (linha fina), a qual tem a geometria da reflexão
primária obtida com a fonte na mesma coordenada horizontal e é representada
verticalmente abaixo do ponto escolhido, de acordo com um deslocamento dado
pelo tempo do mesmo ponto. O meio é do tipo 1.5D, ou seja, o refletor é horizontal
e a velocidade é constante (3000m/s).

de Kirchhoff, sintetizar de forma adequada um campo de ondas refletido em uma superfı́cie


relativamente simples como, tipicamente, é o caso da superfı́cie livre. Se, além disso, a
mesma superfı́cie for considerada horizontal, a aproximação Kirchhoff assume a forma
que se poderia denominar “aproximação Rayleigh”, uma vez que, neste caso, a integral
de Kirchhoff pode ser substituı́da pela de Rayleigh II. Aplicada à geração das múltiplas de
primeira ordem da superfı́cie livre, ainda em um meio 1.5-D, esta integral se transforma
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 237

na seguinte expressão37 :
Z  
∂Pg (x0 − x, ω)
Ms(1) (x0 − xs0 , ω) = rPs0 (x − xs0 , ω) dx (2.8.28)
0
∂z z=0

(1)
onde Ms0 representa, no domı́nio da freqüência, as múltiplas de primeira ordem corres-
pondentes a Ps0 , r representa o coeficiente de reflexão da superfı́cie livre e x0 indica a
posição do receptor escolhido. Por sua vez, Pg representa a transformada de Fourier do
registro correspondente a um agrupamento de fonte (ou receptor) comum, obtido com a
fonte (ou receptor) situada na coordenada x, de tal forma que, para x = xs0 , observa-se
a igualdade Pg = Ps0 .
A equação 2.8.28 é a representação matemática, no domı́nio da freqüência, das o-
perações descritas geometricamente através da Figura 2.67. Esta idéia torna-se mais
clara quando, na aplicação da mesma equação, admite-se um valor variável para x 0 e um
fixo para x (na figura, uma das posições identificadas pelo sı́mbolo •). Neste caso, um
único coeficiente de Ps0 , no afastamento fonte-receptor x − xs0 , é multiplicado por toda a
função ∂Pg (x0 − x, ω)/∂z, a qual é caracterizada pela fonte na posição x e os receptores
distribuı́dos de acordo com os afastamentos fonte-receptor x0 − x. Repetindo-se esta
operação para os diversos valores de x e acumulando os resultados, obtêm-se as múltiplas
de primeira ordem desejadas. Aliando-se estas idéias à própria forma da equação 2.8.28,
assumindo que r = −1 e negligenciando xs0 (que exerce um papel neutro), pode-se
transformá-la na seguinte expressão:

∂Pg (x, ω)
Ms(1) (x, ω) = −Ps0 (x, ω) ∗ (2.8.29)
0
∂z

onde ∗ denota convolução ao longo do eixo x.


A lógica empregada na dedução da equação 2.8.29 pode ser expandida para múltiplas
de qualquer ordem. Assim, para se gerar o conjunto de múltiplas de ordem k, basta levar
em conta que o campo de ondas ascendentes na superfı́cie deve corresponder ao conjunto
de múltiplas de ordem k − 1, enquanto a equivalência entre a função de Green e o campo
de ondas original, Pg , é mantida. Define-se desta forma o seguinte processo recursivo:

∂Pg
Ms(k) = −Ms(k−1) ∗ (2.8.30)
0 0
∂z
(k−1)
onde, para k = 1, Ms0 = Ps0 e, para simplificar a notação, removeram-se as coordena-
das presentes na equação 2.8.29.
A equação 2.8.30, que representa uma ordem especı́fica das múltiplas geradas na su-
perfı́cie livre, é fundamental para a sintetização matemática do campo total de ondas,
incluindo todos os eventos possı́veis, primários e múltiplos. O resultado — sem a in-
37
Observe-se que, nesta equação, não aparece o fator 1/2π, presente na integral de Rayleigh II. Isto se
deve ao fato de que ele foi incorporado à função de Green, uma vez que o impulso unitário que caracteriza
a fonte não foi multiplicado por 4π, ao contrário do que estabelece a equação 2.4.53. Observe-se ainda
que, para facilitar a análise subseqüente, subtraiu-se xs0 de x e x0 , de tal forma que d(x − xs0 ) = dx e
x0 − xs0 − (x − xs0 ) = x0 − x.
238 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

fluência do pulso sı́smico — é a seguinte série38 :


 
∂Pg ∂Pg ∂Pg ∂Pg ∂Pg ∂Pg
Ss0 = Ps0 ∗ δ(x − xs0 ) − + ∗ − ∗ ∗ +··· (2.8.31)
∂z ∂z ∂z ∂z ∂z ∂z

onde xs0 é a coordenada da fonte s0 , enquanto Ss0 representa, no domı́nio da freqüência, o


sismograma obtido, ou seja, Ss0 = Ss0 (x, ω). Obviamente, para se construir o sismograma
completo, há necessidade de repetir a aplicação desta expressão para diferentes valores de
ω e, depois, retornar ao domı́nio do tempo. No processo, ∂Pg /∂z pode ser computada no
domı́nio ω-Kx , no qual a derivada se transforma na multiplicação pelo fator iKz (equação
2.4.22).
A equação 2.8.31 admite formas mais compactas, uma das quais será utilizada na
discussão sobre a atenuação das múltiplas, no Capı́tulo 3. Para se obtê-la, coloca-se em
evidência a derivada ∂Pg /∂z, no que resulta a seguinte expressão:
 
∂Pg0 ∂Pg ∂Pg ∂Pg
Ss 0 = P s 0 − P s 0 ∗ δ(x − xs0 ) − + ∗ − ···
∂z ∂z ∂z ∂z
| {z }
∂Sg
∂z
Com este resultado, a equação 2.8.31 pode ser reescrita da seguinte forma:
 
∂Sg
Ss 0 = Ps0 ∗ δ(x − xs0 ) − (2.8.32)
∂z

onde Sg sintetiza a transformada de Fourier dos diferentes sismogramas envolvidos, cada


um deles com todas as suas múltiplas. Com base neste resultado, é possı́vel definir o
campo total de múltiplas através de:

X ∂Sg
Ms(k) = −Ps0 ∗ (2.8.33)
0
∂z
k=1

ou, com base na equivalência entre as integrais de Rayleigh I e II,



X ∂Ps0
Ms(k) = −Sg ∗ (2.8.34)
0
∂z
k=1

onde k é a ordem da múltipla. (Um exercı́cio para o leitor: se todo o campo Ps0 fosse
substituı́do pela transformada de Fourier de uma reflexão isolada — como a do fundo do
mar — e Sg fosse mantido intocado, qual seria o resultado da aplicação desta equação?)
Aplicado à expressão 2.8.31, o conceito de meio 1.5-D implica aceitar que os diversos
campos, Pg , cada um deles caracterizado por uma função com centro na posição de
uma fonte ou receptor comum, são iguais. Entretanto, sabe-se que Pg não é lateralmente
38
Este é um resultado compatı́vel com a série de espalhamento de Born, aplicada ao caso em que o
meio de referência é um meio-espaço homogêneo e isotrópico, tipicamente constituı́do de pura água (ver
Ikelle et al., 2003).
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 239

constante, como se observa, por exemplo, na presença de mergulho, ou de variação espacial


na velocidade, ou de ambas. A Figura 2.67 pode ser usada para ilustrar o fato de que esta
caracterı́stica não invalida a generalidade da teoria apresentada, em especial se o tema
for analisado com base no princı́pio da superposição. Neste caso, basta observar que,
em cada posição de fonte, a reflexão obtida no correspondente sismograma pode assumir
uma forma diferente, forma esta que, de acordo com o princı́pio de Huygens, influencia
adequadamente a geometria da múltipla resultante.
Em termos matemáticos, se for levada em conta a aplicabilidade da aproximação
Kirchhoff a meios lateralmente variáveis, induz-se que, na forma da equação 2.8.31, a
variação de Pg pode ser incorporada sem dificuldades. Esta caracterı́stica torna-se clara
através de uma avaliação da expressão 2.8.28: a coordenada x identifica uma posição
especı́fica de fonte (ou receptor) comum e, conseqüentemente, uma forma também es-
pecı́fica da função Pg . Por extensão, pode-se dizer que, também no caso das equações
2.8.32 a 2.8.34, admite-se a variação espacial de Sg .

2.8.4 O filtro estratigráfico


Um fenômeno em particular, relacionado às múltiplas internas, merece destaque: as
distorções causadas pelas múltiplas de camadas muito finas, com espessuras substancial-
mente menores do que o pulso sı́smico e até mesmo do que o intervalo de amostragem.
A atuação combinada de diversos desses eventos introduz, no pulso sı́smico, um efeito
semelhante ao gerado pela absorção (ver O’Doherty e Anstey, 1971; Schoenberger e Le-
vin, 1974; Richards e Menke, 1983). O operador correspondente, denominado por alguns
autores filtro estratigráfico, apresenta caracterı́sticas de fase mı́nima, já que é constituı́do
por uma combinação de expressões como a da equação 2.8.17 com o efeito da transmissão.
No texto que se segue, apresenta-se, com pequenas alterações, a dedução do filtro
estratigráfico obtida por O’Doherty e Anstey (1971). O modelo geológico adotado é
unidimensional e constituı́do de uma pilha de camadas de pequena espessura, a qual
é envolvida — acima e abaixo — por coeficientes de reflexão iguais a zero. Ou seja,
excluem-se do processo as múltiplas da superfı́cie livre. Em termos gráficos, o modelo
descrito pode ser resumido pelo exemplo esquemático da Figura 2.68, o qual é válido
para o caso bidimensional, ou para a representação no domı́nio τ -p.
A linha de raciocı́nio seguida por O’Doherty e Anstey (1971) implica analisar, com
base em critérios parcialmente estatı́sticos, a atuação isolada das diversas ordens das
múltiplas internas. No caso das múltiplas de primeira ordem, o filtro correspondente
resulta da combinação puramente determinı́stica, duas a duas, de todas as interfaces
existentes no meio, respeitando-se a diferença de tempo entre elas. No domı́nio da trans-
formada Z, esta operação leva à seguinte expressão:

M1 (Z) = −(r1 r0 + r2 r1 + · · · )Z − (r2 r0 + r3 r1 + r4 r2 + · · · )Z 2 − (r3 r0 + r4 r1 + · · · )Z 3 − · · ·

onde o expoente de Z representa o atraso da múltipla em relação à onda direta e o sinal


negativo aparece porque todos os coeficientes de reflexão são definidos para uma onda
que incide em cada interface na direção descendente. Observe-se que a função obtida
corresponde a uma parte da transformada Z da autocorrelação da série de coeficientes
240 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.68: Representação esquemática das


múltiplas internas que dão origem à versão bidimensi-
onal do filtro estratigráfico.

de reflexão multiplicada por −1. Ou seja, no domı́nio do tempo, a função m1 é dada por
N
X
m1 (l) = − rk rk−l , l>0 (2.8.35)
k=1

onde N é o número de interfaces e l é o lag, ou deslocamento da autocorrelação, definido


em número de amostras.
Com base na equação 2.8.35, pode-se concluir que os deslocamentos positivos da
autocorrelação da série de coeficientes de reflexão, correspondente à seção situada acima
de um ponto qualquer, é suficiente para se estimar as múltiplas internas de primeira ordem
que atingem o mesmo ponto. Observe-se que, para isto, não podem haver refletores acima
da fonte, o que significa desconsiderar as múltiplas da superfı́cie livre.
Ainda de acordo com a dedução de O’Doherty e Anstey (1971), o próximo passo
consiste em se estimar a função associada às múltiplas de segunda ordem. A intuição
sugere que deve haver alguma forma de obtê-las com base na expressão 2.8.35. Com efeito,
isto é possı́vel já que, como se viu no caso das múltiplas da superfı́cie livre, as múltiplas de
segunda ordem são geradas através de um processo convolucional envolvendo as múltiplas
de primeira ordem. Entretanto, no caso das múltiplas entre camadas, a multiplicidade
de interfaces envolvidas exige um tratamento mais detalhado.
Considere-se agora que se deseja obter o valor do coeficiente do filtro de múltiplas de
segunda ordem em um determinado atraso l em relação à onda direta. Analisando as
possı́veis combinações da série de coeficientes de reflexão com as múltiplas de primeira
ordem, de forma similar ao que foi feito para a dedução da equação 2.8.35, obtém-se a
seguinte expressão:
l−1 X
N k+j−1
X X
m2 (l) = rk rk−j ri ri−l+j (2.8.36)
j=1 k=1 i=1
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 241

Ou seja, as múltiplas de segunda ordem no atraso l resultam da combinação de dois


atrasos, j e l − j. Além disso, como o processo é causal, apenas as contribuições até o
atraso j = l − 1 estão envolvidas.
O próximo passo da dedução exige a adoção da seguinte premissa: a série de coe-
ficientes de reflexão é considerada estacionária, ou seja, suas propriedades estatı́sticas
não variam com o tempo. Esta caracterı́stica permite dizer, de acordo com a expressão
2.8.35, que o produto entre dois coeficientes de reflexão quaisquer, rk rk−l , tem, como valor
esperado, a razão −m1 (l)/N . Pode-se, assim, transformar a equação 2.8.36 na seguinte
aproximação:
l−1 XN k

X X m1 (l − j)
m2 (l) = − rk rk−j
j=1 k=1 i=1
N
ou
N
l−1 X  
X m1 (l − j)
m2 (l) ∼
=− rk rk−j k
j=1 k=1
N
ou, ainda,
N 
l−1 X   Xl−1 N
!
X m (j) m (l − j) X k
m2 (l) ∼
1 1
= k = m 1 (j)m 1 (l − j)
j=1
N N j=1
N2
k=1 k=1

Observe-se que para N suficientemente grande, como no caso, o somatório de k/N 2 tende
a 1/2. Isto significa que a última expressão pode ser reescrita da seguinte forma:
l−1
X
1
m2 (l) = 2
m1 (j)m1 (l − j), l>0 (2.8.37)
j=1

Uma simples inspeção da equação 2.8.37 permite identificá-la como a autoconvolução


da função m1 , seguida de uma divisão por 2. Ou seja, as múltiplas de segunda ordem po-
dem realmente ser construı́das exclusivamente com base nas múltiplas de primeira ordem,
sem nenhum conhecimento direto do meio. Lógica similar é empregada para se deduzir a
forma das ordens seguintes. Assim, levando em conta o papel do impulso unitário corres-
pondente à onda direta, caracteriza-se a transformada Z do filtro de múltiplas completo,
que atravessa as N interfaces do modelo, através da seguinte expressão:
1 2 1
M (Z) = 1 − B(Z) + B (Z) − B 3 (Z) + · · · (2.8.38)
2! 3!
onde B(Z) corresponde a uma versão truncada da transformada Z da autocorrelação da
série de coeficientes de reflexão, restrita a expoentes de Z maiores do que zero. Observe-se
que este resultado equivale à seguinte expressão:

M (Z) = exp [−B(Z)] (2.8.39)

Na dedução da equação 2.8.39, considerou-se que o sinal se propaga em uma só direção.
O equivalente ida-e-volta (two-way) pode ser obtido se for levado em conta que o filtro de
múltiplas, gerado na direção descendente e refletido abaixo da sucessão de N interfaces,
deve ser convolvido com o filtro gerado na direção ascendente. Adicionalmente, pode-se
242 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

demonstrar, com base na dedução da equação 2.8.35, que os dois filtros são idênticos.
Isto significa que, no domı́nio da transformada Z, o filtro de múltiplas ida-e-volta pode
ser obtido através da multiplicação do operador M (Z) por ele mesmo, o que equivale, na
equação 2.8.39, a multiplicar B(Z) por 2. Ou seja:

M 2 (Z) = exp [−2B(Z)] (2.8.40)

Até agora, nada foi dito a respeito do papel do coeficiente de transmissão. Consi-
derando que o sinal atravessa, nas duas direções, a sucessão de N interfaces, a perda
total de amplitude do filtro, devida ao coeficiente de transmissão, pode ser dada pela
equação 2.6.53. Observe-se, na mesma equação, que os termos do somatório envolvem
o quadrado dos coeficientes de reflexão, o que permite associar o resultado ao desloca-
mento nulo da autocorrelação correspondente. Desta forma, assumindo-se novamente que
a função refletividade é estacionária, pode-se transformar a equação 2.6.53 na seguinte
aproximação:  
1 1
TN ∼
= exp −C(0) + 2
C (0) − 3
C (0) + · · ·
2N 3N 2
onde C(0) é o valor, no deslocamento igual a zero, da autocorrelação da série de coefici-
entes de reflexão, cuja transformada Z é C(Z). Para valores suficientemente grandes de
N , obtém-se a seguinte aproximação, equivalente à equação 2.6.54:

TN ∼
= exp [−C(0)] (2.8.41)

Multiplicando as equações 2.8.40 e 2.8.41, obtém-se a seguinte estimativa da transfor-


mada Z do filtro associado às múltiplas entre camadas, denominado filtro estratigráfico:

F (Z) = exp [−2B(Z) − C(0)] (2.8.42)


De acordo com este resultado, o filtro estratigráfico apresenta as seguintes e importantes
caracterı́sticas: (1) tem espectro de amplitude controlado pela autocorrelação da série
de coeficientes de reflexão, C(Z); (2) é uma série causal, já que B(Z) é causal e; (3)
tem espectro de fase dependente da parte causal de C(Z), já que B(Z) = C(Z), para
expoentes de Z maiores do que zero.
Para representar o filtro estratigráfico no domı́nio da freqüência, obtém-se a transfor-
mada de Fourier da equação 2.8.42 através da substituição do valor de Z por exp(iω∆τ ),
onde ∆τ é o intervalo de amostragem (ver a equação 1.2.1). O resultado é:

F (ω) = exp [−2B(ω) − C(0)] (2.8.43)

Aplicando-se a este resultado o logaritmo neperiano e retornando ao domı́nio do tempo,


obtém-se o cepstrum do filtro estratigráfico, o qual é dado pela seguinte igualdade:

fˆ(τ ) = −δ(τ )C(0) − 2B(τ ) (2.8.44)

ou, já que, para τ > 0, a função B(τ ) é igual à função C(τ ),

fˆ(τ ) = −2C(τ )u(τ ) (2.8.45)

onde u(τ ) é a função degrau (Heaviside).


2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 243

Aplicando-se, à equação 2.8.45, a transformada de Fourier e submetendo o resultado


ao exponencial complexo, obtém-se a seguinte expressão para F (ω):
  
1
F (ω) = exp −C(ω) − i C(ω) ∗ (2.8.46)
πω

onde C(ω) é o espectro de potência da função refletividade. Com base neste resultado e
na teoria apresentada no item 1.5, pode-se concluir que o filtro estratigráfico tem espectro
de fase mı́nima. O leitor poderá comprovar esta caracterı́stica analisando as semelhanças
e diferenças entre o resultado obtido e as expressões 1.5.21 a 1.5.24 .
Para estabelecer a forma final do filtro estratigráfico, O’Doherty e Anstey introduzi-
ram, no espectro de potência da série de coeficientes de reflexão, C(ω), a normalização
pelo tempo duplo de trajeto τr = N ∆τ , o que resulta na função D(ω) = C(ω)/τr . Com
esta providência, a equação 2.8.46 pode ser representada da seguinte forma (ver, por
exemplo, Frazer, 1994):
F (ω) = exp(iω2zSst ) (2.8.47)
Nesta expressão, z é a distância vertical percorrida pela onda e Sst é uma função complexa
com dimensão de vagarosidade, ou inverso da velocidade, dada por
1
Sst = [DH (ω) + iD(ω)] (2.8.48)
ωv
onde v é a velocidade de propagação do meio (ou seja, v = 2z/τr ) e DH é o resultado
da convolução entre o filtro de quadratura, 1/πω, e o espectro de potência normalizado,
D(ω).
Analisando-se a expressão 2.8.47, percebe-se que o filtro estratigráfico pode ser des-
crito como um fenômeno de fase mı́nima que atua de forma recursiva. Esta caracterı́stica
é melhor explicitada através da seguinte equação39 :

S(τ − ∆τ, ω) = S(τ, ω) exp(iωv∆τ Sst ) exp (iω∆τ ) (2.8.49)

onde S(τ − ∆τ, ω) é a transformada de Fourier do traço sı́smico que seria obtido na
pseudo-profundidade indicada, τ − ∆τ , a partir da atuação do filtro estratigráfico sobre
a transformada de Fourier do traço correspondente à pseudo-profundidade τ . Ou seja,
a cada intervalo de pseudo-profundidade, o filtro e, conseqüentemente, o traço sı́smico
obtido são modificados.
Uma caracterı́stica importante do filtro estratigráfico é sua dependência com relação
ao comportamento espectral da série de coeficientes de reflexão. Como se viu no item
2.6, a autocorrelação da série de coeficientes de reflexão é, normalmente, azul, ou seja,
os componentes de alta freqüência apresentam maiores amplitudes do que os de baixa
freqüência. Esta tendência, observada por diversos autores (ver, por exemplo, Rosa e
Ulrych, 1991), faz com que o filtro estratigráfico, na forma da equação 2.8.46, atenue
mais fortemente os componentes de alta freqüência, atuando como um filtro corta-altas.
Nos casos estudados por Schoenberger e Levin (1974), a atuação do filtro estratigráfico
poderia ser responsável por uma fração entre um terço e metade da atenuação depen-
dente da freqüência. Ressalte-se, entretanto, que conclusões deste tipo são normalmente
39
Sugere-se ao leitor comparar esta equação com a expressão 2.8.13.
244 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

baseadas em perfis sônicos, com o apoio de registros de check-shot (tiros de controle).


Como o perfil sônico já envolve uma média das propriedades do meio, induz-se que o
efeito do filtro estratigráfico pode ser mais acentuado do que o previsto por aqueles e
outros autores.
Seguindo na mesma linha, Richards e Menke (1983) afirmam que a atenuação causada
pelas múltiplas (elástica) e por fricção (inelástica) são fenômenos aproximadamente aditi-
vos. Esta observação, parcialmente fundamentada em uma comparação entre as equações
2.8.49 e 2.8.8, pode ser resumida pela seguinte expressão, proposta pelos mesmos autores:

1 1 1
= + (2.8.50)
QT OT AL Qst Q

onde Q e Qst são os fatores de qualidade associados à absorção inelástica e ao filtro


estratigráfico, respectivamente.
Segundo Richards e Menke, a expressão 2.8.50 é bem representativa, com exceção
das situações em que ocorre grande absorção. Observe-se que, se o modelo implı́cito na
mesma expressão está correto, o espectro de potência normalizado da função refletividade
deveria ser descrito, com base em uma comparação entre as equações 2.8.10 e 2.8.47, por

ω
D(ω) = (2.8.51)
2Qst

Ou seja, D(ω) deveria ser proporcional à freqüência, o que está parcialmente de acordo
com os trabalhos já publicados sobre o tema (ver o item 2.6).
Na forma proposta por O’Doherty e Anstey (1971), a teoria do filtro estratigráfico
pode ser facilmente estendida ao caso em que a propagação é oblı́qua, bastando, para
isto, analisar o tema no domı́nio τ -p. Neste caso, induz-se, com base na discussão apre-
sentada no item 2.6, que o fator de qualidade estratigráfico, Qst , deve ser inversamente
proporcional ao parâmetro de raio, p. Este é um resultado, obtido também por Shapiro
et al. (1994), que certamente deve ser levado em conta quando se analisa a anisotropia
atribuı́da a folhelhos finamente laminados.
Deve-se ressaltar que a denominação “filtro estratigráfico” pode levar à indução de
que o microacamamento é o único fator responsável pela atenuação elástica dos com-
ponentes de alta freqüência do sinal sı́smico. Na verdade, esta é uma aproximação de
primeira ordem, induzida pela simplicidade de um meio acamadado. Uma denominação
mais adequada, capaz de incorporar outros aspectos do problema, é: “filtro de microes-
palhamento”. A razão para esta idéia é simples: a heterogeneidade do meio geológico,
responsável pelo filtro em discussão, não é unicamente associada ao microacamamento,
mas também a outras descontinuidades de pequena escala, as quais incluem até mesmo a
granulação das rochas e, conseqüentemente, introduzem um importante componente la-
teral no processo, semelhante ao ilustrado pela Figura 2.66. Observe-se que as dimensões
desse tipo de heterogeneidade impedem que ela seja adequadamente tratada através de
técnicas convencionais de imageamento. Esta caracterı́stica explica o recurso à estatı́stica,
adotado por O’Doherty e Anstey e por diversos outros pesquisadores que os sucederam
(ver, por exemplo, Banik et al., 1985; Frazer, 1994; Shapiro et al., 1994).
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 245

O P
0
φ
Profundidade (km)

θ
1
A

−3 −2 −1 0 1 2 3
Distância da fonte (km)

Figura 2.69: Frente de onda em um meio anisotrópico, superposta a uma


frente de onda correspondente a um meio isotrópico (linha tracejada), ambas
obtidas com a mesma velocidade P (2500m/s) após um tempo de percurso de
1s. Parâmetros: ε = 0.3, δ = 0.02; vP /vS = 2. O ponto destacado abaixo da
frente de onda, na coordenada horizontal da fonte (identificada pela letra O),
representa a profundidade que seria prevista com base na velocidade NMO
(equação 2.8.69). A teoria usada na construção da figura será discutida mais
adiante.

2.8.5 A anisotropia de meios TI


Em grande parte dos conceitos discutidos até agora, assumiu-se que as propriedades
elásticas de um meio homogêneo, em uma dada posição do espaço, não dependem da
direção de propagação. A principal conseqüência prática desta idéia é a de que a velo-
cidade de propagação na direção vertical é igual à velocidade de propagação em outra
direção qualquer. Na verdade, observa-se que as propriedades elásticas podem variar
substancialmente em função do azimute da análise, mesmo em meios litologicamente
homogêneos. Quando isto ocorre, o meio é dito anisotrópico.
Na escala sı́smica, a caracterização da anisotropia não deve ser baseada unicamente
na variação da velocidade com o azimute da análise, já que outros fenômenos podem levar
a um efeito similar. Em particular, observa-se que um meio isotrópico heterogêneo leva
necessariamente a uma dependência da velocidade média com o azimute da propagação,
mas tanto a energia quanto uma determinada fase do sinal (um pico, ou uma cavidade)
viajam com a mesma velocidade. Em conseqüência, o raio é perpendicular à frente de
onda, como no exemplo da Figura 2.40 (página 152). Na presença de anisotropia, a
variação microscópica da velocidade com o azimute afeta a aplicação do princı́pio de
Huygens de tal forma que o raio passa a não ser perpendicular à frente de onda, como se
vê no exemplo da Figura 2.69.
Outro aspecto importante do problema é a diferença entre anisotropia intrı́nseca e
extrı́nseca. Na primeira, a anisotropia é parte fundamental da substância analisada. Já
a anisotropia extrı́nseca é causada pela combinação de diferentes substâncias isotrópicas
e é observada somente quando o comprimento de onda do acamamento é substancial-
246 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

mente menor do que o comprimento de onda dominante do pulso sı́smico (ver Backus,
1962; Berryman, 1979). Assim, muitos folhelhos, por serem finamente laminados, podem
ser caracterizados como anisotrópicos, mesmo que cada uma de suas lâminas não seja
constituı́da de substâncias intrinsecamente anisotrópicas. Ressalte-se que, para que o
fenômeno seja efetivo, é também necessário que as propriedades elásticas das camadas
que se intercalam sejam razoavelmente diferentes.
Os folhelhos com as caracterı́sticas descritas têm sido usados como bons exemplos da
forma de anisotropia mais simples — a anisotropia de meios transversalmente isotrópicos,
ou TI —, nos quais as propriedades elásticas dependem apenas da profundidade mas não
da posição horizontal (mais especificamente, não variam na direção paralela às camadas).
No que diz respeito à influência do fenômeno sobre as velocidades sı́smicas, um artigo
clássico é o de Banik (1984). Na mesma linha, um exemplo particularmente importante é
o dos folhelhos geradores de petróleo, que correspondem, na direção vertical, a uma pilha
de intercalações entre minerais argilosos e matéria orgânica.
Percebe-se facilmente que, nesta discussão, está envolvido um problema de escala. Afi-
nal de contas, pode-se sempre imaginar um pulso sı́smico com tal conteúdo de freqüências
que as laminações de um folhelho qualquer poderiam ser tratadas como camadas rela-
tivamente espessas. Por outro lado, sabe-se que, no trajeto entre o topo e a base do
mesmo folhelho, a distância percorrida nas camadas de maior velocidade é proporcional
ao parâmetro de raio, p, o que se dá de forma independente da escala (ver as equações
2.5.28, 2.5.29 e 2.5.30). Assumindo-se que o folhelho seja constituı́do por intercalações de
materiais de alta e baixa velocidade, a conseqüência prática desta tendência é a seguinte:
quanto mais horizontal é o trajeto, maior é a velocidade média medida ao longo do raio.
Considere-se agora a condição necessária para a ocorrência de anisotropia em meios
TI, ou seja, cada camada do folhelho tem espessura muito menor do que o comprimento
de onda representativo do pulso sı́smico. No caso, a interferência dos eventos gerados
nas múltiplas interfaces leva a pelo menos três importantes conseqüências: (1) torna-se
muito difı́cil estabelecer como as velocidades P das camadas internas do folhelho afetam
a cinemática da propagação; (2) mesmo em trajetos curtos, as velocidades medidas nas
direções vertical e horizontal tendem a ser substancialmente diferentes; (3) o raio, caracte-
rizado pela linha reta que conecta os picos de máxima energia, deixa de ser perpendicular
à frente de onda quando o parâmetro de raio torna-se maior do que zero.
A caracterização de um meio como o descrito não é um problema trivial, apesar de
suas propriedades não variarem lateralmente. No que diz respeito à velocidade P, pode-se
adotar o conceito de meio efetivo, na forma proposta por Backus (1962). Com base no
mesmo trabalho, a velocidade P efetiva da rocha, vP E , medida na direção vertical, pode
ser dada por
s
ME
vP E = (2.8.52)
ρ̄

onde ρ̄ é a média aritmética das densidades. Por sua vez, ME é o módulo efetivo da onda
P, dado pela seguinte média harmônica:
!−1/2
1 X dn
ME = (2.8.53)
D n vP2 n ρn
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 247

onde D é a espessura total da rocha, dn é a espessura da lâmina n, enquanto vPn e ρn são


as respectivas velocidade e densidade.
A mesma idéia se aplica à velocidade de ondas cisalhantes, vS . Para ilustrar a aplicação
do conceito ao caso das ondas P, imagine-se um folhelho caracterizado pela intercalação
de lâminas ricas e pobres em matéria orgânica, cada uma delas com igual espessura
e propriedades acústicas dadas por40 : velocidades P, 2500m/s e 4500m/s; densidades,
2.19g/cm3 e 2.53g/cm3 . Aplicada ao caso, a equação 2.8.52 leva a uma velocidade P,
avaliada na direção vertical, igual a 3032m/s, portanto menor do que a velocidade média
convencional, obtida pela razão entre a espessura e o tempo teórico de trajeto, que é
igual a 3214m/s. No mesmo caso, a velocidade média horizontal tenderia à do material
de maior velocidade, ou seja, 4500m/s.
Se o leitor estudou os subitens anteriores, ele poderá estar pensando — talvez corre-
tamente — que a anisotropia gerada em folhelhos laminados é um fenômeno associado às
múltiplas de camadas finas e, mais especificamente, a uma versão generalizada do filtro
estratigráfico. Neste contexto, a propagação de ondas em meios TI envolve a dispersão
dependente da freqüência, de acordo com a qual a velocidade de propagação é função
da freqüência e, em conseqüência, a fase do pulso sı́smico varia continuamente ao longo
do tempo, mesmo quando a avaliação é feita perpendicularmente ao acamamento. Le-
vando em conta que o fator de qualidade estratigráfico, Qst , varia com o parâmetro de
raio, admite-se forçosamente que a intensidade da dispersão dependente da freqüência
também varia com o mesmo parâmetro. O leitor interessado em aprofundar a análise
deste tema pode recorrer, por exemplo, a Shapiro et al. (1994)41 .
Por outro lado, pode-se imaginar um meio em que as propriedades elásticas das
lâminas, mesmo substancialmente diferentes entre si, não caracterizam fortes contras-
tes elásticos e, portanto, inibem a atuação do filtro estratigráfico. Para isto, basta que,
nas interfaces correspondentes, a impedância acústica e a razão de Poisson não variem,
mas a densidade e a velocidade o façam. Em um meio com tais caracterı́sticas, é con-
veniente tratar a propagação das ondas como um fenômeno puramente anisotrópico, o
que significa dizer que a velocidade não depende da freqüência e varia exclusivamente em
função da direção de propagação.
Para simplificar a análise do tema, considere-se o caso de um meio constituı́do de
uma única camada de folhelho finamente laminado. Estas são as condições em que se
construiu, de forma caricatural, a Figura 2.70. Na figura, o sinal gerado na fonte O atinge
o ponto A no tempo τ . No mesmo ponto, a frente de onda não é perpendicular ao raio,
o que se deve ao fato de a velocidade depender do azimute de propagação. Considere-se
agora o trajeto do ponto A até o ponto B, o qual é atingido no tempo τ + ∆τ . Não é
difı́cil concluir que, no caso, a seguinte igualdade é aplicável:
1
|∇τ | =
vf
onde ∇τ é o gradiente do escalar τ que define a frente de onda e vf é velocidade de fase,
40
A intensidade da anisotropia usada neste exemplo foi inspirada no caso de um folhelho gerador real,
cujas propriedades elásticas foram medidas no Centro de Pesquisas da Petrobrás por J. Lira.
41
Uma das conclusões deste interessante trabalho, que estende os resultados de O’Doherty e Anstey
(1971), é a de que, na faixa de freqüências sı́smicas, a dispersão dependente da freqüência pode ser mais
importante do que a anisotropia. No trabalho, os autores assumiram um modelo estocástico para as
heterogeneidades e não levaram em conta sua variação com a profundidade.
248 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

O P

φ
∆θ ∆θ
A
Profundidade

C
φ−θ
τ θ
B D

∆τ
τ+

Distância

Figura 2.70: Geometria da relação entre o raio e a frente de onda em um


meio TI. As retas identificadas por τ e τ + ∆τ são tangentes às frentes de onda
centradas no ponto P e observadas nos pontos A e B.

ou seja, a velocidade com que avança a frente de onda ao longo da direção normal a ela,
definida pelo ângulo de fase, θ.
Observe-se entretanto que, no mesmo tempo τ + ∆τ , a onda atingiu também o ponto
C, o qual se alinha com a fonte O e o ponto A. Considerando as dimensões envolvidas,
isto significa que a velocidade correspondente ao trajeto AC, denominada vg , é neces-
sariamente maior do que a velocidade correspondente ao trajeto AB. Por extensão, a
energia que abandona a fonte não está viajando de fato com a velocidade v f mas sim com
a velocidade vg , a qual é a velocidade efetivamente medida no ponto C. Percebe-se assim
a analogia entre as velocidades envolvidas e as velocidades de fase e de grupo.
Analisando-se a Figura 2.70, pode-se agora perguntar: (1) qual é a relação entre o
ângulo de fase, que caracteriza a frente de onda, θ, e o ângulo que define o trajeto do
raio, φ? (2) qual é a relação entre a velocidade de fase, vf , e a velocidade de propagação
ao longo do raio, vg , ou seja, entre os pontos A e C? Para responder a estas perguntas,
considere-se que as retas identificadas por τ e τ + ∆τ são tangentes a duas frentes de
onda nos pontos A e B, ambas centradas no ponto P . Aplicam-se ao caso as seguintes
igualdades:
2 2 2
AC = AB + BC = (vg ∆τ )2 (2.8.54)

e
BC = AB tan (φ − θ) = vf ∆τ tan (φ − θ) (2.8.55)

Observe-se que, para um ponto fixo P , a distância BC pode também ser relacionada à
variação do ângulo de fase, ∆θ, e, em conseqüência, à variação da velocidade de fase,
∆vf . Se ∆θ for considerado um ângulo infinitesimalmente pequeno, a relação obtida é
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 249

dada por
BD ∆vf
BC = = ∆τ (2.8.56)
∆θ ∆θ
No limite em que ∆τ tende a zero, as expressões 2.8.54, 2.8.55 e 2.8.56 permitem a
obtenção das seguintes igualdades:
1 dvf
tan (φ − θ) = (2.8.57)
vf dθ
ou, com base em relações trigonométricas,
dvf
vf tan θ +
tan (φ) = dθ (2.8.58)
dvf
vf − tan θ

e, escrevendo o teorema de Pitágoras em termos de produtos entre velocidade e tempo,
 
2 2
dvf 2
vg = v f + (2.8.59)

Conforme demonstrou Berryman (1979), o último resultado pode também ser obtido com
base na definição da velocidade de grupo, ou seja,
 2  2  
2 dω dθ dω dθ 2
dvf 2
vg = + = vf + (2.8.60)
dθ dKx dθ dKz dθ
Com as expressões 2.8.58 e 2.8.59, criam-se condições para obter a velocidade com a
qual se estima o tempo de trajeto em um meio TI. No caso de uma camada homogênea
como a da Figura 2.70, aplica-se a seguinte expressão:
z
t= (2.8.61)
vg cos φ

onde z é a profundidade até onde se deseja estimar o tempo de trajeto.


Nas aplicações práticas da equação 2.8.61, é necessário estimar vg e, portanto, estabe-
lecer a relação entre a velocidade de fase e a velocidade P do meio. Para isto, recorre-se
à versão generalizada da lei de Hooke, a qual estabelece a relação entre esforço e de-
formação em qualquer tipo de meio. Nesta linha, uma série de trabalhos dedicados ao
tema, que inclui Backus (1962), Berryman (1979), Thomsen (1986), Tsvankin e Thomsen
(1994), Alkhalifah e Tsvankin (1995) e Tsvankin (1996), permitiu a obtenção da seguinte
expressão:
 s 
2 2
vf (θ) α 2ε sen θ 2 2
2(ε − δ) sen 2θ 
2
= 1 + ε sen 2 θ − 1 − 1+ − (2.8.62)
vP 2 α α

onde α = (vP2 − vS2 )/vP2 , sendo vP e vS as velocidades efetivas, P e S, do meio. Por sua
vez, ε e δ são constantes introduzidas por Thomsen (1986) e definidas, em termos da
velocidade de fase, por
v2 − v2
ε= h 2 P (2.8.63)
2vP
250 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

e  2
2 vq2 − vP2 α−ε α 2 + ε2
δ= 2
+ − (2.8.64)
α vP 2 2α
onde vh e vq são as velocidades de fase vf (π/2) e vf (π/4), ou seja, medidas nas direções
θ = 900 e θ = 450 .
A equação 2.8.62 não é linear e, além disso, exige o conhecimento da razão vP /vS .
Uma versão mais simples da mesma equação, obtida por Thomsen (1986), e que se baseia
na idéia de anisotropia fraca — válida para módulos de ε e δ próximos de zero —, é a
seguinte aproximação:
 
v̂f (θ) ∼
= vP 1 + 2δ sen 2 θ + 2(ε − δ) sen 4 θ (2.8.65)

No caso em que ε = δ, tem-se um resultado sem qualquer aproximação, que corresponde


à chamada anisotropia elı́ptica, e que é dado por

vf (θ) = vP (1 + 2δ sen 2 θ) (2.8.66)

Com as expressões obtidas até agora, pode-se entender melhor a Figura 2.69, a qual
representa um exemplo simples de anisotropia em um meio TI. A mesma teoria foi usada
para ilustrar, através da Figura 2.71, a relação entre o ângulo de fase, θ, e as razões
vg /vP , vf /vP e φ/θ. Percebe-se, na figura, que as velocidades de fase e de grupo são
iguais quando os ângulos de fase são 00 e 900 . O mesmo ocorre com a relação entre os
ângulos de fase e de grupo quando θ = 900 mas não quando θ = 00 , o que se deve ao fato
de que, no limite em que θ tende a zero, φ tende a θ(1 + 2δ).
As equações 2.8.57 a 2.8.64, que não incluem qualquer aproximação, são de aplicação
prática relativamente difı́cil, particularmente no contexto da técnica CDP, para a qual
é necessário estabelecer relações simples entre as propriedades do meio e os tempos de
reflexão. Estas foram as razões que motivaram Alkhalifah e Tsvankin (1995) a, com
base nos trabalhos de Hake et al. (1984) e Tsvankin e Thomsen (1994), obter a seguinte
expressão42 (ver as equações 2.5.56 a 2.5.59):

2 x2 2ηx4
t = t20 + 2
− 2 (2.8.67)
vN MO vN M O [t20 vN
2 2
M O + (1 + 2η)x ]

onde t é o tempo de reflexão, x é o afastamento entre a fonte e o receptor, v N M O é


a velocidade válida para o limite em que x tende a zero e η é uma constante definida
(exatamente) por
ε−δ
η= (2.8.68)
1 + 2δ
Para se estabelecer a expressão que descreve a velocidade NMO, recorre-se à discussão
apresentada no subitem 2.5.2 e, em particular, à seguinte equação, a qual é válida para
pequenos valores de x:
dt sen θ x
p= = = 2
dx vf vN M O t
42
Alkhalifah e Tsvankin (1995) demonstraram que a razão vS /vP influencia pouco o resultado. Desta
forma, a variável α, na equação 2.8.62, pode ser considerada igual a 1.
2.8. FONTES DE DISTORÇÃO DO SINAL SÍSMICO 251

160

150

C
140
Percentagem

130
A

120

110

100
0 30 60 90
Ângulo de fase (graus)

Figura 2.71: Razões, em percentagem: (A) vg /vP ; (B) vf /vP ; (C) φ/θ. A
linha tracejada representa, também em percentagem, a razão v̂ f /vP (equação
2.8.65). Parâmetros: ε = 0.5; δ = 0.1; vP = 2000m/s e; vP /vS = 2.

Levando em conta que t = x/vg sen φ, este resultado se transforma em


sen θ vg sen φ
= 2
vf vN M O

Uma vez que, no limite em que x tende a zero, vg = vf = vP e sen φ/ sen θ = 1 + 2δ,
pode-se obter o seguinte resultado, aplicável a uma camada isolada (ver Thomsen, 1986):
 
2 sen φ
vN M O = lim vg vf = vP2 (1 + 2δ) (2.8.69)
x→0 sen θ
No caso de múltiplas camadas, a velocidade NMO é computada de forma similar à da
velocidade RMS (equação 2.5.60). O resultado é:

2 1X 2
vN MO = v (1 + 2δi )∆t0,i (2.8.70)
t0 i Pi

onde ∆t0,i é o tempo vertical na camada i e t0 é o tempo vertical total.


Nos casos mais tı́picos, a constante η tende a ser positiva e menor do que 0.2, o que
corresponde, grosseiramente, a valores de ε entre 0 e 0.2 e a valores de δ em torno de
zero. Nestas circunstâncias, as reflexões correspondentes a traços sı́smicos registrados
na presença de afastamento fonte-receptor apresentam tempos de trajeto reduzidos pela
maior velocidade de propagação horizontal, ou subhorizontal, em relação à vertical. Esta
é uma afirmação que pode ser constatada na Figura 2.72, na qual se observam erros
nas estimativas de tempo de reflexão obtidas com a aproximação hiperbólica, usando
252 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

50

40

30
A
20 B
Erro (ms)

10

−10 A B

−20

−30
0 1 2 3 4
Razão afastamento/profundidade

Figura 2.72: Erro nos tempos de reflexão, estimados em um meio TI, no caso
de um refletor situado a uma profundidade de 2500m, para uma velocidade P
de 2500m/s. As diferenças de tempo positivas correspondem aos erros obtidos
com a aproximação hiperbólica e velocidade também igual a 2500m/s. As
negativas correspondem ao erro obtido com a equação 2.8.67. Parâmetros:
(A) ε = 0.3, δ = 0.02; (B) ε = 0.1, δ = 0.02; nos dois casos, v P /vS = 2.

vN M O = vP , e com a equação 2.8.67. Os tempos corretos foram calculados com a expressão


2.8.61.
Na forma descrita até agora, a anisotropia de meios TI apresenta um eixo de simetria
vertical, o que caracteriza o subtipo denominado anisotropia polar e identificado pela
sigla VTI (Vertical TI). Um outro subtipo do caso TI é a anisotropia azimutal, a qual é
matematicamente idêntica à anisotropia polar, mas com rotação do eixo de simetria. Um
caso particular desse tipo de anisotropia é identificado pela sigla HTI (Horizontal TI).

2.9 O Pulso Sı́smico e seus Componentes


Denomina-se pulso sı́smico a forma de onda produzida pela fonte de energia elástica
empregada no registro dos dados sı́smicos. Uma análise superficial permite induzir que
a série de coeficientes de reflexão, em um traço sı́smico, é convolvida com uma forma de
onda que é o efeito exclusivo da atuação da fonte sı́smica. Verifica-se, na verdade, que
o pulso sı́smico, como registrado, resulta da convolução da assinatura da fonte com uma
série de diferentes formas de onda, algumas variáveis com o tempo e a distância.
Para simplificar a análise, considere-se, por um momento, que a forma de onda asso-
ciada ao pulso sı́smico, registrada em um determinado receptor, não varia dentro de uma
janela de tempo e distância estabelecida. Nestas circunstâncias, a mesma forma de onda
pode ser definida com base na seguinte equação, a qual corresponde a uma simplificação
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 253

de caráter didático (para um tratamento mais rigoroso, ver o item 3.2):

p(t) = w(t) ∗ i(t) ∗ h(t) ∗ g(t) ∗ a(t) ∗ e(t) (2.9.1)

onde w(t) é a assinatura da fonte, propriamente dita. Os demais termos são as respostas,
ao impulso, dos seguintes processos: i(t), o instrumento, ou sismógrafo, com seus filtros;
h(t), o geofone, ou hidrofone; g(t), a combinação dos fantasmas da fonte e dos receptores;
a(t), a combinação dos arranjos de tiro e receptores e; e(t), o filtro da terra.
Com exceção do filtro da terra, todos esses componentes são discutidos em seguida,
com ênfase na influência de cada um deles sobre a forma do pulso sı́smico. Ressalte-
se que se poderia especificar mais algumas fontes de distorção do pulso sı́smico, como
o acoplamento da fonte e dos receptores, cujos efeitos são desprezados aqui, por dois
motivos: (1) a variação lateral desse tipo de fenômeno, nas operações terrestres, é muito
grande, tornando-se difı́cil modelá-lo; (2) no mar, por outro lado, ele se torna pouco
importante.

2.9.1 Assinatura da fonte


A assinatura da fonte apresenta formas muito variáveis, em função do tipo de equipamento
usado para gerar energia. Sob esse aspecto, as principais fontes sı́smicas podem ser
classificadas em três grandes grupos: (1) fontes com forma de onda controlada; (2) fontes
explosivas, que liberam energia em um tempo muito curto ou que, através de técnicas
adequadas de aquisição, produzem uma forma de onda com esta caracterı́stica e; (3)
fontes com forma de onda não controlada que liberam energia de forma relativamente
lenta, gerando um pulso que, para ser adequadamente deconvolvido, exige a gravação
durante a aquisição dos dados sı́smicos.
Entre as fontes com forma de onda controlada, está o Vibroseis. A duração em tempo
de um pulso emitido pelos vibradores é preestabelecida e pode alcançar até dezenas de
segundos. Na Figura 2.73, mostra-se um exemplo esquemático desse tipo de pulso. Nos
termos do modelo convolucional, poder-se-ia questionar a validade de se usar um pulso
de tão longa duração, que obviamente impede a individualização segura de refletores.
Entretanto, como o sinal gerado pelos vibradores é conhecido, pode-se aplicar um filtro
de forma para reduzi-lo a um pulso de curta duração. No caso, isto é feito através de
uma correlação cruzada entre o traço sı́smico e o pulso piloto do Vibroseis, que é gravado
nas operações normais de registro de uma linha sı́smica. A forma de onda resultante,
desprezadas as distorções inerentes ao método, é grosseiramente equivalente, mas não
igual, a uma função de autocorrelação do pulso piloto (ver a Figura 2.73 e Ziolkowski,
1991).
As fontes explosivas mais conhecidas são a dinamite e o air-gun, ou canhão de ar
comprimido. A primeira delas, quando usada em bacias terrestres, gera normalmente uma
forma de onda de curta duração, com as maiores amplitudes concentradas nos primeiros
20ms de dados (ver Sharpe, 1942, 1944; Ziolkowski, 1993). Já os canhões de ar, usados no
mar, produzem formas de onda mais longas, por causa da formação de bolhas de ar (ver
Ziolkowski et al., 1982). Entretanto, com a utilização de canhões especiais, distribuı́dos
de forma adequada, o pulso resultante torna-se uma forma de onda substancialmente
mais reduzida. Isto pode ser confirmado na Figura 2.74, na qual se pode ver um pulso de
254 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.73: Pulso sı́smico (esquemático) de Vibroseis.

Figura 2.74: Pulso sı́smico de air-gun após remoção dos efeitos do


instrumento e do fantasma.

air-gun, parcialmente isento dos efeitos dos fantasmas e do instrumento, restando ainda
os do receptor e do arranjo de tiro, juntamente com a assinatura da fonte. Na Figura
2.4 (página 71), pode-se ver o mesmo pulso antes da deconvolução que levou ao pulso da
Figura 2.74.
Em função da rápida liberação de energia propiciada pelas fontes explosivas, as for-
mas de onda resultantes apresentam caracterı́sticas muito próximas de um pulso de fase
mı́nima, como se pode inferir com base na Figura 2.74. Assim, esse tipo de fonte torna-
se especialmente adequado para a aplicação de filtros inversos causais, ou seja, para a
deconvolução de fase mı́nima, conforme se verá no Capitulo 3. Ressalte-se que a forma
de onda da Figura 2.74, obtida no mar, pode, como primeira aproximação, representar
também a assinatura da fonte correspondente à dinamite, em terra.
Entre as fontes com forma de onda não controlada que exigem a gravação do pulso
correspondente, as mais conhecidas são o Vaporchoc e o water-gun, ou canhão de água.
A primeira delas foi muito usada na década de 1970. Ambas as fontes produzem pulsos
com caracterı́sticas de fase misturada, tornando-se, por isso, pouco adequadas para a
aplicação de deconvolução de fase mı́nima. Visando compensar essa deficiência, a forma
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 255

Figura 2.75: Respostas de dois filtros do instrumento DFS-V (decli-


vidades de 18 e 72dB/oitava).

de onda gerada pela fonte é gravada simultaneamente aos dados sı́smicos, facilitando,
portanto, a aplicação de filtros de forma, durante o processamento.

2.9.2 Instrumento e receptores


Entre as distorções sofridas pelo pulso sı́smico, cita-se a gerada pelo próprio instrumento
de registro. Na Figura 2.75, estão representadas as respostas, ao impulso, do instrumento
DFS-V, no caso de dois filtros tı́picos das décadas de 1970 e 1980, registrados com intervalo
de amostragem de 4ms: 8-64Hz e 8-90Hz. Pode-se observar que, em especial no caso do
primeiro filtro, a forma de onda tem um lobo lateral bastante proeminente. Assim,
mesmo que a assinatura da fonte seja um impulso unitário e as demais distorções sejam
desprezadas, o pulso sı́smico resultante teria a forma da resposta do instrumento, a qual,
em muitos casos, não permite sequer identificar com segurança a polaridade de uma
reflexão.
A evolução da tecnologia aplicada ao método sı́smico, seja na aquisição, seja no pro-
cessamento, tem tornado possı́vel a adoção de filtros de campo que, na faixa superior
do espectro de freqüências, objetivam primordialmente o controle do efeito de álias, en-
quanto que, na faixa inferior, atenuam apenas os componentes realmente próximos de
zero (tipicamente, na faixa de 0 a 3Hz). Em conseqüência, o tamanho relativo dos lobos
laterais perde importância, em comparação, por exemplo, com os dois filtros da Figura
2.75.
Nesta evolução, um tema em particular merece destaque: a tecnologia Σ-δ, que passou
a ser empregada nos equipamentos de registro a partir dos anos 199043 . Com ela, tornou-
43
Uma descrição simples desta tecnologia, que é empregada na conversão de dados analógicos para
digitais e foi inicialmente utilizada na indústria fonográfica, pode ser encontrada no trabalho de Helbig
(1998).
256 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

1.00

0.75
Amplitude

0.50

0.25

−0.25
−50 0 50 100 150
Tempo (ms)

Figura 2.76: Resposta, ao impulso, de um instrumento Aran. O in-


tervalo de amostragem é de 2ms e os parâmetros dos filtros são: corta-
baixas de 3Hz, corta-altas de 205Hz, declividades de 24 e 580dB/oitava,
respectivamente. (Dados fornecidos por M. Gontijo dos Santos e M.
Sérgio Costa).

se possı́vel usar filtros digitais, da famı́lia FIR (Finite-duration Impulse Response), que
admitem espectro linear de fase e a possibilidade de posicionar a máxima amplitude no
tempo t = 0. Na Figura 2.76, pode-se ver a resposta, ao impulso, de um exemplo desta
geração de instrumentos.

Considere-se agora a resposta, ao impulso, dos receptores, h(t). Neste caso, a corres-
pondente distorção de fase pode, dependendo das circunstâncias e do tipo de receptor,
ser bastante significativa. Na aquisição de dados sı́smicos, três tipos de receptor, ou sen-
sor, têm sido usados: geofone, hidrofone e acelerômetro. Dos três, o que exige análise
mais profunda é o geofone, uma vez que os outros dois apresentam resposta, ao impulso,
aproximadamente igual a um impulso unitário, conseqüentemente afetando muito pouco
a forma do sinal sı́smico. No caso particular do acelerômetro, isto se deve ao uso de sen-
sores sofisticados, da famı́la MEMS (sigla em inglês para sistema micro-eletro-mecânico),
que não apresenta as deficiências dos equipamentos antigos. Quanto ao hidrofone, um
sensor piezoelétrico, deve-se fazer uma ressalva: a eventual conexão com um transforma-
dor faz com ele se comporte de forma similar a um geofone e, portanto, possa ser tratado
da mesma forma.

No caso de um geofone, é possı́vel demonstrar que os espectros de amplitude e fase de


2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 257

h(t) são descritos pelas seguintes expressões (ver Aki e Richards, 1980, páginas 478-482)44 :

1
A(ω) = q (2.9.3)
(1 − R2 )2 + (2aR)2

e  
−1 2aR
φ(ω) = − tan (2.9.4)
(1 − R2 )
onde a é o fator de amortecimento e R é a razão entre a freqüência angular de ressonância
ω0 e a freqüência angular ω, ou seja,
ω0
R=
ω
A tı́tulo de exemplo, os espectros de amplitude e fase correspondentes a um geofone
— com freqüência de ressonância de 10Hz e fator de amortecimento igual a 0.7 — são
apresentados na Figura 2.77. Como em todos os geofones do mesmo tipo, a fase, na
freqüência de ressonância, é igual a −90 graus, de acordo com a convenção adotada aqui.
Não se percebe, na figura, a importância do fator de amortecimento. A este respeito, deve-
se dizer que, se a se aproximasse de zero, a amplitude, na freqüência de ressonância, seria
muito alta. Para evitar este problema e tornar o espectro de amplitude de h(t) similar
ao de um filtro corta-baixas,√os fatores de amortecimento devem ser relativamente altos.
Um valor representativo é √ 2/2, o qual redunda em uma amplitude, na freqüência de
ressonância, também igual a 2/2.
Na Figura 2.78, vê-se a forma da função h(t) correspondente aos parâmetros usados
na construção da Figura 2.77. Vê-se também o efeito da filtragem da mesma resposta com
três faixas de freqüência distintas, filtragem esta aplicada através de produtos no domı́nio
da freqüência. É digno de destaque, nas duas figuras, o fato de que um geofone trata
com pequena distorção de fase e amplitude os componentes de freqüência mais alta, ao
mesmo tempo em que altera significativamente os componentes situados nas vizinhanças
e abaixo da freqüência de ressonância, na qual ele se comporta praticamente como um
acelerômetro.
Geofones, hidrofones e acelerômetros transformam em eletricidade grandezas fı́sicas
diferentes, conforme resumido na Tabela 2.2, a qual foi construı́da com base em conceitos
apresentados no item 2.4. No caso de um geofone tı́pico, cuja grandeza fı́sica envolvida —
a velocidade de partı́culas — é vetorial, existe a possibilidade de se determinar o sentido
da onda e, na aquisição com três componentes (3C), também a direção. O mesmo ocorre
44
Também com base no livro de Aki e Richards (1980), particularmente no texto das páginas 480 a
482, é possı́vel obter uma descrição direta da função h(t). É ela:

 ω0 ∆t exp(−aω0 t)  2  

 2a − 1 sen (ω0 At) − 2aA cos (ω0 At) , para a < 1, t > 0
 A
h(t) = ω0 ∆t (ω0 t − 2) exp(−ω0 t), para a = 1, t > 0
n o
 ω0 ∆t (a − B)2 exp [−ω0 t (a − B)] − (a + B)2 exp [−ω0 t (a + B)] , para a > 1, t > 0



2B
√ √ (2.9.2)
onde ∆t é o intervalo de amostragem, A = 1 − a2 e B = a2 − 1. Nos três casos, a função h(t) é igual
a zero para t < 0 e é estimada numericamente quando t = 0.
258 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

100
Amplitude (%)

50

0
0 20 40 60 80 100
Freqüência (Hz)
0
Fase (graus)

−90

−180
0 20 40 60 80 100
Freqüência (Hz)
Figura 2.77: Espectros teóricos de amplitude e de fase corresponden-
tes a um geofone com fator de amortecimento de 0.7 e freqüência de
ressonância de 10Hz.

com o acelerômetro, o qual pode ser “reduzido” a um geofone através de uma integração,
ao longo do eixo dos tempos, do sinal obtido. Quanto ao hidrofone, que é sensı́vel à
variação de pressão, não há condições de se definir direção e sentido da onda.
Para reforçar a diferença entre um geofone e um hidrofone, considere-se o caso em
que o primeiro é um equipamento convencional, voltado para o registro do componente
vertical da velocidade de partı́culas. Neste caso, levando em conta a incidência oblı́qua,
a correspondente medida é dada por
∂uz ∂u
= cos θ (2.9.5)
∂t ∂t
onde u é o deslocamento de partı́culas medido na direção em que a onda se propaga
(não é um vetor) e θ é o ângulo que o raio faz com a direção vertical. Por outro lado,
demonstrou-se no item 2.4 que a variação de pressão, p, e a velocidade de partı́culas,
∂u/∂t, se relacionam através da seguinte expressão:

∂u
p = −vρ (2.9.6)
∂t
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 259

0−20Hz

0
Amplitude

0−40Hz
0

0−60Hz
0

−20 0 20 40 60 80
Tempo (ms)
100

75
Amplitude (%)

50

25

−20 0 20 40 60 80
Tempo (ms)

Figura 2.78: Resposta, ao impulso, de um geofone (o mesmo da Figura


2.77), na forma original (embaixo) e convolvida com três diferentes fil-
tros corta-altas de fase nula e declividade igual a 42dB/oitava (no alto).
Os pulsos filtrados foram normalizados.

Combinando-se as duas expressões, obtém-se o seguinte resultado:

∂uz p
= ∓ cos θ (2.9.7)
∂t vρ

onde, nas aplicações práticas, o sinal ∓ depende da convenção adotada.


Para ilustrar a importância da equação 2.9.7, admita-se que dois sistemas de registro,
um feito com geofones, outro com hidrofones, tenham sido utilizados para se obter dados
sı́smicos em uma mesma posição espacial. Considere-se agora que as respostas, ao im-
pulso, dos dois equipamentos de registro, incluindo os sensores, tenham sido convertidas
em impulsos unitários. Neste caso, a equação 2.9.7 permite a seguinte conclusão: os
260 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Receptor Grandeza fı́sica Expressão


∂~u
Geofone Velocidade de partı́culas
∂t
Hidrofone Variação de pressão −v 2ρ∇ • ~u
∂ 2~u
Acelerômetro Aceleração de partı́culas
∂t2
Tabela 2.2: Os três principais tipos de receptor e as correspon-
dentes grandezas fı́sicas. Nas expressões, ~u é o vetor de desloca-
mento de partı́culas, ∇ • ~u é um escalar correspondente à soma
das deformações nos três eixos espaciais (ver a equação 2.4.5), en-
quanto v e ρ são a velocidade e a densidade, medidas na posição
do receptor.

sinais obtidos com os dois diferentes sensores devem ser proporcionais entre si e ambos
devem apresentar o mesmo espectro de fase, se uma só convenção de polaridade tiver sido
usada. Esta ressalva é importante por que, enquanto o hidrofone não distingue a direção
da onda, o geofone “vê” uma onda ascendente com polaridade diferente da de uma onda
descendente. Este tema tem uma interessante aplicação no caso do fantasma.

2.9.3 Os fantasmas
Dentre os fatores que afetam a forma do pulso, um dos mais importantes é o fantasma.
Para discutir o fenômeno, preparou-se a Figura 2.79, na qual se destaca o fato de que o
fantasma é simplesmente uma reflexão múltipla gerada na superfı́cie livre, nas vizinhanças
da fonte, ou dos receptores. A mesma figura representa também um caso particular da
geometria envolvida na geração de um fantasma.
Matematicamente, o efeito final da atuação do fantasma corresponde ao resultado da
operação de filtragem com o operador g(t), cuja versão discreta é dada por

gt = (1, 0, 0, 0, · · · , a)

ou
gt = δt + aδt−τ (2.9.8)
Neste operador, a é a amplitude da amostra, definida por

a = rD (2.9.9)

onde r é o coeficiente de reflexão, para uma onda ascendente, entre o solo (ou a água) e o
ar, e D é o fator de perda devido ao espalhamento geométrico (ver o item 2.5). Por sua
vez, o tempo τ , que corresponde ao atraso do fantasma, é definido, com base na Figura
2.79, por
2d
τ= cos θ (2.9.10)
v
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 261

θ
d

Superfície

θ θ

Fan
d
θ

tasm
Receptora

Figura 2.79: Geometria envolvida na geração do fantasma as-


sociado a um receptor e a uma onda plana inclinada.

sendo d a profundidade da fonte ou do receptor, v a velocidade de propagação no meio e θ


o ângulo de emergência do sinal, que pode ser calculado com a expressão A.5.2 (Apêndice
A.5).
Em função das diferenças entre as propriedades elásticas dos dois meios que caracte-
rizam a superfı́cie, o valor do correspondente coeficiente de reflexão, r, é normalmente
negativo. Entretanto, no caso particular do fantasma associado a um geofone, o sinal de
r deve ser trocado. A razão para este comportamento diferenciado pode ser demonstrada
através de uma análise da Figura 2.80, na qual procurou-se caracterizar a relação entre
o sentido da vibração das partı́culas, na parte frontal das ondas, e a geometria envolvida
na geração e no registro dos fantasmas.
Na construção da Figura 2.80, adotou-se um modelo segundo o qual a superfı́cie livre
tem coeficiente de reflexão negativo, o refletor tem coeficiente de reflexão positivo e a
fonte é explosiva. A seta com um ponto indica o sentido em que as partı́culas vibram, na
parte frontal da onda: se a vibração ocorre no mesmo sentido da propagação, a onda é
de compressão; no caso contrário, é de distensão.
Percebe-se na Figura 2.80 que, no caso de um hidrofone, que é sensı́vel à variação
de pressão, os dois fantasmas apresentam polaridade oposta à dos eventos primários.
Quanto ao geofone, que é sensı́vel à velocidade de partı́culas (uma grandeza vetorial), o
fantasma do receptor é “visto” com a mesma polaridade do evento primário, uma vez
que as partı́culas estão subindo, em ambos os casos. No que diz respeito ao fantasma da
fonte, o geofone o “vê” da mesma forma que um hidrofone, já que sua geração é remota,
associada exclusivamente às condições existentes nas proximidades da fonte.
Entendida a razão para o comportamento diferenciado do fantasma do geofone, pode-
se agora discutir o valor do coeficiente de reflexão, r. Para isto, considere-se, na aquisição
262 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

Figura 2.80: A geometria e o tipo de onda (compressão ou distensão) en-


volvidos na geração dos fantasmas da fonte e do receptor, no caso de uma
fonte explosiva. Cada uma das setas com um ponto indica o sentido local do
movimento das partı́culas, na parte frontal da onda.

terrestre, a situação tı́pica em que a incidência na superfı́cie livre não é vertical. Neste
caso, de acordo com a equação 2.6.21, os valores representativos de r variam entre −0.6 e
−0.999, assumindo-se que a velocidade do som no ar seja 340m/s e a densidade do mesmo
meio seja 0.0012 gramas por centı́metro cúbico. Para o meio em que se situa a fonte ou
os receptores, assumem-se velocidades entre 500 e 2000 metros por segundo, densidades
entre 1 e 2 gramas por centı́metro cúbico e razão de Poisson de 0.4 a 0.5.
No caso das operações marı́timas (ou em diversos casos da propagação vertical nas
operações terrestres), os valores representativos de r, estimados com a equação 2.6.12,
se aproximam de −1. Valores absolutos menores são observados nas situações em que a
superfı́cie do mar mostra-se muito irregular, ou quando a impedância acústica da água,
junto à superfı́cie, está afetada por uma mistura mais acentuada com o ar. Ressalte-se
entretanto que, nas situações práticas, o módulo de r nunca atinge o valor 1.
Quanto ao espalhamento geométrico, D, a expressão que permite calculá-lo, no caso
de um meio homogêneo e isotrópico, tridimensional, é (ver o item 2.5):
t
D= (2.9.11)
t+τ
onde t é o tempo duplo da reflexão que estiver sendo analisada. Valores tı́picos de D
oscilam entre 0.8 e 1.0. Ressalte-se que D varia com o afastamento, embora, para tempos
de reflexão superiores a 0.5-1.0s, esta variação seja relativamente pequena.
Caracterizados os elementos que definem a equação 2.9.8, o próximo passo consiste
em analisar a influência dos fantasmas sobre a forma do pulso sı́smico. Esta é uma tarefa
que pode ser bem conduzida através de uma análise dos espectros de amplitude e fase
do operador do fantasma. Para obtê-los, parte-se da transformada Z da equação 2.9.8, a
qual é dada por
G(Z) = 1 + rDZ n (2.9.12)
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 263

onde n é o número de amostras correspondentes ao tempo τ . Com base nesta expressão,


pode-se demonstrar que, para r = 1 e D = 1, os espectros de amplitude e fase do filtro
do fantasma são dados por  ωτ 
AG (ω) = 2 cos (2.9.13)
2
e
ωτ
φG (ω) = (2.9.14)
2
No caso em que r = −1 e D = 1, os espectros de amplitude e fase do operador do
fantasma são dados por
 ωτ 
AG (ω) = 2 sen (2.9.15)
2
e
ωτ π
φG (ω) = − (2.9.16)
2 2
Uma vez que são válidas para um valor positivo de r, as equações 2.9.13 e 2.9.14
podem ser consideradas adequadas para analisar o fantasma do geofone. Na condição em
que este tipo de sensor é colocado exatamente na superfı́cie — o que representa o caso
tı́pico das operações terrestres —, segue-se que τ =0 e, portanto, que o correspondente
operador do fantasma não afeta a forma do sinal sı́smico. Ressalte-se que isto não ocorre
na aquisição com o chamado cabo de fundo, na qual geofones são posicionados no fundo
do mar (ver o exercı́cio 41, no item 2.11).
Por sua vez, as equações 2.9.15 e 2.9.16 podem ser consideradas adequadas para
analisar três diferentes fantasmas: (1) o das fontes terrestres; (2) o das fontes marı́timas
e; (3) o do hidrofone, ou cabo de hidrofones. Na Figura 2.81, apresentam-se os espectros
de amplitude e fase aplicáveis a esses três casos, para três diferentes profundidades de cabo
ou fonte, calculados com as equações 2.9.15 e 2.9.16. Percebe-se na figura que, quando o
cabo está muito próximo da superfı́cie, a fase se aproxima de um valor constante de −90
graus. Quanto à amplitude, o fantasma cria notches nas freqüências múltiplas de 45 :
1 v
f= =
τ 2d cos θ
Com base na transformada de Fourier do operador do fantasma, percebe-se não ser
recomendável utilizar profundidades de cabo nem muito pequenas nem muito grandes,
sob pena de danificar excessivamente os espectros de fase e de amplitude do sinal. Valores
entre 5 e 10 metros satisfazem esta recomendação, ressalvando-se que, com freqüência,
o cabo deve ser aprofundado para reduzir o nı́vel de ruı́do gerado em condições de mar
revolto.
Para ser mais representativa, a forma de onda do operador do fantasma deve incluir a
atuação conjunta dos fantasmas da fonte e do receptor. Na Figura 2.82, vê-se a resposta,
ao impulso, da combinação dos dois fantasmas, no caso das profundidades de 5m, para
a fonte, e 10m, para o hidrofone, assumindo-se incidência vertical46 . Observe-se que a
banda de freqüências disponı́vel influencia significativamente a forma de onda obtida.
45
No caso de um geofone submerso, os notches ocorrem nas freqüências definidas por (2n−1)v/4d cosθ,
onde n é um número inteiro.
46
O efeito dessa mesma combinação de fantasmas está incluı́do no pulso apresentado na Figura 2.11
(página 90).
264 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

2.0

1.5
Amplitude

20ms
1.0

10ms
0.5

2ms
0
0 20 40 60 80 100
Freqüência (Hz)
180

90
Fase (graus)

20ms
10ms
0

2ms
−90
0 20 40 60 80 100
Freqüência (Hz)

Figura 2.81: Espectros de amplitude e de fase do operador do fan-


tasma, para três valores do tempo τ , correspondentes, nos casos de in-
cidência vertical, às seguintes profundidades de fonte ou hidrofone: 1.5m
(2ms); 7.5m (10ms) e; 15m (20ms). A velocidade do meio é 1500m/s e
o espalhamento geométrico da energia foi desprezado.

A influência dos fantasmas sobre a forma do pulso sı́smico fica bem caracterizada
através da comparação entre quatro pulsos diferentes, obtidos com a mesma assinatura
da fonte: (1) pulso sem os fantasmas da fonte e do cabo e sem o efeito do instrumento,
apresentado na Figura 2.74 (página 254); (2) pulso com o fantasma da fonte (hidrofone
profundo), apresentado na Figura 2.4 (página 71); (3) pulso com ambos os fantasmas da
fonte e do cabo, apresentado na Figura 2.11 (página 90); (4) pulso também com ambos
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 265

60Hz
0
Amplitude

120Hz
0

Sem filtro
0

−30 −20 −10 0 10 20 30 40 50


Tempo (ms)

Figura 2.82: Resposta, ao impulso, da combinação dos fan-


tasmas da fonte (profundidade de 5m) e do hidrofone (profundi-
dade de 10m), sem filtro e submetido a dois filtros corta-altas de
42dB/oitava. Premissas: aquisição no mar (v = 1500m/s) e in-
cidência vertical (θ = 00 ). O espalhamento geométrico da energia
foi desprezado e as formas de onda foram normalizadas.

Figura 2.83: Pulso sı́smico de air-gun registrado em campo remoto (o


mesmo da Figura 2.4), combinado com a resposta sintética de um recep-
tor situado a uma profundidade de 15m, assumindo incidência vertical
(θ = 00 ).

os fantasmas da fonte e do cabo, mas com este na profundidade de 15m, em vez de 10m,
apresentado na Figura 2.83. Nas quatro situações, apenas o pulso da Figura 2.4 foi
realmente registrado; os demais foram sintetizados a partir dele.
Até agora, os efeitos do fantasma foram analisados de forma unidimensional, embora
a forma do operador correspondente varie com o tempo e a distância, em função do
afastamento fonte-receptor (ver a equação 2.9.10). Para se analisar como um sismograma
é afetado pelo fantasma, em duas ou três dimensões, pode-se recorrer à representação nos
domı́nios ω-Kx ou ω-Kx-Ky , nos quais o sinal é tratado na forma de ondas planas. No
266 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

caso 2-D, um sismograma afetado por um fantasma pode ser representado por

S̃(Kx , ω) = P̃ (Kx , ω)G̃(Kx , ω) (2.9.17)

onde S̃ e P̃ representam as transformadas de Fourier do sismograma 2-D registrado com


o fantasma e do mesmo sismograma sem o fantasma, respectivamente. Por sua vez, G̃
corresponde ao operador do fantasma, ou seja,

G̃(Kx , ω) = 1 + r exp(−iKz 2d) (2.9.18)

onde r é o coeficiente de reflexão na superfı́cie, d é a profundidade da fonte, ou do receptor


e Kz = −(ω/v) cos θ.
Na forma da equação 2.9.17, a atuação do fantasma é sintetizada com base no algo-
ritmo de deslocamento de fase (item 2.7). No caso, tudo se passa como se o sismograma
registrado correspondesse à convolução bidimensional do operador do fantasma com um
sismograma que contém apenas eventos primários. Ressalte-se que a expressão 2.9.17 é
mais adequada ao caso em que o meio é homogêneo e isotrópico. Além disso, no caso
2-D, a perda de amplitude causada pelo espalhamento geométrico é subdimensionada, já
que o modelo implı́cito no processo é baseado na premissa de que a onda se propaga de
acordo com uma forma cilı́ndrica, em vez de esférica.

2.9.4 Arranjos de tiro e receptor


Os arranjos de campo mais comumente usados são os lineares. Tais arranjos apresentam,
na forma normalizada, a seguinte transformada de Fourier:

1 sen 12 Kx N ∆x
A(Kx ) = 1 (2.9.19)
N K ∆x
2 x

onde N é o número de elementos do arranjo, Kx é a freqüência angular espacial, medida


ao longo do eixo horizontal e ∆x é a distância entre elementos do arranjo. No limite em
que ∆x tende a zero, mantendo-se constante o comprimento, o arranjo linear transforma-
se em uma função caixa (box ), ou seja, no equivalente a um cordel detonante, que tem
transformada de Fourier, na forma normalizada, dada por

sen 21 Kx L
A(Kx ) = 1 (2.9.20)
K L
2 x

onde L é o comprimento do arranjo.


As equações 2.9.19 e 2.9.20 podem ser facilmente reescritas em função da velocidade,
da freqüência e do ângulo de emergência na superfı́cie, passando a descrever a transfor-
mada de Fourier do arranjo de campo em função do tempo, at . Para isto, substitui-se a
freqüência angular espacial por (ver a equação 2.1.48):
dt sen θ
Kx = ω =ω (2.9.21)
dx v
onde x é o afastamento fonte-receptor, t é o tempo de reflexão e v é a velocidade do
meio superficial. O ângulo θ e a vagarosidade dt/dx se relacionam através da seguinte
2.9. O PULSO SÍSMICO E SEUS COMPONENTES 267

igualdade, obtida através da combinação entre a derivada do tempo com relação ao


afastamento fonte-receptor, na equação 2.1.65, e a equação 2.1.48 (ver também o Apêndice
A.5):
dt x sen θ
= 2 = (2.9.22)
dx vE t v
onde vE é a velocidade de empilhamento, ou seja, a velocidade que representa melhor a
curva tempo-distância, no sentido dos mı́nimos quadrados.
No domı́nio do tempo, a forma de onda associada aos arranjos de tiro e geofone tem
a mesma forma que no domı́nio da distância, mas comprimento dependente do ângulo
de emergência e da velocidade na camada superficial. Com as equações 2.9.19 a 2.9.22,
demonstra-se que a forma de onda resultante corresponde grosseiramente a um filtro
corta-altas, cuja freqüência de corte pode ser estimada com base na expressão abaixo
(assumindo-se um limite de corte de 3dB):
vE2 t
F =κ (2.9.23)
Lx
onde vE é a velocidade de empilhamento, t é o tempo no afastamento fonte-receptor x e
κ é uma constante que depende do arranjo, sendo 0.25 para um arranjo de dois pontos e
0.44 para um arranjo em forma de caixa (box ).
Assim, para um cordel detonante de comprimento igual a 50m, o sinal registrado no
afastamento de 2000m, em um tempo vertical de 2s, terá uma freqüência de corte (3dB)
de 39Hz, para uma velocidade de empilhamento de 2000m/s. No caso de um arranjo de
geofones mais tı́pico, a freqüência de corte seria um pouco menor. Ressalte-se, contudo,
que, em operações terrestres, a ação dos arranjos pode ser mais prejudicial, tendo em vista
a topografia variável e as possı́veis diferenças no acoplamento de cada um dos elementos,
que introduzem distorção de fase dificilmente equacionável.

2.9.5 O pulso sı́smico e as convenções de polaridade


Até 1975, o registro de dados sı́smicos não obedecia a uma convenção de polaridade
universalmente aceita. Ou seja, cada companhia tinha seus próprios critérios, o que
tornava confuso o processamento de dados sı́smicos de origens diferentes. A SEG (Society
of Exploration Geophysicists) formou um grupo para estudar o assunto, no que resultou
a seguinte convenção: “Uma onda de compressão, que empurra a carcaça de um geofone
para cima, ou espreme um hidrofone, deve produzir um número negativo no registro e uma
quebra para baixo no sismograma” (Thigpen et al., 1975). Observe-se que esta convenção
não faz menção à polaridade do coeficiente de reflexão, o que se deve ao fato de que a
forma do pulso sı́smico varia bastante de fonte para fonte e, em muitas circunstâncias, de
ponto de tiro para ponto de tiro, mesmo quanto se utiliza uma só fonte.
As figuras 2.4 e 2.11 (páginas 71 e 90) podem ser usadas para ilustrar a discussão.
Com base no que foi dito anteriormente, particularmente quanto à primeira quebra,
percebe-se que, em ambas as figuras, a polaridade é a da convenção da SEG. Adicio-
nalmente, embora ambas as formas de onda correspondam a uma única fonte marinha,
a da Figura 2.4 pode ser tomada como uma aproximação de um pulso sı́smico terrestre
gerado por dinamite. Ou seja, pode-se afirmar que as figuras 2.11 e 2.4 são formas bem
representativas de uma reflexão isolada, obtida com um pulso marı́timo de air-gun e um
268 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

terrestre de dinamite, respectivamente. Esta generalização deve-se à importância dos


fantasmas na definição da forma do pulso (ver a Figura 2.80, na página 262).
Analisando-se as figuras 2.4 e 2.11, pode-se afirmar que, pelo menos em princı́pio,
seria mais fácil estabelecer o sinal do coeficiente de reflexão — através da reflexão cor-
respondente — em dados sı́smicos marinhos obtidos com canhões de ar do que em dados
terrestres obtidos com dinamite. Isto porque, neste último caso, existe apenas um fan-
tasma, o da fonte e, portanto, não se observa um pico ou uma cavidade dominante na
forma do pulso. Entretanto, esta não é uma afirmação absolutamente generalizável.
Para que se estabeleça uma relação realmente segura, entre as polaridades do traço
sı́smico e do coeficiente de reflexão, é necessário o processamento da assinatura, que será
discutido no item 3.2. A importância do tema pode ser percebida ao se comparar os dois
pulsos da Figura 1.14 (página 46): após a aplicação do filtro de forma, vê-se que já é
possı́vel estabelecer com maior segurança a polaridade e a posição de um evento isolado,
já que o pulso de fase nula tem um pico claramente dominante.

2.10 Fontes de Consulta


Os tópicos abrangidos neste capı́tulo são analisados de forma abrangente no livro de
Sheriff e Geldart (1982, 1985) e de forma mais teórica no de Aki e Richards (1980). A
propagação de ondas é bem discutida por diversos autores, entre eles Robinson (1983),
Berkhout (1980, 1987), Claerbout (1976, 1985) e Stolt e Benson (1986), além daqueles
que fazem parte da coletânea de artigos editada por Gardner (1985), que inclui diversos
trabalhos pioneiros. Um maior nı́vel de detalhe, aplicado aos algoritmos de modelagem
sı́smica, pode ser obtido na coletânea de artigos editada por Kelly e Marfurt (1990).
Teoria do raio e espalhamento geométrico podem ser estudados em Bleistein (1984),
Hubral e Krey (1980), Cerveny e Ravindra (1971), Cerveny et al. (1977), Newman (1973) e
Tygel et al. (1992), os dois últimos exclusivamente dedicados ao espalhamento geométrico.
A análise da influência do ângulo de incidência sobre o coeficiente de reflexão pode ser
lida em Koefoed (1955), Bortfeld (1961), Cerveny e Ravindra (1971), Aki e Richards
(1980), Ostrander (1984), Shuey (1985) e, especialmente, em Castagna e Backus (1993).
Absorção é o tema central da coletânea de artigos editada por Johnston (1981). Múltiplas
e reverberações foram temas dos trabalhos de Backus (1959), Meissner (1965), Weglein
et al. (1997) e Berkhout e Verschuur (1997a,b). No que diz respeito à assinatura sı́smica,
sugere-se consultar a coletânea de artigos editada por Osman e Robinson (1996).

2.11 Exercı́cios
1. Represente geometricamente a frente de onda da Figura 2.6 (página 80) no domı́nio Kz -
Kx , considerando Kz o eixo vertical. O que representa, neste domı́nio, a razão K x /Kz ?
Converta o mesmo evento de profundidade para tempo e o represente algebricamente, no
domı́nio ωτ -Kx , onde ωτ é a freqüência angular associada ao tempo vertical. Qual é a
relação entre Kz e ωτ ? (Sugestão: use os exercı́cios 15 e 17 do Capı́tulo 1).

2. Represente algebricamente a frente de onda da Figura 2.6 (página 80) no domı́nio ω-


Kx , escrevendo o parâmetro de raio p na forma da razão sen θ/v. Compare o resultado
2.11. EXERCÍCIOS 269

obtido com o do exercı́cio anterior e, considerando um mesmo valor de K x nos dois casos,
determine a relação entre ω e ωτ .

3. Liste as limitações do modelo convolucional expresso na forma da equação 2.1.59.

4. No caso 2-D, define-se raio imagem como aquele que atinge a superfı́cie de acordo com a
vagarosidade dt/dx = 0 (ver a Figura 2.15, na página 96). Represente, no domı́nio z-x,
um raio imagem hipotético, em um meio com três camadas mergulhantes para a direita,
cada uma delas com uma velocidade diferente, sendo a maior correspondente à camada
mais profunda e a menor à mais rasa.

5. Suponha que, no exercı́cio anterior, exista um difrator na profundidade intermediária


de cada uma das camadas, em posições coincidentes com as do raio imagem. Represente
geometricamente a forma e a posição das difrações correspondentes, em uma seção sı́smica
hipotética.

6. Descreva operacionalmente a aplicação da equação 2.2.26 ao caso de um único refletor


horizontal e vários traços sı́smicos na superfı́cie (múltiplos pontos A), usando uma lin-
guagem lógica como a que se segue:
Faça do primeiro traço ao último traço
Faça da primeira amostra à última amostra
Operação sobre cada amostra
Fim das amostras
Fim dos traços
Com base no pseudo-programa assim construı́do, defina, no domı́nio x-y-t, a forma resul-
tante da modelagem de um único ponto do refletor.

7. Considere que o pulso sı́smico é igual a um impulso unitário e que a equação 2.2.26 é
aplicada ao caso de um refletor horizontal, com coeficiente de reflexão constante, nas
seguintes condições: ∆t = 2ms, vH = 2000m/s e zB = 200m. Com base nesses dados,
resolva: (a) qual é o raio da área circular do modelo que efetivamente contribui para
a obtenção do sinal registrado na superfı́cie, com a mesma amplitude do coeficiente de
reflexão, no tempo t = zB /vH ? (b) na mesma situação, analise a importância relativa
do termo envolvendo 1/R 2 , presente na equação 2.2.27. (Sugestão: represente a equação
2.2.26 na forma de uma série de tempo, na qual, em cada termo i, a derivada de m com
relação ao tempo é dada por (mi − mi−1 )/∆t, considere que a mesma derivada
P pode
ser aplicada depois da execução do somatório, e determine a área ∆S = ∆x∆y que
permite obter um sinal com a mesma amplitude do coeficiente de reflexão).

8. Aplique a equação 2.2.9, usando os dados do exercı́cio anterior e estimando o comprimento


de onda com uma freqüência igual à metade da de Nyquist. Compare o resultado obtido
com o do item (a) do mesmo exercı́cio. Em seguida, deduza o equivalente à equação 2.2.9
para um atraso de metade do perı́odo e repita a comparação. O que você conclui?

9. Compare as figuras 2.5 e 2.24 (páginas 77 e 112) e discuta as diferenças encontradas.

10. Reconstrua esquematicamente a Figura 2.24, supondo que, no intervalo entre as profun-
didades z1 e z2 , a velocidade varia linearmente na direção lateral.
270 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

11. Monte um esquema de modelagem baseado em cı́rculos em vez de hipérboles e mostre


geometricamente que o resultado é o mesmo da modelagem não recursiva discutida no
item 2.2. (Sugestão: inicie a análise descobrindo o ponto de interseção das difrações
associadas a uma coleção de difratores distribuı́dos ao longo de um cı́rculo com centro na
superfı́cie).

12. Em um agrupamento CMP, em que circunstâncias o ângulo de emergência na superfı́cie


é igual a zero, para um afastamento fonte-receptor maior do que zero?

13. Use a equação 2.3.28 para deduzir uma expressão equivalente à equação 2.2.25, aplicável
ao caso em que existe afastamento entre a fonte e o receptor. Como a equação resultante
trata o espalhamento geométrico da energia?

14. Demonstre a equação da onda acústica 2-D, no caso em que a densidade varia com a
distância e a profundidade.

15. Mostre o que ocorre com o coeficiente de reflexão, na forma da equação 2.6.12, nos se-
guintes casos: (a) θ = 00 (incidência normal); (b) θ = θc (ângulo crı́tico) e; (c) θ > θc .
Qual é o módulo do coeficiente de reflexão no caso c?

16. Deduza os coeficientes de reflexão e transmissão para o deslocamento de partı́culas, u, a


velocidade de partı́culas, υ, e a pressão, p, com base nos conceitos empregados na dedução
das equações 2.6.16 e 2.6.17 e nas seguintes relações:

∂ uR ∂ uR
uR B1
ru = , rυ = ∂ t , rp = ∂z
uI ∂ uI ∂ uI
B1
∂t ∂z
e

∂ uT ∂ uT
uT B2
Tu = ,Tυ = ∂ t , Tp = ∂z
uI ∂ uI ∂ uI
B1
∂t ∂z
Compare o resultado obtido com as equações 2.6.16 e 2.6.17 e explique a diferença.

17. Por que o coeficiente de transmissão pode ser maior do que 1? (Sugestão: analise a
conservação da energia em uma interface).

18. Calcule o coeficiente de reflexão aproximado com a equação 2.6.27, variando o ângulo de
incidência entre 0 e 30 graus, para γ = 1.02, η = 1, σ 1 = 0.3, σ2 = 0.1. Compare o
resultado com o da equação 2.6.16, para θ = 00 . Qual seria o resultado aproximado do
empilhamento dos traços sı́smicos que envolvessem esses ângulos de incidência?

19. Faça uma analogia entre a equação 2.7.4 e o teorema do deslocamento da transformada
de Fourier.

20. Compare as equações 2.4.15 e 2.7.16. O que você conclui?

21. Compare a amplitude dos operadores exp(−iK z ∆z) e (1−iKz ∆z), presentes nas equações
2.7.4 e 2.7.14. Com base nesta comparação e supondo que ambas as equações sejam
aplicadas de forma recursiva sobre um dado campo de pressões, o que se pode esperar da
estabilidade numérica dos dois algoritmos, após um grande número de etapas da recursão?
2.11. EXERCÍCIOS 271

22. Descreva operacionalmente a aplicação da equação 2.7.4 à modelagem sı́smica bidimen-


sional (incluindo, de forma simplificada, as transformadas de Fourier necessárias). Para
isto, use um fluxograma ou uma linguagem lógica semelhante à sugerida no exercı́cio
6. Em seguida, analise o significado da aplicação do algoritmo ao caso de uma reflexão
horizontal e ao de outra com um mergulho arbitrário.

23. Escreva a equação 2.7.19 no domı́nio tempo-distância e compare o resultado com a equação
2.4.19.

24. Na dedução da expressão 2.7.46, usaram-se implicitamente as seguintes equações:

P̃ = exp [−i |Kz | (zB − z0 )] (2.11.1)

e
exp [iKz (zA − zB )]
G̃ = 2π (2.11.2)
−iKz
onde z0 é a profundidade em que foi gerado o campo P̃ , zB é a profundidade em que foi
gerado o campo G̃, e z0 > zB . A equação 2.11.1 é a transformada de Fourier da solução
da equação 2.7.28, enquanto a equação 2.11.2 é a transformada de Fourier da solução da
equação 2.7.29 (ver Schneider, 1978). Aplique as duas expressões fornecidas para deduzir
a equação 2.7.6, partindo da equação 2.7.46.

25. Analise as equações 2.11.1 e 2.11.2 no que diz respeito à relação entre o sentido da pro-
pagação e o aumento no tempo. Em seguida, obtenha as derivadas parciais das duas
equações com relação a zB , zA e z0 e analise o significado fı́sico do resultado. (Sugestão:
para simplificar, considere o caso de um evento horizontal).

26. Analise as possı́veis correlações entre as equações 2.2.28, 2.2.29, 2.7.45 e 2.7.46. O que se
pode concluir?

27. Imagine uma onda ascendente que atinge uma superfı́cie horizontal desprovida de qualquer
descontinuidade. Use a equivalência entre as equações 2.2.28 e 2.2.29 para mostrar, no
domı́nio do tempo, como a integral de Kirchhoff cancela a onda secundária descendente
gerada na mesma superfı́cie. (Sugestão: leve em conta o sinal de dt/dz e o fato de a onda
que atinge a superfı́cie ser puramente ascendente).

28. Analise a influência da velocidade em cada um dos algoritmos de extrapolação de campos


de onda discutidos nos itens 2.2 e 2.7, de acordo com os seguintes aspectos: (1) velocidade
de empilhamento versus intervalar versus média versus RMS; (2) influência da variação
vertical na velocidade e; (3) influência da variação lateral na velocidade.

29. A função de Green 2-D, dada pela equação 2.7.55, pode ser aproximada por
r 
2π π
G(x, z, ω) = A exp iωτ + i (2.11.3)
ω 4

onde, no caso de um meio homogêneo,√A é dado pela raiz quadrada do inverso da distância
percorrida pela onda, ou seja, A = 1/ R. Use esta aproximação como uma analogia para
deduzir a aplicação da equação 2.7.53 a meios com qualquer comportamento de velocidade.
(Sugestão: use a teoria do espalhamento geométrico da energia para estabelecer a forma
de A).
272 CAPÍTULO 2. MÉTODO SÍSMICO DIRETO

30. A Figura 2.20 (página 101) representa uma difração em um meio 2-D. Em que seria
diferente a mesma figura se o meio fosse 3-D? Para responder, leve em conta não somente
a amplitude, mas também a fase, com base na seguinte aproximação:
1 
(1 − Z) /2 ∼
= 1 − 21 Z

Observação: considere o papel da derivada com relação ao tempo na forma de onda da


difração e lembre-se que a mesma operação pode ser aproximada pela convolução com o
operador (1, −1)/∆t.

31. Imagine um refletor horizontal interrompido por uma falha vertical, em um meio 3-D.
Como se comportaria a fase da difração resultante, aquém e além do plano da falha?
Justifique, com base na interferência de difrações adjacentes e na aproximação do operador
de derivada citada no exercı́cio anterior.

32. Se o valor de Q do meio é igual a 70 e a faixa dinâmica do instrumento é 84dB, ou


exp(9.671), qual é a máxima freqüência que se pode registrar corretamente a um tempo
de 3 segundos? Repita o exercı́cio supondo que a faixa dinâmica útil seja 60dB, ou
exp(6.908). Nos dois casos, assuma que a mı́nima freqüência desejada seja 10Hz.

33. Suponha que os tempos necessários para dois sinais com freqüências distintas, f 1 = 10kHz
e f2 = 25Hz, percorrerem uma mesma distância sejam, respectivamente, 1.00s e 1.02s.
Calcule o fator Q correspondente. (Sugestão: use a equação 2.8.7).

34. Calcule a primeira harmônica da reverberação, no caso das operações marı́timas, quando
a lâmina de água tem 7.5m, 75m, e 750m. Esquematize os espectros correspondentes e
diga o que esperar da qualidade dos dados nos três casos.

35. De acordo com o modelo do refletor explosivo, todos os pontos do refletor “explodem”
simultaneamente no tempo t = 0. Neste caso, considerando um refletor horizontal em um
meio homogêneo, qual seria a relação entre os tempos da reflexão primária e das múltiplas
de primeira e segunda ordens?

36. Use o princı́pio de Huygens para, na Figura 2.67 (página 236), construir a geometria de
uma múltipla de segunda ordem da reflexão RP .

37. A equação 2.8.31 representa o conjunto de eventos — primários e múltiplos — que carac-
teriza um sismograma bidimensional. Por quê a influência do pulso sı́smico não é incluı́da
na mesma equação?

38. Na geração da forma de onda apresentada na Figura 2.76 (página 256), o filtro digital,
aplicado pelo instrumento Aran, apresenta espectro linear de fase. Considerando que a
máxima amplitude situa-se no tempo t = 0, qual poderia ser a origem da distorção de
fase observada na mesma figura?

39. Deduza as equações 2.9.15 e 2.9.16. (Sugestão: a mesma do exercı́cio 5, no item 1.7).

40. O que você esperaria do registro feito com um hidrofone situado exatamente na superfı́cie
livre? E se o receptor fosse um geofone?

41. Em que freqüências ocorrem os notches do fantasma aasociado a um geofone situado no


piso oceânico, a 60m da superfı́cie?
2.11. EXERCÍCIOS 273

42. Imagine uma aquisição com cabo de fundo, na qual foram registrados sinais com hidrofones
e geofones posicionados em uma mesma profundidade. Imagine ainda que as respostas,
ao impulso, dos dois sensores tenham sido adequadamente uniformizadas. Neste caso,
como a soma dos dois tipos de registro trataria os fantasmas associados ao geofone e ao
hidrofone? Na análise, leve em conta que os geofones são sensı́veis ao sinal que afeta o
substrato marinho.

43. Determine a forma do operador do fantasma do hidrofone, associado a um refletor, após o


empilhamento, com os seguintes dados: (a) cobertura de 400% (4 traços por agrupamento
CMP), com afastamentos de 0, 500, 1500 e 2000m entre a fonte e o receptor; (b) profun-
didade do cabo igual a 15m; (c) profundidade do refletor igual a 750m; (d) rD = −1.0 e;
(e) velocidade de propagação no meio igual a 1500m/s.
Capı́tulo 3

MÉTODO SÍSMICO INVERSO

3.1 Introdução
Pode-se definir “processamento de dados sı́smicos” como o conjunto de processos empre-
gados na obtenção das propriedades elásticas responsáveis pelos dados registrados. Esta
definição pode ser complementada através da classificação desses processos em três gran-
des famı́lias de técnicas: (1) as preparatórias, empregadas no condicionamento dos dados
sı́smicos; (2) as nucleares, que envolvem diretamente a inversão dos fenômenos geofı́sicos
discutidos no Capı́tulo 2; (3) as complementares, empregadas na geração dos insumos
necessários para a aplicação das técnicas nucleares.
Embora, em muitas circunstâncias, a distinção entre essas famı́lias de técnicas não
seja fácil, julgou-se conveniente discuti-las separadamente. Assim, as técnicas nucleares,
desmembradas na forma de deconvolução da assinatura, correção dos fatores de pro-
pagação, migração e inversão, são analisadas nos itens 3.2 a 3.7. As outras duas famı́lias
de técnicas são discutidas neste item, as preparatórias com ênfase no condicionamento dos
dados sı́smicos para a aplicação dos processos nucleares e as complementares concentradas
na técnica CDP, no empilhamento e na obtenção de velocidades sı́smicas.

3.1.1 O condicionamento dos dados sı́smicos


O condicionamento dos dados sı́smicos, que é uma etapa fundamental para as etapas
seguintes do processamento, inclui as seguintes tarefas: (1) determinação do perfeito
posicionamento espacial dos traços sı́smicos, o que significa a associação entre cada um
deles e suas respectivas coordenadas reais; (2) aplicação de correções estáticas de curtos
comprimentos de onda e pequeno valor absoluto, deixando para a migração a tarefa
de posicionar os dados no datum final desejado; (3) tratamento das amplitudes, com
o fim de eliminar distorções que prejudiquem as fases seguintes do processamento; (4)
reamostragem e regularização da distribuição espacial dos traços sı́smicos, feitas com o fim
de compensar deficiências da aquisição e otimizar a distância entre traços e a cobertura
(número de traços por agrupamento CMP) e; (5) atenuação de ruı́dos que não possam
ser tratados pela migração ou pelo empilhamento.
Não há muito o que dizer a respeito da óbvia necessidade de posicionar corretamente
no espaço um determinado traço sı́smico. Em contrapartida, os demais temas merecem
uma discussão à parte, de acordo com uma ordem que não necessariamente representa

274
3.1. INTRODUÇÃO 275

a seqüência em que os algoritmos correspondentes são aplicados. Ou seja, em muitas


circunstâncias, as técnicas voltadas para o condicionamento dos dados sı́smicos podem
envolver uma ordem que, nem sempre, obedece ao que sugere a intuição.

Correções estáticas
No que diz respeito às distorções no tempo de trajeto, associadas às camadas superficiais,
o procedimento mais corriqueiro consiste em aplicar as chamadas correções estáticas, ou
seja, deslocamentos verticais de tempo nos traços sı́smicos de um agrupamento CMP,
feitos de forma a simular a aquisição em uma elevação constante, a qual define o da-
tum final, ou de processamento. Este datum é normalmente, mas não obrigatoriamente,
posicionado logo abaixo da base das camadas superficiais, de forma a envolver a menor
distância possı́vel até a superfı́cie de registro. Após a aplicação das correções estáticas, o
tempo de reflexão do datum escolhido passa a ser, tipicamente, igual a zero, fazendo com
que, no caso, se admita a existência de sinais em tempos negativos.
Usualmente, as correções estáticas são determinadas através de técnicas de refração
rasa, seja através de levantamentos especı́ficos, seja através das primeiras quebras dos
registros sı́smicos convencionais. Como resultado da aplicação desses dois processos,
obtém-se um modelo, definido em termos de velocidade e espessura, para as camadas
superficiais e as imediatamente subjacentes, através do qual se determinam as correções
estáticas correspondentes. Neste cálculo, assume-se que, acima do datum escolhido, as
ondas viajam na direção vertical o que, considerando as baixas velocidades tı́picas das
camadas superficiais, é uma aproximação freqüentemente aceitável (ver a equação 2.1.58).
O leitor poderá aprofundar a análise do tema através da consulta aos livros de Musgrave
(1967) e de Slotnick (1959).
Fortuitamente, a alta redundância, inerente à aquisição sı́smica fundamentada na
técnica CDP, favorece sobremaneira o processo de determinação das correções estáticas.
Ou seja, trata-se de um problema em que, normalmente, dispõe-se de um número subs-
tancialmente maior de equações do que de incógnitas e que, por isto, permite a aplicação
de algoritmos sofisticados. Em uma das técnicas desta famı́lia, desenvolvida por Amorim
et al. (1987), o processo de obtenção das correções estáticas é tratado como um problema
tomográfico não linear, linearizado no processo. Solução explicitamente não linear, de
uso mais restrito, é a de Rothman (1986).
Em muitos casos, é conveniente a aplicação das chamadas correções estáticas residu-
1
ais . Para determiná-las, uma técnica muito usada baseia-se no conceito de consistência
superficial, desenvolvido ainda na década de 1970 (Taner et al., 1974; Wiggins et al.,
1976; Taner e Koehler, 1981). De acordo com este conceito, “uma mesma correção estática
aplica-se a um ponto de tiro em uma determinada posição superficial, independentemente
da posição dos vários receptores. Similarmente, a correção estática do receptor em uma
dada posição deve ser a mesma para o sinal vindo de vários pontos de tiro” (Wiggins
et al., 1976). Esta idéia, combinada com o desmembramento do tempo de trajeto em
seus diversos componentes (deslocamento estático de tiro e receptor, tempo “geológico”
1
Dependendo do relevo estrutural esperado, é conveniente fazer correções independentes, como as que
se baseiam nos levantamentos verticais de velocidade, os quais consistem em se determinar as velocidades
das camadas superficiais em poços rasos. Os tempos correspondentes são usados para calibrar as correções
estáticas estimadas previamente.
276 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

e NMO residual), permite a construção de um sistema de equações cuja solução atende


à premissa de consistência superficial.
Os procedimentos descritos esbarram em uma dificuldade comum: com freqüência,
a elevação das fontes e dos receptores varia tanto que a opção por um único datum em
toda a linha sı́smica pode fazer com que, no processo de cálculo das correções estáticas,
seja necessário envolver grandes espessuras das camadas geológicas situadas abaixo da
zona de intemperismo. Neste caso, a influência da lei de Snell torna inadequados os
tempos verticais estimados e o próprio processo de aplicação das correções estáticas.
Entre as conseqüências negativas desta distorção, estão a deterioração na qualidade do
empilhamento e a deformação da geometria das reflexões.
Para contornar a deficiência descrita, um dos procedimentos mais indicados é baseado
na decomposição das correções estáticas em dois grupos de comprimentos de onda, curtos
e longos, definidos ao longo da direção horizontal. Esta decomposição é normalmente con-
duzida a partir da obtenção do chamado datum flutuante, ou seja, um nı́vel de referência
que varia lentamente ao longo das linhas sı́smicas e que é definido através de pelo menos
dois procedimentos distintos. No processamento convencional, o tempo entre o datum
flutuante e o datum final é normalmente estimado com base em uma média das correções
estáticas totais de cada traço sı́smico do agrupamento CMP (ou seja, a profundidade do
datum flutuante não é explicitada). No caso em que se aplica migração em profundidade,
pode-se adotar, como datum flutuante, uma versão suavizada da profundidade da base
da camada de intemperismo.
A aplicação do conceito de datum flutuante envolve duas etapas. Na primeira, aplicam-
se as correções estáticas de pequeno comprimento de onda. O resultado é, em tese,
equivalente ao que se obteria se os dados sı́smicos tivessem sido adquiridos com tiros e
geofones situados no próprio datum flutuante. Criam-se assim condições para que, na
segunda etapa, a migração, seja em tempo, seja em profundidade, trate mais adequada-
mente os tempos envolvidos no trajeto entre o datum final e o flutuante. Isto se deve ao
fato de que, no caso, as distorções sofridas pelo campo de ondas são consideradas uma
parte intrı́nseca do processo de propagação e não um simples deslocamento estático (ver
os itens 3.5 e 3.6).
Normalmente, a idéia de correção estática não está associada à aquisição de dados
sı́smicos marı́timos. Isto significa que, no processamento desse tipo de dado, desprezam-se
duas distorções passı́veis de serem tratadas na forma das correções estáticas. Uma delas
é associada às profundidades do cabo e da fonte. No caso, a correção estática consiste
simplesmente em aumentar o tempo de reflexão de acordo com o valor correspondente à
soma dos tempos verticais no trajeto entre a superfı́cie e os dois elementos. Ressalte-se
entretanto que, nas aplicações mais convencionais dessa idéia, desprezam-se as flutuações
nas profundidades do cabo e da fonte ao longo da linha sı́smica, o que pode levar a uma
deterioração dos componentes de alta freqüência. Neste caso, pode ser recomendável a
aplicação de algoritmos de correção estática residual.
Outra distorção, presente em dados sı́smicos registrados no mar, é causada pela maré.
Uma vez que, com freqüência, os deslocamentos de tempo correspondentes são pequenos
e, no caso da aquisição bidimensional, relativamente constantes em cada agrupamento
CMP, a prática mais comum consiste em desprezar o fenômeno. Entretanto, existem
regiões em que a variação do nı́vel do mar causada pela maré pode levar a deslocamentos
de tempo superiores a um ou dois intervalos de amostragem. Além disso, na aquisição
3.1. INTRODUÇÃO 277

tridimensional, a combinação, em um mesmo agrupamento CMP, de traços sı́smicos de


linhas vizinhas, registradas em horas diferentes, pode enfatizar a distorção e influen-
ciar negativamente a migração e o empilhamento de componentes de alta freqüência. A
correção do efeito da maré é, em princı́pio, relativamente simples, bastando garantir que
a hora da aquisição tenha sido corretamente registrada.
Um fator potencialmente mais importante do que a maré é a dependência da veloci-
dade da água do mar com relação à temperatura e à salinidade. Como se verá no item 4.2,
uma variação de 20 graus centı́grados na temperatura, junto à superfı́cie, pode alterar a
velocidade média da água do mar em mais de 20m/s, dependendo da batimetria envolvida
(ver a Figura 4.9, na página 490). Este tema, discutido, entre outros autores, por Wom-
bell (1996), torna-se crı́tico para o processamento de sinais de alta freqüência, se houver
uma mudança na temperatura, ou na salinidade, da água durante a aquisição de um
levantamento sı́smico tridimensional. Em tese, a melhor forma de corrigir os efeitos desse
fenômeno envolve a reposição de camadas, no contexto da migração pré-empilhamento.

Correções de amplitude
O condicionamento da amplitude dos dados sı́smicos é fundamental para a aplicação dos
processos baseados na equação da onda, assim como para a aplicação de qualquer técnica
convolucional, como as discutidas nos itens 3.2 e 3.3 e para as demais correções discutidas
neste item. Ou seja, a correção criteriosa de importantes fatores de propagação pode se
revelar inútil, se, por exemplo, a amplitude do sinal registrado não se mostrar consistente.
Assim, algum tipo de condicionamento dos dados é essencial.
Entre os processos convencionais dedicados a correções semi-estatı́sticas das ampli-
tudes, estão: (1) normalização da amplitude dos dados sı́smicos com base na amplitude
média RMS, ou na média aritmética dos valores absolutos das amplitudes, ou, ainda, na
maior amplitude absoluta de cada traço; (2) processos equivalentes ao anterior, aplicados
a conjuntos de traços; (3) correção da amplitude com base na consistência geológico-
superficial, garantindo, por exemplo, que um agrupamento de tiro comum e um de geo-
fone comum, na mesma posição espacial, representem de forma similar a resposta sı́smica
da terra. Nos três processos citados, tem crescido a importância de técnicas baseadas em
medianas, em vez de médias.
Idealmente, o condicionamento das amplitudes deveria ser tão determinı́stico quanto
possı́vel. Particularmente no caso de dados sı́smicos adquiridos em águas profundas, uma
técnica com esta caracterı́stica consiste em utilizar a amplitude da onda direta para homo-
geneizar a influência direta da fonte sı́smica. Na óbvia ausência de uma aquisição sı́smica
perfeita, capaz de tornar desnecessárias as técnicas estatı́sticas, não é difı́cil concluir que
a melhor solução do problema passa pela combinação entre essas técnicas e as correções
fundamentadas na geologia. Ou seja, a consistência geológica deve constituir o cerne das
preocupações de quem analisa o assunto. A maior conseqüência desta recomendação é a
necessidade de reavaliar técnicas convencionais, baseadas em pura consistência superfi-
cial, técnicas estas que, além de não serem adequadamente aplicáveis aos levantamentos
3-D marinhos convencionais2 , podem introduzir distorções na distribuição das amplitudes
2
Na aquisição marinha convencional, não existem receptores fixos. Além disso, alguns fenômenos
superficiais podem variar de forma rápida com o tempo. Estas caracterı́sticas violam as premissas de
consistência superficial, resumidas na discussão sobre correções estáticas.
278 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

com o afastamento fonte-receptor.


Neste contexto, é muito importante avaliar a distribuição em área das amplitudes de
grupos de traços sı́smicos, em especial fonte ou receptor comum, com o fim de verificar a
compatibilidade da mesma com a resposta geofı́sica esperada. Este tipo de análise pode
ser muito enriquecido se filtros de caráter estatı́stico tiverem sido previamente aplicados
aos dados, com o fim de remover distorções pouco representativas. Nestas condições,
torna-se possı́vel aplicar correções que visam gerar uma distribuição das amplitudes co-
mum a todos os conjuntos de dados de mesma natureza e suave o suficiente para não
prejudicar a aplicação posterior da migração.
Um problema comum, que afeta a aplicabilidade destas idéias, ocorre em regiões
onde as propriedades elásticas do piso oceânico variam lateralmente de forma muito
acentuada. Isto ocorre, por exemplo, em linhas registradas nas vizinhanças da quebra do
talude (shelf edge), onde tanto o material do piso oceânico quanto a batimetria podem
variar de forma acentuada. Nestas condições, uma mesma linha sı́smica pode apresentar
traços contaminados por eventos reverberantes de alta amplitude, na região da plataforma
continental, ao lado de traços de boa qualidade, na região de talude, onde as múltiplas
são mais fracas e mais facilmente atenuáveis. Situações desse tipo podem levar à idéia de
que os problemas verificados nas fases subseqüentes do processamento estão relacionados
com o tratamento de amplitude quando, na verdade, se devem à influência negativa das
reverberações.

Regularização
A regularização dos dados sı́smicos, mais crı́tica no caso da aquisição marinha, é um tema
muito importante, particularmente para a migração. Os objetivos fundamentais desse
processo são, entre outros: (1) garantir a aplicabilidade do princı́pio da reciprocidade, de
tal forma que os agrupamentos de fonte comum e de receptor comum sejam tão similares
quanto possı́vel; (2) evitar o efeito de álias de CDP, o que consiste em garantir que as
famı́lias CMP sejam homogêneas, no que diz respeito à distribuição de afastamentos e
dos azimutes, ou seja, dos ângulos entre as linhas de fontes e de receptores (ver discussão
sobre a técnica CDP) e; (3) favorecer a migração de dados sı́smicos, garantindo, tanto
quanto possı́vel, maior homogeneidade espacial e menores espaçamentos entre elementos
dos diversos agrupamentos.
As técnicas aplicadas com essas finalidades vão desde uma simples interpolação linear
entre traços sı́smicos vizinhos em diferentes agrupamentos, por sinal inadequada, até a
aplicação de processos baseados na equação da onda. Entre as técnicas de interpolação,
uma das mais bem-sucedidas é conduzida no domı́nio freqüência-distância, através da
aplicação de filtros lineares de predição de erro (ver Spitz, 1991). Na forma convencional,
esta técnica exige amostragem espacial em intervalos regulares, restringindo sua aplicação
à simples reamostragem. Entretanto, como o demonstra a aplicação conhecida como
krigging (item 1.4), a técnica pode ser generalizada.
No caso dos algoritmos de regularização baseados na equação da onda, há uma tendên-
cia natural de aplicá-los durante a própria migração, particularmente no caso da famı́lia
Kirchhoff, que admite esta possibilidade. Para isto, leva-se em conta o fato de que a mi-
gração Kirchhoff envolve uma integral de superfı́cie. Desta forma, a regularização consiste
simplesmente em atribuir a cada traço sı́smico a área superficial que ele representa, desde
3.1. INTRODUÇÃO 279

que se respeitem limites aceitáveis de amostragem espacial (ver o item 3.6). Aplica-se a
este tipo de regularização o termo “condicionamento geométrico”.
Processos de regularização baseados em continuação lateral de campos de onda estão
crescendo em importância, como preparação dos dados sı́smicos para algoritmos de mi-
gração pré-empilhamento que exigem amostragem espacial regular. Um exemplo dessa
famı́lia de processos — a correção de AMO (Azimuth MoveOut) —, que objetiva corrigir o
azimute da aquisição sı́smica, é muito importante no caso da migração pré-empilhamento
em tempo em duas passagens (ver o item 3.6 e Biondi et al., 1998).

Atenuação de ruı́dos
Excluı́das da análise as múltiplas, a atenuação dos ruı́dos é favorecida se eles forem se-
parados em dois grupos: (1) ruı́dos que podem ser atenuados pela migração dos dados
sı́smicos e; (2) ruı́dos que exigem um tratamento à parte. Com base na teoria da pro-
pagação de ondas discutida no item 2.7, sabe-se que os eventos que apresentam velocidade
de propagação menor do que a velocidade de corpo do meio são tratados como se fossem
ondas evanescentes. Isto significa que, se esses ruı́dos forem adequadamente amostrados,
eles podem ser fortemente atenuados durante a migração, particularmente no caso da
migração pré-empilhamento3 .
O melhor exemplo de sucesso da aplicação dessa idéia ocorre no caso das ondas conver-
tidas (de compressionais para cisalhantes e de cisalhantes para compressionais), geradas
junto à superfı́cie, as quais são normalmente bem amostradas e podem ser atenuadas
durante a migração. Entretanto, de acordo com a condição estabelecida no parágrafo
anterior, a velocidade S, que caracteriza os ruı́dos, deve ser menor do que a menor ve-
locidade P dos sedimentos. Esta condição ocorre, por exemplo, na Bacia do Paraná, a
qual é recoberta por basaltos cuja velocidade S é pelo menos 1000m/s menor do que a
velocidade de migração (ver a Figura 2.64, na página 232).
Entre os ruı́dos que, em muitos casos, não podem ser adequadamente atenuados du-
rante a migração e que, mais do que isto, podem prejudicá-la, estão: (1) ruı́dos aleatórios;
(2) ruı́dos espacial e temporalmente localizados, com freqüência agrupados sob a deno-
minação noise bursts e; (3) ruı́dos coerentes parcialmente localizados. Os três tipos de
ruı́do exigem tratamentos especı́ficos.
A atenuação dos ruı́dos aleatórios ganhou um poderoso aliado, quando se descobriu
a possibilidade de aplicar, ao problema, o filtro Wiener-Hopf. Como se viu no Capı́tulo
1, este tipo de filtro pode ser usado para caracterizar eventos previsı́veis. Ou seja, dada
uma função de autocorrelação, pode-se estimar em tempos futuros, ou em posições late-
ralmente adjacentes, eventos que apresentem as propriedades estatı́sticas definidas pela
mesma função. Com base nesta idéia, pode-se atenuar, em um traço sı́smico, os eventos
que não possam ser previstos com base nos traços vizinhos. Este conceito, oposto ao
da deconvolução tradicional, vem recebendo a denominação deconvolução f -x, por ser
conduzido no domı́nio freqüência-distância (Treitel, 1974; Canales, 1984; Gulunay, 1986).
O problema fundamental dos ruı́dos espacial e temporalmente localizados é a grande
diferença de amplitude e fase, em relação às amostras vizinhas. Uma das formas de
tratar tais ruı́dos baseia-se em inspeção visual, seguida de remoção de todo ou parte do
3
A correção de DMO introduz efeito similar, com efetividade decrescente na direção dos tempos
maiores e do afastamento fonte-receptor igual a zero.
280 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

traço sı́smico afetado. Outras técnicas consistem em tratá-los de forma estatı́stica, tanto
na caracterização quanto na atenuação. Um grupo de técnicas dessa famı́lia baseia-se
na generalização do conceito de consistência superficial (Taner e Koehler, 1981). Outra
técnica, simples mas muito eficaz, consiste na aplicação de filtros de mediana, filtros
estes, que por não serem lineares, são insensı́veis a valores extremos, sem representação
estatı́stica4 (ver Bednar, 1983). Desta forma, um ruı́do localizado pode ser removido sem
contaminar amostras de traços vizinhos. O mesmo não ocorre com os filtros que, direta
ou indiretamente, envolvam médias dos dados.
Um ruı́do coerente que tende a apresentar concentração espacial — no caso, em torno
da fonte — é o chamado ground-roll, ou seja, as ondas superficiais Rayleigh ou Love,
caracterizadas pelo deslocamento elı́ptico ou horizontal das partı́culas, de acordo com ve-
locidade de propagação mais baixa do que a das ondas S do mesmo meio. Fortuitamente,
o ground-roll tende a apresentar conteúdo de freqüências caracterı́stico, de tal forma que
processos como o balanceamento espectral atenuam-nos relativamente bem (ver o item
3.2). Os resı́duos remanescentes podem ser tratados através de técnicas como as que
envolvem filtros de velocidade ou filtros de número de onda ou, ainda, filtros lineares de
predição de erro, aplicados no domı́nio freqüência-distância. Ressalte-se que, de acordo
com a teoria discutida no item 3.2, a aplicação de balanceamento espectral antes da de-
convolução de fase mı́nima pode levar à introdução de significativas distorções de fase,
as quais podem ser corrigidas posteriormente através de processos como o descrito por
Gibson e Larner (1984).

3.1.2 A multiplicidade e as velocidades sı́smicas

A alta multiplicidade, caracterı́stica da aquisição sı́smica moderna, tem gerado resultados


importantes para a indústria do petróleo. Sabe-se que, no empilhamento de dados de uma
famı́lia CMP, a multiplicidade favorece os seguintes processos: (1) atenuação de eventos
múltiplos, de forma dependente da aceleração do meio, ou seja, da rapidez com que
varia a velocidade de empilhamento em função do tempo (ver o item 3.3); (2) atenuação
de ruı́dos aleatórios, de forma proporcional à raiz quadrada da cobertura empregada na
técnica CDP, ou seja, do número de traços sı́smicos de cada agrupamento de ponto médio
comum (CMP) e; (3) obtenção de velocidades sı́smicas, as quais são empregadas tanto
no processamento dos dados sı́smicos quanto na previsão de profundidade dos refletores.
Ressalte-se que esta descrição se aplica também ao caso da migração pré-empilhamento
dos dados sı́smicos. Discutem-se em seguida alguns aspectos relativos ao assunto, com
destaque para a técnica CDP.

4
A filtragem de mediana consiste simplesmente em selecionar, em um grupo de amostras, o valor da
mediana das amplitudes correspondentes. Na aplicação dessa técnica, dois temas merecem ser comenta-
dos. Em primeiro lugar, o filtro de mediana pode ser ponderado, o que equivale a alterar a representação
estatı́stica de cada amostra, respeitando-se sua posição relativa. Assim, a aplicação do filtro de mediana
1 : 2 : 1 a três amostras sucessivas implica repetir a amostra central antes de se determinar a mediana
das amplitudes envolvidas. Em segundo lugar, deve-se ressaltar que, em muitos casos, a aplicação do
filtro de mediana pode ser enriquecida se ele for aplicado, no domı́nio ω-x, a cada harmônica ω.
3.1. INTRODUÇÃO 281

A técnica CDP
Na técnica CDP, assume-se que o ponto intermediário entre a fonte e o receptor apresenta
coordenadas horizontais iguais às do CDP, ou seja, ao ponto comum em profundidade.
Em conseqüência, a curva tempo-distância correspondente a uma reflexão, em um agru-
pamento CMP, pode ser descrita pela seguinte equação:

x2
t2 = t20 + (3.1.1)
vE2

onde vE é a velocidade de empilhamento, t0 é o tempo vertical e x é o afastamento


fonte-receptor.
Nas aplicações práticas, a velocidade de empilhamento — aquela que, para uma de-
terminada reflexão em um agrupamento CMP, possibilita obter a curva tempo-distância
mais próxima da correta — é estimada através da chamada análise de velocidade. Em-
bora as técnicas usadas neste processo sejam normalmente baseadas em inspeção visual
do resultado de testes, elas correspondem virtualmente a um ajuste que leva ao menor
erro médio quadrático. Ou seja, assumindo-se que a curva tempo-distância correta seja
medida, a velocidade de empilhamento é aquela que, através de um ajuste feito com base
na equação 3.1.1, leva ao menor erro. No caso de uma reflexão isolada em um agrupa-
mento CMP, assume-se que o mı́nimo erro é atingido quando: (1) a coerência entre os
diversos traços sı́smicos do agrupamento é máxima ou; (2) a amplitude do sinal empilhado
atinge a expectativa do intérprete.
Em um meio homogêneo e isotrópico, condição em que a trajetória do raio é reta, a
equação 3.1.1 é exata e a velocidade de empilhamento estimada é igual às velocidades
intervalar e média. Em meios relativamente mais complexos, a mesma expressão pode
ainda ser virtualmente exata, desde que os afastamentos entre a fonte e os receptores
tendam a zero. Estas são as condições em que se define a chamada velocidade NMO, cujas
diferentes descrições analı́ticas podem incluir os efeitos do acamamento, do mergulho e
até mesmo da anisotropia de meios TI (isotropia transversa), sendo que, no primeiro
caso, ela equivale à velocidade RMS. Nos itens 2.5 e 2.8, discute-se a teoria associada ao
assunto (ver as equações 2.5.77, 2.5.78 e 2.8.70).
Na condição mais realista em que os afastamentos fonte-receptor se afastam substan-
cialmente de zero, a curva tempo-distância real pode se tornar bastante diferente da que
se poderia estimar com a velocidade NMO, aplicada à equação 3.1.1. Para ilustrar a
importância do tema, considere-se o caso simples de um meio homogêneo e isotrópico, no
qual existe uma interface acústica mergulhante. A presença de mergulho introduz dois
importantes fenômenos que influenciam o empilhamento da reflexão correspondente: (1)
o ponto comum em profundidade transforma-se em uma área; (2) a velocidade de empi-
lhamento é aumentada. Na Figura 3.1, vê-se uma representação geométrica que favorece
o entendimento desses fenômenos.
Percebe-se, na Figura 3.1, que, para uma fonte no ponto S, a reflexão registrada
no ponto G vem do ponto R, em vez do ponto D, o qual seria responsável por uma
reflexão no afastamento fonte-receptor igual a zero. Assim, considerando o agrupamento
CMP correspondente ao ponto M , o segmento de reta RD define a região amostrada
pelos pares fonte-receptor com afastamentos x no intervalo SG ≥ x ≥ 0. Por outro
lado, a construção apresentada na figura permite deduzir que S 0 G0 = AB, SS 0 = GG0 ,
282 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

RN 0 = M D e, conseqüentemente, que
2 2 2
S 0 R + RG0 = 2M D + AB
Uma vez que AB = SG cos θ = x cos θ, S 0 R + RG0 = vE t e 2M D = vE t0 , pode-se obter a
seguinte expressão:
cos 2 θ
t2 = t20 + x2 2 (3.1.2)
vE
onde vE é a velocidade de empilhamento na ausência de mergulho e θ indica o ângulo
de mergulho. Observe-se que o mergulho introduz o efeito de aumentar a velocidade de
empilhamento, ou seja,
v
vM = E (3.1.3)
cos θ
onde o subscrito M identifica a velocidade de empilhamento na presença de mergulho.
Com base em uma comparação com a equação 2.5.79, induz-se que este resultado aplica-
se também a um meio de múltiplas camadas mergulhantes, desde que elas sejam plano-
paralelas, e, além disso, os afastamentos fonte-receptor não sejam muito acentuados.
De acordo com as equações 3.1.2 e 3.1.3, se dois eventos distintos apresentarem o
mesmo tempo vertical de reflexão, sendo um deles associado a um refletor horizontal e o
outro a um refletor mergulhante, o empilhamento bem-sucedido de um deles é feito em
detrimento do outro, por causa da diferença nas velocidades de empilhamento, diferença
esta introduzida pelo mergulho. Como exemplo, considere-se, na Figura 3.1, o ponto de
um hipotético refletor horizontal situado verticalmente abaixo do ponto M , na profundi-
dade vE t0 /2 e identificado pela letra P . A reflexão correspondente deveria ser empilhada
na mesma posição horizontal e no mesmo tempo que a reflexão oriunda do ponto R, mas
com a velocidade correta, sem influência do mergulho. Isto significa que uma das das
duas deveria ser sacrificada para que a outra fosse bem empilhada.
Como preparação para a discussão a ser apresentada no item 3.6, é conveniente apro-
fundar a análise da relação entre o mergulho das interfaces e a correção de NMO. Para
isto, o primeiro passo consiste em reapresentar, da seguinte forma, a equação 3.1.2:
 2
2 2 4h2 2 sen θ
t = t0 + 2 − 4h (3.1.4)
vE vE
onde h é igual à metade do afastamento fonte-receptor, ou seja, h = x/2.
Imagine-se agora que, ao sinal registrado no tempo dado pela equação 3.1.4, seja
aplicada uma correção de NMO que não leve em conta a contribuição do mergulho. O
resultado é:
4h2
t2N = t2 − 2 (3.1.5)
vE
onde tN é o tempo resultante da correção de NMO. Com base na equação 3.1.4, o mesmo
tempo pode ser redefinido da seguinte forma:
t2N = t20 − h2 p2E (3.1.6)
onde pE , que equivale ao parâmetro de raio da seção de afastamento nulo, é definido por
2 sen θ
pE = (3.1.7)
vE
3.1. INTRODUÇÃO 283

Figura 3.1: Geometria envolvida no registro de uma reflexão, na presença de


mergulho.

O passo seguinte baseia-se em uma análise detalhada da Figura 3.1. Observe-se


que, por construção, SE = EO e que, com base na lei da reflexão, o segmento de reta
OR é necessariamente a continuação do segmento RG. Levando ainda em conta que
os segmentos SO e N R são paralelos, conclui-se que os triângulos SOG e N RG são
semelhantes, o que permite estabelecer a seguinte relação:

N G : SG = N R : SO

ou
1
h + |yN − y0 | v t0 − |yN − y0 | sen θ
= 2 E 1  (3.1.8)
2h 2 2 vE t0 − h sen θ
onde yN e y0 correspondem às coordenadas horizontais5 dos pontos N e M , sendo este o
ponto médio comum correspondente a t0 . Após alguma manipulação algébrica, obtém-se:
2h2 sen θ
|yN − y0 | = (3.1.9)
v E t0
ou seja,
t0 |yN − y0 |
pE = (3.1.10)
h2
Levando-se em conta que o ângulo de mergulho pode ser negativo ou positivo, tem-se:
t0 (yN − y0 )
pE = (3.1.11)
h2
5
A opção pelo sı́mbolo y foi feita apenas para estabelecer uma diferença em relação ao afastamento
fonte-receptor x, que é igual a 2h. Não se trata de uma coordenada medida na direção transversal àquela
em que os dados sı́smicos são adquiridos.
284 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Substituindo-se esta expressão na equação 3.1.6, obtém-se o seguinte resultado:

t2N (yN − y0 )2
1= 2 + (3.1.12)
t0 h2

O leitor poderá perceber que, para valores variáveis de yN e tN , a equação 3.1.12


representa a geometria de uma elipse com eixos vertical e horizontal dados por t0 e
h. Poderá também perceber que a relação entre o tempo vertical isento do efeito do
mergulho, t0 , e o tempo resultante da correção de NMO, tN , não depende diretamente
da velocidade. Ressalte-se, por outro lado, que a máxima distância |yN − y0 | possı́vel
depende do mergulho geológico e, portanto, da velocidade, como se pode perceber com
base nas equações 3.1.7 e 3.1.10. Assim, para o mergulho máximo de 900 , deduz-se que o
menor tempo tN possı́vel será obtido na distância dada por 2h2 /vE t0 . Ressalte-se ainda
que, desconsiderando-se o efeito da velocidade, o máximo valor possı́vel de |y N − y0 | é
igual a h, o que ocorre quando tN = 0.
Deve-se ressaltar que os contextos geológicos mais comuns favorecem a aplicabilidade
da técnica CDP, já que mergulhos estruturais próximos de zero são muito mais comuns
do que os mergulhos acima de 30 ou 40 graus. Entretanto, mesmo em um contexto
estrutural favorável, a técnica CDP pode ser afetada negativamente por outros fatores,
particularmente no caso de afastamentos fonte-receptor tı́picos, da ordem de 3-4km. Este
é o caso de um meio com múltiplas camadas de velocidade espacialmente variável. Neste
caso, a trajetória do raio não segue uma linha reta, por causa da lei de Snell, e, em
conseqüência, a correspondente curva tempo-distância não pode ser exatamente descrita
por uma hipérbole.
A complexidade natural de uma situação como a descrita dificulta bastante uma
análise global. Por esta razão, justifica-se avaliar o tema através da influência isolada
de alguns dos fatores envolvidos. Considere-se inicialmente a influência da variação da
velocidade intervalar com a profundidade. O caso mais simples, discutido no item 2.5, é
o da variação linear, expressa na forma da seguinte igualdade:

v = v0 + az (3.1.13)

onde v0 e v são as velocidades intervalares na superfı́cie e na profundidade arbitrária z,


enquanto a é uma constante, associada à compactação das rochas, cujo valor tı́pico é
igual a 0.6s−1 . Em um modelo com estas caracterı́sticas, pode-se calcular o tempo de
reflexão de forma analı́tica, até a profundidade z, através da expressão 2.5.35, ou 2.5.37.
Estas foram as condições em que se construiu a Figura 3.2, na qual se podem ver
diferenças nos tempos de reflexão ao quadrado, tomando como referência a curva tempo-
distância construı́da com base na técnica CDP. A correspondente velocidade de empilha-
mento, vE , e o tempo vertical aproximado, t0 , foram determinados através de regressão
linear aplicada à equação 3.1.1 e aos tempos de reflexão corretos. Com esse conjunto de
dados e as velocidades média e RMS6 , calcularam-se os valores residuais de tempo ao
quadrado representados pelas curvas A, B e C da figura, sendo que, nos dois últimos
casos, aplicou-se a equação 3.1.1, substituindo vE pela velocidade correspondente e t0
pelo tempo vertical correto.
6
No caso de um meio como o descrito, a velocidade RMS é dada pela expressão 2.5.46.
3.1. INTRODUÇÃO 285

0.120
0.12
Diferença de tempo quadrático
0.100
0.10

0.080
0.08

0.060
0.06

0.040
0.04 C B

0.050
0.02 A

−0.020
−0.02
0 1 2 3 4
Razão afastamento/profundidade

Figura 3.2: Diferença de tempo de reflexão ao quadrado (s 2 ), em


relação ao estimado com a velocidade de empilhamento, em um agru-
pamento CMP: (A) tempos corretos; (B) tempos estimados com a ve-
locidade RMS e; (C) tempos estimados com a velocidade média. A
velocidade intervalar cresce linearmente com a profundidade, z, ou seja,
v = v0 + az. Parâmetros: v0 = 1700m/s, a = 0.6s−1 e z = 1000m.
As escalas horizontal e vertical são lineares em função da distância ao
quadrado e da diferença entre os tempos elevados ao quadrado.

Uma avaliação rápida da Figura 3.2 permite que se façam as seguintes observações:
(a) a curva tempo-distância obtida com a velocidade de empilhamento corresponde a
uma aproximação da curva tempo-distância correta; (b) a velocidade de empilhamento
é maior do que as velocidades RMS e média (no caso, 2018m/s, 1992m/s e 1985m/s,
respectivamente); (c) na posição em que x = 0, o tempo de reflexão obtido com a velo-
cidade de empilhamento, ou seja, t0 , é maior do que o correto; (d) na mesma posição, a
curva tempo-distância definida pela velocidade RMS é tangente à curva tempo-distância
correta. Além disso, pode-se dizer que o aumento no gradiente linear de velocidade, a,
leva a um aumento no valor residual da correção de NMO.
Considere-se agora o caso de outra camada horizontal, na qual a velocidade varia
exclusivamente na direção horizontal. Nesta circunstância, os trajetos e os tempos de
reflexão até a base da camada podem ser calculados também com base na expressão
2.5.35, ou 2.5.37, bastando, para isto, trocar os papéis da profundidade e da distância
horizontal. Esta foi a técnica adotada na construção da Figura 3.3, na qual podem ser
vistos os trajetos de três raios, gerados no contexto de um agrupamento CMP.
Na Figura 3.3, destacam-se os seguintes detalhes: (a) em cada afastamento fonte-
receptor, a reflexão é oriunda de um ponto diferente do refletor; (b) a região iluminada se
distribui, a partir do ponto médio, na direção em que a velocidade intervalar é maior; (c)
existe um limite mı́nimo na distância entre o ponto médio e a região do refletor iluminada
286 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

200 C
B A
Profundidade (m)

400

600

800

Refletor
1000

−800 −600 −400 −200 0 200 400 600 800


Coordenada horizontal relativa (m)

Figura 3.3: Três trajetos percorridos pela onda entre a fonte e o re-
ceptor, em um agrupamento CMP, no caso de um meio em que a veloci-
dade intervalar varia, na direção lateral, entre 1500m/s, na coordenada
−800m, e 2460m/s, na coordenada 800m, o que equivale a um gradi-
ente horizontal igual a 0.6s−1 . As letras indicam: (A) trajeto do raio
normal (perpendicular ao refletor); (B) trajeto do raio perpendicular
à superfı́cie (ressalte-se que, nesta posição de um agrupamento CMP,
dt/dx 6= 0) e; (C) trajeto de um raio qualquer.

por um agrupamento CMP7 . A última observação permite induzir que a posição do refletor
situada na coordenada horizontal do ponto médio seria iluminada por outro agrupamento
CMP. Apenas na presença de mergulho seria teoricamente possı́vel a obtenção de uma
reflexão oriunda da mesma coordenada.
A influência da variação lateral da velocidade intervalar sobre a correção de NMO
pode ser analisada com base na Figura 3.4, a qual foi construı́da de forma similar à
da Figura 3.2. Observa-se, na figura, que a diferença entre os tempos estimados com a
velocidade de empilhamento e os tempos corretos apresenta as seguintes diferenças, em
relação à Figura 3.2: (a) a velocidade de empilhamento é menor do que as velocidades
RMS e média (no caso, 1953.4m/s, 1986.7m/s e 1983.4m/s, respectivamente 8 ); (b) na
posição em que x = 0, o tempo de reflexão obtido com a velocidade de empilhamento,
ou seja, t0 , é menor do que o correto; (c) na mesma posição, a curva tempo-distância
definida pela velocidade RMS não é tangente à curva tempo-distância correta, em função
do fato de que não existe um ponto comum em profundidade e, portanto, vRM S 6= vN M O
7
Ver o subitem 2.5.2 e, em particular, as expressões 2.5.40 e 2.5.41, lembrando que os papéis de hmax
e zmax devem ser trocados.
8
A velocidade RMS, que é diferente da velocidade NMO, foi calculada, de forma não convencional,
com base na equação 2.5.45. Por sua vez, a velocidade média foi computada através da divisão entre a
profundidade do refletor e a metade do tempo de reflexão, calculado no afastamento fonte-receptor igual
a zero, o que a torna maior do que a velocidade vertical, a qual é 1980m/s (ver a Figura 3.3). Ressalte-se
entretanto que, se a velocidade média fosse calculada pela razão entre o comprimento do raio e o tempo
correspondente, ela seria, neste caso, apenas ligeiramente menor do que a RMS.
3.1. INTRODUÇÃO 287

0.02
Diferença de tempo quadrático
0
A
−0.02

−0.04
C

−0.06 B

−0.08

−0.10

−0.12
0 1 2 3 4
Razão afastamento/profundidade

Figura 3.4: Diferença de tempo de reflexão ao quadrado (s 2 ), em


relação ao estimado com a velocidade de empilhamento, em um agru-
pamento CMP: (A) tempos corretos; (B) tempos estimados com a ve-
locidade RMS e; (C) tempos estimados com a velocidade média. A
velocidade intervalar cresce linearmente com a distância entre a fonte e
o receptor, variando entre 1580m/s e 2380m/s, passando por 1980m/s
no ponto médio, o que equivale a um gradiente horizontal de 0.2s −1 . A
profundidade do refletor é igual a 1000m. As escalas horizontal e vertical
são lineares em função da distância ao quadrado e da diferença entre os
tempos elevados ao quadrado.

(ver a Figura 3.3). Por outro lado, pode-se dizer que o aumento no gradiente linear de
velocidade também leva a um aumento no valor residual da correção de NMO.
Sabe-se que a variação lateral de velocidade pode gerar efeitos muito mais severos do
que os ilustrados através da Figura 3.4. Este é o caso em que o mesmo fenômeno ocorre de
acordo com um comprimento de onda menor do que o máximo afastamento fonte-receptor
de um agrupamento CMP. Neste caso, observa-se o que se convencionou denominar “des-
locamento estático enterrado”, por causa da alteração no tempo de trajeto, introduzida,
em traços sı́smicos diferentes, pela variação lateral na velocidade.
As curvas tempo-distância em um agrupamento CMP são também afetadas pela ani-
sotropia nas velocidades intervalares. De acordo com a teoria apresentada no subitem
2.8.5, sabe-se que, em um meio transversalmente isotrópico, ou TI, esta caracterı́stica
faz com que, na correção de NMO com a velocidade de empilhamento isenta do efeito
da anisotropia, ocorra uma supercorreção nos maiores afastamentos fonte-receptor. Nos
casos mais tı́picos, particularmente quando o parâmetro de anisotropia δ é próximo de
zero e o eixo de simetria é vertical (VTI), o padrão geral é semelhante ao observado na
Figura 3.2.
Embora as diferenças de tempo presentes nas figuras 3.2 e 3.4 tenham caracterı́sticas
caricaturais — ou seja, em função do máximo afastamento fonte-receptor escolhido, são
288 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

−75

NMO residual (ms)


0

75
−75

75
0 1 2 3 4 S
Razão afastamento/Profundidade

Figura 3.5: Agrupamentos CMP sintéticos e resultados dos correspon-


dentes empilhamentos (letra S), no caso da reflexão gerada na base de
um modelo em que a velocidade intervalar cresce linearmente com a pro-
fundidade (na equação 3.1.13, v0 = 1700m/s, a = 0.6s−1 e z = 1000m).
No alto: resultado obtido com a velocidade de empilhamento estimada
com todos os traços sı́smicos. Embaixo: resultado correspondente à ve-
locidade obtida com a metade dos traços mais próxima da fonte. Pulso
sı́smico: filtro passa-banda de 8-40Hz.

propositalmente exageradas — elas são úteis para o entendimento do principal problema


da técnica CDP convencional: o efeito de deformação do sinal, causado pelo resı́duo da
correção de NMO, o qual faz com que uma reflexão seja empilhada de acordo com tempos
diferentes dos corretos.
Dois exemplos do efeito de filtragem associado à técnica CDP podem ser vistos na
Figura 3.5, a qual foi construı́da com base no mesmo modelo da Figura 3.2. Os valores
de t0 e vE foram estimados numericamente e o resı́duo da correção de NMO foi calculado
através da seguinte expressão:
s
x2
∆tN M O = t2 (x) − 2 − t(0)
vE

onde t(x) é o tempo de reflexão correto no afastamento fonte-receptor x. A velocidade


vE foi considerada constante em todos os tempos envolvidos. Observe-se que o tempo
t0 , estimado numericamente, não foi utilizado nos cálculos; sua influência é percebida
através do valor positivo de ∆tN M O na posição de máxima amplitude do sinal empilhado,
exatamente como em uma análise de velocidade convencional.
Destaca-se na Figura 3.5 a influência da faixa de afastamentos fonte-receptor em-
pregada na obtenção da velocidade de empilhamento: quando apenas metade do lanço
foi envolvida no processo, tanto o tempo t0 quanto a velocidade de empilhamento se
aproximaram dos valores teóricos de tempo vertical e velocidade RMS (t0 = 1007.8ms e
vE = 1998m/s, contra t(0) = 1007.6ms e vRM S = 1992m/s), mas a qualidade do resultado
do empilhamento é claramente pior do que a obtida com a velocidade estimada em todo
o lanço, ainda que, neste caso, os resultados numéricos obtidos sejam mais desfavoráveis
3.1. INTRODUÇÃO 289

à conversão de tempo para profundidade (t0 = 1012.5ms e vE = 2018m/s). É digna de


menção, no primeiro caso, a supercorreção de NMO dos eventos registrados nos maiores
afastamentos, a qual poderia, por exemplo, ser atribuı́da à influência da anisotropia.
No contexto da técnica CDP, o tratamento das curvas tempo-distância está associado
a outra importante distorção, que é o efeito de estiramento (em inglês, stretch), também
visı́vel na Figura 3.5. Trata-se, como sugere o nome, do aumento no comprimento do
pulso sı́smico, gerado em função da seguinte caracterı́stica da correção de NMO: o inter-
valo de tempo entre duas amostras de um traço sı́smico sem correção de NMO, dada por
∆t, é aumentado, após a aplicação da mesma correção, para ∆t0 . A razão entre os dois
intervalos pode ser estimada com base na derivada da equação 3.1.1 com relação a t0 , a
qual, se for levada em conta a variação vertical da velocidade, é dada por
  2  
dt t0 t − t20 dvE
= 1− (3.1.14)
dt0 t v E t0 dt0

A presença dos fatores t0 /t e dvE /dt0 , aliada ao fato de que t > t0 , permite entender
porque o efeito de estiramento é proporcional ao aumento do afastamento fonte-receptor
e ao crescimento da velocidade de empilhamento com o tempo vertical. Ressalte-se que
apenas o primeiro fator influenciou a construção da Figura 3.5, ou seja, a variação vertical
da velocidade de empilhamento não foi considerada.
Para completar o entendimento do efeito de estiramento, resta estabelecer a relação
entre a correção de NMO e o conteúdo de freqüências do sinal. No caso, a expressão
3.1.14 permite a aplicação local da seguinte forma do teorema da escala da transformada
de Fourier (ver o item 1.2):
1 
SN (f ) = S fa (3.1.15)
a
onde S e SN são as transformadas de Fourier de uma janela do traço sı́smico envolvendo
uma reflexão qualquer, antes e depois da correção de NMO, enquanto a = dt/dt 0 e f é a
freqüência. Observa-se, assim, que a correção de NMO desloca o espectro de freqüências
do traço original na direção de f = 0, já que, em termos práticos, a < 1.
Com base na discussão apresentada no item 2.6, sabe-se que, na forma da equação
3.1.15, o chamado “efeito de estiramento” deveria representar, na verdade, a correção
de um fenômeno associado à aquisição dos dados sı́smicos: a redução no comprimento
da função refletividade, observada quando o ângulo de incidência é maior do que zero.
O efeito negativo, constatado em condições práticas, como a da Figura 3.5, é devido
exclusivamente ao conteúdo de freqüências do pulso sı́smico efetivo, que é limitado. Nes-
tas condições, é fácil concluir que nenhum problema existiria se o pulso sı́smico fosse
um impulso unitário e se, além disso, o intervalo de amostragem fosse suficientemente
pequeno.
Sabe-se que as deficiências da técnica CDP abrangem outros temas, ou seja, não se
restringem à curva tempo-distância. Entre as deficiências adicionais, incluem-se as que
dependem da relação entre a amplitude e a geometria das camadas. Este é o caso da fo-
calização e do espalhamento diferenciais do sinal registrado, os quais são controlados pela
curvatura dos refletores e das interfaces eventualmente atravessadas no trajeto. Assim,
dependendo da geometria de um refletor em um meio homogêneo, a amplitude registrada
pode ser maior em uma determinada faixa de afastamentos fonte-receptor, em relação
290 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

aos demais, ainda que o coeficiente de reflexão não varie. Um exemplo desta situação foi
apresentado na Figura 2.36 (página 129).
Um tema importante é o da relação entre a técnica CDP e a correção dos fatores de
propagação. Ver-se-á, no item 3.6, que, no contexto da técnica CDP, a correção do efeito
do espalhamento geométrico da energia não trata a amplitude das difrações de forma
adequada, já que as versões convencionais das técnicas empregadas com essa finalidade
assumem que todos os eventos são reflexões horizontais. A principal conseqüência desta
distorção é a deterioração no tratamento das amplitudes pela migração, afetando de
forma particularmente mais importante os eventos mergulhantes. A mesma idéia aplica-
se, ainda que em menor escala, ao caso da absorção.
Outra deficiência da técnica CDP consiste no tratamento inadequado da variação da
amplitude com o afastamento fonte-receptor. A este respeito, sabe-se que o empilha-
mento convencional leva a um valor médio das amplitudes, em vez do correspondente ao
afastamento igual a zero. Nestas condições, a opção pelo uso da técnica CDP implica
desprezar a variação do coeficiente de reflexão com o ângulo de incidência e admitir a
possibilidade de se interpretar erroneamente as caracterı́sticas elásticas do meio. Este
problema pode se tornar ainda mais importante quando o ângulo crı́tico é atingido na
faixa de afastamentos fonte-receptor abrangida pelo agrupamento CMP, o que introduz
uma importante variação na fase do sinal. Exemplos deste fenômeno foram ilustrados
através da Figura 2.58, na págins 221.
Por outro lado, deve-se mencionar o fato de a derivada do coeficiente de reflexão,
com relação ao ângulo de incidência, tender a zero, quando o mesmo ângulo tende a
zero. Esta é uma propriedade que beneficia a técnica CDP, na medida em que está
associada a uma variação suave da curva de coeficientes de reflexão em função do ângulo
de incidência, particularmente quando este é menor do que 30 ou 40 graus. Para uma
melhor compreensão do tema, sugere-se ao leitor consultar os itens 2.6 e 3.7.
Até agora, discutiram-se fenômenos diretamente associados à propagação de ondas
elásticas. Diversos fenômenos que não se enquadram neste padrão prejudicam não so-
mente a técnica CDP mas também a migração pré-empilhamento em tempo ou profun-
didade. Um deles é o chamado álias de CDP (conceito trazido para o Brasil por Milo
Backus, no inı́cio dos anos 80). Este é um efeito observado quando, em uma linha sı́smica,
ou em um volume de dados sı́smicos, a geometria de aquisição leva à geração de agru-
pamentos CMP com diferentes composições de afastamento fonte-receptor. Assim, no
caso 2-D, quando a distância entre pontos de tiro, D, é maior ou igual à distância entre
estações de geofones, d, o número de diferentes agrupamentos CMP possı́veis é dado pelo
fator 2D/d. Em conseqüência, reforçam-se, na seção empilhada, os eventos espúrios com
comprimento de onda definidos pelo produto entre o mesmo fator e a distância entre
traços sı́smicos empilhados. A forma mais simples de atenuar os ruı́dos em álias envolve
a aplicação, à seção empilhada, da mistura linear de 2D/d traços. Ressalte-se que, no
caso 3-D, os padrões de álias de CDP e, conseqüentemente, a atenuação de seus efeitos,
podem ser bem mais complexos.
Nos sistemas de aquisição mais modernos, a técnica CDP vem sendo ajustada, em
maior ou menor grau, a uma filosofia alinhada com as idéias discutidas neste capı́tulo.
Em particular, destaca-se a amostragem dos eventos, seja ruı́do ou sinal útil, que, ide-
almente, deve ser feita de acordo com as seguintes práticas: (1) os arranjos de campo,
tradicionalmente utilizados no cancelamento de uma ampla gama de diferentes ruı́dos,
3.1. INTRODUÇÃO 291

devem ser tratados apenas como filtros anti-álias espacial; (2) a amostragem espacial
deve ser densa, propiciando o uso de arranjos de campo mais curtos e, consequentemente,
otimizando a aplicação de correções estáticas e de filtros espaciais, no processamento; (3)
a geometria de aquisição deve ser planejada de forma a minimizar a amostragem de ruı́do
em álias espacial nos agrupamentos CMP; (4) deve-se favorecer, sempre que possı́vel, a
aplicabilidade do princı́pio da reciprocidade, com vistas à otimização de técnicas como
a migração pré-empilhamento, a atenuação de múltiplas e as correções estáticas; (5) a
faixa dinâmica dos instrumentos deve ser a maior possı́vel (neste caso, pode-se chegar ao
ponto em que a cada geofone corresponda um canal de registro, sem preocupações quanto
à razão sinal/ruı́do, durante a fase de aquisição).

Melhorando a técnica CDP9

Ver-se-á, nos itens 3.6 e 3.7, que a melhor forma de tratar a maior parte das deficiências
da técnica CDP passa pela migração tridimensional pré-empilhamento em profundidade,
seguida da inversão elástica dos dados sı́smicos. Com freqüência, entretanto, adota-se um
dos seguintes procedimentos alternativos: (1) correção de DMO, seguida de empilhamento
e migração e; (2) migração em tempo de agrupamentos fonte-receptor comum, seguida
de empilhamento.
A correção de DMO — voltada para as distorções causadas pelo mergulho e par-
cialmente discutida no item 3.6 — reduz a interdependência entre o mergulho dos re-
fletores e o afastamento entre a fonte e o receptor. Nesta circunstância, a velocidade
de empilhamento passa também a independer do mergulho, ao mesmo tempo em que a
correspondente velocidade NMO tende a se aproximar da velocidade RMS.
Ver-se-á, no item 3.6, que a segunda alternativa, baseada na migração pré-empi-
lhamento em tempo, possibilita a correção de fatores adicionais. Entretanto, como a
técnica CDP, também depende de uma boa descrição analı́tica da curva tempo-distância,
principalmente ao se levar em conta a abertura do operador de migração, que pode ser
bem maior do que o máximo afastamento fonte-receptor disponı́vel.
Nestas condições, fatores como as distorções causadas pela variação lateral e vertical
da velocidade de empilhamento, assim como pela anisotropia, devem ser levados em conta,
o que exige descrições mais detalhadas da curva tempo-distância do que a da equação
3.1.1. Diversas dessas descrições mais sofisticadas são baseadas na seguinte série Taylor
(ver o subitem 2.5.2):
t2 = t20 + A1 x2 + A2 x4 + A3 x6 + · · · (3.1.16)

onde, como antes, t e x são o tempo de reflexão e o afastamento fonte-receptor. Por sua
vez, Ak é o coeficiente k da expansão.
Na aplicação da equação 3.1.16, uma das alternativas, baseada no truncamento da
série no segundo termo, consiste em definir melhor o parâmetro A1 , adaptando-o a cada
afastamento fonte-receptor. Esta idéia está no núcleo da técnica CRS (Common Reflec-
tion Surface), proposta pelo grupo de Peter Hubral (ver Hubral et al., 1998; Müller, 1998),
a qual, no caso 2-D, é baseada na equação 2.5.75. Em termos práticos, os parâmetros
envolvidos são obtidos de forma automatizada, sem interferência direta do geofı́sico.
9
Com agradecimentos a Carlos Cunha Filho, Gerson Ritter e Antônio Buginga Ramos.
292 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Outras alternativas baseiam-se no truncamento da série 3.1.16 no terceiro termo, em


vez do segundo, gerando o que se convencionou denominar aproximação de quarta ordem.
Este é o caso, embora não de forma explı́cita, da equação proposta por de Bazelaire (1988).
É também o caso da seguinte versão da equação 2.5.59:

x2 αx4
t2 = t20 + − (3.1.17)
vE2 vE4

onde vE é a velocidade de empilhamento aplicável a afastamentos fonte-receptor, x,


próximos de zero, ou seja,
vE ∼
= vN M O
e, com base na equação 2.5.66,
1 dv 2
α∼
= lim E2 (3.1.18)
2 x→0 dx
Uma alternativa para a equação 3.1.17, baseada na expressão 2.5.63, é dada por

x2
t2 = t20 + (3.1.19)
vE2 + αx2

onde α é dado pela expressão 3.1.18. Observe-se que, neste caso, torna-se clara a variação,
com o afastamento fonte-receptor, da velocidade de empilhamento efetiva, já que v E é
válida apenas nas posições em que x tende a zero.
As equações 3.1.17 e 3.1.19 são adequadas à correção de NMO na presença de variação
espacial de velocidade em um meio isotrópico. No caso em que se leva em conta a
anisotropia de meios TI, aplica-se a seguinte expressão (Alkhalifah e Tsvankin, 1995):

x2 2ηx4
t2 = t20 + − (3.1.20)
vE2 vE2 [t20 vE2 + (1 + 2η)x2 ]

onde, com base nos parâmetros de anisotropia de Thomsen (1986),


ε−δ
η=
1 + 2δ
Por outro lado, sabe-se que
1X 2
vE2 ∼ 2
= vN MO = v (1 + 2δi )∆t0,i (3.1.21)
t0 i Pi

onde vPi e ∆ti são a velocidade P e o tempo de trajeto na direção vertical, na camada de
ı́ndice i.
Nas figuras 3.6, 3.7 e 3.8, apresentam-se os erros no tempo de reflexão, obtidos através
da aplicação numérica das equações 3.1.1, 3.1.19 e 3.1.20 a três diferentes modelos10 . Na
primeira (3.6), a velocidade varia linearmente com a profundidade e é constante na
direção horizontal. Na segunda (3.7), a velocidade varia lateralmente e é constante na
10
Um aspecto importante das figuras 3.6, 3.7 e 3.8 deve ser mencionado: como elas descrevem erros
antes da correção de NMO, elas não refletem os resı́duos desta correção.
3.1. INTRODUÇÃO 293

10

A
5
Erro (ms)

C
0

−5

−10
0 1 2 3 4
Razão afastamento/profundidade

Figura 3.6: Erro correspondente ao tempo de reflexão, antes da


correção de NMO, estimado com: (A) equação 3.1.1; (B) equação
3.1.20 e; (C) equação 3.1.19. A velocidade intervalar cresce linearmente
com a profundidade de acordo com a expressão 3.1.13. Parâmetros:
v0 = 1800m/s, a = 0.62s−1 e z = 1500m. Comparar com a Figura 2.41,
na página 157, levando em conta que o ângulo de incidência correspon-
dente ao máximo afastamento fonte-receptor usado foi 85.7 0 .

direção vertical. Na terceira (3.8), incluiu-se o efeito da anisotropia. Nos três casos,
os valores corretos de tempo, assim como a velocidade NMO (ou RMS), foram obtidos
analiticamente, com base na teoria apresentada nos subitens 2.5.2 e 2.8.5. Os parâmetros
que caracterizam as três equações citadas foram estimados numericamente, com base na
minimização dos respectivos erros quadráticos.
Combinadas com os resultados numéricos, apresentados na Tabela 3.1, as figuras 3.6,
3.7 e 3.8 permitem as seguintes observações: (a) como já se sabia, a equação 3.1.1 é uma
representação pobre da realidade e; (b) não é fácil isolar a influência dos parâmetros que
caracterizam as expressões 3.1.19 e 3.1.20, já que ambas geram resultados de qualidade
similar; (c) nas estimativas baseadas na aproximação hiperbólica, os erros apresentam
formas diferentes na presença de anisotropia ou de crescimento da velocidade com a
profundidade (no primeiro caso, a curva é um pouco mais simétrica).
Mesmo levando em conta as diferenças constatadas nas figuras 3.6 a 3.8, percebe-se
que a anisotropia pode ser confundida com variação espacial na velocidade e vice-versa.
De acordo com a discussão apresentada na página 289 e ilustrada através da Figura
3.5, sabe-se que esta dubiedade pode ser ainda maior no caso em que se determinam
velocidades de empilhamento em pequenos afastamentos fonte-receptor e se aplicam as
mesmas velocidades na correção de NMO dos eventos situados em todo o lanço. Se, além
disso, a anisotropia for associada aos efeitos do filtro estratigráfico, pode-se afirmar que
os valores dos parâmetros vE e η, estimados no processo, dependem do processamento
294 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

10

5 A

0
Erro (ms)

B
−5

−10

−15
0 1 2 3 4
Razão afastamento/profundidade

Figura 3.7: Erro correspondente ao tempo de reflexão, antes da


correção de NMO, estimado com: (A) equação 3.1.1; (B) equação 3.1.20
e; (C) equação 3.1.19. A velocidade intervalar cresce linearmente com a
distância horizontal entre 1380m/s e 2580m/s, passando por 1980m/s,
no ponto médio. A profundidade do refletor é 1000m.

Parâmetro Estimativa Fig. 3.6 Fig. 3.7 Fig. 3.8


vRM S 2248.5 1995.0
vN M O 2248.5 2549.0
v̂N M O (A) 2301.9 1919.7 2691.1
v̂N M O (B) 2187.0 2035.0 2546.5
v̂N M O (C) 2249.6 1972.8 2630.8
t0 1343.6 1006.3 2000.0
t̂0 (A) 1355.3 994.6 2016.0
t̂0 (B) 1341.0 1009.0 1999.8
t̂0 (C) 1343.6 1006.3 2004.5
η − − 0.0769
η̂ (B) 0.0662 −0.070 0.0753
α 0.0075 − −
α̂ (C) 0.0076 −0.015 0.0038

Tabela 3.1: Parâmetros teóricos e estimados, correspondentes às


figuras 3.6 (variação vertical de velocidade), 3.7 (variação lateral
de velocidade) e 3.8 (anisotropia de meios TI). As unidades das
velocidades e do tempo são, respectivamente, m/s e ms, enquanto
α é dado em s−2 . Os valores emoldurados representam os melhores
resultados obtidos.
3.1. INTRODUÇÃO 295

15

10
A
C
5
Erro (ms)

B
0

−5

−10

−15
0 1 2 3 4
Razão afastamento/profundidade

Figura 3.8: Erro correspondente ao tempo de reflexão, antes da


correção de NMO, estimado com: (A) equação 3.1.1; (B) equação 3.1.20
e; (C) equação 3.1.19. O meio é anisotrópico (isotropia transversa) e os
parâmetros correspondentes são (ver o subitem 2.8.5): vP = 2500m/s,
ε = 0.1, δ = 0.02 e razão vP /vS = 2. A profundidade do refletor é
2500m.

anterior, uma vez que a aplicação de filtros temporal e espacialmente variáveis, como a
compensação Q, tende a corrigir a dispersão. O mesmo ocorreria com o valor de α, já
que a posição relativa dos picos e cavidades do pulso seria alterada.
Em muitos casos, pode ser conveniente estimar a velocidade de empilhamento e o
parâmetro α, ou η, em duas etapas. Na primeira, aplica-se a equação 3.1.1 e se utiliza
uma faixa de afastamentos fonte-receptor relativamente próxima da fonte, o que permite
a obtenção de velocidades, vE , e tempos de reflexão, t0 , mais adequados ao conceito de
velocidade NMO, ou RMS (ver a parte inferior da Figura 3.5). Na segunda etapa, já
com a faixa de afastamentos completa, determina-se o valor de α, ou de η, fixando-se
vE e t0 . Uma versão simplificada da segunda etapa, aplicável à equação 3.1.17, consiste
em se estimar algebricamente o valor de α, usando-se a expressão 2.5.67 e a aproximação
vE2 ∼
= µ2 . No processo, as velocidades intervalares são obtidas com a equação 3.1.22.
Uma interessante técnica — independente da expansão 3.1.16 — fundamenta-se na se-
guinte idéia, proposta por Al-Chalabi (1974): é possı́vel remover o chamado bias, presente
na velocidade de empilhamento, de forma a convertê-la na velocidade NMO, ou RMS.
Neste processo, é necessário estimar a curva tempo-distância teórica — normalmente,
através de traçamento de raios — que melhor se ajusta à obtida com base na velocidade
de empilhamento. A curva assim estimada, que tende a se aproximar da real, é usada no
empilhamento, em substituição à calculada com a velocidade de empilhamento. No texto
que se segue, discute-se uma versão mais abrangente desta técnica.
296 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Obtenção de velocidades intervalares


As geometrias de aquisição de dados sı́smicos mais empregadas implicam expressivos afas-
tamentos fonte-receptor. Do ponto de vista cinemático, esta situação favorece a obtenção
de velocidades intervalares, seja através da migração pré-empilhamento em profundidade
(item 3.6), seja através da técnica CDP. Neste último caso, o procedimento mais simples
consiste em determinar velocidades intervalares com base na conhecida fórmula de Dix,
a qual é gerada a partir de uma manipulação algébrica da equação 2.5.78, o que permite
a obtenção da seguinte expressão:

(vE2 t)2 − (vE2 t)1


v2 = (3.1.22)
t2 − t 1

onde v é a velocidade intervalar, vE é a velocidade de empilhamento, t é o tempo vertical


(t0 na equação 3.1.1) e os ı́ndices 1 e 2 indicam duas interfaces sucessivas.
Implı́cita, na equação 3.1.22, está a aproximação da velocidade RMS pela velocidade
de empilhamento. Considerando os problemas discutidos anteriormente, esta pode ser
considerada uma aproximação grosseira, mesmo levando em conta a melhor qualidade
propiciada pelas equações 3.1.19 e 3.1.20. No caso particular da anisotropia, a natural
dificuldade para se obter o parâmetro δ piora ainda mais a qualidade da aproximação.
Assim, outro tipo de técnica inversa deve ser aplicada às velocidades de empilhamento,
se se deseja obter velocidades intervalares de boa qualidade.
Visando uma solução mais abrangente para o problema exposto, procura-se obter não
somente velocidades intervalares mas, também, o tempo vertical correto, já que ambos
são estimados com bias, no processo de empilhamento, como se pode ver na Figura 3.2
(ver Al-Chalabi, 1974, 1979). Nesse tipo de técnica, aplicada à geometria de um agrupa-
mento CMP, procura-se determinar o modelo de velocidades intervalares que poderia dar
origem às curvas tempo-distância estimadas com base nas velocidades de empilhamento.
A complexidade envolvida no equacionamento da lei de Snell, na presença de múltiplas
camadas, faz com que as técnicas mais indicadas para esse fim sejam iterativas. Uma
delas, baseada no método Gauss-Newton de solução de equações, permite estimar a ve-
locidade intervalar, v, e a espessura, e, de cada camada, através da seguinte equação:
   
v v [A]Tk  
= + [t] − t̂ k (3.1.23)
e k+1
e k [A]Tk [A]k

onde k é o ı́ndice da iteração, [t] − t̂ k é o vetor com a diferença entre os tempos
fornecidos e aqueles obtidos na iteração k, cada elemento do vetor correspondendo a um
afastamento fonte-receptor. A matriz [A] contém as derivadas dos tempos t da iteração
k, com relação à velocidade e à espessura, para os diferentes afastamentos envolvidos.
Ou seja, A é constituı́da de vetores definidos por ∂t/∂v e ∂t/∂e, cada um deles em uma
coluna cujo número de elementos é igual ao de traços sı́smicos usados. Por sua vez, T
denota transposição de matriz.
Na aplicação da técnica, o modelo inicial de cada camada é construı́do a partir dos
pares de tempo e velocidade intervalar de Dix, obtida com a equação 3.1.22, enquanto a
curva tempo-distância dada é medida no agrupamento CMP, ou estimada com base na
velocidade de empilhamento. Com essa estimativa inicial e o resultado da pesquisa nas
3.1. INTRODUÇÃO 297

camadas superiores, monta-se o modelo da primeira iteração e se computa a curva tempo-


distância correspondente, utilizando-se técnicas de traçamento dos raios, de acordo com
a mesma geometria empregada na medida dos tempos dados.
A matriz de derivadas dos tempos, com relação aos parâmetros desejados, pode ser
computada numericamente ou, alternativamente, a partir de aproximações analı́ticas. As
matrizes obtidas com esses dados são substituı́das na equação 3.1.23 e se calcula novo
modelo para a camada em questão. Repete-se então todo o processo, comparando-se
sempre a curva tempo-distância do modelo com a curva fornecida, tantas vezes quantas
forem necessárias para que o erro dessa diferença atinja um nı́vel aceitável. Normalmente,
três a quatro iterações são suficientes.
A aplicação da equação 3.1.23 é baseada no conceito de continuação para baixo, ou
seja, a determinação das velocidades intervalares e espessuras é feito de cima para baixo,
camada a camada, no que se convencionou denominar “despimento de camadas” (layer
stripping). O resultado pode ser otimizado se forem escolhidos refletores bem definidos,
como no caso do limite entre seqüências sismoestratigráficas. Casos como o dos domos
de sal devem ser tratados de maneira particularmente cuidadosa.
A técnica descrita á aplicável a um modelo de camadas horizontais e, além disso,
permite inversão de um único CMP. Entretanto, é possı́vel generalizá-la para qualquer
modelo geológico e número de CMP’s, desde que a quantidade de medidas de tempo seja
superior à de incógnitas (ver Bishop et al., 1985). No caso, a geometria das camadas,
estabelecida em função das velocidades intervalares e da profundidade, deve respeitar o
modelo em tempo fornecido, o qual pode ser baseado em uma simples interpretação da
seção empilhada e das velocidades de empilhamento. O resultado da inversão descrita
pode ser visto como uma versão geométrica da migração em profundidade.
Outra técnica, em tese mais poderosa, consiste em determinar as velocidades interva-
lares através da análise de velocidade de migração em profundidade. A técnica é baseada
na análise de um conjunto de agrupamentos CI (do inglês Common Image), cada um
deles obtido, em uma mesma posição espacial, com uma diferente velocidade intervalar
da camada que está sendo estudada. O agrupamento CI em que a imagem da base da
camada aparece horizontalmente alinhada, nos diversos afastamentos fonte-receptor, deve
corresponder à velocidade intervalar correta (ver o item 3.6).
A análise de velocidade de migração assim descrita também envolve o processo de
despimento de camadas, ou seja, as velocidades são determinadas camada a camada, de
cima para baixo. A determinação das velocidades, que normalmente exige a participação
humana, pode ser automatizada, através da aplicação de técnicas tomográficas, similares à
implı́cita na equação 3.1.23. Observe-se, na mesma equação, que a convergência da busca
iterativa depende da diferença entre os tempos estimados em cada passo e os tempos
conhecidos, os últimos dos quais são resultantes de uma medida. Neste caso, para que se
evite o envolvimento humano, é necessário utilizar uma medida automática dos tempos
ou substituir o critério de avaliação do processo. Na migração em profundidade, é comum
a adoção — isoladamente ou em conjunto — dos seguintes critérios: (1) avaliação do grau
de horizontalização dos eventos, aferido em uma janela preestabelecida e; (2) maximização
da amplitude resultante da soma dos traços sı́smicos que compõem o agrupamento CI em
uma dada janela de profundidade.
As duas técnicas descritas podem ser alteradas de forma a permitir a obtenção de
parâmetros adicionais importantes. Entre estes, citam-se o gradiente de velocidade ver-
298 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

tical em cada camada e os parâmetros que descrevem a anisotropia, como os propostos


por Thomsen (1986), os quais podem afetar as estimativas de espessura e velocidade ob-
tidas. Tome-se como exemplo a equação 3.1.23: o gradiente vertical de velocidade e os
parâmetros de anisotropia poderiam facilmente ser incluı́dos como incógnitas adicionais,
ao lado da velocidade e da espessura de cada camada.
Estas idéias devem ser contrapostas ao seguinte fato: não é possı́vel afirmar que um
determinado modelo de velocidades está correto mas, sim, que ele é adequado aos dados
sı́smicos registrados. Em outras palavras: a distribuição das espessuras e velocidades
das camadas, necessária para se obter uma imagem sı́smica de boa qualidade, ou um
bom ajuste entre os tempos de reflexão medidos e os estimados, pode não corresponder ao
modelo geológico correto. Isto se deve ao fato de que, para poderem ser aplicadas, as duas
técnicas dependem de uma acentuada simplificação da realidade. Desta forma, pode-se
garantir que, por melhores que sejam, os resultados da inversão ainda incluem distorções
residuais.

3.2 A Deconvolução da Assinatura Sı́smica


Sabe-se que a mais simples descrição matemática do traço sı́smico, st , corresponde à
convolução da assinatura da fonte, ou pulso sı́smico, pt , com a série de coeficientes de
reflexão, rt . Em um modelo geológico simples, com camadas espessas, o conhecimento do
pulso sı́smico, por si só, pode ser suficiente para que se obtenha uma estimativa razoável
do valor relativo dos coeficientes de reflexão, a partir de um traço sı́smico adequadamente
processado.
Entretanto, os modelos geológicos reais incluem camadas finas, dificultando, portanto,
a identificação dos coeficientes de reflexão (um exemplo simples dessa dificuldade é o das
camadas 2 e 5 da Figura 2.9, na página 86). Por outro lado, mesmo que o modelo geológico
seja simples, o desconhecimento da forma do pulso sı́smico pode levar a interpretações
erroneamente mais complexas. Assim, uma interface simples pode ser tomada como duas
ou mais, se um pulso sı́smico relativamente longo for interpretado como uma sucessão de
impulsos unitários.
O quadro descrito sugere duas providências: (1) aplicação de um processo de deter-
minação da forma do pulso sı́smico; (2) transformação da forma de onda obtida em outra,
mais apropriada à interpretação. Caracteriza-se assim a versão 1-D da deconvolução da
assinatura, cujo operador, denominado filtro de forma, é geralmente calculado através da
equação 1.4.11.
Algebricamente, a ação do filtro de forma sobre o pulso sı́smico pode ser descrita por

dˆt = ft ∗ pt

onde dˆt é a forma de onda obtida e ft é o filtro calculado, tomando-se como desejado o
pulso dt que, preferencialmente, deve ter fase igual a zero.
Como a convolução é um processo linear, pode-se afirmar que a expressão que se segue
é válida:
st ∗ f t = r t ∗ p t ∗ f t
ou
st ∗ ft = rt ∗ dˆt
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 299

Figura 3.9: Representação esquemática da deconvolução da assinatura, no domı́nio


da freqüência. A convenção usada na transformada de Fourier foi diferente da adotada
no Capı́tulo 1.

Portanto, a convolução do filtro de forma com o traço sı́smico altera o pulso sı́smico
na direção desejada, sem modificar a série de coeficientes de reflexão. As informações
geológicas permanecem e a interpretação torna-se mais fácil.
Se a forma de onda desejada, dt , for um impulso unitário, a deconvolução da assina-
tura pode ser representada, no domı́nio da freqüência, pelas operações contrárias às das
equações 2.1.62 e 2.1.63, como no exemplo da Figura 3.9. Assim, a divisão do espectro
de amplitude do traço sı́smico pelo espectro de amplitude do pulso resulta no espectro
de amplitude dos coeficientes de reflexão. Similarmente, a subtração do espectro de fase
do traço pelo espectro de fase do pulso resulta no espectro de fase dos coeficientes de
reflexão. Analiticamente, têm-se as seguintes expressões:

AS (f )
AR (f ) = (3.2.1)
AP (f )

e
φR (f ) = φS (f ) − φP (f ) (3.2.2)

onde A e φ representam amplitude e fase.


Na prática, a solução apresentada apresenta dois importantes problemas. Em pri-
meiro lugar, o pulso sı́smico é, com freqüência, desconhecido, o que leva à necessidade
de se estimá-lo. Em segundo lugar, o pulso sı́smico é, na verdade, uma composição
de diferentes formas de ondas, algumas delas variáveis no tempo e no espaço. Estas
dificuldades, aliadas aos ruı́dos e outras fontes de distorção, tornam conveniente discutir
de forma mais ampla a deconvolução da assinatura sı́smica, tomando como referência a
obtenção de uma estimativa para o pulso sı́smico.
300 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

3.2.1 Estimativas do pulso sı́smico


O problema básico discutido neste subitem é o da obtenção de estimativas da função
W (ω), a qual descreve a transformada de Fourier da assinatura da fonte presente nos
dados sı́smicos, preferencialmente sem os efeitos dos fatores de propagação. Diversas
técnicas vêm sendo desenvolvidas com esta finalidade, as quais podem ser agrupadas de
acordo com as seguintes famı́lias: (1) gravação do pulso sı́smico em condições de campo
remoto; (2) estimativas determinı́sticas; (3) estimativas estatı́sticas, baseadas na análise
do sinal sı́smico e; (4) estimativas baseadas em dados de poços. O caso do Vibroseis, que
é uma fonte controlada, não será discutido aqui, bastando lembrar que o sinal responsável
pela geração da assinatura correspondente, o chamado sweep, é gravado e utilizado como
um elemento intrı́nseco e inseparável do processamento (ver o item 2.9).
De todas as famı́lias de técnicas citadas, a teoricamente mais robusta é a primeira,
de acordo com a qual se utiliza um pulso sı́smico registrado em campo remoto, o que
representa uma prática relativamente comum no caso da aquisição de dados no mar.
Uma versão alternativa desta técnica consiste em substituir o sinal gravado por uma
forma sintetizada do pulso sı́smico. Nas duas opções, a mais expressiva ressalva é o
fato de se assumir que o espectro de freqüências do pulso sı́smico não é modificado
durante a aquisição dos dados de produção. Desprezando-se esta ressalva, pode-se aplicar
diretamente a deconvolução determinı́stica da assinatura, na forma descrita adiante.
No caso da aquisição terrestre, sabe-se que registros do pulso sı́smico em campo remoto
são praticamente inexeqüı́veis. Por outro lado, sabe-se também, pelo menos desde os
trabalhos pioneiros de Joseph Sharpe, que a forma de onda elástica gerada pela explosão
de uma carga de dinamite depende tanto do tamanho da carga quanto das propriedades
do meio (ver Sharpe, 1942, 1944). A primeira dessas dependências se reflete no fato de
que o conteúdo de freqüências do pulso sı́smico é inversamente proporcional ao tamanho
da carga usada na sua emissão. Aplica-se ao caso a seguinte lei de escala (ver Ziolkowski,
1993):
s2 (t) = αs1 (t/α) (3.2.3)
onde α é uma constante proporcional à raiz cúbica da razão entre as massas de explosivo,
m2 /m1 , usadas na obtenção, em uma mesma posição, dos traços sı́smicos s1 e s2 .
A lei de escala da fonte está nos fundamentos de uma técnica proposta por Ziolkowski
através de uma série de trabalhos publicados a partir do final da década de 1970 (ver
Ziolkowski, 1993; Ziolkowski e Bokhorst, 1993). De acordo com o que estabelece a mesma
lei, a aplicação da técnica proposta exige o registro de dois sismogramas em uma mesma
posição no terreno, cada um deles com uma diferente carga de explosivos. Assumindo-
se que a geologia e as propriedades do meio sejam as mesmas, os registros desses dois
sismogramas seriam suficientes para, através de uma técnica inversa, estimar a assinatura
básica correspondente.
Na aquisição marinha, algumas técnicas determinı́sticas baseiam-se na utilização do
registro em campo próximo, ou seja, junto da fonte, através do qual pode-se estimar a
assinatura sı́smica em campo remoto. No caso de fontes pontuais — relativamente pouco
usadas —, a técnica é grosseiramente equivalente à do registro em campo remoto, já
mencionada. Infelizmente, a fonte marinha mais comum, o air-gun, exige um tratamento
diferenciado, uma vez que os correspondentes arranjos envolvem fenômenos de interação
relativamente complexos.
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 301

De acordo com Ziolkowski et al. (1982), o arranjo de canhões de ar, que atuam de forma
interativa, é aproximadamente equivalente a um arranjo teórico (notional ) de canhões
não interativos, cujo padrão de radiação combinado é idêntico ao do arranjo original.
Os mesmos autores demonstram que as assinaturas desses canhões equivalentes podem
ser determinadas com base em medidas feitas em campo próximo, ou seja, através de
receptores situados a uma distância da fonte pequena o suficiente para reduzir a influência
recı́proca dos canhões (mas grande o suficiente para reduzir a importância de efeitos não
lineares associados à geração das bolhas de ar). Em cada um desses receptores, registra-
se um sinal que pode ser descrito, no domı́nio da freqüência angular, ω, pela seguinte
expressão:

M  
X 1 r
Sn (ω) = Wm (ω) exp(iωτnm ) − exp(iωτgnm ) (3.2.4)
m=1
Rnm Rgnm

onde Sn (ω) e Wm (ω) são as transformadas de Fourier do sinal registrado no receptor


de número n e da assinatura do canhão m, a última das quais é desconhecida. Por
sua vez, Rnm e τnm representam as correspondentes distância e tempo de trajeto. O
subscrito g identifica o trajeto associado ao fantasma gerado na superfı́cie e r é o módulo
do coeficiente de reflexão na mesma posição.
Na aplicação da proposta de Ziolkowski et al. (1982), há necessidade do registro em
campo próximo através de, pelo menos, um receptor para cada canhão de ar. Neste caso,
ter-se-ia um número mı́nimo de uma equação como a 3.2.4 para cada canhão, ou seja,
pelo menos M registros em diferentes posições. Criam-se, assim, condições para obter as
assinaturas de todos os canhões e, com o resultado obtido, calcular a assinatura sı́smica
em campo remoto, na posição desejada. Avaliações desta idéia são discutidas por Parkes
et al. (1984) e por Landro et al. (1991).
Na técnica proposta por Oliveira (2000), não há necessidade de se registrar a assina-
tura sı́smica em campo próximo, já que se trabalha com a onda direta gerada pela fonte,
amostrada pelo cabo de hidrofones convencional. Trata-se de uma idéia que se aplica
a regiões de águas profundas, onde a onda direta atinge os receptores antes do sinal
espalhado. Nestas condições, pode-se descrever a onda direta, no domı́nio freqüência-
distância, ou ω-x, através da seguinte expressão:
X
D(ω, xg ) = W (ω) ck Gk (ω, xk , xg ) (3.2.5)
k

Nesta expressão, ck é uma constante proporcional à raiz cúbica do volume do canhão k,


enquanto D, W e G denotam as transformadas de Fourier de: D, a onda direta, registrada
na posição xg ; W , a assinatura da fonte; G, a função de Green correspondente ao trajeto
entre a posição de cada canhão k e o receptor g, função esta que deve incluir o efeito do
fantasma gerado na superfı́cie livre (ver o item 2.9).
Na equação 3.2.5, a distribuição e as caracterı́sticas dos canhões individuais, assim
como do receptor, são dados conhecidos. Nestas condições, pode-se facilmente estimar
a função W (ω). Uma simplificação do processo é obtida levando-se em conta o fato de
que a propagação da onda direta e do fantasma correspondente ocorrem ao longo de uma
direção próxima da horizontal. Em conseqüência, a diferença de tempo entre os dois
302 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

sinais tende a zero e, como o coeficiente de reflexão na superfı́cie é aproximadamente


igual a −1, a função D pode ser reescrita da seguinte forma:
X ck
D(ω, xg ) ∼
= W (ω) [exp(iωτk ) − exp(iωτk + iω∆τ )]
Rk
k

ou, para pequenos valores de ∆τ ,


X ck
D(ω, xg ) ∼
= (−iω∆τ )W (ω) exp(iωτk ) (3.2.6)
k
Rk

onde R e τ correspondem à distância e ao tempo entre cada canhão e o receptor.


Percebe-se, com base na equação 3.2.6, que a função D pode ser vista como a trans-
formada de Fourier da derivada do pulso sı́smico com relação ao tempo, ponderada por
∆τ . Neste caso, é possı́vel estimar W (ω) através da seguinte expressão:
DI (ω, xg )
W (ω) ∼
= P ck (3.2.7)
exp(iωτk )
k Rk

onde DI é a transformada de Fourier da integração numérica adimensional da onda direta


ao longo do eixo dos tempos (uma soma corrida). Nesta forma, uma eventual instabilidade
se restringira à inversão do arranjo de canhões e não envolveria o fantasma da fonte.
Técnicas como a de Ziolkowski, ou a de Oliveira, dependem do conhecimento preciso
do arranjo e das caracterı́sticas da fonte sı́smica, para que se possa estimar a assinatura da
fonte em campo remoto. Este tema levou Hargreaves (1984, 1996) a propor uma técnica
alternativa, baseada na propagação de ondas, de acordo com a qual o registro sı́smico
convencional seria acompanhado pelo registro da onda direta, através de um conjunto de
receptores situado abaixo da fonte. Os dados adicionais, assim obtidos, são submetidos
à propagação, com base na integral de Kirchhoff, para a posição desejada, fazendo com
que o pulso sı́smico registrado em campo próximo seja convertido em um pulso de campo
remoto (ver o item 2.7). A idéia de Hargreaves envolve dois problemas: (1) a necessidade
de registrar o sinal em afastamentos fonte-receptor iguais e menores do que zero, para
que a extrapolação seja bem-sucedida e; (2) em águas rasas, a influência do campo de
ondas espalhado, que pode afetar a qualidade do registro do pulso sı́smico11 .
Uma técnica até certo ponto similar à de Hargreaves é a de Weglein e Secrest (1990),
a qual se baseia no registro dos campos de ondas P e ∂P/∂z, a profundidades apenas
ligeiramente maiores do que a da fonte. Com os dois campos registrados, aplica-se o
teorema da extinção para se eliminar as reflexões e obter a onda direta, a qual é propagada
para as profundidades desejadas (ver o item 2.7). Esta técnica, em tese muito poderosa,
esbarra no fato de que a aquisição concomitante de dois tipos de campos de ondas não é
muito comum, já que exige o uso simultâneo de hidrofones e geofones ou, na melhor das
hipóteses, de dois cabos de hidrofones. Ainda que se contorne esta dificuldade, estimando-
se o campo de ondas ∂P/∂z a partir do campo de ondas P (idéia de Arthur Weglein), há
ainda que se mencionar, como ocorre no caso da técnica de Hargreaves, a necessidade de
registrar o sinal em afastamentos fonte-receptor iguais e menores do que zero.
11
Este é um problema que, obviamente, afeta também as técnicas de Ziolkowski et al. (1982) e Oliveira
(2000).
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 303

Outra técnica que se poderia rotular como determinı́stica corresponde a um subpro-


duto do processo de remoção de múltiplas desenvolvido pelos grupos de Weglein (Weglein
et al., 1997; Carvalho, 1992) e de Berkhout (Verschuur et al., 1988; Berkhout e Verschuur,
1997a,b). Neste processo, discutido parcialmente adiante, há possibilidade de se obter
uma estimativa do pulso sı́smico com base na premissa segundo a qual a energia dos
dados sı́smicos sem eventos múltiplos é menor do que a dos mesmos dados com even-
tos múltiplos (ver, por exemplo, Ikelle et al., 1997). Em tese, a minimização da energia
somente é bem-sucedida se a fase do pulso sı́smico for igual a zero e se o espectro de
amplitude for plano. Com base nesta condição, o processo de atenuação dos eventos
múltiplos, que envolve um grande volume de dados sı́smicos não empilhados, possibilita
a obtenção de uma estimativa do pulso sı́smico.
Até agora, discutiram-se técnicas que, teoricamente, não são afetadas pela influência
do meio responsável pelo campo espalhado, ou seja, pelas reflexões registradas. Isto sig-
nifica que o registro em campo remoto e as técnicas determinı́sticas mencionadas levam,
pelo menos em tese, a pulsos sı́smicos independentes da influência de fenômenos como
absorção, filtragem estratigráfica, etc. No caso das técnicas estatı́sticas e as que se ba-
seiam em dados de poços, discutidas em seguida, há necessidade de atenuar previamente
o efeito desses fenômenos ou admitir que eles façam parte da assinatura sı́smica.
As técnicas estatı́sticas, voltadas para a determinação da assinatura sı́smica, são
baseadas na decomposição espectral do traço sı́smico. A este respeito, uma simples
inspeção dos espectros de amplitude incluı́dos na Figura 3.9 permite duas importantes
constatações, baseadas em uma aproximação de primeira ordem: (1) as oscilações com
maior periodicidade no espectro de amplitude do traço sı́smico, ou seja, aquelas que
envolvem pequenos intervalos de freqüência, são associadas aos coeficientes de reflexão;
(2) as oscilações mais suaves do espectro de amplitude do traço sı́smico, ou seja, aque-
las que envolvem grandes intervalos de freqüência, são associadas ao pulso sı́smico e a
deformações que, no domı́nio do tempo, são de curta duração.
No jargão da deconvolução homomórfica, discutida abaixo, diz-se que o pulso sı́smi-
co apresenta predominância de componentes de baixa qüefrência (freqüência medida no
espectro de freqüências, em unidades de ciclos por Hertz), enquanto a série de coeficientes
de reflexão é dominada por componentes de alta qüefrência. Na verdade, com base na
discussão apresentada no item 2.6, sabe-se que não somente o pulso sı́smico mas também
a função refletividade envolve componentes de baixa qüefrência.
A análise dos espectros de fase da Figura 3.9 poderia levar a constatações similares.
Observe-se, na figura, que o espectro de fase da função refletividade apresenta um as-
pecto aleatório superposto a um importante componente linear, enquanto o espectro de
fase do pulso sı́smico é suave e apresenta módulo reduzido. Percebe-se por outro lado
que ocorrem, no espectro de fase da função refletividade, oscilações suaves de relativa
importância, semelhantes às observadas no espectro de fase do pulso sı́smico. Estas ca-
racterı́sticas fazem com que a decomposição do espectro de fase do traço sı́smico seja uma
tarefa bastante difı́cil, o que explica a freqüente necessidade da adoção de premissas como
a de fase mı́nima ou o recurso a técnicas determinı́sticas para a obtenção de estimativas
confiáveis da fase do pulso sı́smico.
Entre as técnicas estatı́sticas que se baseiam na decomposição espectral descrita,
as mais bem-sucedidas concentram-se na obtenção do espectro de amplitude do pulso
sı́smico. Técnicas de filtragem do espectro de amplitude do traço sı́smico, ou suas equi-
304 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

valentes no domı́nio do tempo, possibilitam, em muitos casos, a obtenção de versões


aceitáveis do espectro de amplitude do pulso sı́smico. No caso do espectro de fase, a
solução mais robusta, embora nem sempre correta, consiste em assumir que a fase do
pulso sı́smico é mı́nima, o que leva à possibilidade de se estimá-la a partir do espectro de
amplitude correspondente. De acordo com os resultados do projeto conduzido por Sch-
neider et al. (1982), esta caracterı́stica poderia ser aceitável no caso da dinamite aplicada
à aquisição de dados sı́smicos em terra (ver Sixta, 1982; Ziolkowski, 1991).
Nas técnicas dedicadas à obtenção de espectros de fase mı́nima a partir de espectros
de amplitude, as maiores dificuldades concentram-se em: (1) influência negativa dos
componentes de freqüência em que a amplitude reduz-se rapidamente para zero (ver
Walden, 1991); (2) tratamento digital de um fenômeno que é contı́nuo, ou, na melhor
das hipóteses, mais finamente discreto do que o usualmente assumido no método sı́smico
convencional (ver Hargreaves, 1992). A primeira dessas dificuldades é explorada com
maior profundidade nos subitens subseqüentes.
Tentativas estatı́sticas, voltadas para se estimar de forma independente o espectro de
fase do pulso sı́smico, não têm levado a resultados satisfatórios. Este tema foi objeto
de imenso esforço, em especial ao longo dos anos 1970 e 1980. Àquela época, uma das
técnicas mais intensamente pesquisadas foi a deconvolução homomórfica, proposta por
A. V. Oppenheim. De acordo com este conceito, existe a possibilidade de separação, no
domı́nio do cepstrum, das contribuições devidas aos coeficientes de reflexão e ao pulso
sı́smico (ver o item 1.5 e Ulrych, 1971). Uma das dificuldades enfrentadas por esta e
outras famı́lias de técnicas estatı́sticas concentra-se no desenrolamento da fase do traço
sı́smico — necessário para a obtenção de um espectro de fase sem descontinuidades —,
processo este que ainda não dispõe de um algoritmo de aplicabilidade geral (ver, por
exemplo, Shatilo, 1992).
Outra famı́lia de técnicas voltadas para se estimar a forma de onda do pulso sı́smico
primário baseia-se na correlação entre o traço sı́smico gerado sinteticamente com os perfis
de um poço e o traço sı́smico obtido na mesma posição espacial. Esta técnica, discutida
de forma especı́fica mais adiante, apresenta uma importante deficiência, muitas vezes ne-
gligenciada: nem sempre os perfis de poços representam a mesma geologia que a envolvida
no registro de um traço sı́smico (ver os itens 4.1 e 4.3). Para compensar esta deficiência,
pode-se usar dados de perfis sı́smicos verticais (Vertical Seismic Profiles, ou VSP’s).

3.2.2 Deconvolução determinı́stica


Considere-se o caso realista de um sismograma tı́pico, o qual implica afastamento entre a
fonte e os receptores. Nestas circunstâncias, torna-se conveniente separar o pulso sı́smico
em seus diversos componentes, uma vez que alguns deles variam com a direção em que
a onda se propaga e, portanto, exigem tratamento diferenciado. De acordo com uma
forma generalizada da equação 2.9.1, sabe-se que a forma de onda correspondente ao
pulso sı́smico depende de quatro componentes principais: (a) a assinatura da fonte pro-
priamente dita; (b) os fantasmas da fonte e do receptor; (c) os arranjos de tiro e receptor
e; (d) o equipamento de registro, que inclui instrumento e receptores.
No caso 2-D, a variação espacial e temporal de alguns desses componentes faz com
que a deconvolução da assinatura sı́smica presente em um sismograma seja mais adequa-
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 305

damente aplicada no domı́nio ω-Kx , no qual ela assume a seguinte forma:

S̃D (Kxs , Kxg , ω) = S̃(Kxs , Kxg , ω)P̃ −1 (Kxs , Kxg , ω) (3.2.8)

onde S̃D , S̃ e P̃ denotam, respectivamente, as transformadas de Fourier dos dados decon-


volvidos, dos dados registrados e do pulso sı́smico empregado no processo de aquisição.
Por sua vez, Kxs e Kxg representam, respectivamente, os números de onda horizontais
relativos aos agrupamentos de receptor comum, g, e fonte comum, s (ver o item 2.2).
A função inversa da transformada de Fourier do pulso sı́smico é dada por
h i−1
P̃ −1 (Kxs , Kxg , ω) = I(ω)H(ω)W (ω)As(Kxs )G̃s (Kxs , ω), Ag (Kxg )G̃g (Kxg , ω)
(3.2.9)
onde I, H e W são, respectivamente, as transformadas de Fourier das respostas do ins-
trumento, do receptor (hidrofone ou geofone) e da fonte sı́smica, enquanto A é a transfor-
mada de Fourier espacial do arranjo de campo (fonte ou receptor) e G̃ é a transformada
bidimensional de Fourier do operador do fantasma (fonte ou receptor).
Entre os componentes do pulso sı́smico, o mais difı́cil de deconvolver é certamente o
fantasma, tanto o da fonte quanto o do receptor, em grande parte porque não se conhece
com precisão os parâmetros que o influenciam. Na forma teoricamente mais correta, os
filtros inversos correspondentes são dados por
−1
G̃−1
s (Kxs , ω) = [1 + r exp(−iKzs 2ds )] (3.2.10)

e  −1
G̃−1
g (Kxg , ω) = 1 + r exp(−iKzg 2dg ) (3.2.11)
onde r é o coeficiente de reflexão da superfı́cie livre, d é a profundidade da fonte ou
do receptor, enquanto Kzs e Kzg são os números de onda verticais correspondentes aos
agrupamentos de receptor comum e fonte comum, respectivamente (ver o item 2.3).
Na aplicação das equações 3.2.10 e 3.2.11, deve-se levar em conta que o espalhamento
geométrico, implı́cito no operador do fantasma, é tratado de forma bidimensional, o que
afeta a qualidade do processo no caso de reflexões muito rasas. Neste caso, pode ser
conveniente aplicar uma correção adicional. Outro importante aspecto da aplicação das
duas equações diz respeito à possibilidade de superelevação de ruı́dos, associada à remoção
dos notches que estão presentes no espectro de amplitude do operador do fantasma.
Para evitar os ruı́dos associados aos notches, basta introduzir, no processo de cálculo
do operador de deconvolução do fantasma, o erro da profundidade da fonte, ou do recep-
tor. A forma mais indicada para isto consiste em empregar uma distribuição gaussiana
para representar o coeficiente de reflexão da superfı́cie (sugestão feita ao autor por técnicos
da empresa Western Geophysical Company, através de Ken Larner, em 1981). Neste par-
ticular, uma importante caracterı́stica do processo descrito é o papel do empilhamento e
da deconvolução de fase mı́nima, a serem aplicadas posteriormente: as duas técnicas se
encarregam de atenuar, ou dispersar, eventuais distorções introduzidas pelo filtro inverso
do fantasma.
A equação 3.2.9 permite tratar de forma adequada os diversos fenômenos associados
ao pulso sı́smico. Nas aplicações práticas, é comum a adoção de algumas simplificações.
Uma delas consiste em desprezar o papel dos arranjos de tiro e receptor. No caso dos
306 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

fantasmas, outra aproximação consiste em tratar o fantasma dos receptores de forma


rigorosa e deconvolver o efeito do fantasma da fonte assumindo-se propagação vertical, de
forma similar ao que se faz no caso da deconvolução estatı́stico-determinı́stica, discutida
adiante.

3.2.3 Deconvolução de fase mı́nima


O aspecto errático do espectro de amplitude dos coeficientes de reflexão, visı́vel nas figuras
2.52 e 3.9 (páginas 187 e 299), é responsável por uma premissa largamente empregada
nas técnicas de deconvolução: ao longo do eixo dos tempos, a série de coeficientes de
reflexão, rt , é aleatória e não correlacionável e, portanto, tem espectro de amplitude de
luz branca; ou seja, todos os componentes de freqüência estão presentes, com valores de
amplitude distribuı́dos de forma aleatória em torno de um valor esperado qualquer. Esta
propriedade é resumida na seguinte aproximação:

Φrr (τ ) ∼
= R0 δτ (3.2.12)

onde Φrr é a autocorrelação da série de coeficientes de reflexão e δτ é um impulso unitário


situado no deslocamento τ = 0. Por sua vez, R0 é a potência da série rt , definida por
tX
max

R0 = Φrr (0) = rt2 (3.2.13)


t=0

onde t é o ı́ndice que identifica o tempo.


De acordo com a premissa representada pela equação 3.2.12, a autocorrelação da série
de coeficientes de reflexão é definida por um impulso unitário. Viu-se no item 2.6 que esta
afirmação merece ressalvas, ainda que relativamente pouco expressivas. A própria Figura
3.9 pode ser usada para avaliar a qualidade da premissa adotada. Através de uma análise
cuidadosa do espectro de amplitude da função refletividade, definido por AR , percebe-se
que ele é caracterizado por um suave crescimento de amplitude com a freqüência, embora
o aspecto aleatório predomine. Em termos práticos, isto significa que, se a equação 3.2.12
fosse absolutamente correta, a mesma forma suave, se detectada no espectro de amplitude
do traço sı́smico, seria atribuı́da ao pulso sı́smico.
Por outro lado, o modelo convolucional, aplicado à autocorrelação do traço sı́smico,
permite a obtenção da seguinte expressão:

Φss (τ ) = Φrr (τ ) ∗ Φpp (τ ) (3.2.14)

ou seja, a autocorrelação do traço sı́smico, Φss , é igual à convolução da autocorrelação


da série de coeficientes de reflexão, Φrr , com a autocorrelação do pulso sı́smico, Φpp .
Substituindo-se, no resultado obtido, a igualdade 3.2.12, obtém-se:
1
Φpp (τ ) ∼
= Φss (τ ) (3.2.15)
R0
Nas situações em que Φss (τ ) corresponde à versão completa da autocorrelação do
traço sı́smico, a equação 3.2.15 permitiria considerar os espectros de potência do traço e
do pulso sı́smico como entidades equivalentes, a menos de um fator de escala. Sabe-se
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 307

que isto não é exatamente verdade. É necessário, portanto, adaptar a equação 3.2.15, o
que é feito através da seguinte expressão:
Φpp (τ ) ∼
= T (τ )Φss (τ ) (3.2.16)

onde T (τ ) é uma função que pondera e trunca simetricamente a autocorrelação do traço


sı́smico.
No domı́nio da freqüência, a equação 3.2.16 corresponde a uma convolução entre a
transformada de Fourier de T (τ ) e o espectro de potência do traço sı́smico. Para que
esta operação resulte no espectro de potência do pulso sı́smico, a função T (τ ) deve ser
tal que equivalha, no domı́nio da freqüência, a um filtro corta-altas qüefrências, capaz de
remover do espectro de potência do traço sı́smico os componentes aleatórios, atribuı́dos
aos coeficientes de reflexão. Diversas formas da função T (τ ) têm sido usadas, entre as
quais citam-se as seguintes: caixa (box ), triângulo (ou Bartlett), Hamming, Hanning e
Blackman (ver a Tabela 1.3 e Oppenheim e Schafer, 1989). A mais comum é exatamente
a mais simples de todas: a função caixa, descrita no item 1.2.
Deduz-se assim que uma versão adequadamente truncada da autocorrelação do traço
sı́smico corresponde a uma aproximação da autocorrelação do pulso sı́smico. Para aplicar,
com base nesta idéia, a deconvolução da assinatura sı́smica, resta estimar o espectro de
fase correspondente. A este respeito, uma premissa muito freqüente consiste em conside-
rar o pulso sı́smico como uma forma de onda de fase mı́nima, o que parece ser aceitável
em algumas circunstâncias. Além disso, sabe-se que as múltiplas internas de perı́odo
curto constituem um filtro de fase mı́nima, o chamado filtro estratigráfico, cuja atuação
deforma o pulso sı́smico efetivo (ver o item 2.8).
Criam-se, assim, condições para aplicar o filtro Wiener-Hopf-Levinson, ou WHL, à de-
convolução de fase mı́nima. Ou seja: (1) considera-se a versão truncada da autocorrelação
do traço sı́smico como equivalente à autocorrelação do pulso sı́smico e; (2) a premissa de
fase mı́nima permite considerar o pulso desejado dt como um impulso unitário. Nestas
condições, tem-se a seguinte versão discreta da equação Wiener-Hopf:
n∆t
X
Φss (τ − t)ft = kδτ , para τ ≥ 0 (3.2.17)
t=0

onde δτ é um impulso unitário na origem (τ = 0) e k é uma constante usada para controlar


o nı́vel de amplitude desejado.
Para a obtenção do filtro ft , aplica-se a expressão 3.2.17 na forma matricial dada
pela equação 1.4.11. No processo, a matriz de autocorrelação é utilizada com número de
colunas (e de linhas) igual ao número de pontos do filtro ft . Isto significa que a equação
3.2.17 inclui implicitamente o truncamento da autocorrelação do traço sı́smico em um
deslocamento correspondente ao comprimento do filtro a calcular, o qual é, no caso, igual
a n + 1. Assim, na equação 3.2.16, T (τ ) = 0 para τ < −n∆t e τ > n∆t.
É possı́vel dizer que o operador de deconvolução de fase mı́nima corresponde a um
caso particular de filtro de forma, estando embutida no processo a determinação de uma
estimativa do pulso sı́smico. Nas aplicações práticas, a correspondência entre o espectro
de amplitude do pulso e o espectro de fase mı́nima exige um tratamento cuidadoso, em
particular no que diz respeito a: (1) o papel dos ruı́dos e; (2) alterações do espectro de
amplitude dos traços sı́smicos, antes ou durante a deconvolução.
308 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

A influência do ruı́do e das alterações no espectro de amplitude torna-se mais clara


com base em uma análise da deconvolução de fase mı́nima no domı́nio da freqüência. Para
isto, suponha-se, inicialmente, que o espectro de freqüências correto do pulso sı́smico seja
dado por
P (f ) = AP (f ) exp [iφP (f )] (3.2.18)
onde AP (f ) e φP (f ) são os espectros de amplitude e de fase.
Em condições realistas, o espectro de freqüências do pulso sı́smico, estimado pela
deconvolução de fase mı́nima, é dado por
h i
P̂ (f ) = ÂP (f ) exp iφ̂P (f ) (3.2.19)

onde ÂP (f ) e φ̂P (f ) são os espectros de amplitude e de fase mı́nima estimados durante a
deconvolução. Em conseqüência, pode-se representar o espectro de freqüências do filtro
de deconvolução da seguinte forma:
1 h i
D(f ) = exp −iφ̂P (f ) (3.2.20)
ÂP (f )

Para que se compreenda melhor como a estimativa de fase mı́nima, φ̂P (f ), é obtida
durante a deconvolução, o primeiro passo consiste em calcular o logaritmo neperiano da
expressão 3.2.19, o que leva à seguinte equação:
h i
ln P̂ (f ) = ln ÂP (f ) + iφ̂P (f ) (3.2.21)

Na expressão 3.2.21, o número imaginário i expressa uma relação de ortogonalidade


entre o logaritmo do espectro de amplitude e o espectro de fase. Foi demonstrado no
item 1.5 que, se o logaritmo do espectro de amplitude for convolvido com um operador
de quadratura (operador que desloca a fase de qualquer sinal em 90 graus), obtém-se
o espectro de fase mı́nima correspondente. Aplicada ao caso, esta operação, conhecida
como técnica Hilbert, é descrita por
n h io
φ̂P (f ) = ln ÂP (f ) ∗ q(f ) (3.2.22)

onde q(f ) é o filtro de quadratura.


No caso de um espectro de amplitude suave, como o de um pulso sı́smico, a convolução
descrita pela expressão 3.2.22 pode ser aproximada por uma derivada12 , o que leva a:
2k d n h io
φ̂P (f ) ∼
=− ln ÂP (f ) (3.2.23)
π df
onde k é um fator que preserva a dimensionalidade. Levando em conta a relação d ln A =
dA/A, tem-se a seguinte aproximação:

2k 1 d h i
φ̂P (f ) ∼
=− ÂP (f ) (3.2.24)
π ÂP (f ) df
12
Comparar os três termos centrais das equações 1.2.29 e 1.2.38.
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 309

A equação 3.2.24, que não pode ser usada de forma absoluta, é muito útil no caso em
que se deseja avaliar qualitativamente a influência do ruı́do aleatório sobre a deconvolução
de fase mı́nima. Para isto, o primeiro passo consiste em representar da seguinte forma a
contaminação do sinal pelo ruı́do:

ÂP N (f ) = ÂP (f ) + β (3.2.25)

onde ÂP N (f ) e ÂP (f ) são as estimativas do espectro de amplitude do pulso sı́smico,


na presença e na ausência de ruı́do, respectivamente. Por sua vez, β é uma constante
equivalente ao valor esperado para a amplitude do ruı́do aleatório.
Com base na expressão 3.2.25, pode-se definir o espectro do operador de deconvolução,
DN , da seguinte forma:
1 h i
DN (f ) = exp −iφ̂P N (f ) (3.2.26)
ÂP (f ) + β

onde φ̂P N (f ) é o espectro de fase mı́nima estimado na presença do ruı́do.


No que diz respeito ao espectro de amplitude, percebe-se que o ruı́do inibe a ação do
filtro de deconvolução. Assim, por exemplo, se β >> ÂP (f ), a deconvolução se reduz à
aplicação de um fator de escala o qual, entretanto, pode ter seu efeito compensado no
processo. Por outro lado, como a relação entre β e ÂP (f ) tende a variar com a freqüência,
pode-se esperar uma ação diferenciada do filtro de deconvolução, que seria mais efetivo
nas freqüências com melhor razão sinal-ruı́do.
Para que se compreenda o que ocorre com a estimativa de fase do pulso sı́smico, faz-se
uso da seguinte versão da expressão 3.2.22:
n h io
φ̂P N (f ) = ln ÂP (f ) + β ∗ q(f ) (3.2.27)

Com base nas expressões 3.2.23 e 3.2.24, pode-se transformar este resultado na seguinte
aproximação para a fase mı́nima estimada na presença de ruı́do aleatório:
" #
 P (f )
φ̂P N (f ) ∼
= φ̂P (f ) (3.2.28)
ÂP (f ) + β

onde φ̂P (f ) é o espectro de fase mı́nima do pulso sı́smico, estimado sem influência do
ruı́do.
A expressão 3.2.28, apesar de ser apenas uma aproximação, permite perceber que,
à semelhança do que ocorre com o espectro de amplitude, o ruı́do branco amortece a
correção de fase aplicada pelo filtro de deconvolução. Assim, se β >> ÂP (f ), a fase
estimada se aproxima de zero. Também como no caso do espectro de amplitude, a
correção de fase feita pelo operador de deconvolução é mais efetiva nas freqüências com
melhor razão sinal-ruı́do.
Na Figura 3.10, vê-se como o ruı́do branco afeta a estimativa de fase feita com a
deconvolução de fase mı́nima, no caso de um pulso de absorção truncado. Percebe-se, na
figura, o favorecimento das amplitudes mais altas (no caso, localizadas nas freqüências
próximas de zero), o que está de acordo com o que se poderia prever com base na equação
3.2.28.
310 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.10: Módulos dos espectros de fase mı́nima de um pulso


de absorção truncado: (a) estimado com a deconvolução de fase
mı́nima, sem ruı́do; (b) estimado com nı́vel de ruı́do β = 0.25 e;
(c) estimado com a equação 3.2.28.

Em resumo, conclui-se que, na presença de ruı́do branco forte, os dados sı́smicos não
são significativamente alterados pela deconvolução de fase mı́nima; em vez de produzir
instabilidade, como se poderia esperar, o ruı́do aleatório amortece a ação da deconvolução.
Por outro lado, mesmo agindo parcialmente, a deconvolução favorece a homogeneização
lateral do pulso, em um conjunto de traços sı́smicos qualquer13 . Ou seja, nas freqüências
com melhor razão sinal-ruı́do, a deconvolução tende a compensar diferenças nos espectros
de traços vizinhos, ao mesmo tempo em que pouco altera as freqüências mais contami-
nadas.
No caso de um agrupamento CMP, por exemplo, a ação da deconvolução de fase
mı́nima é muito positiva já que, ao homogeneizar lateralmente o pulso sı́smico, favorece
a qualidade do empilhamento e de processos como correções estáticas residuais e análise
de velocidade. O espectro de amplitude plano, resultante do processo, é obviamente
contaminado pelo ruı́do branco, particularmente nas altas freqüências. Entretanto, o
ruı́do branco tende a ser fortemente atenuado pelo empilhamento e outros processos
multicanais, porque apresenta espectro de fase aleatório. Em conseqüência, os traços
sı́smicos empilhados são apenas um pouco mais brancos do que os traços originais, em
função da deconvolução parcial e da atenuação de eventos fora de fase, mas o pulso
sı́smico resultante é certamente mais estável lateralmente do que nos mesmos dados sem
deconvolução.
Sabe-se que não são somente os ruı́dos a alterar o espectro de amplitude dos dados
sı́smicos e, conseqüentemente, a fase resultante do processo. A própria forma com que se
estima o espectro de amplitude do pulso sı́smico pode afetar sensivelmente os resultados
obtidos. Este é o caso da deconvolução de fase mı́nima baseada no conceito de consistência
superficial, a qual envolve a combinação dos espectros de amplitude de traços sı́smicos
13
A tese de Sixta (1982) é uma excelente fonte para uma boa avaliação dessa afirmação.
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 311

diferentes (Levin, 1989). Em função da presença ou não de ruı́do e da variação na


periodicidade dos eventos, a fase resultante do processo pode ser mais distorcida do que a
obtida através da deconvolução de fase mı́nima convencional. A razão para esta afirmação
está relacionada com fatores estatı́sticos: uma distorção associada à deconvolução de
fase mı́nima convencional é localizada e, por isto, tende a ser compensada durante o
empilhamento; já uma deficiência da deconvolução multicanal envolve um número maior
de traços e, por isto, tende a ser mantida.
Outro processo, que, em geral, introduz alterações significativas na qualidade da fase
obtida através da deconvolução de fase mı́nima, é a aplicação prévia de filtros passa-
banda. Desconsiderando-se a série de coeficientes de reflexão e os ruı́dos, sabe-se que o
espectro de amplitude resultante desse processo é igual ao produto entre os espectros de
amplitude do pulso e do filtro. Desta forma, tem-se a seguinte igualdade:

ÂP F (f ) = ÂP (f )AF (f ) (3.2.29)

onde AF (f ) é o espectro de amplitude do filtro passa-banda. Pode-se portanto aplicar a


seguinte versão da equação 3.2.22:
n h io
φ̂P F (f ) = ln ÂP (f )AF (f ) ∗ q(f ) (3.2.30)

O resultado é:
φ̂P F (f ) = φ̂P (f ) + φ̂F (f ) (3.2.31)
onde φ̂P F (f ) é o espectro de fase mı́nima estimado no processo, φ̂P (f ) é o espectro de
fase mı́nima estimado sem a influência do filtro e φ̂F (f ) é o espectro de fase mı́nima
correspondente ao filtro passa-banda aplicado previamente aos dados sı́smicos.
Com base no resultado representado pela equação 3.2.31, não é difı́cil concluir que os
filtros passa-banda tı́picos podem alterar significativamente a fase resultante da decon-
volução de fase mı́nima. Ressalte-se que o efeito dos filtros corta-baixas é mais danoso
do que, por exemplo, o dos filtros anti-álias, por causa da boa razão sinal-ruı́do e da alta
declividade do espectro de amplitude que, normalmente, se observam nas freqüências
baixas, caracterı́sticas estas que não estão presentes nas altas freqüências.
A influência negativa dos filtros passa-banda pode ser facilmente evitada já que, na
maioria das vezes, eles não melhoram o resultado da deconvolução de fase mı́nima e,
conseqüentemente, são dispensáveis. Processos que reduzem a incoerência lateral dos
traços sı́smicos podem ser muito mais úteis, já que atuam somente sobre eventos aleatórios
e, portanto, não influenciam negativamente a deconvolução. Deve-se destacar que, se
estas recomendações forem seguidas e se o conhecimento da fase do pulso sı́smico não for
muito importante, a deconvolução de fase mı́nima pode se tornar um processo satisfatório.
Entretanto, no caso de objetivos mais refinados, para os quais torna-se desejável um pulso
curto e de fase nula, a deconvolução de fase mı́nima isolada não é satisfatória.

3.2.4 Deconvolução estatı́stico-determinı́stica


Talvez a maior deficiência da técnica de deconvolução de fase mı́nima se concentre no
tratamento inadequado das faixas de freqüência em que o espectro de amplitude do traço
sı́smico apresenta descontinuidade ou declividade acentuada. Duas dessas faixas são a das
312 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

freqüências inferiores a 5 ou 6Hz, na qual a amplitude cai rapidamente para zero, e a de


eventuais notches. Normalmente, filtros elétricos e fantasmas são responsáveis por estas
caracterı́sticas espectrais, com destaque para a primeira delas, que pode ser considerada
mais crı́tica (ver Walden, 1991).
Nestas circunstâncias, indica-se a aplicação de uma técnica alternativa, a qual resulta
da combinação de processos estatı́sticos e determinı́sticos. Esta idéia fundamenta-se
na decomposição do pulso sı́smico, seja na forma direta (equação 2.9.1) seja na inversa
(equação 3.2.9), decomposição esta que, na ausência do conhecimento do pulso sı́smico,
favorece a separação do processamento da assinatura em duas partes: a primeira, pura-
mente determinı́stica, através da aplicação de um filtro inverso, e a segunda, estatı́stica,
através da aplicação da deconvolução de fase mı́nima. Nestas condições, o processamento
da assinatura envolve a seguinte seqüência de tarefas:

1. Medem-se, ou estimam-se, os componentes conhecidos do pulso sı́smico, que passam


a ser agrupados na forma do pulso discreto qt , o qual é definido por

qt = i t ∗ h t ∗ g t ∗ a t

onde it e ht são as respostas, ao impulso, do instrumento e do geofone, gt é o operador


do fantasma e at é o filtro correspondente aos arranjos de campo. Nas situações
práticas, it é gravado nos testes de instrumento, ht é sintetizado ou também gravado,
gt é estimado matematicamente (item 2.9) e at pode ser desprezado, já que os
arranjos são, em geral, curtos.

2. Calcula-se o filtro ótimo ft tal que:

ft ∗ q t = δ t

Em função das caracterı́sticas de fase de qt , o filtro a ser computado pode ter compo-
nentes de antecipação, ou seja, coeficientes diferentes de zero para tempos menores
do que zero. Nesse caso, o pulso desejado é ainda um impulso unitário, mas esti-
mado de forma a considerar deslocamento de tempo condicionado às caracterı́sticas
de fase de qt (ver o item 1.4).

3. Convolve-se ft com os dados sı́smicos, antes do empilhamento, de tal forma que o


pulso sı́smico presente nos dados, pt , se reduz a uma estimativa da assinatura da
fonte, ou seja,
ft ∗ pt = wt ∗ et = ŵt
onde wt é a assinatura da fonte e et é o filtro da terra, o qual inclui efeitos como
o da absorção e o filtro estratigráfico. Com esse procedimento, obtém-se uma nova
versão do pulso sı́smico, ŵt , na qual o módulo da fase é substancialmente menor do
que o de pt .

4. Submetem-se os dados à deconvolução de fase mı́nima, ainda antes do empilha-


mento. Esta idéia se baseia na premissa de que ŵt é um pulso com caracterı́sticas
de fase mı́nima, a qual, em muitas circunstâncias, é aceitável.
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 313

Deve-se ressaltar que a fase determinı́stica da técnica descrita pode ser conduzida na
forma apresentada no subitem 3.2.2, em particular no que diz respeito à deconvolução
do operador dos fantasmas, que deve levar em conta o erro nas profundidades da fonte
e do receptor. Mencione-se ainda que uma estimativa independente de boa qualidade
para a assinatura da fonte, wt , a qual substituiria o pulso qt , tende a favorecer o processo
descrito, já que a deconvolução de fase mı́nima poderia ser concentrada em fenômenos
relacionados com a propagação. Para se estimar wt , pode-se usar uma das técnicas
descritas no subitem 3.2.1, como a gravação da assinatura sı́smica em campo remoto e
a técnica de Oliveira (2000), a qual é sintetizada pelas equações 3.2.5 e 3.2.7. Nas duas
técnicas, é necessário apenas levar em conta o efeito dos fantasmas o qual, na primeira
delas, envolve apenas o receptor.
Outra alternativa à seqüência proposta consiste em, na etapa 2, estimar um filtro
ótimo que anule o espectro de fase e ajuste, para uma forma desejada qualquer, o espectro
de amplitude de qt . Ou seja, neste caso, o filtro inverso é substituı́do por um filtro
de forma, filtro este aplicado na etapa 3. Para garantir a integridade do resultado, a
deconvolução de fase mı́nima, aplicada na etapa 4, seria substituı́da por uma deconvolução
preditiva com distância de predição maior do que o comprimento efetivo de qt . Observe-se
que esta alternativa equivale a aplicar deconvolução puramente determinı́stica ao pulso
sı́smico, deixando para outras etapas do processamento eventuais correções residuais de
fase e amplitude.
Um procedimento usado com freqüência, muitas vezes de forma errônea, consiste em
transformar qt em seu equivalente de fase mı́nima, durante os passos 2 e 3 da seqüência
proposta. Em tese, a deconvolução de fase mı́nima subseqüente deveria transformar a
forma de onda obtida em um impulso unitário. Na verdade, isto não ocorre nas situações
práticas, em parte por que o nı́vel de ruı́do, naturalmente presente nos dados sı́smicos, é
alto o suficiente para inibir a atuação da deconvolução de fase mı́nima, mesmo em áreas
de boa razão sinal-ruı́do (ver discussão sobre o papel do ruı́do sobre a deconvolução de
fase mı́nima, no subitem 3.2.3).
A eficiência da deconvolução estatı́stico-determinı́stica foi testada exaustivamente em
um trabalho de Rosa e Schinelli (1985), usando dados experimentais de água profunda
(800m) da Bacia de Campos. Nesta experiência, o pulso sı́smico foi gravado diretamente,
através de um hidrofone colocado a 180m de profundidade, em vários afastamentos. Um
dos pulsos diretos obtidos foi apresentado na Figura 2.4 (página 71). O instrumento usado
foi o LRS-888, o filtro foi 0-176Hz (72dB/oitava) e a profundidade da fonte (air-gun) foi
de 5m. Os pulsos resultantes não incluem, obviamente, o fantasma do hidrofone.
Nas figuras 3.11 e 3.12, pode-se ver, respectivamente, o pulso qt associado ao experi-
mental e o correspondente filtro inverso, ft . Neste último, são evidentes os componentes
de antecipação, indicando que, no caso, o pulso qt realmente não tem caracterı́sticas de
fase mı́nima.
O passo seguinte do teste consistiu em aplicar, aos pulsos registrados em 11 afasta-
mentos fonte-receptor distintos, quatro seqüências de processamento14 : (1) empilhamento
simples; (2) aplicação do filtro inverso e empilhamento; (3) aplicação do filtro inverso,
deconvolução de fase mı́nima e empilhamento e; (4) deconvolução de fase mı́nima simples
e empilhamento. A luz branca usada em todas as diferentes deconvoluções foi de 0.01%.
14
No empilhamento, cada um dos traços foi submetido a um deslocamento puramente estático.
314 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.11: Pulsos sı́smicos correspondentes à res-


posta do instrumento (ao alto) e à convolução desta
com a resposta do fantasma da fonte, usados no tra-
balho de Rosa e Schinelli (1985).

Figura 3.12: Filtro inverso correspondente ao pulso sı́smico apresentado na


parte inferior da Figura 3.11.

Os resultados das quatro seqüências de processamento podem ser vistos na Figura


3.13. Considerando-se a situação controlada do experimental, o resultado ótimo da
deconvolução da assinatura sobre um pulso gravado diretamente deve ser um impulso
unitário. No caso, fica evidente a superioridade da deconvolução estatı́stico-determinı́stica
sobre a deconvolução de fase mı́nima comum, cujos resultados reforçam a constatação de
que o pulso qt não tem caracterı́sticas de fase mı́nima. Por fim, há que se destacar a
semelhança entre o pulso registrado e o pulso sintético, qt , da Figura 3.11, o que é uma
forte evidência do poderio da técnica descrita.
Um dos aspectos mais importantes da deconvolução determinı́stica é, sem dúvida, o
condicionamento dos dados para a deconvolução de fase mı́nima, particularmente no que
diz respeito às posições do espectro de amplitude em que ocorrem os notches. Este tema
não é levado em conta na técnica proposta por Connelly e Hart (1985). Nesta técnica,
modela-se o efeito de todo o processamento, sobre uma estimativa do pulso sı́smico, p t ,
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 315

Figura 3.13: Resultados obtidos no trabalho de Rosa e


Schinelli (1985), ordenados de cima para baixo: (a) pulso
sı́smico registrado; (b) pulso sı́smico após a remoção dos
efeitos do instrumento e do fantasma; (c) pulso sı́smico após
a remoção dos efeitos do instrumento e do fantasma e de-
convolução de fase mı́nima e; (d) pulso sı́smico após decon-
volução de fase mı́nima isolada.

que pode ser qt . No processo, submete-se qt ao mesmo operador de deconvolução aplicado


aos dados sı́smicos. O resultado é utilizado para o cálculo de um filtro de forma, que é,
em seguida, aplicado aos dados deconvolvidos.
Duas limitações importantes afetam a técnica de Connelly e Hart. A primeira delas
está relacionada com a necessidade de se estimar a quantidade de luz branca natural dos
dados (ruı́do aleatório), que deve ser usada na deconvolução de qt . Se a luz branca natural
for diferente da estimada, a modelagem introduzirá distorções na forma final do pulso
obtido (ver a equação 3.2.28). A segunda limitação é o fato de o espectro de amplitude
original do traço sı́smico ser fortemente dependente das respostas do instrumento e dos
fantasmas, o que certamente limita a capacidade de a deconvolução de fase mı́nima tratar
adequadamente o efeito de fenômenos associados à propagação.

3.2.5 Deconvolução de fase nula


Se o pulso sı́smico já tem fase próxima de zero, a deconvolução da assinatura se reduz a
um processo de correção do espectro de amplitude, com base na premissa segundo a qual
o espectro de amplitude do traço sı́smico pode ser decomposto em feições associadas aos
coeficientes de reflexão e feições devidas ao pulso sı́smico. Aplicada à deconvolução de
fase nula, esta decomposição é básica para a obtenção de uma boa estimativa do espectro
de amplitude do pulso sı́smico.
316 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

O espectro de amplitude do pulso sı́smico pode ser estimado através de diferentes


técnicas, duas das quais são: (1) suavização do espectro de amplitude do traço sı́smico
com um filtro apropriado, com o fim de se remover as oscilações mais rápidas, em tese
associadas aos coeficientes de reflexão; (2) modelagem espectral, através do ajuste do es-
pectro de amplitude do traço a um modelo qualquer que descreva o espectro de amplitude
do pulso.
O aspecto mais inconveniente da técnica de suavização espectral é a possibilidade
de parte das oscilações do espectro de amplitude dos coeficientes de reflexão não poder
ser removida. Esta dificuldade, que depende da periodicidade envolvida, faz com que a
técnica de suavização mais indicada implique uma seqüência do tipo “filtro de mediana
+ média móvel” e, por outro lado, faz com que a técnica menos indicada seja a baseada
no simples truncamento da autocorrelação do traço sı́smico.
No caso da modelagem espectral, dispõe-se de uma grande diversidade de formas de
onda possivelmente aplicáveis, uma das quais, inspirada no pulso Ricker (ver o Apêndice
A.6), apresenta o seguinte espectro de amplitude:
P (f ) = |f |k exp [G(f )] (3.2.32)
onde k é uma constante não negativa e G(f ) é um polinômio em f . No caso particular em
que k = 2 e G(f ) é definido apenas para a potência de 2, a equação 3.2.32 se aproxima de
uma descrição do espectro de amplitude do pulso Ricker. Mais genericamente, a expressão
3.2.32 pode descrever uma grande variedade de espectros de amplitude, inclusive o da
atenuação (ver o item 2.8).
Aplicada à modelagem espectral, a equação 3.2.32 é ajustada ao espectro de amplitude
do traço sı́smico, variando-se o valor de k e obtendo-se um polinômio G(f ) em cada
iteração. O valor de k escolhido é o que propicia a melhor correlação entre o espectro do
traço de entrada e o do modelo. Na prática, verifica-se que as formas tı́picas do espectro
de amplitude dos dados sı́smicos, aliadas ao ajuste de polinômios envolvido na técnica
descrita, fazem com que o resultado não seja muito sensı́vel ao valor de k, desde que
este se restrinja ao intervalo entre 0.5 e 3. Na Figura 3.14, vê-se um resultado tı́pico da
aplicação da técnica a um traço empilhado e migrado da Bacia de Campos. Observe-
se que o modelo descreve bem a forma geral do espectro, sem influência das oscilações
rápidas, teoricamente associadas aos coeficientes de reflexão.
Determinado o espectro de amplitude do pulso sı́smico, a deconvolução de fase nula
pode ser feita através de diversas técnicas, tais como a aplicação do filtro Wiener-Hopf, ou
a simples divisão dos espectros envolvidos, ou, ainda, a deconvolução iterativa, discutida
no subitem 3.2.6. A primeira dessas técnicas foi apresentada no item 1.4, enquanto a
segunda delas corresponde à divisão do espectro de amplitude do traço sı́smico pelo do
pulso, já que o espectro de fase do traço sı́smico é mantido intocado.
Outra alternativa muito usada para a deconvolução de fase nula é o chamado balan-
ceamento espectral (spectral whitening), que não exige o conhecimento do pulso sı́smico.
Nesta técnica que, apesar do nome, é normalmente feita no domı́nio do tempo, procura-se
tornar constante o valor esperado para a amplitude de cada componente do espectro de
freqüências do traço sı́smico, através das seguintes operações:
1. Convolve-se o traço sı́smico com uma série de filtros passa-banda envolvendo faixas
de freqüência estreitas, em número suficiente para cobrir a parte do espectro que
se deseja deconvolver (por exemplo, 10 filtros no intervalo entre 8 e 60Hz).
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 317

Figura 3.14: Espectro de amplitude de um traço sı́smico empilhado, migrado


e filtrado, superposto ao modelo obtido com a equação 3.2.32. Observação: a
menor amplitude é aproximadamente igual a 0.5.

2. Aplica-se, a cada um dos traços resultantes da filtragem, ganho variável com o


tempo, de forma que todos os traços filtrados tenham, por exemplo, a mesma média
RMS em cada janela especı́fica.

3. Somam-se os traços obtidos na etapa anterior.

4. Faz-se com que o traço resultante da soma apresente decaimento de amplitude com
o tempo equivalente ao do traço original.

Esta seqüência de operações equivale a aplicar, no domı́nio da freqüência, um ganho


variável com a freqüência, fazendo com que o espectro de amplitude tenha média RMS
constante em janelas de freqüência com largura escolhida. Adicionalmente, uma vez que
o ganho é também variável com o tempo, a técnica descrita leva a uma correção parcial
da atenuação devida à atuação da absorção e do filtro estratigráfico.
Uns dos principais problemas relacionados com esta técnica é a seqüência de pro-
cessamento, em particular a sua relação com a deconvolução de fase mı́nima. No caso,
se o balanceamento espectral for aplicado antes da deconvolução de fase mı́nima, a fase
do pulso resultante pode não ser a ideal. Para corrigir a distorção introduzida, é re-
comendável uma correção adicional da fase, na linha do trabalho de Gibson e Larner
(1984). Esta é a razão pela qual o balanceamento espectral, tão importante na atenuação
do ground-roll, tem sido normalmente aplicado depois da deconvolução de fase mı́nima.
318 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

3.2.6 Deconvolução iterativa


A versão original da deconvolução iterativa foi desenvolvida na Petrobrás por José Tassini,
com ajuda de Emilson Evangelista, a partir de uma idéia proposta, em 1976, por técnicos
da Geoquest, no contexto de um projeto conjunto envolvendo as duas empresas15 . A
forma atual, discutida aqui, resultou da evolução na teoria envolvida, evolução esta que
permitiu a introdução da versão linear da técnica.
Do ponto de vista teórico, a deconvolução iterativa é baseada na minimização de um
funcional, g, cuja derivada com relação aos coeficientes de reflexão é definida em função
do modelo convolucional. Tem-se, no caso, a seguinte equação:

∂g
= −(st − rt ∗ wt ) = 0 (3.2.33)
∂rt
onde st e wt são o traço sı́smico e o pulso conhecido, enquanto rt é a série de coeficientes
de reflexão que se deseja estimar. Observe-se que a minimização do funcional g equivale
a determinar a série rt .
É possı́vel demonstrar (ver Ortega e Rheinboldt, 1970, páginas 93-96) que o funcional
g é dado por  
T 1 T
g(r) = − [r̂t ] [st ] − 2 [r̂t ] [ŝt ] (3.2.34)

onde T denota transposição, enquanto [r̂t ] e [ŝt ] são vetores correspondentes, respectiva-
mente, às estimativas da série de coeficientes de reflexão e do traço sı́smico a ela associado.
Ou seja, ŝt é a série resultante da convolução da série estimada r̂t com o pulso sı́smico
conhecido.
Uma inspeção da equação 3.2.34 permite observar que g envolve a diferença entre os
valores, no deslocamento igual a zero, de duas correlações cruzadas: (1) a da estimativa
dos coeficientes de reflexão com a estimativa do traço sı́smico correspondente e; (2) a da
estimativa dos coeficientes de reflexão com o traço sı́smico original. Conclui-se assim que
minimizar g corresponde também a aumentar a correlação entre a série de coeficientes
de reflexão a estimar e o traço sı́smico original. Esta idéia torna-se mais clara quando se
estabelece a condição em que g atinge o menor valor possı́vel, a qual permite transformar
a equação 3.2.34 na seguinte igualdade:

gmin (r) = − 21 Φrs (0) (3.2.35)

onde Φ denota correlação cruzada entre as funções indicadas como subscritos. Com base
neste resultado, não é difı́cil concluir que a deconvolução iterativa exige, para ser bem-
sucedida, que a fase do pulso sı́smico seja nula (ou anulada no processo).
A aplicação, à equação 3.2.33, do método dos gradientes, leva ao seguinte processo
iterativo (Ortega e Rheinboldt, 1970, páginas 250 a 252):

[r̂t ]k+1 = [r̂t ]k + αk {[st ] − [ŝt ]k } (3.2.36)

onde, em cada etapa k da iteração, [r̂t ]k é um vetor com a estimativa dos coeficientes de
reflexão e [ŝt ]k é o modelo de traço sı́smico correspondente. O vetor diferença [st ] − [ŝt ]k
15
O projeto mencionado visava mapear, com dados sı́smicos, reservatórios da Bacia de Campos
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 319

corresponde aos resı́duos obtidos na iteração k e αk é o fator responsável pela modificação


na estimativa dos coeficientes de reflexão obtida em cada iteração.
É possı́vel simplificar o processo descrito pela equação 3.2.36. Para isto, faz-se uso de
um fator βk capaz de satisfazer a seguinte igualdade:

αk {[st ] − [ŝt ]k } = [st ] − βk [ŝt ]k (3.2.37)

A minimização do erro médio quadrático desta equação é a base para a obtenção de β k .


O resultado é a seguinte expressão:

αk [ŝt ]Tk {[st ] − [ŝt ]k } + [ŝt ]Tk [st ]


βk = (3.2.38)
[ŝt ]Tk [ŝt ]k

Com base na expressão 3.2.38, percebe-se que, se a estimativa k da série de coeficientes


de reflexão estiver suficientemente próxima da solução, a seguinte inequação se aplica:

[ŝt ]Tk [st ] >> αk [ŝt ]Tk {[st ] − [ŝt ]k }

Neste caso, pode-se desprezar o termo que envolve αk na equação 3.2.38, fazendo com
que o fator βk assuma a seguinte forma:

[ŝt ]Tk [st ]


βk = (3.2.39)
[ŝt ]Tk [ŝt ]k

Observe-se que este resultado corresponde à razão entre os valores, no deslocamento igual
a zero, de duas correlações cruzadas: a do traço sı́smico dado com o modelo correspon-
dente e a do modelo com ele mesmo. Ou seja, o fator βk fornece uma medida de quão
semelhantes são o traço sı́smico original e o modelo correspondente (ver a equação 1.3.9).
A condição de proximidade da solução, necessária para validar a expressão 3.2.39, pode
ser satisfeita com base no fato de que um traço sı́smico de boa qualidade, adequadamente
processado, corresponde a uma versão filtrada da série de coeficientes de reflexão. Assim,
se o mesmo traço for utilizado como estimativa inicial da série de coeficientes de reflexão,
a deconvolução iterativa é iniciada em uma região já próxima da solução almejada. Neste
caso, a equação 3.2.36 é substituı́da por

[r̂t ]k+1 = [r̂t ]k + [st ] − βk [ŝt ]k (3.2.40)

Caracteriza-se, assim, a versão linear da deconvolução iterativa.


Na forma original, que não é linear, a deconvolução iterativa fundamenta-se em uma
importante aproximação de primeira ordem, aplicável a um traço sı́smico em que a fase
do pulso é nula: (1) a posição de cada coeficiente de reflexão coincide com o pico central
do pulso e; (2) o valor do coeficiente de reflexão é proporcional à amplitude do mesmo
pico central. Neste caso, cada um dos máximos e mı́nimos locais do traço sı́smico pode
ser visto como uma aproximação de um coeficiente de reflexão válido. Nestas condições,
torna-se possı́vel transformar a equação 3.2.40 no seguinte algoritmo:

[r̂t ]k+1 = [r̂t ]k + M {[st ] − βk [ŝt ]k } (3.2.41)


320 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

onde M é um operador que seleciona máximos e mı́nimos locais de uma série, deixando
valores iguais a zero entre seleções sucessivas. Em outras palavras, M é um operador que
seleciona picos e cavidades.
Duas observações devem ser feitas a respeito das expressões 3.2.40 e 3.2.41. Em
primeiro lugar, deve-se ressaltar que a primeira delas pode ser considerada um caso
particular da segunda. Para isto, basta levar em conta que o operador M deve selecionar
todas as amplitudes do sinal envolvido e não apenas os picos e as cavidades. Em segundo
lugar, observa-se que, em cada iteração k, o fator βk exerce o papel de corrigir a influência
do pulso sı́smico sobre a energia das estimativas dos coeficientes de reflexão obtidas na
iteração k − 1. Assim, se esta correção não for explicitamente aplicada em cada iteração,
deve-se, ao final do processo, corrigir os coeficientes de reflexão obtidos, multiplicando-os
por β.
Em termos algorı́tmicos, as duas versões da deconvolução iterativa podem ser descritas
da seguinte forma:

1. Estima-se o pulso sı́smico recorrendo-se, por exemplo, a uma das técnicas descritas
no subitem anterior.

2. Obtém-se a primeira estimativa dos coeficientes de reflexão, denominada [r̂t ]k , onde


k = 0. Para isto, aplica-se o operador M diretamente sobre o traço sı́smico original,
st . No caso da técnica linear, o resultado obtido é o próprio traço.

3. Convolve-se o pulso sı́smico com a série [r̂t ]k , obtendo-se o traço-modelo corrente,


[ŝt ]k .

4. Determina-se o valor da constante βk , usando a equação 3.2.39.

5. Aplica-se a equação 3.2.41, para se determinar [r̂t ]k+1 . Ou seja, aplica-se o operador
M sobre o erro [st ] − βk [ŝt ]k e soma-se o resultado a [r̂t ]k .

6. Atualiza-se k, fazendo-o igual a k + 1.

7. Repetem-se as etapas 3 a 6 até um número pré-estabelecido de iterações, ou até


que a variação no valor de βk seja considerada desprezı́vel.

8. Corrigem-se os coeficientes de reflexão obtidos, multiplicando-os pelo valor final de


β.

O significado e o alcance da deconvolução iterativa merecem uma discussão especı́fica.


Considere-se inicialmente o caso da versão linear da técnica, que pode ser descrita no
domı́nio da freqüência, ω, através da seguinte igualdade, correspondente à transformada
de Fourier da equação 3.2.40:

R̂k+1 = R̂k + S − βk R̂k W

ou
R̂k+1 = R̂k + W (R − βk R̂k ) (3.2.42)
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 321

100

75
Amplitude (%)

50

25

0
0 25 50 75 100 125
Freqüência (Hz)

Figura 3.15: Espectro de amplitude de um pulso sı́smico representa-


tivo (linha fina) e o resultante da aplicação da deconvolução iterativa
linear sobre o mesmo pulso (linha espessa), usando-se 15 iterações. Os
dois espectros foram normalizados.

onde S, R, R̂ e W são as transformadas de Fourier de st , rt , r̂t e wt . Observe-se que o


valor de βk , estimado no domı́nio da freqüência, é igual ao obtido no domı́nio do tempo,
já que é definido por
P
T R̂k W S ∗
[ŝt ]k [st ] Φŝs (0) ω
βk = T
= = P (3.2.43)
[ŝt ]k [ŝt ]k Φŝŝ (0) |R̂k W |2
ω

onde ∗ denota conjugado complexo.


Percebe-se, com base na equação 3.2.43, que a deconvolução iterativa linear altera a
função R̂k de forma proporcional ao termo W (R − βk R̂k ). Isto significa que a eficácia
do processo depende do módulo da declividade ∂W/∂ω, uma vez que, onde a mesma
declividade é igual a zero, o processo introduz, no máximo, um fator de escala. Na
mesma linha, induz-se que a atuação da deconvolução iterativa linear tende a ser nula
onde W tende a zero. Como resultado, o processo respeita os limites efetivos da banda
espectral original, limitando-se a enriquecer sua forma, sem, por exemplo, aumentar a
amplitude dos ruı́dos de alta freqüência 16 . Na Figura 3.15, vê-se um exemplo parcial
dessas caracterı́sticas da técnica.
A versão não linear da deconvolução iterativa exige uma análise mais sofisticada.
Nesta linha, o primeiro passo consiste em ilustrar, através de um exemplo simples, como
a mesma técnica comprime um pulso sı́smico isolado. Este foi o objetivo da Figura 3.16,
na qual se apresentam as séries envolvidas nas primeiras etapas da deconvolução de um
pulso sı́smico. Percebe-se, na figura, que a estimativa inicial dos coeficientes de reflexão,
16
A mesma idéia se aplica à versão não linear da técnica.
322 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

−100
Tempo (ms)

100
S E C D P 1 C D P 2 C S
Figura 3.16: Séries envolvidas em duas iterações da versão não linear
da deconvolução iterativa aplicada a um pulso sı́smico, representado
pelos dois traços S. Os demais traços são: E, 1 e 2 – estimativas sucessivas
dos coeficientes de reflexão; C – os modelos sı́smicos correspondentes,
ponderados por β; D – diferenças entre o traço S e os traços C ; P –
picos e cavidades dos traços D adjacentes.

representada pelo traço E, inclui dois importantes coeficientes falsos, correspondentes


aos lobos laterais da forma de onda usada. Percebe-se também que, nas duas estimativas
seguintes, o valor relativo do pico principal se acentua progressivamente, ao mesmo tempo
em que o traço modelo torna-se mais parecido com o traço sı́smico original. A continuação
do processo leva ao virtual desaparecimento dos lobos laterais do pulso, na medida em
que a energia se concentra na posição correta do coeficiente de reflexão.
O modelo da Figura 3.16 pode ser usado também para ilustrar como a deconvolução
iterativa extrapola o espectro de freqüências, ou seja, como informações situadas fora da
banda espectral disponı́vel são introduzidas pela técnica17 . Para isto, deve-se observar
na figura que os impulsos unitários definidos por picos, ou cavidades, são introduzidos,
em cada iteração, na forma de um impulso unitário central e um conjunto de pares
de impulsos unitários de igual amplitude. Demonstra-se facilmente que, em função da
simetria do pulso sı́smico usado, um par isolado com estas caracterı́sticas apresenta a
seguinte correspondência entre tempo e freqüência angular (ver o item 1.2):

a0 δ(t + t0 ) + a0 δ(t − t0 ) ⇔ 2a0 cos (ωt0 ) (3.2.44)

onde a0 e t0 são a amplitude e o tempo associados aos impulsos unitários, enquanto δ é a


função delta de Dirac. Para facilitar a convenção, assumiu-se que o pico central do pulso
sı́smico situa-se no tempo t = 0, como na Figura 3.16.
Com base na equação 3.2.44, percebe-se que, independentemente do espectro de ampli-
tude do pulso sı́smico, um par de impulsos unitários dele extraı́do dá origem, no domı́nio
da freqüência, a uma função periódica que não se limita à banda espectral disponı́vel.
Obviamente, fenômeno similar ocorre com o pico central do pulso sı́smico, ao qual cor-
responde um espectro de amplitude plano. Nestas condições, pode-se induzir que é a
17
Sugestão de Carlos Cunha Filho.
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 323

100

75
Amplitude (%)

50
2
1
25 E

S
0
0 25 50 75 100 125
Freqüência (Hz)

Figura 3.17: Espectros de amplitude normalizados dos traços S (linha


espessa), E, 1 e 2 da Figura 3.16.

introdução de novos pares de impulsos unitários — juntamente com a de resı́duos obti-


dos na posição central do pulso — o fator responsável pela extrapolação espectral. Na
mesma linha, induz-se que a qualidade da extrapolação é proporcional à diversidade na
distribuição desses impulsos unitários, a qual é controlada pelo espectro de amplitude do
pulso sı́smico original.
Para ilustrar esta discussão, construiu-se a Figura 3.17, na qual se vêem os espectros
de amplitude das estimativas dos coeficientes de reflexão apresentados na Figura 3.16.
Merece ser destacado o espectro de amplitude do traço E, que apresenta forma cosse-
noidal controlada pelo pico e, principalmente, pelas duas cavidades do pulso sı́smico18 .
Comparando-se as duas figuras, percebe-se que a introdução de novos impulsos unitários
faz com que o espectro de amplitude tenda a se afastar da forma cossenoidal mencionada.
Até agora, discutiu-se a deconvolução de um pulso sı́smico isolado. Um caso mais
complexo é o do sinal resultante da interferência entre dois coeficientes de reflexão de igual
módulo e polaridades opostas, verticalmente separados de acordo com um dado intervalo
de tempo 2t0 . Um par de coeficientes assim definido apresenta a seguinte correspondência
entre tempo e freqüência angular:
 π
|a0 |δ(t + t0 ) − |a0 |δ(t − t0 ) ⇔ 2 |a0 sen (ωt0 )| exp −i (3.2.45)
2
onde os termos são os mesmos da expressão 3.2.44.
Com base no teorema da amostragem, induz-se que, no domı́nio da freqüência, a
eficácia da reconstrução de uma forma cı́clica, como a definida pela equação 3.2.45, de-
pende da adequada representação, na banda espectral disponı́vel, de pelo menos metade
18
Desprezando-se os impulsos unitários menos importantes, a correspondente transformada de Fourier
é dada pela expressão 1 − 2|a0 | cos (ωt0 ), onde a0 e t0 são iguais a −0.37 e 0.022s.
324 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

de um ciclo. Por outro lado, é óbvio que esta representação é tão melhor quanto mais
plano for, na mesma faixa de freqüências, o espectro de amplitude do pulso sı́smico.
Nesta linha de raciocı́nio, pode-se estabelecer um processo recursivo que consiste em
aplicar aos dados sı́smicos a técnica linear e, sobre o resultado obtido, a técnica não
linear. Em termos práticos, a primeira etapa exerce o papel de reduzir a interferência
de reflexões adjacentes, de forma a deslocar os correspondentes picos e cavidades para
posições mais próximas dos coeficientes de reflexão corretos. Ressalte-se que melhores
resultados são obtidos se, na segunda etapa, o pulso sı́smico corresponder ao resultado
da aplicação da técnica linear sobre o pulso sı́smico usado na primeira etapa.

3.2.7 Técnicas baseadas em dados de poços


Uma famı́lia de técnicas de deconvolução residual muito usada é baseada na correlação
entre dados sı́smicos reais e dados sı́smicos sintetizados com perfis de poços (ver o item
4.1). Em uma das técnicas dessa famı́lia, aplicam-se, aos dados sı́smicos reais, desloca-
mentos de fase constantes em todo o espectro de freqüência. O resultado é comparado
com sismogramas sintéticos de fase igual a zero. Assumindo-se que os espectros de am-
plitude dos dois conjuntos de dados sejam equivalentes, o deslocamento de fase mais
correto é aquele em que a correlação entre os traços sı́smicos e sismogramas sintéticos é
a melhor possı́vel. Esta é uma técnica que deve preferencialmente ser aplicada quando
os deslocamentos de fase são residuais ou sabidamente constantes. Deve-se, além disso,
levar em conta que os dados sı́smicos reais e sintéticos envolvem diferentes amostragens
das feições geológicas, o que leva à necessidade de se aplicar a técnica descrita com base
em correlação criteriosa.
Outra interessante técnica da mesma famı́lia é baseada na seguinte idéia: dispondo-
se de um traço sı́smico e um sismograma sintético, ambos obtidos na mesma posição
espacial, pode-se estimar um filtro que transforma o primeiro no segundo. Uma aplicação
mais ambiciosa da técnica consiste em estimar o filtro que transforma o traço sı́smico
na própria função refletividade. Aplica-se ao caso a seguinte versão discreta da equação
Wiener-Hopf:
n∆t
X
Φss (τ − t)ft = grs (τ ), para τ ≥ 0 (3.2.46)
t=0
onde Φss é a autocorrelação do traço sı́smico e grs corresponde à correlação cruzada entre
a série de coeficientes de reflexão, rt , e o traço sı́smico, st .
Quando ocorre homogeneidade lateral do meio superficial e da assinatura sı́smica,
a aplicação do filtro obtido aos dados sı́smicos pode dar bons resultados. Entretanto,
como no ajuste de fase já citado, é necessário também que os perfis de poços sejam
representativos das caracterı́sticas elásticas do meio e que o traço sı́smico, adequadamente
processado, também o seja. Em particular, há que se levar em conta o fato de que a
amplitude varia com o afastamento fonte-receptor.
Como uma alternativa de melhor qualidade, pode-se usar o traço resultante do pro-
cessamento de um perfil sı́smico vertical, ou VSP (Vertical Seismic Profile), registrado
no poço, alterando-se a equação 3.2.46 para:
n∆t
X
Φss (τ − t)ft = gvs (τ ), para τ ≥ 0 (3.2.47)
t=0
3.2. A DECONVOLUÇÃO DA ASSINATURA SÍSMICA 325

onde o ı́ndice v refere-se ao VSP, vt , e ft é um filtro de forma que converte o pulso sı́smico
dos dados de reflexão no pulso incluı́do no processamento do VSP, que idealmente, deve
ter fase nula. Obviamente, a série vt poderia também ser um traço sı́smico sintético,
equivalente a uma versão filtrada da série de coeficientes de reflexão.

3.2.8 A restauração da cor da função refletividade


Descreveu-se até agora uma série de técnicas que permitem a computação de estimativas
da série de coeficientes de reflexão a partir de um traço sı́smico. Algumas dessas técnicas
envolvem a adoção de uma premissa que ainda não foi analisada com a necessária pro-
fundidade: a de que a função refletividade tem espectro de luz branca. É fácil induzir
que, se esta premissa não for adequada, as técnicas que dela dependem podem afetar a
qualidade dos processos subseqüentes, particularmente a inversão.
Com base na discussão apresentada no item 2.6, sabe-se que a cor da função refleti-
vidade não é branca, caracterı́stica esta refletida na forma de um espectro de amplitude
que favorece as altas freqüências (ver as figuras 2.52 e 3.9, nas página 187 e 299). Em
outras palavras, a função refletividade não é aleatória. Isto significa que, após ou durante
as etapas de deconvolução descritas, deve-se procurar ajustar o espectro do traço sı́smico
deconvolvido, de forma a garantir que o resultado apresente a cor adequada.
Uma das formas de tratar o assunto consiste em deconvolver o traço sı́smico de forma
a torná-lo equivalente a uma função aleatória e, em seguida, aplicar um filtro de cor, o
que é feito com base na seguinte equação (ver o item 2.6):

rt ∼
= ct ∗ f t (3.2.48)

onde ct é a função aleatória resultante da deconvolução, ft é um filtro de cor e rt é uma


estimativa mais fidedigna da função refletividade.
Dentre as possı́veis descrições do filtro de cor, uma é dada pela equação 2.6.71. No
caso da correção de fase, sua aplicação deve ser cuidadosa e, em particular, deve levar em
conta o nı́vel de luz branca natural dos dados sı́smicos submetidos à deconvolução de fase
mı́nima. A este respeito, sabe-se que o ruı́do aleatório inibe a atuação da deconvolução
e, portanto, faz com que a estimativa da série ct não corresponda ao resultado esperado.
Para reforçar a importância desse tema, basta lembrar que o nı́vel de ruı́do aleatório,
presente em dados sı́smicos de boa qualidade, tende a ser superior a 20 por cento.
A técnica descrita foi testada em dados da Bacia de Campos e apresentada em um
trabalho de Rosa e Ulrych (1991). O impacto relativo da técnica fica evidente quando, na
posição de um poço, se compara um sismograma sintético com dados sı́smicos processados
de diferentes formas, como no exemplo da Figura 3.18. A primeira seção, à esquerda, é
o resultado da aplicação, aos dados sı́smicos, da deconvolução estatı́stico-determinı́stica,
discutida no subitem 3.2.4. A seção do centro foi obtida após deconvolução de fase nula
aplicada sobre a seção da esquerda, técnica esta também discutida anteriormente. A
seção à direita é o resultado da correção da cor da função refletividade (amplitude e fase)
aplicada ao resultado da seção central.
Observe-se, na Figura 3.18, que a deconvolução de fase nula foi responsável por uma
acentuada mudança no conteúdo de freqüências da seção e que a correção da cor da função
refletividade representa um efeito de segunda ordem, embora tenha possibilitado melhor
correlação entre os dados sı́smicos e o sismograma sintético. Ressalte-se entretanto que
326 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.18: Seção sı́smica processada de três formas, juntamente com sismograma
sintético gerado com pulso de fase igual a zero (8-60Hz):(a) à esquerda, deconvolução
estatı́stico-determinı́stica; (b) ao centro, o mesmo processamento, seguido de decon-
volução de fase nula e; (c) o processamento anterior, seguido de correção da cor da
função refletividade.

a pequena melhoria introduzida pelo processo pode se revelar muito importante no caso
em que se deseja obter estimativas sı́smicas das impedâncias acústicas (ver o item 3.7).

3.3 Correção dos Fatores de Propagação


Na modelagem sı́smica, os fatores de propagação podem, em muitos casos, ser tratados
com base na equação da onda, através por exemplo, da aplicação da aproximação Kir-
chhoff. No processamento dos dados sı́smicos, a correção dos mesmos fatores poderia ser
tratada de forma equivalente, em conjunto com a migração dos dados sı́smicos. Com
muita freqüência, entretanto, os efeitos atribuı́dos a esses fatores são corrigidos de forma
explı́cita, seja porque ainda não existem justificativas sólidas para anexá-los à etapa de
migração, seja porque a adoção de uma seqüência convencional de processamento assim
o exige.
Um exemplo da segunda circunstância citada ocorre com o espalhamento geométrico
da energia, no caso em que se aplica migração pós-empilhamento. A correção corres-
pondente é feita preferencialmente em dados não empilhados, usando-se equações como
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 327

a 2.5.104 e velocidades que sejam representativas do trajeto percorrido pelo sinal. Em


grande parte dos casos, a velocidade de empilhamento satisfaz esta condição.
Situação similar ocorre com a anisotropia, cujas distorções poderiam ser adequada-
mente tratadas durante a migração de dados sı́smicos não empilhados. Quando isto não
é feito, o fenômeno é normalmente desprezado, embora pudesse ser tratado no contexto
da técnica CDP (ver discussão no subitem 3.1.2)19 . Entretanto, mesmo que esta tarefa
seja bem-sucedida, o processamento dos dados sı́smicos ainda não estaria completamente
livre do fenômeno, já que a migração pós-empilhamento também é afetada por ele.
Os eventos resultantes das distorções associadas à conversão de modo são freqüente-
mente tratadas como ruı́do, o que significa desprezar informações eventualmente úteis.
Por outro lado, como a velocidade de propagação desses eventos é, muitas vezes, menor
do que a menor velocidade P do meio, os algoritmos de migração e de correção de DMO
podem atenuá-los de forma satisfatória (ver os itens 3.5 e 3.6).
As perdas de amplitude por transmissão através das interfaces podem ser tratadas de
acordo com três diferentes enfoques. O primeiro deles consiste em simplesmente desprezar
o fenômeno, já que, com freqüência, a transmissão de energia através das interfaces
introduz erro menor do que o causado por distorções residuais atribuı́das a outros fatores.
O segundo enfoque consiste em incluir a perda por transmissão no próprio processo de
inversão dos dados sı́smicos, com base em aproximações como a da equação 2.6.48. No
terceiro enfoque, poder-se-ia corrigir os efeitos da transmissão juntamente com os do filtro
estratigráfico já que, nos dois casos, a autocorrelação da série de coeficientes de reflexão
está envolvida.
Os demais fatores de propagação — eventos múltiplos, absorção e filtro estratigráfico,
neste caso com a possibilidade de corrigir a perda por transmissão — são normalmente
incluı́dos na primeira categoria citada acima, ou seja, tendem a ser tratados de forma
explı́cita. Uma análise superficial poderia levar o leitor a questionar esse tratamento
diferenciado. Existem três boas razões para adotá-lo: (1) ao contrário do espalhamento
geométrico e da anisotropia, os fatores de propagação citados podem, sem grandes prejuı́-
zos para o resultado, ser desacoplados da migração dos dados sı́smicos; (2) o custo de um
erro na parametrização, que leve à necessidade de repetir o processo de correção de um
determinado fator de propagação, seria acrescido ao custo de uma nova migração, eventu-
almente desnecessária; (3) particularmente no caso da influência dos eventos múltiplos e
do filtro estratigráfico, ainda não existe uma técnica suficientemente robusta para tratá-
los na forma de uma técnica de inversão que inclua também a migração.

3.3.1 As diferenças de NMO e a atenuação das múltiplas


Entre os fatores associados à propagação do sinal, um dos fenômenos mais nocivos, par-
ticularmente nas operações marı́timas, é o das múltiplas e reverberações. A presença das
múltiplas é prejudicial não somente para a interpretação sı́smica em si mas, também,
para a aplicação de outros algoritmos de processamento. O exemplo mais flagrante é o
da migração: uma vez que a velocidade de propagação das múltiplas é freqüentemente
inferior à de um evento primário com o mesmo tempo de propagação, a migração, feita
19
Ressalte-se que, de acordo com a discussão apresentada no subitem 2.8.5, existe a possibilidade de
tratar a anisotropia de meios TI no mesmo contexto que inclui o filtro estratigráfico e a absorção.
328 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

com a velocidade de propagação do evento primário, faz com que as múltiplas sejam mi-
gradas em excesso, gerando os chamados “sorrisos” da migração, o que tende a enfatizar
os efeitos nocivos do fenômeno.
Na forma convencional, as técnicas de atenuação de eventos múltiplos são aplicadas
em dados sı́smicos distribuı́dos na forma de agrupamentos de ponto médio comum (CMP).
Neste domı́nio, a diferença de NMO entre eventos primários e múltiplos possibilita, em
muitos casos, a necessária discriminação que possibilita a atenuação dos primeiros. Esta
condição ocorre em duas circunstâncias: (1) quando a velocidade dos eventos primários
é substancialmente maior do que a dos múltiplos e; (2) quando existe variação suficien-
temente ampla, no afastamento entre fonte e receptores.
Na aquisição convencional, estas condições ocorrem, por exemplo, em seções sedimen-
tares onde a aceleração — definida como a derivada da velocidade de propagação com
relação do tempo, ou, ainda, a medida da rapidez com que cresce a mesma velocidade
— atinge valores significativos. Neste caso, pode-se obter discriminação razoável entre
eventos primários e múltiplos, mesmo nos traços sı́smicos registrados relativamente junto
à fonte. Desta forma, pode-se aplicar com sucesso todos os algoritmos que fazem uso de
diferenças de NMO entre os eventos primários e os múltiplos. Em particular, cita-se o
empilhamento dos traços das famı́lias CMP (ver o subitem 3.1.2).
Considere-se agora o caso em que a velocidade de propagação varia lentamente. Neste
caso, o empilhamento dos traços sı́smicos de um agrupamento CMP pode não ser sufici-
ente para atenuar os eventos múltiplos. Recorre-se então a técnicas de filtragem que per-
mitem ganhos adicionais em relação ao empilhamento convencional. Uma dessas técnicas
consiste em aplicar, no domı́nio f -K, filtros de velocidade voltados para atenuar os even-
tos múltiplos de uma famı́lia CMP, o que é feito após correção de NMO dedicada a
posicionar, em quadrantes diferentes do plano f -K, eventos primários e múltiplos, o que
favorece a atenuação dos últimos. Ou seja, a velocidade usada na correção de NMO deve
ser um valor intermediário entre o da primária e o da múltipla que seria registrada no
mesmo tempo.
Outra técnica, mais bem-sucedida, é baseada na transformada Radon parabólica, ou
hiperbólica, conduzida após a correção de NMO convencional (ver o Apêndice A.1 e
Hampson, 1986; Foster e Mosher, 1992). Na versão parabólica, assume-se que o moveout
residual das múltiplas obedece ao modelo ax2 , onde x é o afastamento fonte-receptor e a
é um parâmetro que controla a declividade dos eventos resultantes da correção de NMO.
Com base nesse modelo, as múltiplas são isoladas no domı́nio Radon e, após obtenção da
transformada inversa correspondente, subtraı́das dos dados sı́smicos.
Alternativas adicionais, aplicadas a dados sı́smicos já submetidos à correção de NMO,
são: (1) aplicação de filtros de número de onda às amostras situadas em um mesmo tempo
de reflexão; (2) nas mesmas condições, empilhamento das amostras estatisticamente mais
representativas (situadas junto à mediana das amplitudes, seja no domı́nio do tempo, seja
da freqüência); (3) empilhamento seletivo de autoimagens (Freire, 1986).
É fácil induzir que a maior dificuldade para a atenuação de múltiplas se concentra
nos afastamentos próximos de zero, onde a diferença de NMO entre eventos primários
e múltiplos é muito pequena. Para contornar esta dificuldade, a seguinte técnica, ainda
pouco explorada, foi proposta por Rodolfo do Val, em meados da década de 1990: (1)
os traços sı́smicos de um agrupamento CMP, após correção de NMO, têm as amostras,
em cada tempo de reflexão vertical, reordenadas de forma aleatória, com o fim de se
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 329

gerar uma série em que a posição relativa original não é respeitada; (2) em seguida, esta
série é submetida à atenuação, ou filtragem, dos eventos que não apresentam coerência;
(3) subseqüentemente, cada um dos elementos filtrados é recolocado na posição original.
Este esquema favorece a atenuação das múltiplas, já que a redistribuição das amplitudes,
antes da filtragem, pode posicionar, lado a lado, amostras obtidas em afastamentos fonte-
receptor muito diferentes, condição esta que afeta mais os eventos múltiplos do que os
eventos primários. Ressalte-se que, em alguns casos, as anomalias de AVO podem ser
afetadas.
Reportam-se casos de sucesso de todas as técnicas citadas, assim como das que serão
discutidas em seguida. Entretanto, em algumas circunstâncias, em particular na faixa de
lâmina d’água entre 40 e 100 metros e piso oceânico mais rı́gido, desenvolve-se um padrão
reverberante ainda não bem resolvido pelos algoritmos disponı́veis. A teoria discutida no
item 2.8 abrange parcialmente as razões deste problema e permite induzir a aplicação de
duas famı́lias de técnicas: (a) deconvolução preditiva, preferencialmente no domı́nio τ -p;
(2) algoritmos baseados no registro simultâneo dos campos de velocidade de partı́culas
e pressão. A primeira famı́lia de técnicas é discutida adiante e a segunda, que não
será analisada, baseia-se na idéia de que o campo de velocidades de partı́culas permite
identificar o sentido da propagação das ondas.

3.3.2 Atenuação de múltiplas com base na equação da onda


A aplicação da equação da onda à atenuação das múltiplas da superfı́cie livre redunda em
algoritmos que apresentam a grande vantagem de não dependerem do NMO relativo dos
eventos envolvidos. Isto significa a possibilidade de atenuar múltiplas que se superponham
exatamente às reflexões primárias, situação esta comum em meios em que uma mesma
velocidade de propagação controla os dois tipos de evento.
Na literatura, os primeiros trabalhos de caráter prático, relacionados com o tema,
surgiram nos anos 1980, grande parte deles baseados em idéias de caráter teórico já co-
nhecidas (um exemplo: a chamada deconvolução de Noé, proposta ainda nos anos 70
por J. Claerbout e seu grupo). Um desses trabalhos é o de Wiggins (1988), segundo ele
próprio desenvolvido em consonância com a linha adotada por Larry Morley em sua tese
de doutorado, de 1982. A proposta de Wiggins, reapresentada de forma mais simples em
1999, depende do conhecimento da refletividade da superfı́cie responsável pelas múltiplas,
a mais notória das quais é o piso oceânico. Seguindo uma linha até certo ponto simi-
lar, Filpo e Tygel (1999) utilizam a própria reflexão primária correspondente à mesma
superfı́cie para contornar esta necessidade.
Na busca por uma solução mais geral, que não dependesse do conhecimento das pro-
priedades do meio, os esforços de pesquisa resultaram em duas teorias para a atenuação
de múltiplas, propostas pelos grupos de A. Weglein (Weglein et al., 1997; Carvalho, 1992)
e de A. Berkhout (Verschuur et al., 1988; Berkhout e Verschuur, 1997a,b). É interessante
destacar que os dois algoritmos correspondentes, mesmo obtidos através de caminhos
diferentes, são muito semelhantes20 .
Do ponto de vista fı́sico-matemático, a atuação dos diversos algoritmos mencionados
pode ser razoavelmente bem entendida se a discussão for iniciada com o caso unidimen-
20
De acordo com Biersteker (2001), a mesma idéia já vem sendo aplicada na Shell desde o inı́cio dos
anos 1980, com base em trabalho interno desenvolvido a partir de 1978.
330 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

sional, de acordo com o qual a transformada Z de um traço sı́smico é descrita pelas


seguintes expressões, apresentadas no subitem 2.8.2:
S = PF (3.3.1)
e
S = P (1 − S) (3.3.2)
onde S e P são as transformadas Z do traço sı́smico com e sem múltiplas, enquanto F é
a transformada Z do filtro de múltiplas. Nas duas expressões, o coeficiente de reflexão,
para uma onda ascendente na superfı́cie livre, é considerado igual a −1.
Assuma-se, por enquanto, que se deseja eliminar os eventos múltiplos gerados por
uma interface isolada. O exemplo mais representativo é o fundo do mar, normalmente
responsável pelas múltiplas e peg legs mais importantes. Neste caso, todos os sinais que,
vindos de baixo, atingem a camada de água, são afetados pela mesma forma de onda, a
qual é exemplificada pela Figura 2.62, na página 230. Para efeito de ilustração, o leitor
pode recorrer também aos casos b e c da Figura 2.10, na página 89, que representam
de forma esquemática os trajetos de uma múltipla e de uma peg leg, ambas de primeira
ordem.
Especializado em uma interface isolada, como o fundo do mar, o operador F da ex-
pressão 3.3.1 corresponde a uma expansão binomial, exatamente como descreve a equação
2.8.20. Pode-se, assim, reescrever a mesma expressão de forma a explicitar o campo de
ondas primárias, no que resulta a seguinte igualdade:

P = S 1 + rZ 2m (3.3.3)
onde Z é o operador de atraso unitário, m representa o número de amostras em tempo
simples entre a superfı́cie livre e o fundo do mar, enquanto r é o coeficiente de reflexão na
mesma posição. De acordo com a expressão 2.8.15, este resultado corresponde também a
 
P = P − rZ 2m P + r 2 Z 4m P − . . . + rZ 2m P − r 2 Z 4m P + . . . (3.3.4)
| {z } | {z }
S rZ 2m S

Na expressão 3.3.4, o termo rZ 2m S corresponde a uma extrapolação unidimensional


do traço sı́smico registrado, de acordo com a qual os eventos primários são multiplicados
por r e deslocados ao longo do eixo dos tempos, gerando, como resultado, o próprio trem
de múltiplas com sinal trocado. Desta forma, se o valor de r fosse conhecido, o resultado
da operação S + rZ 2m S seria o conjunto de eventos primários, ou seja, sem múltiplas.
A aplicabilidade da expressão 3.3.3 pode ser facilmente estendida para o caso bidi-
mensional, desde que o fundo do mar seja horizontal e que a velocidade de propagação
não varie lateralmente, ou seja, que o meio responsável pela geração das múltiplas seja
do tipo 1.5-D. Admite-se ainda que o sistema de registro seja constituı́do de uma linha
de receptores, no centro da qual se situa uma fonte pontual, cuja forma de onda é um
impulso unitário na origem dos tempos.
Aplicado ao caso, o conceito de deslocamento de fase implica substituir Z pelo termo
de deslocamento duplo exp(iω∆t) exp(−iKx ∆x), onde t e x são tempo de reflexão e
coordenada horizontal dos receptores, aos quais se associam os números de onda temporal
e espacial, ω e Kx (ver o item 2.7 e a equação 2.8.22). O resultado é a seguinte expressão:
P̃s0 = S̃s0 [1 + r exp(2iωqzm )] (3.3.5)
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 331

onde P̃s0 e S̃s0 são, respectivamente, as transformadas de Fourier bidimensionais do campo


de ondas primárias e do sismograma registrado, ambos correspondentes a uma fonte s 0 ,
enquanto zm é a profundidade do fundo do mar. Por sua vez, q é a vagarosidade vertical
associada aos receptores e definida pela razão cos θ/v, onde θ é o ângulo entre o raio e a
direção vertical e v é a velocidade de propagação na água.
Observe-se, na equação 3.3.5, que o operador r exp(2iωqzm ) exerce papel similar ao do
operador rZ 2m da expressão 3.3.3, que é o de prever, com a polaridade trocada, um trem
de múltiplas equivalente ao original, levando em conta o trajeto duplo. A única e óbvia
diferença é a introdução, no caso bidimensional, do efeito de fatores como o espalhamento
geométrico da energia e o deslocamento de tempo associado ao NMO21 .
No domı́nio tempo-distância, a equação 3.3.5 pode ser descrita na forma de uma
aplicação do princı́pio de Huygens, ilustrada geometricamente através da Figura 3.19.
Nos termos do mesmo princı́pio, as funções S̃s0 e r exp(2iωqzm ) correspondem às trans-
formadas de Fourier das ondas primárias e secundárias, respectivamente, as últimas das
quais são construı́das com a própria reflexão do fundo do mar. Isto significa que cada
amplitude registrada na superfı́cie atua como fonte secundária para uma onda com a
geometria da reflexão do fundo do mar que seria obtida com a fonte na mesma posição.
A combinação de todas as possı́veis ondas assim geradas dá origem a eventos que, na
forma da expressão 3.3.5, correspondem às múltiplas registradas, mas com sinal trocado.
O mesmo conceito se aplica às múltiplas do tipo peg leg, como se percebe no exemplo da
Figura 3.19, o qual foi gerado de acordo com geometria equivalente à ilustrada pelo caso
c da Figura 2.10 (página 89).
Nas aplicações práticas dessa linha de algoritmos, é necessário estimar o valor do
coeficiente de reflexão do fundo do mar, r, o que não é uma tarefa fácil. Para contornar
esta dificuldade, leva-se em conta que as múltiplas representam energia adicional, em
relação aos eventos primários. Com base nesta idéia, adotada por diversos autores, o
valor de r pode ser estimado a partir da minimização da energia resultante da operação
representada pela expressão 3.3.5. No caso, o melhor resultado é aquele que redunda na
menor energia do traço sı́smico a obter22 . Ressalte-se entretanto que esta é uma solução
paliativa, principalmente quando se leva em conta o caso em que eventos primários e
21
Para complementar a análise, deve-se observar que a equação 3.3.5 pode também ser usada para
apresentar a versão 1.5-D do algoritmo de Wiggins (1988, 1999), a qual implica reescrever a mesma
equação da seguinte forma:
 

P̃s0 = S̃s0 exp(−iωqzm) +r exp(iωqzm ) exp(iωqzm ) (3.3.6)


| {z } | {z } | {z }
A B C

onde a operação (A + rB)C substitui o termo entre colchetes da equação 3.3.5. Observe-se que o produto
S̃s0 A é responsável pela geração de um campo de pressões hipoteticamente adquirido no fundo do mar,
enquanto o produto S̃s0 rB se encarrega de gerar as múltiplas que seriam descendentes na mesma posição.
Como, nos dois campos de onda, os eventos múltiplos apresentam polaridades opostas e os mesmos tempos
de reflexão, o resultado da soma dá origem ao campo de eventos primários que se obteria no fundo do
mar. Na seqüência, o produto pelo termo C se encarrega de extrapolar o resultado da operação de volta
para a superfı́cie.
22
Para isto, parte-se da premissa de que o tempo de reflexão correspondente ao fundo do mar é correto
e que as deformações associadas ao pulso sı́smico já foram atenuadas. É também necessário levar em
conta que a reflexão do fundo do mar nunca é um evento isolado (ver Wiggins, 1999).
332 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

FM

RP
Tempo (s)

M1

P−L

3
M2

−2 −1 0 1 2
Afastamento da fonte (km)
Figura 3.19: Representação esquemática da aplicação do princı́pio de Huy-
gens à geração, em um sismograma, das múltiplas de primeira e segunda ordem
associadas ao fundo do mar (M1 e M2 ) e de uma múltipla peg leg associada
a um refletor (P-L). As reflexões primárias correspondentes são identificadas
por FM e RP. Cada sı́mbolo • indica um ponto usado para a geração de
uma onda secundária (linha fina), a qual tem a geometria da reflexão primária
do fundo do mar obtida com a fonte na mesma coordenada horizontal e é
representada verticalmente abaixo do ponto escolhido, de acordo com um des-
locamento dado pelo tempo do mesmo ponto. As camadas são horizontais e
as velocidades da água e dos sedimentos são lateralmente constantes (1500 e
2000m/s).

múltiplos se superpõem exatamente, caso este que, paradoxalmente, é uma justificativa


para a aplicação de técnicas baseadas na equação da onda.
Outro aspecto ainda não mencionado é a geometria do fundo do mar a qual, no caso
1.5-D, é lateralmente constante. Como esta é uma caracterı́stica pouco realista, torna-se
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 333

necessário transformar a equação 3.3.5 para o domı́nio ω-x, no qual a mesma equação
transforma-se na seguinte convolução, obtida com base na expressão 2.8.34:
 
∂Rg
Ps0 = Ss0 ∗ δ(x − xs0 ) + (3.3.7)
∂z
onde ∗ denota convolução ao longo do eixo x e xs0 é a coordenada horizontal da fonte
s0 , enquanto Ps0 , Ss0 e Rg são funções de ω e x, sendo que Rg corresponde à reflexão
primária do fundo do mar estimada com a fonte situada em qualquer posição superficial.
Na forma da equação 3.3.7, a função Rg pode variar lateralmente. Adicionalmente, a
mesma equação admite a idéia de que Rg poderia ser obtida a partir do próprio sismo-
grama registrado com a fonte situada na posição identificada pelo subscrito g. Admitindo-
se esta possibilidade, não haveria a necessidade de se estimar os coeficientes de reflexão
r, uma vez que Rg corresponderia à transformada de Fourier de uma pequena janela do
sismograma, suficiente para incluir a própria reflexão do fundo do mar23 . Esta é uma
idéia implı́cita na proposta de Filpo e Tygel (1999), a qual se aplica a dados sı́smicos
registrados na ausência de afastamento entre a fonte e o receptor.
A possibilidade de se obter a função Rg a partir dos próprios sismogramas registrados
permite uma importante indução. Sabendo-se que todas as reflexões primárias, presentes
nos sismogramas registrados, geram múltiplas da superfı́cie livre, pode-se perguntar: seria
possı́vel utilizar todo o sismograma, obtido na posição g, como uma estimativa abran-
gente da função Rg ? Para analisar o tema, deve-se considerar que, na expressão 3.3.7, a
operação Ss0 ∗ ∂Rg /∂z é responsável pela geração das múltiplas com sinal trocado. Desta
forma, a substituição da função Rg pela correspondente ao sismograma, Sg , resulta, com
base na equação 2.8.32, na seguinte igualdade:
 
∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg
Ss 0 ∗ = P s0 ∗ − Ps 0 ∗ ∗
∂z ∂z ∂z ∂z
ou, levando em conta a expressão 2.8.33,

"∞ #
∂Sg X X ∂Sg
Ss 0 ∗ =− Ms(k) + Ms(k) ∗ (3.3.8)
∂z k=1
0
k=1
0
∂z
(k)
onde Ms0 representa as múltiplas de ordem k. Nas aplicações práticas, Sg pode cor-
responder, em cada posição, à transformada de Fourier de um agrupamento de receptor
comum.
Percebe-se que a expressão 3.3.8 permite prever, com o sinal trocado, todas as múltiplas
cujo atraso é controlado pelas reflexões primárias. Entretanto, nos termos do princı́pio de
Huygens, as múltiplas já existentes no sismograma também atuam como fontes primárias
e geram um resı́duo, o qual envolve as múltiplas de ordem maior do que 1. Por outro lado,
não é difı́cil induzir que a operação Ss0 ∗ ∂Sg /∂z ∗ ∂Sg /∂z geraria uma versão, também
com o sinal trocado, do mesmo resı́duo. Tem-se no caso, a seguinte igualdade:
"∞ # "∞ # "∞ #
∂Sg ∂Sg X
(k) ∂Sg X
(k)
X
(k) ∂Sg
Ss 0 ∗ ∗ =− Ms0 ∗ + Ms0 ∗ Ms0 ∗ (3.3.9)
∂z ∂z k=1
∂z k=1 k=1
∂z
23
Neste caso, a derivada com relação à profundidade pode ser estimada no domı́nio ω-K x , através do
produto entre a transformada de Fourier de Rg e o fator iKz .
334 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Analisando-se as equações 3.3.8 e 3.3.9, conclui-se que a soma de ambas faz com que
o resı́duo criado pela primeira seja cancelado pela segunda a qual, por sua vez, cria um
novo resı́duo, neste caso envolvendo múltiplas de ordem maior do que 2. O mesmo resı́duo
aparece com o sinal trocado no resultado de uma nova convolução, entre a equação 3.3.9
e a derivada ∂Sg /∂z. Por extensão, admite-se, para um número infinito de convoluções,
a igualdade definida por
∞  
X
(k) ∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg
Ms0 = −Ss0 ∗ + ∗ + ∗ ∗ +··· (3.3.10)
k=1
∂z ∂z ∂z ∂z ∂z ∂z

Este resultado, que permite estimar o campo de múltiplas presentes no sismograma s0 ,


pode ser combinado com as equações 2.8.32 e 2.8.33, de forma a se obter a seguinte série24 :
 
∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg ∂Sg
Ps0 = Ss0 ∗ δ(x − xs0 ) + + ∗ + ∗ ∗ +··· (3.3.11)
∂z ∂z ∂z ∂z ∂z ∂z

Deduziu-se, assim, uma expressão equivalente às obtidas pelos grupos de Weglein e de
Berkhout (Weglein et al., 1997; Carvalho, 1992; Verschuur et al., 1988; Berkhout e Vers-
chuur, 1997a,b).
Observe-se que, de acordo com a equação 3.3.11, é possı́vel obter os eventos primá-
rios correspondentes a um sismograma a partir, única e exclusivamente, de um conjunto
de sismogramas registrados com múltiplas. Ou seja, à parte o coeficiente de reflexão da
superfı́cie livre, nenhum conhecimento, a respeito das propriedades elásticas do meio,
é necessário. Não é difı́cil perceber, na mesma equação, que o número de termos ade-
quado depende da profundidade do piso oceânico, uma vez que o último termo apresenta
múltiplas ainda não canceladas. Levando em conta que as sucessivas convoluções deslo-
cam as múltiplas residuais para tempos cada vez maiores, é fácil concluir que, em regiões
de águas profundas, mesmo que se utilize um número restrito de termos, nenhuma dis-
torção residual afeta os sinais primários.
Deve-se destacar três condições fundamentais para o sucesso da técnica descrita, as
quais se aplicam, pelo menos em parte, também aos algoritmos de Wiggins (1988) e Filpo
e Tygel (1999): (1) os dados devem estar em amplitude verdadeira, condição esta que pode
ser facilmente detectada na dedução da equação 2.8.31; (2) a forma da assinatura da fonte
e as distorções do pulso sı́smico geradas pelo sistema de aquisição devem ser reduzidas a
um impulso unitário, para que não ocorram alterações de tempo e amplitude capazes de
reduzir a eficiência da técnica e; (3) é necessária a existência de traços sı́smicos registrados
de acordo com uma faixa de afastamentos fonte-receptor que inclua a superposição com
a fonte, para que as múltiplas sejam adequadamente previstas25 .
24
A série obtida corresponde também à forma inversa da equação 2.8.32, a qual, para uma posição
isolada da função Ps0 , pode ser descrita como uma série simples. A demonstração correspondente não é
muito diferente da que se aplica ao caso 1-D, para o qual a série de eventos primários é obtida a partir
da equação 3.3.2, ou seja,
S
P =
1−S
ou, na forma de uma expansão binomial, P = S + S 2 + S 3 + · · ·
25
Rigorosamente, esta condição deveria ser generalizada para o caso 3-D, o que implicaria a utilização
de um sistema de aquisição em que os receptores se distribuı́ssem ao longo de uma área em torno da
fonte.
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 335

Das três condições citadas, talvez a mais severa delas seja a necessidade de se registrar
dados com afastamentos fonte-receptor iguais ou próximos de zero, já que as técnicas de
extrapolação, ou interpolação, de traços sı́smicos, que visam contornar esta necessidade,
tendem a somente ser bem-sucedidas em circunstâncias especiais como, por exemplo, nas
regiões de águas profundas. Em termos práticos, o conhecimento do pulso sı́smico não
representa uma limitação real, tendo em vista as opções de deconvolução de assinatura
disponı́veis. Além disso, como se afirmou no subitem dedicado ao mesmo tema, o próprio
processo de atenuação de múltiplas cria condições para se estimar o pulso sı́smico, com
base na idéia, já citada, de que o traço sı́smico sem múltiplas apresenta menor energia
do que o mesmo traço com múltiplas (ver Ikelle et al., 1997).

3.3.3 Deconvolução preditiva


Com base na teoria apresentada no item 2.8, pode-se dizer que as múltiplas são fenô-
menos com caracterı́sticas de fase mı́nima. Viu-se ainda que as múltiplas de camadas
finas geram um efeito de filtragem que, pelo menos em tese, pode ser relativamente
bem resolvido pela deconvolução de fase mı́nima. Resta perguntar se múltiplas com
periodicidade menor também podem ser atenuadas através da deconvolução. Este é o
objetivo da versão preditiva da técnica.
É possı́vel demonstrar que a deconvolução de fase mı́nima equivale à deconvolução pre-
ditiva, se esta for aplicada com distância de predição igual a uma amostra. A única dife-
rença, entre as duas técnicas, consiste na forma com que a autocorrelação do traço sı́smico
é tratada. Adotando-se a premissa de que a função refletividade é estacionária, aleatória
e, conseqüentemente, imprevisı́vel, conclui-se que, na ausência de eventos múltiplos, a au-
tocorrelação de um traço sı́smico deve ter coeficientes próximos de zero, para os tempos
maiores do que o do comprimento do pulso sı́smico.
Considere-se agora que existam eventos múltiplos no traço sı́smico. Neste caso, pode-
se concluir que o mesmo pulso foi convolvido com uma função não aleatória, caracterizada
por repetições, em intervalos regulares, da função refletividade. Esta propriedade faz com
que a autocorrelação do traço sı́smico seja caracterizada por repetições da autocorrelação
do pulso sı́smico, de acordo com intensidade e polaridade dependentes de cada um dos
eventos múltiplos.
A caracterı́stica descrita permite prever o padrão de eventos múltiplos de um traço
sı́smico, a partir de sua autocorrelação. Em outras palavras, a autocorrelação do traço,
deslocada em tempo de acordo com o atraso da múltipla, é equivalente à correlação
cruzada entre a série de reflexões primárias e as repetições correspondentes. No caso, o
tempo de atraso da múltipla corresponde à distância de predição.
Com base na teoria do filtro Wiener-Hopf-Levinson, pode-se agora montar o sistema de
equações que possibilita determinar os coeficientes do operador de predição de múltiplas,
ht , aplicável a um traço sı́smico hipotético, st . Aplica-se ao caso a seguinte versão discreta
da equação Wiener-Hopf:

n∆t
X
Φss (τ − t)ht = Φss (τ + m∆t), para τ ≥ 0 (3.3.12)
t=0

onde n + 1 é o número de coeficientes de ht , Φss é a autocorrelação do traço sı́smico,


336 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

m é o número de amostras correspondente à distância de predição e ∆t é o intervalo de


amostragem.
O operador de predição, ht , obtido com base na expressão 3.3.12, é usado para se cons-
truir o filtro de deconvolução preditiva, ft , o qual tem comprimento de m + n coeficientes.
Para isto, adota-se o seguinte modelo:

ft = (1, 0, 0, · · · , −h0 , −h1 , · · · , −hn )


| {z } | {z }
m−1 zeros n+1 coeficientes

Percebe-se facilmente que a aplicação deste filtro ao traço sı́smico não afeta as informações
no intervalo de tempo entre τ = 0 e τ = (m − 1)∆t, ao mesmo tempo em que atenua
os eventos cuja periodicidade envolve o intervalo entre m e n + m amostras. Esta é uma
caracterı́stica garantida pelo impulso unitário na origem, aliado aos m − 1 zeros e ao sinal
negativo que multiplica ht .
De acordo com que se afirmou anteriormente, sabe-se que, quando a distância de
predição é igual a uma amostra, ou seja, m = 1, o filtro ft obtido é igual ao filtro que se
calcula com a equação 3.2.17. Neste caso, a deconvolução preditiva atenua reverberações
com perı́odos que variam entre o equivalente a uma amostra e o comprimento do operador
(tipicamente, 80ms a 120-140ms), o que inclui os efeitos do filtro estratigráfico. Quando
se aplica a deconvolução preditiva com distâncias de predição maiores (por exemplo, 30ms
ou 40ms), o objetivo é o de não alterar a forma do pulso: as amostras nos tempos iniciais
da autocorrelação, correspondentes à parte mais importante do pulso, não são afetadas,
assim como grande parte dos efeitos do filtro estratigráfico.
A deconvolução preditiva, como aliás sugere o nome, exige periodicidade dos eventos a
atenuar. Viu-se no item 2.8 que, na presença de afastamento entre a fonte e o receptor, os
eventos múltiplos — gerados em um meio constituı́do de camadas horizontais e velocidade
lateralmente constante — se repetem não somente no dobro do tempo mas também no
dobro do afastamento em que ocorrem as reflexões primárias. Isto significa que, mesmo
no caso de um meio tão simples quanto o descrito, uma múltipla pode não apresentar
padrão periódico em um traço sı́smico isolado. Esta é a razão pela qual se justifica a
adoção de técnicas de deconvolução no domı́nio tempo-parâmetro de raio (o chamado
τ -p), domı́nio este em que as múltiplas apresentam padrão aproximadamente periódico.
No domı́nio τ -p, a deconvolução preditiva poderia, em princı́pio, atenuar também as
múltiplas de perı́odo longo (ver o subitem 2.8.2 e o Apêndice A.1). Entretanto, para que
isto fosse possı́vel, seria necessário que os dados registrados incluı́ssem uma adequada
representação estatı́stica das múltiplas, o que depende de um bom tratamento de am-
plitude, da ausência de ruı́dos, de um registro suficientemente longo e da presença de
componentes de baixas freqüências. As três últimas condições não se verificam no caso
de um sismograma tı́pico. Assim, o sistema de múltiplas de longo perı́odo apresenta-se
pobremente representado, truncado e afetado pelo ruı́do, o que diminui sua influência na
autocorrelação e, conseqüentemente, prejudica a eficácia do operador de deconvolução.

3.3.4 Compensação Q
No item 2.8, a absorção foi discutida com base no algoritmo de extrapolação de campos
de onda por deslocamento de fase (phase shift). O mesmo algoritmo pode ser aplicado
na correção do fenômeno, a qual é denominada por muitos autores “compensação Q”.
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 337

Para isto, a equação 2.8.13 é adaptada à extrapolação inversa, no que resulta a seguinte
expressão:
   
πf ∆τ 2f ∆τ f
S(τ + ∆τ, f ) = S(τ, f ) exp exp i ln exp(−iω∆τ ) (3.3.13)
Q Q f0

onde S é a transformada de Fourier do traço sı́smico, τ é o equivalente em tempo da


profundidade, Q é o fator de qualidade e f0 é a freqüência de referência.
Na forma da equação 3.3.13, a compensação Q é semelhante à migração por deslo-
camento de fase, representada pela equação 3.5.34. Aplica-se aos dois casos o modelo
do refletor explosivo, ou seja, assume-se que o refletor “explode” no tempo t = 0, o
que justifica a redução progressiva no tempo e o aumento na pseudo-profundidade de
observação, implı́citos na multiplicação pelo termo exp(−iω∆τ ). Assim, tudo se passa
como se o sistema de registro fosse progressivamente se aproximando da profundidade em
que o refletor “explodiu”.
A compensação Q baseada na equação 3.3.13 pode ser aplicada através da seguinte
seqüência de operações:

1. Calcula-se a transformada de Fourier do traço sı́smico registrado, representada por


S(τ = 0, f ).

2. Aplica-se a equação 3.3.13, para se obter a transformada de Fourier S(τ + ∆τ, f ),


na pseudo-profundidade τ + ∆τ .

3. Assumindo que fonte e receptor estão situados exatamente na posição τ + ∆τ ,


estima-se a amplitude que seria obtida no tempo t = 0, através da seguinte forma
da transformada inversa de Fourier (equação 1.2.11):
N
1 X
s(τ + ∆τ, t = 0) = RS (τ + ∆τ, n∆f ) (3.3.14)
N + 1 n=0

onde RS representa os componentes reais de S, ∆f é o intervalo entre freqüências


e N ∆f é a freqüência de Nyquist. Percebe-se, assim, ser desnecessária uma trans-
formada inversa de Fourier completa, já que o interesse reside apenas na amostra
obtida no tempo igual a zero e, no caso, uma simples média dos componentes reais
permite a obtenção do resultado desejado.

4. Armazena-se o resultado obtido na amostra τ + ∆τ do traço sı́smico corrigido.

5. Repetem-se as etapas 2 a 4 até que o valor de τ +∆τ corresponda ao tempo máximo


do traço sı́smico usado no inı́cio do processo.

A compensação Q depende de dois parâmetros: o fator de qualidade, Q, e a freqüência


de referência, f0 . O primeiro desses parâmetros pode ser estimado com base na geração
de painéis de dados sı́smicos, cada um deles correspondente à correção da absorção com
um valor especı́fico de Q. Outra técnica consiste em obter o valor de Q com base na
declividade do logaritmo neperiano do espectro de amplitude dos dados sı́smicos, a qual
é estimada: (a) através da razão entre os espectros de amplitude obtidos em duas janelas
338 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

sucessivas de tempo de reflexão, ou; (b) usando-se as freqüências superiores à de pico, em


uma janela de tempo de reflexão isolada. A Figura 3.14 (página 317), cujo eixo vertical
obedece a uma escala logarı́tmica, pode ser usada para ilustrar a alternativa b. No caso,
a razão Q/τ , estimada na faixa de freqüências superior à de pico, seria grosseiramente
igual a 50, ou, para τ = 2s, Q seria igual a 100.
O caso da freqüência de referência é, à primeira vista, um pouco mais simples, já que,
teoricamente, é aceitável adotar-se um valor constante para f0 . A este respeito, sabe-se
que, de acordo com o modelo de Futterman (1962), o valor adotado deveria ser quase
igual a zero. Entretanto, o que normalmente se faz é escolher um valor arbitrário para f 0
como, por exemplo, a freqüência de pico do sinal (ver Robinson, 1979). Outra alternativa,
cujas conseqüências teóricas são discutidas no subitem 3.3.5 e no Apêndice A.2, consiste
em tratar a absorção como um fenômeno de fase mı́nima, o que, no caso discreto, implica
considerar f0 igual à freqüência de Nyquist.
Uma conseqüência comum da má escolha do fator de qualidade é a superelevação de
ruı́dos nas altas freqüências, gerada pela aplicação recursiva do termo exp(πf ∆τ /Q), pre-
sente na equação 3.3.13. Conforme sugerido por Gibson e Larner (1984), este problema
pode ser contornado através da utilização de valores superestimados de Q, os quais le-
variam a uma subcorreção das perdas causadas pela atenuação, reduzindo a distorção
citada. De acordo com a mesma linha de raciocı́nio, a melhor solução consiste em esta-
bilizar a razão Q/τ em um valor mı́nimo preestabelecido, o que equivale, com o aumento
de τ , a um aumento de Q.
Observa-se, entretanto, que, mesmo adotando-se a sugestão de Gibson e Larner, a
aplicação da equação 3.3.13 ao caso especı́fico da atenuação leva, com freqüência, a resul-
tados piores do que a deconvolução de fase nula, se esta for aplicada na forma de janelas
de tempo. Por sua vez, a deconvolução de fase nula não permite tratar adequadamente a
perda de amplitude absoluta observada ao longo do trajeto percorrido pelo pulso sı́smico.
Esta deficiência pode ser parcialmente contornada com base na transformada inversa de
Fourier da equação 2.8.11, a qual dá origem, no domı́nio do tempo, ao pulso de absorção
de fase nula, correspondente ao efeito isolado da atenuação. No limite em que a máxima
freqüência é infinita, tem-se a seguinte expressão:
"  2 #−1
2Q Q
at (τ ) = 1 + 4t2 (3.3.15)
πτ τ

onde t é um tempo relativo e equivale ao tempo de reflexão menos o valor de τ .


A expressão 3.3.15 pode ser útil no caso em que se procura corrigir a amplitude ao
longo de uma reflexão amostrada em um agrupamento CMP (Common MidPoint), no
qual, desconsiderando-se o efeito do filtro estratigráfico, pode-se admitir que o fator Q é
aproximadamente constante. Admitindo-se ainda que a correção relativa seja aceitável,
pode-se tornar o processo parcialmente independente do valor de Q. Isto é feito com base
na seguinte expressão:
a0 (τ0 ) τ
c(τ ) = = (3.3.16)
a0 (τ ) τ0
onde c(τ ) é a correção a aplicar aos dados, τ é o tempo de trajeto, em um afastamento
fonte-receptor qualquer, enquanto τ0 corresponde ao trajeto vertical. O leitor poderá
verificar a validade desta expressão analisando a Figura 2.60, na página 226.
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 339

Na mesma linha, um tratamento alternativo, mais elegante, é baseado no conceito de


continuação de afastamento fonte-receptor26 . De acordo com esta técnica, aplica-se a uma
reflexão isolada de um traço sı́smico não empilhado a seguinte forma da compensação Q:
   
πf (τ − τ0 ) 2f (τ − τ0 ) f
Sc (τ, f ) = S(τ, f ) exp exp i ln (3.3.17)
Q Q f0

onde Sc (τ, f ) é a transformada de Fourier do traço sı́smico parcialmente corrigido, en-


quanto τ0 e τ correspondem aos trajetos vertical e na presença de afastamento fonte-
receptor, respectivamente. Observe-se nesta expressão que, adotando-se a aproximação
hiperbólica, uma reflexão situada no afastamento fonte-receptor igual a zero não é alte-
rada, uma vez que, neste caso, τ = τ0 .
Seja através da continuação de afastamento fonte-receptor, seja na versão convenci-
onal, é muitas vezes conveniente aplicar a compensação Q de forma dedicada exclusiva-
mente à correção da dispersão. Neste caso, pode-se adotar a mesma seqüência apresentada
acima, substituindo-se a equação 3.3.13 pela seguinte expressão:
 
2f ∆τ f
S(τ + ∆τ, f ) = S(τ, f ) exp i ln exp(−iω∆τ ) (3.3.18)
Q f0

Ou seja, o termo que corrige a atenuação — exp(πf ∆τ /Q) — é considerado igual a 1.


Como no caso da equação 3.3.13, o resultado da aplicação da expressão 3.3.18 é
dependente do valor de Q. Entretanto, as eventuais supercorreções da dispersão são
mais sutis do que as da atenuação, particularmente na região do espectro que inclui as
freqüências vizinhas à de referência, f0 . No caso de um processamento mais ambicioso,
em que a recuperação de componentes de altas freqüências faz parte dos objetivos do
geofı́sico, uma correção de dispersão exagerada pode ser bem mais danosa do que a
deconvolução de fase mı́nima, a qual é amortecida na presença de ruı́do aleatório.
Na Figura 3.20, vê-se um exemplo de aplicação da equação 3.3.18 a dados sı́smicos
sintéticos não empilhados. Observe-se na figura que: (1) um erro no valor de f0 introduz
apenas um deslocamento linear de fase, uma vez que o termo −(τ ln f0 )/(πQ) é constante;
(2) um erro no valor de Q altera significativamente a forma do sinal resultante, em relação
à esperada. No primeiro caso, uma pequena mudança na velocidade de migração, ou de
empilhamento, pode compensar a distorção observada. O mesmo não se aplica ao erro
no valor de Q, o qual exige uma correção residual de fase, normalmente aplicada com o
apoio de dados de poços27 .
As equações 3.3.13 e 3.3.18, por serem fundamentadas no conceito de deslocamento
de fase, implicam processamento mais demorado do que a deconvolução rotineira. Para
minorar esta deficiência, podem ser usadas técnicas alternativas que permitem corrigir a
atenuação, ou a dispersão, ou ambas, respeitando também a variação do operador, amos-
tra a amostra, mas de forma mais rápida do que a observada na aplicação do algoritmo de
deslocamento de fase. Uma dessas técnicas, desenvolvida por Hale (1982) e generalizada
por Varela et al. (1993), é discutida no Apêndice A.2. A mesma discussão pode ser usada
26
Trata-se de uma idéia proposta por Carlos L. Varela.
27
Nesta tarefa, deve-se tomar cuidado com a banda espectral disponı́vel para a análise, uma vez que
um conteúdo de freqüências limitado pode dar a falsa impressão de que a fase não exige correção.
340 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

0.9
a
1.0

1.1

0.9
b
1.0
Tempo (s)

1.1

0.9
c
1.0

1.1

0.9
d
1.0

1.1
0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0
Afastamento fonte−receptor (km)
Figura 3.20: Agrupamento CMP sintético, correspondente a uma re-
flexão gerada no tempo vertical igual a 1 segundo: (a) traços com absorção
(Q = 100, f0 = 500Hz); (b) após correção da dispersão, usando f 0 = 40Hz
e o valor correto de Q; (c) após correção da dispersão, usando Q = 50 e o
valor correto de f0 ; (d) após correção da dispersão, usando os valores cor-
retos de Q e f0 . Os traços sı́smicos foram submetidos à correção de NMO,
assumindo-se um meio sem absorção e sem levar em conta o estiramento.
Parâmetros: v = 2000m/s, filtro passa-banda de 8-60Hz e fase nula.

para se deduzir o filtro recursivo de dois pontos proposto por O. Duarte, na segunda
metade dos anos 1990 (ver o exercı́cio 16, no item 3.9).
As técnicas dedicadas à compensação Q podem ser combinadas com a deconvolução
da assinatura, através de uma seqüência que representa uma boa alternativa para a
deconvolução estatı́stico-determinı́stica discutida anteriormente. Neste caso, a fase de-
terminı́stica do processo consiste na aplicação de um filtro de forma, em vez de um filtro
inverso. Ou seja, o pulso sı́smico residual tem espectro de fase igual a zero e espectro de
amplitude com uma forma desejada qualquer. Em seguida, aplica-se a compensação Q
com o objetivo de corrigir apenas a dispersão, iniciando-se o processo abaixo da eventual
camada de água.
O procedimento alternativo proposto deve ser complementado com as técnicas de
atenuação de múltiplas já discutidas e, adicionalmente, com a deconvolução de fase nula,
analisada no item 3.2. É possı́vel ainda, na linha proposta por Varela et al. (1993), aplicar
compensação Q residual após a deconvolução estatı́stico-determinı́stica, com o cuidado
3.3. CORREÇÃO DOS FATORES DE PROPAGAÇÃO 341

de utilizar valores altos para Q.

3.3.5 Compensação estratigráfica


A complexidade envolvida na atenuação dos efeitos do filtro estratigráfico pode ser ava-
liada simplesmente com base na denominação alternativa que se poderia adotar para o
fenômeno: “microespalhamento da energia”. Ou seja, a “construção” do filtro estra-
tigráfico envolve não somente as interfaces entre camadas finas mas também todos os
demais possı́veis espalhadores de energia situados em posições vertical e lateralmente
muito próximas umas das outras. Independentemente de suas causas, sabe-se que a curta
duração, caracterı́stica do fenômeno, impede um tratamento baseado na atenuação de
múltiplas entre camadas ou, no caso dos espalhadores laterais, na combinação da mesma
técnica com a migração dos dados sı́smicos. Por outro lado, a mesma caracterı́stica pode
fazer com que o filtro estratigráfico não seja explicitamente tratado e, em conseqüência,
afete o resultado de processos relacionados a outros fenômenos, como a anisotropia (ver
o subitem 2.8.5).
De acordo com o modelo de filtro estratigráfico de O’Doherty e Anstey (1971), não se
leva explicitamente em conta o efeito de espalhadores laterais de energia. Entretanto, a
abordagem estatı́stica, usada por eles e por diversos outros autores, permite, com algumas
ressalvas, generalizar o modelo. Aceita-se assim a idéia de que o filtro estratigráfico é um
operador de fase mı́nima e, portanto, pode ser submetido com sucesso à deconvolução de
fase mı́nima. Para isto, é necessária a aplicação prévia de procedimentos determinı́sticos
que deixem no espectro de amplitude dos traços sı́smicos o efeito exclusivo do filtro
estratigráfico e da função refletividade. Ou seja, a influência de fatores como o pulso
sı́smico e seus componentes deve ser previamente atenuada (ver os subitens 3.2.1 e 3.2.4).
Viu-se, no subitem 3.2.3, que a eficácia da deconvolução de fase mı́nima é fortemente
controlada pelo nı́vel de ruı́do aleatório naturalmente presente nos dados sı́smicos. Isto
significa que, se nada for feito, a deconvolução de fase mı́nima atenuaria de forma não ne-
cessariamente satisfatória os efeitos do filtro estratigráfico. Adicionalmente, sabe-se que
o filtro estratigráfico é “construı́do” recursivamente, de tal forma que ele se modifica a
cada novo espalhador encontrado no trajeto do sinal, o que exigiria modificar os procedi-
mentos normalmente usados na deconvolução de fase mı́nima. Se, além disso, admitir-se
que a função refletividade — generalizada de forma a incorporar os espalhadores laterais
— não é estacionária, deve-se concluir que a deconvolução de fase mı́nima representa, no
máximo, uma solução paliativa do problema.
Fortuitamente, as possibilidades do modelo de O’Doherty e Anstey foram levadas um
pouco mais longe por outros autores. Dois deles, Richards e Menke (1983), propuseram a
idéia de que o filtro estratigráfico atua de forma equivalente à da absorção. Admitindo-se
esta possibilidade, conclui-se ser possı́vel avaliar, de forma operacional, a dimensão dos
efeitos do filtro estratigráfico, o que é feito com base em estimativas sı́smicas do fator
estratigráfico de qualidade, Qst , exatamente como se faz no caso do fator de qualidade
convencional, Q. Ressalte-se ainda que, se for levada em conta a relação entre a hete-
rogeneidade caracterı́stica dos microespalhadores de energia e a dispersão observada no
sinal sı́smico, é possı́vel afirmar, como fizeram Richards e Menke, que muito do que se
considera absorção inelástica pode ser devida à atuação do filtro estratigráfico.
Esta linha de raciocı́nio induz a proposição do que se poderia denominar “compensação
342 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

estratigráfica”, ou seja, o tratamento dos efeitos do filtro estratigráfico, incluindo a perda


por transmissão, na forma de uma “absorção” elástica de fase mı́nima. De acordo com
Futterman (1962), sabe-se que os espectros de amplitude e fase da absorção se relacio-
nam através da transformada Hilbert contı́nua, o que implica considerar a fase descrita
pela expressão 2.8.12 como mı́nima. Nestes termos, a única diferença explı́cita, entre as
compensações Q e estratigráfica, consistiria na substituição do fator Q pelo fator Q st . En-
tretanto, um detalhe torna a discussão um pouco mais complexa: a escolha da freqüência
de referência. Este tema, que envolve a relação entre a fase mı́nima analógica e a digi-
tal, é discutido no Apêndice A.2, no contexto da técnica de Hale (1982) e Varela et al.
(1993). Em termos práticos, é uma fonte potencial de problemas, dependendo da faixa
de freqüências que se almeja obter.

3.4 O Princı́pio de Huygens e a Migração


A migração dos dados sı́smicos, baseada no modelo do modelo do refletor explosivo, é um
processo que tem como tarefas básicas: (a) localizar exatamente os pontos responsáveis
pela geração das reflexões ou difrações e; (b) estimar os valores de amplitude correspon-
dentes aos mesmos pontos, assumindo que cada um deles “explodiu” no mesmo instante
t = 0. Com base nesses objetivos, procura-se analisar neste item, de forma progressiva-
mente mais profunda, como a migração depende da geometria dos refletores, da inter-
ferência entre os sinais “gerados” nos mesmos refletores e das deformações introduzidas
pela distribuição das velocidades.

3.4.1 Migração geométrica


Em sua acepção geométrica, a migração de dados sı́smicos pode ser definida como o
processo que permite a localização de difratores ou, nos termos do modelo do refletor
explosivo, a posição em que a energia foi gerada. Aplica-se ao caso o seguinte princı́pio,
descrito nas condições de um meio homogêneo e isotrópico mas facilmente generalizável: o
sinal sı́smico correspondente a uma amostra registrada pode ter sido gerado em qualquer
ponto de um semicı́rculo com centro na posição de registro — uma superfı́cie aplanática 28 .
Considerando um impulso unitário registrado no tempo arbitrário t0 e na coordenada
horizontal x0 , a equação correspondente é:

z 2 = v 2 t20 − (x − x0 )2 (3.4.1)

ou, em termos do tempo vertical,


 2
2 x − x0
τ = t20 − (3.4.2)
v

onde z corresponde à profundidade, τ é o seu equivalente em tempo, x é a coordenada


horizontal e v é a metade da velocidade de propagação no meio (ou seja, v = v H ). Deve-se
destacar a diferença entre os produtos vt0 e vτ : o primeiro é uma profundidade aparente,
28
A generalização mencionada exige, na maioria dos casos, o recurso a descrições não analı́ticas da
superfı́cie aplanática (ver o item 2.5).
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 343

0.5
Tempo (s)

1.0

1.5

2.0
1 2 3 4
Coordenada horizontal (km)

Figura 3.21: Localização de um difrator, identificado pelo sı́mbolo •,


com base nos tempos de registro da difração correspondente.

avaliada nos dados registrados, enquanto o segundo é a profundidade real, referente aos
dados migrados.
Aplicada ao exemplo de uma difração isolada, ainda nas condições de um meio ho-
mogêneo e isotrópico, a versão geométrica da migração pode ser descrita da seguinte
forma: a partir de cada uma das posições de registro, traça-se um semicı́rculo construı́do
com base na equação 3.4.1, ou na 3.4.2, usando o valor de tempo obtido na mesma
posição; o difrator é localizado no ponto em que os diversos semicı́rculos se interceptam.
Na Figura 3.21, vê-se uma ilustração do conceito, aplicado com base na equação 3.4.2,
ou seja, as profundidades dos semicı́rculos, z, foram substituı́das pelos seus equivalentes
em tempo, τ .
Considere-se agora a Figura 3.22, na qual se representa a relação geométrica entre
uma difração, uma frente de onda gerada na posição original de registro e uma reflexão
qualquer, no caso de um meio homogêneo e isotrópico. Percebe-se na figura que: (1)
a difração, gerada no refletor, tangencia a reflexão em um determinado ponto; (2) a
frente de onda, gerada no mesmo ponto, tangencia o refletor na posição do difrator, após
percorrer o tempo correspondente ao da reflexão obtida; (3) a mesma frente de onda
corta a difração em seu ápice, o qual, em função das caracterı́sticas do meio, situa-se
na posição do difrator. Desta forma, pode-se dizer que a migração geométrica de uma
reflexão consiste em localizar os diversos difratores que a caracterizam.
Com base nos conceitos ilustrados através das figuras 3.21 e 3.22, a migração geométrica
de uma reflexão pode ser conduzida como no exemplo da Figura 3.23. Ou seja, traçam-se
semicı́rculos, centrados nas posições de registro, tomando-se como raio a profundidade
aparente do refletor. Através de uma inspeção dos semicı́rculos traçados, confirma-se a
expectativa: o envelope tangente às frentes de onda circulares corresponde à interface
usada para a geração da reflexão, corrigindo o falseamento de mergulho, existente na
seção não migrada. A técnica descrita é a versão geométrica da chamada migração por
frentes de onda.
A migração por frentes de onda tem uma interessante interpretação, baseada na in-
versão das posições do difrator e do registro na superfı́cie. Para isto, considera-se cada
344 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

0.5 FO
Tempo (s)

1.0
D

1.5

R
M
2.0
0 1 2 3
Coordenada horizontal (km)

Figura 3.22: Geometrias da frente de onda (F O) e da difração (D) que


relacionam um difrator ao correspondente ponto na reflexão registrada.
O meio é homogêneo e isotrópico e a velocidade é igual a 2000m/s (v H =
1000m/s). Os sı́mbolos M e R representam a interface geológica e a
reflexão registrada.

uma das posições originais de registro como uma fonte de energia, com amplitude igual
à do sinal registrado na mesma posição. A energia é propagada terra a dentro e o novo
registro é agora uma fotografia da frente de onda, obtida quando a onda viajou o tempo
equivalente à da reflexão registrada. Somando-se as fotografias das diversas frentes de
onda possı́veis, obtém-se, como resultado, a seção migrada.
Em meios homogêneos e isotrópicos, a versão geométrica da migração de dados sı́smicos
pode ser reproduzida algebricamente com base em um conjunto de relações relativamente
simples, baseadas em conceitos já apresentados nos itens 2.1 e 2.2. O primeiro e mais
fundamental desses conceitos é resumido pela seguinte expressão:

sen θ = tan ψ = vp (3.4.3)

onde θ é o mergulho real da interface e ψ é o mergulho aparente da mesma interface,


medido na seção não migrada. Por sua vez, v é igual à metade da velocidade média até
a interface (v = vH ) e p é a vagarosidade horizontal, dada por

dt sen θ
p= = (3.4.4)
dx v
Este resultado merece ser destacado: a vagarosidade de uma reflexão contém informações
que permitem calcular o mergulho do refletor correspondente, sendo que, no caso de um
meio homogêneo e isotrópico, este cálculo é trivial.
Com as equações 3.4.3 e 3.4.4, pode-se estimar não somente a mudança no ângulo
de mergulho mas também o deslocamento horizontal introduzidos pela migração de um
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 345

0
α

0.5
Tempo (s)

1.0

1.5

R
M
2.0
0 1 2 3
Coordenada horizontal (km)

Figura 3.23: Representação geométrica da migração por frentes de


onda em um meio homogêneo e isotrópico, no qual a velocidade é igual
a 2000m/s (vH = 1000m/s). As letras M e R representam a interface
geológica e a correspondente reflexão. O sı́mbolo α identifica o ângulo
de migração, ou seja, o máximo ângulo, com relação à vertical, usado
no traçamento dos semi-cı́rculos.

evento qualquer. Para se estimar também o deslocamento vertical e, desta forma, comple-
tar o processo de migração do mesmo evento, é necessário definir também a vagarosidade
vertical, a qual é dada por r
dt cos θ 1
= = − p2 (3.4.5)
dz v v2
onde z é a profundidade. Este resultado permite definir o cosseno do ângulo de mergulho
real através da seguinte expressão:
p
cos θ = 1 − v 2 p2 (3.4.6)

Com base na Figura 3.24 e nas expressões 3.4.3 a 3.4.6, pode-se facilmente estimar
os deslocamentos horizontal e vertical aplicados pela migração. Para apresentar as ex-
pressões correspondentes, suponha-se que uma determinada amostra de um evento, cuja
declividade aparente é dt/dx, tenha sido registrada na coordenada horizontal x A e na
profundidade aparente zA = vt, onde t é o tempo de reflexão e v é metade da velocidade
de propagação correta. Aplicada à mesma amostra, a migração a reposiciona na coorde-
nada horizontal xM e na profundidade zM , as quais são dadas pelas seguintes expressões:

dt
xM = x A − v 2 t = xA − zA sen θ (3.4.7)
dx
ou
xM = xA − vt sen θ = xA − zM tan θ (3.4.8)
346 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.24: Relação entre o mergulho aparente e o real.

e
dt
zM = v 2 t = zA cos θ (3.4.9)
dz
ou, em termos do tempo migrado τM ,

τM = t cos θ (3.4.10)

Com base nas equações 3.4.3 a 3.4.10, percebe-se que a migração de uma amostra
qualquer implica o seguinte percurso: partindo-se da superfı́cie, onde a amostra foi re-
gistrada, caminha-se ao longo do raio descrito pelo parâmetro p, até que a distância
percorrida seja igual à profundidade aparente da reflexão registrada, a qual é dada por
zA = vt. As coordenadas do ponto atingido correspondem às da amostra migrada.
A declividade de um refletor migrado pode ser obtida com base na declividade da
reflexão não migrada, sem a necessidade de computar coordenadas. Para isto, aplica-se
a seguinte definição da tangente do ângulo real, θ:
dτM
tan θ = v (3.4.11)
dx
onde τM é o tempo duplo na seção migrada. Sabendo-se que tan θ é igual a sen θ/ cos θ,
pode-se, com as expressões 3.4.4 e 3.4.6, obter a equação que define a declividade do
refletor após a migração, com base na declividade da reflexão registrada. O resultado é:
dτM p
=p (3.4.12)
dx 1 − v 2 p2
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 347

Uma análise das expressões 3.4.7 a 3.4.12 pode levar à conclusão de que velocidades
maiores do que a correta implicam migração excessiva. O oposto é válido para velocidades
mais baixas do que a correta. Um caso extremo é bem ilustrativo: o da velocidade igual
a zero. Neste caso, observa-se, na equação 3.4.12, que a declividade da reflexão migrada
é igual à da registrada, em função do fato de que o produto vp é igual a zero. Observa-se
ainda que a reflexão migrada é mantida na posição da reflexão original, já que o ângulo
θ, estimado com base na equação 3.4.3, é igual a zero e, em conseqüência, xM = xA e
zM = zA (ver as equações 3.4.7 e 3.4.9).
Nas aplicações práticas da migração, dois conceitos interrelacionados são fundamen-
tais: o ângulo de migração e a abertura do operador de migração o qual, em um meio
homogêneo e isotrópico, tem a geometria de um semi-cı́rculo, ou de uma frente de onda.
Ambos são parâmetros que estabelecem até que declividade uma dada difração será co-
lapsada pela migração. Conforme já foi dito no item 3.1, sinais com declividades maiores
do que o limite estabelecido são atenuados no processo.
Em termos práticos, o ângulo de migração, identificado esquematicamente na Figura
3.23, define até que ângulo de mergulho um refletor poderá ser corretamente migrado.
Por sua vez, a abertura do operador de migração corresponde à distância horizontal entre
os extremos da geometria que caracteriza o mesmo operador, extremos estes associados ao
máximo ângulo de mergulho a ser corretamente migrado. Percebe-se assim que, para uma
mesma abertura de operador, o ângulo de migração tende a decrescer com a profundidade.
Por outro lado, se o parâmetro fixado for o ângulo de migração, a abertura do operador
tende a crescer com a profundidade.

3.4.2 A migração e a interferência de ondas acústicas


Até agora, a migração foi tratada como um processo puramente geométrico. Para apro-
fundar um pouco mais a análise, torna-se necessário introduzir os conceitos envolvidos
na interferência de sinais. Em primeiro lugar, menciona-se a primeira zona de Fresnel,
a qual pode ser analisada de forma análoga à conduzida no item 2.2, bastando levar em
conta as diferenças na geometria. No caso, a área que inclui sinais com atraso relativo
de até um quarto do comprimento de onda, os quais contribuem de forma construtiva
para a obtenção de uma amostra migrada, é definida na superfı́cie de registro e não na
superfı́cie do refletor. Considerando-se um meio homogêneo e isotrópico e uma reflexão
horizontal, demonstra-se facilmente que, na migração, o raio da primeira zona de Fresnel
é também definido pela equação 2.2.9.
Para uma análise mais abrangente da interferência de sinais na migração, suponha-se
inicialmente que, em vez de uma reflexão horizontal, registrou-se uma amplitude iso-
lada. No caso, a migração leva a uma forma de onda com geometria semicircular, como
no exemplo da Figura 3.25, a qual corresponde a uma versão filtrada do operador de
migração, aplicada a um impulso unitário situado no tempo de 512 milissegundos.
Na presença de uma reflexão, formas de onda como a da Figura 3.25 combinam-se
entre si, de forma a gerar o refletor migrado. Para ilustrar o conceito, foi preparada a
Figura 3.26, nos mesmos moldes da Figura 2.19 (página 101). Observe-se que, à medida
que diminui a distância entre os impulsos unitários, forma-se um refletor. O leitor pode
estar se perguntando qual é, neste processo, o papel do tempo de reflexão e da amplitude
correspondentes à reflexão registrada.
348 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.25: Resposta da migração bidimensional em tempo a um impulso unitário


filtrado (8-40Hz). Parâmetros: v = 2000m/s (v H = 1000m/s), t0 = 512ms, ∆x =
25m.

Para responder à pergunta feita no parágrafo anterior, recorre-se à aplicação do prin-


cı́pio de Huygens na direção inversa. Esta analogia permite considerar um traço sı́smico
como uma coleção de “fontes” de energia29 , cada uma delas caracterizada por um par de
valores de amplitude e de tempo de reflexão. Assim, de acordo com a forma inversa do
princı́pio de Huygens, cada uma dessas “fontes” gera uma onda com amplitude propor-
cional à registrada e tempo de trajeto igual ao de reflexão. A soma de todas as possı́veis
ondas assim geradas dá origem à seção sı́smica migrada. Com base na Figura 3.22, não
é difı́cil induzir que a mesma operação poderia ser conduzida somando-se amplitudes ao
longo das difrações.
De acordo com esta linha de raciocı́nio, a migração pode, indistintamente, ser exe-
cutada de duas formas: (1) na migração por soma de difrações, somam-se amplitudes
ao longo da difração correspondente a cada difrator e posiciona-se o resultado, na seção
migrada, na posição do ápice da difração; (2) na migração por frentes de onda, cada sinal
registrado dá origem a uma frente de onda que é acumulada na seção migrada. Observe-se
que estas operações são opostas às executadas na modelagem, a qual pode ser executada
também de duas formas: (1) cada difrator dá origem a uma difração, a qual é acumulada
na seção “registrada”; (2) somam-se amplitudes ao longo da frente de onda definida para
cada difrator e posiciona-se o resultado, na seção “registrada”, na posição correspondente
à base da frente de onda. As figuras 3.26 e 2.19 (página 101) podem ser usadas para
ilustrar os dois processos.
Nas duas formas de migração apresentadas, aplica-se, como na modelagem, o conceito
mais fundamental do princı́pio de Huygens: nos pontos em que ocorrem difratores reais,
ou nas posições em que a frente de onda é tangente a refletores válidos, o processo
de soma de amplitudes, conduzido pela migração, resulta em números expressivos; nas
demais posições, as somas devem ser desprezı́veis. Assim, os difratores e refletores podem
29
As aspas na palavra fontes são justificadas pelo fato de que não se trata de fontes convencionais,
uma vez que os espectros de amplitude e fase são tratados de uma forma diferente, a ser discutida.
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 349

Figura 3.26: Migração bidimensional em tempo de impulsos unitários filtra-


dos (8-40Hz) e distribuı́dos de acordo com espaçamento lateral variável. Parte
superior: modelo de impulsos unitários não filtrados. Parte inferior: resultado.
Parâmetros: v = 2000m/s (vH = 1000m/s), t0 = 512ms, ∆x = 25m.

ser identificados com base nas maiores amplitudes relativas.

Com esses conceitos, pode-se retornar à discussão sobre a interferência de sinais e


perguntar o que ocorre no caso de uma reflexão curva. Como o princı́pio de Huygens está
sendo aplicado no sentido inverso, pode-se dizer que a definição da zona de Fresnel deve
também ser analisada de forma inversa. Assim, enquanto que, no caso direto, um refletor
côncavo para cima leva a uma primeira zona de Fresnel mais extensa, o oposto ocorre no
caso inverso. Em conseqüência, pode-se dizer que, quando uma reflexão é convexa para
cima, a migração tende a concentrar amplitude na região do ápice correspondente. O
oposto ocorre quando a reflexão é côncava para cima.

Esses dois exemplos podem ser usados para ilustrar como a migração corrige as dis-
torções de amplitude geradas pela geometria dos refletores. Viu-se no item 2.2 que, na
propagação direta, um sinclinal leva a uma concentração de energia em torno do traço
sı́smico cuja coordenada superficial coincide com o centro do raio de curvatura da inter-
face. Uma boa ilustração desse fenômeno foi apresentada na Figura 2.21 (página 102).
Por outro lado, sabe-se que a migração de um impulso unitário dá origem a formas se-
micirculares como a da Figura 3.25. Não é difı́cil induzir que, neste caso, a migração se
encarrega de redistribuir a energia concentrada pelo processo direto. O oposto ocorre no
caso de um anticlinal.
350 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

3.4.3 A álgebra da versão inversa do princı́pio de Huygens


Embora não tenha sido explicitado anteriormente, a migração implica a extrapolação
inversa dos dados registrados, na superfı́cie, até a posição dos refletores, em subsuperfı́cie.
Para que se aprofundem os conceitos envolvidos no tema, pode-se seguir a mesma linha
de raciocı́nio adotada no item 2.2. Para isto, suponha-se que se deseja estimar como seria
o campo de ondas em um ponto hipotético B, definido por p(xB , yB , z = zB , t), a partir
do campo de ondas registrado na superfı́cie, p(x, y, z = 0, t), sabendo-se que zB > 0 e que
o meio é homogêneo e isotrópico. Neste caso, a distância entre cada ponto na superfı́cie
e o ponto B seria dada por
p
R = |~r| = (x − xB )2 + (y − yB )2 + (z − zB )2 (3.4.13)

ou
R = vτ (3.4.14)
onde τ é o tempo duplo correspondente à distância R e, como está sendo aplicado o
modelo do refletor explosivo, a velocidade é metade da correta (v = vH ).
A aplicação do princı́pio de Huygens-Fresnel ao problema proposto consiste em se
estimar a resposta sı́smica desejada, no ponto B, através de uma soma ao longo da
superfı́cie de registro (z = 0), nos moldes do que foi feito, no item 2.2, para a geração de
uma reflexão. Aplica-se ao caso a seguinte expressão:
XX
p(xB , yB , zB , t) = p(x, y, z = 0, t + τ ) (3.4.15)
y x

Na equação 3.4.15, o termo t + τ significa que cada amostra da matriz de dados


registrados, situada nas coordenadas (x, y, z = 0), tem seu tempo reduzido de acordo
com o intervalo τ = R/v, para a execução do somatório. Esta redução no tempo equivale
a um aprofundamento da profundidade de registro ou, ainda, à propagação inversa para
o interior da terra. Aplica-se a mesma equação a todos os valores possı́veis de x B , yB
e t, mantendo-se z e zB constantes. Observe-se que, para um mesmo traço sı́smico
p(x, y, z = 0, t), o tempo τ é constante ao longo de todos os valores de t usados na
obtenção do traço p(xB , yB , zB , t). O resultado é uma estimativa de como seria o volume
de dados “registrados” na profundidade zB .
Para ilustrar o processo, considere-se que foi registrada na superfı́cie uma reflexão
horizontal, no tempo t0 , e que se deseja estimar, com a equação 3.4.15, como seria o
traço sı́smico na posição (xB , yB , zB ). Considere-se ainda que a amplitude da reflexão
é constante, que o pulso sı́smico é um impulso unitário e que o meio é homogêneo e
isotrópico. Suponha-se agora que a profundidade zB seja exatamente a profundidade do
refletor, ou seja, zB = vt0 . Isto significa que se deseja posicionar fontes e receptores
hipotéticos na profundidade do refletor que gerou a reflexão registrada.
Como a reflexão é horizontal, e se aplica o modelo do refletor explosivo, conclui-se que o
resultado do processo deve levar a um evento também horizontal, com a mesma amplitude
da reflexão, já que a frente de onda, por ser plana, exclui a influência do espalhamento
geométrico. Ou seja, o traço sı́smico extrapolado deve apresentar um evento isolado, no
tempo t = 0, com amplitude dada por

p(xB , yB , z = zB , t = 0) = p(x, y, z = 0, t = zB /v)


3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 351

Na Figura 3.27a, mostra-se o resultado da aplicação da equação 3.4.15 ao problema


proposto. Observe-se na figura o decréscimo de amplitude com o tempo desde os tempos
negativos até a descontinuidade observada no tempo t = 0. Ou seja, não se obteve o
resultado esperado.
Seguindo-se uma linha de raciocı́nio semelhante à utilizada no item 2.2, pode-se con-
cluir que uma amostra do traço sı́smico obtido com a equação 3.4.15, em um dado tempo
t, concentra a influência de um anel com área ∆S, o qual poderia ser visualizado através
de uma versão de cabeça para baixo da Figura 2.18 (página 100). Sabendo-se que a
amplitude medida, p, é lateralmente constante, a expressão que descreve ∆S, deduzida
no item 2.2, permite interpretar a equação 3.4.15 como uma soma ao longo do tempo,
dada por  
2πv 2 a(t)
p(xB , yB , zB , t) = u(−t)p0 ∆τ (3.4.16)
k
onde a(t) = t0 − t, enquanto k e p0 são constantes, a primeira com dimensão de superfı́cie
e a segunda igual ao valor da amplitude da reflexão, medida na superfı́cie. Por sua vez,
a função u(−t) corresponde à versão anti-causal da função degrau.
Com base nas propriedades da função degrau, pode-se explicitar duas distorções na
expressão 3.4.16 e, conseqüentemente, na equação 3.4.15:
1. A amplitude do traço sı́smico estimado com a equação 3.4.15 decresce continua-
mente com o tempo, desde t = −∞ até t = 0, o que reproduz o resultado apresen-
tado na Figura 3.27a.
2. A equação 3.4.15 inclui implicitamente uma integração anti-causal com relação ao
tempo, o que se deve às propriedades da função degrau anti-causal, a qual, se
for desprezada a freqüência igual a zero, tem transformada de Fourier igual à do
operador de integração anti-causal (ver as equações 1.2.31 e 1.2.44).
Para compensar o decréscimo de amplitude com o tempo, transforma-se a equação
3.4.15 na seguinte soma ponderada pela área ∆S, a qual é dada pela equação 2.2.14:
X X  1  
1
p(xB , yB , zB , t) = 2π p(x, y, z = 0, t + τ ) ∆x∆y (3.4.17)
y x
vR∆t

Na Figura 3.27b, vê-se o resultado da aplicação desta equação ao problema da reflexão


horizontal. Percebe-se que a amplitude é constante na região em que os tempos são
inferiores a zero e que o resultado obtido ainda não é o desejado, já que corresponde
conceitualmente à seguinte expressão:
p(xB , yB , zB , t) = p0 u(−t)
Eliminado o decréscimo de amplitude com o tempo, resta ainda a integração anti-
causal introduzida implicitamente pela função degrau invertida no tempo. Para se cance-
lar esta distorção, deve-se incluir na equação 3.4.17 a operação inversa, que é a derivada
anti-causal, a qual tem sinal oposto ao da derivada causal. Neste conceito, está implı́cita
a idéia de que a integração deveria ter sido feita sobre a razão −∆p/∆t, em vez do campo
p. Introduzindo-se esta modificação na equação 3.4.17 e fazendo ∆t tender a zero, tem-se:
X X  1 ∂  
1
p(xB , yB , zB , t) = − 2π p(x, y, z = 0, t + τ ) ∆x∆y (3.4.18)
y x
vR ∂t
352 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

a
t t=
=0
Tempo

Figura 3.27: Resultados da aplicação, a uma reflexão horizontal, de cinco versões


algébricas da extrapolação inversa baseada no princı́pio de Huygens: (a) equação
3.4.15; (b) equação 3.4.17; (c) equação 3.4.18; (d) equação 3.4.19; (e) equação 3.4.20.
Parâmetros: v = 4000m/s (vH = 2000m/s), ∆x = 5m, ∆y = 5m, zB = 100m e
∆t = 2ms. Para facilitar a visualização, o traço a teve sua amplitude multiplicada
por uma constante.

Observe-se, na equação 3.4.18, que o valor da pressão no ponto B pode ser interpretado
como o resultado do fluxo do sinal, através da superfı́cie de registro, de acordo com a taxa
−∂p/∂t. Ou seja, trata-se de um fluxo reverso no tempo, como se a onda se propagasse
no sentido do ponto onde foi gerada.

Ainda de acordo com a mesma linha de raciocı́nio empregada no item 2.2, deve-se
incluir o fator de obliqüidade, cos α, onde α é o ângulo que o raio faz com o eixo vertical.
Com base no princı́pio da reciprocidade, esta operação equivale a projetar o produto
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 353

∆x∆y sobre a frente de onda. Desta forma, obtém-se:


XX 
1 ∂
 
1
p(xB , yB , zB , t) = − 2π cos α p(x, y, z = 0, t + τ ) ∆x∆y (3.4.19)
y x
vR ∂t

Por fim, ainda mantendo a seqüência de raciocı́nio empregada no item 2.2, pode-se
obter a forma final desejada, a qual inclui uma compensação para a derivada de cos α
com relação ao tempo, aplicada de forma implı́cita na equação 3.4.19. O resultado é:
XX 
1 1 ∂
 
1
p(xB , yB , zB , t) = 2π cos α 2
− p(x, y, z = 0, t + τ ) ∆x∆y
y x
R vR ∂t
(3.4.20)
Nas figuras 3.27c, 3.27d e 3.27e, vêem-se os resultados da aplicação das equações
3.4.18, 3.4.19 e 3.4.20 ao problema da reflexão horizontal. É possı́vel observar o efeito da
introdução do fator de obliqüidade na Figura 3.27d, o qual gerou uma pequena distorção
nas amplitudes situadas nos tempos imediatamente inferiores a t = 0, distorção esta que
a equação 3.4.20 remove. O resultado final do processo é um evento isolado, no tempo
t = 0, de acordo com o que foi dito anteriormente. Observe-se que, ainda por analogia
com a discussão conduzida no item 2.2, pode-se também obter uma equação equivalente
à expressão 2.2.29, aplicável à propagação inversa.

3.4.4 Migração por soma de difrações


Ver-se-á, no item 3.5, que os conceitos necessários para a dedução da equação 3.4.20 são
suficientes para a aplicação da migração por soma de difrações. Para isto, deve-se observar
que a extrapolação inversa, conduzida com a mesma equação, leva a dados equivalentes
aos que seriam registrados na profundidade escolhida, no caso igual a zB . Ou seja, após a
extrapolação, as fontes e geofones hipotéticos passam a estar situados exatamente sobre
os refletores cuja profundidade é zB . Conseqüentemente, as amostras situadas no tempo
t = 0 do resultado estão corretamente migradas, uma vez que os refletores “explodem”
neste mesmo tempo.
Após a extrapolação inversa, o passo seguinte do processo é o de posicionar o resultado
na seção migrada desejada. Na migração por soma de difrações, esta tarefa implica
deslocar cada uma das amostras obtidas através da extrapolação, situadas no tempo
t = 0, para o tempo correspondente ao ápice da difração relacionada a ela.
A mesma seqüência de operações, extrapolação inversa e posicionamento na seção
migrada, deve ser executada em todos os possı́veis difratores presentes nos dados. O re-
sultado é a seção migrada. Em termos matemáticos, esta descrição corresponde a trans-
formar a equação 3.4.19 na seguinte expressão, que combina as etapas de extrapolação
inversa e posicionamento do resultado no volume migrado — a chamada migração por
soma de difrações:
XX  
1

1 0
m(x0 , y0 , τ0 ) = − 2π cos α p (x, y, z = 0, t = τ ) ∆x∆y (3.4.21)
y x
vR

onde m(x0 , y0 , τ0 ) é a amostra migrada e p0 identifica a derivada dos dados sı́smicos


originais com relação ao tempo. Por sua vez, a distância R e o tempo τ , medidos entre
354 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

o difrator e cada ponto de registro, na superfı́cie, se relacionam através da seguinte


igualdade: p
R = vτ = (x − x0 )2 + (y − y0 )2 + (vτ0 )2 (3.4.22)
Por fim, o fator cos α é dado por
vτ0
cos α = (3.4.23)
R
De acordo com a equação 3.4.21, a igualdade t = τ significa a seleção da amostra
que, no volume p0 (x, y, z = 0, t), situa-se no tempo igual a τ , tempo este referente a uma
posição qualquer de uma difração hipotética. O resultado, após a adequada ponderação, é
deslocado para as coordenadas correspondentes ao ápice da difração escolhida, (x 0 , y0 , τ0 ),
onde é somado ao obtido com as demais amostras da mesma difração. Uma vez que o
meio é homogêneo e isotrópico e a seção migrada é representada em função do tempo, as
mesmas coordenadas definem também a posição do difrator. Esta é uma caracterı́stica da
migração em tempo, cujas deficiências serão discutidas adiante. Aplicando-se a mesma
equação a todos os valores possı́veis de x0 , y0 e τ0 , obtém-se uma aproximação do volume
de dados migrados, apresentados em função do tempo.
A migração por soma de difrações, também denominada migração Kirchhoff em
tempo, pode ser executada através da seguinte seqüência de operações, baseada na
equação 3.4.21 e aplicável a um volume sı́smico tridimensional:

1. Todos os traços sı́smicos dos dados a migrar são derivados com relação ao tempo.

2. Escolhe-se uma posição nas coordenadas hipotéticas (x0 , y0 , τ0 ). Assume-se que


a mesma posição corresponda, no volume de dados migrados, a um difrator e, no
volume de dados originais, ao ápice da difração a ele associada. Esta é uma premissa
básica da migração por soma de difrações.

3. Calcula-se o tempo de trajeto, τ , entre o difrator escolhido e cada ponto da superfı́cie


onde a difração correspondente poderia estar presente no volume de dados originais.
Este tempo é estimado através da razão R/v, onde R é dado pela equação 3.4.22.
Observe-se que a velocidade a usar é metade da correta e que o maior valor possı́vel
de R é função do ângulo de migração, ou da abertura do operador de migração,
aplicada no processo.

4. Em cada uma das posições definidas pela curva tempo-distância obtida, ou seja, nos
tempos τ dos diversos traços sı́smicos do volume de dados originais, a amplitude é
extraı́da e multiplicada pelo fator W3D , o qual é dado por
cos α
W3D = − ∆x∆y
2πvR
onde cos α = z/R e R = vτ .

5. Somam-se todas as amplitudes corrigidas na etapa 4 e posiciona-se o resultado nas


coordenadas (x0 , y0 , τ0 ) do volume de dados migrados.

6. Repetem-se as etapas 2 a 5, para todas as amostras de todos os traços do volume


de dados migrados.
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 355

Como resultado do processo de soma envolvido na migração, as amplitudes resultan-


tes são bem maiores nas posições correspondentes a eventos válidos, em comparação com
outras posições da matriz definida pela seção sı́smica migrada. Adicionalmente, difrações
presentes na seção original são colapsadas, ou seja, são reduzidas a amplitudes aproxima-
damente pontuais. A Figura 3.26 é um excelente exemplo de como o processo funciona,
com destaque para o fato de que as reflexões horizontais não são alteradas, tanto no que
diz respeito à fase quanto à amplitude.
A qualidade do campo de velocidades é um fator fundamental para o sucesso da
migração. Esta é uma idéia que pode ser bem ilustrada através da comparação entre
dois eventos, ambos obtidos em um mesmo meio homogêneo e isotrópico e associados a
uma mesma profundidade: (a) uma difração em uma seção sı́smica empilhada e; (b) uma
reflexão horizontal em um agrupamento CMP, antes da correção de NMO. Analisando-
se aspectos puramente cinemáticos dos dois eventos, é fácil concluir que ambos devem
apresentar a mesma geometria. Eventuais diferenças de caráter cinemático seriam geradas
em função do máximo afastamento entre a fonte e o receptor, no caso da reflexão, e da
máxima distância horizontal entre o difrator e cada traço sı́smico da seção empilhada, no
caso da difração30 .
Sabe-se que, no processamento dos dois eventos citados, o objetivo básico é o de fazer
uma soma em fase. Ou seja, tudo se passa como se a correta correção de NMO fizesse
parte tanto da migração de uma difração quanto do empilhamento de uma reflexão. Com
base nesta comparação simples, pode-se obter uma importante conclusão: as distorções de
caráter cinemático, que afetam o empilhamento dos traços sı́smicos de um agrupamento
CMP, influenciam de forma similar a migração. Por outro lado, pode-se também induzir
que, no caso de um meio em que a velocidade varia somente na direção vertical, é possı́vel
usar a velocidade de empilhamento, isenta do efeito do mergulho, para representar a
velocidade de migração.

3.4.5 Migração em tempo versus profundidade


Na forma descrita até aqui, a migração pode ser dividida em dois processos. O primeiro
— a focalização — consiste em somar amplitudes ao longo da geometria das difrações
registradas, aplicando-se a cada uma das amostras, antes da soma, o fator de correção
adequado. O segundo processo — o posicionamento — consiste em posicionar o resultado
da focalização nas coordenadas do difrator, na seção migrada. Ver-se-á em seguida que,
na migração em tempo, aplicada ao caso de um meio complexo, os dois processos são
conduzidos de forma aproximada. As aproximações empregadas estão relacionadas com
as seguintes e importantes questões: (1) uma curva tempo-distância de forma hiperbólica
permite focalizar bem uma difração em qualquer tipo de meio? e; (2) o ápice da mesma
curva corresponde realmente à posição do difrator?
Considere-se inicialmente a resposta à segunda pergunta. No caso da coordenada ver-
tical do difrator, o resultado da migração em tempo é, em princı́pio, inadequado, já que
não é representado em função da profundidade. No que diz respeito às coordenadas hori-
zontais, o tema torna-se um pouco mais complexo, como pode ser demonstrado com base
no modelo da Figura 3.28. Vê-se, na figura, a representação sı́smica, em profundidade,
30
No que diz respeito às formas de onda, observam-se importantes diferenças de fase e amplitude (ver
a Figura 2.20, na página 101).
356 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.28: Representação sı́smica, em profundidade, de um modelo geológico


caracterizado por duas camadas com velocidades diferentes, separadas por uma in-
terface mergulhante, juntamente com um raio imagem gerado no limite superior
esquerdo do bloco alto de uma falha. A coordenada horizontal é dada em metros
e as velocidades são as corretas, ou seja, não se baseiam no modelo do refletor
explosivo.

de um modelo geológico relativamente simples, mas caracterizado por uma grande mu-
dança de velocidade na interface inclinada, mudança esta que torna complexa a resposta
sı́smica correspondente. Na parte central da figura, o ângulo de mergulho da interface
superior é de 15 graus, enquanto a falha, na base da segunda camada, apresenta plano
com ângulo de mergulho de 45 graus.
Na Figura 3.29, pode-se ver a resposta sı́smica bidimensional não migrada, corres-
pondente ao modelo da Figura 3.28. Observe-se, na figura, que a geometria da interface
inferior é bastante deformada e que as feições geradas em função da falha aparecem clara-
mente deslocadas para a esquerda, na direção em que a velocidade média de propagação
é maior. Este efeito, associado à lei de Snell, é também responsável pela geometria do
raio imagem representado na Figura 3.28, o qual, por definição, atinge a superfı́cie na
direção vertical e que, por esta razão, pode ser usado para caracterizar o trajeto entre
um difrator e a posição em que se observa o ápice da correspondente difração. Conclui-se
portanto, com base no mesmo raio imagem, que a difração gerada no limite esquerdo do
bloco alto da falha teria seu ápice observado, na superfı́cie, a cerca de um quilômetro à
esquerda da posição do difrator. Esta previsão pode ser constatada através da Figura
3.30, na qual se pode ver o resultado da sintetização da difração citada.
Conclui-se, assim, que, em um meio complexo, as coordenadas do ápice da curva
tempo-distância correspondente a uma difração podem não representar a posição do di-
frator correspondente. No que diz respeito à focalização do sinal, sabe-se que, se o meio
fosse homogêneo e isotrópico, as curvas tempo-distância real e estimada com base na
equação 3.4.13 seriam coincidentes, o que permitiria, à migração em tempo, focalizar
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 357

Figura 3.29: Resposta sı́smica bidimensional em tempo ao modelo da Figura


3.28, baseada no modelo do refletor explosivo. O pulso sı́smico usado foi um filtro
passa-banda (8-40Hz).

bem as difrações. No caso de um meio razoavelmente complexo, como o representado na


Figura 3.28, a curva tempo-distância real se afasta substancialmente de uma hipérbole,
em função do papel da lei de Snell, como ilustrado no exemplo da Figura 3.30. Nestas
condições, pode-se dizer que, em um meio com variação lateral e vertical de velocidade,
a curva tempo-distância descrita com base em uma única velocidade de migração não
descreve adequadamente a realidade.
A Figura 3.31, que corresponde ao resultado da migração convencional em tempo dos
dados sintéticos da Figura 3.29, pode ser usada como exemplo de como as distorções
descritas afetam a migração em tempo. No processo, as curvas tempo-distância das
difrações foram obtidas com base nas velocidades RMS estimadas nas posições dos ápices
correspondentes e levando em conta o trajeto do raio imagem. Observe-se, na figura, que
a imagem da interface inferior é mal resolvida e que, principalmente, o plano da falha
aparece deformado e deslocado para a esquerda, em relação à posição real.
O resultado da Figura 3.31 sugere duas providências. Em primeiro lugar, deve-se
obter uma curva tempo-distância mais adequada à geometria de cada difração, o que
permitiria uma focalização bem-sucedida. Esta condição — apenas parcialmente atendida
na geração da Figura 3.31 — permite definir a atuação ideal da migração em tempo:
resultado da focalização perfeito, mas posicionado nas coordenadas do ápice da difração,
em vez das coordenadas reais do difrator.
A deficiência principal desse novo processo consiste, obviamente, no posicionamento
inadequado dos difratores, como se pode perceber na Figura 3.32, na qual se vê a des-
crição geométrica do resultado da aplicação, na forma ideal, de dois processos: (V ), a
migração em profundidade seguida da conversão para tempo com base no raio vertical e
(I), a migração em tempo. Digno de nota é o fato de que, no caso do refletor profundo,
358 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.30: Difração correspondente ao difrator situado no limite do bloco alto


da falha representada na Figura 3.28. A coordenada horizontal do difrator é 5400m.

Figura 3.31: Migração em tempo do modelo sintético da Figura 3.29, usando-se


velocidades RMS para o cálculo das curvas tempo-distância.

os dois resultados são substancialmente diferentes, com destaque para o deslocamento, no


sentido de onde a velocidade média é maior, introduzido pela migração em tempo. Em
função desta análise, o leitor poderá concluir que migrar uma seção em tempo e convertê-
la para profundidade não é a mesma coisa que migrar a mesma seção em profundidade,
ainda que a migração em tempo resulte em uma focalização perfeita. Isto somente ocor-
reria se a velocidade não variasse lateralmente, como ocorre com o refletor mais raso da
Figura 3.32.
O leitor atento poderá ser levado a uma importante pergunta: para a determinação
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 359

V
0.5
I
Tempo (s)

1.0 V

I
1.5

2.0
2000 3000 4000 5000 6000 7000 8000
Figura 3.32: Representação geométrica esperada para a migração em tempo, I,
e para a migração em profundidade seguida de conversão para tempo com base no
raio vertical, V , ambas referentes ao modelo da Figura 3.28.

da geometria correta de uma difração, não seria necessário conhecer a posição real do
difrator? No caso afirmativo, poder-se-ia ainda perguntar por que não modificar a mi-
gração de tal forma que o resultado da focalização seja posicionado não nas coordenadas
do ápice da difração mas nas próprias coordenadas do difrator. Esta linha de raciocı́nio
leva à definição da atuação ideal da migração em profundidade: resultado da focalização
perfeito, posicionado nas coordenadas reais do difrator, em vez das coordenadas do ápice
da difração. No caso dos dados da Figura 3.29, o resultado ideal desse processo seria
similar ao modelo da Figura 3.28, a menos da diferença no conteúdo de freqüências espa-
ciais entre os dois refletores — maior no caso do refletor raso —, o que se deve à diferença
nas velocidades intervalares envolvidas.

Uma análise um pouco mais cuidadosa de todos os aspectos desta discussão pode levar
a uma importante conclusão: na migração, a geometria da difração deve ser obtida com
base na distribuição das velocidades do próprio resultado desejado e não na dos dados
originais. Ou seja, para se obter a curva tempo-distância correta, é necessário saber,
ainda que de forma aproximada, como as camadas e suas velocidades intervalares estão
distribuı́das no espaço. Esta condição é a razão principal pela qual as velocidades de
migração são normalmente estimadas com base em processos do tipo tentativa-e-erro,
através das chamadas análises de velocidade de migração. No caso de dados sı́smicos
não empilhados, é possı́vel algum nı́vel de automação do processo, particularmente nas
regiões onde a qualidade é satisfatória (ver o item 3.6).
360 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.33: Geometria da forma inversa do


princı́pio de Huygens, aplicada ao problema da pedra
na lagoa.

3.4.6 Introdução à migração recursiva


Sabe-se que, de acordo com o princı́pio de Huygens, a migração pode ser vista como
um processo de localização de difratores. Sabe-se também que a aplicação rigorosa do
princı́pio de Huygens é recursiva, ou seja, cada ponto da frente de onda em um dado
tempo t é considerado como uma fonte pontual para a geração de uma nova frente de
onda no tempo t + ∆t, onde ∆t é um deslocamento infinitesimal de tempo. Combinando-
se as duas idéias, pode-se transformar a migração em um processo recursivo, através do
qual se localiza a frente de onda no tempo t − ∆t, a partir da frente de onda estimada no
tempo t. A continuidade desse processo leva a um encolhimento progressivo da frente de
onda, na direção do ponto que efetivamente gerou o evento, onde o tempo é igual a zero.
Para entender o que representa o processo descrito, pode-se fazer uma analogia com
uma pedra atirada em uma lagoa, a qual gera uma onda que se propaga na forma de
um cı́rculo que se expande. Suponha-se que se disponha de uma fotografia da frente de
onda correspondente, obtida em um tempo t0 após o instante em que a pedra foi atirada
(t = 0). Imagine-se agora que se deseja estimar qual foi a posição em que a pedra caiu,
a partir da fotografia obtida e do valor da velocidade de propagação da onda gerada, v,
supostamente conhecido.
A primeira etapa do processo consiste em traçar pequenos semicı́rculos de raio igual a
v∆t, centrados em cada ponto da frente de onda fotografada e voltados para o interior do
cı́rculo correspondente, na forma da Figura 3.33. De acordo com o princı́pio de Huygens,
a tangente a esses semicı́rculos dá origem à frente de onda no tempo t0 − ∆t, a qual é
usada para se estimar, da mesma forma, a frente de onda no tempo t0 − 2∆t. A repetição
do processo descrito, até que o tempo da frente de onda obtida equivalha a zero (ou até
que n∆t = t0 , sendo n o número de etapas), reduz a frente de onda a um ponto isolado,
que corresponde à posição em que a pedra caiu.
Cada etapa da recursão, na solução do problema da pedra na lagoa, corresponde a
uma versão geométrica da extrapolação inversa, nome este devido ao fato de se estar
depropagando o sinal obtido. Por sua vez, a tarefa final do processo, que corresponde
à determinação da posição em que a pedra caiu, ou, de uma forma mais genérica, à
determinação da posição em que a onda depropagada encontra a fonte correspondente,
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 361

é a versão geométrica do imageamento (imaging, em inglês). O processo descrito, que


envolve extrapolação inversa e imageamento, é a versão geométrica da migração recursiva.
O problema da pedra na lagoa apresenta uma particularidade importante, já que a
imagem inicial da frente de onda foi obtida no domı́nio do espaço, em um tempo cons-
tante. Nestas condições, para um meio homogêneo e isotrópico, a imagem da frente de
onda é circular. Esta é uma situação diversa da observada na aquisição de uma seção
sı́smica, a qual implica amostragem em uma profundidade constante (ou aproximada-
mente constante), durante um determinado intervalo de tempo. Assim, em um meio
homogêneo e isotrópico, uma eventual frente de onda circular, como a criada pela pedra,
seria vista como uma hipérbole, em vez de um cı́rculo.
Estas condições sugerem o estabelecimento de um processo de extrapolação inversa
correspondente ao aprofundamento sucessivo da profundidade de registro. Ou seja, parte-
se da profundidade de registro real (exemplo: z = 0), e criam-se superfı́cies de registro
virtuais, cada uma delas obtida a partir da anterior, com base no princı́pio de Huygens,
as duas separadas entre si de acordo com um intervalo de profundidade ∆z. No caso de
ondas ascendentes, tudo se passa como se um observador fictı́cio, vendo ondas avançando
em sua direção, caminhasse no sentido dos pontos em que as ondas são geradas.
Aplicada à migração recursiva, a extrapolação inversa é aplicada em cascatas, de
acordo com um pequeno intervalo de profundidade. Cada etapa do processo pode ser
descrita, em termos geométricos, com base na discussão conduzida no item 2.2 e, em
particular, na Figura 2.24 (página 112). Ao final do processo, ou seja, de todas as
etapas da recursão que levam a um evento corretamente migrado, o deslocamento total
na distância horizontal e no tempo, sofridos por ele, são dados, no caso bidimensional,
por X
∆X = xM − x0 = − ∆z tan θn (3.4.24)
n
e
X ∆z
∆T = −t0 = − (3.4.25)
n
vn cos θn
onde ∆z é um número positivo que define o intervalo de profundidade, n é o ı́ndice
que identifica a etapa da recursão, t0 e x0 são as coordenadas do evento nos dados não
migrados e o ı́ndice M indica os dados migrados. Por sua vez, o ângulo θ é definido, em
função da vagarosidade local do evento, através da seguinte expressão:
 
−1 −1 dt
θ = sen (vp) = sen v
dx

onde dt/dx e v são a vagarosidade e a velocidade locais. Observe-se que estas grandezas
devem ser compatı́veis, ou seja, se o tempo t for duplo, a velocidade v deve ser metade
da correta.
As expressões 3.4.24 e 3.4.25 apresentam algumas particularidades importantes. Em
primeiro lugar, observa-se que o módulo do deslocamento de tempo ∆T é igual ao tempo
de registro, o que caracteriza a chamada condição de imagem, ou seja, o refletor “explode”
no tempo t = 0. Além disso, como o valor de θ deve ser recalculado em cada etapa n, com
a velocidade v local, criam-se condições para o raio se defletir, sempre que a velocidade
mudar. Por fim, deve-se ressaltar que o sinal negativo na expressão 3.4.24 é incluı́do
362 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

para que, se a tangente de θ for positiva, o deslocamento horizontal tenha sinal negativo.
Esta condição é necessária porque a migração encolhe as difrações, o que leva a uma
redução da coordenada horizontal quando o ângulo θ é positivo e a um aumento na
mesma coordenada quando θ é negativo (ver a Figura 2.24, na página 112).
Com base na discussão apresentada no subitem 2.2.5, sabe-se que as expressões 3.4.24
e 3.4.25 podem ser facilmente aplicadas no domı́nio ω-Kx . Para apresentar o conceito,
suponha-se que se conheça a transformada bidimensional de Fourier, P̃ (x, z, ω), corres-
pondente a uma seção sı́smica obtida em uma profundidade hipotética, z. Neste caso, a
aplicação dos deslocamentos de tempo e distância — associados ao aprofundamento da
superfı́cie de “registro” para a profundidade z + ∆z — corresponde à seguinte igualdade:
 
∆z
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp (iKx ∆z tan θ) exp −iω
v cos θ
Sabendo-se que Kx = (ω/v) sen θ, pode-se alterar este resultado para
 ω 
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp −i ∆z cos θ (3.4.26)
v
Deve-se ressaltar que este algoritmo, embora facilite o entendimento da migração recur-
siva, apresenta uma importante deficiência: não admite variação lateral na velocidade.
Inicia-se a migração tridimensional recursiva em profundidade com os dados regis-
trados na superfı́cie (z = 0), como na migração sem recursão. Os dados são então
inversamente extrapolados até um nı́vel situado na profundidade ∆z. Como resultado,
obtêm-se dados sı́smicos corretamente migrados no tempo t = 0 do novo volume de dados
(“registrado” na profundidade ∆z), enquanto o restante do volume corresponde a dados
ainda não migrados. Armazenam-se os dados migrados (imageamento) e extrapolam-se
os dados “registrados” na profundidade ∆z até um novo nı́vel, situado a uma distância
∆z abaixo do primeiro, ou seja, até a profundidade igual a 2∆z (extrapolação inversa).
Como antes, os dados situados no tempo t = 0 do novo volume obtido estão correta-
mente migrados e podem ser armazenados na matriz de dados migrados (imageamento),
enquanto os demais dados devem ser extrapolados outra vez, até um nı́vel inferior (ex-
trapolação inversa). A continuação desse processo até o final do volume original gera os
dados migrados.
O entendimento global do processo descrito pode ser melhorado com o recurso a
modelos bidimensionais relativamente simples, como o da Figura 3.34, a qual inclui duas
difrações sintéticas, submetidas à migração e à extrapolação inversa. Na parte superior
da Figura 3.34, podem ser vistas as duas difrações, com ápices nos tempos t = t1 e
t = t2 , sendo t2 > t1 . No centro, pode-se ver o resultado ideal da migração das duas
difrações. Observe-se que ambas as formas hiperbólicas originais reduziram-se a formas
de onda aproximadamente pontuais, tı́picas de difratores filtrados. Na parte inferior da
figura, vê-se o resultado da extrapolação inversa, dos dados registrados na superfı́cie, até
a profundidade do difrator superior, ou seja, z = vt1 , onde v é a metade da velocidade
correta. Neste caso, a difração superior foi colapsada no tempo t = 0, enquanto a difração
inferior teve sua forma alterada para uma hipérbole menor e com flancos mais ı́ngremes.

Pode-se observar, na Figura 3.34, que os dados extrapolados apresentam, no tempo


t = 0, o mesmo resultado dos dados migrados, no tempo t = t1 . Com base na equação
3.4. O PRINCÍPIO DE HUYGENS E A MIGRAÇÃO 363

0.1

0.2

0.3

0.4

0.1
Tempo (s)

0.2

0.3

0.4

0.1

0.2

0.3

0.4
−400 −200 0 200 400
Distância (m)
Figura 3.34: Migração versus extrapolação inversa em duas di-
mensões: (a) duas difrações isoladas, no alto; (b) migração em tempo
das duas difrações, no centro, e; (c) extrapolação inversa até a profun-
didade do difrator superior, embaixo. A velocidade do meio é 2000m/s
e os resultados foram filtrados (8-40Hz).

3.4.21 e na discussão anterior, pode-se dizer que

m(x, y, t = t1 ) = p(x, y, z = vt1 , t = 0)

Induz-se facilmente que, para migrar a difração mais profunda, é necessário extrapolar o
campo de ondas para a profundidade z = vt2 . Nos dois casos, a extração das amplitudes
no tempo t = 0 caracteriza o imageamento. A mesma linha de raciocı́nio pode ser
generalizada para diversos difratores e diversas profundidades diferentes, seguindo-se uma
364 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.35: Fluxogramas das versões recursivas da modelagem (esquerda)


e da migração sı́smicas.

seqüência de etapas de extrapolação e imageamento, a qual será melhor discutida no item


3.5.
Neste ponto, é interessante comparar as versões recursivas dos processos de migração
e modelagem baseados no modelo do refletor explosivo. Na Figura 3.35, pode-se ver
uma simplificação dos dois fluxogramas correspondentes. Observe-se o significado das
amostras situadas no tempo t = 0, nos dois casos: na modelagem, os coeficientes de
reflexão do modelo geológico são acrescentados no tempo t = 0 do modelo sı́smico, o que
equivale à introdução de uma fonte; na migração, os dados situados no tempo t = 0 são
considerados migrados.
Não seria exagero reforçar aqui o que se ganha com as formas recursivas da modelagem
e da migração. Para ilustrar o caso da migração, suponha-se, inicialmente, um meio que
apresenta variação puramente vertical na velocidade, no qual foi registrada uma difração
isolada. Por causa das propriedades do meio, a curva tempo-distância, correspondente
à difração, é deformada e se afasta de uma hipérbole perfeita. Aplicando-se, ao caso,
a migração recursiva, a lei de Snell seria respeitada e a estimativa da frente de onda se
aproximaria da verdadeira. Até mesmo formas simples de extrapolação recursiva, como
a descrita pela expressão 3.4.26, seria capaz de tratar adequadamente este problema.
Situação pior ocorre na presença de variação lateral na velocidade. Por causa das
propriedades desse tipo de meio, a curva tempo-distância correspondente a uma difração
isolada é assimétrica, em vez de perfeitamente hiperbólica (ver o exemplo da Figura 3.30,
na página 358). Sabe-se que a migração não recursiva de um evento com esta caracterı́stica
implicaria a determinação de algum tipo de velocidade média, que possibilitasse uma boa
representação da curva tempo-distância correta. Na migração recursiva, este problema
seria minimizado se fossem utilizados algoritmos de extrapolação mais sofisticados do que
o descrito pela expressão 3.4.26. Este tema será aprofundado no próximo item.
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 365

3.5 Algoritmos de Migração


Os algoritmos de migração de dados sı́smicos mais utilizados, em especial no caso de
seções ou volumes empilhados, são de uma forma ou de outra relacionados com uma
das três famı́lias seguintes: (1) a integral de Kirchhoff (Schneider, 1978); (2) as técnicas
espectrais, como a do deslocamento de fase (Gazdag, 1978), ou a de Stolt (1978); (3)
as técnicas de diferenças finitas, grande parte delas resultantes de evoluções do trabalho
pioneiro de Claerbout (1970). Discutem-se em seguida os fundamentos das três famı́lias,
sendo que, na terceira delas, restringiu-se a análise ao algoritmo implı́cito e à migração
de tempo reverso (RTM, ou Reverse-Time Migration).

3.5.1 Migração Kirchhoff


Os conceitos envolvidos na integral de Kirchhoff apresentam uma gama de aplicações
muito ampla, particularmente no que diz respeito ao entendimento intuitivo da propaga-
ção de ondas. Outra particularidade da integral de Kirchhoff é a sua grande versatilidade
na abordagem de problemas especı́ficos, ao lado de alta eficiência computacional nas
aplicações mais simples, particularmente no caso da migração em tempo. É difı́cil apontar
uma deficiência que impeça a aplicação generalizada da migração Kirchhoff: existe, na
maior parte dos algoritmos da famı́lia, alguma solução para problemas que, à primeira
vista, parecem incontornáveis.

Extrapolação inversa com a integral de Rayleigh II - Versão 3-D


Viu-se, no item 2.7, que um campo de ondas ascendentes definido no domı́nio da freqüência,
P , ao incidir sobre uma superfı́cie horizontal, gera novas ondas secundárias. Estas ondas
são expressas na forma da versão causal da função de Green, as quais são responsáveis pela
geração de um novo campo de ondas, em uma profundidade menor e em um tempo maior.
Na propagação inversa, o mesmo campo ascendente, registrado na superfı́cie (z = 0), é
usado para se obter um novo campo de ondas, mas em uma profundidade maior e em
um tempo menor. Neste caso, a função de Green passa a ser anti-causal e definida pela
seguinte igualdade, a qual é aplicável a um meio homogêneo e isotrópico:

1
G∗ (x − xB , y − yB , z − zB , ω) = exp(−iωτ ) (3.5.1)
R

onde ∗ denota conjugado complexo. No domı́nio do tempo, a mesma expressão corres-


ponde a:
1
g ∗ (x − xB , y − yB , z − zB , t) = δ(t + τ ) (3.5.2)
R
onde τ = R/v, R é dado pela equação 3.4.13 e δ é a função delta de Dirac.
A função de Green definida pelas equações 3.5.1 e 3.5.2 descreve uma forma de onda
com amplitude proporcional a 1/R, nos pontos em que R = vτ , o que inclui o espalha-
mento geométrico da energia. Nas demais posições do espaço, a amplitude é igual a zero.
A geometria correspondente é a de uma forma esferoidal, de raio igual a vτ , encolhendo-se
no espaço, à medida em que o tempo é reduzido.
366 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Na aplicação da integral de Kirchhoff à extrapolação inversa, deve-se substituir a


função de Green da expressão 2.4.54 pela da expressão 3.5.1. Deve-se também substituir
o modelo da Figura 2.56 (página 202) pelo da Figura 3.36. Com base neste modelo,
procura-se avaliar o campo de ondas no ponto B a partir de medidas feitas na superfı́cie
S2 . Para isto, opta-se freqüentemente por um dos seguintes enfoques, o segundo dos
quais, de acordo com Weglein e Stolt (1990), pode ser considerado mais correto:

1. Consideram-se as superfı́cies S1 , S3 e S4 tão afastadas do ponto B quanto necessário


para que as suas contribuições tornem-se desprezı́veis.

2. Como o campo P é puramente ascendente na superfı́cie S2 e a função de Green é


anti-causal, ou seja, implica recuo no tempo, a superfı́cie S1 não contribui para a
observação no ponto B. Por sua vez, as superfı́cies S3 e S4 podem ser consideradas
afastadas o suficiente para que sua contribuição seja desprezada.

Uma vez que a superfı́cie de registro é considerada horizontal, pode-se reduzir a in-
tegral de Kirchhoff, na forma da equação 2.7.33, à integral de Rayleigh II aplicada à
extrapolação inversa. O resultado é equivalente ao negativo31 da expressão 2.7.46, ou
seja,
Z Z  
1 ∂G∗
P (xB , yB , zB , ω) = 2π P dxdy (3.5.3)
∂z
Ly Lx

onde, no caso da Figura 3.36, ∂G∗ /∂z é avaliada na superfı́cie (z = 0), a função de Green
G∗ é dada pela equação 3.5.1 e, no núcleo da integral, P = P (x, y, z = 0, ω).
A equação 3.5.3, aplicada às condições da Figura 3.36, pode ser modificada de forma
a facilitar o entendimento da extrapolação inversa. Para isto, parte-se da seguinte ex-
pressão:
∂G∗ ∂G∗ ∂τ
=
∂z ∂τ ∂z
onde τ = R/v. No caso de ∂G∗ /∂τ , o resultado é:
 
∂G∗ v iω
=− 2
+ exp(−iωτ )
∂τ R R

Por outro lado, sabe-se que ∂τ /∂z = − cos α/v, ou seja, um aumento na profundidade de
registro (no caso, z = 0) leva a uma redução no tempo de propagação correspondente, τ .
Pode-se, assim, obter a seguinte forma para a derivada da função de Green com relação
à profundidade:  
∂G∗ 1 iω
= cos α + exp(−iωτ ) (3.5.4)
∂z R2 vR
onde cos α é dado por
|zB − z|
cos α = (3.5.5)
R
31
A este respeito, o leitor deve estar atento para o sentido do vetor ~n, na Figura 3.36.
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 367

n SUPERFÍCIE x
S2

r
S3 B S4

S1
z
Figura 3.36: Modelo para aplicação da integral de Kir-
chhoff à extrapolação inversa.

Substituindo-se a equação 3.5.4 na expressão 3.5.3, obtém-se o seguinte resultado:


Z Z    
1 1 iω
P (xB , yB , zB , ω) = 2π cos α + exp(−iωτ )P (x, y, z = 0, ω) dxdy
R2 vR
Ly Lx
(3.5.6)

Uma comparação entre os algoritmos de extrapolação direta e inversa, na forma das


equações 2.7.49 e 3.5.6, permite concluir que esta última corresponde ao conjugado com-
plexo da primeira, o que se deve à anti-causalidade do processo, ou seja, ao avanço na
direção dos tempos menores, implı́cito na equação 3.5.1. Como se verá adiante, a mesma
troca de sinal ocorre nos demais algoritmos de extrapolação.
A transformada inversa de Fourier da expressão 3.5.6 pode ser facilmente obtida,
aplicando-se os teoremas da derivada e do deslocamento, os quais são descritos, no caso,
por

− ⇔ iω
∂t
e
p(x, y, z = 0, t + τ ) ⇔ P (x, y, z = 0, ω) exp(−iωτ )
As substituições apropriadas levam à seguinte versão da integral de Rayleigh II:
Z Z    
1 1 1 ∂
p(xB , yB , zB , t) = 2π cos α − p(x, y, z = 0, t + τ ) dxdy (3.5.7)
R2 vR ∂t
Ly Lx

Como na equação 3.4.20, o termo t + τ indica que a amostra deve ter seu tempo reduzido
de acordo com o intervalo τ = R/v, para a avaliação numérica da integral.
Nas situações em que ωτ >> 1, é comum desprezar-se o termo de campo próximo da
equação 3.5.7, o que leva à seguinte versão da integral de Rayleigh II:
Z Z    
1 1 ∂
p(xB , yB , zB , t) = − 2π cos α p(x, y, z = 0, t + τ ) dxdy (3.5.8)
vR ∂t
Ly Lx
368 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

ou, na versão discreta,


XX 
1 ∂
 
1
p(xB , yB , zB , t) = − 2π cos α p(x, y, z = 0, t + τ ) ∆x∆y (3.5.9)
y x
vR ∂t

Observe-se que, ainda de acordo com a premissa segundo a qual ωτ >> 1 , o operador
∂/∂t poderia ser transferido para fora da integral, ou para fora do somatório. Isto é
possı́vel porque os dados resultantes da extrapolação inversa ainda são definidos em função
do tempo. Por outro lado, deve-se ressaltar que, onde esta aproximação não se aplica,
deve-se utilizar a versão discreta da expressão 3.5.7.

Extrapolação inversa com a integral de Rayleigh II - Versão 2-D


Como se viu anteriormente, a função de Green usada na extrapolação inversa é o conju-
gado complexo da função de Green usada na extrapolação direta. Aplicando-se o mesmo
conceito ao caso 2-D, pode-se demonstrar que a correspondente integral de Rayleigh II é
dada por
Z
1 n cos α h (2)
i o
P (xB , zB , ω) = − iωH1 (ωτ ) P (x, z = 0, ω) dx (3.5.10)
2 v
Lx

onde P (x, z = 0, ω) é a transformada de Fourier da seção registrada,


p
R = vτ = (x − xB )2 + (z − zB )2 (3.5.11)
e
|z − zB |
cos α = (3.5.12)
R
(2)
Por sua vez, H1 é a função de Hankel de segundo tipo e primeira ordem, definida, no
caso, por
(2)
H1 (ωτ ) = J1 (ωτ ) − iY1 (ωτ ) (3.5.13)
onde J1 e Y1 são funções de Bessel.
(2)
Nas situações em que o produto ωτ é muito maior do que 1, a função de Hankel H 1
reduz-se a uma expressão relativamente simples (ver Press et al., 1986; Wylie, 1975), dada
por r  
(2) 2v 3π
H1 (ωτ ) = exp i − iωτ (3.5.14)
πωR 4
Aplicando-se este resultado à equação 3.5.10, obtém-se a seguinte versão da integral de
Rayleigh II:
Z  r  π  
ω
P (xB , zB , ω) = cos α exp i − iωτ P (x, z = 0, ω) dx (3.5.15)
2πvR 4
Lx

ou, no caso discreto,


X r  π  
ω
P (xB , zB , ω) = cos α exp i − iωτ P (x, z = 0, ω) ∆x (3.5.16)
x
2πvR 4
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 369

No domı́nio tempo-distância, a expressão 3.5.16 pode ser reescrita da seguinte forma:


X  cos α 
p(xB , zB , t) = √ pd (x, z = 0, t + τ ) ∆x (3.5.17)
x 2πvR

onde p(xB , zB , t) representa um traço sı́smico inversamente extrapolado e pd é o resultado


da convolução entre os dados sı́smicos originais e o operador d∗t , o qual corresponde, no
domı́nio da freqüência, ao conjugado complexo da expressão 2.7.62, ou seja,
p  π
d∗t ⇔ |ω| exp i (3.5.18)
4
Em termos matemáticos, pd = d∗t ∗ p, onde p representa os dados sı́smicos originais.
Observe-se que a convolução com o operador d∗t , implı́cita na equação 3.5.17, pode ser
transferida para fora do somatório por causa da premissa segundo a qual o produto ωτ é
muito maior do que 1, o que ocorre, por exemplo, quando os tempos de reflexão suplantam
100 ou 200 milésimos de segundo. Nas situações inferiores a tais limites, a própria função
de Hankel não deve ser tratada de forma aproximada, tornando recomendável a aplicação
da versão discreta da equação 3.5.10.

Migração Kirchhoff em tempo


O leitor deve ter observado que as equações 3.5.9 e 3.4.19 são iguais, assim como são
iguais as equações 3.5.7 e 3.4.20. Isto significa que a equação usada na migração por
soma de difrações e discutida no item 3.4, pode ser deduzida também a partir da integral
de Kirchhoff. Ou seja, a equação 3.4.21 corresponde realmente a uma forma simplificada
do algoritmo Kirchhoff de migração tridimensional em tempo. Resta portanto apresentar
a versão 2-D do algoritmo.
Nas mesmas condições em que a equação 3.4.21 é aplicável, ou seja, quando o produto
ωτ é substancialmente maior do que 1, a obtenção de uma amostra migrada em duas
dimensões pode ser executada com base na seguinte versão da equação 3.5.17:
X  cos α 
m(x0 , τ0 ) = √ pd (x, z = 0, t = τ ) ∆x (3.5.19)
x
2πvR

onde m(x0 , τ0 ) é a amostra sı́smica migrada e pd representa a convolução entre os dados


sı́smicos originais e o operador d∗t , definido pela expressão 3.5.18. A distância R e o tempo
τ se relacionam ao tempo vertical τ0 através da seguinte expressão:
p
R = vτ = (x0 − x)2 + (vτ0 )2 (3.5.20)

Por sua vez, o fator cos α é dado por


vτ0
cos α = (3.5.21)
R
A operacionalização da migração Kirchhoff 2-D em tempo é similar à do caso 3-D.
Em relação ao esquema apresentado no item 3.4, introduzem-se as seguintes modificações,
fundamentadas na equação 3.5.19:
370 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

1. A derivação com relação ao tempo é substituı́da pela convolução com o operador


da equação 3.5.18.

2. Calculam-se os tempos de trajeto com base na equação 3.5.20.

3. O fator W2D , pelo qual as amplitudes são multiplicadas antes da soma, é dado por
cos α
W2D = √ ∆x
2πvR

4. As amostras migradas são posicionadas nas coordenadas (x0 , τ0 ).

Com base nas equações 3.4.21 e 3.5.19, conclui-se que as formas mais simples da
migração baseada na equação da onda devem incluir, implı́cita ou explicitamente: (1)
correção de amplitude associada ao espalhamento geométrico da energia, no caso 3-D, ou
sua raiz quadrada, no caso 2-D; (2) correção de amplitude proporcional à freqüência, no
caso 3-D, e à raiz quadrada da freqüência, no caso 2-D; (3) deslocamento de fase em 90
graus, no caso 3-D, e 45 graus, no caso 2-D; (4) ponderação pelo fator de obliquidade,
representado por cos α. Isto significa que as primeiras versões da migração por soma
de difrações, que nem sempre incluı́am os pesos apropriados, apresentavam significativas
distorções de amplitude e fase, em comparação com a migração baseada na equação da
onda.
Com estes conceitos, pode-se entender a amplitude e a fase da forma de onda da
Figura 3.25 (página 348), a qual foi gerada com base na versão 2-D da integral de
Rayleigh II. Percebe-se que a fase do pulso usado na geração da figura, que era igual a
zero, foi alterada, tornando-o assimétrico, o que se deve ao deslocamento de fase igual
a 450 , introduzido pela integral de Kirchhoff. Percebe-se também que a amplitude da
forma de onda cai com o aumento do mergulho.

Migração Kirchhoff em profundidade


Nos termos da integral de Rayleigh II, a migração em profundidade sem recursão inclui a
extrapolação do sinal registrado na superfı́cie até a profundidade real do difrator, levando
em consideração a lei de Snell e o modelo de velocidades intervalares definido em função
da profundidade e das coordenadas horizontais. Ou seja, não mais se utilizam velocidades
médias para se estimar os tempos de trajeto, as quais são substituı́das por velocidades
intervalares.
Nestas circunstâncias, a função de Green deixa de ser uma expressão analı́tica, como
a 3.5.1, e passa a apresentar amplitude e fase bem mais complexas. Admitindo-se que
a freqüência do sinal seja alta e que a variação espacial da velocidade seja suave, esta
função de Green pode ser aproximada por

G∗ (x − xB , y − yB , z − zB , ω) = A exp(−iωτ ) (3.5.22)

onde z = 0, A é a amplitude e ωτ é a fase, sendo τ o tempo de percurso entre a fonte


secundária e o ponto de observação. Observe-se que, devido à complexidade do meio,
tanto A como τ não mais podem ser descritas através de expressões analı́ticas simples,
como 1/R e R/v. Isto significa que o tempo e a amplitude associados à função de Green
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 371

devem ser obtidos através de técnicas especiais, como o traçamento dos raios (ver o item
2.5).
Em situações desse tipo, as equações 3.5.7 e 3.5.8 não mais se aplicam. Ou seja,
uma nova versão da integral de Rayleigh II, ainda baseada na expressão 3.5.3, deve ser
obtida. Para isto, a primeira providência consiste em se determinar a derivada da função
de Green com relação à profundidade, através da regra da cadeia, ou seja,
∂G∗ ∂A ∂τ
= exp(−iωτ ) − iωA exp(−iωτ )
∂z ∂z ∂z
Por outro lado, já que um aumento na profundidade z leva a uma redução no tempo de
trajeto τ , pode-se escrever:
∂τ cos α
=−
∂z v
onde v é a metade da velocidade intervalar local e cos α é o ângulo que o raio faz com a
vertical, ambos avaliados nas coordenadas (x, y, z = 0). Desta forma, obtém-se a seguinte
igualdade:  
∂G∗ ∂A iωA
= + cos α exp(−iωτ ) (3.5.23)
∂z ∂z v
Com a equação 3.5.23, a integral de Rayleigh II, na forma da expressão 3.5.3, pode
ser alterada para a seguinte forma:
Z Z   
1 ∂A iωA
P (xB , yB , zB , ω) = 2π + cos α exp(−iωτ )P (x, y, z = 0, ω) dxdy
∂z v
Ly Lx
(3.5.24)
Se a derivada da amplitude da função de Green for desprezada, a equação 3.5.24 passa a
ser dada, no domı́nio do tempo, por
Z Z    
1 A∂
p(xB , yB , zB , t) = − 2π cos α p(x, y, z = 0, t + τ ) dxdy (3.5.25)
v ∂t
Ly Lx

Aplicada à obtenção de uma amostra migrada em três dimensões, basta incorporar, à


expressão 3.5.25, a etapa de imageamento. Na forma discreta, o resultado é:
XX  
A 0

1
m(x0 , y0 , z0 ) = − 2π cos α p (x, y, z = 0, t = τ ) ∆x∆y (3.5.26)
y x
v

onde m(x0 , y0 , z0 ) é a amostra sı́smica migrada e p0 representa a derivada dos dados


sı́smicos originais com relação ao tempo.
A aplicação do equação 3.5.26 à migração de um volume de dados sı́smicos empilhados
obedece à seguinte seqüência de passos:
1. Todos os traços sı́smicos dos dados a migrar são derivados com relação ao tempo.

2. Escolhe-se uma posição nas coordenadas hipotéticas x = x0 , y = y0 e z = z0 .


Assume-se que a mesma posição corresponda, no volume de dados sı́smicos migra-
dos, a um difrator.
372 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

3. Calcula-se o tempo de trajeto, τ , entre o difrator escolhido e cada ponto da superfı́cie


onde a difração correspondente poderia estar presente no volume de dados sı́smicos
originais. Este tempo é estimado através de rotinas de cálculo de tempo de trajeto,
baseadas no traçamento de raios ou na equação iconal (item 2.5). Neste caso, a
velocidade a usar é a correta e não sua metade.
4. Em cada uma das posições definidas pela curva tempo-distância obtida, ou seja, nos
tempos τ dos diversos traços sı́smicos do volume de dados originais, a amplitude é
extraı́da e multiplicada pelo seguinte peso:
A cos α
W3D = − ∆x∆y
2πv
onde A é estimado através das próprias rotinas de cálculo dos tempos de trajeto ou
algoritmos mais especı́ficos, como a solução da equação de transporte. É freqüente
a utilização de formas aproximadas para A, como o fator 1/R, onde R é a distância
definida pela equação 3.4.13.
5. Somam-se todas as amplitudes corrigidas na etapa 4 e posiciona-se o resultado nas
coordenadas correspondentes ao difrator (x0 , y0 , z0 ), no volume de dados migrados,
o qual tem as mesmas dimensões do volume de velocidades.
6. Repetem-se as etapas 2 a 5, para todas as amostras de todos os traços sı́smicos do
volume de dados originais.
Observe-se que, de acordo com a discussão apresentada no item 3.4, a migração em
profundidade implica também o empilhamento de difrações. Entretanto, o resultado é
posicionado nas próprias coordenadas do difrator, em vez de ser posicionado nas coorde-
nadas do ápice da difração (uma caracterı́stica da migração em tempo). Como ocorre com
qualquer algoritmo de migração, o modelo de velocidades intervalares, usado no processo,
é definido em função do volume migrado e não do registrado. Uma vez que, no caso, o
resultado desejado é função da profundidade, o modelo de velocidades também o deve
ser.
O algoritmo descrito pode ter sua ordem alterada sem que o resultado seja afetado.
No caso, ao invés de se somar amplitudes ao longo de difrações, espalham-se amplitudes
ao longo de frentes de onda. Uma das vantagens desta alternativa é a possibilidade de
aplicar filtros anti-álias de forma mais econômica (ver discussão sobre o tema no subitem
3.5.5).
Uma das caracterı́sticas mais marcantes da migração Kirchhoff assim descrita é a
flexibilidade quanto ao modelo de velocidades e os tempos de trajeto correspondentes.
Dependendo do algoritmo de cálculo de tempo e amplitude empregado, é possı́vel tratar
as seguintes situações: (1) meios com qualquer distribuição de velocidades; (2) meios
anisotrópicos, ou seja, meios em que a velocidade depende da direção do trajeto e; (3)
meios em que ocorrem as chamadas turning waves, ou ondas mergulhantes que se refletem
já no trajeto ascendente, as quais dependem do crescimento da velocidade intervalar com a
profundidade e permitem migrar refletores com mergulho maior do que 90 graus (comuns
em flancos de domo, por exemplo).
O algoritmo descrito depende fundamentalmente da rotina de cálculo de tempos e
amplitude não somente no sentido positivo, mas também no negativo. Assim, se o meio
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 373

for muito complexo, podem surgir problemas, entre os quais listam-se: (1) o tempo de
trajeto pode ser menor do que o adequado, se a rotina usada for baseada na premissa de
a freqüência é infinita (ver o item 2.5); (2) os algoritmos de traçamento de raios podem
levar à geração de zonas de sombra, para as quais nenhum tempo é computado. Em
situações desse tipo, a solução mais simples consiste em suavizar o campo de velocidades
usado no processo. Melhores resultados são obtidos combinando-se esta técnica com o
cálculo recursivo da função de Green e sua derivada com relação a z (ver a discussão
sobre a migração RTM e, em particular, as expressões 3.5.69 e 3.5.70).

Migração Kirchhoff recursiva


A migração Kirchhoff recursiva é uma aplicação direta do conceito ilustrado pelo fluxo-
grama da Figura 3.35 (página 364). No caso, o aspecto mais fundamental é o de que a
extrapolação inversa de um determinado volume de dados, para uma profundidade qual-
quer, gera dados corretamente migrados no tempo t = 0 do novo volume obtido, enquanto
o restante do volume corresponde aos dados inversamente extrapolados.
Em um meio tridimensional, a integral de Rayleigh II, na forma da equação 3.5.6,
pode ser teoricamente aplicada à versão recursiva da extrapolação inversa, através da
inclusão de pequena alteração, a qual visa tornar mais explı́cito o processo. O resultado
é:
Z Z    
1 1 1 ∂
p(xB , yB , z + ∆z, t) = 2π cos α − p(x, y, z, t + τ ) dxdy (3.5.27)
R2 vR ∂t
Ly Lx

ou, na versão discreta,


XX 
1 1 ∂
 
1
p(xB , yB , z + ∆z, t) = 2π
cos α 2
− p(x, y, z, t + τ ) ∆x∆y
y x
R vR ∂t
(3.5.28)
onde cos α = ∆z/R e τ = R/v, sendo R definido por
p
R = (x − xB )2 + (y − yB )2 + (∆z)2 (3.5.29)

No caso 2-D, a migração Kirchhoff, feita no domı́nio ω-x, é baseada na seguinte versão
da integral de Rayleigh II:
Z
1 n cos α h (2)
i o
P (xB , z + ∆z, ω) = − iωH1 (ωτ ) P (x, z, ω) dx (3.5.30)
2 v
Lx

ou, na versão discreta,

1 X n cos α h (2)
i o
P (xB , z + ∆z, ω) = − iωH1 (ωτ ) P (x, z, ω) ∆x (3.5.31)
2 x v

onde cos α = ∆z/R e τ = R/v, sendo que R é dado por


p
R = (x − xB )2 + (∆z)2 (3.5.32)
374 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

(2)
Por sua vez, a função de Hankel H1 foi definida pela equação 3.5.13.
O leitor deve ter observado que, para a migração recursiva, substituı́ram-se as aproxi-
mações das equações 3.5.8 e 3.5.15 pelas expressões exatas correspondentes. Isto se deve
ao fato de o pequeno intervalo de profundidade envolvido no processo, ∆z, tornar também
pequeno o produto ωτ . Nestas condições, o termo de campo próximo, bem caracterizado
no caso da migração tridimensional, assume proporções que impedem negligenciá-lo.
De acordo com o esquema discutido na seção dedicada à migração recursiva, no item
3.4, as equações 3.5.28 e 3.5.31 são aplicadas em cascata, desde a profundidade z = 0 até
a profundidade máxima desejada. Em cada uma das profundidades alcançadas, o image-
amento é feito através da obtenção das amostras obtidas no tempo igual a zero do volume
obtido e armazenado, no volume ou seção migrada, na profundidade correspondente.
Ressalte-se que a migração bidimensional, feita no domı́nio ω-x, implica alterar, no
esquema descrito, a forma como a etapa de imageamento é conduzida. Uma vez que
a extrapolação inversa é conduzida no domı́nio da freqüência e o imageamento implica
obter dados no tempo t = 0 da seção estimada na profundidade z + ∆z, seria necessário,
pelo menos em princı́pio, calcular uma transformada inversa de Fourier em cada etapa
da recursão. Para evitar esta tarefa, utiliza-se um conceito básico da transformada de
Fourier, o qual consiste em fazer t = 0 na equação 1.2.13, de forma a se obter a amostra
correspondente a cada valor de x, unicamente para o tempo igual a zero. O resultado é
expresso através da seguinte igualdade:

Z ∞
1
p(x, z + ∆z, t = 0) = 2π
P (x, z + ∆z, ω)dω (3.5.33)
−∞

No caso discreto, a integral é substituı́da por uma simples média dos componentes reais
de P (x, z + ∆z, ω) (ver a equação 3.3.14).
A migração recursiva também pode ser feita em intervalos constantes de tempo mi-
grado, substituindo-se, nas equações 3.5.28 e 3.5.31, o valor de ∆z pelo produto entre o
intervalo de tempo ∆τ e a velocidade. Neste caso, o intervalo efetivo de profundidade
depende localmente da velocidade, já que o intervalo de tempo ∆τ é constante, em cada
uma das etapas do processo. Para que a migração em tempo, conduzida desta forma,
leve a uma boa imagem, é necessário que a velocidade intervalar usada seja corretamente
obtida e, como nas demais alternativas de migração em tempo, definida em função do
tempo migrado e não do tempo de reflexão.
Deve-se destacar que a teoria da migração recursiva Kirchhoff, representada pelas
equações 3.5.28 e 3.5.31, esbarra em problemas de estabilidade, dependendo dos valores
de ∆z, ∆x e ∆y. Em particular, intervalos tı́picos entre traços sı́smicos, da ordem de
25m, não são adequados aos valores de ∆z que se poderia desejar, dificultando a aplicação
da técnica. Entretanto, pode-se aplicá-la de forma semi-recursiva, ou seja, migrando-se
camadas espessas, uma a uma. De acordo com esta idéia, migram-se os diversos eventos
dentro de cada camada e, adicionalmente, gera-se um volume equivalente ao que se obteria
se fontes e geofones estivessem na base da mesma camada. Este volume é usado para a
migração da próxima camada e, também, para o reposicionamento do datum na base da
mesma camada.
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 375

3.5.2 Técnicas espectrais


Denominam-se técnicas espectrais de migração as que são aplicadas no domı́nio ω-K x -
Ky ou ω-Kx , e que, por isto, envolvem transformadas bi ou tridimensionais dos dados
sı́smicos. Uma deficiência comum a estas técnicas é a incapacidade de lidar com variação
lateral no campo de velocidades, o que levou diversos autores a desenvolver versões alter-
nativas que buscam contorná-la. Por outro lado, as duas técnicas da famı́lia, discutidas em
seguida, são relativamente rápidas, particularmente a de Stolt e, em meios homogêneos,
são virtualmente exatas.

Migração por deslocamento de fase


Como se afirmou no item 2.7, a integral de Rayleigh II corresponde, no domı́nio ω-Kx ,
ao algoritmo de extrapolação de campos de onda conhecido como deslocamento de fase,
ou phase shift (Schneider, 1978; Gazdag, 1978). Aplicada à migração, a extrapolação de
campos de onda com este algoritmo implica a troca do sinal do expoente da equação 2.7.4,
porque a migração implica extrapolação descendente, ou seja, no sentido de profundidades
crescentes. O mesmo algoritmo pode ser obtido também com base nas equações 3.4.24 e
3.4.25, nos moldes do que foi feito com a extrapolação direta, no item 2.7.
No caso 2-D, a extrapolação inversa com base no algoritmo de deslocamento de fase
é conduzida através da seguinte versão inversa da expressão 2.7.6:

P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp(iKz ∆z) (3.5.34)

onde P̃ é a transformada bidimensional de Fourier dos dados sı́smicos, ∆z é um número


positivo e Kz , como se viu nos itens 2.1 e 2.4, é estimado em função de Kx , e ω, ou seja,
r 
ω 2
Kz = − − Kx2 (3.5.35)
v
ou s  2
ω vKx
Kz = − 1− (3.5.36)
v ω
ou ainda, em função do ângulo θ,
ω
Kz = − cos θ (3.5.37)
v
Observe-se que o sinal de Kz é negativo, exatamente como na modelagem. Isto se ex-
plica pelo fato de a extrapolação inversa implicar aumento na profundidade e decréscimo
no tempo, ou seja, dt/dz é negativo; portanto, com base na equação 2.1.50, Kz também
deve ser negativo. Por outro lado, é possı́vel perceber que, se θ for igual a zero, o cor-
respondente cosseno é igual a 1 e a expressão 3.5.34 torna-se equivalente a um simples
deslocamento de tempo dado por ∆z/v.
Com os conceitos apresentados até agora, pode-se aplicar a migração recursiva por
deslocamento de fase, em duas dimensões, através dos seguintes passos:
1. Calcula-se a transformada de Fourier bidimensional da seção registrada na superfı́cie
(z = 0), obtendo-se o campo de pressões P̃ (Kx , z = 0, ω).
376 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

2. Aplica-se, a todas as amostras do campo transformado, a expressão de deslocamento


de fase dada pela equação 3.5.34. De acordo com o modelo do refletor explosivo, a
velocidade usada no cômputo de Kz é igual à metade da velocidade intervalar entre
as profundidades z e z + ∆z.
3. Para se obter a seção sı́smica extrapolada na profundidade z + ∆z, poder-se-ia
computar a transformada inversa de Fourier nas duas dimensões. O resultado seria
uma seção inversamente extrapolada. Entretanto, não há necessidade de se calcular
uma transformada de Fourier completa, uma vez que se procura estimar, em cada
etapa da recursão, apenas as amostras situadas na profundidade z + ∆z. Ou seja,
procura-se obter a imagem correspondente ao tempo t = 0 da seção inversamente
extrapolada. Assim, utiliza-se o mesmo conceito empregado na obtenção da equação
3.5.33, o que leva à seguinte expressão:
Z
1
P (Kx , z + ∆z, t = 0) = 2π P̃ (Kx , z + ∆z, ω)dω (3.5.38)

No caso discreto, a integral é substituı́da por uma simples soma de todos os com-
ponentes de freqüência ω, para cada valor de Kx .
4. Calcula-se a transformada inversa de Fourier de P (Kx , z + ∆z, t = 0), ao longo
do eixo Kx . O resultado é uma linha de amostras na profundidade z + ∆z, que é
armazenada na matriz de dados migrados.
5. Atualiza-se o valor de z, substituindo-o por z + ∆z. Isto equivale a deslocar para
baixo a superfı́cie de “registro”, de acordo com o intervalo ∆z.
6. Usando o resultado do próprio passo 2 como entrada, repetem-se os passos 2 a 5
para todos os valores de z. O resultado é a seção migrada.
Como se viu no item 2.7, o valor de Kz pode se tornar complexo, desde que vKx /ω > 1,
ou que ω/v > Kx . Na região do espectro assim definida, viajam as ondas evanescentes,
que, na migração, tendem a ser enfatizadas, já que o expoente da equação 3.5.34 torna-
se real e positivo. Para se evitar problemas com os ruı́dos, as ondas evanescentes são
normalmente removidas durante a migração. Em termos práticos, isto significa que qual-
quer evento com velocidade aparente inferior à menor velocidade usada na migração é
removida, ou atenuada.
Nas aplicações práticas da migração por deslocamento de fase, pode-se incluir o efeito
da anisotropia, já que o ângulo de propagação aparece explicitamente. O grande problema
com o algoritmo descrito, que a migração Kirchhoff com traçamento de raios contorna,
é a impossibilidade de variar lateralmente a velocidade, assim como os parâmetros que
definem a anisotropia; ou seja, em cada passo descrito pela equação 3.5.34, a velocidade e
os parâmetros de anisotropia são constantes. Propostas para contornar o primeiro desses
problemas foram apresentadas por Gazdag e Sguazzero (1984), Kosloff e Kessler (1987)
e Stoffa et al. (1990).
Como no caso da migração Kirchhoff recursiva, a migração por deslocamento de fase
também pode ser feita em tempo, substituindo-se ∆z por v∆τ . Entretanto, neste caso, o
efeito da troca aparece apenas na coordenada vertical, já que, no domı́nio ω-K x , a velo-
cidade não pode variar lateralmente. Isto significa dizer que, nas aplicações do algoritmo
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 377

de deslocamento de fase, o resultado da migração em tempo equivale à conversão para o


tempo do resultado obtido com a migração em profundidade.

Migração Stolt
O algoritmo de migração por deslocamento de fase é naturalmente recursivo, ou seja,
o campo de pressões em cada profundidade é calculado a partir do campo obtido na
profundidade anterior. Como resultado, o tempo de processamento é elevado, em com-
paração com a migração Kirchhoff convencional. Entretanto, se o meio for homogêneo,
pode-se, como na migração Kirchhoff, executar a migração de uma só vez, no domı́nio da
freqüência.
Suponha-se que seja possı́vel dispor dos dados amostrados no domı́nio Kz -Kx , onde
Kz é a freqüência espacial ao longo do eixo das profundidades. Neste caso, uma simples
transformada inversa de Fourier, para o domı́nio profundidade-distância, resultaria na
seção migrada em profundidade. Conclui-se, portanto, que a migração em profundidade
inclui, implicitamente, a conversão dos dados do domı́nio ω-Kx para o domı́nio Kz -Kx .
Antes da migração, a freqüência espacial Kz não é conhecida mas, como se percebe na
equação 3.5.35, ela pode ser determinada através das freqüências Kx e ω. Induz-se, assim,
que é possı́vel migrar os dados sı́smicos através de uma seqüência de operações relativa-
mente simples: (1) transformam-se os dados para o domı́nio ω-Kx ; (2) reamostram-se os
dados no domı́nio Kz -Kx , determinando-se Kz com base na equação 3.5.35 e posicionando-
se cada amostra na nova posição, com o recurso de técnicas de interpolação; (3) a trans-
formada bidimensional inversa do resultado é a seção migrada em profundidade.
A técnica descrita, que corresponde a uma versão simplificada da migração Stolt
(1978), pode ser melhor compreendida com base na Figura 3.37. Vê-se, na figura, que
a amostra situada na freqüência ω0 /v é deslocada para a freqüência espacial dada por
(ω0 /v) cos θ, onde θ é o mergulho da frente de onda e v é a velocidade do meio. Na mesma
figura, vê-se também que o seno do ângulo de mergulho real é igual à tangente do ângulo
de mergulho aparente, ou seja, sen θ = tan ψ (equação 3.4.3). Observe-se que a técnica
descrita difere de uma simples conversão de tempo para profundidade, a qual é baseada
na divisão de ω por v.
Para que a migração Stolt trate corretamente as amplitudes, é necessário substituir
a variável de integração na transformada inversa de Fourier, o que é feito com base na
derivada de ω com relação a Kz , na equação 3.5.17, ou seja,

dω v |Kz |
= −p (3.5.39)
dKz Kz2 + Kx2

onde o sinal negativo aparece por que está sendo usado o modelo do refletor explosivo.
Por outro lado, como as convenções de sinal das transformadas de Fourier espacial e
temporal são opostas (ver o Capı́tulo 1), o sinal negativo é desconsiderado. Assim, a
transformada inversa de Fourier, cujo resultado corresponde à seção migrada, passa a ser
dada por
Z Z
1
p(x, z) = 4π 2
A exp(iKx x) exp(iKz z)P̃ (Kx , z = 0, Kz )dKz dKx (3.5.40)
378 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.37: Representação geométrica da mi-


gração Stolt.

onde A = −dω/dKz , ou seja, com base na expressão 3.5.39,

v |Kz |
A= p
Kz2 + Kx2

Com as expressões 3.5.35 e 3.5.37, pode-se demonstrar que A = v cos θ. Ou seja, também
na migração Stolt, cos θ é utilizado para corrigir a amplitude dos dados.
O método Stolt é a mais rápida técnica de migração, mas apresenta uma importante
limitação: exige meios homogêneos, tanto vertical quanto lateralmente. Na literatura,
existem técnicas que buscam minimizar essa deficiência (Stolt, 1978; Beasley et al., 1988).
A primeira delas, que foi proposta pelo próprio Stolt em seu trabalho clássico, procura
simular a situação de velocidade constante através do que veio a ser chamado “Stolt
stretch”. Neste processo, os dados não migrados são reamostrados ao longo de uma
nova escala de tempo (uma pseudo-profundidade), através da qual procura-se manter a
curvatura correta das difrações, nas posições dos ápices correspondentes (ver Claerbout,
1985; Yilmaz, 1987). Esta modificação leva a uma nova relação de dispersão da equação
da onda, na qual aparece um fator W , o qual deve estar, normalmente, entre 0.5 e 1,
sendo que W igual a 1 indica um meio homogêneo.

3.5.3 Diferenças finitas


A denominação “diferenças finitas” inclui uma grande variedade de algoritmos de mi-
gração, alguns fundamentados na versão acústica da equação completa da onda (ver
Whitmore, 1983; McMechan, 1983; Baysal et al., 1983; Kosloff e Baysal, 1983), além de
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 379

diversos outros que representam, de uma forma ou de outra, evoluções do trabalho de Cla-
erbout (1970). Entre os primeiros, o algoritmo mais bem sucedido é a migração de tempo
reverso, ou RTM, discutida no final deste subitem. No que diz respeito à segunda famı́lia
de algoritmos, as versões mais utilizadas são baseadas na técnica implı́cita, parcialmente
analisada em seguida.

O algoritmo implı́cito
Viu-se anteriormente que a migração por deslocamento de fase apresenta uma importante
limitação, que é a impossibilidade de variar lateralmente a velocidade. Por outro lado, a
transformada inversa de Fourier do algoritmo de deslocamento de fase, que corresponde
à integral de Rayleigh II, implica a necessidade de se utilizar rotinas de traçamento dos
raios, as quais podem, em diversas circunstâncias, apresentar importantes deficiências.
Uma alternativa para estas dificuldades baseia-se na aproximação por diferenças finitas
da expressão 3.5.18, definida no domı́nio ω-x (ver Claerbout, 1985).
Para a obtenção do algoritmo correspondente, parte-se da seguinte versão da equação
3.5.34:
   
∆z ∆z
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp −iω exp iω (1 − cos θ) (3.5.41)
v v

Multiplicando e dividindo por 1 + cos θ a expressão entre colchetes, tem-se:


   
∆z ∆z sen 2 θ
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp −iω exp iω (3.5.42)
v v 1 + cos θ

ou, levando em conta que sen θ = vKx /ω,


   
∆z vK 2 1
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp −iω exp i x ∆z (3.5.43)
v ω 1 + cos θ

Observe-se que, na forma das equações 3.5.41 a 3.5.43, o algoritmo de deslocamento de


fase corresponde à combinação de um deslocamento de tempo independente do mergulho,
denominado “termo das lentes finas”, e um deslocamento lateral dependente do mergulho,
denominado “termo das difrações”. Isto significa que, pelo menos parcialmente, criaram-
se condições para variar lateralmente a velocidade usada na migração, já que o termo das
lentes finas não depende da freqüência espacial32 Kx .
Através da expressão 3.5.43, pode-se obter um algoritmo que possibilita aplicar o
termo das difrações de forma também independente da freqüência espacial Kx , o que
implica transformar a mesma expressão para o domı́nio ω-x. Para isto, recorre-se a
uma simplificação do termo cos θ, de forma a possibilitar a mesma transformação. Na
32
Esta idéia é fundamental para o conceito de split-step (Stoffa et al., 1990), de acordo com o qual
a extrapolacão inversa é dividida em dois passos. No primeiro, que inclui a aplicação dos dois termos
— difrações e lentes finas —, a velocidade usada é constante dentro de cada intervalo ∆z. No segundo
passo, ainda no mesmo intervalo, aplica-se somente o termo das lentes finas, para corrigir o resı́duo de
fase associado à diferença entre a velocidade correta e a empregada no primeiro passo.
380 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

aproximação de primeira ordem, que equivale a considerar cos θ = 1, obtém-se o chamado


algoritmo de 15 graus, o qual pode ser descrito, no domı́nio da freqüência, por
     
∆z v∆zKx2
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp −iω exp − (3.5.44)
v 2iω

O resultado obtido seria o mesmo se se adotasse, com base nas equações 3.5.36 e
3.5.37, a seguinte aproximação:
s  2  2
vKx ∼ 1 vKx
cos θ = 1 − = 1− (3.5.45)
ω 2 ω
ou
1
cos θ ∼
= 1 − sen 2 θ (3.5.46)
2
Observe-se que a combinação das equações 3.5.37 e 3.5.45 leva à seguinte relação de
dispersão: "  2 #
ω 1 vKx
Kz ∼
=− 1− (3.5.47)
v 2 ω
Apesar de não envolver o termo cos θ, a equação 3.5.44 ainda não pode ser facilmente
transformada para o domı́nio ω-x, basicamente por causa do expoente envolvendo Kx .
Para que isto seja possı́vel, pode-se fazer uso da seguinte expansão Taylor:
   2
v∆zKx2 v∆zKx2 1 v∆zKx2
exp − =1− + − ... (3.5.48)
2iω 2iω 2! 2iω

Se apenas os dois primeiros termos deste resultado forem aproveitados, pode-se transfor-
mar a equação 3.5.44 na seguinte aproximação:
    
∆z v∆zKx2
P̃ (Kx , z + ∆z, ω) = P̃ (Kx , z, ω) exp −iω 1− (3.5.49)
v 2iω

Com a equação 3.5.49, criam-se condições para a obtenção do algoritmo de desloca-


mento de fase no domı́nio ω-x. Neste processo, o termo das lentes finas, que não envolve
Kx , não é alterado. Já a transformada inversa de Fourier da aproximação do termo das
difrações pode ser obtida com base no teorema da derivada (ver o item 1.2). Tem-se,
como resultado, a seguinte expressão:
    
∆z v∆z ∂ 2
P (x, z + ∆z, ω) = exp −iω 1+ P (x, z, ω) (3.5.50)
v 2iω ∂x2

O leitor atento já deve ter observado que nenhum acoplamento existe entre o termo
das lentes finas e o termo das difrações. Isto significa que o processo pode ser dividido em
duas partes. Para isto, define-se o chamado “campo atrasado”, Q, com base na seguinte
igualdade:  
∆z
Q(x, z + ∆z, ω) = P (x, z + ∆z, ω) exp iω (3.5.51)
v
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 381

Ou seja, o campo Q é igual à multiplicação entre o campo P e um fator que, no domı́nio


t-x, corresponde a um atraso igual a ∆z/v. Com base nesta definição, admite-se a
possibilidade de se aplicar isoladamente, ao campo Q, o termo das difrações. Obtém-se,
assim, a seguinte expressão:
 
v∆z ∂ 2
Q(x, z + ∆z, ω) = 1 + Q(x, z, ω) (3.5.52)
2iω ∂x2

O resultado da aplicação da equação 3.5.52 é o campo atrasado Q na profundidade


z + ∆z. Para obter o campo P na mesma profundidade, deve-se aplicar a seguinte versão
da equação 3.5.51:
 
∆z
P (x, z + ∆z, ω) = Q(x, z + ∆z, ω) exp −iω (3.5.53)
v

A aplicação das equações 3.5.52 e 3.5.53 à extrapolação inversa pode ser exemplificada,
geometricamente, com base na Figura 2.24 (página 112). Imagine-se que se deseja obter
a difração 1 da figura, a partir da difração 2. A aplicação da equação 3.5.52 a esta
última levaria a uma forma idêntica à da difração 1, mas o ápice correspondente estaria
na mesma posição do ápice da difração 2. Por sua vez, a aplicação da equação 3.5.53,
à difração assim obtida, a deslocaria para cima de acordo com um tempo puramente
vertical, correspondente à diferença (z1 − z2 )/v. O resultado final seria a difração 1.
É interessante ressaltar que a equação 3.5.52 corresponde à versão discretizada da
equação parabólica da onda, obtida por Claerbout em 1970, já que, com um simples
rearranjo dos termos, ela se transforma em:

Q(x, z + ∆z, ω) − Q(x, z, ω) v ∂ 2 Q(x, z, ω)


=
∆z 2iω ∂x2
Considerando-se o lado esquerdo do resultado uma aproximação de primeira ordem da
derivada com relação a z, pode-se obter a expressão deduzida por Claerbout, ou seja,

∂Q v ∂2Q
= (3.5.54)
∂z 2iω ∂x2
Multiplicando-se ambos os lados deste resultado por −iω, e aplicando-se o teorema da
derivada da transformada de Fourier (ver o item 1.2), obtém-se a expressão equivalente,
no domı́nio tempo-distância, também em termos do campo de pressões atrasado, dada
por
∂2q v ∂2q
=−
∂t∂z 2 ∂x2
onde q = q(x, z, t). Ressalte-se que a equação obtida não inclui múltiplas e descreve
ondas ascendentes, de acordo com o modelo do refletor explosivo, uma vez que a dedução
partiu do conceito de deslocamento de fase, que permite esse tipo de restrição.
Para se aplicar o algoritmo de extrapolação, seja no domı́nio tempo-distância, seja
no domı́nio freqüência-distância, é necessário estimar o valor da derivada segunda com
relação ao espaço. Isto é normalmente feito através de aproximações por diferenças
382 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

finitas. Assim, em uma aproximação de primeira ordem, a derivada pode ser estimada
numericamente por
∂2Q ∼ δ2Q Qx+∆x − 2Qx + Qx−∆x
2
= 2
= (3.5.55)
∂x δx ∆x2
onde δ significa operador de diferença e ∆x é a distância entre traços sı́smicos. A mesma
operação pode também ser vista como a convolução entre Q e o operador (1, −2, 1)/∆x 2 ,
ao longo do eixo x, para cada freqüência.
Discretizando-se a derivada segunda com relação a x, na forma da equação 3.5.55,
pode-se transformar a equação 3.5.52 no algoritmo que possibilita a extrapolação inversa
de campos de onda atrasados, por diferenças finitas, no domı́nio ω-x. O resultado é:

1
Q(x, z + ∆z, ω) = Q(x, z, ω) + [Q(x + ∆x, z, ω) − 2Q(x, z, ω) + Q(x − ∆x, z, ω)]
a
(3.5.56)
onde
2iω∆x2
a=
v∆z
Na forma do algoritmo descrito, a extrapolação de campos de onda deve ser conduzida
através da aplicação alternada das expressões 3.5.56 e 3.5.53. Uma análise rigorosa da
técnica, que corresponde à versão explı́cita da chamada aproximação de 15 graus, permite
caracterizar os seguintes problemas:

1. Percebe-se, na equação 3.5.52, que o termo entre colchetes, que é complexo, tem
módulo maior do que 1. Isto significa que o processo de extrapolação descrito tende
a aumentar a energia presente nos dados. O mesmo não ocorre com o algoritmo de
deslocamento de fase, cujo operador tem amplitude sempre igual a 1, com exceção
da região de ondas evanescentes (ver a equação 1.2.8).

2. O ângulo de mergulho é apenas aproximado, como se pode ver na Figura 3.38.


A geometria parabólica da relação de dispersão correspondente (equação 3.5.47)
pode ser vista na Figura 3.39, juntamente com a geometria circular da relação de
dispersão da equação escalar da onda. Vê-se, tanto na Figura 3.38 como na 3.39,
que os menores erros ocorrem quando θ → 00 e os maiores ocorrem quando θ → 900 .

3. A discretização das derivadas parciais implica aproximar as freqüências angulares.


No caso da expressão 3.5.55, a seguinte igualdade, baseada na transformada de
Fourier do operador (1, −1), é aplicável:
   
2 Kx ∆x 2 ∆x ω
K̂x = sen = sen sen θ (3.5.57)
∆x 2 ∆x 2 v

onde K̂x corresponde à aproximação de Kx . Percebe-se que os menores erros ocor-


rem quando a freqüência angular tende a zero, o que significa erros menores na
presença dos mergulhos menores. Conceito similar se aplica ao eixo das profundi-
dades, o que não significa qualquer prejuı́zo para o termo de deslocamento de tempo,
que é aplicado à parte, afetando portanto apenas o termo associado às difrações.
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 383

Figura 3.38: A relação entre o mergulho exato e o esti-


mado com a equação 3.5.45, juntamente com o módulo do
erro correspondente.

Figura 3.39: Geometria da relação de dispersão da


equação da onda em dois casos: (a) equação 3.5.36 e; (b)
equação 3.5.47.

Em contraposição a estes problemas, há que se mencionar as qualidades da técnica,


as quais permitem entender o sucesso dos algoritmos de migração baseados nas idéias
de Claerbout. Em primeiro lugar, deve-se mencionar a possibilidade de se variar espa-
cialmente, de forma quase irrestrita, a velocidade de migração. Em segundo lugar, a
dispersão caracterı́stica da técnica é exclusivamente anisotrópica, ou seja, não depende
384 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

da freqüência mas apenas do ângulo de propagação (ver a Figura 3.39). Isto significa
que o algoritmo descrito não altera de forma significativa a fase e a amplitude de eventos
de baixo mergulho. O mesmo não ocorre com outros algoritmos da famı́lia das diferenças
finitas, como é o caso de algumas implementações da migração de tempo reverso, ou RTM
(Whitmore, 1983; McMechan, 1983).
Parte das deficiências do algoritmo de 15 graus pode ser atenuada através da extra-
polação do campo de pressões em uma forma implı́cita. No caso, ao invés de se aplicar
diretamente a equação 3.5.56, determina-se o campo extrapolado com base em um sistema
de equações. O método implı́cito está fundamentado na forma como se estima a derivada
do campo de pressões com relação à profundidade. Observe-se, na equação 3.5.55, que
o operador de primeira derivada é (1, −1)/∆z, embora o operador mais indicado seja
(1, 0, −1)/∆z. Ou seja, a derivada resultante deveria estar centrada na profundidade
média entre z e z + ∆z. Uma forma de aproximar a operação correta consiste em alterar
a equação 3.5.52, de forma a incluir a média das derivadas segundas, com relação a x,
estimadas nas profundidades z e z + ∆z. Este é o conceito básico da técnica conhecida
como Crank-Nicolson (ver Claerbout, 1985).
Resultado idêntico ao da técnica Crank-Nicolson pode ser obtido através de uma
aproximação mais direta, baseada no primeiro termo da expansão do logaritmo neperiano
de (1 + x)/(1 − x), o qual é igual a 2x (ver Selby, 1973, página 472). Aplicada em
substituição à expansão Taylor da expressão 3.5.48, esta idéia permite a obtenção do
seguinte resultado:  
∆z vKx2
  1−
v∆zKx2 ∼ 2 2iω
exp − =   (3.5.58)
2iω ∆z vKx2
1+
2 2iω
Na seqüência, pode-se obter a seguinte expressão:
  
∆z vKx2
1 − 2 2iω 
Q̃(Kx , z + ∆z, ω) = Q̃(Kx , z, ω)    (3.5.59)
 ∆z vKx2 
1+
2 2iω

Percebe-se que, na forma da equação 3.5.59, a extrapolação de campos de onda atrasa-


dos é um processo estável, já que a amplitude do termo entre colchetes — correspondente
à divisão de um número complexo pelo seu conjugado complexo — é sempre igual a 1.
No domı́nio ω-x, a mesma equação corresponde à seguinte igualdade:
   
v∆z ∂ 2 v∆z ∂ 2
1− Q(x, z + ∆z, ω) = 1 + Q(x, z, ω) (3.5.60)
2iω ∂x2 2iω ∂x2

Observe-se que, na equação 3.5.60, não é possı́vel explicitar o campo de ondas Q na


profundidade z + ∆z, o que justifica o termo implı́cito para a identificação do algoritmo
em discussão. Isto implica a necessidade de resolver um sistema de equações, o qual é
resumido pela seguinte forma matricial:

AQz+∆z = BQz (3.5.61)


3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 385

onde Q é a matriz coluna que descreve o campo de pressões atrasado, ao longo do eixo
x, para cada freqüência. A matriz A é quadrada e tem todos os seus elementos iguais
a zero, exceto nas três diagonais principais, que têm valores definidos por −1/2, a + 1 e
−1/2, ou seja,
 
a + 1 −1/2 0 ··· 0 0 0
 −1/2 a + 1 −1/2 · · · 0 0 0 
 
 0 −1/2 a + 1 · · · 0 0 0 
 
 .. .
. . . . . . . .
. .
. 
A= . . . . . . .  (3.5.62)
 
 0 0 0 · · · a + 1 −1/2 0  

 0 0 0 · · · −1/2 a + 1 −1/2 
0 0 0 ··· 0 −1/2 a + 1

onde v varia ao longo do eixo x,


2iω∆x2
a= (3.5.63)
v∆z
e os demais elementos são constantes, durante a solução do sistema. A matriz B tem
forma semelhante à da matriz A, mas as três diagonais têm valores definidos por 1/2,
a − 1 e 1/2. Ressalte-se que, nas aplicações práticas, a equação 3.5.61 é resolvida de
forma recursiva (ver Claerbout, 1985).
Com as expressões que definem a extrapolação inversa de campos de onda, seja implı́-
cita ou explı́cita, a migração por diferenças finitas, no domı́nio ω-x, é conduzida através
da seguinte seqüência de operações:

1. Calcula-se a transformada de Fourier temporal da seção registrada na superfı́cie


(z = 0), obtendo-se o campo de pressões P (x, z = 0, ω).

2. O campo de pressões atrasado Q é tomado como igual ao campo de pressões P , ou


seja:
Q(x, z, ω) = P (x, z, ω)

3. Aplica-se, ao campo atrasado, a extrapolação inversa, através da equação 3.5.61


(ou 3.5.56), freqüência a freqüência. Como resultado, obtém-se o campo atrasado
na profundidade z + ∆z.

4. O campo obtido na etapa anterior é deslocado no tempo, também freqüência a


freqüência, através da aplicação da equação 3.5.53, o que leva ao campo P , na
profundidade z + ∆z.

5. Para se obter os dados migrados na profundidade z + ∆z, aplica-se a condição de


imagem, segundo a qual as amostras do campo de pressões correspondente à mesma
profundidade, situadas no tempo t = 0, estão corretamente migradas. Portanto,
pode-se aplicar a equação 3.5.33, para se obter as amostras migradas na profundi-
dade z + ∆z.

6. Atualiza-se o valor de z, substituindo-o por z+∆z. Isto equivale a descer a superfı́cie


de “registro” em um intervalo ∆z.
386 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.40: Migração em tempo de um impulso unitário filtrado (8-40Hz) com o


algoritmo implı́cito de 65 graus, aplicado no domı́nio ω-x. Parâmetros: v = 2000m/s
(vH = 1000m/s), t0 = 512ms, ∆x = 25m.

7. Repetem-se as etapas 2 a 6, até que o maior valor de z seja atingido.


A técnica de migração descrita leva a dados migrados em profundidade. Como nos
demais algoritmos, a migração em tempo implica a substituição de ∆z por v∆τ , onde
∆τ é mantido constante. Esta alteração deve ser feita tanto no termo de deslocamento
de tempo quanto no termo das difrações. Desta forma, a equação 3.5.44 deve ser alterada
para:
  2 
v ∆τ Kx2
P̃ (Kx , τ + ∆τ, ω) = P̃ (Kx , τ, ω) [exp (−iω∆τ )] exp − (3.5.64)
2iω
A migração por diferenças finitas no domı́nio ω-x é relativamente rápida e aceita
variação lateral e vertical na velocidade, sem as restrições tı́picas da migração por des-
locamento de fase. Entretanto, tais qualidades devem ser contrapostas aos problemas
de dispersão numérica inerentes ao método, os quais resultam em erros crescentes com o
mergulho. Algumas das técnicas usadas para reduzir estas distorções, que são discutidas
no Apêndice A.3, permitem a obtenção de sete diferentes ordens do algoritmo implı́cito,
desde a de 15 graus até a de 90 graus, passando pela mais comumente aplicada, a de
65 graus. No caso particular do algoritmo de 15 graus, um detalhe merece ser desta-
cado: com algumas modificações relativamente simples, é possı́vel transformá-lo em um
algoritmo de 50 graus.
Na Figura 3.40, vê-se a resposta, ao impulso, da migração com o algoritmo implı́cito,
na forma melhorada da versão de 65 graus, a qual é aplicada no domı́nio ω-x. Percebe-
se na figura que, mesmo com as alterações introduzidas, o operador de migração por
diferenças finitas apresenta importantes deficiências, particularmente quando comparado
com o operador de migração por deslocamento de fase, ou Kirchhoff (ver a Figura 3.25,
na página 348). Em particular, destacam-se os ruı́dos numéricos, que se concentram na
parte central do operador33 .
33
A origem desses ruı́dos pode ser inferida a partir da equação 3.5.54, cuja transformada inversa inclui
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 387

Em dados sı́smicos reais, os ruı́dos numéricos mencionados tendem a se tornar pouco


importantes. Esta afirmação pode ser parcialmente constatada com base no fato de que
os ruı́dos de maior amplitude, observados na parte central do operador implı́cito (como
no exemplo da Figura 3.40), apresentam comprimento de onda próximo de duas vezes
a distância entre traços sı́smicos. Desta forma, induz-se que uma simples mistura de
operadores lateralmente adjacentes — observada na presença de um refletor — é suficiente
para atenuá-los substancialmente.
Até agora, discutiram-se aplicações bidimensionais do algoritmo implı́cito. Uma
versão tridimensional de primeira ordem implica a adoção da seguinte aproximação, em
substituição à expressão 3.5.45:
s  2  2  2  2
vKx vKy ∼ 1 vK x 1 vK y
cos θ = 1 − − =1− − (3.5.65)
ω ω 2 ω 2 ω

onde Ky é o número de onda associado ao eixo y. Este resultado permite a obtenção da


seguinte forma da equação 3.5.52:
  
v∆z ∂2 ∂2
Q(x, y, z + ∆z, ω) = 1 + + Q(x, y, z, ω) (3.5.66)
2iω ∂x2 ∂y 2

A equação 3.5.66 — válida para o algoritmo de 150 (ou 500 , dependendo dos recursos
empregados) — apresenta uma importante caracterı́stica: as duas derivadas espaciais,
∂ 2 Q/∂x2 e ∂ 2 Q/∂y 2 , podem ser aplicadas de forma desacoplada uma da outra. O mesmo
não ocorre com os algoritmos de mais alta ordem, o que pode ser percebido com base
na versão tridimensional da equação A.3.7 (página 562): o termo Ŝ 2 , que deve incluir
a soma das transformadas de Fourier dos dois operadores de derivada, está presente
tanto no numerador quanto no denominador. A conseqüência desta caracterı́stica é a
impossibilidade de isolar a aplicação das duas derivadas, o que leva à necessidade de se
adotar o seguinte artifı́cio: aplica-se o termo das difrações em dois passos, o primeiro
ao longo de um dos eixos superficiais e o segundo ao longo do outro eixo, neste caso
utilizando como entrada o resultado obtido no primeiro passo.
Para perceber o impacto da aproximação mencionada, faz-se uso de um corte hori-
zontal no volume correspondente ao operador tridimensional de migração obtido em um
meio homogêneo e isotrópico (ver exemplos na página 405 de Yilmaz, 1987). Neste tipo
de corte, o operador gerado com o algoritmo de 15 graus apresenta a forma — correta
— de um cı́rculo. Já no caso dos algoritmos de mais alta ordem, a forma — errada —
é a de um losango. Como demonstrou Li (1991), esta deficiência dos operadores de alta
ordem pode ser corrigida através de um ajuste de fase aplicado no domı́nio ω-Kx-Ky , de
forma intercalada com a extrapolação inversa.

Migração de tempo reverso – RTM


Em comparação com a técnica implı́cita, o grande apelo da migração RTM (em inglês,
Reverse-Time Migration) consiste na utilização da equação completa da onda, a qual
uma integração anti-causal com relação ao tempo, associada à derivada segunda com relação ao espaço,
ambas aplicadas ao campo de pressões atrasado, q.
388 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

torna possı́vel aplicar a migração sem limitações no ângulo de mergulho das camadas,
mesmo no caso de meios em que a velocidade varia livremente. Entre os trabalhos pio-
neiros dedicados ao tema, incluem-se os de Whitmore (1983), McMechan (1983) e Baysal
et al. (1983), no segundo dos quais o autor atribuiu o nome “boundary value migration”
ao algoritmo proposto34 .
No contexto do modelo do refletor explosivo, aplicado a duas dimensões, define-se
migração RTM como o processo que, a partir da seção sı́smica registrada, s(x, z = 0, t),
permite obter uma estimativa da seção de coeficientes de reflexão responsável por ela,
p(x, z, t = 0), através de uma propagação em que a origem das coordenadas espaciais é
mantida e o tempo é reduzido. Neste caso, as amplitudes sı́smicas medidas na superfı́cie
são tratadas como fontes de energia que “explodem” no tempo registrado e geram sinal
que avança no espaço e recua no tempo até que a posição dos refletores seja atingida, o
que se dá quando t = 0. De acordo com a discussão apresentada no item 3.4, trata-se de
uma migração por frentes de onda (ver as figuras 3.23 e 3.26, nas páginas 345 e 349).
Com base nesses conceitos, a extrapolação anti-causal, ou de tempo reverso, aplicada
a um meio bidimensional, pode ser resumida, a partir da expressão 2.7.21, pela seguinte
equação:
    
2 2 ∂ 1 ∂pt ∂ 1 ∂pt
pt−∆t = 2pt − pt+∆t + v ρ∆t + (3.5.67)
∂x ρ ∂x ∂z ρ ∂z

onde pt , pt−∆t e pt+∆t denotam seções dos campos de ondas sı́smicas estimados nos tempos
constantes t, t − ∆t e t + ∆t, ao longo das coordenadas x e z. Por sua vez, ρ e v repre-
sentam, respectivamente, as seções de densidade e metade da velocidade de propagação
(ou seja, v = vH ).
Na aplicação da equação 3.5.67, a seção sı́smica a migrar é tratada como uma condição
de contorno35 , de acordo com a qual cada conjunto de amostras registradas na superfı́cie,
no tempo t, é incorporado ao processo através da seguinte atualização da seção p t :

pt (x, z = 0) = s(x, z = 0, t) (3.5.68)

Na aplicação desta igualdade, os sinais porventura existentes no campo pt , na profun-


didade z = 0, são todos substituı́dos pelas amostras que, na seção sı́smica registrada,
situam-se no mesmo tempo t.
Deve-se enfatizar o significado da expressão 3.5.68: ela implica anular, somente na
superfı́cie de registro, os sinais do campo pt que, extrapolados a partir de outras pro-
fundidades, atingem a mesma superfı́cie, como se, lá, existisse um dipolo (1, −1). Isto
equivale a dizer que, na superfı́cie de registro, a função de Green anti-causal é igual a
zero, enquanto a correspondente derivada com relação à profundidade é diferente de zero.
Em outras palavras, a equação 3.5.68 representa a condição de contorno de Dirichlet36 ,
condição esta que caracteriza também a migração baseada na integral de Rayleigh II. Com
base nesta analogia, torna-se mais clara a idéia de que o resultado da migração RTM de
34
Há quem atribua a autoria da migração RTM a D. Whitmore e C. Hemon, que desenvolveram
trabalhos simultâneos sobre o tema já nos anos 1970 (ver Zhu e Lines, 1997).
35
Observa-se assim uma importante diferença em relação aos algoritmos implı́cito e de deslocamento
de fase, uma vez que, em ambos, a seção sı́smica registrada é tratada como condição inicial.
36
Ver a nota de rodapé 27, na página 206.
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 389

um impulso unitário é descrito pela seguinte igualdade, válida para uma superfı́cie de
registro horizontal:

1 ∂g
pt=0 (x, z) = 2π ∆x (3.5.69)
∂z
onde pt=0 é a seção resultante da migração e g ∗ é a versão anti-causal da função de Green,
a qual é também definida em função das coordenadas x e z.
Em uma aplicação tı́pica, a migração RTM corresponde a uma soma implı́cita de seções
como a representada pela equação 3.5.69, cada uma delas multiplicada pela correspon-
dente amplitude dos dados sı́smicos registrados. Tem-se, no caso, a seguinte expressão,
também válida para uma superfı́cie de registro horizontal:
t=0
( )
X X ∂g ∗

1
pt=0 (x, z) = 2π
s(x, z = 0, t) ∆x (3.5.70)
t=t x
∂z
max

onde pt=0 representa a seção final migrada e tmax é o máximo valor de tempo dos dados
sı́smicos registrados.
Percebe-se facilmente que a expressão 3.5.70 descreve, também, a migração baseada na
integral de Rayleigh II, uma vez que o termo entre chaves corresponde à versão discreta
da mesma integral, cuja forma tridimensional é dada, no domı́nio da freqüência, pela
equação 3.5.3. Aprofundando a analogia, pode-se levar em conta que, no contexto em
que são válidas, as duas integrais de Rayleigh, I e II, geram resultados idênticos. Este
fato torna possı́vel alterar a aplicação da expressão 3.5.67 de tal forma que a migração
RTM equivalha à migração baseada na integral de Rayleigh I. Para isto, adotam-se as
seguintes medidas: (1) substitui-se o sinal registrado, s, pela derivada ∂s/∂z, estimada
na superfı́cie de registro37 e; (2) aplica-se a migração RTM com a condição de contorno
de Neumann, o que equivale a substituir a expressão 3.5.68 por

∂s(x, z = 0, t)
pt (x, z = 0) + ⇒ pt (x, z = 0) (3.5.71)
∂z
De acordo com a equação 3.5.71, os sinais que, extrapolados a partir de outras pro-
fundidades, atingem a superfı́cie de registro, são preservados. Nos termos da condição de
contorno de Neumann, observa-se, na mesma superfı́cie, que a função de Green é diferente
de zero e sua derivada com relação à profundidade é igual a zero. Assim, se ∂s/∂z —
em vez de s — fosse um impulso unitário, o resultado da migração, com a condição de
contorno de Neumann, seria descrito pela seguinte igualdade, também aplicável a uma
superfı́cie de registro horizontal:
1 ∗
pt=0 (x, z) = 2π
g ∆x (3.5.72)

onde, como antes, g ∗ é a função de Green anti-causal.


Para ilustrar o tema em discussão, gerou-se a Figura 3.41, através da aplicação da
versão bidimensional do algoritmo RTM a um impulso unitário filtrado, na presença de
forte variação lateral de velocidade (600m/s para cada quilômetro), assumindo que a
37
A derivada ∂s/∂z pode ser calculada no domı́nio ω-Kx , ou ω-Kx -Ky , através do produto iKz S̃, onde
S̃ é a transformada de Fourier de s. No caso, a velocidade a usar é a da camada em que é feito o registro
dos dados sı́smicos.
390 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Prof. (m) 0

500

4500 5000 5500


Figura 3.41: Resultado da migração RTM bidimensional, em profundidade, de
um impulso unitário filtrado (8-40Hz). Assumiu-se que o impulso foi registrado
na posição indicada pelo sı́mbolo •, no tempo t 0 = 512ms. A velocidade de
propagação real — o dobro da utilizada na migração — varia lateralmente entre
1700m/s e 2390m/s na região apresentada (2000m/s na coordenada igual a 5000m).
Parâmetros: ∆x = 12.5m, ∆z = 2m e ∆t = 0.5ms.

densidade é constante. O resultado pode ser considerado uma versão filtrada do sinal
descrito pela equação 3.5.69. Gerou-se também a Figura 3.42, através da extrapolação
de tempo reverso com a condição de contorno de Neumann, aplicada ao mesmo impulso
unitário filtrado, mas tratando-o como equivalente à derivada ∂s/∂z (em vez de s). Neste
caso, o resultado pode ser considerado uma versão filtrada do sinal descrito pela equação
3.5.72.
Uma comparação entre as figuras 3.41 e 3.42 permite a extração de algumas lições.
Em primeiro lugar, deve-se mencionar que, como o processo foi conduzido em duas di-
mensões, a fase da função de Green anti-causal, presente nos dois casos, é igual a 45
graus. Além disso, as diferenças de amplitude e fase, observadas quando se comparam
os sinais das duas figuras, devem-se ao fato de que a forma de onda presente na primeira
corresponde a uma derivada, com relação à profundidade, da forma de onda da segunda,
derivada esta avaliada na posição de registro. Entre as diferenças observadas, merece
destaque, na Figura 3.42, a ausência do efeito da obliqüidade o qual, na Figura 3.41, é
controlado pela variação do mergulho.
Nas aplicações práticas, o maior empecilho enfrentado pela migração RTM é a ne-
cessidade de evitar três problemas: (1) instabilidade numérica; (2) dispersão numérica
e; (3) geração indesejada de reflexões e suas múltiplas. No subitem 2.7.3, discutiram-se
soluções para os dois primeiros problemas, com destaque, no segundo deles, para a técnica
Fourier, a qual consiste em aplicar as duas derivadas espaciais no domı́nio dos respectivos
números de onda, Kx e Kz .
No que diz respeito a evitar a geração de reflexões e suas múltiplas, pode-se adotar
uma das seguintes técnicas:
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 391

Prof. (m) 0

500

4500 5000 5500


Figura 3.42: Resultado da extrapolação de tempo reverso, em duas dimensões,
de um impulso unitário filtrado (8-40Hz), utilizando a condição de contorno de
Neumann. Assumiu-se que o impulso, correspondente à derivada ∂s/∂z, foi obtido
na posição indicada pelo sı́mbolo •, no tempo t 0 = 512ms. O modelo de velocidades
e os demais parâmetros são os mesmos usados na geração da Figura 3.41.

1. Considera-se constante a densidade e suaviza-se o campo de vagarosidades interva-


lares (1/v) de forma a reduzir os correspondentes contrastes e a afetar tão pouco
quanto possı́vel o tempo de propagação (Loewenthal et al., 1987). Desta forma, as
interfaces acústicas se diluem e a energia refletida torna-se desprezı́vel. O filtro a
ser aplicado com esta finalidade deve ser maior do que os comprimentos de onda
esperados.

2. Em cada ponto em subsuperfı́cie, o valor da densidade é considerado igual ao inverso


da velocidade, de forma a tornar constante a impedância acústica do meio (Baysal
et al., 1984). No caso de uma onda plana e afastamento fonte-receptor igual a zero,
todos os coeficientes de reflexão passam a ser nulos, o que evita a geração de eventos
indesejados.

3. Substitui-se a expressão 3.5.67 por sua equivalente baseada na versão unidirecional


da equação da onda, a qual possibilita escolher o sentido em que as ondas avançam
e, desta forma, evita a geração de reflexões (Baysal et al., 1983). A expressão
resultante, obtida através da combinação entre a relação de dispersão da equação
da onda e a discretização centrada do operador ∂pt /∂t, pode ser representada por
hp i
−1 2 2
pt−∆t = pt+∆t − 2v∆t F i Kx + Kz F (pt ) (3.5.73)

onde F ( ) e F −1 [ ] denotam transformada direta e inversa de Fourier entre os do-


mı́nios z-x e Kz -Kx . Em uma forma mais compacta, o mesmo algoritmo é descrito
por
∂pt
pt−∆t = pt+∆t − 2∆t (3.5.74)
∂t
392 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

onde ∂pt /∂t é o produto entre a velocidade v e o resultado da transformada inversa


de Fourier presente na equação 3.5.73.

Das três técnicas descritas, a mais bem-sucedida é a primeira, o que se deve a: (1)
é a mais rápida das três; (2) tem aplicabilidade mais geral do que a segunda, a qual é
inadequada para a migração de dados sı́smicos não empilhados e; (3) é numericamente
mais robusta do que a terceira. Sua aplicação à migração de uma seção sı́smica pode ser
descrita, em termos algorı́tmicos, através da seguinte seqüência de tarefas:

1. Geram-se as velocidades intervalares em uma região cujas dimensões são condi-


cionadas pela seção migrada a ser obtida e pela necessidade de atenuar eventos
gerados nas bordas, em particular acima da superfı́cie de registro. Para isto, pode-
se, por exemplo, expandir a seção a ser obtida e, nas regiões adicionais, reduzir
gradualmente a velocidade no sentido das bordas.

2. Suaviza-se o campo de vagarosidades intervalares, ou seja, o inverso das velocidades


intervalares geradas na etapa anterior.

3. O processo é iniciado no máximo valor de tempo de registro dos dados sı́smicos,


tmax . Nesta etapa, atribui-se t = tmax e consideram-se nulas as seções pt+∆t , pt e
pt−∆t .

4. Atualiza-se o valor da seção pt apenas na superfı́cie de registro (z = 0), aplicando-se


a expressão 3.5.68.

5. Calculam-se as seções das derivadas ∂ 2 pt /∂x2 e ∂ 2 pt /∂z 2 . Se for adotada a técnica


Fourier, esta tarefa é conduzida nos domı́nios dos números de onda Kx e Kz , nos
quais as duas derivadas se transformam em multiplicações pelos operadores −Kx2
e −Kz2 . Em muitos casos, é conveniente executar a mesma operação no domı́nio
do espaço (x-z), através da convolução entre a seção pt e versões reduzidas das
transformadas inversas de Fourier dos mesmos operadores (ver, por exemplo, Mufti
et al., 1996).

6. Para se obter a seção pt−∆t , aplica-se a seguinte versão da equação 3.5.67:


 2 
2 2 ∂ pt ∂ 2 pt
pt−∆t = 2pt − pt+∆t + v ∆t + (3.5.75)
∂x2 ∂z 2

7. Atualizam-se os valores de tempo, substituindo-se t por t + ∆t e t − ∆t por t. Isto


implica transformar as seções pt e pt−∆t em pt+∆t e pt , respectivamente.

8. Repetem-se as etapas 4 a 7, até que o valor de t atinja zero. A seção obtida, pt=0 ,
representa os dados sı́smicos migrados em profundidade.

A técnica descrita pode ser diretamente estendida para três dimensões, em função da
linearidade do processo. Além disso, é também facilmente adaptável para a migração em
tempo. No caso, basta substituir o intervalo de profundidades da seção migrada, ∆z,
pelo produto v∆τ , onde ∆τ é constante e τ é o equivalente em tempo da profundidade.
Em conseqüência, a derivada ∂ 2 pt /∂z 2 é convertida na expressão (∂ 2 pt /∂τ 2 )/v 2 .
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 393

3.5.4 Técnicas complementares


Entre as técnicas complementares discutidas neste item, listam-se a migração em cascatas
e a migração tridimensional em duas passagens, ambas baseadas no conceito de migração
residual. O mesmo conceito é fundamental para o entendimento da aplicação combinada
de diferentes algoritmos de migração. Outra linha de técnicas consiste na aplicação de
migração residual em profundidade, com base no raio imagem, a dados migrados em
tempo, os quais são considerados submigrados. A última técnica discutida é a migração
a partir do datum flutuante, a qual possibilita tratar de forma mais adequada a migração
de dados sı́smicos em regiões onde a topografia é muito acentuada.

Migração residual
Suponha-se que uma seção sı́smica, registrada em um meio homogêneo e isotrópico, seja
migrada em tempo. Neste caso, a freqüência temporal resultante, denominada ωτ , é
definida por
ωτ = vKz (3.5.76)
onde Kz é a freqüência espacial na direção do eixo z. Com base na expressão 3.5.35,
pode-se dizer, portanto:
ωτ2 = ω 2 − v 2 Kx2 (3.5.77)
onde ω é a freqüência temporal da seção sı́smica não migrada.
Suponha-se agora que se migre a mesma seção sı́smica com uma velocidade v1 , a qual
é mais baixa do que a correta. Aplicando-se a expressão 3.5.77, obtém-se:

ω12 = ω 2 − v12 Kx2

Se o resultado obtido for novamente migrado, com outra velocidade, v2 , obtém-se:

ω22 = ω12 − v22 Kx2

ou
ω22 = ω 2 − (v12 + v22 )Kx2 (3.5.78)
Supondo-se que o resultado obtido com a segunda migração esteja correto, pode-se
igualar as equações 3.5.77 e 3.5.78, o que leva a:

v 2 = v12 + v22

Generalizando-se, para um número de migrações igual a N , tem-se:

N
X
2
v = vn2 (3.5.79)
n

onde v é a velocidade de migração correta e vn é a velocidade de migração usada na etapa


n.
Deduz-se, portanto, ser possı́vel migrar de forma sucessiva — em cascatas — uma
seção sı́smica com diferentes velocidades e obter-se o resultado correto, desde que estas
394 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

velocidades satisfaçam à equação 3.5.79 e a migração seja feita em tempo. Este impor-
tante resultado, registrado na literatura sob diversas formas (ver Rothman et al., 1985), já
havia sido obtido por Geraldo de Oliveira em 1977 (informação verbal, obtida na mesma
época).
Entre as aplicações da equação 3.5.79, está o conceito de migração em cascatas, que
é voltado para melhorar a qualidade da migração por diferenças finitas (Larner e Be-
asley, 1987), ou a da migração Stolt (Beasley et al., 1988). A mesma idéia é aplicada
na combinação de diferentes técnicas de migração. Por exemplo, pode-se migrar uma
seção com o algoritmo de Stolt (1978), assumindo-se velocidade constante e, em seguida,
migrar o resultado com a técnica de diferenças finitas, usando-se as velocidades residuais,
estimadas com base na equação 3.5.79. Com esta seqüência, aproveitam-se as qualidades
intrı́nsecas das duas técnicas.
Na aplicação do conceito de migração em cascatas, deve-se ressaltar que, em meios
de velocidade lateralmente variável, a velocidade deve ser constante em cada etapa da
migração, com exceção da última, quando a velocidade pode variar. Isto se explica pelo
fato de a equação 3.5.79 ser deduzida com base na relação de dispersão da equação da
onda, no domı́nio ω-Kx , o qual implica velocidade constante. Desta forma, na migração
em cascatas, o tratamento da velocidade de migração, em um meio complexo, pode
adquirir um grau de sofisticação elevado.
Também com base no conceito de migração residual, é possı́vel demonstrar que, na
ausência de variação lateral na velocidade, a migração em tempo de um volume tridimen-
sional de dados sı́smicos pode ser dividida em duas etapas de migração bidimensional,
sendo a primeira na direção x, seguida de outra etapa, desta vez na direção y (Geraldo
de Oliveira, informação verbal na década de 1970 e Jakubowski e Levin, 1983). Para
demonstrar a idéia, suponha-se que um dado volume tridimensional de dados sı́smicos
tenha sido migrado somente na direção x, utilizando-se um algoritmo bidimensional. A
seguinte expressão é aplicável ao caso:

ω12 = ω 2 − v 2 Kx2

onde ω é a freqüência temporal dos dados sı́smicos não migrados e ω1 é a freqüência tem-
poral dos dados resultantes da migração bidimensional. Na segunda etapa, ou passagem,
obtém-se:
ω22 = ω12 − v 2 Ky2
ou
ω22 = ω 2 − v 2 Kx2 − v 2 Ky2
Observe-se que o lado direito da equação obtida equivale a v 2 Kz2 , ou seja,

v 2 Kz2 = ω 2 − v 2 Kx2 − v 2 Ky2

Este resultado é exatamente a relação de dispersão da equação da onda, o que prova a


validade do processo.
De um ponto de vista teoricamente rigoroso, a migração em tempo em duas passagens
deveria se restringir a meios lateralmente homogêneos. Entretanto, observa-se que, na
grande maioria das situações, o grau de variação lateral na velocidade não é suficiente-
mente grande para afetar sensivelmente a aplicação da técnica. Adicionalmente, sabe-se
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 395

que o empilhamento de agrupamentos CMP, no contexto da técnica CDP, é também


muito afetado pela variação lateral de velocidade (ver o item 3.1). Pode-se mesmo dizer
que os eventos que apresentam mergulhos mal resolvidos pela migração em duas passa-
gens são os mesmos que não são adequadamente tratados pela técnica CDP — ou seja,
são fortemente atenuados durante o empilhamento. Este tema será novamente discutido
no item 3.6.

Migração em profundidade com base no raio imagem


Após analisar as figuras 3.28 a 3.32 (páginas 356 a 359), a observação mais lógica que
se poderia fazer é: deve-se sistematicamente migrar os dados em profundidade. Esta
afirmação pode ser parcialmente contestada com base na analogia com o peixe na lagoa.
Para que um ı́ndio o atinja com sua lança, ele não necessita vê-lo na posição correta mas,
tão somente, deve estimar qual é o deslocamento na imagem introduzido pelo trajeto da
luz na água. Similarmente, se a imagem da migração em tempo for a ideal, o deslocamento
espacial do difrator poderá ser estimado posteriormente.
Com base nesta linha de raciocı́nio, a migração em profundidade poderia ser aplicada
em duas etapas, de acordo com a técnica do raio imagem. Na primeira etapa, submetem-se
os dados sı́smicos a uma versão tão perfeita quanto possı́vel da migração em tempo, a qual
implica posicionar o resultado da focalização das difrações nos ápices correspondentes.
Este conceito permite induzir que as amostras de um traço sı́smico corretamente migrado
em tempo estão associadas aos ápices de uma famı́lia de difrações que se sucedem no
tempo.
Nestas condições, o traço sı́smico migrado em tempo pode ser visto como uma coleção
de eventos que atingem a superfı́cie na direção vertical, ou seja, de acordo com uma
vagarosidade horizontal constante e igual a zero. Esta é também a condição fundamental
para a definição do raio imagem, ou seja, o raio que, saindo da superfı́cie na direção
vertical, sofre inclinações, devidas à influência da lei de Snell, sempre que atingir uma
interface mergulhante entre meios de velocidades distintas (ver as figuras 2.15 e 3.28,
nas páginas 96 e 356 e Hubral e Krey, 1980). Conclui-se, portanto, que o traço sı́smico
migrado em tempo corresponde a uma coleção de coeficientes de reflexão situados ao
longo do raio imagem, coleção esta representada verticalmente abaixo do ponto em que
o mesmo raio atinge a superfı́cie.
A conclusão obtida leva à etapa seguinte da migração em profundidade baseada no
raio imagem. Esta etapa consiste em transferir cada amostra migrada em tempo para a
posição espacial do difrator, a qual se situa sobre o raio imagem. Na versão bidimensional
desta técnica, proposta por Larner et al. (1981), executam-se os seguintes passos:

1. Obtém-se o modelo de velocidades intervalares do meio, definido em função da


profundidade e da coordenada horizontal.

2. Com o modelo obtido, traça-se o raio imagem, a partir da posição superficial de


cada traço sı́smico migrado em tempo, e se obtém a função que associa o tempo
duplo de trajeto, medido ao longo do raio, à posição espacial correspondente.

3. A função obtida na etapa anterior é usada para se copiar as amostras do traço


sı́smico migrado em tempo na matriz de dados migrados em profundidade. Para
396 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

isto, faz-se uso da equivalência entre o tempo migrado e o tempo duplo de trajeto
medido ao longo do raio imagem.

4. Repetem-se as etapas 2 e 3 para todos os traços migrados em tempo.

O resultado do processo descrito é uma seção sı́smica caracterizada por traços sı́smicos
que, fundamentalmente, apresentam a geometria dos raios imagem correspondentes. Ou
seja, cada traço sı́smico que, migrado em tempo, é representado na direção vertical,
é apresentado, em função da profundidade, ao longo do trajeto do raio imagem. O
resultado obtido depende bastante da qualidade e do tratamento espacial do modelo
de velocidades utilizado (ver discussão sobre a migração Kirchhoff em profundidade),
assim como depende também dos algoritmos de interpolação empregados no processo de
regularização da distribuição das amplitudes.

Migração a partir do datum flutuante


Nas aplicações tı́picas das correções estáticas, o raio que abandona a fonte, ou o que atinge
o receptor, é considerado vertical. Esta é uma aproximação suportada pela constatação de
que a camada de intemperismo apresenta velocidade intervalar substancialmente menor
do que a do substrato rochoso. Neste caso, de acordo com a lei de Snell, o raio que se
propaga na mesma camada é aproximadamente vertical. Nas situações práticas, mesmo
onde ocorre uma camada superficial de baixa velocidade, observa-se com freqüência a
necessidade de posicionar o datum dentro do substrato rochoso. Cria-se assim uma fonte
de distorções, uma vez que, neste caso, a direção do raio pode se afastar substancialmente
da vertical.
Para se contornar a dificuldade descrita, adota-se a seguinte seqüência de procedi-
mentos, baseada em conceitos apresentados no item 3.1:

1. Escolhe-se um datum flutuante, ou seja, um datum que varia de forma suave ao


longo da linha sı́smica e que permite restringir as correções estáticas aos efeitos
superficiais, reduzindo assim a influência da lei de Snell sobre o empilhamento
subseqüente.

2. Empilham-se os traços sı́smicos aplicando-se as correções estáticas estimadas de


acordo com o critério descrito na etapa anterior. O resultado equivale ao que seria
obtido se fontes e receptores estivessem posicionados no datum flutuante.

3. Migram-se os dados sı́smicos empilhados a partir do datum flutuante, posicionando-


se o resultado no datum final. Neste caso, os sinais são tratados levando em conta
o fato de que, abaixo da camada de intemperismo, o raio não é vertical. Garante-se
assim o imageamento adequado dos dados sı́smicos.

A migração dos dados sı́smicos a partir do datum flutuante envolve artifı́cios que
dependem do algoritmo escolhido. Considere-se, inicialmente, a migração Kirchhoff, apli-
cada com base na equação 3.5.3. No caso, é necessário trocar a superfı́cie horizontal de
integração pela superfı́cie do datum flutuante, o que implica alterar a forma com que os
tempos de trajeto são calculados. Haveria também a necessidade de trocar a derivada
da função de Green com relação à profundidade, ∂G∗ /∂z, pelo produto escalar ∇G∗ • ~n,
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 397

assim como a troca de ∆x∆y por ∆S, onde S é a área medida ao longo do datum flutu-
ante e ~n é o correspondente vetor unitário. Entretanto, como a forma dos data flutuantes
mais tı́picos é suave, pode-se utilizar ∂G∗ /∂z, principalmente se o ângulo entre o raio e
a superfı́cie de integração for adequadamente estimado.
Um caso interessante é o da migração em tempo com o algoritmo implı́cito. Na
forma proposta por Beasley e Lynn (1992), aplica-se ao caso o conceito de camada de
velocidade nula (em inglês, zero velocity layer ). De acordo com esta idéia, assume-se
que o meio situado acima do datum flutuante apresenta velocidade igual a zero e se
leva em conta, com base na equação 3.5.64, que a extrapolação do sinal em meios com
esta caracterı́stica envolve um deslocamento puramente vertical, dado por ∆τ . Nestas
condições, a migração recursiva de traços sı́smicos, fundamentada na mesma equação, não
colapsa difrações enquanto o tempo migrado τ estiver acima do datum flutuante. Assim,
no caso dos traços sı́smicos obtidos em cotas topográficas relativamente mais baixas,
as etapas iniciais de extrapolação correspondem a simples correções estáticas, já que a
aplicação do termo das difrações somente é iniciada quando o tempo migrado ultrapassa
o nı́vel do datum flutuante.
Na migração RTM, o tratamento do datum flutuante pode representar uma parte
implı́cita do processo de extrapolação inversa (ver McMechan e Chen, 1990). Na medida
em que cada amostra registrada atua como uma fonte de energia no tempo e na posição
de registro, a propagação inversa é naturalmente feita a partir da superfı́cie, não importa
qual seja sua cota. Esta é uma observação que possibilita uma analogia imediata com a
versão não recursiva da migração Kirchhoff: em ambos os algoritmos, os dados registrados
na superfı́cie atuam como condição de contorno, o que torna desnecessária a utilização
de artifı́cios adicionais para tratar adequadamente o datum flutuante.

3.5.5 Um pouco mais de detalhe


No desenvolvimento, implementação e aplicação dos algoritmos de migração de dados
sı́smicos, esbarra-se freqüentemente em inúmeros temas especı́ficos, não discutidos, ou
apenas parcialmente analisados, nas seções anteriores. Dois desses assuntos são discutidos
em seguida.

Parâmetros fundamentais para a migração de dados sı́smicos


Na migração (ou na extrapolação) de dados sı́smicos com a integral de Rayleigh II,
um parâmetro é básico: a abertura do operador de migração (ou de extrapolação), que
está relacionada ao chamado ângulo de migração (ver a Figura 3.23, na página 345).
A abertura do operador de migração é definida pelo máximo afastamento lateral entre
os traços sı́smicos envolvidos na soma das amplitudes ao longo da difração. Assim, para
garantir a correta migração de um ponto situado na profundidade aparente zA , a abertura
A do operador deve ser dada por

A ≥ 2zA sen θ (3.5.80)

ou, em função da profundidade correta zM ,

A ≥ 2zM tan θ (3.5.81)


398 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

onde θ é o ângulo de mergulho real do evento a migrar, ou o ângulo de migração.


A condição estabelecida pelas inequações 3.5.80 e 3.5.81 define também o dobro da
largura da franja adicional a ser adicionada às dimensões horizontais da área em que se
procura obter dados corretamente migrados. Esta é uma providência adotada para que
os eventuais artefatos de borda, gerados pela migração (os “sorrisos”), não influenciem
negativamente a área considerada útil.
Um parâmetro fundamental para a migração, com qualquer algoritmo, é o intervalo
de amostragem espacial ∆x, que corresponde à distância entre traços sı́smicos (ou entre
linhas sı́smicas, no caso 3-D, o que implicaria substituir ∆x por ∆y). Para se estabelecer
a amostragem adequada para a migração, faz-se uso da seguinte expressão (repetição da
2.1.48):
K sen θ dt
= =
ω v dx
onde v é a metade da velocidade correta, medida na superfı́cie. Sabendo-se que a
freqüência angular espacial de Nyquist, KxN , é igual a π/∆x, pode-se dizer:

Kx N π sen θ
= = (3.5.82)
ω ω∆x v
Com base na equação 3.5.82, é possı́vel dizer que, para se evitar a amostragem de dados
em álias espacial e, consequentemente, para se migrar bem os dados, deve-se obedecer à
seguinte condição:
πv v
∆x ≤ = (3.5.83)
ωmax sen θ 2fmax sen θ
ou, alternativamente,
v
fmax ≤ (3.5.84)
2∆x sen θ
ou ainda,
1
fmax ≤ (3.5.85)
2p∆x
onde fmax corresponde à freqüência que limita a migração correta dos dados, para o
intervalo entre traços sı́smicos ∆x, enquanto p é o parâmetro de raio, ou seja, p = dt/dx.
Um importante ponto a destacar é que, para a correta migração dos dados sı́smicos,
são fundamentais o colapso das difrações e o imageamento de planos de falha. Nas
aplicações práticas, isto significa que o ângulo θ a utilizar nas equações 3.5.80 a 3.5.85
não deve ser o mergulho dos refletores, já que estes são normalmente muito menores do
que os de outros eventos, como os planos de falha. Assim, o ângulo θ mais indicado deve
ser pelo menos da ordem de 600 , valor este que é representativo de planos de falha tı́picos,
e suficiente para colapsar parte substancial das difrações.
No caso particular da migração em profundidade, um parâmetro fundamental é o
intervalo ∆z, que separa as amostras da seção migrada ao longo do eixo das profundidades.
O conceito básico, neste caso, é o efeito de álias, o qual deve ser evitado com a correta
escolha do intervalo ∆z. Para isto, pode ser usado um dos seguintes critérios: (1) ∆z
deve ser igual a v∆τ , sendo v igual à metade da menor velocidade intervalar presente
na seção; (2) ∆z deve ser igual ou menor do que 1/4 do menor comprimento de onda
presente nos dados.
3.5. ALGORITMOS DE MIGRAÇÃO 399

Álias espacial e migração


De acordo com a equação 3.5.84, ou 3.5.85, existe um limite de freqüência para a correta
migração dos dados sı́smicos. Com base nos conceitos usados na dedução da mesma
equação, pode-se concluir que esta é a mesma freqüência que limita a amostragem dos
dados sem o efeito de álias espacial. Isto significa que um evento em álias espacial será
não somente amostrado erroneamente como também migrado erroneamente.
O problema da amostragem espacial dos dados é tratado de forma diferente nos di-
versos algoritmos de migração. No caso da migração Kirchhoff, não existe uma limitação
operacional associada à distribuição dos dados. Ou seja, pode-se migrar corretamente
dados com distribuição irregular, desde que se introduzam as correções necessárias. En-
tretanto, na aplicação dos algoritmos de diferenças finitas e de deslocamento de fase,
os dados devem ser regularmente distribuı́dos. Assim, algum tipo de homogeneização
espacial prévia deve ser feita.
Na migração por deslocamento de fase, a distribuição regular dos dados faz com que
a transformada de Fourier correspondente limite a atuação do operador de migração ao
máximo número de onda amostrado. Em conseqüência, o algoritmo atua sobre eventos
com o mesmo ângulo de mergulho apenas até a freqüência temporal correspondente ao
número de onda de Nyquist. Ou seja, nada ocorre com os componentes de freqüência
maiores do que esse limite, a menos que eles tenham sido amostrados em álias espacial,
o que leva o processo a interpretá-los como eventos com outros números de onda. Se
algum tipo de filtro anti-álias espacial tiver sido usado na aquisição, ou durante o próprio
processamento, nenhuma distorção será introduzida pela migração.
No caso da migração Kirchhoff, que não exige amostragem regular dos dados, o pro-
cesso não contém um limite de aplicação implı́cito, como o descrito acima. Assim, se
nenhuma providência for tomada, nada impede que o algoritmo migre componentes de
freqüência maiores do que o limite estabelecido pela equação 3.5.85. Em outras palavras,
o operador de migração pode atuar sobre componentes de freqüência inexistentes nos
dados. Este conceito recebe na literatura o nome de álias do operador de migração.
Entre as conseqüências da utilização de um operador em álias, a mais notória é a
criação de eventos espúrios. Este é um resultado causado pelo fato de que, nos altos
mergulhos, o operador de migração em álias apresenta amplitude e conteúdo de freqüência
maiores do que as adequadas aos dados. Desta forma, mesmo na migração de eventos
válidos, particularmente nas partes mais rasas da seção, as extremidades mais altas do
operador não são totalmente atenuadas no processo, deixando resı́duos no resultado.
Para evitar o efeito de álias no operador, a migração Kirchhoff deve incluir um filtro
corta-altas dependente do mergulho. Isto equivale a transformar a equação 3.5.26 na
seguinte expressão:

XX  
A

1
m(x0 , y0 , z0 ) = − 2π cos α pf (x, y, z = 0, t = τ ) ∆x∆y (3.5.86)
y x
v

Nesta expressão, pf representa uma versão filtrada dos dados sı́smicos originais, definida
por
pf (x, y, z = 0, t) = f (α, x, y, t) ∗ p(x, y, z = 0, t)
onde ∗ denota convolução temporal e f (α, x, y, t) é o resultado da convolução do operador
400 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

de derivada com um filtro corta-altas cuja freqüência de corte é definida pela equação
3.5.85, tomando-se α = θ.
Percebe-se que a correta aplicação da expressão 3.5.86 implica filtrar um único traço
sı́smico com inúmeras freqüências de corte, já que diferentes amostras migradas são obti-
das a partir de uma mesma amostra dos dados não migrados. No subitem 3.6.3, discute-se
a aplicação prática desta idéia à migração de dados sı́smicos não empilhados.

3.6 Migração Pré-empilhamento


Os objetivos básicos da migração pré-empilhamento de dados sı́smicos são: (1) localizar
os pontos que, iluminados pelo sinal gerado por uma fonte sı́smica, produziram as re-
flexões registradas na superfı́cie e; (2) obter uma estimativa dos coeficientes de reflexão
correspondentes. Em relação à migração baseada no modelo do refletor explosivo, a prin-
cipal diferença reside na adoção de técnicas que contornam importantes deficiências do
processamento sı́smico convencional.
A qualidade da migração baseada no modelo do refletor explosivo é altamente depen-
dente da eficácia da técnica CDP. Se o meio não apresentar grande complexidade, ou se os
objetivos do processamento sı́smico não forem muito ambiciosos, o correspondente resul-
tado pode ser aceitável. Entretanto, o avanço do processo exploratório tem levado à busca
por armadilhas geológicas cada vez mais sutis, armadilhas estas que, com freqüência, são
mal caracterizadas nos resultados do processamento convencional, em grande parte por
causa das deficiências da técnica CDP (ver o item 3.1).
Às deficiências mencionadas, deve-se acrescentar a necessidade de se dispor de da-
dos sı́smicos não empilhados com a qualidade adequada à geração dos atributos de AVO
(Amplitude Versus Offset) ou, de uma forma mais abrangente, à inversão elástica (ver
o item 3.7). Implı́cita nesta frase está a idéia de que os dados sı́smicos não empilhados
contêm importantes informações adicionais, negligenciadas quando se opta pela aplicação
cega da técnica CDP. A alternativa da migração pré-empilhamento ou, em alguns casos,
da aplicação de procedimentos paliativos que permitam contornar as deficiências menci-
onadas, favorece a obtenção de dados sı́smicos com a qualidade requerida além, é claro,
de possibilitar a geração de seções empilhadas de qualidade superior.
Deve-se relacionar também, como informação adicional, a profundidade dos refletores.
A este respeito, ver-se-á adiante que um campo de velocidades inadequado pode fazer com
que a migração dos dados sı́smicos e o empilhamento subseqüente não resultem em uma
boa imagem. Isto significa que, no processo de correção das distorções envolvidas no
imageamento, é necessário definir um bom campo de velocidades. Segue-se daı́ que a
correta migração dos dados sı́smicos tende a estar associada, direta ou indiretamente,
a informações a respeito da profundidade dos refletores. Deve-se ressaltar, entretanto,
que a velocidade necessária para a obtenção de uma boa imagem não garante, embora
favoreça, a determinação da correta profundidade dos refletores.
Em resumo, o processamento fundamentado na técnica CDP e no modelo do refletor
explosivo pode levar à obtenção de imagens mal definidas dos objetivos, além de não
permitir a extração, com a qualidade adequada, de todo o conjunto de informações que,
teoricamente, estão incluı́das nos dados sı́smicos registrados. Dentre as técnicas e procedi-
mentos, relacionados ou não à migração pré-empilhamento e que se propõem a contornar
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 401

estas deficiências, listam-se os seguintes, alguns dos quais devem ser considerados soluções
paliativas:

1. Correção de DMO (Dip MoveOut) – Trata-se de um processo que compensa as


distorções introduzidas pela relação entre o afastamento fonte-receptor e o mergulho
das interfaces entre camadas e, em conseqüência, favorece a aplicação da técnica
CDP, ou da pseudo-migração pré-empilhamento (subitem 3.6.2).

2. Pseudo-migração pré-empilhamento – Técnica que introduz ganhos adicionais em


relação à simples aplicação da correção de DMO, ao permitir melhor correção das
amplitudes e possibilitar análise de AVO após a migração (subitem 3.6.3).

3. Migração pré-empilhamento em tempo – Processo que permite contornar pratica-


mente todas as deficiências da técnica CDP, com exceção dos efeitos da variação
lateral de velocidade (subitens 3.6.1 e 3.6.3).

4. Migração pré-empilhamento em profundidade – Além das vantagens da migração


em tempo, permite corrigir as distorções introduzidas pela variação lateral na ve-
locidade (subitens 3.6.1 e 3.6.3). Por outro lado, exige informações adicionais de
velocidade, as quais, em contrapartida, são úteis para a interpretação.

Limitações de ordem computacional, aliadas à influência negativa de eventos espúrios


e a dificuldades na obtenção das velocidades adequadas, tendem a inibir a aplicação,
em larga escala, da migração pré-empilhamento em profundidade, a qual representa a
alternativa mais indicada. Já a migração pré-empilhamento em tempo é mais rápida e,
embora não corrija algumas das distorções citadas, dispensa a correção de DMO e pode
incluir um tratamento adequado das amplitudes.
Outro fator que favorece a migração em tempo é o fato de que o processo de obtenção
das correspondentes velocidades é relativamente mais simples do que o indicado para
a migração em profundidade, além de permitir algum nı́vel de sofisticação, como no
caso em que se aplicam expressões como a 3.1.17, a 3.1.19 ou a 3.1.20. Em função
destas caracterı́sticas, observa-se a tendência de se aplicar rotineiramente a migração pré-
empilhamento em tempo, seguida pela migração residual em profundidade dos dados já
empilhados. De acordo com esta filosofia, a migração pré-empilhamento em profundidade
se restringiria a regiões selecionadas, particularmente mais complexas.

3.6.1 Introdução à migração pré-empilhamento


A fı́sica da migração pré-empilhamento dos dados sı́smicos é a mesma que dá suporte à
migração fundamentada no modelo do refletor explosivo. A aparente complexidade do
conceito é fruto exclusivo da geometria de aquisição, a qual envolve diferentes afastamen-
tos entre a fonte e o receptor. Nestas circunstâncias, é conveniente apresentar a migração
pré-empilhamento através de uma seqüência cujo primeiro passo é uma discussão a res-
peito da influência do afastamento fonte-receptor sobre a forma inversa do princı́pio de
Huygens, com ênfase no processo de localização geométrica de difratores. Para que o
leitor acompanhe bem a discussão, considera-se essencial uma leitura dos itens 2.3 e 3.4
ou o domı́nio dos conceitos lá apresentados.
402 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Migração de agrupamentos de afastamento fonte-receptor comum (CO)


Suponha-se que exista, em um meio bidimensional homogêneo e isotrópico, apenas um
difrator, situado na coordenada horizontal xB e na profundidade zB . Admitindo-se que o
registro sı́smico correspondente seja um único agrupamento de afastamento fonte-receptor
comum (CO), suponha-se agora que se deseja utilizar a geometria da difração registrada
para localizar o difrator. No caso 2-D, a curva tempo-distância que permite descrever
geometricamente a difração é dada pela seguinte versão da equação 2.3.8:
s  2 s  2
 z 2 xB − (x − h)  z 2 (x + h) − xB
B B
t= + + + (3.6.1)
v v v v

onde v é a velocidade de propagação, t é o tempo total de reflexão, x é a coordenada


horizontal do ponto médio entre a fonte e o receptor e h é a metade do afastamento
correspondente.
Com base na teoria apresentada no item 2.3, sabe-se que, em um meio homogêneo e
isotrópico, cada amostra registrada — seja ela um ponto de uma difração ou de uma re-
flexão — pode ser associada a uma superfı́cie aplanática que, no caso 2-D, se reduz a uma
elipse. Nestas condições, é fácil induzir que uma superfı́cie aplanática descreve também a
geometria resultante da migração de um impulso unitário. Por extensão, conclui-se que,
a cada ponto isolado da difração mencionada, corresponde uma superfı́cie aplanática, ou
uma superfı́cie migrada, a qual é descrita pela seguinte versão bidimensional da equação
2.3.16:
(x − x0 )2 vH2 2
τM
2 2
+ 2 2
=1 (3.6.2)
v H t0 v H t0 − h 2
onde x é a coordenada horizontal da superfı́cie aplanática, a qual é representada em função
do tempo migrado38 , τM , enquanto vH é a metade da velocidade de propagação do meio
e o par (t0 , x0 ) representa a posição de um ponto da difração na seção de agrupamento
CO.
Pode-se agora resolver o problema proposto, ou seja, localizar o difrator com base
na geometria da difração correspondente. Para ilustrar o processo, preparou-se a Figura
3.43, na qual se pode ver a descrição geométrica dos seguintes elementos: a difração, D,
associada a um difrator situado nas coordenadas xB = 2500m e zB = 250m; a mesma
difração após a correção de NMO, N , e; quatro superfı́cies aplanáticas, cada uma delas
calculada através da equação 3.6.2, usando-se os pontos destacados, na difração, através
do sı́mbolo •.
Analisando-se a Figura 3.43, verifica-se que o cruzamento das quatro superfı́cies gera-
das ocorre exatamente na posição do difrator, ou seja, xB e τB = zB /vH . A mesma idéia
pode ser estendida para todos os pontos da difração. Por outro lado, percebe-se, na figura,
que a base de cada uma das superfı́cies aplanáticas geradas não coincide com a posição do
ponto que a ela deu origem. Este é um efeito associado ao afastamento entre a fonte e o
receptor e, conseqüentemente, à correção de NMO. Entretanto, percebe-se também que,
se cada um dos quatro pontos escolhidos for submetido à correção de NMO, o resultado
38
Neste caso, a palavra “tempo” não tem o significado de tempo de registro mas sim o de uma pseudo-
profundidade, ou tempo vertical.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 403

500
Tempo (ms)

1000 D

N
1500

2000
1000 2000 3000 4000
Coordenada horizontal do ponto médio (m)

Figura 3.43: Localização de um difrator em uma seção de agrupamento CO com


base nos tempos de registro da difração correspondente. Cada um dos sı́mbolos •
representa um ponto usado para se calcular a superfı́cie aplanática cuja base está
situada verticalmente acima dele. Parâmetros: v = 2000m/s, h = 625m. As letras
D e N indicam a difração antes e após a correção de NMO.

coincide com a base da superfı́cie aplanática correspondente. Observa-se neste caso uma
clara analogia entre as figuras 3.21 (página 343) e 3.43: a única diferença resume-se à
geometria das superfı́cies migradas, um cı́rculo no caso da Figura 3.21, uma elipse no
caso da Figura 3.43.
O leitor distraı́do poderá ter pensado que a correção de NMO representa uma etapa
explı́cita da migração de agrupamentos CO. Na verdade, isto não ocorre, embora a
correção de NMO seja uma parte intrı́nseca do processo. A mesma idéia torna-se mais
clara quando se analisa a equação 3.6.2: observe-se que uma dada superfı́cie aplanática
tem sua base situada verticalmente acima do ponto que a ela deu origem, de acordo com
2 2
um deslocamento controlado pelo termo vH t0 − h2 . Destaca-se, no caso, a subtração por
2
h , sem a qual a superfı́cie aplanática se tornaria um cı́rculo de raio igual a vH t0 (ver a
equação 3.4.1).
A correção de NMO, aliada à correção das distorções associadas ao mergulho dos
refletores — ambas adequadamente tratadas pela migração pré-empilhamento — são
bem ilustradas no exemplo da Figura 3.44. Vêem-se, na figura, os diversos elementos
que permitem relacionar a reflexão registrada, R, à reflexão migrada em tempo, M :
a reflexão após a correção de NMO, N , uma superfı́cie aplanática, B, gerada com a
coordenada horizontal e o tempo do ponto b, e uma difração, D, tangente à reflexão R
no mesmo ponto (o difrator correspondente situa-se no ponto a).
Analisada com base na relação entre a reflexão migrada e a reflexão sujeita à correção
de NMO, a Figura 3.44 apresenta uma forte analogia com a Figura 3.22 (página 344).
Em particular, destaca-se o fato de que a difração DN tangencia a reflexão N na base da
superfı́cie aplanática B. Como seria de se esperar, as diferenças entre as duas figuras estão
relacionadas à correção de NMO e à geometria das superfı́cies aplanáticas e das difrações:
404 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

M B
a
DN
500

R
Tempo (ms)

D
1000 b
N

1500

0 500 1000 1500 2000 2500


Coordenada horizontal do ponto médio (m)

Figura 3.44: Geometria envolvida na migração em tempo de uma reflexão mergu-


lhante em um agrupamento CO: R – reflexão registrada; N – reflexão após a correção
de NMO; M – refletor que deu origem à reflexão; D – difração gerada no ponto a;
DN – mesma difração após correção de NMO e; B – superfı́cie aplanática corres-
pondente a um impulso unitário na posição b. Parâmetros: h = 625m, v = 2000m/s
e mergulho do refletor igual a 300 .

hipérbole versus “hipérbole achatada” no caso da difração, cı́rculo versus elipse no caso
da superfı́cie aplanática.
O leitor deve observar que “superfı́cie aplanática” é um conceito a ser analisado no
domı́nio da profundidade ou do tempo migrado. Neste domı́nio, a mesma superfı́cie pode
ser vista como uma frente de onda hipotética, construı́da com base nas posições da fonte
e do receptor e no tempo de cada amostra registrada. Aliando-se esta idéia à forma
inversa do princı́pio de Huygens, induz-se que a migração de um agrupamento CO pode
ser descrita como um processo de construção e acumulação de ondas hipoteticamente
geradas na superfı́cie, cada uma delas centrada na posição do ponto médio entre a fonte e
o receptor. As frentes de onda correspondentes apresentam, no caso 2-D, a geometria de
uma elipse e, no caso 3-D, a geometria de um elipsóide de revolução (ver a Figura 2.29,
na página 122).
Aumentando a abrangência da análise, pode-se abandonar o enfoque puramente geo-
métrico e levar em consideração os fenômenos de interferência envolvidos na migração dos
agrupamentos CO. Para isto, faz-se uso das figuras 3.45 e 3.46, ambas correspondentes
a um meio homogêneo e isotrópico. A primeira delas é um exemplo da forma de onda
filtrada correspondente ao operador de migração bidimensional de agrupamentos CO. Na
segunda, que foi construı́da nos mesmos moldes da Figura 3.26 (página 349), vê-se como
os fenômenos de interferência atuam na migração e, além disso, como a correção de NMO,
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 405

Figura 3.45: Resultado da migração bidimensional em profundidade de um agru-


pamento CO, no caso em que os dados originais são constituı́dos por um impulso
unitário filtrado (8-40Hz). Parâmetros: h = 625m, v = 2000m/s, ∆x = 25m. O im-
pulso unitário se situa na coordenada horizontal x = 5000m e no tempo t = 808ms.
As posições da fonte e do receptor são indicadas pelas letras s e g. Observação: a
escala vertical é válida também para tempo vertical em milissegundos.

Figura 3.46: Resultado da migração bidimensional de impulsos unitários filtrados


(8-40Hz) e distribuı́dos de acordo com espaçamento lateral variável em um agru-
pamento CO. Parte superior: modelo de impulsos unitários não filtrados, em es-
cala de tempo. Parte inferior: resultado, em escala de profundidade. Parâmetros:
h = 625m, v = 2000m/s, ∆x = 25m.

implı́cita no processo, afeta o resultado. À semelhança da migração baseada no modelo


do refletor explosivo, o operador é somado em fase onde existe um refletor e é atenuado
nas demais posições.
Na forma da Figura 3.46, a migração bidimensional corresponde a um processo em
406 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

que a amplitude e a posição de cada amostra da seção registrada representam parâmetros


usados na ponderação e no deslocamento do operador de migração, o qual é somado, na
seção migrada, ao resultado da aplicação do mesmo processo a outras amostras. Como em
qualquer outra convolução, o processo descrito — a migração por frentes de onda — pode
ter sua ordem alterada, sem modificar o resultado. No caso, pode-se somar amplitudes
ao longo de cada difração hipoteticamente registrada e posicionar o resultado na posição
do difrator: a migração por soma de difrações (ver o item 3.4). Ver-se-á adiante que, na
aplicação a meios complexos, o cálculo do tempo de trânsito é baseado no traçamento do
raio, ou em soluções da equação iconal, ao invés de expressões analı́ticas como a 3.6.1.
Ver-se-á também que, no processo de construção do operador de migração, aplicam-se
correções de amplitude e fase, sem as quais o resultado não seria aceitável.

Migração de agrupamentos de fonte comum (CS)

Neste ponto, pode-se perguntar como seria o processo de localização de difratores e,


por extensão, a migração de dados sı́smicos redistribuı́dos na forma de agrupamentos de
fonte comum (CS). Com base no que foi apresentado no item 2.3, sabe-se que o tempo
de registro correspondente a cada ponto de uma difração registrada em um agrupamento
CS é decomposto em duas partes: (1) o tempo entre a fonte e o difrator, ts0 , o qual é
constante e; (2) o tempo entre o difrator e cada receptor, tg , o qual varia lateralmente,
em função da coordenada horizontal do receptor. No caso de um meio homogêneo e
isotrópico, tem-se a seguinte versão da equação 3.6.1:

s  2
 z 2 xg − x B
B
t = t s0 + + (3.6.3)
v v

onde v é a velocidade de propagação, t é o tempo total de reflexão, x g é a coordenada


horizontal do receptor e zB /v é o tempo vertical simples entre o difrator e a superfı́cie.
Como no caso da equação 3.6.1, zB e xB representam a profundidade e a coordenada
horizontal do difrator. Por sua vez, o tempo ts0 é dado por

s  2
 z 2 xB − x s 0
B
ts 0 = + (3.6.4)
v v

onde xs0 é a coordenada horizontal da fonte.


Admita-se agora que uma difração isolada tenha sido registrada em um agrupamento
CS e apresente geometria definida com base na equação 3.6.3. A localização do difra-
tor correspondente pode ser tratada de forma similar à localização de difratores em um
agrupamento CO. A razão para esta afirmação é simples: independentemente do tipo de
agrupamento, um evento registrado em um determinado tempo, em um receptor em par-
ticular, deve ser oriundo de uma posição qualquer de uma superfı́cie aplanática centrada
no ponto médio entre a fonte e o receptor (ver o item 2.3). Aplica-se ao caso de um meio
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 407

homogêneo e isotrópico a seguinte versão da equação 3.6.2:


 2
xg 0 + x s 0
x− 2 2
2 vH τM
2 2
+  2 = 1 (3.6.5)
v H t0 2 2 x g 0 − x s 0
vH t0 −
2

onde x é a coordenada horizontal da superfı́cie aplanática, a qual é representada em função


do tempo migrado, τM , enquanto vH é a metade da velocidade de propagação do meio e o
par (t0 , xg0 ) representa a posição de um ponto da difração no registro do agrupamento CS.
Ou seja, xg0 é a coordenada horizontal de um receptor especı́fico. Desta forma, percebe-se
que (xg0 + xs0 )/2 corresponde à coordenada do ponto médio entre a fonte e o receptor,
enquanto (xg0 − xs0 )/2 é a metade do afastamento fonte-receptor.
Para ilustrar a cinemática da migração de um agrupamento CS, construiu-se o exemplo
da Figura 3.47, na qual se vêem as geometrias dos seguintes elementos: (1) uma difração,
D; (2) a curva, N , que conecta a base das superfı́cies aplanáticas associadas aos pontos
da difração, curva esta obtida através da aplicação da correção de NMO à difração,
acompanhada do posicionamento do resultado no ponto médio entre a fonte e o receptor 39 ;
(3) três superfı́cies aplanáticas particulares, uma delas correspondente ao afastamento
fonte-receptor igual a zero.

0
C
A
B
Tempo (ms)

N
500 b

a
D
1000 c

0 500 1000 1500 2000


Afastamento fonte−receptor (m)

Figura 3.47: Localização de um difrator em um agrupamento CS com base nos


tempos de registro da difração correspondente. As letras D e N indicam a difração
antes e depois da correção de NMO. Os pontos a, b e c foram usados para se calcular
as superfı́cies aplanáticas A, B e C, respectivamente. A velocidade do meio é igual
a 2000m/s.

Observe-se, na Figura 3.47, que o difrator é localizado no cruzamento das três su-
perfı́cies aplanáticas, no tempo vertical 2zB /v = 0.25s, ou τB = 0.25s, e na coordenada
39
Este posicionamento explica porque, nos afastamentos fonte-receptor menores do que zero incluı́dos
na figura, os tempos da curva N são maiores do que os da curva D.
408 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

horizontal xB = 625m. Na figura, o papel da correção de NMO torna-se claro quanto se


analisa a relação entre as três superfı́cies aplanáticas geradas e a curva N . Em particular,
destaca-se a redução no deslocamento lateral entre cada ponto da difração e a base da su-
perfı́cie aplanática correspondente, à medida em que diminui o afastamento entre a fonte
e o receptor. No limite em que este afastamento é igual a zero, não ocorre deslocamento
— seja lateral, seja vertical — já que a correção de NMO torna-se igual a zero.
A Figura 3.47 pode ser usada como ilustração da seguinte descrição geométrica da
migração de um agrupamento CS: cada amostra registrada é deslocada para o ponto médio
entre a fonte e o receptor, de onde ela é espalhada ao longo de uma superfı́cie que apresenta
a mesma geometria da migração de agrupamentos CO. Assim, nos termos da geometria
da migração baseada na construção de frentes de onda, a migração de agrupamentos CS é
similar à migração de agrupamentos CO, bastando levar em conta que, no primeiro caso,
o afastamento fonte-receptor não é constante. Também à semelhança do que ocorre com
a migração de um agrupamento CO, a correção de NMO é um componente intrı́nseco,
embora não explı́cito, da migração de agrupamentos CS.
O impacto desses conceitos sobre a geometria envolvida na migração de uma reflexão
pode ser analisado com base na Figura 3.48. Representou-se, na figura, a geometria
dos seguintes elementos: (1) uma reflexão registrada, R; (2) a correspondente reflexão
migrada, M , cujo mergulho é de 300 ; (3) a difração cuja geometria apresenta ápice coinci-
dente com o da reflexão, D; (4) a superfı́cie aplanática correspondente ao ápice da reflexão
obtida, A; (5) a superfı́cie aplanática correspondente ao afastamento fonte-receptor igual
a zero, B; (6) a reflexão registrada após correção de NMO, posicionada no ponto médio
entre a fonte e o receptor, N e; (7) a difração após a mesma operação, DN .
Observe-se que a Figura 3.48 obedece a padrões similares aos constatados na Figura
3.44. Observe-se ainda a diferença na forma das superfı́cies aplanáticas correspondentes
aos dois afastamentos fonte-receptor escolhidos como exemplo, um cı́rculo no caso da
superfı́cie B, uma elipse no da A. Outro aspecto a destacar é a semelhança nas formas
da reflexão, R, e da difração, D, semelhança esta que é mais acentuada no caso de um
refletor horizontal. A Figura 2.35, na página 129, pode ser usada para ilustrar melhor
esta idéia.
A semelhança mencionada é responsável por uma importante caracterı́stica da mi-
gração em tempo de agrupamentos CS: a concentração de energia em torno da posição cor-
respondente ao ápice da geometria de cada reflexão. Para ilustrar o fenômeno, construiu-
se a Figura 3.49, a qual representa o resultado da migração em profundidade de uma re-
flexão — produzida sinteticamente por um refletor mergulhante em um meio homogêneo
e isotrópico —, reflexão esta “registrada” em um agrupamento CS. Percebe-se, na fi-
gura, que o refletor mergulhante é melhor imageado à esquerda da coordenada horizontal
da fonte, em torno da posição de fase estacionária40 , na qual se observa a igualdade
∂t/∂xg = 0. Nos termos da migração Kirchhoff, este é um resultado devido ao fato de
que, em um agrupamento CS, o empilhamento ao longo das difrações responsáveis por
uma reflexão se aproxima de uma soma ao longo da própria reflexão.

40
No caso de um refletor horizontal, em um meio também isotrópico, esta posição coincide com a
coordenada horizontal da fonte.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 409

M
100 d A
B
Tempo (ms)

DN
a
200 b
D
R
300
N

400
−400 −300 −200 −100 0 100 200 300
Afastamento fonte−receptor (m)

Figura 3.48: Geometria envolvida na migração em tempo de uma reflexão (R),


correspondente a um refletor com ângulo de mergulho de 30 0 (M ), registrada em
um agrupamento CS. A velocidade do meio é igual a 2000m/s e a profundidade do
refletor, na posição da fonte, é igual a 250m, ou, em termos do tempo migrado,
0.25s. Os pontos a, b e d foram usados na construção das superfı́cies aplanáticas A
e B e da difração D. As curvas N e DN correspondem à reflexão e à difração após
a correção de NMO.

O conceito de aquisição submergente


Na construção da Figura 3.47, o objetivo explı́cito foi o de representar geometricamente
a localização de um difrator em um agrupamento CS, usando-se a curva tempo-distância
que define a difração correspondente, a qual foi obtida na superfı́cie (z = 0). Admita-
se agora que se deseja estimar, a partir do mesmo tipo de agrupamento, qual seria a
geometria da difração no caso em que se aprofundam os receptores, sem alterar a posição
da fonte, ou seja, sem levar em conta o tempo entre a fonte e o difrator. Em outras
palavras, pergunta-se qual seria a geometria da difração se os receptores estivessem em
outra profundidade como, por exemplo, z = ∆z, onde ∆z é um valor qualquer maior do
que zero.
Aplicando-se, à propagação direta, a forma recursiva do princı́pio de Huygens, assume-
se que, no trajeto ascendente de uma onda, cada posição da superfı́cie horizontal situada
na profundidade ∆z atua como uma fonte secundária de energia, a qual dá origem às
ondas envolvidas no trajeto entre z = ∆z e z = 0. No caso, a curva tempo-distância
correspondente, associada a um evento qualquer, em um meio homogêneo e isotrópico, é
definida com base na seguinte expressão:
s 2  2
∆z x − x0
t = t0 + + (3.6.6)
v v
onde v é a velocidade de propagação, enquanto t e x definem o tempo e a coordenada
410 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.49: Resultado da migração bidimensional em profundidade de um agru-


pamento CS resultante da resposta sı́smica filtrada (8-40Hz) a uma interface mer-
gulhante (200 ), em função do afastamento fonte-receptor (em metros). Parâmetros:
v = 2000m/s e ∆xg = 25m. Os afastamentos fonte-receptor variaram entre −1950m
e 2050m. Na posição da fonte, a profundidade do refletor é igual a 1000m. Ob-
servação: a forma hiperbólica definida por amplitudes pontuais representa a geome-
tria da reflexão, após conversão de tempo para profundidade.

horizontal correspondentes a um evento secundário, gerado em um dado tempo t0 na


posição (x0 , ∆z) e “registrado” na superfı́cie.
Observe-se na expressão 3.6.6 que, como o meio é homogêneo no intervalo entre z =
∆z e z = 0, uma mesma curva tempo-distância é associada a todos os sinais que atingem
a superfı́cie definida por z = ∆z. Ainda que o meio não seja homogêneo, uma mesma
curva tempo-distância é aplicável a todos os sinais que atingem uma mesma coordenada
horizontal x = x0 . Entretanto, neste caso, a referida curva não é necessariamente definida
por uma expressão analı́tica.
A aplicação da equação 3.6.6 à extrapolação inversa, ou seja, ao processo de obtenção
da geometria de uma difração na profundidade z = ∆z, a partir de uma difração regis-
trada na superfı́cie, é relativamente simples. De acordo com a discussão apresentada no
item 3.4, basta inverter os papéis dos tempos t e t0 e levar em conta que o tempo de cada
evento registrado deve ser reduzido, para que se avalie sua influência na profundidade ∆z.
O resultado é a seguinte igualdade:
s 2  2
∆z x − x0
t = t0 − + (3.6.7)
v v

onde t e x definem o tempo e a coordenada horizontal correspondentes à posição para


onde o sinal obtido nas coordenadas (t0 , x0 ) é espalhado.
Para ilustrar a extrapolação inversa a um agrupamento CS, construiu-se o exemplo
da Figura 3.50. Vêem-se, na figura, as geometrias de duas difrações, uma registrada na
superfı́cie e a outra equivalente à que seria registrada em uma profundidade igual à metade
da profundidade do difrator (no caso, ∆z = 125m). Vê-se também, na figura, a geometria
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 411

500

750
Tempo (ms)

1
1000 2

500 1000 1500 2000


Coordenada do receptor (m)

Figura 3.50: Geometria da extrapolação inversa de uma difração, em um agru-


pamento CS, simulando o aprofundamento dos receptores da superfı́cie (difração 1)
para a profundidade z = 125m (difração 2). Coordenadas do difrator: z B = 250m,
xB = 1250m. A velocidade do meio é igual a 2000m/s e a fonte se situa na co-
ordenada x = 0. Cada um dos quatro pontos destacados na difração 1 representa
a posição usada no cálculo do operador de extrapolação inversa cuja geometria é
representada verticalmente acima dele.

dos operadores de extrapolação que permitiriam a obtenção da segunda difração a partir


da primeira, geometria esta que, a menos da posição em que o operador é aplicado, não
varia. Deve-se destacar, na figura, o fato de que o operador de extrapolação, mesmo
construı́do com base em um ponto da difração a extrapolar, não a corta. Em vez disso,
ele é posicionado, no sismograma resultante do processo, com um deslocamento vertical
definido pela equação 3.6.7. Ressalte-se ainda que a geometria de “hipérbole invertida”
do operador de extrapolação inversa é devida ao fato de que as duas superfı́cies envolvidas
— a de registro e a de extrapolação — são horizontais e, além disso, o tempo é variável.
Se os dados fossem representados em função da profundidade, a geometria do processo
de extrapolação seria similar à apresentada na Figura 3.33 (página 360).
O significado da extrapolação inversa de sismogramas pode se tornar mais claro com
base em uma análise da Figura 3.51. Na construção da figura, usaram-se as mesmas
difrações da Figura 3.50 e se buscou representar, através da geometria dos operadores
de extrapolação direta e inversa, como a energia é transferida de uma difração para a
outra. Para facilitar a visualização, usou-se o mesmo truque da Figura 2.24 (página 112):
representaram-se os ápices das duas difrações na posição correspondente ao registro feito
na superfı́cie, ou seja, a difração 2 da figura foi toda deslocada para baixo de acordo com
o tempo ∆z/v = 0.0625s. Nestas condições, percebe-se que, aplicando-se a equação 3.6.6
412 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

700

800

1
Tempo (ms)

900 a

b
1000

2
1100

1200
400 800 1200 1600
Coordenada do receptor (m)

Figura 3.51: Relação entre as duas difrações da Figura 3.50 e a geometria dos
operadores de extrapolação direta e inversa. A difração 2 foi toda deslocada para
baixo de acordo com o tempo 0.0625s, de forma a fazer com que seu ápice coincidisse
com o ápice da difração 1.

ao ponto a e levando em conta o deslocamento de tempo mencionado, obtém-se uma


forma hiperbólica que é tangente à difração 1 no ponto b. Similarmente, aplicando-se
a equação 3.6.7 ao ponto b, obtém-se uma forma hiperbólica invertida que é tangente à
difração 2 no ponto a.
O leitor atento deve ter observado que, ao contrário do que ocorre com os operadores
de migração das figuras 3.43 e 3.47, as diferentes replicações do operador de extrapolação
da Figura 3.50 não se cruzam em uma única posição. Isto significa que o difrator res-
ponsável pela difração da figura ainda não foi localizado. Desta forma, o resultado do
processo ilustrado nas figuras 3.50 e 3.51 é ainda uma difração mas — como sugere a
expressão ”extrapolação inversa” — uma difração equivalente à que seria obtida se os re-
ceptores fossem deslocados para baixo, no sentido inverso ao da propagação direta. Esta
observação representa a base para a discussão da migração baseada no conceito de survey
sinking, ou, em uma tradução livre, “aquisição submergente” (ver Claerbout, 1985).
A aplicação mais simples do conceito de aquisição submergente é a versão recursiva
da migração de agrupamentos CS. Para ilustrar a idéia, suponha-se que, na construção
da Figura 3.50, a profundidade ∆z tivesse sido exatamente igual à do difrator, ou seja,
∆z = zB = 250m. Neste caso, é forçoso concluir, com base na discussão dos parágrafos
anteriores, que os operadores de extrapolação inversa, gerados a partir de cada ponto da
difração registrada na superfı́cie, se cruzariam em um único ponto, situado na coordenada
horizontal do difrator e no tempo correspondente ao trajeto entre o difrator e a fonte,
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 413

ts0 . Aplica-se ao caso especı́fico da difração a seguinte versão da equação 3.6.7:


s  2 s 2  2
 z 2 xB − x 0 ∆z x − x0
B
t = t s0 + + − + (3.6.8)
v v v v

Assim, na posição em que x = xB , tem-se, para todos os valores de x0 , a igualdade t = ts0 ,


já que zB = ∆z.
Nas condições descritas, o difrator já teria sido localizado, uma vez que um dos re-
ceptores “aprofundados” estaria situado exatamente sobre ele e, além disso, o tempo t s0
poderia ser facilmente estimado. Neste caso, para completar o processo de migração,
bastaria: (1) aplicar ao resultado o deslocamento de tempo t − ts0 , o que, no caso, equi-
valeria a deslocar a amostra obtida para o tempo t = 0 e; (2) reposicionar o resultado do
passo anterior na profundidade ∆z, ou no tempo τM = 2∆z/v, do sismograma migrado.
Implı́cita nesta seqüência está a seguinte condição de imagem: o difrator “explode” no
tempo correspondente ao trajeto entre ele e a fonte (ver Keho e Beydon, 1988).
A aplicação rigorosa do conceito de aquisição submergente implica aprofundar não
somente os receptores mas também as fontes. Caracteriza-se assim o chamado reposicio-
namento do datum (em inglês, redatuming), de acordo com o qual os dados sı́smicos são
deslocados para superfı́cies virtuais de registro (ver Berryhill, 1979; Schultz e Sherwood,
1980). Isoladamente, esta técnica é aplicada com duas finalidades principais: (1) tra-
tar na forma de extrapolação de campos de onda os grandes deslocamentos de tempo
e; (2) substituir a velocidade do meio por uma velocidade mais adequada aos processos
subseqüentes, em especial a migração.

Os papéis da velocidade e da multiplicidade

Independentemente do tipo de agrupamento de dados sı́smicos submetido à migração


pré-empilhamento, é fácil induzir, com base na discussão apresentada neste e no item
3.4, que o campo de velocidades afeta o processo através dos seguintes fatores: (1) a
focalização do sinal em cada agrupamento; (2) a posição, também em cada agrupamento,
do resultado da focalização e; (3) a posição relativa, no conjunto de agrupamentos, do
sinal focalizado.
Para ilustrar a discussão, considere-se a migração Kirchhoff de agrupamentos CO, em
tempo ou em profundidade. Como em qualquer aplicação dessa famı́lia de algoritmos,
somam-se, após as devidas correções, as amplitudes obtidas ao longo da curva tempo-
distância que caracteriza cada difração. De acordo com a discussão apresentada no item
3.4, induz-se que a mesma curva poderia, nos dois tipos de migração, ser obtida com base
no traçamento de raios, em vez de expressões analı́ticas como a 3.6.1 ou qualquer uma
das apresentadas no item 3.1. Obviamente, haveria necessidade de tratar separadamente
o trajeto entre a fonte e o difrator e o trajeto entre este e o receptor, independentemente
da técnica usada na computação dos tempos de trânsito.
É no passo seguinte do processo que se detecta a principal diferença entre a migração
em tempo e a migração em profundidade: na migração em tempo, o resultado da soma
das amplitudes corrigidas é posicionado nas coordenadas que correspondem ao ápice da
difração, deslocado pelo equivalente implı́cito da correção de NMO; na migração em pro-
414 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.52: Difrações sintéticas correspondentes a dois afastamentos fonte-


receptor distintos (h = 0m na difração superior e h = 1000m na inferior). O modelo
usado é o da Figura 3.28, o pulso sı́smico é um filtro passa-banda (8-40Hz) e as
duas difrações foram superpostas na forma de imagem (não houve soma de ampli-
tudes), sem prévia correção de NMO. O sı́mbolo • indica a coordenada horizontal
do difrator.

fundidade, o resultado da soma é posicionado nas coordenadas do difrator41 . Não é difı́cil


induzir que, a menos da correção de NMO, a influência da velocidade sobre a focalização
do sinal e o subseqüente posicionamento do resultado em cada agrupamento CO indi-
vidual pode ser analisada de forma semelhante à conduzida no item 3.4. Entretanto, a
velocidade afeta também, e de forma mais óbvia, a correção de NMO, particularmente
quando se leva em conta a multiplicidade de afastamentos fonte-receptor normalmente
disponı́veis.
A Figura 3.52 representa uma ilustração simples de como o campo de velocidades
influencia o registro de múltiplos afastamentos CO. Vê-se, na figura, a superposição,
na forma de imagem, das difrações correspondentes a dois afastamentos fonte-receptor
distintos, ambas geradas sinteticamente com base no modelo da Figura 3.28 (página 356).
O resultado obtido apresenta as seguintes caracterı́sticas: (1) os ápices das duas difrações
não ocorrem na mesma coordenada horizontal; (2) nenhum dos dois ápices apresenta
coordenada horizontal coincidente com a do difrator e; (3) as duas difrações apresentam
formas que fogem da prescrita pela equação 3.6.1. Todas essas são distorções relacionadas
com a variação lateral de velocidade presente no modelo da Figura 3.28.
A Figura 3.52 é representativa dos principais problemas da migração pré-empilha-
mento. Considere-se, inicialmente, a migração em tempo das mesmas difrações. Neste
particular, percebe-se que a utilização da equação 3.6.2 está fadada ao insucesso, já que
o meio não é homogêneo. Assuma-se agora que a curva tempo-distância que descreve
41
Ressalte-se que, mesmo a profundidade sendo convertida para tempo vertical, o último processo ainda
é caracterizado como migração em profundidade. Neste caso, percebe-se facilmente que, se a velocidade
não variar lateralmente, os resultados dos dois processos devem ser iguais, se ambos forem representados
em função do tempo vertical, ou da profundidade.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 415

Figura 3.53: Resultado da migração em profundidade de um agrupamento CO,


no caso em que os dados originais são constituı́dos por um impulso unitário filtrado
(8-40Hz) e a velocidade intervalar varia, da esquerda para a direita, entre 1520m/s
e 2525m/s (2000m/s na coordenada horizontal igual a 5000m). Parâmetros: h =
625m, ∆x = 25m. O impulso unitário usado situa-se na coordenada horizontal
x = 5000m e no tempo t = 808ms. As posições da fonte e do receptor são indicadas
pelas letras s e g.

cada difração seja calculada com base no traçamento de raios. Neste caso, se a migração
em tempo fosse a opção escolhida e o campo de velocidades fosse o correto, as duas
difrações seriam bem colapsadas nas coordenadas horizontais dos ápices correspondentes.
Entretanto, como se percebe na Figura 3.52, os dois ápices ocorrem em coordenadas
horizontais diferentes entre si e da coordenada horizontal do difrator. Induz-se assim
que, no empilhamento subseqüente dos traços resultantes, a multiplicidade não implicaria
qualquer ganho de qualidade. É até mesmo possı́vel que, em situações como esta, o
empilhamento leve à deterioração das imagens individuais obtidas.
A situação ilustrada através da Figura 3.52 pode, obviamente, ser resolvida através
da migração em profundidade. Neste caso, se o campo de velocidades fosse o correto, as
duas difrações seriam colapsadas de forma adequada e, além disso, os correspondentes
resultados seriam posicionados — em ambos os casos — nas coordenadas do próprio di-
frator (xB = 5400m e zB = 2000m, ou τB = 1270ms). Induz-se assim que o empilhamento
subseqüente seria muito mais bem sucedido do que no caso em que se opta pela migração
em tempo.
Na Figura 3.53, vê-se um exemplo simples de como o operador de migração de agru-
pamentos CO depende da variação lateral de velocidade. Para tornar a análise mais
consistente, assumiu-se um modelo em que a velocidade é constante na direção verti-
cal e varia, de forma linear, ao longo da direção horizontal, o que possibilitou o cálculo
analı́tico dos tempos de trânsito (ver os subitens 2.5.2 e 3.1.2). Percebe-se, na figura, que
as posições horizontais do impulso unitário original e da parte mais profunda do operador
não são coincidentes, o que é uma caracterı́stica de meios em que a velocidade varia na
direção horizontal. Uma inspeção da Figura 3.3, na página 286, facilita a compreensão
do tema.
Com base nesta discussão, pode-se afirmar que o sucesso da migração de agrupamen-
tos CO depende da seguinte e importante caracterı́stica: se for desprezada a influência da
variação do coeficiente de reflexão em função do ângulo de incidência, um determinado
416 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

difrator, ou ponto de um refletor, caracterizado através da migração, deve ter a mesma


amplitude e estar situado nas mesmas coordenadas, em todos os agrupamentos CO migra-
dos. Nestas condições, a variação de amplitude com o ângulo de incidência seria mantida
no resultado final do processo, favorecendo a análise de AVO.
No caso da migração de agrupamentos CS, a análise do tema adquire novos contornos.
No que diz respeito à posição do resultado obtido, um mesmo difrator, ou ponto de um
refletor, deve também estar situado nas mesmas coordenadas, nos diversos agrupamentos
CS cujos limites geográficos tenham sido amplos o suficiente para iluminá-lo. Quanto
à amplitude, a concentração espacial de energia que, no caso de um refletor horizontal,
se dá em torno da coordenada horizontal da fonte, afeta bastante a análise do resultado
obtido. Neste caso, a análise de AVO exigiria tratamento adicional dos dados.
Percebe-se assim que, na migração pré-empilhamento, a multiplicidade envolve obje-
tivos similares aos que originaram a técnica CDP: a obtenção de múltiplos registros de um
ponto comum em profundidade. Na verdade, sabe-se que esta é uma tarefa muito difı́cil,
o que explica a mudança do termo “agrupamento CDP” para o menos ambicioso “agru-
pamento CMP”, adotada já há alguns anos. Tendo em vista esta restrição e levando em
conta que a migração pré-empilhamento representa um processo de imageamento da sub-
superfı́cie, passou-se a denominar agrupamento CI (do inglês Common Image) a coleção
de traços sı́smicos que resultam da migração de diferentes agrupamentos e que apresentam
em comum as mesmas coordenadas horizontais42 .
Implı́cita no conceito está ainda a premissa de que, a cada profundidade de um agru-
pamento CI, deve corresponder um conjunto de amplitudes proporcionais ao coeficiente
de reflexão de um mesmo ponto em subsuperfı́cie, na forma variável com o ângulo de
incidência. Esta é também a linha de raciocı́nio que leva à idéia de agrupamentos de
ângulo de incidência comum, CA (Common Angle) ou agrupamentos de parâmetro de
raio comum (ver o item 3.7).
Esta discussão permite induzir que, nas aplicações práticas da migração pré-empi-
lhamento, um tema fundamental é a obtenção de velocidades que propiciam a melhor
focalização do sinal em uma profundidade comum a todos os traços do agrupamento CI.
Com o objetivo de ilustrar a importância do tema, preparou-se a Figura 3.54, a qual
representa os agrupamentos CI obtidos com três diferentes velocidades de migração em
profundidade. Para a geração da figura, optou-se por um meio homogêneo e isotrópico,
no qual existe apenas um refletor horizontal isolado, e pela migração de agrupamentos
CO. Além disso, o coeficiente de reflexão não varia com o ângulo de incidência.
Observe-se que, nas condições em que se gerou a Figura 3.54, um erro na velocidade
de migração não afeta substancialmente a amplitude e a fase do sinal focalizado, o que se
deve ao fato de que, no caso, a reflexão é horizontal e o meio é homogêneo e isotrópico.
Por outro lado, a velocidade errada introduz duas distorções claras. Em primeiro lugar,
a presença de NMO residual, a qual apresenta forma similar à observada na aplicação da
técnica CDP. Em segundo lugar, o erro na profundidade correspondente ao afastamento
fonte-receptor igual a zero.
A influência da velocidade sobre a declividade e a profundidade absoluta do refletor,
no agrupamento CI, pode ser bem caracterizada pelo resultado do empilhamento dos três
42
Registrem-se ainda as denominações “agrupamento CRP” (Common Reflection Point) e “agrupa-
mento CFP” (Common Focus Point) as quais, mesmo envolvendo diferentes algoritmos, podem ser
consideradas variações em torno da mesma idéia.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 417

400m

500m

600m

400m

500m

600m

0 1000 S
400m

500m

600m

0 500 1000 S
Figura 3.54: Três versões de um agrupamento CI, cada um deles obtido com uma
diferente velocidade de migração em profundidade (1900m/s, no alto, 2000m/s, no
centro, e 2100m/s, embaixo). Os dados usados foram agrupamentos CO, corres-
pondentes a um único refletor horizontal e obtidos sinteticamente com a velocidade
de 2000m/s. A letra S identifica o resultado do empilhamento dos traços sı́smicos
migrados. A coordenada horizontal é a metade do afastamento fonte-receptor, h,
em metros.

conjuntos de traços sı́smicos da Figura 3.54, indicado pela letra S. Percebe-se, no caso,
que: (1) o resultado do empilhamento correspondente à migração com a velocidade correta
apresenta máxima amplitude absoluta igual à de todos os traços sı́smicos migrados, mas
conteúdo de freqüências intermediário; (2) em termos de amplitude, o empilhamento do
resultado da migração com as velocidades erradas é caracterizado pelo espalhamento do
sinal, gerando um “borrão” tênue; (3) no caso da velocidade mais baixa do que a correta,
este espalhamento é distribuı́do acima da profundidade correta, enquanto o oposto se dá
com a velocidade mais alta e; (4) se o resultado fosse representado em função do tempo
migrado, o sinal empilhado estaria, nos dois casos, mais próximo do tempo esperado. A
Figura 3.5 (página 288) pode ser utilizada para ilustrar a última afirmação, uma vez
que, nas condições em que ela foi construı́da, a migração pré-empilhamento levaria a um
resultado equivalente.
Ainda que associada a um meio homogêneo, a Figura 3.54 pode ser utilizada para se
induzir o que ocorre no caso de um meio em que a velocidade varia lateralmente. Em pri-
meiro lugar, se a variação na velocidade envolvesse comprimentos de onda muito maiores
do que o máximo afastamento fonte-receptor do agrupamento CI, o resultado não seria
significativamente alterado. Entretanto, se a velocidade de migração variasse em inter-
418 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

valos de distância menores do que o mencionado e a migração não levasse este fenômeno
em consideração, os refletores não somente não se alinhariam na profundidade correta
mas, além disso, incluiriam uma sinuosidade que não se vê na Figura 3.54. O resultado
da migração seria um sinal de má qualidade, situado em uma posição inadequada, neste
caso tanto vertical quanto horizontalmente, o que pode ser depreendido de uma análise
da Figura 3.52.
A Figura 3.54 pode também ser usada para ilustrar um problema importante da
migração pré-empilhamento: o efeito de estiramento. Trata-se, como sugere o nome, do
aumento no comprimento do pulso sı́smico associado a cada refletor, gerado em função
da seguinte caracterı́stica da correção de NMO, a qual representa uma operação implı́cita
na migração pré-empilhamento: o intervalo de tempo entre duas amostras de um traço
sı́smico não migrado, dada por ∆t, é aumentado, após a migração, para ∆τM , onde τM
é o tempo vertical medido nos dados sı́smicos migrados43 . A intensidade do fenômeno,
que é similar ao observado na aplicação convencional da técnica CDP, é inversamente
proporcional à banda espectral disponı́vel e à relação ∂t/∂z, onde z é a profundidade
do sinal imageado e t é o tempo original (ver a equação 3.1.14 e Tygel et al., 1994).
Em conseqüência, o efeito de estiramento é tão mais importante quanto maior for o
afastamento fonte-receptor, 2h, assim como pode se tornar tão mais intenso quanto maior
for a variação vertical de velocidade.
Outro aspecto a analisar diz respeito à abertura do operador de migração, conceito
este explı́cito na forma de um parâmetro da migração Kirchhoff e definido pelo dobro
da máxima distância lateral entre o ponto médio onde se situa a amostra a espalhar e o
ponto médio até onde ela é espalhada. Comparando-se as figuras 3.25 e 3.45 (páginas
348 e 405), poder-se-ia induzir que, para se migrar corretamente a reflexão associada
a um refletor de alto ângulo de mergulho, a abertura do operador de migração deveria
ser controlada pelo valor do afastamento fonte-receptor. Na verdade, a associação entre
abertura do operador de migração e afastamento fonte-receptor é indireta, na medida em
que apenas a coordenada do ponto médio está envolvido no processo. No caso em que o
parâmetro que controla a abertura do operador de migração é o ângulo de mergulho, não
existe confusão, uma vez que as distâncias não estão diretamente envolvidas, mas apenas
a máxima declividade do operador, em relação à direção vertical, na posição do refletor.
Os principais conceitos apresentados até aqui, embora concentrados na migração em
profundidade, se aplicam, com pequenos ajustes, à migração em tempo. Um tema em
particular merece comentários adicionais: o da velocidade de migração. Para isto, pode-
se fazer uso da análise das deficiências da técnica CDP, conduzida no item 3.1, com
destaque para a Figura 3.5 (página 288), na qual os dois agrupamentos CMP apresentados
poderiam ser vistos como agrupamentos CI correspondentes a um refletor horizontal.
Com base nesta analogia, poder-se-ia dizer que, em cada afastamento fonte-receptor do
resultado apresentado na parte de baixo da figura, o sinal foi bem focalizado. Entretanto,
a posição relativa não foi adequada.
Nestas condições, não é difı́cil concluir que a velocidade de migração em tempo deve
ser estimada com muito cuidado, levando em conta não somente a focalização do sinal
43
A correspondente deformação no espectro de freqüências foi discutida no item 3.1, com destaque
para o fato de que, na presença de um pulso sı́smico de espectro de amplitude plano e uma amostragem
espacial e temporal suficientemente densa, o efeito de estiramento não representaria um problema mas,
sim, uma solução.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 419

mas também o empilhamento subseqüente. Esta é uma recomendação compatı́vel com


a idéia de privilegiar a boa definição da curva tempo-distância nas posições vizinhas ao
ápice de cada difração e, principalmente, com a inclusão de pelo menos um parâmetro
adicional na definição do campo de velocidades. Um exemplo: a equação 3.1.19 (página
292).

3.6.2 A correção de DMO


A versão original da correção de DMO, também conhecida como continuação de offset
(afastamento fonte-receptor), ou (indevidamente) como migração parcial, foi proposta
por J. Sherwood e recebeu, na época, o nome de devilish (in Claerbout, 1985). Neste
processo, corrige-se o posicionamento dos refletores de tal forma que, no que diz respeito
à influência isolada do mergulho, o ponto médio comum passa a equivaler realmente
ao CDP. Como resultado, a técnica CDP torna-se, pelo menos teoricamente, aplicável
a meios em que o mergulho das interfaces está presente. Criam-se também condições
para a aplicação de técnicas alternativas à migração pré-empilhamento, como a chamada
pseudo-migração pré-empilhamento.
Matematicamente, a correção de DMO pode ser definida como o processo que converte
uma seção sı́smica obtida em um afastamento fonte-receptor arbitrário na correspondente
seção de afastamento igual a zero. Uma das formas de se apresentar o conceito, intro-
duzida por Deregowski e Rocca (1981), consiste em dividir a correção de DMO em duas
etapas. Inicialmente, migra-se a seção de afastamento fonte-receptor arbitrário (CO),
no que resulta a teoricamente correta distribuição dos refletores e suas amplitudes. Em
seguida, submete-se o resultado obtido à modelagem sı́smica, assumindo-se agora que o
afastamento fonte-receptor é igual a zero. Ou seja, como a migração pré-empilhamento
resulta em dados corretamente migrados e isentos de NMO, a modelagem de afastamento
nulo44 (ZO) certamente resultará na seção de afastamento nulo equivalente à seção de
afastamento arbitrário original.
A Figura 3.55, inspirada em uma figura do livro de Claerbout (1985), foi construı́da
com o fim de ilustrar o conceito. Vê-se, na figura, o resultado da modelagem ZO apli-
cada a alguns traços sı́smicos resultantes da migração CO de um impulso unitário. Vê-se
também a geometria (apenas a geometria) correspondente à migração CO do mesmo im-
pulso unitário. Observe-se que um número restrito de traços migrados foi suficiente para
delinear, no centro da figura, uma forma de onda côncava para cima, a qual corresponde
a uma versão filtrada — e parcial — do operador de DMO. Desta forma, o operador
de DMO é visto como o resultado da convolução entre os operadores de migração pré-
empilhamento CO e de modelagem ZO.
A sequência “migração pré-empilhamento CO + modelagem ZO” deve ser entendida
como um recurso lógico, voltado para ilustrar a atuação do operador de DMO. A real
correção de DMO, ainda que implicitamente equivalente à sequência descrita, é muito
mais simples, já que, como se percebe na Figura 3.55, o operador correspondente é
relativamente curto. Adicionalmente, como a migração pré-empilhamento CO envolve
implicitamente a correção de NMO, pode-se induzir que a correção de DMO deve ser
precedida da correção de NMO. Nestas condições, a correção de DMO poderia ser vista
44
Neste caso, modelagem é sinônima da chamada “demigração”, ou seja, não se incluem no processo
fatores de propagação além daqueles tratados pela migração.
420 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.55: Resultado da modelagem de afastamento nulo aplicada a traços


sı́smicos esparsos resultantes da migração pré-empilhamento CO de um impulso
unitário, seguida de filtragem temporal (8-40Hz). Parâmetros: ∆x = 25m, v =
4000m/s, h = 600m. Observação: a forma elı́ptica definida por amplitudes pontuais
representa a geometria resultante da migração pré-empilhamento CO.

como uma convolução bidimensional entre uma seção de afastamento fonte-receptor co-
mum já submetida à correção de NMO e uma coleção de operadores similares ao obtido na
construção da Figura 3.55. Em termos práticos, esta convolução representa um processo
semelhante ao da migração por frentes de onda, caracterı́stica esta que pode se tornar
evidente com base em uma análise dos aspectos cinemáticos do conceito.
A cinemática da correção de DMO é baseada na relação entre o tempo de reflexão
obtido em uma seção ZO e o tempo de reflexão obtido em uma seção CO, após a correção
isolada de NMO. Esta relação, que foi deduzida no item 3.1, permite apresentar da
seguinte forma a curva tempo-distância correspondente ao operador de DMO:

t2N (x − x0 )2
1= 2 + (3.6.9)
t0 h2

onde h é metade do afastamento fonte-receptor, tN é o tempo do operador relativo a cada


coordenada horizontal do ponto médio entre a fonte e o receptor, x, enquanto t0 e x0
representam a posição em que o operador apresenta declividade igual a zero.
Para discutir a aplicação da equação 3.6.9, é conveniente analisar a Figura 3.1 (página
283), no contexto de uma seção de afastamento fonte-receptor comum. Neste domı́nio, o
trajeto indicado na figura pela reta RN pode ser associado não apenas ao tempo afetado
pelo mergulho no ponto médio situado na posição M mas também ao tempo correto
no ponto médio situado na posição N . Na dedução da equação 3.1.12, apresentada no
item 3.1, esta observação não foi levada em conta, já que a análise foi concentrada no
deslocamento puramente vertical da reflexão em um único agrupamento de ponto médio
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 421

100
Tempo (ms)

200

N
300

400 M

Z
500
0 400 800 1200 1600
Coordenada horizontal do ponto médio (m)

Figura 3.56: Geometria de uma mesma reflexão nas seções de afastamento fonte-
receptor comum após correção de NMO (N ), de afastamento nulo (Z) e migrada em
tempo (M ), juntamente com a geometria do operador de DMO em três posições.
Parâmetros: v = 2000m/s, h = 625m e mergulho do refletor igual a 30 0 .

comum (CMP). Já na aplicação da equação 3.6.9, leva-se em conta tanto o deslocamento
vertical quanto o lateral, de forma a admitir que um único par (t0 , x0 ), observado em uma
seção CO após correção de NMO, pode ser associado a uma famı́lia de pontos (t N , x) na
seção ZO, definida na forma da equação 3.6.9.
Com base nestas idéias, induz-se que a correção de DMO implica espalhar a amostra
obtida na posição (t0 , x0 ) ao longo da curva tempo-distância definida pela equação 3.6.9,
na qual tN varia em função de x. Usando-se a analogia com a migração por frentes de
onda, pode-se dizer que, na posição em que a referida curva tempo-distância tangencia a
reflexão obtida na seção ZO, a amostra deslocada é somada em fase com amostras oriundas
de outros pontos da reflexão, enquanto que, nas demais posições da seção resultante, o
sinal obtido tende a zero. Assim, na ausência de mergulho, a correção de DMO não
desloca a reflexão observada. O mesmo não ocorre com um evento mergulhante, que é
reposicionado nas coordenadas (tN , x).
Para ilustrar o conceito, é conveniente o recurso a um exemplo, como o da Figura
3.56, na qual se vê a geometria correspondente a uma mesma reflexão em três tipos de
seção sı́smica: (1) seção de afastamento fonte-receptor comum, após a correção isolada de
NMO (N ); (2) seção de afastamento fonte-receptor igual a zero (Z) e; (3) seção migrada
em tempo (M ). Vê-se também a geometria do operador de DMO, calculada com a
equação 3.6.9, em três diferentes posições. Na mesma figura, pode-se perceber também
uma caracterı́stica da correção de DMO: a redução na declividade da reflexão (após a
correção de NMO), ao contrário do que ocorre com a subseqüente migração em tempo.
422 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

500 N
FO
Tempo (ms)

a b
SD
1000 Z

1500

1000 1500 2000 2500 3000


Coordenada horizontal do ponto médio (m)

Figura 3.57: Geometria de uma mesma difração nas seções de afastamento fonte-
receptor comum após correção de NMO (N ) e de afastamento nulo (Z), juntamente
com as geometrias envolvidas em duas formas de aplicação do operador de DMO
(F O e SD). Parâmetros: v = 2000m/s e h = 625m. A profundidade do difrator é
250m.

O caso de uma difração pode ser ainda mais instrutivo. Na Figura 3.57, vêem-se as
geometrias de duas difrações associadas a um mesmo difrator: (1) a difração em uma
seção CO, após a correção isolada de NMO e; (2) a difração em uma seção ZO. Vê-
se também um exemplo da geometria de duas alternativas de aplicação do operador de
DMO, uma delas similar à migração por frentes de onda, FO, e a segunda similar à
migração por soma de difrações, SD (neste caso, usa-se também a equação 3.6.9, mas
fixando o tempo tN e variando o tempo t0 ). Aplicada à Figura 3.57, esta analogia tem as
seguintes interpretações: (1) a amplitude do ponto a da difração N representa o fator de
ponderação do operador F O, o qual é acumulado na seção resultante; (2) as amplitudes
coletadas na seção original, ao longo da superfı́cie SD, são ponderadas e acumuladas, na
seção resultante, no ponto b.
Os exemplos das Figuras 3.55, 3.56 e 3.57, aliados às equações 3.6.9 e 3.1.10, per-
mitem algumas interessantes observações. Em primeiro lugar, percebe-se que o operador
de DMO apresenta abertura máxima relativamente pequena e não depende diretamente
da velocidade. Além disso, o aumento no tempo e a diminuição do afastamento fonte-
receptor fazem com que o operador de DMO tenda a se tornar um impulso unitário.
Esta última caracterı́stica torna-se evidente quando se leva em conta que o máximo valor
efetivo da distância |xN − x0 |, correspondente a um evento com ângulo de mergulho igual
a 900 , é dado, de acordo com a equação 3.1.10, por 2h2 /vE t0 . Neste particular, o leitor
deve observar que, para a construção das figuras 3.56 e 3.57, escolheram-se exemplos
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 423

em que o tempo de reflexão é curto o suficiente para caracterizar bem a geometria do


operador de DMO mas não é longo o suficiente para caracterizar a variação, em função
do tempo, da máxima abertura correspondente.
Aplicada a dados sı́smicos reais, a correção de DMO em duas dimensões é feita através
da convolução bidimensional com operadores que apresentam geometria definida com base
na equação 3.6.9 e amplitude controlada por (ver, por exemplo, Deregowski e Rocca,
1981; Beasley e Mobley, 1988):
√ (1) um filtro de meia derivada anti-causal (a transfor-
mada inversa de Fourier de iω); (2) o fator de obliqüidade; (3) um termo associado ao
espalhamento geométrico e; (4) o controle de álias. Através de uma análise cuidadosa
da Figura 3.55, pode-se perceber a influência combinada desses fatores. Em particular,
deve-se notar a pequena abertura efetiva do operador.
Na forma proposta por Hale (1984), a versão espectral da correção de DMO tornou-se
muito popular. Para apresentar a idéia, imagine-se que se deseja aplicar a correção de
DMO com base na seguinte equação, deduzida no item 3.1:

t20 = t2N + h2 p2E (3.6.10)

onde pE é a vagarosidade horizontal na seção de afastamento fonte-receptor igual a zero,


ou seja, pE = 2 sen θ/vE , onde θ é o ângulo de mergulho do refletor e vE é a velocidade
de empilhamento sem a influência do mergulho.
No domı́nio tempo-distância, a aplicação da equação 3.6.10 não é direta, já que não
se conhece o valor de pE . Entretanto, ela se torna simples no domı́nio ω-Kx , onde o
parâmetro de raio pE não depende explicitamente do mergulho mas, sim, das freqüências
angulares envolvidas. Tem-se, no caso, a relação pE = Kx /ω0 , onde ω0 se refere à
frequência angular da seção corrigida de NMO+DMO.
Na aplicação da correção de DMO no domı́nio ω0 -Kx , o primeiro passo é a correção de
NMO. Em seguida, agrupam-se os dados sı́smicos na forma de afastamento fonte-receptor
comum (CO) e calcula-se a transformada de Fourier ao longo do eixo x, obtendo-se os
dados no domı́nio tN -Kx . O operador de DMO é construı́do na passagem desse domı́nio
para o domı́nio ω0 -Kx . Para isso, substitui-se pE por Kx /ω0 na expressão 3.6.10. Em
seguida, derivando-se o tempo corrigido de NMO, tN , com relação ao tempo corrigido de
NMO+DMO, t0 , e substituindo-se t0 com base na mesma expressão, obtém-se a seguinte
igualdade:
s
dtN t0 K 2 h2
= = 1 + 2x 2 (3.6.11)
dt0 tN ω0 tN

A equação 3.6.11 descreve como a variação no tempo corrigido de NMO se relaciona


à variação no tempo corrigido de NMO+DMO. Este é o conceito básico que permite a
aplicação da correção de DMO durante o próprio processo de cálculo da transformada de
Fourier, do domı́nio tN -Kx para o domı́nio ω0 -Kx . Para isto, modifica-se a equação 1.2.12
com base na expressão 3.6.11, o que leva à seguinte versão modificada da transformada
de Fourier:
Z
1
S̃(ω0 , Kx ) = S(tN , Kx ) exp (iω0 tN ) dtN (3.6.12)
A

onde S e S̃ são as transformadas de Fourier da seção de afastamento fonte-receptor nos


424 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

domı́nios tN -Kx e ω0 -Kx , enquanto A é o fator dado por


s
Kx2 h2
A= 1+
ω02 t2N

Retornando-se ao domı́nio tempo-distância com o resultado, obtém-se a seção de afas-


tamento fonte-receptor comum equivalente, no que diz respeito ao efeito do mergulho, a
uma seção de afastamento nulo45 .
A idéia da correção de DMO permite diversas generalizações. Uma delas, particular-
mente útil no condicionamento dos dados sı́smicos para a migração pré-empilhamento, é
a chamada correção de AMO (Azimuth MoveOut). Esta idéia, introduzida por Biondi
et al. (1998), consiste em se gerar uma seção sı́smica de afastamento comum em um
azimute estabelecido, com base em outra seção obtida em um azimute qualquer. Com este
conceito, pode-se, entre outros resultados, regularizar a distribuição dos traços sı́smicos
não empilhados e favorecer a migração subseqüente.
A lógica envolvida no conceito de AMO é similar à aplicada na correção de DMO. No
caso, o resultado desejado é obtido através da aplicação virtual da seqüência “migração
pré-empilhamento + modelagem de afastamento comum”. A mesma lógica faz com que,
também à semelhança da correção de DMO, o operador de AMO seja curto e parcialmente
insensı́vel à velocidade do meio.

3.6.3 Algoritmos de migração pré-empilhamento


Com base em uma leitura combinada do item 3.5 e do subitem 3.6.1, o leitor teve condições
de adquirir um razoável entendimento da cinemática da migração de dados sı́smicos não
empilhados. O mesmo não se aplica à dinâmica do processo, em particular no que diz
respeito à correção da perda de amplitude devida ao espalhamento geométrico da energia.
Este é um tema fundamental para uma boa discussão dos algoritmos de migração. Por
esta razão, justifica alguns comentários preliminares.
De acordo com o modelo do refletor explosivo, a propagação do sinal associado a
um refletor plano, em um meio homogêneo e isotrópico, ocorre na forma de uma onda
também plana, sem que ocorra espalhamento de energia. Em contrapartida, um difrator
isolado, no mesmo tipo de meio, é responsável por uma forma de onda semi-esférica que,
durante a propagação, tem sua amplitude reduzida por causa do espalhamento geométrico
da energia. Isto significa que os processos de migração baseados no modelo do refletor
explosivo corrigem as mudanças de amplitude estritamente associadas à geometria dos
refletores. Um bom exemplo dessa associação pode ser visto na Figura 2.21 (página 102),
na qual a variação lateral de amplitude é causada pela presença de um sinclinal.
Sabe-se que, em um sismograma tı́pico, a geometria das reflexões não reproduz a
forma dos refletores, mesmo em um meio homogêneo e isotrópico. Se, por um lado, esta
caracterı́stica representa uma distorção, por outro pode espelhar a distribuição real da
energia espalhada. A conseqüência imediata desta idéia é que, na migração de dados
45
O leitor observador deve ter notado a semelhança entre a linha de raciocı́nio que levou a este resultado
e a que permitiu a dedução da equação 3.5.40 (item 3.5). Trata-se de uma verdadeira fórmula heurı́stica,
introduzida por Robert Stolt.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 425

sı́smicos não empilhados, torna-se relativamente fácil corrigir de forma adequada o es-
palhamento da energia. Em alguns algoritmos, esta correção é até mesmo uma parte
intrı́nseca da migração, não sendo necessário explicitá-la.
Apesar de a teoria apresentada neste subitem ser fundamentada na integral de Ray-
leigh II, pode-se facilmente estendê-la para a aplicação das técnicas de diferenças finitas, o
que será objetivo de uma pequena parte do texto. Ao final, discutem-se alguns conceitos
complementares, entre os quais se incluem algoritmos alternativos, a migração tridimensi-
onal em duas passagens e as correções estáticas. Para um bom entendimento da discussão,
é essencial que o leitor conheça, com relativa profundidade, os temas apresentados nos
itens 2.7 e 3.5.

Migração Kirchhoff com reposicionamento do datum


Um dos mais elegantes algoritmos de migração é baseado no conceito de aquisição submer-
gente, o qual envolve o reposicionamento do datum, parcialmente discutido no subitem
3.6.1 (ver também Berryhill, 1979; Schultz e Sherwood, 1980). Para analisar sua versão
Kirchhoff de forma adequada, é conveniente supor uma aquisição sı́smica realmente tri-
dimensional, de acordo com a qual os receptores de cada agrupamento de fonte comum
(CS) são distribuı́dos ao longo de uma extensa área, no centro da qual se situa a fonte.
O mesmo se aplica às fontes de cada agrupamento de receptor comum (CG). Neste caso,
a migração dos dados sı́smicos, voltada para a obtenção de um conjunto de amostras em
uma determinada profundidade, envolve três passos.
O primeiro passo consiste em extrapolar inversamente todos os agrupamentos de fonte
comum para uma profundidade arbitrária zB , mantendo-se, em cada um deles, a fonte na
superfı́cie. Esta é uma operação que, no caso de um agrupamento CS em particular, pode
ser resumida pela seguinte versão da integral de Rayleigh II, aplicável a uma superfı́cie
de registro horizontal:
Z Z  
1
∂G∗g
Ps0 (xg0 , yg0 , zg0 = zB , zs0 = 0, ω) = 2π Ps0 (xg , yg , zg = zs0 = 0, ω) dxg dyg
∂zg
Ly Lx
(3.6.13)
onde Ps0 é a transformada temporal de Fourier do agrupamento CS cuja fonte é identifi-
cada pelo subscrito s0 e G∗g é a versão anti-causal da função de Green correspondente ao
trajeto entre o difrator e os diversos receptores, cujas coordenadas são identificadas pelo
subscrito g. De acordo com a aproximação de altas freqüências, a função de Green G ∗g ,
cuja derivada com relação a z é estimada na superfı́cie, pode ser definida, no caso de um
meio relativamente simples (que não gera cáusticas), por

G∗g = Ag exp(−iωτg ) (3.6.14)

onde Ag e τg se referem à amplitude e ao tempo envolvidos no trajeto entre cada receptor


e o difrator situado na profundidade zB e nas coordenadas horizontais xg0 e yg0 . Se o
meio é homogêneo e isotrópico, Ag corresponde ao inverso da distância percorrida pela
onda no trajeto mencionado.
Aplicando-se a equação 3.6.13 a todos os pontos de cada agrupamento CS existente,
obtém-se um resultado equivalente ao de um registro sı́smico de uma harmônica, ω, em
que os receptores estão situados na profundidade zB e as fontes são mantidas em sua
426 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

posição original, ou seja, na superfı́cie. Sabe-se que, para se obter os dados sı́smicos mi-
grados na profundidade zB , tanto as fontes quanto os receptores deveriam estar situados
na mesma profundidade. Caracteriza-se assim o segundo passo do processo: a extra-
polação inversa de todos os agrupamentos CG resultantes de um rearranjo dos dados
sı́smicos obtidos no primeiro passo. Aplica-se ao caso a seguinte versão da integral de
Rayleigh II, válida para uma superfı́cie de registro horizontal:
Z Z  
1 ∂G∗s
Pg0 (xs0 , ys0 , zs0 = zg0 = zB , ω) = 2π Pg0 (xs , ys , zs = 0, zg0 = zB , ω) dxs dys
∂zs
Ly Lx
(3.6.15)
onde Pg0 é a transformada temporal de Fourier de um agrupamento CG cujo receptor é
identificado pelo subscrito g0 e G∗s é a versão anti-causal da função de Green correspon-
dente ao trajeto entre o difrator e as diversas fontes, cujas coordenadas são identificadas
pelo subscrito s. De acordo com a aproximação de altas freqüências, a função de Green
G∗s , cuja derivada com relação a z é também estimada na superfı́cie, pode ser definida,
no caso de um meio relativamente simples (que não gera cáusticas), por

G∗s = As exp(−iωτs ) (3.6.16)

onde As e τs se referem à amplitude e ao tempo envolvidos no trajeto entre cada fonte e


o difrator situado na profundidade zB e nas coordenadas horizontais xs0 e ys0 . Se o meio
é homogêneo e isotrópico, As corresponde ao inverso da distância percorrida pela onda
no trajeto mencionado.
O resultado da aplicação da equação 3.6.15, a todos os pontos de cada agrupamento
CG existente, corresponde a uma harmônica dos dados sı́smicos que seriam hipotetica-
mente registrados na profundidade zB . Para se obter a transformada de Fourier completa
dos agrupamentos CG envolvidos, os dois passos descritos são repetidos para todos os
valores de freqüência angular, ω, necessários para representar os dados sı́smicos. No
processo, há que se levar em conta o efeito de álias do operador, discutido no subitem
3.5.5.
Ao final dos dois passos descritos, tudo se passa como se fontes e geofones estivessem
situados na profundidade zB . No tempo t = 0 do volume de dados sı́smicos obtido,
encontram-se as amostras sı́smicas migradas correspondentes à mesma profundidade.
Caracteriza-se assim o terceiro passo do processo: a aplicação da condição de imagem,
que consiste em transportar, para a profundidade zB do volume de dados sı́smicos mi-
grados, as amostras assim definidas. Para isto, faz-se uso da seguinte versão da equação
3.5.33:
Z ∞
1
mg0 (xs0 , ys0 , zs0 = zg0 = zB ) = 2π Pg0 (xs0 , ys0 , zs0 = zg0 = zB , ω)dω (3.6.17)
−∞

onde mg0 representa a amostra resultante da migração, em um agrupamento CG ar-


bitrário. Nas aplicações práticas, esta integral é substituı́da por uma média dos compo-
nentes reais no intervalo de freqüências entre zero e a de Nyquist.
O volume completo de dados sı́smicos migrados é construı́do através da repetição dos
três passos descritos para todos os valores desejados de profundidade. Selecionando-se, no
resultado obtido, as amostras que se situam em uma dada coordenada horizontal, pode-se
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 427

construir um agrupamento de imagem comum (CI), cujo número de traços depende da


redundância estabelecida pela cobertura nominal. Como ocorre com os demais algoritmos
da famı́lia Kirchhoff, todos os passos do processo podem ser conduzidos no domı́nio do
tempo, o que o torna mais rápido.
No algoritmo descrito, a perda de amplitude pelo espalhamento geométrico é auto-
maticamente corrigida, em função do fato de que a propagação inversa do sinal leva em
conta a curvatura da onda mesmo no caso de um refletor plano, o que não ocorre quando
se aplica o modelo do refletor explosivo. Nestas condições, o colapso do sinal associado
a um ponto do refletor em torno de uma única posição espacial garante a conservação
da energia e, conseqüentemente, a correção da perda de amplitude pelo espalhamento
geométrico. No que diz respeito à geometria de aquisição, tudo se passa como se os di-
ferentes afastamentos fonte-receptor se reduzissem a zero, o que resulta em amplitudes
que, com relação ao ângulo de incidência, representam valores médios.

Migração Kirchhoff de agrupamentos CS


Uma alternativa à migração com reposicionamento do datum é a migração de agrupa-
mentos de fonte comum (CS), a qual envolve um tratamento hı́brido para a correção
das amplitudes. Duas boas referências para esse tipo de migração são os trabalhos de
Keho e Beydon (1988) e Bleistein (1987). No contexto da teoria do raio, os algoritmos
de migração apresentados nos dois trabalhos são equivalentes (ver Docherty, 1991), mas
o primeiro deles, que se baseia na integral de Rayleigh II, é mais representativo da linha
heurı́stica adotada neste subitem.
Na migração tridimensional de agrupamentos CS com base no trabalho de Keho e Bey-
don (1988), aplica-se a condição de imagem denominada “tempo de excitação” (Chang e
McMechan, 1986). De acordo com este conceito, uma difração registrada em um agrupa-
mento CS pode ser vista como o sinal oriundo de um ponto difrator que “explode” com
amplitude e atraso controlados pelo trajeto entre a fonte e o mesmo ponto. Desta forma,
a continuação descendente da difração até o ponto difrator resultaria em um evento pon-
tual fora de posição e com amplitude inversamente proporcional ao fator de espalhamento
geométrico associado ao trajeto entre o difrator e a fonte.
Para aplicar a extrapolação inversa em um agrupamento CS arbitrário e, na seqüência,
corrigir o tempo e a amplitude do sinal obtido, aplica-se a seguinte versão da integral de
Rayleigh II, a qual é válida para o caso em que a profundidade de registro é horizontal:
Z Z  
1 ∂G∗g
Ps0 (xg0 , yg0 , zB , ω) = Ps0 (xg , yg , zg = zs0 = 0, ω) dxg dyg (3.6.18)
2πGs0 ∂zg
Ly Lx

onde Ps0 é a transformada temporal de Fourier do agrupamento CS cuja fonte é identi-


ficada pelo subscrito s0 e G∗g é a versão anti-causal da função de Green correspondente
ao trajeto entre o difrator e os diversos receptores, cujas coordenadas são identificadas
pelo subscrito g. Por sua vez, Gs0 é a função de Green causal correspondente ao trajeto
entre o difrator e a fonte, função esta que não varia durante o processo de extrapolação
inversa até um difrator individual. Utilizando-se a aproximação de altas freqüências, as
duas funções de Green são descritas, no caso de um meio relativamente simples (que não
gera cáusticas), por
G∗g = Ag exp(−iωτg ) (3.6.19)
428 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

s g
0
Profundidade (m)

500

1000

4500 5000 5500

Figura 3.58: Representação, ao longo dos eixos x e z, das transformadas inversas


de Fourier das funções Gs0 e ∂G∗g /∂z, em um meio tridimensional homogêneo e
isotrópico. Parâmetros: τs0 = 296ms, τg = 512ms, ∆x = 25m, h = 625m, ∆z =
4m, ∆t = 4ms e v = 2000m/s. Os sinais correspondentes às duas funções foram:
(a) submetidos a um filtro passa-banda (8-40Hz) antes de serem representados em
profundidade e; (b) individualmente normalizados antes da composição final. A
curva elı́ptica representa a superfı́cie aplanática associada a um evento no tempo
t = τs0 + τg = 808ms e as letras s e g indicam as posições da fonte e do receptor.

e
Gs0 = As0 exp(iωτs0 ) (3.6.20)
onde τ é o tempo de trajeto entre o difrator e o elemento indicado pelo subscrito, enquanto
A é a amplitude correspondente. Se meio for homogêneo e isotrópico, A pode ser reduzida,
como nos casos anteriores, ao inverso da distância percorrida em cada trajeto.
A condição de imagem empregada na equação 3.6.18 pode ser bem entendida com
base na Figura 3.58, a qual foi construı́da através da superposição dos seguintes campos
de onda, ambos normalizados individualmente e representados, ao longo do eixo x, em
função das coordenadas espaciais x e z: (1) a transformada inversa de Fourier da função
de Green, Gs0 , gerada na posição da fonte (s) e propagada, no sentido causal, até o
tempo τs0 = 296ms e; (2) a transformada inversa de Fourier da derivada da função
de Green com relação à profundidade, ∂G∗g /∂z, gerada na posição do receptor (g), no
tempo t = 808ms, e propagada, no sentido anti-causal, até o tempo τs0 , o que significa
a igualdade τg = 512ms. Foi também representada, na figura, a geometria da superfı́cie
aplanática correspondente ao tempo de registro e ao sistema de aquisição usado.
Na Figura 3.58, a posição em que as duas frentes de onda e a superfı́cie aplanática
se encontram satisfaz à condição de imagem de tempo de excitação. Ou seja, a mesma
posição coincide com a de um difrator que é excitado no tempo τs0 = 296ms e gera o sinal
que demora outros 512ms para atingir o receptor, 808ms depois que a fonte é acionada.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 429

Nos termos da equação 3.6.18, a extrapolação inversa até a profundidade do difrator e


a divisão pela função de Green Gs0 envolvem um recuo total no tempo equivalente ao
próprio tempo de registro, ou seja, 808ms. Portanto, o sinal obtido já não mais inclui o
atraso entre a fonte e o difrator.
Nestas condições, a migração é concluı́da através da extração, do volume obtido com
a aplicação da equação 3.6.18 a diferentes valores de ω, as amostras situadas no tempo
t = 0, as quais, na seqüência, são posicionadas nas coordenadas xg0 , yg0 e zB do volume
de dados sı́smicos migrados. Aplica-se ao caso a seguinte expressão:
Z ∞
1
ms0 (xg0 , yg0 , zB ) = 2π Ps0 (xg0 , yg0 , zB , ω)dω (3.6.21)
−∞

onde ms0 representa uma amostra migrada do agrupamento CS escolhido. Nas aplica-
ções práticas, esta integral é substituı́da por uma média dos componentes reais entre as
freqüências zero e de Nyquist.
A repetição de todo o processo descrito, com diferentes profundidades e agrupamentos
CS, leva ao volume final desejado. Obviamente, a computação correspondente também
ser conduzida no domı́nio do tempo, o que leva a uma substancial redução no tempo de
computação.
Na forma da equação 3.6.18, a correção da perda de amplitude pelo espalhamento
geométrico é dividida em duas operações. A segunda delas — a divisão pela função
de Green Gs0 — corrige explicitamente a perda associada ao trajeto entre a fonte e
cada ponto difrator. A primeira — a soma das amplitudes ao longo da curva tempo-
distância associada ao trajeto entre o difrator e os receptores — se encarrega de corrigir
implicitamente a perda restante. Neste caso, isto se dá em função da concentração, em
torno de um único ponto, da energia espalhada entre o difrator e os receptores.

Migração Kirchhoff de agrupamentos CO


Tanto a migração de agrupamentos CS quanto a baseada no conceito de aquisição sub-
mergente esbarram em uma importante deficiência de caráter prático: a variação da am-
plitude em função do afastamento fonte-receptor não faz parte dos resultados diretos da
migração46 . Esta limitação aponta na direção de algoritmos de migração tridimensional
que, aplicados a dados sı́smicos tı́picos, não somente possibilitem a obtenção de ampli-
tudes corretas mas também preservem sua relação com o afastamento fonte-receptor, ou
com o ângulo de incidência.
A solução mais simples para o problema proposto é a migração de agrupamentos de
afastamento fonte-receptor comum (CO). Surge então uma nova dificuldade: neste tipo de
agrupamento, os refletores planos dão origem a reflexões também planas, o que dificulta o
tratamento do espalhamento geométrico da energia. No algoritmo Kirchhoff, contorna-se
esta dificuldade através da inclusão de uma forma explı́cita da correspondente correção,
como fizeram Bleistein (1987) e o grupo de Peter Hubral (ver Schleicher et al., 1993; Tygel
et al., 1996), em ambos os casos com base no conceito de fase estacionária (Bleistein,
46
Nesses algoritmos, a obtenção das amplitudes em função do ângulo de incidência exige um trata-
mento especı́fico. Um exemplo pode ser encontrado no trabalho de Volker et al. (2001), que discute
aspectos práticos relacionados com o conceito de CFP (Common Focus Point), proposto pelo grupo de
A. Berkhout.
430 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

1984). A mesma idéia pode ser generalizada de forma a envolver explicitamente uma
função de Green, para o quê se faz uso da aproximação Kirchhoff, discutida no subitem
2.7.5.
Em sua forma inversa, aplicada à migração, a aproximação Kirchhoff envolve as se-
guintes alterações na equação 2.7.83: (1) a superfı́cie do refletor é substituı́da pela su-
perfı́cie de registro; (2) os coeficientes de reflexão são substituı́dos pelas amplitudes me-
didas e; (3) a função de Green G, definida pela equação 2.7.84, é substituı́da pela sua
equivalente anti-causal, G∗ , a qual deve incluir um fator que corrija a perda de ampli-
tude pelo espalhamento geométrico da energia. No caso em que a superfı́cie de registro é
horizontal, tem-se a seguinte forma da integral de Rayleigh II:
Z Z  
1 ∂G∗
Ph0 (xB , yB , zB , ω) = 2π Ph0 (x, y, z = 0, ω) dxdy (3.6.22)
∂z
Ly Lx

onde o subscrito h0 se refere à metade de um afastamento fonte-receptor arbitrário e as


coordenadas x e y identificam a posição do ponto médio correspondente, de acordo com
as premissas de azimute igual a zero e afastamento fonte-receptor constante. Por sua vez,
a função de Green, G∗ , pode ser aproximada por
G∗s G∗g
G∗ ∼
= (3.6.23)
2A2sg
onde Asg é o inverso do fator de espalhamento geométrico estimado no trajeto total entre
a fonte (s), o refletor e o receptor (g), enquanto G∗s e G∗g são funções de Green anti-causais
associadas ao trajeto entre o elemento indicado pelo subscrito e o refletor.
O leitor atento poderá estar perguntando qual é a origem do fator 1/A2sg , presente na
equação 3.6.23. Trata-se de um fator que pode ser obtido com base no conceito de fase
estacionária (Bleistein, 1984). Pode também ser induzido de forma relativamente simples
através do seguinte raciocı́nio: se ele não existisse, a equação 3.6.22 levaria a uma nova
perda de amplitude pelo espalhamento geométrico, em função da presença, implı́cita na
equação 3.6.23, do produto entre as amplitudes de G∗s e de G∗g , aproximado por As Ag .
De acordo com a discussão apresentada no subitem 2.7.5, sabe-se que, na extrapolação
direta, o produto As Ag é responsável pela introdução da perda de amplitude pelo espa-
lhamento geométrico da energia. O mesmo efeito é observado na extrapolação inversa de
um agrupamento CO, já que a aproximação Kirchhoff leva em conta a curvatura do sinal
responsável pela formação de uma onda plana, em função da presença do produto G ∗s G∗g .
Desta forma, a divisão pelo quadrado de Asg se encarrega de corrigir não somente a dis-
torção introduzida durante a migração como também a perda de amplitude originalmente
presente nos dados sı́smicos47 .
Adotando-se a aproximação de altas freqüências para a função de Green, a equação
3.6.22 passa a ser dada, no domı́nio do tempo, por
Z Z   
1 ∂A ∂τ ∂
ph0 (xB , yB , zB , t) = 2π −A ph0 (x, y, z = 0, t + τ ) dxdy (3.6.24)
∂z ∂z ∂t
Ly Lx

47
A mesma lógica pode ser usada para se obter uma função de Green que não corrija o espalhamento
geométrico e mantenha constantes as amplitudes de ondas planas. Para isto, basta substituir A 2sg por
Asg .
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 431

ou, na forma discreta, por


X X  ∂A ∂τ ∂
 
1
ph0 (xB , yB , zB , t) = 2π
−A ph0 (x, y, z = 0, t + τ ) ∆x∆y (3.6.25)
y x
∂z ∂z ∂t

onde τ é o tempo de trajeto entre a fonte, o difrator e o receptor. Por sua vez, o fator A
é definido, com base nas expressões 3.6.23, 3.6.14 e 3.6.16, por
As Ag
A= , (3.6.26)
2A2sg

enquanto a vagarosidade ∂τ /∂z é dada por

∂τ cos αs cos αg
= + (3.6.27)
∂z vs vg

onde cos α e v são o ângulo de emergência e a velocidade nas posições da fonte (subscrito
s) e do receptor (subscrito g).
Sabe-se que não é aplicável, a um agrupamento de fonte-receptor comum, a versão
recursiva do princı́pio de Huygens e, por extensão, a forma rigorosa da teoria da pro-
pagação de ondas. Isto significa que a equação 3.6.25 corresponde na verdade ao que
se denominaria um algoritmo de pseudo-extrapolação, cujo resultado é válido apenas no
tempo t = 0. Entretanto, do ponto de vista cinemático, este resultado é exatamente o
que se deseja com a migração, já que caracteriza a condição de imagem adequada ao caso.
Nestas condições, para se obter uma amostra migrada no ponto B, bastaria aplicar
a condição de imagem descrita, o que implica extrair, do volume inversamente pseudo-
extrapolado, ph0 , a amostra obtida no tempo t = 0, nas coordenadas do mesmo ponto.
Se o termo de campo próximo — representado pela derivada de A com relação à profun-
didade — for desprezado, a combinação das etapas de extrapolação inversa e aplicação
da condição de imagem resulta na seguinte expressão, válida para qualquer azimute de
aquisição:

X X   ∂τ  
1 0
mh0 (x0 , y0 , z0 ) = − 2π A ph0 (xs , ys , xg , yg , z = 0, t = τ ) ∆x∆y (3.6.28)
y x
∂z

onde mh0 (x0 , y0 , z0 ) é a amostra resultante da migração e p0h0 representa a derivada


∂ph0 /∂t, enquanto (xs , ys , xg , yg ) são as coordenadas horizontais das fontes e recepto-
res. Por sua vez, o fator A e a vagarosidade ∂τ /∂z são definidos pelas equações 3.6.26 e
3.6.27.
Na aplicação da expressão 3.6.28 à migração em profundidade, pode-se seguir a se-
guinte seqüência de passos:

1. Constrói-se o volume de velocidades intervalares em profundidade, as quais devem


ser estimadas através de análises de velocidade de migração em profundidade. Nesta
etapa, pode-se também construir tabelas com os tempos correspondentes aos traje-
tos entre a superfı́cie de registro e uma malha de pontos em subsuperfı́cie, a serem
usadas na etapa 7.
432 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

2. Ordenam-se os dados sı́smicos na forma de um agrupamento CO arbitrário, no que


resulta o volume ph0 (xs , ys , xg , yg , z = 0, t).

3. Escolhe-se um traço sı́smico do volume obtido e aplica-se a ele uma derivada com
relação ao tempo.

4. O traço sı́smico resultante da etapa anterior é convolvido com diferentes filtros anti-
álias, no que resulta um pequeno conjunto de traços filtrados. O número de filtros
— e de traços desse conjunto — depende do mı́nimo valor possı́vel para a freqüência
de álias e dos intervalos de amostragem temporal e espacial dos dados sı́smicos (ver
a equação 3.5.85).

5. Estima-se, no volume de dados sı́smicos migrados a ser obtido, a região de influência


do traço sı́smico escolhido na etapa 3. Para isto, leva-se em conta a abertura do
operador de migração.

6. Escolhe-se uma posição nas coordenadas hipotéticas x = x0 , y = y0 e z = z0 , dentro


da região estimada. Assume-se que a mesma posição corresponda a um difrator.

7. Estima-se o tempo de trajeto, τ , entre a fonte, o difrator escolhido e o receptor,


além dos seguintes parâmetros: ∂τ /∂x, ∂τ /∂y, cos αs , cos αg , As , Ag e Asg . À
semelhança dos dois cossenos, as vagarosidades ∂τ /∂x e ∂τ /∂y são avaliadas na
superfı́cie de registro.

8. Estima-se, com uma equação similar à 3.5.85, qual é a freqüência de álias associada
ao trajeto determinado na etapa anterior, para o quê se faz uso das vagarosidades
∂τ /∂x e ∂τ /∂y.

9. Escolhe-se, no volume de traços sı́smicos obtidos na etapa 4, aquele que se adequa


à freqüência estimada na etapa anterior.

10. Extrai-se, do traço sı́smico escolhido, a amplitude correspondente ao tempo τ e


multiplica-se o resultado pelo peso
 
A cos αs cos αg
W =− + ∆S
2π vs vg
onde, se os traços sı́smicos forem homogeneamente espaçados, ∆S equivale ao
produto ∆x∆y. No caso contrário, ∆S pode ser estimado com base na distri-
buição espacial dos traços sı́smicos, o que caracteriza o chamado condicionamento
geométrico.

11. Adiciona-se o resultado obtido na etapa anterior à amplitude eventualmente já


armazenada na posição (x0 , y0 , z0 ) do volume de dados sı́smicos migrados.

12. Repetem-se as etapas 6 a 11 para toda a região de influência estimada na etapa 5.

13. Repetem-se as etapas 3 a 12 para todos os traços sı́smicos do agrupamento CO


escolhido.

14. Repetem-se as etapas 2 a 13 para todos os agrupamentos CO desejados.


3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 433

O algoritmo descrito pode ser diretamente adaptado para a migração em tempo.


Neste caso, a profundidade z0 é substituı́da pelo tempo migrado τ0 e as velocidades
intervalares em profundidade, usadas na etapa 7, são substituı́das por velocidades de
migração em tempo, definidas em função do tempo migrado. As amplitudes As , Ag e Asg
são aproximadas por 1/Rs , 1/Rg e 1/(Rs + Rg ), onde R é a distância entre o difrator e
o elemento indicado pelo subscrito. Por sua vez, o tempo τ pode ser estimado com

τ = τ s + τg (3.6.29)

onde s
 τ 2  2  2
0 x0 − x s y0 − y s
τs = + + (3.6.30)
2 v v
e s
 τ 2  2  2
0 xg − x 0 yg − y 0
τg = + + (3.6.31)
2 v v
Com base nestas aproximações, percebe-se que, no limite em que o afastamento fonte-
receptor tende a zero, o fator A, dado pela equação 3.6.26, torna-se igual a 2 e, portanto,
passa a não depender dos valores isolados de As e Ag (ver também Schleicher et al., 1993).
Esta independência representa um dos suportes lógicos para uma importante inferência:
se a distribuição de velocidades for relativamente suave, pode-se estender para a migração
em profundidade a aproximação do fator A aplicada na migração em tempo.
Os eventuais erros de uma aproximação como a descrita tendem a ser aceitáveis,
principalmente porque a correção da perda de amplitude pelo espalhamento geométrico
da energia é uma função que, normalmente, varia lentamente no tempo e no espaço. Deve-
se ainda ressaltar que, em áreas geologicamente complexas, o tratamento das amplitudes
pode se tornar menos importante do que o cálculo dos tempos de trajeto, em particular
se estes forem estimados com base na teoria do raio.

Migração por diferenças finitas


Considere-se, inicialmente, o caso da migração com reposicionamento do datum. Nas
aplicações da técnica das diferenças finitas a esse conceito, substituem-se as equações
3.6.13 e 3.6.15 pelas equivalentes baseadas na extrapolação inversa por diferenças finitas.
Para isto, uma das soluções mais comuns consiste em utilizar o algoritmo implı́cito,
discutido no subitem 3.5.3. O principal problema enfrentado por este tipo de migração,
seja através de algoritmos Kirchhoff ou diferenças finitas, é o fato de que a aquisição
sı́smica é normalmente linear, ou seja, a faixa de azimutes disponı́veis é, quase sempre,
limitada. Esta é a principal razão pela qual a migração com reposicionamento do datum
é mais freqüentemente aplicada em duas dimensões.
Na migração por diferenças finitas de agrupamentos de fonte comum (CS), a principal
alteração, em relação à migração Kirchhoff fundamentada na equação 3.6.18, consiste em
substituir a etapa de extrapolação inversa pela equivalente baseada em diferenças finitas.
Neste caso, duas opções diferentes estão disponı́veis: (1) a continuação descendente dos
receptores, normalmente aplicada através do algoritmo implı́cito e; (2) a migração de
tempo reverso, ou RTM (em inglês, Reverse-Time Migration). Nos dois casos, é freqüente
434 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

a utilização da condição de imagem de tempo de excitação (ver texto na página 427 e o


trabalho de Chang e McMechan, 1986).
Se a continuação descendente dos receptores for conduzida no domı́nio ω-x-y, a apli-
cação da condição de imagem envolve tarefas idênticas às descritas na discussão sobre a
equação 3.6.18. Desta forma, assumindo-se que os receptores já estão na profundidade
zB , a transformada de Fourier do sinal obtido através da extrapolação inversa é dividida
pela função de Green Gs0 , a qual é associada ao trajeto entre a fonte e o ponto cujas
coordenadas são xg0 , yg0 e zB . A subseqüente aplicação da equação 3.6.21 permite a
obtenção de uma amostra migrada no mesmo ponto.
No caso em que a continuação descendente é conduzida no domı́nio do tempo, a
aplicação da condição de imagem consiste em selecionar, nos dados sı́smicos inversamente
extrapolados até a profundidade zB , a amplitude correspondente ao tempo de trajeto
entre cada ponto situado na mesma profundidade e a fonte. O resultado dessa seleção é
submetido à correção da perda pelo espalhamento geométrico respectivo e, na seqüência,
posicionado no volume de dados migrados, nas coordenadas espaciais do mesmo ponto.
Ou seja, neste caso, o tempo de trajeto entre a fonte e o difrator não é removido de forma
explı́cita.
Na migração RTM de agrupamentos CS, a aplicação da condição de imagem proposta
por Chang e McMechan (1986) envolve procedimentos ligeiramente diferentes, em função
do fato de que a extrapolação inversa é baseada no recuo do tempo e não na continuação
descendente. Isto significa que, em tese, não se sabe a posição espacial da frente de onda
em um determinado tempo de propagação. Esta diferença, aliada a outras peculiaridades
do algoritmo, justifica detalhar a aplicação da migração RTM, a qual pode se dar na
forma da seguinte seqüência de passos (ver discussão a partir da página 387):

1. Constrói-se o volume de velocidades intervalares em profundidade, v(x, y, z), e sua-


viza-se o resultado, expresso na forma de vagarosidades intervalares, buscando evi-
tar a geração, pelo algoritmo, de reflexões e suas múltiplas (ver Loewenthal et al.,
1987), o que inclui as bordas do modelo, em particular a que se situa acima da
superfı́cie de registro.

2. Escolhe-se um agrupamento CS, cujos dados sı́smicos estão agrupados na forma do


volume tridimensional s(xg , yg , z = 0, t).

3. Computa-se a amplitude e o tempo associados ao trajeto entre a posição da fonte


e cada ponto do volume migrado a ser obtido, no que resulta os volumes Ts (x, y, z)
e As (x, y, z). Para executar esta tarefa, diferentes técnicas podem ser adotadas.
A mais simples consiste em computar o volume Ts com traçamento de raios e
aproximar a amplitude pela razão 1/Rs , onde Rs é a distância entre cada ponto do
volume As e a fonte. A mais sofisticada consiste em se estimar a função de Green gs ,
gerada na posição da fonte, através da aplicação de técnicas de diferenças finitas,
com base na qual se determinam a amplitude e o tempo correspondentes a cada
ponto a imagear.

4. A extrapolação é iniciada no máximo valor de tempo de registro dos dados sı́smicos,


tmax . Nesta etapa, atribui-se t = tmax e consideram-se nulos os volumes pt+∆t , pt e
pt−∆t , os três definidos em função das coordenadas espaciais x, y e z.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 435

5. Atualiza-se o valor do volume pt apenas na superfı́cie de registro (z = zg ), aplican-


do-se a seguinte expressão:

pt (xg , yg , z = zg ) = s(xg , yg , z = zg , t) (3.6.32)

6. Calculam-se os volumes das derivadas ∂ 2 pt /∂x2 , ∂ 2 pt /∂y 2 e ∂ 2 pt /∂z 2 , de forma


similar à discutida na página 392.

7. Para se obter o volume pt−∆t , aplica-se a seguinte versão da equação 3.5.67:


 2 
2 2 ∂ pt ∂ 2 pt ∂ 2 pt
pt−∆t = 2pt − pt+∆t + v ∆t + + (3.6.33)
∂x2 ∂y 2 ∂z 2

8. Selecionam-se, no volume pt−∆t , as amplitudes cujo tempo Ts é igual ao tempo


t − ∆t.

9. Corrigem-se as amplitudes obtidas na etapa anterior, dividindo-as pelos fatores


armazenados, nas mesmas posições, no volume As .

10. Adicionam-se as amplitudes corrigidas às que se encontram, nas mesmas coordena-
das, no volume de dados sı́smicos migrados, m(x, y, z).

11. Atualizam-se os valores de tempo, substituindo-se t por t + ∆t e t − ∆t por t. Isto


implica transformar os volumes pt e pt−∆t em pt+∆t e pt , respectivamente.

12. Repetem-se as etapas 5 a 11, até que o valor de t atinja o menor valor presente no
volume Ts . Encerra-se assim a contribuição do agrupamento CS para o volume de
dados sı́smicos migrados em profundidade, m(x, y, z).

13. Repetem-se as etapas 2 a 12 para todos os agrupamentos CS desejados.

A flexibilidade do algoritmo RTM possibilita sua aplicação em condições similares às


envolvidas na migração Kirchhoff. Em primeiro lugar, é possı́vel migrar em três dimensões
um agrupamento CS adquirido ao longo de um único azimute, ou de uma faixa limitada
de azimutes. Neste caso, a formação da imagem completa dos refletores é garantida
pela soma das imagens tridimensionais resultantes da migração de agrupamentos CS
adjacentes. Aplica-se ao caso a versão tridimensional inversa do princı́pio de Huygens.
A Figura 3.26, na página 349, pode ser usada como exemplo. A mesma flexibilidade
favorece ainda: (1) a migração de dados sı́smicos reposicionados no datum flutuante (ver
o subitem 3.5.4 e o trabalho de McMechan e Chen, 1990); (2) a interpolação implı́cita dos
dados sı́smicos para uma malha mais densa, durante a própria migração (Zhu e Lines,
1997).

A prática da migração pré-empilhamento


Nas circunstâncias práticas, a migração tridimensional de dados sı́smicos não empilhados
envolve três temas principais: (1) qualidade da imagem; (2) obtenção de informações de
amplitude em função do ângulo de incidência e; (3) tempo de computação. No que diz
436 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

respeito ao primeiro tema, o foco dos esforços tem sido as áreas complexas, particular-
mente no que diz respeito à distribuição das velocidades. No segundo tema, o tratamento
das amplitudes assume um lugar particularmente importante. Já o terceiro tema pode ser
considerado o maior responsável pela proliferação de diferentes algoritmos de migração,
facilmente constatada na literatura geofı́sica.
No que diz respeito à qualidade da imagem, observa-se um conflito interessante: Kir-
chhoff versus diferenças finitas, particularmente nos casos em que a primeira técnica é
fundamentada na teoria do raio. Com base na discussão apresentada no subitem 3.5.3,
conclui-se facilmente que os resultados obtidos com as duas técnicas se tornariam equi-
valentes se48 : (1) na extrapolação com diferenças finitas, fossem utilizadas aproximações
numéricas de alta qualidade; (2) na extrapolação Kirchhoff, as funções de Green envol-
vidas fossem estimadas através de técnicas de diferenças finitas49 . Em resumo, os dois
algoritmos podem ser vistos como variações em torno de um mesmo tema, separados
basicamente por aspectos relativos ao desempenho computacional.
Na migração de agrupamentos CS, não se observam diferenças entre as técnicas Kir-
chhoff e diferenças finitas se a análise se restringir à etapa de aplicação da condição de
imagem. Considere-se, como exemplo, o caso de uma área estruturalmente complexa,
afetada por fortes variações de velocidade. Em situações deste tipo, os tempos de trajeto
entre a fonte e cada ponto a imagear devem ser estimados com redobrado cuidado, inde-
pendentemente do tipo de algoritmo usado na etapa anterior — a extrapolação inversa.
Para isto, um procedimento comum consiste em se medir tempos de trajeto na posição
de máxima amplitude do sinal estimado com base no traçamento dinâmico de raios, ou
na solução das equações iconal e de transporte. Um procedimento mais elegante, embora
muito mais demorado, já foi mencionado: a aplicação da técnica das diferenças finitas ao
processo de estimação da função de Green envolvida no processo.
No que diz respeito à obtenção de informações de amplitude em função do ângulo de
incidência, as técnicas de aplicação mais imediata são as da famı́lia Kirchhoff. Com elas,
pode-se facilmente migrar dados sı́smicos de forma a preservar a relação entre amplitude
e afastamento fonte-receptor, através da qual se estabelece a relação com o ângulo de
incidência (ver o Apêndice A.5 e Bleistein, 1987). Por outro lado, se for levada um pouco
mais adiante a analogia entre os algoritmos Kirchhoff e RTM, induz-se que os dois pode-
riam ser aplicados em conjunto, na forma da equação 3.6.22, à migração de agrupamentos
CO. No caso, as funções de Green e suas derivadas com relação à profundidade seriam
calculadas com a técnica das diferenças finitas, enquanto a integração seria conduzida
com base na aproximação Kirchhoff. Nesta combinação de técnicas, computacionalmente
pesada, é possı́vel introduzir o tratamento de amplitude adequado à análise de AVO.
O aspecto computacional, aliado à conveniência de representar os dados sı́smicos
em função do ângulo de incidência comum, CA (Common Angle), foram dois fatores
que catalisaram o desenvolvimento da migração conduzida no domı́nio τ -p. No que diz
respeito ao algoritmo Kirchhoff, duas boas referências sobre o tema são os trabalhos
de Hildebrand e Carroll (1993) e Akbar et al. (1996). Na aplicação à migração RTM,
a mesma idéia representa um passo ainda mais importante, uma vez que, através da
48
Ver, a partir da página 387, a discussão sobre a migração RTM e, em particular, a equação 3.5.70.
49
As figuras 3.42 e 3.41 (página 391) podem ser consideradas bons exemplos de uma função de Green
filtrada e de sua derivada com relação à profundidade, ambas estimadas com o algoritmo RTM em um
meio bidimensional.
3.6. MIGRAÇÃO PRÉ-EMPILHAMENTO 437

combinação de múltiplos agrupamentos CS, torna-se possı́vel acelerar substancialmente


o processo.
O desempenho computacional foi também parcialmente responsável pela idéia da mi-
gração pré-empilhamento em tempo em duas passagens50 . A principal justificativa teórica
para a idéia é relativamente simples: a mesma premissa que fundamenta a migração em
tempo — ausência de variação lateral de velocidade — valida também a opção pela mi-
gração em duas passagens. Em outras palavras, feita a opção pela migração em tempo,
pouco haveria a ganhar conduzindo o processo em uma só passagem, em vez de duas,
desde, é claro, que alguns cuidados sejam tomados.
Do ponto de vista cinemático, a migração em duas passagens é fundamentada no fato
de que uma superfı́cie aplanática, como a representada na Figura 2.29 (página 122), pode
ser desmembrada em dois componentes: uma elipse na direção do eixo x, um cı́rculo na
direção do eixo y. Isto significa que, se o azimute de aquisição coincidir com o eixo x
— ou seja, a direção da linha sı́smica —, a correção de NMO, implı́cita na migração
pré-empilhamento, pode ser toda concentrada ao longo do mesmo eixo. Nestas condições,
pode-se desdobrar a equação 2.3.15 em duas partes, o que permite definir da seguinte
forma a curva tempo-distância correspondente à difração gerada em um ponto hipotético
B:
2 2 (y − yB )2
ty = τ B + 1 2 (3.6.34)
4
v
onde v é a velocidade de migração e τB é o tempo migrado correspondente ao difrator.
Por sua vez, ty é o tempo resultante da migração bidimensional ao longo do eixo x e
definido algebricamente, com base na equação 3.6.1, por
s  2 s 2  2
t2y xB − (x − h) ty (x + h) − xB
t= + + + (3.6.35)
4 v 4 v

onde t é o tempo correspondente à difração e h é o afastamento entre a fonte e o receptor.


Nos termos das equações 3.6.35 e 3.6.34, a migração em duas passagens é caracte-
rizada por: (1) migração bidimensional pré-empilhamento ao longo do eixo x, aplicada
isoladamente a cada um dos agrupamentos de afastamento fonte-receptor comum (CO),
em cada coordenada y, calculando-se os tempos com a equação 3.6.35; (2) migração bi-
dimensional baseada no modelo do refletor explosivo ao longo do eixo y, aplicada a cada
agrupamento CO resultante da primeira passagem, em cada coordenada x, calculando-
se os tempos com a equação 3.6.34. Considerando-se um ponto difrator isolado, não é
difı́cil perceber que o resultado da primeira passagem, em cada agrupamento CO, é uma
difração isolada, situada ao longo do eixo y, na coordenada xB do mesmo ponto.
Ressalte-se que, para a seqüência descrita ser aplicável, é muito importante garantir
que o azimute de aquisição coincida realmente com o eixo x. Para contornar situações
em que esta exigência não é satisfeita, uma solução consiste em se aplicar a correção de
AMO (Azimuth MoveOut), antes da migração. No caso particular de eventos de baixo
mergulho, é normalmente suficiente a utilização de um fator que compense exclusivamente
as distorções de amplitude associadas à variação no azimute. Se apenas esta correção for
50
Uma curiosidade: soube-se mais tarde que, enquanto esta idéia estava sendo avaliada na Petrobrás
por um grupo coordenado por Carlos Cunha Filho, o mesmo já ocorria em outros centros.
438 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

implementada, o prejuı́zo mais visı́vel é observado na definição de feições oblı́quas, como


os planos de falha.
Do ponto de vista dinâmico, a migração em duas passagens exige dois ajustes. Em
primeiro lugar, a correção da perda de amplitude associada ao espalhamento geométrico
da energia pode ser feita separadamente, ou durante a primeira passagem, em ambos os
casos com alguma perda de qualidade. Em segundo lugar, há que se mencionar o peso
a aplicar aos dados sı́smicos durante a integração: à parte o espalhamento geométrico e
excluindo-se o fator ∆S (página 432), ele corresponde, no domı́nio da freqüência, à raiz
quadrada do peso aplicado na migração em uma passagem. Isto inclui a raiz quadrada
do fator iω — a “meia” derivada anti-causal.
Uma técnica ainda mais simples do que a descrita é a chamada pseudo-migração
pré-empilhamento. Trata-se de uma idéia particularmente útil no caso em que se deseja
realizar estudos de AVO em um tempo curto. O processo envolve os seguintes passos: (1)
aplicação das correções de NMO e DMO aos dados sı́smicos; (2) empilhamento parcial
em faixas de afastamento fonte-receptor comum, ou ângulo de incidência comum; (3)
migração Stolt dos agrupamentos resultantes, preferencialmente em uma forma equiva-
lente à técnica PSPI51 , ou Phase-Shift Plus Interpolation (Gazdag e Sguazzero, 1984).
Em muitas circunstâncias, particularmente onde a migração em tempo é aplicável, os
resultados apresentam boa qualidade.
Um último tema relativo à migração pré-empilhamento merece ser destacado: as
correções estáticas e da velocidade da água (ver o item 3.1). De acordo com a filosofia
adotada ao longo deste capı́tulo, considera-se essencial isolar os componentes de curto
e longo comprimento de onda das correções estáticas, deixando-se para a migração o
deslocamento entre os data flutuante e final. Neste caso, pouco há o que se acrescentar
à discussão apresentada no item 3.5, com a óbvia exceção da necessidade de isolar, no
caso da migração pré-empilhamento, os componentes de tempo associados às fontes e
aos receptores. Quanto à correção da velocidade da água, é conveniente um tratamento
do tipo reposição de camadas, conduzido nos agrupamentos CS, o qual deve ser feito
para homogeneizar a velocidade correspondente à água do mar. Com esta providência, a
migração subseqüente poderia tratar a água como um material realmente homogêneo.

3.7 Técnicas Aproximadas de Inversão


O termo “inversão de dados sı́smicos” apresenta uma ampla gama de definições. De
acordo com a mais abrangente delas, os dados sı́smicos registrados são submetidos a um
processo global que, simultaneamente, remove ou atenua todas as distorções presentes e
gera, como resposta, as propriedades elásticas do meio — velocidade P, densidade e razão
de Poisson — representadas em função da profundidade. Inúmeras tentativas de inversão
global nesta linha têm sido feitas, mas nenhuma atingiu ainda o estágio de aplicação
rotineira. As principais razões para este insucesso são:
1. Os dados sı́smicos apresentam baixa razão sinal/ruı́do nos componentes de fre-
qüência próxima de zero, a qual se deve em grande parte ao fato de que a função
51
De acordo com esta técnica, os dados sı́smicos são migrados com diferentes campos de velocidade
e, em seguida, submetidos a um processo de interpolação que visa estimar o volume correspondente às
velocidades desejadas.
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 439

refletividade é aproximadamente proporcional à freqüência (ver o item 2.6). Há


ainda que se mencionar a impossibilidade lógica de se registrar valores válidos do
componente de freqüência igual a zero. Assim, em termos práticos, dificilmente se
obtêm informações de amplitude úteis na faixa de freqüências inferiores a 5-6Hz, o
que torna as estimativas de coeficientes de reflexão, por melhores que sejam, apenas
grandezas relativas.

2. No que diz respeito às altas freqüências, os processos de inversão esbarram na


amostragem espacial inadequada. Neste sentido, as geometrias de aquisição sı́smica
tı́picas não favorecem o adequado imageamento das descontinuidades distribuı́das
em intervalos de distância horizontal inferiores a 10 ou 20m, assim como não fa-
vorecem a eliminação dos eventos múltiplos associados a elas. Desta forma, ainda
que se apliquem sofisticadas técnicas de processamento, a máxima freqüência útil
obtida raramente atinge 100Hz52 .

3. A própria relação entre os coeficientes de reflexão e as propriedades elásticas não é


robusta o suficiente para possibilitar uma inversão isenta de erros. A Figura 2.51
(página 177) pode ser usada para ilustrar este problema. Observe-se, por exemplo,
que, nas vizinhanças do ângulo de incidência igual a zero, as derivadas do coeficiente
de reflexão, com relação à razão entre as velocidades e à razão entre as densidades,
apresentam forma similar. Neste caso, pode-se prever que, em um processo inverso,
uma variação na densidade poderia ser atribuı́da a uma variação na velocidade.
Percebe-se ainda, com base na mesma figura, que uma variação na razão de Poisson
da camada 1 poderia ser confundida com uma variação, no sentido contrário, da
razão de Poisson da camada 2.

Combinando-se as deficiências no conteúdo de freqüência dos dados sı́smicos com as


dificuldades inerentes ao processo de inversão em si, torna-se óbvia a defesa do conceito de
aproximações sucessivas. Ou seja, ao invés de uma inversão global ambiciosa, procura-se
resolver o problema por etapas, na linha que vem sendo seguida neste capı́tulo. Assim,
assumindo-se que todos os eventos espúrios tenham sido atenuados, a migração tenha
sido bem-sucedida, a amplitude e a fase tenham sido tratadas da melhor forma possı́vel,
pode-se dizer que os dados sı́smicos resultantes correspondem a uma versão filtrada dos
coeficientes de reflexão.
Nesta linha de raciocı́nio, pode-se dividir o processo de inversão em três etapas. Na
primeira delas, fundamentada na técnica AVO (Amplitude Versus Offset), procura-se
estimar parâmetros capazes de descrever, de forma relativa, a variação dos coeficientes
de reflexão em função do ângulo de incidência. Na etapa seguinte, que é subdividida em
inversão acústica e elástica, busca-se combinar os parâmetros de AVO com o objetivo
de obter estimativas, de forma também relativa, das propriedades elásticas das rochas,
ou de combinações entre elas. Ressalte-se que o termo relativa deve-se basicamente às
deficiências observadas na parte inferior do espectro de freqüências dos dados sı́smicos.
52
Um exemplo para o leitor: partindo-se da premissa de que o correto imageamento dos espalhadores
de energia envolve ângulos de migração de 80-85 graus e que as velocidades médias tı́picas não passam
de 4000m/s, a aplicação da equação 3.5.84 ao caso levaria a valores de freqüência máxima pouco maior
do que 50Hz. Nas mesmas condições, o limite de 100Hz somente seria atingido se o imageamento se
restringisse a ângulos de mergulho inferiores a 30 graus.
440 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

200
Tempo (ms)

400

600

800
0 0

Figura 3.59: Decomposição de um perfil de velocidades normalizado


– .5 ln(vt /v1 ) – e amostrado em função do tempo, em três faixas de
freqüência: (a) 0-500Hz, correspondente ao perfil original (linha fina à
direita); (b) 0-5Hz (linha espessa à direita); (c) 6-500Hz (linha fina à
esquerda, gerado através da diferença entre o perfil original e o perfil na
banda 0-5Hz). Declividade do filtro 0-5Hz: 39dB/oitava.

De acordo com a discussão apresentada no Capı́tulo 4, sabe-se que a ausência dos


componentes de freqüência mais alta afeta a resolução, impedindo a caracterização de ca-
madas finas. Por sua vez, a ausência dos componentes de freqüência mais baixa impede
a identificação do valor médio das propriedades elásticas. Na Figura 3.59, apresenta-se
uma ilustração desse conceito, no caso de um perfil de velocidades em escala de tempo,
decomposto em duas faixas de freqüência, além da original (0-500Hz). Vê-se, na figura,
que os componentes de freqüência mais baixa caracterizam o valor médio local da veloci-
dade normalizada, enquanto os componentes de freqüência mais alta caracterizam melhor
os detalhes, ou seja, os desvios em relação à mesma média.
As estimativas das propriedades elásticas das rochas, obtidas ao final da segunda etapa
de inversão, apresentam comportamento similar ao da faixa 6-500Hz da Figura 3.59. Em
termos práticos, isto significa que não seria possı́vel comparar, de forma confiável, os
valores absolutos de duas amostras verticalmente separadas de acordo com um intervalo
de tempo maior do que, por exemplo, 100ms. Esta é uma informação carregada pela
faixa de freqüências inferior a 5Hz, a qual não está presente nas estimativas das propri-
edades elásticas obtidas. Neste ponto, pode-se perguntar: seria possı́vel complementar o
espectro de freqüências dos dados sı́smicos, de forma a obter estimativas absolutas dessas
propriedades? Este é o objetivo da terceira etapa de inversão.
O leitor atento deverá ter induzido, com base na Figura 3.59, que a faixa de freqüên-
cias 0-5Hz de um perfil de velocidades contém informações que, teoricamente, poderiam
ser extraı́das das velocidades sı́smicas. Mais genericamente, pode-se afirmar que a geome-
tria das reflexões, em dados não empilhados, contém informações adicionais às contidas
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 441

nas amplitudes sı́smicas. Esta é a idéia que fundamenta a utilização dos campos de velo-
cidade de migração, ou de empilhamento, com o fim de complementar a inversão. Neste
processo, é muito importante garantir que as informações adicionais sejam compatı́veis
com os dados de poços53 .
Em resumo, pode-se dizer que, ao final da primeira etapa da inversão, dispõe-se de uma
descrição razoável do comportamento dos coeficientes de reflexão em função do ângulo de
incidência. Por sua vez, os resultados obtidos na segunda etapa correspondem a — tão
somente — estimativas da diferença entre as propriedades elásticas e os correspondentes
valores médios locais (background ). Trata-se, portanto, de estimativas de banda espectral
limitada. Atingindo-se a terceira etapa, o resultado corresponde, na melhor hipótese, a
valores absolutos grosseiros das propriedades elásticas. O caráter impreciso, inerente a
esta etapa, é uma das razões pela qual se acrescenta o prefixo “pseudo” à denominação das
correspondentes estimativas sı́smicas das propriedades elásticas54 . Um exemplo: pseudo-
impedâncias acústicas.
Que esta descrição aparentemente negativa não iluda o leitor: as estimativas sı́smicas
de propriedades elásticas, ainda que de caráter relativo, são muito úteis, particularmente
na caracterização de anomalias associadas às litologias e à presença de petróleo. Neste
sentido, é importante ressaltar que um traço sı́smico invertido, com todas as suas de-
ficiências, é mais representativo da geologia do que um traço sı́smico convencional. Esta
afirmativa se justifica pelo fato de que, enquanto um traço sı́smico convencional corres-
ponde a uma estimativa dos contrastes entre propriedades elásticas de camadas distintas,
um traço sı́smico invertido corresponde a uma versão filtrada das próprias propriedades
elásticas do meio. Em outras palavras, a influência das rochas encaixantes sobre a esti-
mativa sı́smica das propriedades elásticas de uma determinada camada é menor do que
a exercida sobre a estimativa dos coeficientes de reflexão a ela associados.

3.7.1 Parâmetros de AVO


A técnica AVO é fundamentada na variação dos coeficientes de reflexão em função do
ângulo de incidência. Viu-se, no item 2.6, que é possı́vel obter aproximações, baseadas em
poucos parâmetros, capazes de descrever razoavelmente bem esta variação. Três dessas
aproximações, fundamentadas nos trabalhos de Richards e Frasier (1976), Aki e Richards
(1980), Shuey (1985) e Fatti et al. (1994), serão analisadas aqui. Na primeira delas, a
relação entre o coeficiente de reflexão e o ângulo de incidência é dada por

r(θ̄) ∼
= A + B + C tan 2 θ̄ sen 2 θ̄ (3.7.1)
53
Sabe-se que as informações extraı́das dos perfis de poços são geograficamente esparsas. Com base
na lei de Walter, é fácil induzir que, para a inversão dos dados sı́smicos, as informações mais úteis dos
perfis de poços são as que se situam na faixa inferior do espectro de freqüências. Em outras palavras, a
interpolação de informações contidas nas altas freqüências dos perfis, eventualmente incluı́da na inversão,
não é confiável. Pode-se, assim, afirmar que os perfis de poços devem ser usados de forma limitada a:
(a) correção das informações extraı́das das velocidades sı́smicas; (2) suporte (cuidadoso) à obtenção de
uma estimativa do pulso sı́smico e; (3) após a inversão, ajuste das propriedades estimadas, com base em
técnicas geoestatı́sticas.
54
Deve-se ressaltar que a geometria das reflexões, seja de ondas P ou S, não carrega informações
relativas à densidade. Esta é a razão pela qual se usam, na inversão de dados sı́smicos, expressões
empı́ricas como a de Gardner et al. (1974).
442 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

onde r(θ̄) é o coeficiente de reflexão associado ao ângulo médio θ̄, enquanto A, B e C são
descritos pelas equações 2.6.34, 2.6.40 e 2.6.35.
A partir da década de 1990, passou a fazer parte da rotina dos geofı́sicos a utilização
dos parâmetros interseção (em inglês, intercept) e gradiente, os quais são obtidos com
base em uma simplificação da expressão 3.7.1. Nesta simplificação, leva-se em conta que,
se os ângulos de incidência forem relativamente pequenos (por exemplo, menores do que
30 graus), pode-se desprezar o termo envolvendo o parâmetro C, já que, nestas condições,
o valor do produto sen 2 θ̄ tan 2 θ̄ é bem menor do que o de sen 2 θ̄. A mesma simplificação
é válida na presença de ângulos de incidência maiores, desde que o parâmetro C seja
próximo de zero. Nos dois casos, a equação 3.7.1 é reduzida à seguinte expressão:

r(θ̄) ∼
= Ā + B̄ sen 2 θ̄ (3.7.2)

onde Ā é a interseção e B̄ é o gradiente. Os valores de Ā e B̄ podem ser relacionados


às propriedades elásticas através das seguintes aproximações: Ā ∼
=A∼ = r(0) e B̄ ∼
= B,
onde A é definido pela expressão 2.6.34 e B pode assumir uma das formas apresentadas
na Tabela 2.1 (página 181).
Outra classe de parâmetros de AVO é baseada na equação 2.6.32. Para aplicá-la com
maior facilidade, leva-se em conta que o termo envolvendo a densidade é proporcional-
mente pequeno, o que permite desprezá-lo. O resultado é:

r(θ̄) ∼
= Ā(1 + tan 2 θ̄) + D̄ sen 2 θ̄ (3.7.3)

= r(0) e D̄ ∼
= A ∼
Neste caso, as seguintes aproximações são aplicáveis: Ā ∼ = D, onde
A é definido pela expressão 2.6.34 e D pode assumir uma das formas apresentadas na
Tabela 2.1 (página 181). Uma delas, D = B − A, permite a seguinte e útil aproximação:
B∼= D̄ + Ā.

As técnicas ABC, ĀB̄ e ĀD̄


Com as equações 3.7.1, 3.7.2 e 3.7.3, é possı́vel estabelecer relações de primeira ordem
entre os coeficientes de reflexão e as propriedades elásticas que caracterizam as rochas. Ou
seja, criam-se condições para, a partir dos coeficientes de reflexão, obter os parâmetros de
AVO e, com base neles, estabelecer inferências a respeito das propriedades de significado
econômico das rochas. Adotam-se, no caso, três diferentes enfoques: na técnica ABC,
estimam-se os valores dos parâmetros A, B e C; na técnica ĀB̄, o objetivo é a obtenção
da interseção e do gradiente, ou Ā e B̄; na técnica ĀD̄, estimam-se Ā e D̄.
É óbvio que, para se estimar os três conjuntos de parâmetros de AVO, são necessários
pelo menos três, ou, no caso das técnicas ĀB̄ e ĀD̄, dois valores de coeficiente de reflexão,
correspondentes a um mesmo ponto em subsuperfı́cie, cada um deles estimado em um
ângulo de incidência diferente. Na prática, dispõe-se de um número muito maior do que
três. Por outro lado, os dados sı́smicos, ainda que muito bem processados, correspondem,
na melhor hipótese, a uma versão filtrada dos coeficientes de reflexão. Isto significa que
as estimativas dos parâmetros de AVO correspondem também a uma versão filtrada dos
valores corretos.
No Apêndice A.4, discute-se uma solução empregada na obtenção dos parâmetros de
AVO, a qual se baseia na minimização do erro médio quadrático da diferença entre as
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 443

amplitudes medidas e as estimativas de coeficiente de reflexão obtidas com a equação


3.7.1, ou 3.7.2, ou 3.7.3. Na solução discutida, utilizam-se empilhamentos parciais em
três, ou duas, diferentes faixas de afastamento fonte-receptor (ou ângulo de incidência),
identificadas em função da distância entre os receptores e as fontes: N (do inglês Near ),
M (Mid ) e F (Far ), ou N e F .
Repetindo-se qualquer um dos procedimentos descritos no Apêndice A.4 para todas
amostras de um agrupamento CMP e todos os agrupamentos CMP do volume de da-
dos sı́smicos, obtêm-se, como resultado, volumes dos parâmetros de AVO. O mesmo se
aplica, com maior propriedade, a dados migrados antes do empilhamento, o que equivale
a substituir os agrupamentos CMP por agrupamentos CI (Common Image).
Uma importante tarefa, envolvida no processo descrito e ainda não explicitada, con-
siste em estimar os ângulos de incidência correspondentes às amplitudes originais. Esta é
uma tarefa que pode ser conduzida de uma forma sofisticada, envolvendo a migração em
profundidade (ver Bleistein, 1987), ou de forma aproximada. Neste caso, que é o mais
comum, empregam-se velocidades de empilhamento, ou de migração. No Apêndice A.5,
discute-se com maior profundidade este tema.
No caso em que se utiliza a técnica ABC, torna-se teoricamente possı́vel a correção
da perda por transmissão. Para isto, empregam-se aproximações como a da equação
2.6.48, ou 2.6.50, aplicadas a um modelo de camadas horizontais, cada uma delas com
velocidade lateralmente constante. Nestas condições, a amplitude sı́smica correspondente
a uma interface hipotética t seria submetida à seguinte correção, antes de se estimar os
parâmetros de AVO na mesma interface:
" t−1 #
X 2
at (θ̄) = ât (θ̄) exp Aj − Cj tan 2 θ̄j (3.7.4)
j=1

onde ât (θ̄) corresponde à amplitude sı́smica antes da correção da perda por transmissão.
Observe-se que os parâmetros A e C se referem às interfaces de ı́ndices inferiores a t, o
que caracteriza um processo do tipo “despimento de camadas”.
Nas aplicações práticas da expressão 3.7.4, esbarra-se em uma importante dificul-
dade. Ver-se-á adiante que, entre as estimativas dos parâmetros de AVO estimados com
a técnica ABC, a que normalmente apresenta pior qualidade é a do parâmetro C. Esta
deficiência pode levar à opção por não corrigir a perda por transmissão, ou alternativa-
mente, introduzir correções de caráter paliativo. De acordo com uma dessas correções,
utiliza-se uma versão suavizada da série de velocidades intervalares, avaliada ao longo do
eixo das profundidades, com o fim de determinar uma seqüência de valores aceitáveis —
ainda que subdimensionados — para o parâmetro C.
Uma idéia mais simples, embora menos precisa, consiste em normalizar as amplitudes
dos traços A, B e C (ou Ā e B̄, ou Ā e D̄), com base em uma média RMS do traço A (ou
Ā), média esta estimada em janelas longas (1 a 2s). Esta operação mantém a relação entre
os valores dos parâmetros de AVO, obtidos em cada tempo de reflexão vertical, ao mesmo
tempo em que reduz um pouco a importância de eventuais imprecisões nas correções de
amplitude. Ressalte-se entretanto que a presença de anomalias de amplitude muito fortes
tende a fazer com que feições verticalmente adjacentes se tornem proporcionalmente mais
fracas, depois da correção.
444 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

0
vP vS ρ A B C D/2 1 2 3 4 5 6 7

200
Tempo (ms)

400

600

800

Figura 3.60: Perfis elásticos de um poço da Bacia de Campos e os


correspondentes valores teóricos de A, B, C e D/2, juntamente com os
erros resultantes do processo de obtenção dos parâmetros de AVO. Os
traços 1 a 7 correspondem ao resultado da diferença entre os valores
estimados e os teóricos de: traços 1, 2 e 3 - A, B e C (técnica ABC);
traços 4 e 5 - A e D/2 (técnica ĀD̄); traços 6 e 7 - A e B (técnica ĀB̄).
O máximo ângulo de incidência usado foi de 40 0 . Os traços sı́smicos
sintéticos e os parâmetros teóricos foram filtrados (8-40Hz).

Avaliação das estimativas dos parâmetros de AVO


Sabe-se que as equações que relacionam o coeficiente de reflexão aos parâmetros de AVO
são aproximadas. Por esta razão, justifica-se uma avaliação da qualidade dos proces-
sos inversos baseados nas mesmas equações. Para ilustrar a discussão, aplicaram-se as
técnicas ABC, ĀB̄ e ĀD̄ a dados sı́smicos sintéticos, gerados com os perfis de um poço
da Bacia de Campos, e se compararam os resultados com os valores teóricos de A, B, C e
D. No cálculo dos coeficientes de reflexão, utilizou-se a equação 2.6.21 e se assumiu que
o meio é constituı́do de camadas horizontais. O resultado desse esforço é apresentado na
Figura 3.60, na qual o parâmetro D é dividido por 2, o que se deve ao fato de que seus
valores representativos oscilam em torno do dobro dos demais.
Na Figura 3.60, observa-se que os maiores erros correspondem às estimativas dos
seguintes parâmetros: (a) na técnica ABC, o parâmetro C (traço 3); (b) na técnica ĀB̄,
o parâmetro B (traço 7); (c) na técnica ĀD̄, o parâmetro D (traço 5). Observa-se ainda
que, nos três casos, os maiores erros se concentram na região em que os contrastes de
velocidade, P e S, são acentuados, o que representa uma regra geral. Por fim, destaca-se
o fato de que as três diferentes estimativas do parâmetro A são perfeitamente aceitáveis.

Uma vez que, na construção da Figura 3.60, os ângulos de incidência são exatos, os
erros nela observados podem ser atribuı́dos ao fato de que as equações 3.7.1, 3.7.2 e 3.7.3
são simples aproximações. Para aprofundar a discussão, convém analisar como as três
expressões se comportam no caso especı́fico de uma reflexão isolada. Um bom exemplo
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 445

.18
Coeficiente de reflexão

.17

.16
a
.15

.14
b
0 10 20 30 40
Ângulo de incidência (graus)

Figura 3.61: Coeficientes de reflexão, em função do ângulo de in-


cidência, calculados sem aproximação com a equação 2.6.21 (linha pon-
tilhada) e estimados numericamente com as técnicas ABC (linha trace-
jada), ĀD̄ (linha traço-pontilhada) e ĀB̄ (reta a). A reta b foi obtida
analiticamente, com a expressão A + B sen 2 θ̄. Os ângulos são apresen-
tados em escala de seno ao quadrado.

é o da Figura 3.61, na qual se vêem cinco diferentes curvas de coeficientes de reflexão,


correspondentes a uma interface que, na Figura 3.60, situa-se no tempo igual a 420ms.
Observa-se na Figura 3.61 que, como seria de se esperar, a equação mais precisa é
a original de Frasier, Richards e Aki, usada na técnica ABC. Em segundo lugar, vem
a equação 3.7.3, usada na técnica ĀD̄. O pior resultado é o da equação 3.7.2, usada na
técnica ĀB̄. Uma evidência gritante é o fato de que a declividade da reta a é positiva
enquanto a declividade correta, correspondente à reta b, é negativa.
A discrepância entre as retas a e b, observada na Figura 3.61, é função de uma
importante caracterı́stica da técnica ĀB̄: o valor de B̄ é afetado pelo parâmetro C de
forma proporcional a seu módulo e ao ângulo de incidência. A mesma caracterı́stica está
presente na Figura 3.60, na qual se observa que que o erro B̄ − B, representado no traço
7, é proporcional ao valor de C. Em termos algébricos, a seguinte relação, baseada na
expressão 3.7.1, se aplica:
B̄ ∼
= B + CQS (3.7.5)
P P
onde o fator QS é definido por n tan 2 θ̄n sen 2 θ̄n / n sen 2 θ̄n , ou seja, é igual à média,
ponderada por sen 2 θ̄, de tan 2 θ̄.
Para ilustrar a importância da expressão 3.7.5, deve-se destacar que, se a faixa de
ângulos de incidência variasse entre 00 e 560 , B̄ seria aproximadamente igual a B +
C. No caso da Figura 3.61, que envolveu ângulos de incidência entre 00 e 400 , B̄ é
aproximadamente igual a B +0.38C. Conclui-se assim que, na técnica ĀB̄, uma anomalia
de velocidade poderia ser falsamente atribuı́da a uma anomalia de razão de Poisson.
446 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Caracteriza-se desta forma a chamada anomalia de AVO não linear.


Fenômenos similares, embora menos importantes, ocorrem com a diferença D̄ − D,
a qual é proporcional ao parâmetro E (equação 2.6.42). No caso, tem-se a seguinte
aproximação:
D̄ ∼
= D − EQS (3.7.6)

Ou seja, a estimativa do parâmetro D, dada por D̄, é contaminada pela variação relativa
da densidade. Este resultado significa que, se a faixa de ângulos de incidência variasse
entre 00 e 560 , o parâmetro D̄ seria aproximadamente igual a D − ∆ρ/2ρ̄.
Com base na Figura 3.61, induz-se que os problemas relacionados à estimação do
parâmetro B poderiam ser parcialmente resolvidos ou, no mı́nimo, bem caracterizados,
através da aplicação da técnica ABC ou, até mesmo, da técnica ĀD̄. Com esta indução,
a avaliação da qualidade dos parâmetros de AVO poderia ser encerrada, não fora o fato
de que a validade da própria expressão 3.7.1 merece ser questionada, particularmente em
situações de altos contrastes elásticos, a exemplo da que se observa na Figura 3.60. A
este respeito, deve-se destacar que se o máximo ângulo de incidência usado na Figura
3.60 fosse 20 graus, em vez de 40, os erros das três técnicas seriam reduzidos, embora
em maior grau no caso da técnica ĀB̄. Além disso, como se verá adiante, os processos
de inversão envolvem a aplicação de algoritmos recursivos e, desta forma, favorecem a
propagação de erros pontuais, ainda que pequenos.

3.7.2 Inversão acústica


A análise conduzida no subitem 3.7.1 permite concluir que a estimativa do parâmetro
A, baseada em qualquer uma das três técnicas discutidas, pode ser considerada uma boa
representação de um coeficiente de reflexão obtido na ausência de afastamento fonte-
receptor. Criam-se, assim, condições para aplicar, com relativo sucesso, as técnicas de
inversão acústica voltadas para a obtenção de representações sı́smicas das impedâncias
acústicas do meio, na forma proposta originalmente por Lindseth (1979) e Lavergne e
Willm (1977).
Idealmente, as impedâncias acústicas poderiam ser obtidas, a partir de estimativas
sı́smicas dos coeficientes de reflexão, através da seguinte versão da equação 2.6.57:

t−1
Y 1 + r̂n
It = I 1 (3.7.7)
n=1
1 − r̂n

onde I é a impedância acústica, r̂n é a estimativa sı́smica do coeficiente de reflexão na


amostra de ı́ndice n (ou seja, r̂n corresponde ao parâmetro An , o qual é definido pela
equação 2.6.34), enquanto t é o ı́ndice da amostra que está sendo avaliada.
Percebe-se assim que, com os dados sı́smicos adequadamente processados e o valor de
I1 , pode-se estimar as impedâncias acústicas associadas à função refletividade, de forma
recursiva, da primeira para a última amostra de cada traço sı́smico. De acordo com a
discussão do item 2.6, a expressão 3.7.7 pode ser alterada para uma forma numericamente
mais estável, aplicável ao caso em que a média RMS dos coeficientes de reflexão é pequena.
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 447

O resultado é a seguinte aproximação:


t−1
!
X
It ∼
= I1 exp 2 r̂n (3.7.8)
n=1

onde o somatório envolvendo os coeficientes de reflexão pode ser visto como uma inte-
gração numérica adimensional — uma soma corrida — com relação ao tempo.
Aplicando-se o logaritmo neperiano ao resultado expresso pela equação 3.7.8, pode-se
isolar o termo que envolve a integração numérica adimensional dos coeficientes de reflexão,
a qual corresponde a uma aproximação de primeira ordem para a inversão acústica. O
resultado é a seguinte aproximação:
t−1
1 It ∼ X
ln = r̂n (3.7.9)
2 I1 n=1

ou, aplicando-se uma aproximação adicional,


  Xt−1
1 It ∼
lt ≡ −1 = r̂n (3.7.10)
2 I1 n=1

onde lt é uma versão normalizada das impedâncias acústicas (ver o item 2.6).
Uma seção de pseudo-impedâncias acústicas, obtida através da equação 3.7.8, ou
3.7.9, reflete de forma clara as deficiências na parte inferior da banda espectral do traço
sı́smico, mencionadas na introdução deste item. Esta caracterı́stica é particularmente
evidente onde a velocidade varia substancialmente, como se pode observar no exemplo da
Figura 3.62. Percebe-se na figura que, apesar da boa correlação entre o perfil sônico e os
dados sı́smicos, as estimativas de impedância acústica não reproduzem o crescimento da
velocidade com a profundidade, visı́vel no perfil. Percebe-se ainda que algumas feições
localizadas, caracterizadas pelos componentes de freqüência mais alta, não puderam ser
reproduzidas na seção de pseudo-impedâncias acústicas.
Considerando-se que, após a deconvolução dos dados sı́smicos, a ausência de compo-
nentes de alta freqüência é, na maioria dos casos, inexorável, resta tentar enriquecer a
parte baixa da banda espectral dos traços sı́smicos. Para isso, é necessário recorrer a ou-
tras fontes de dados, capazes de levar à obtenção de informações na faixa de freqüências
próximas de zero e que não sejam diretamente dependentes das amplitudes sı́smicas.
Este é o caso dos perfis de poços, das técnicas de inversão cinemáticas, representadas,
por exemplo, pelas equações 3.1.22 e 3.1.23, e das análises de velocidade de empilhamento
ou de migração. A melhor alternativa consiste em combinar todas estas fontes de dados,
já que a mais segura delas, correspondente aos perfis de poços, é muito esparsa, portanto
insuficiente para resolver o problema.
A combinação entre as técnicas citadas e a interpretação dos dados sı́smicos leva
normalmente à geração de modelos caracterizados por pacotes de velocidade intervalar
caracterı́stica, separados por contrastes acentuados. Para transformar esta informação
em estimativas válidas dos componentes de baixa freqüência dos coeficientes de reflexão,
executa-se a seguinte seqüência de operações:
1. Obtém-se a série de velocidades intervalares em função do tempo, preferencialmente
com ajuste aos poços porventura existentes.
448 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

Figura 3.62: Exemplo de seção de pseudo-impedâncias acústicas, juntamente com


o perfil sônico de um poço da Bacia de Campos. (Figura gerada por José Tassini e
Roberto Morales).

2. Aplica-se, à série obtida, um filtro passa-baixas, atenuando-se as freqüências acima


de um certo valor, equivalente à mı́nima freqüência útil presente no traço sı́smico
(por exemplo, 5Hz ou 6Hz).

3. As densidades e, por extensão, as impedâncias acústicas, são calculadas a partir


das próprias velocidades intervalares filtradas, com o apoio de expressões empı́ricas
como a de Gardner et al. (1974), a qual é dada por

ρ = av b (3.7.11)

onde a e b são constantes. Tipicamente, a = 0.31 e b = 0.25, para a densidade dada


em gramas por centı́metro cúbico e a velocidade em metros por segundo, constantes
estas válidas para clásticos do golfo do México, de acordo com o trabalho original
de Gardner et al. (1974).

4. Com o resultado da etapa 3, calculam-se os componentes de baixa freqüência dos


coeficientes de reflexão, através da equação 2.6.16. Obviamente, o resultado será
uma aproximação que, em muitos casos, é satisfatória.

Desta forma, passa-se a dispor, na posição espacial correspondente a cada traço


sı́smico, de dois conjuntos de coeficientes de reflexão, um deles calculado a partir do
próprio traço sı́smico e o outro obtido com base em velocidades intervalares. Garantin-
do-se que os conteúdos de freqüência dos dois conjuntos de dados sejam complementares,
a soma de ambos conduz a uma razoável estimativa dos coeficientes de reflexão corretos.
Entretanto, a estimativa do peso relativo de cada um deles, necessária para se fazer a
combinação entre os dois, não é um problema trivial. A técnica mais simples é baseada
na premissa de que o resultado da soma deve ser estatisticamente compatı́vel com os
coeficientes de reflexão calculados em poços da área estudada, não somente no que diz
respeito à média RMS mas, também, à distribuição dos componentes de freqüência (ver
discussão sobre a cor da função refletividade nos itens 2.6 e 3.2).
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 449

Figura 3.63: Exemplo de seção de pseudo-velocidades intervalares.

Com a série de coeficientes de reflexão assim obtida, pode-se aplicar a expressão 3.7.8,
para se estimar as pseudo-impedâncias acústicas e, através delas, com o apoio da equação
3.7.11, obter uma seção de pseudo-velocidades intervalares. No exemplo da Figura 3.63,
vê-se que a utilização de informações de baixa freqüência garantiu a introdução de va-
riações mais lentas nas pseudo-velocidades intervalares. Desta forma, criam-se condições
para estimar, ainda que grosseiramente, os valores absolutos das velocidades intervalares.
O resultado final obtido apresenta ainda limitações importantes, que reforçam a con-
veniência de se adotar o nome de pseudo-velocidades intervalares, em função das seguintes
razões: (1) a influência das densidades é apenas atenuada, através de um modelo empı́rico
que não pode ser aplicado indiscriminadamente; (2) se a inversão tiver sido aplicada a
traços sı́smicos empilhados, o resultado pode apresentar influências indesejáveis da razão
de Poisson. Além disso, deve-se enfatizar que a combinação dos componentes de altas
e baixas freqüências dos coeficientes de reflexão, na forma descrita acima, é, na melhor
hipótese, apenas aceitável.
O processo inverso descrito pode ter diversas aplicações práticas, uma das quais con-
siste na obtenção de estimativas de porosidade, usando-se os dados de pseudo-velocidades
intervalares. Nesta técnica, utiliza-se normalmente a equação 3.7.11, conforme se discute
no Capı́tulo 4. Pode-se ainda acrescentar, ao processo, a conversão de tempo para pro-
fundidade, ou a utilização de dados sı́smicos migrados em profundidade.

3.7.3 Inversão elástica


Em uma das possı́veis formas de inversão elástica, procura-se estimar as razões de ve-
locidade, vP2 /vP1 , de densidade, ρ2 /ρ1 , e as razões de Poisson, σ1 e σ2 (ou a diferença
∆σ) associadas a cada interface, usando-se as estimativas dos coeficientes de reflexão,
em função do ângulo de incidência, obtidas ao final do processamento. A mais óbvia
descrição desse processo consiste em inverter a equação 2.6.21, como foi feito por Rosa
450 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

(1976), seguindo sugestão de Fred Hilterman. Nesta tarefa, observam-se importantes


dificuldades, parte delas resumida no inı́cio deste item.
Dentre as alternativas para a técnica mencionada, pode-se citar a que inclui, como
primeiro passo, a obtenção de estimativas dos parâmetros A, B e C, os quais são consi-
derados representativos de três funções refletividades distintas. Nos termos das equações
2.6.34, 2.6.40 e 2.6.35, o parâmetro A representa uma medida do contraste de im-
pedância acústica, o parâmetro C representa uma medida do contraste de velocidade
P e o parâmetro B representa uma medida da combinação de três diferentes contrastes.
Este modelo leva facilmente à indução de que a inversão elástica pode ser tratada de
forma similar à acústica. Aplicada ao caso, isto implica submeter os traços A, B e C
a uma integração numérica adimensional, ao longo do tempo. Tomando-se as equações
2.6.34, 2.6.40 e 2.6.35 como definição dos mesmos parâmetros, obtêm-se as seguintes
expressões, cada uma delas gerando como resultado uma amostra no tempo de ı́ndice t:
t−1  
1 X ∆vPn ∆ρn
AI = + , (3.7.12)
2 n=1 v̄Pn ρ̄n
t−1   t−1   t−1
1X ∆vPn ∆ρn 1X ∆vPn X ∆σn
BI = − kn + + (1 − kn ) + (3.7.13)
2 n=1 v̄Pn ρ̄n 2 n=1 v̄Pn n=1
(1 − σ̄n )2
e
t−1
1 X ∆vPn
CI = (3.7.14)
2 n=1 v̄Pn
onde 1  2
− σ̄2 v̄S
k=4 =4 (3.7.15)
1 − σ̄ v̄P
O leitor poderá observar que, com exceção do termo que envolve a razão de Poisson,
as equações 3.7.12 a 3.7.14 envolvem somatórios com a seguinte propriedade em comum:
t−1 t−1
X X ∆xn
∆ ln xn ∼
= (3.7.16)
n=1 n=1
x̄n

onde ∆ ln x é uma diferença centrada entre dois valores sucessivos de qualquer uma das
propriedades elásticas identificadas, no caso, por x. Por outro lado, o termo envolvendo
a razão de Poisson pode ser tratado na forma da seguinte expressão:
t−1 t−1
X ∆σn ∼ X
2 = ∆ (1 − σn )−1 (3.7.17)
n=1
(1 − σ̄n ) n=1

Com as relações 3.7.16 e 3.7.17, as equações 3.7.12 a 3.7.14 podem ser transformadas
em expressões algebricamente mais simples, além de mais facilmente interpretáveis. O
resultado é:
1 It
AI = ln (3.7.18)
2 I1
onde I é a impedância acústica,
σt − σ 1
BI = −k̄AI + (1 − k̄)CI + (3.7.19)
(1 − σt ) (1 − σ1 )
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 451

ou, com base na Tabela 2.1 (página 181),


   
v St 1 + k̄ ρt
BI = AI − k̄ ln + ln (3.7.20)
v S1 2k̄ ρ1
e
1 v Pt
CI = ln (3.7.21)
2 v P1
sendo k̄ um valor médio do parâmetro k.
Nas aplicações da equação 3.7.19, o valor médio de k, ou seja, k̄, depende da faixa de
freqüências envolvidas. Considerando o caso tı́pico em que a mı́nima freqüência útil oscila
em torno de 5 ou 6Hz, os somatórios definidos pelas expressões 3.7.12, 3.7.13 e 3.7.14 são
representativos de propriedades que variam dentro de intervalos de tempo relativamente
pequenos, da ordem de 100 a 200ms. Em intervalos deste porte, admite-se que o valor de
k seja aproximadamente constante e que, portanto, k̄ possa ser estimado com a equação
3.7.15, usando-se componentes de baixas freqüências das velocidades intervalares P. O
cálculo da velocidade S, necessário para se estimar k̄, depende de expressões empı́ricas
como as obtidas por Castagna et al. (1985) e Castagna et al. (1993). No primeiro caso,
tem-se (ver o item 4.2):
1
vS = (vP − c) (3.7.22)
m
onde m e c são constantes que, na forma original, são iguais a 1.16 e 1360, para velocidades
quantificadas em metros por segundo.
Admita-se agora que, com as expressões 3.7.18 a 3.7.21, seja possı́vel obter estimativas
confiáveis dos traços AI , BI e CI . Neste caso, o processo de inversão pode ser levado
um pouco mais adiante. Para isto, combinam-se os três resultados, de forma a obter as
seguintes expressões para a razão de Poisson e a densidade:
σt − σ 1 ∼
= BI + k̄AI + (k̄ − 1)CI (3.7.23)
(1 − σt ) (1 − σ1 )
e
1 ρt ∼
EI = ln = AI − C I (3.7.24)
2 ρ1
Como se afirmou anteriormente, o processo de inversão apresentado exige a obtenção
de estimativas dos parâmetros A, B e C, antes de se obter AI , BI e CI . Entretanto,
a linearidade caracterı́stica do processo descrito possibilita tratar o mesmo problema de
uma forma alternativa, baseada na seguinte expressão55 :

et (θ̄) ∼
= AI + BI sen 2 θ̄ + CI tan 2 θ̄ sen 2 θ̄ (3.7.26)
55
Observe-se que, com base nas equações 3.7.12 a 3.7.14, a expressão 3.7.26 pode ser transformada no
que alguns autores denominam uma “impedância elástica” (Connolly, 1999). O resultado é:
  It 
exp 2et (θ̄) ∼
= exp 2BI sen 2 θ̄ + 2CI tan 2 θ̄ sen 2 θ̄ (3.7.25)
I1
Ressalte-se entretanto que, com mais propriedade do que no caso acústico, deve-se anexar o prefixo
“pseudo” ao termo “impedância elástica”.
452 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

vP σ ρ

Tempo (ms)
100

200
0 10 20 30 40 0 10 20 30 40
0

vP σ ρ
Tempo (ms)

100

200
0 10 20 30 40 0 10 20 30 40

Figura 3.64: Perfis sintéticos normalizados e as corres-


pondentes respostas sı́smicas em função do ângulo de in-
cidência, no caso de um reservatório saturado de petróleo,
encaixado em folhelhos. No alto, vêem-se traços-ângulo de
coeficientes de reflexão (no centro) e traços-ângulo invertidos
(à direita). Embaixo, foi incluı́da a influência de um pulso
sı́smico de fase nula (8-60Hz). Nas abscissas, os números
indicam ângulos de incidência em graus.

onde et (θ̄) representa uma integração numérica adimensional (uma soma corrida), com
relação ao tempo, aplicada às estimativas dos coeficientes de reflexão para cada ângulo
de incidência, ou seja,
t−1
X
et (θ̄) = r̂n (θ̄) (3.7.27)
n=1
Na forma da equação 3.7.26, a inversão elástica é fundamentada nos chamados traços-
ângulo, ou seja, traços sı́smicos representados em função do ângulo de incidência, em
vez do afastamento fonte-receptor. Na Figura 3.64, apresenta-se um exemplo de como
os traços-ângulos de coeficiente de reflexão, r(θ̄), se relacionam com os traços-ângulos
resultantes da aplicação da equação 3.7.27. O exemplo foi construı́do de forma proposi-
talmente dirigida para o caso, relativamente comum, em que o topo de um reservatório
é gradacional. Observe-se que, ao contrário dos coeficientes de reflexão, que são função
de simples contrastes elásticos, os traços-ângulo invertidos, et (θ̄), são proporcionais às
próprias propriedades elásticas do meio.
Calculados os traços-ângulo, et (θ̄), como no exemplo da Figura 3.64, pode-se obter
as estimativas de AI , BI e CI , usando-se a técnica ABC, descrita no subitem 3.7.1 e no
Apêndice A.4. Um tratamento alternativo, mais simples, é baseado na técnica ĀB̄. No
caso, substitui-se a expressão 3.7.26 pela seguinte aproximação:

et (θ̄) ∼
= ĀI + B̄I sen 2 θ̄ (3.7.28)
3.7. TÉCNICAS APROXIMADAS DE INVERSÃO 453

onde os parâmetros ĀI e B̄I correspondem a novas versões da interseção e do gradiente.


Implı́citas neste resultado estão as seguintes aproximações: ĀI ∼ = AI e B̄I ∼
= BI , onde AI
e BI foram definidos pelas equações 3.7.12 e 3.7.13, ou 3.7.18 e 3.7.19, respectivamente.
Um tratamento de melhor qualidade do que o propiciado pela expressão 3.7.28 é
baseado na técnica ĀD̄. No caso, aplica-se a seguinte aproximação, obtida a partir da
equação 3.7.3:

et (θ̄) ∼
= ĀI 1 + tan 2 θ̄ + D̄I sen 2 θ̄ (3.7.29)

onde o parâmetro ĀI já foi definido e D̄I é dado, a partir da Tabela 2.1 (página 181),
por
   
∼ v St 1 + k̄ ρt
D̄I = −k̄ ln + ln (3.7.30)
v S1 2k̄ ρ1
ou  
k̄ − 1 ρt σt − σ 1
D̄I ∼
= −2k̄AI + ln + (3.7.31)
2 ρ1 (1 − σt ) (1 − σ1 )
Observe-se na primeira expressão que o valor de D̄I é proporcional à aproximação de um
parâmetro elástico que se poderia denominar “impedância S”.
Em resumo, viu-se que a inversão elástica baseada nos parâmetros de AVO pode ser
aplicada de acordo com os seguintes modelos: (1) estimam-se os parâmetros A, B e C (ou
Ā e B̄, ou Ā e D̄) e, com os resultados obtidos, estimam-se AI , BI e CI (ou ĀI e B̄I , ou
ĀI e D̄I ); (2) estimam-se diretamente AI , BI e CI (ou ĀI e B̄I , ou ĀI e D̄I ), aplicando-se
a técnica ABC (ou ĀB̄, ou ĀD̄) aos traços-ângulo que, anteriormente, devem ter sido
submetidos a uma soma corrida ao longo do tempo (equação 3.7.27). Em tese, as duas
alternativas levam ao mesmo resultado, desde que a aproximação da equação 3.7.1 seja
aplicável.
Neste ponto, o leitor, lembrando-se da discussão apresentada no subitem 3.7.1, deve
estar se perguntando o que se poderia esperar dos resultados de qualquer uma dessas
opções de inversão elástica. Para ilustrar a análise do tema, utilizaram-se os mesmos
perfis apresentados na Figura 3.60 (página 444), com os quais foram calculados, através
da equação 2.6.21, os coeficientes de reflexão correspondentes a cada tempo de reflexão,
variando-se o ângulo de incidência entre 0 e 40 graus. Em seguida, os traços-ângulo
obtidos foram numericamente integrados, na forma da equação 3.7.27, o que levou às
estimativas de et (θ̄), uma para cada ângulo de incidência. Cada traço resultante dessa
operação foi submetido à remoção da média móvel correspondente a uma janela de 100ms.
Na seqüência, estimaram-se, em cada tempo de reflexão, os valores de AI , BI , CI e DI ,
usando-se as técnicas ABC, ĀB̄ e ĀD̄.
Na Figura 3.65, podem ser vistos os valores teóricos de AI , BI , CI e DI /2, calculados
através das equações 3.7.12 a 3.7.14 e 3.7.31, juntamente com os erros obtidos na aplicação
das três técnicas mencionadas. O leitor poderá observar que, com a remoção da média
móvel, os quatro parâmetros elásticos são melhor definidos como variações em relação
às correspondentes médias locais. Por outro lado, ao contrário dos parâmetros A, B,
C e D/2, que descrevem simples contrastes elásticos, eles são proporcionais às próprias
propriedades elásticas do meio.
Também em função da remoção da média móvel, as diferenças entre os resultados
teóricos e os estimados, apresentados nos traços 1 a 7 da Figura 3.65, são relativamente
454 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

0
vP vS ρ AI BI CI DI /2 1 2 3 4 5 6 7

200
Tempo (ms)

400

600

800

Figura 3.65: Perfis elásticos de um poço da Bacia de Campos e os


correspondentes valores teóricos de A I , BI , CI e DI /2, juntamente com
os erros resultantes do processo de inversão. Os traços 1 a 7 correspon-
dem ao resultado da diferença entre os valores estimados e os teóricos
de: traços 1, 2 e 3 - AI , BI e CI (técnica ABC); traços 4 e 5 - AI e
DI /2 (técnica ĀD̄); traços 6 e 7 - AI e BI (técnica ĀB̄). O máximo
ângulo de incidência usado foi 40 0 . Os traços sı́smicos sintéticos inver-
tidos e os parâmetros teóricos foram submetidos à remoção da média
móvel (janela de 100ms).

pequenas, repetindo o comportamento observado na Figura 3.60, na qual erros signifi-


cativos são observados apenas onde ocorrem os maiores contrastes elásticos. Ressalte-se
que, também à semelhança da Figura 3.60, os mesmos erros tornar-se-iam bem menores
se o máximo ângulo de incidência empregado no processo não passasse de 20 graus.
Em algumas circunstâncias, pode ser conveniente obter estimativas, ainda que gros-
seiras, dos valores absolutos das propriedades elásticas. Para a obtenção desses valores,
combinam-se os componentes de freqüência mais alta dos coeficientes de reflexão, basea-
dos nas amplitudes sı́smicas, e os componentes de freqüência próxima de zero dos mesmos
coeficientes, os quais são estimados com base nas velocidades intervalares de onda com-
pressional, as mesmas empregadas nos processos de inversão acústica e de cálculo do
parâmetro k̄.
A obtenção dos componentes de baixa freqüência dos coeficientes de reflexão pode
ser conduzida, em cada agrupamento CMP, ou CI, através da seguinte seqüência de
operações:

1. Obtém-se a série de velocidades intervalares de onda compressional em função do


tempo, preferencialmente com ajuste aos poços porventura existentes.

2. Aplica-se, à série obtida, um filtro passa-baixas, cortando-se as freqüências acima


de um certo valor, equivalente à mı́nima freqüência útil presente nos traços sı́smicos
(por exemplo, 5Hz ou 6Hz).
3.8. FONTES DE CONSULTA 455

3. As densidades e, por extensão, as impedâncias acústicas, são calculadas a partir


das velocidades intervalares filtradas, com o apoio de expressões empı́ricas como a
3.7.11 (ver o subitem 3.7.2).
4. As velocidades S e, por extensão, as razões de Poisson, podem também ser estima-
das a partir das velocidades intervalares filtradas, utilizando-se expressões como a
3.7.22.
5. Os dados obtidos nas etapas anteriores são usados para se calcular coeficientes de
reflexão em função do ângulo de incidência e os correspondentes traços-ângulo.
Com os resultados obtidos, dispõem-se agora, na posição espacial correspondente a
cada agrupamento CMP, ou CI, de dois conjuntos de coeficientes de reflexão, um deles
calculado a partir do próprio traço sı́smico e o outro obtido através de técnicas empı́ricas
aplicadas às velocidades de empilhamento, ou de migração. A etapa subseqüente consiste
em combiná-los de forma adequada, garantindo-se que os conteúdos de freqüência dos dois
conjuntos de dados sejam complementares, de tal forma que a soma de ambos conduza
a uma razoável estimativa dos coeficientes de reflexão corretos. Também como no caso
acústico, esta tarefa é conduzida de forma empı́rica, dependente de informações adicionais,
como os perfis de poços.
Os coeficientes de reflexão assim obtidos são submetidos à aplicação dos algoritmos
de inversão elástica já apresentados. Ressalte-se que, dada a alta dose de empirismo
envolvida na técnica descrita, sua utilização deve ser cuidadosa e, se possı́vel, baseada em
critérios estatı́sticos. Aliada ao fato de que, em geral, os intervalos geológicos de interesse
envolvem anomalias de curta duração, esta idéia permite afirmar que, em grande parte das
circunstâncias práticas, as estimativas sem baixas freqüências dos parâmetros elásticos
podem ser mais adequadas.

3.8 Fontes de Consulta


Alguns dos problemas associados à técnica CDP são bem abordados por Hubral e Krey
(1980), Al-Chalabi (1974, 1979) e pela coletânea de artigos editada por Byun (1990), a
qual inclui também, entre outros tópicos, a anisotropia. Na área de deconvolução, citam-
se o livro de Robinson e Treitel (1980) e as coletâneas de artigos editadas por Webster
(1978), Robinson e Osman (1996) e Osman e Robinson (1996). No que diz respeito à
migração de dados sı́smicos, recomendam-se para leitura os livros de Claerbout (1985),
Stolt e Benson (1986), Yilmaz (1987) e Berkhout (1980, 1987). No que diz respeito à
correção de DMO, citam-se Claerbout (1985), Hale (1984, 1991a), a coletânea de artigos
editada por Hale (1995) e Yilmaz (1987). Quanto à inversão, sugere-se a coletânea de
artigos editada por Lines (1988) e o texto de Lindseth (1982). O tema AVO pode ser
estudado nos artigos e livros relacionados à variação do coeficiente de reflexão com o
ângulo de incidência, citados no item 2.10. O mesmo ocorre com os fatores de propagação.

3.9 Exercı́cios
1. O que se pode esperar da qualidade dos resultados da equação 3.1.22 se: (a) o afastamento
fonte-receptor mı́nimo é 2000m e o máximo é 4000m? (b) o afastamento mı́nimo é 0m
456 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

e o máximo é 2000m? (c) o afastamento mı́nimo é 0m e o máximo é 4000m? Qual


das situações aproxima melhor o valor correto da velocidade intervalar, em um meio de
camadas planas e horizontais?

2. Diga como a técnica de Ziolkowski et al. (1982), apresentada no subitem 3.2.1, poderia
ser modificada para se obter, no domı́nio do tempo, uma assinatura média de todos os
canhões, em vez de uma
P assinatura para cada canhão. (Sugestão: altere a equação 3.2.4
introduzindo a soma n Sn (ω) e estime a média C̄(ω)).
1
3. Suponha que se deseja deconvolver o binômio A(Z) = 3 /2 (1 + Z). Calcule o valor de sua
autocorrelação no deslocamento igual a zero e adicione o equivalente a 2/3 do resultado
na forma de luz branca. Em seguida, estime qual seria o binômio de fase mı́nima que
teria a autocorrelação resultante. Compare as caracterı́sticas de fase do binômio obtido
com as do binômio original e avalie como a luz branca afeta a deconvolução.

4. Analise, intuitivamente, o efeito do ruı́do branco, presente nos dados sı́smicos, sobre três
técnicas de deconvolução distintas, aplicadas a um pulso sı́smico tı́pico, como o da Fi-
gura 2.11 (página 90): (a) deconvolução de fase mı́nima convencional; (b) deconvolução
estatı́stico-determinı́stica e; (c) correção de fase baseada na modelagem do efeito da de-
convolução convencional sobre o pulso sı́smico (página 314).

5. Estime qual seria a forma aproximada de um pulso sı́smico terrestre e de um marı́timo


se as respostas do instrumento e do geofone fossem desprezadas e o efeito da atenuação
fosse incluı́do.

6. Suponha que o coeficiente de reflexão da superfı́cie livre seja −0.9, o atraso do fantasma
seja de 3 amostras (τ = 3∆t) e a divergência esférica seja desprezada. Usando transfor-
mada Z, analise o efeito da deconvolução sobre o operador do fantasma correspondente
supondo que o valor estimado de τ tenha sido de 4 amostras, em vez do valor correto.

7. Considere o caso em que se deconvolve o efeito do fantasma através da equação 3.2.10,


ou 3.2.11, e resolva as seguintes questões: (a) imagine um estratagema para reduzir a
importância de erros na profundidade do cabo de hidrofones ou da fonte; (b) no que diz
respeito à organização dos dados em diferentes agrupamentos, como seria a aplicação da
equação no caso em que se deseja remover tanto o fantasma da fonte quanto o do cabo
de hidrofones?

8. Suponha que uma seção sı́smica tenha sido processada de acordo com a seguinte seqüência:
(a) calculou-se o filtro que transforma o pulso sı́smico registrado, sem o fantasma do
receptor, em seu equivalente de fase mı́nima; (b) convolveu-se o filtro obtido com os
dados registrados e; (c) o resultado foi submetido à deconvolução de fase mı́nima. No que
diz respeito à fase do resultado final, esta seqüência apresenta uma importante deficiência.
Qual é ela e o que pode ser feito para corrigir a fase dos dados obtidos, sem usar perfis
de poços?

9. Analise as deficiências do tratamento de fase feito pela deconvolução de fase mı́nima em


uma área onde a razão sinal-ruı́do varia lateralmente. Como o empilhamento baseado na
técnica CDP afeta as mesmas deficiências?

10. De que forma as reverberações afetariam a deconvolução de fase nula?

11. A deconvolução iterativa depende de uma estimativa razoável do pulso sı́smico de fase
nula presente nos dados. Sabe-se que o correspondente espectro de amplitude muda com
3.9. EXERCÍCIOS 457

o tempo, em função da absorção. Nestas condições, qual seria o melhor estratagema para
aplicar a mesma deconvolução?

12. Descreva vantagens e desvantagens teóricas do balanceamento espectral, em comparação


com a deconvolução iterativa, particularmente no que diz respeito aos ruı́dos aleatórios
de alta freqüência.

13. Qual seria a principal limitação da técnica de deconvolução descrita pela equação 3.2.46?
(Sugestão: leve em conta as dimensões relativas da região abrangida pelos perfis de poços
e a resolução lateral dos dados sı́smicos).

14. Na correção do espalhamento geométrico baseada na equação 2.5.105, o que ocorreria se


as velocidades empregadas tivessem sido estimadas na presença de mergulho? Como seria
a mesma equação, se o meio fosse homogêneo e isotrópico?

15. Avalie como diferentes valores de f 0 afetariam a forma e o sinal do espectro de fase do
operador descrito pela equação 3.3.13. No mesmo caso, analise o que ocorreria com o
pulso, no domı́nio do tempo se o valor de f 0 fosse: (a) maior do que o correto e; (b)
menor do que o correto.

16. Use as equações A.2.1 e A.2.7 (Apêndice A.2), ambas truncadas no segundo termo, para
obter um filtro recursivo de dois pontos para a compensação Q, como proposto por O.
Duarte. (Sugestão: na primeira equação, substitua τ por ∆τ ).

17. Na Figura 3.23 (página 345), o ângulo de mergulho da interface e o de migração foram
iguais, respectivamente, a 400 e 600 . Avalie como seria a geometria da reflexão migrada
se o ângulo de migração fosse igual a 30 0 .

18. Calcule as coordenadas, após a migração, de uma reflexão registrada em um tempo de 1s,
com inclinação de 1ms/m, em um meio homogêneo e isotrópico, para o qual a velocidade
de propagação é de 2000 m/s (ou seja, de acordo com o modelo do refletor explosivo,
v = 1000m/s, na equação 3.4.3). Qual é o mergulho aparente? E o real?

19. No cruzamento de duas linhas A e B, levantadas em direções perpendiculares, foi regis-


trada uma reflexão a 1s da superfı́cie. Na linha A, o evento tinha um mergulho aparente
de 0.5ms/m e, na linha B, foi registrado sem mergulho. Supondo que a velocidade de
propagação seja 2000m/s (ou seja, na equação 3.4.3, v = 1000m/s), migre o evento sepa-
radamente nas duas linhas, estimando as coordenadas reais do ponto que deu origem à
reflexão registrada. Qual é o modelo estrutural que explica a observação? Como seria a
amarração entre as duas linhas migradas?

20. Por que a migração de um impulso unitário, em uma seção empilhada, dá origem a um
evento com forma semi-circular?

21. Considerando que a Figura 3.25 (página 348) corresponde à migração bidimensional de
um impulso unitário isolado, explique, usando argumentos intuitivos, por que a amplitude
do resultado obtido decresce na direção da superfı́cie, onde é igual a zero. Se a migração
fosse feita em três dimensões, em que a amplitude e a fase seriam diferentes? (Sugestão:
tente prever, no caso, qual seria o sinal registrado se não existisse o fator de obliqüidade).

22. Analise as equações 2.2.26 e 3.4.19 e discuta as diferenças entre os processos de extra-
polação direta e inversa.
458 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

23. A propagação de ondas sı́smicas é um processo elástico, ou seja, não gera deformações
permanentes. Assim, o que se deve esperar do resultado da soma de todas as amplitudes
do pulso sı́smico? Como este conceito se reflete na extrapolação de campos de onda?

24. Idealize um esquema, para a migração Kirchhoff em tempo, que respeite a curva tempo-
distância correta, mesmo no caso de meios que apresentem forte variação lateral na veloci-
dade. Em que a técnica de migração resultante é diferente da migração em profundidade
seguida da conversão de profundidade para tempo?

25. Altere as equações 3.4.24 e 3.4.25 para contemplar o caso da migração em tempo. Com
base no resultado obtido, diga qual seria o resultado da migração recursiva se a velocidade
utilizada fosse igual a zero.

26. Explique por que, na equação 3.4.25, o deslocamento de tempo está associado à razão
∆z/ cos θ, enquanto, nas equações 3.5.34 e 3.5.37, aparece o termo ∆z cos θ. (Sugestão:
na Figura 3.24, na página 346, considere zM igual a ∆z, deduza a expressão que define h
em função de θ e ∆z e raciocine a respeito do papel da igualdade t = 0 na extrapolação
inversa).

27. Imagine um esquema para se mudar sinteticamente a profundidade de registro para um


datum qualquer, com base na integral de Kirchhoff. A expressão “correções estáticas”
aplica-se ao caso?

28. Suponha que a equação 3.5.34 seja aplicada a uma reflexão cuja geometria é definida por
δ(t − px), onde p é constante. Mostre que o resultado é outro evento com geometria dada
por δ(t − px + ∆τ cos θ), onde ∆τ = ∆z/v. Como o mergulho aparente é alterado no
processo? (Sugestão: use a Figura 2.6, na página 80, e analise o papel das distâncias ∆z
e ∆t).

29. Faça um fluxograma, ou um pseudo-programa, dos diversos algoritmos de migração dis-


cutidos no item 3.5 e discuta a influência da velocidade sobre cada um deles, levando
em consideração os seguintes temas: (1) velocidade de empilhamento versus intervalar
versus média versus RMS; (2) variação vertical de velocidade e; (3) variação lateral de
velocidade.

30. Qual seria o resultado da migração do sinal representado na Figura 3.30 (página 358),
se a velocidade usada fosse constante? Na migração Kirchhoff dos mesmos dados, o que
deveria ser feito para a obtenção do resultado correto? E na migração por deslocamento
de fase?

31. Compare o resultado da migração bidimensional de um impulso unitário com os ope-


radores Kirchhoff (Figura 3.25, na página 348) e por diferenças finitas no domı́nio da
freqüência (Figura 3.40, na página 386) e comente as deficiências deste último, levando
em conta que os dois resultados foram obtidos nas mesmas condições.

32. Por que, na migração de seções empilhadas, há necessidade de se utilizar a metade da
velocidade de migração, em vez de simplesmente se considerar o tempo duplo? Como o
mesmo conceito se reflete nos diversos algoritmos discutidos?

33. Qual é o resultado da migração de eventos cuja vagarosidade horizontal é maior do que a
maior vagarosidade do operador de migração? Para responder, analise separadamente o
caso da migração Kirchhoff e o da migração por deslocamento de fase.
3.9. EXERCÍCIOS 459

34. Assumindo que a mı́nima espessura de camada que se consegue resolver na direção vertical
é dada por λ/4, utilize a Figura 2.16 (página 97) para deduzir qual é a menor distância
horizontal entre duas feições geológicas que a migração consegue resolver, em função do
ângulo de migração α e da resolução vertical. (Sugestão: leve em conta uma camada com
mergulho α e espessura, medida na direção perpendicular ao acamamento, dada por λ/4,
cruzando a linha identificada como refletor na mesma figura).

35. Usando a equação 3.5.54, avalie qual é, no domı́nio tempo-distância, o efeito da divisão
por iω e da aplicação da derivada segunda com relação à distância horizontal. Para isto,
considere as etapas sucessivas de extrapolação inversa durante a migração de um impulso
unitário situado em um tempo arbitrário. (Sugestão: use os teoremas da transformada
de Fourier).

36. Em que condições é indicada a migração tridimensional pós-empilhamento em uma passa-


gem, em comparação com a migração em duas passagens? O que ocorre com a qualidade
dos dados empilhados nas mesmas condições? No caso, qual seria a seqüência de proces-
samento mais indicada?

37. Analise como a correção de NMO é tratada na migração pré-empilhamento, em com-


paração com o processamento convencional.

38. Em que a correção de espalhamento geométrico é diferente se aplicada durante a migração


pré-empilhamento ou na forma explı́cita dada pela equação 2.5.104? (Sugestão: analise o
que ocorre com uma difração em um ponto lateralmente afastado do difrator).

39. Responda às seguintes questões, todas aplicadas à migração pré-empilhamento com o
algoritmo Kirchhoff: (a) na migração de agrupamentos CO, é possı́vel obter uma seção
em que a distância entre traços sı́smicos migrados é menor do que a registrada? (b) na
migração de agrupamentos CS, é possı́vel, com os dados de um único sismograma, obter
informações em uma posição espacial não abrangida pelo lanço? (c) nos dois casos, quais
são as limitações dos resultados obtidos?

40. Explique porque a reflexão R é representada sem mergulho na extremidade esquerda da


Figura 3.44 (página 404).

41. Analise a relação entre o efeito de estiramento e a resolução de dados sı́smicos migrados
comparando as figuras 3.26, 3.46 e 3.54 (páginas 349, 405 e 417).

42. Imagine uma seqüência de impedâncias acústicas relativas dadas por (1, 1.01, 1, 0.75).
Estime os coeficientes de reflexão com a equação 2.6.16 e calcule de volta as impedâncias
acústicas com as expressões 3.7.7 e 3.7.9. Avalie os resultados obtidos nas diversas cama-
das.

43. Na equação 3.7.2, quais seriam as condições para que o produto Ā × B̄ seja positivo? De
que forma o tratamento inadequado do espalhamento geométrico pode mudar o resultado?
E o da atenuação? (Sugestão: analise as equações 2.5.104, 2.5.105 e 3.3.13).

44. Gere dois gráficos cruzados de interseção, Ā, e gradiente, B̄, usando os sismogramas
sintéticos da parte superior da Figura 3.64 (página 452), representando a interseção no
eixo horizontal. Interprete os resultados obtidos. (Sugestão: uma vez que os valores de
amplitude não estão disponı́veis, gere os gráficos de forma relativa).
460 CAPÍTULO 3. MÉTODO SÍSMICO INVERSO

45. Analise de que forma o desconhecimento da fase do pulso sı́smico pode afetar a análise
das seções Ā e B̄ (equação 3.7.2), sob o ponto de vista de um reservatório de alta im-
pedância acústica e outro de baixa. No caso particular do produto Ā × B̄, quais seriam
as conseqüências?

46. A equação 3.7.2 pode ser vista como uma aproximação da equação 2.6.33, desprezando-
se nesta a influência do termo envolvendo a tangente. Que tipo de erro pode-se estar
cometendo quando o ângulo de incidência passa de 30 graus?

47. Analise a Figura 3.64 e procure induzir a influência dos lobos laterais do pulso sı́smico
residual sobre o processo de inversão nos seguintes casos: (a) uma camada de pequena
espessura; (b) duas camadas de alta velocidade separadas por uma camada de espessura
variável.
Capı́tulo 4

INTERPRETAÇÃO

4.1 Introdução
Na forma tratada neste capı́tulo, interpretação sı́smica é um termo abrangente que en-
volve desde a interpretação propriamente dita até os conceitos que permitem relacionar
atributos sı́smicos às propriedades das rochas e dos fluidos, passando por uma análise
crı́tica da capacidade de resolução do método. A tı́tulo de introdução, discutem-se em
seguida dois temas básicos: a calibração dos dados sı́smicos e a representação sı́smica da
geologia.

4.1.1 Calibração dos dados sı́smicos


A versão fundamental da calibração dos dados sı́smicos consiste em estabelecer, com se-
gurança, a relação entre as reflexões e as interfaces geológicas que se procura mapear.
A mais simples técnica, usada nesta tarefa, consiste em se medir, com o perfil sônico e
alguma extrapolação, o tempo duplo da superfı́cie até o nı́vel de interesse, e identificar,
na seção sı́smica, a reflexão correspondente. Para que esta tarefa seja bem-sucedida,
é fundamental que as camadas atravessadas pelo poço tenham dimensões laterais com-
patı́veis com a resolução horizontal da linha sı́smica. Ou seja, o poço deve amostrar
feições geológicas representativas de uma área extensa o suficiente para a geração de um
sinal sı́smico consistente (ver o item 4.4).
Sabe-se que o sinal gerado e gravado na aquisição de perfis sônicos apresenta conteúdo
de freqüências bem mais alto do que um sinal sı́smico convencional: 1 a 20kHz contra
6 a 100Hz. Por causa da dispersão, que implica velocidade de propagação dependente
da freqüência, esta diferença faz com que os intervalos de tempo medidos em um perfil
sônico tendam a ser menores do que os avaliados nos traços sı́smicos. Assim, mesmo que
o perfil sônico seja perfeito, espera-se a ocorrência de drift positivo, definido como um
atraso em tempo sı́smico em relação a um dado intervalo de tempo sônico (em unidades
de ms/s, por exemplo). Esta é uma das razões que justificam a aquisição de dados de
check-shot (tiros de controle).
Nos levantamentos tı́picos dos tiros de controle, empregam-se normalmente fontes
sı́smicas superficiais e geofones situados em profundidades especı́ficas do poço (em geral,
junto ao topo das principais camadas). Os registros correspondentes que, em relação
aos perfis sônicos, apresentam conteúdo de freqüências mais compatı́vel com o dos traços

461
462 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

sı́smicos convencionais, são utilizados para medir o tempo de propagação entre a superfı́cie
e a posição dos geofones. Os valores de tempo assim obtidos permitem corrigir os perfis
sônicos, o que é feito através da transformação de velocidades sônicas em velocidades
sı́smicas.
Ainda que o perfil sônico seja devidamente corrigido ou, alternativamente, que se uti-
lizem apenas os tempos medidos nos registros de tiros de controle, a amarração entre os
perfis de poços e os dados sı́smicos pode estar errada. Para isto, basta, por exemplo,
que a seção sı́smica não tenha processamento de assinatura, ou que não tenha sido ade-
quadamente migrada. Nestas circunstâncias, o tempo estimado com os dados de poços
pode não corresponder, na seção sı́smica, ao da reflexão correta. No caso, a providência
mais indicada consiste em compatibilizar as duas fontes de informação, o que pode ser
concretizado através da obtenção de um sismograma sintético, sem múltiplas, e de um
traço sı́smico registrado no mesmo local, ambos com qualidade tal que a correlação entre
eles seja a melhor possı́vel.
Na computação do sismograma sintético, é obviamente necessária a existência de um
perfil sônico, preferencialmente corrigido com base nos tiros de controle, e de um perfil
de densidades, através dos quais se estimam as impedâncias acústicas e, a partir delas,
os coeficientes de reflexão. Na ausência do perfil de densidades, é comum a utilização
da fórmula empı́rica de Gardner et al. (1974), a qual possibilita a sintetização das den-
sidades a partir das velocidades de onda compressionais. Entretanto, esta alternativa
pode ser pouco indicada em muitos casos como, por exemplo, nas regiões em que a ve-
locidade dos reservatórios é maior do que a da rocha encaixante e a densidade apresenta
comportamento oposto.
Um sismograma sintético sem múltiplas é gerado através da convolução entre a série
de coeficientes de reflexão e um pulso sı́smico, nos moldes do modelo convolucional (ver
o item 2.1). A forma de onda usada deve apresentar conteúdo de freqüências compatı́vel
com o dos dados sı́smicos usados na interpretação, nos quais deve estar presente um pulso
sı́smico residual de fase preferencialmente igual a zero. Para isto, um procedimento muito
usado consiste em se estimar o espectro de amplitude do pulso a partir do espectro de
amplitude do traço sı́smico e, em seguida, obter, já no domı́nio do tempo, a forma de
onda de fase nula correspondente. Este tema é discutido no Apêndice A.6.
Em muitas circunstâncias, é conveniente complementar a geração dos sismogramas
sintéticos com os chamados perfis sı́smicos verticais, ou VSP’s (Vertical Seismic Profiles),
os quais exigem configuração semelhante à dos levantamentos dos tiros de controle (check-
shots). Do ponto de vista puramente operacional, a principal diferença entre ambos está
no tempo de registro (normalmente maior no VSP) e, principalmente, no intervalo de
profundidade entre registros (bem menor no VSP). Na aquisição dos dados de um VSP,
o geofone é, tipicamente, posicionado em profundidades espaçadas de acordo com um
intervalo regular ∆z, o qual é definido com base na seguinte expressão:

∆z = 21 vmin Tmin

onde vmin é a menor velocidade do meio e Tmin é o perı́odo da máxima freqüência desejada.
Estas condições levam normalmente a valores de ∆z inferiores a 20m.
Nos levantamentos dos tiros de controle, o objetivo imediato é o de obter tempos
de trajeto entre a superfı́cie e as profundidades desejadas. No caso do VSP, procura-se
4.1. INTRODUÇÃO 463

não somente obter esses tempos, mas também registrar as reflexões das interfaces situ-
adas abaixo de cada posição do geofone e também os eventos múltiplos, em particular
os oriundos das interfaces superiores. Esta caracterı́stica, aliada à densa amostragem
vertical, possibilita um tratamento capaz de transformar os registros de VSP em dados
sı́smicos de reflexão com fase próxima de zero e isentos do efeito dos eventos múltiplos ge-
rados acima da máxima profundidade de registro. Neste processo, empregam-se técnicas
similares às descritas no Capı́tulo 3, com destaque para o processo de separação de ondas
ascendentes e descendentes.
O VSP pode ainda ser usado como uma ferramenta de mapeamento sı́smico, em par-
ticular no caso da técnica de registro conhecida como “VSP walkaway”. Nesta técnica,
utilizam-se múltiplas fontes na superfı́cie para cada posição do geofone no poço (VSP con-
vencional), ou múltiplos geofones na superfı́cie para cada posição de fonte no poço (VSP
reverso). Desta forma, pode-se iluminar uma área em subsuperfı́cie, cujas dimensões,
no caso do VSP convencional, dependem da distribuição das fontes na superfı́cie e das
profundidades dos geofones. O adequado tratamento dos dados resultantes, com desta-
que para a migração, pode levar à obtenção de informações úteis, por exemplo, para a
definição de feições geológicas não detectáveis através dos dados sı́smicos de superfı́cie.
Os dados finais de um VSP, ou um sismograma sintético, podem ser poderosas ferra-
mentas de calibração dos dados sı́smicos de superfı́cie. Assim, por exemplo, uma simples
correlação visual entre um sismograma sintético e o traço sı́smico obtido no mesmo local
possibilita não somente a identificação segura de eventos sı́smicos mas também uma ava-
liação da qualidade dos dados sı́smicos de superfı́cie. No primeiro caso, uma seqüência
tı́pica de tarefas consiste em: (1) localizar, no sismograma sintético, o nı́vel geológico de-
sejado e; (2) com base na correlação visual, identificar o horizonte sı́smico correspondente.
A Figura 3.18 (página 326) é um exemplo do tipo de apresentação usado na correlação
visual entre dados sı́smicos e sismogramas sintéticos, no caso usada para avaliar a eficácia
de um algoritmo especı́fico.
Em geral, o resultado do processamento de um VSP, na forma de dados de reflexão
empilhados, é mais indicado para a calibração dos dados sı́smicos de superfı́cie do que
os sismogramas sintéticos, particularmente se as camadas apresentam pequeno mergulho.
Esta afirmação é baseada no papel exercido pela resolução lateral dos dados sı́smicos (ver
o item 4.4): enquanto um sismograma sintético depende apenas da área abrangida pelos
perfis de poços, a qual é inferior a um metro quadrado, os registros de um VSP, mesmo
depois de migrados, são influenciados por uma área dezenas de vezes maior, portanto mais
compatı́vel com a área que afeta uma seção sı́smica corretamente migrada. Assim, uma
descontinuidade localizada pode afetar muito mais um sismograma sintético do que os
registros obtidos sı́smicos na mesma posição, sejam eles obtidos na superfı́cie ou através
de um VSP. Em conseqüência, pode-se esperar melhor correlação entre uma seção sı́smica
e os dados de um VSP, em comparação com um sismograma sintético. Outra importante
aplicação dos VSP’s consiste na identificação mais segura de eventos múltiplos.
Quando se leva em conta a influência do ângulo de incidência sobre a resposta sı́smica,
um sismograma sintético baseado no modelo do refletor explosivo pode não ser satis-
fatório. No caso, há necessidade de se estimar a resposta sı́smica em função não apenas
da impedância acústica mas também da velocidade S, a qual é normalmente obtida através
do registro de perfis sônicos dipolares (Harrison et al., 1990). Assim, com os perfis de
velocidades P e S e de densidade, podem ser computados sismogramas sintéticos mais re-
464 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

presentativos, essenciais para a calibração e a amarração com dados sı́smicos processados


para a análise de AVO.
Os sismogramas sintéticos em função do ângulo de incidência podem ser usados
também na calibração de seções sı́smicas empilhadas. Para isto, basta que se empilhem
também os traços sı́smicos sintéticos obtidos na mesma faixa de ângulos de incidência dos
dados sı́smicos reais. Neste caso, a correlação entre os dois conjuntos de dados tende a
melhorar, em relação aos sismogramas sintéticos convencionais, em particular se o pulso
sı́smico escolhido tiver sido extraı́do dos dados reais.
Até agora, discutiu-se a calibração de dados sı́smicos de superfı́cie convencionais, ou
seja, correspondentes a aproximações dos coeficientes de reflexão. No caso das seções de
pseudo-impedâncias acústicas ou de pseudo-velocidades intervalares, a análise deve ser
ligeiramente diferente. Em primeiro lugar, os sismogramas sintéticos perdem o sentido,
já que os dados sı́smicos correspondem a aproximações do próprio perfil sônico, ou do
produto entre os perfis de velocidade e de densidades. Adicionalmente, a compatibilização
entre os espectros de amplitude dos dois conjuntos de dados deve levar em conta os temas
discutidos no item 3.7.
Da mesma forma que no caso dos dados sı́smicos convencionais, a correlação entre os
perfis de poços e as seções de pseudo-impedâncias acústicas, ou de pseudo-velocidades
intervalares, deve preferencialmente ser feita em escala de tempo, depois de os perfis
já terem sido ajustados com base em tiros de controle, ou dados de VSP. O mesmo se
aplica aos resultados da aplicação de técnicas de inversão elástica e aos atributos de
AVO. Com esses cuidados, evitam-se erros de amarração associados a deficiências na
conversão tempo-profundidade. Na Figura 3.62 (página 448), pode-se ver um exemplo
do tipo de apresentação dos dados usados na correlação entre perfis acústicos e seções de
pseudo-impedâncias acústicas sem baixas freqüências.
O grau de sofisticação necessário à detecção direta de petróleo e o mapeamento das
propriedades dos reservatórios exige que os dados sı́smicos e os perfis de poços efeti-
vamente descrevam respostas geofı́sicas das propriedades das rochas. Para avaliar o
atendimento a esta exigência, é fundamental o recurso à fı́sica de rocha, denominada
aqui petrogeofı́sica. Esta é uma ciência cujos resultados permitem avaliar a represen-
tatividade dos perfis de poços e dos dados sı́smicos, seja através de medidas feitas em
amostras de rocha (testemunhos) obtidas durante a perfuração dos poços, seja através
de simulações numéricas. Assim, por exemplo, uma medida em laboratório da razão de
Poisson possibilita verificar a qualidade da estimativa baseada nos perfis e, por extensão,
validar ou não a resposta sı́smica obtida.
Os fundamentos da fı́sica de rocha são essenciais também para a simulação de situações
hipotéticas, ou seja, ainda não avaliadas através da perfuração de poços. Com base em
trabalhos desta natureza, pode-se identificar com maior segurança, nos dados sı́smicos,
não somente a presença de petróleo mas também a variação lateral das propriedades dos
reservatórios. Um exemplo tı́pico deste trabalho consiste em avaliar a possibilidade de um
determinado reservatório, saturado de água em um poço, ser capaz de gerar uma anomalia
de AVO, se a água for substituı́da por petróleo. Outro exemplo é o caso da chamada
sı́smica 4-D, ou sı́smica time-lapse, que envolve o registro de dados sı́smicos em épocas
diferentes, antes e durante a produção de petróleo, permitindo assim acompanhar as
mudanças elásticas do reservatório e seus fluidos (ver Jack, 1997). Estudos de substituição
de fluido, discutidos no item 4.2, permitem avaliar a viabilidade técnica desse tipo de
4.1. INTRODUÇÃO 465

levantamento sı́smico.

4.1.2 A representação sı́smica da geologia


A interpretação sı́smica é normalmente conduzida com o objetivo abrangente de cons-
truir um modelo geológico de uma bacia ou área, ou seja, uma descrição que inclua a
representação geométrica das diversas camadas e as propriedades mais importantes de
cada uma delas. No caso especı́fico das rochas que possam conter petróleo, ou seja,
as rochas-reservatório, esses objetivos se traduzem em: (a) caracterizar sua geometria
externa, incluindo as falhas e fraturas que as afetam; (b) estimar o seu volume e; (c)
caracterizar o fluido que as satura e calcular o volume correspondente, o que implica
estimar sua porosidade. Para que esses objetivos sejam atingidos, os seguintes temas me-
recem destaque: os dados sı́smicos fundamentais para a interpretação, a visualização dos
dados sı́smicos tridimensionais, a representação dos resultados obtidos e a caracterização
de reservatórios e fluidos.

Dados sı́smicos fundamentais


Idealmente, o processamento dos dados sı́smicos deveria resultar em um volume de propri-
edades elásticas, o qual seria suficiente para atingir os diversos objetivos da interpretação
sı́smica, os quais serão discutidos adiante. Entretanto, a complexidade natural do con-
trole das acumulações de petróleo exige mais do que isto. Esta é a razão pela qual se
utilizam diferentes atributos extraı́dos dos dados sı́smicos, cada um deles idealizado com
um fim especı́fico embora todos devam, preferencialmente, ser obtidos com base em dados
tridimensionais migrados antes do empilhamento e submetidos ao adequado tratamento
de amplitude e fase. Entre esses atributos, citam-se:

1. Dados sı́smicos convencionais empilhados: as amplitudes correspondentes equivalem


a médias pontuais das estimativas dos coeficientes de reflexão filtrados, cada uma
delas associada a um valor especı́fico do ângulo de incidência.

2. Dados sı́smicos convencionais com empilhamento parcial: semelhantes aos dados


convencionais, são usados na geração de atributos de Amplitude Versus Offset, ou
AVO (ver os itens 3.7 e 4.3).

3. Dados sı́smicos parcialmente invertidos com empilhamento parcial: também usados


na geração de atributos de AVO, correspondem a uma integração numérica adimen-
sional — uma soma corrida — das estimativas dos coeficientes de reflexão ao longo
do eixo do tempo (ver os itens 3.7 e 4.3).

4. Atributos de AVO: interseção, gradiente e as diferentes versões dos indicadores da


presença de petróleo (fator de fluido, desvio ortogonal, ou normal à tendência de
fundo, ou background normal 1 , produto entre interseção e gradiente). Discussão
sobre o tema pode ser lida nos itens 3.7 e 4.3.
1
Termo usado pela empresa Shell.
466 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

5. Pseudo-impedâncias acústicas ou pseudo-velocidades intervalares, com ou sem bai-


xas freqüências: correspondem a aproximações das propriedades acústicas do meio
(ver os itens 3.7 e 4.3).

6. Estimativas sı́smicas das propriedades elásticas das rochas, com ou sem baixas
freqüências: tipicamente, são obtidas a partir dos parâmetros de AVO (ver os itens
3.7 e 4.3).

7. Amplitude, fase e freqüência instantâneas: estes são atributos dependentes do traço


sı́smico complexo, ou sinal sı́smico analı́tico, o qual é obtido com base na aplicação
das propriedades da transformada Hilbert (ver a equação 1.7.5 e Taner et al., 1979).
As expressões correspondentes são:
p
At = s2t + yt2 , (4.1.1)

 
−1 yt
ϕt = tan (4.1.2)
st
e
∆ϕt
ft = (4.1.3)
∆t
onde st é o traço sı́smico convencional, yt é o traço quadratura correspondente,
enquanto At , ϕt e ft são a amplitude, a fase e a freqüência instantâneas, respecti-
vamente.

8. Atributos de coerência: estes são atributos baseados na quantificação da coerên-


cia lateral do sinal sı́smico. Originalmente propostos e patenteados pela empresa
Amoco (Bahorich e Farmer, 1995), podem ser calculados com base em diferentes
medidas da coerência lateral do sinal sı́smico, sempre com o objetivo de, ao contrário
do que sugere o nome, destacar as descontinuidades existentes. Efeito similar e
mais abrangente, proposto por Élvio Bulhões, é obtido através da enfatização nas
diferenças entre as amplitudes absolutas de traços vizinhos.

Conforme será discutido adiante, alguns desses atributos são utilizados com a fina-
lidade especı́fica de identificar feições geométricas sutis, enquanto outros correspondem
a estimativas das propriedades elásticas das rochas ou dos contrastes correspondentes.
Criam-se assim condições para que a interpretação conjunta de todos eles leve a uma boa
descrição dos objetos investigados, o que normalmente é feito na forma de mapas, seções
e volumes.

Visualização dos dados sı́smicos tridimensionais


É possı́vel imaginar diversas geometrias para a apresentação dos dados sı́smicos tridimen-
sionais, entre as quais se incluem: (a) as seções verticais, que podem assumir qualquer
direção, desde a da aquisição sı́smica até a forma arbitrária de um zigue-zague; (b) as
fatias horizontais (em inglês, time ou depth slices); (c) as fatias de horizontes (em inglês,
horizon slices), ou seja, medidas de amplitude nos dados sı́smicos ao longo de horizon-
tes já interpretados; (d) os diagramas de cerca, que agrupam diversas seções esparsas,
4.1. INTRODUÇÃO 467

apresentadas de forma a manter a visão tridimensional da relação entre elas e; (e) as


apresentações volumétricas dos dados, desde um simples cubo opaco até as versões semi-
transparentes dos atributos sı́smicos.
Definida a geometria de visualização, vem a pergunta: como representar a distribuição
das amplitudes sı́smicas? Se o objetivo básico da análise incluir a visualização da forma
de onda, a técnica de apresentação mais útil é a chamada wiggle com área variável. Esta
foi a técnica usada na maior parte das figuras dos capı́tulos 2 e 3 (ver, por exemplo, a
Figura 3.18, na página 326). Por outro lado, se se deseja investigar feições sutis, ou,
alternativamente, destacar os valores absolutos das amplitudes, a opção indicada é a
chamada densidade variável, de acordo com a qual atribui-se uma cor a cada intervalo
escolhido de amplitudes.
Na densidade variável, o papel da cor, ou seja, da luz visı́vel, merece uma discussão
à parte. À semelhança do que ocorre com o espectro de freqüências dos dados sı́smicos,
a capacidade de identificar uma feição geológica sutil depende de um espectro rico em
cores. Neste sentido, o mais rico dos espectros é o da luz branca, o qual é plano na
faixa das freqüências visı́veis. Alternativamente, pode-se também dizer que uma imagem
colorida dos dados sı́smicos apresenta banda espectral limitada, já que uma cor pode ser
vista como o resultado da aplicação de um filtro à luz branca.
Com base neste conceito, induz-se que uma escala de tonalidades da cor cinza, vari-
ando de preto até branco, favorece a análise isenta dos dados. A maior capacidade de
resolução desse tipo de apresentação, representada pelo maior conteúdo de freqüências da
luz branca, permite a identificação de feições geológicas sutis que, na imagem colorida,
poderiam ser atenuadas em função da vizinhança de feições mais destacadas.
Considere-se, por exemplo, o caso das falhas, as mais importantes das quais tendem
a ser perfeitamente visı́veis nas seções sı́smicas, circunstância esta que facilita o seu
mapeamento. Entretanto, existem situações em que falhas economicamente importantes,
como as que controlam o limite de acumulações, ou das rochas-reservatório, não são
facilmente detectáveis, mesmo em dados sı́smicos processados de acordo com as técnicas
mais indicadas. O mesmo conceito se aplica às fraturas, aos pinch-outs (desaparecimento
lateral das camadas) e a muitas formas de discordância. Os volumes, seções ou mapas
sı́smicos, apresentados em tonalidades de cinza, podem ser cruciais para a identificação
dessas feições sutis.
Ainda com o mesmo objetivo, alguns atributos sı́smicos especı́ficos se destacam. Este é
o caso, por exemplo, dos atributos de coerência, cujo objetivo fundamental é o de destacar
descontinuidades. Uma vez que o conteúdo de freqüências dos dados sı́smicos influencia
sobremaneira a qualidade dos resultados da técnica, pode-se induzir que os atributos de
coerência devem, preferencialmente, ser calculados com base em estimativas dos coefici-
entes de reflexão (em detrimento, por exemplo, das pseudo-impedâncias acústicas, cujo
espectro é relativamente mais pobre em altas freqüências). Cortes nos volumes de atri-
butos de coerência, sejam horizontais ou ao longo de horizontes, favorecem sobremaneira
a visualização das feições de caráter geométrico. Pequenas falhas e feições estratigráficas
sutis, que de outra forma seriam indistinguı́veis, tornam-se mais facilmente mapeáveis,
como no exemplo da Figura 4.1.
Considere-se agora que o valor absoluto de uma feição geológica seja importante para
caracterizá-la. Este é o caso, por exemplo, de anomalias de porosidade interpretadas em
volumes de pseudo-impedâncias acústicas. Nestas circunstâncias, a cor é fundamental já
468 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Figura 4.1: Exemplo de mapa de coerência ao longo de um horizonte. As áreas claras


indicam alta coerência lateral e as escuras sugerem a presença de descontinuidades. A
dimensão vertical é de cerca de 13km. (Figura gerada por Ana Zélia Barros).

que, no caso, o objetivo da visualização não é mais o de identificar descontinuidades e sim


o de verificar a extensão de um determinado corpo de rocha. Uma técnica aplicada com o
mesmo objetivo e que também faz uso dos filtros de cor, é o da visualização tridimensional
com base na transparência. Nesta técnica, o primeiro passo consiste em estabelecer, no
volume de atributos, o conjunto de valores que melhor caracteriza uma determinada feição
geológica. Os dados sı́smicos são então apresentados de forma a destacar o conjunto de
valores escolhidos e, ao mesmo tempo, tornar os demais valores invisı́veis2 . A análise do
volume de dados tratado dessa forma favorece a caracterização tridimensional das feições
investigadas.
Ressalte-se que, na visualização de dados sı́smicos, é possı́vel aplicar a maior parte das
técnicas empregadas no tratamento de imagens. Assim, por exemplo, pode-se iluminar
os volumes ou superfı́cies e gerar as correspondentes sombras, criar descrições tridimen-
sionais de superfı́cies, rotacionar o volume de dados, etc. Pode-se ainda aplicar filtros,
alguns dos quais são discutidos em seguida.
2
A mesma idéia inclui o caso em que se dispõe de diferentes atributos sı́smicos e se procura identificar,
ou mapear, as posições em que a correlação entre eles apresenta determinada caracterı́stica. Um exemplo:
na caracterização de fácies sı́smicas, pode ser interessante identificar as posições em que as amplitudes
sı́smicas apresentam distribuição caótica e, simultaneamente, são anomalamente altas; ou as posições em
que a distribuição das amplitudes é organizada e as amplitudes são baixas.
4.1. INTRODUÇÃO 469

Os mapas sı́smicos

A partir do momento em que os principais horizontes já tenham sido identificados nos
dados sı́smicos, bem como as principais feições geológicas que os afetam, o intérprete passa
a ter condições de construir um modelo geológico da área investigada. Nesta tarefa, os
mapas exercem papel fundamental, em particular os mapas de tempo de reflexão, que
correspondem a uma simples descrição geométrica do horizonte. Estes são mapas que
normalmente incorporam componentes estruturais e estratigráficos do nı́vel de interesse
e são básicos para a geração dos modelos geológicos.
A qualidade dos mapas sı́smicos pode ser acentuada se, em cada traço, os horizon-
tes interpretados corresponderem a picos ou cavidades e não a posições arbitrárias da
forma de onda mapeada. Este procedimento, que pode ser conduzido com o recurso a
técnicas de rastreamento automático, ou semi-automático, dos horizontes, garante que os
atributos sı́smicos correspondentes representem anomalias locais, na forma de contras-
tes entre propriedades elásticas, ou desvios em relação às propriedades elásticas em si.
Desta forma, os mapas correspondentes podem ter maior significado econômico, além de
favorecerem processamentos posteriores. Obviamente, há que se levar em conta o fato de
que, em alguns tipos de dado, o topo e a base das camadas não correspondem a picos ou
cavidades. Este é o caso das pseudo-impedâncias.
Normalmente, é recomendável que os mapas sejam espacialmente filtrados com o fim
de remover ruı́dos, sejam aqueles que o processamento sı́smico não tenha eliminado, sejam
aqueles gerados pela própria técnica de rastreamento. Entre as técnicas de filtragem
espacial, as mais comuns são lineares, como é o caso da média móvel, a qual, como sugere
o nome, leva à substituição de um valor pontual pela média de um conjunto de valores
vizinhos. Deve-se destacar que, com freqüência, a média móvel é aplicada implicitamente
pelos processos de geração de malha regular (gridagem), os quais se baseiam em técnicas
de interpolação espacial de valores medidos em pontos esparsos.
Uma caracterı́stica importante dos filtros lineares, como é o caso da média móvel,
deve ser destacada: eles tendem a misturar os ruı́dos com os sinais, em vez de eliminá-
los. Por esta razão, os procedimentos mais indicados, para a geração e tratamento de
mapas sı́smicos, são: (1) aplicar filtragem não linear, as quais consistem em remover
dos mapas as medidas estatisticamente pouco representativas, através de técnicas como,
por exemplo, a seleção da mediana de um conjunto de medidas locais; (2) na geração
de malhas com o resultado da interpretação de dados sı́smicos tridimensionais, evitar a
mistura lateral, já que os mesmos dados já constituem malhas regulares e; (3) no caso
de dados sı́smicos bidimensionais, aplicar a primeira técnica ao longo das linhas sı́smicas.
Ressalte-se que a geração de malhas regulares também pode ser baseada no conceito de
mediana.
Os mapas de tempo de reflexão são básicos para a geração de outros mapas, igualmente
importantes: (a) mapas estruturais em profundidade (item 4.4); (b) mapas isópacos (item
4.4); (c) mapas de atributos de superfı́cie, ou seja, estimados com base na geometria que
caracteriza o horizonte mapeado, o que inclui, por exemplo, coerência lateral, gradiente
e azimute (como sugerem os nomes, os dois últimos atributos correspondem a estimati-
vas locais da atitude do horizonte interpretado); (d) mapas de fatias de horizontes, que
permitem avaliar a distribuição espacial de um atributo sı́smico qualquer ao longo de
um horizonte e; (e) mapas de atributos intervalares, ou seja, estimados entre dois nı́veis
470 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

quaisquer. Todos são mapas fundamentais para a caracterização de reservatórios, a qual


é discutida em seguida.

Caracterização de reservatórios e fluidos

Em função dos contrastes elásticos envolvidos, a caracterização dos reservatórios pode ser
dividida em duas grandes famı́lias. A primeira delas inclui as situações nas quais é possı́vel
individualizar o reservatório, tanto nas seções sı́smicas quanto nos perfis de poços. Na
segunda famı́lia, os reservatórios não podem ser isolados com segurança, seja por causa da
complexidade de sua distribuição, seja pelo comportamento elástico lateralmente variável.
Considere-se inicialmente a situação em que o reservatório não pode ser individua-
lizado com segurança. Neste caso, é conveniente o recurso ao mapeamento de valores
intervalares dos atributos sı́smicos, os quais são obtidos a partir do mapeamento das
reflexões que caracterizam topo e base da seqüência estratigráfica que inclui os reser-
vatórios a caracterizar. Diversos atributos estatı́sticos, estimados no intervalo entre as
duas reflexões mapeadas, podem ser calculados, entre os quais estão os valores máximo
e mı́nimo, o desvio padrão, a variância e a curtose. Talvez o mais representativo deles
seja a variância e sua raiz quadrada, ou seja, o desvio padrão das amplitudes, o qual é
definido por
v
u tB
u 1 X
σ= t (st − s̄)2 (4.1.4)
(tB − tT + 1) t=t
T

onde st é a amplitude no tempo de ı́ndice t e s̄ é a amplitude média no intervalo de


tB − tT + 1 amostras entre os ı́ndices de tempo relativos ao topo da seqüência, tT , e à
base, tB . Ressalte-se que, em intervalos de tempo mais longos, a média das amplitudes
dos dados sı́smicos convencionais tende a zero, fazendo com que o desvio padrão tenda
à média RMS das amplitudes, a qual é obtida considerando-se que a média s̄ é igual a
zero.
Tipicamente, a equação 4.1.4 é indicada nas situações em que o grau de heterogenei-
dade do intervalo mapeado pode ser associado à presença de reservatórios. Como o desvio
padrão das amplitudes corresponde a uma medida da heterogeneidade do intervalo mape-
ado, pode-se dizer que a mesma medida é proporcional à probabilidade de ocorrência de
reservatórios. Melhores resultados da aplicação da técnica são obtidos nos casos em que
o sistema deposicional, correspondente à seqüência estratigráfica analisada, leva a formas
caracterı́sticas para a distribuição dos reservatórios, como ocorre em muitos dos proces-
sos sedimentares de águas profundas. O mesmo conceito se aplica a outros atributos
mapeados de forma similar, entre os quais se incluem a máxima amplitude do intervalo
mapeado e a coerência intervalar média (ou seu desvio padrão).
Considere-se agora a famı́lia de técnicas de caracterização de reservatórios em que o
reservatório pode ser individualizado. Sabe-se que a amplitude de uma reflexão sı́smica
depende do contraste elástico entre as duas rochas que constituem a interface correspon-
dente. Assim, se a rocha encaixante fosse homogênea, a amplitude da reflexão gerada
no topo do reservatório poderia ser considerada um indicador direto das propriedades
elásticas do reservatório e seus fluidos. Esta é uma idéia que, em muitos casos, merece
ser questionada.
4.1. INTRODUÇÃO 471

Suponha-se, por exemplo, que um material acusticamente anômalo — de espessura re-


lativamente pequena (da ordem ou menor do que o comprimento de onda do pulso sı́smico)
— ocorra sobreposto a um reservatório cuja porosidade, ou saturação de petróleo, varia
lateralmente. Neste caso, eventuais fenômenos de interferência fariam com que qualquer
mudança nas propriedades do material anômalo pudesse ser erroneamente atribuı́da a
uma mudança nas propriedades do reservatório. Para contornar esta dificuldade, três
providências podem ser tomadas: (1) analisar a amplitude correspondente à reflexão da
base do reservatório, a qual pode ser mais representativa das suas propriedades; (2) tra-
balhar com seções de pseudo-impedâncias acústicas, cujo uso é discutido adiante e; (3)
corrigir a amplitude do topo do reservatório, somando-a à amplitude do topo do material
anômalo. Com base em uma aplicação local da equação 3.7.9, ou 3.7.10, pode-se dizer
que esta última técnica tende a compensar o efeito nocivo do material acusticamente
anômalo.
Mesmo nos casos em que o reservatório não pode ser individualizado, a interpretação
estratigráfica tem muito a ganhar com o recurso a volumes de pseudo-impedâncias acústicas
ou de pseudo-velocidades intervalares. Por exemplo, deve-se lembrar que uma fatia de ho-
rizonte, extraı́da de um volume desse tipo, corresponde a um mapa de pseudo-impedâncias
acústicas ou pseudo-velocidades intervalares. Ou seja, neste caso, não mais se mapeia um
contraste de propriedades acústicas mas sim um atributo que deve ser visto como uma
tendência de comportamento das propriedades acústicas em si.
O papel do conteúdo de freqüências dos dados de pseudo-impedâncias acústicas, ana-
lisado no item 3.7 sob o ponto de vista computacional, merece uma discussão adicional.
Observe-se que, se os componentes correspondentes às freqüências próximas de zero es-
tiverem ausentes, uma interface acústica que, nos dados sı́smicos convencionais, gerasse
uma reflexão expressiva, corresponderia, nos volumes de pseudo-impedância acústica, a
um valor igual a zero. Nas mesmas circunstâncias, uma seção de velocidades intervalares
permitiria a obtenção de um valor diferente de zero, dependente do conteúdo de baixas
freqüências introduzido durante o processamento, embora em qualquer caso coincidente
com uma acentuada aceleração, ou desaceleração. A Figura 3.59 (página 440) pode ser
usada para ilustrar o conceito.
O nı́vel de detalhe, com que a interpretação das seções de pseudo-velocidades interva-
lares é normalmente feita, ao lado do uso de técnicas semelhantes à da correlação de perfis,
permitem colocar um pouco de luz sobre uma antiga discussão: “um refletor representa
uma linha de tempo geológico ou uma mudança de fácies?”. Com base nas técnicas de
interpretação de perfis de poços, sabe-se que existem feições passı́veis de serem tratadas
como uma linha de tempo geológico, enquanto outras representam melhor uma feição
litoestratigráfica. O mesmo se aplica às seções de pseudo-velocidades intervalares, possi-
bilitando ao intérprete o benefı́cio da escolha. Em outras palavras, pode-se assegurar o
que deveria ser óbvio: a interpretação não afeta as medidas fı́sicas, mas apenas o que se
extrai delas. Por outro lado, há que se destacar que, em uma seção de pseudo-velocidades
intervalares, os marcos acústicos, em especial aqueles cujos topos e bases não são carac-
terizados por fortes variações na impedância acústica, tendem a ser melhor visualizados
do que em uma seção convencional.
Entre as deficiências das versões convencionais das fatias de horizontes, deve-se levar
em conta o caso particular das seções empilhadas, invertidas ou não. Com base no que foi
apresentado nos itens 2.6, 3.1 e 3.6, sabe-se que a amplitude medida em um traço sı́smico,
472 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

empilhado de forma convencional, corresponde a uma média das contribuições das am-
plitudes obtidas em diferentes afastamentos fonte-receptor. Com base na teoria discutida
nos mesmos capı́tulos, pode-se dizer que o empilhamento convencional não permite ex-
trair dos dados sı́smicos todas as informações disponı́veis. Para que isto seja possı́vel, é
conveniente o recurso aos chamados atributos de AVO, os quais são fundamentais para
a caracterização dos reservatórios e dos fluidos que os saturam. Deve-se ainda ressaltar
a conveniência de tratar esses atributos na forma de mapas e não somente de seções
ou volumes, o que favorece a distinção entre anomalias associadas à litologia e aquelas
causadas pela presença de petróleo. Este tema será aprofundado do item 4.3.

No caso dos reservatórios passı́veis de serem individualizados, é possı́vel, após iso-


lamento do efeito dos fluidos, elaborar mapas isópacos de boa qualidade, os quais são
fundamentais para a cubagem das acumulações. Neste caso, é necessário o mapeamento
das reflexões correspondentes ao topo e à base do reservatório, embora, no caso de re-
servatórios pouco espessos, seja teoricamente possı́vel estimar espessuras exclusivamente
com base na amplitude. Ver-se-á, no item 4.4 que, na geração de mapas isópacos, esbarra-
se com freqüência nos limites da resolução vertical dos dados sı́smicos. Ver-se-á também
que esta dificuldade pode ser parcialmente contornada, seja através de uma melhor decon-
volução dos dados sı́smicos, seja através da chamada deconvolução transversa de mapas
sı́smicos, a ser discutida no mesmo item.

Os dados sı́smicos podem também ser usados no mapeamento das porosidades dos
reservatórios. Neste caso, são também muito úteis os volumes, ou seções, de pseudo-
impedâncias acústicas e de pseudo-velocidades intervalares. Por outro lado, ainda que
as pseudo-impedâncias acústicas tenham sido geradas a partir de dados adequadamente
tratados, os valores absolutos obtidos nunca são exatos, o que decorre do caráter ine-
rentemente indireto do método sı́smico. Esta dificuldade prática leva a duas linhas de
inversão: (1) incluem-se as informações de alta e baixa freqüência dos perfis de poços
durante o processamento sı́smico, o que permite a obtenção de velocidades intervalares
já corrigidas ou; (2) somente as informações de baixa freqüência dos perfis são utilizadas
durante o processamento, levando à necessidade posterior de ajustar os dados sı́smicos
aos dados de poços.

A primeira famı́lia de técnicas descrita introduz, no processamento sı́smico, uma


fonte de erro adicional, em função de que, nas altas freqüências, perfis de poços e dados
sı́smicos são afetados por diferentes descrições da geologia, os primeiros sendo influenci-
ados por uma área muito menor do que os segundos (ver discussão na página 463). A
segunda técnica atenua a importância desta fonte de erro, já que, nas baixas freqüências,
a amarração entre velocidades sı́smicas e perfis sônicos tende a apresentar boa qualidade.
Ressalte-se entretanto que, nas duas técnicas, melhores resultados são obtidos com o re-
curso a algoritmos geoestatı́sticos. Estas são técnicas que possibilitam obter parâmetros
petrofı́sicos do reservatório aliando o caráter de tendência (soft) dos dados sı́smicos às
medidas mais seguras (hard ) obtidas nos poços. Ressalte-se que este mesmo conceito se
aplica também aos mapas da profundidade do topo e da espessura do reservatório (ver o
item 4.4).
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 473

4.2 Noções de Petrogeofı́sica


No Capı́tulo 3, foram discutidas algumas técnicas aplicadas à extração de propriedades
elásticas a partir dos dados sı́smicos. Isoladamente, estes parâmetros não têm qualquer
significado prático para os geólogos. Entretanto, a densidade, a velocidade e a razão de
Poisson estão relacionadas a parâmetros petrofı́sicos como porosidade, compressibilida-
de da rocha e saturação de petróleo, entre outros. Desta forma, torna-se teoricamente
possı́vel extrair-se, dos dados sı́smicos, pelo menos alguns desses fatores, que têm óbvio
significado econômico. Para compreender melhor esta possibilidade, é conveniente conhe-
cer as leis que governam as relações entre os fatores de caráter petrofı́sico e as propriedades
elásticas das rochas. Esta importante área do conhecimento geofı́sico é denominada, por
alguns autores, petrogeofı́sica.
No caso da densidade da rocha, ρ, obtém-se uma expressão simples, em função da
porosidade, φ, e da densidade dos materiais que a constituem, incluindo os fluidos, na
forma de uma média ponderada pelo volume:

ρ = φ [Sh ρh + (1 − Sh )ρa ] + (1 − φ)ρm (4.2.1)

onde os subscritos h, a e m se referem a petróleo, água e matriz, ou grão, respectivamente.


Por sua vez, S é saturação e ρ é densidade.
No caso da velocidade sônica (de onda compressional), diversas expressões têm sido
desenvolvidas, todas elas com o objetivo de equacionar a influência da porosidade e de
outros parâmetros petrofı́sicos na velocidade com que o som se propaga nas rochas. Na
mais conhecida dessas expressões, a fórmula de Wyllie et al. (1956), também denomi-
nada time-average equation, os seus autores buscaram distribuir a influência do tempo
de trânsito do sinal em cada um dos componentes da rocha, na forma de uma média
ponderada pelo volume, semelhante à da expressão 4.2.1. O resultado é:
 
Sh 1 − S h 1−φ
∆t = φ + + (4.2.2)
vh va vm

onde v é a velocidade sônica (de ondas compressionais) correspondente ao material indi-


cado pelo subscrito e ∆t corresponde a uma média das vagarosidades dos materiais que
constituem a rocha, ponderada pelo volume.
A expressão de Wyllie tem sido usada, na prática, para a determinação da porosidade
a partir de perfis sônicos e até mesmo na computação de seções de pseudo-velocidade
intervalar (ver o item 3.7). Uma vez que a expressão não leva em conta a influência
do arcabouço da rocha, torna-se necessária a aplicação de correções, em função da com-
pactação, para se obter porosidades mais próximas das reais.
Outro modelo, relacionando a velocidade de onda compressional, v, e a porosidade, foi
proposto por Raymer et al. (1980), como uma forma de atenuar o efeito da compactação.
Na faixa de porosidades até 0.37 (37%), a expressão obtida por eles é:

v = φvf + (1 − φ)2 vm (4.2.3)

onde f denota o fluido, ou uma mistura de fluidos. Na faixa de porosidades de 0.47 até
1.0, os autores citados adotaram a média de Reuss, discutida abaixo. Nas porosidades
474 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

intermediárias, a velocidade é estimada a partir de uma interpolação linear entre os


valores obtidos nas porosidades 0.37 e 0.47.
Existem equações, também de caráter empı́rico, voltadas para a relação entre velo-
cidade e densidade, que também podem ser utilizadas com a finalidade de se estimar,
indiretamente, porosidades, a partir da velocidade sônica. A mais conhecida dessas ex-
pressões, apresentada no item 3.7, é:

ρ = av b (4.2.4)

onde a e b são constantes estimadas por Gardner et al. (1974) em 0.23 e 0.25, para a
densidade em gramas por centı́metro cúbico e a velocidade em pés por segundo3 . Ressalte-
se que a mesma expressão deve ser adaptada para a bacia e os sedimentos em que ela
é aplicada. Isto significa dizer que as constantes a e b devem ser recalculadas (a este
respeito, ver Castagna et al., 1993).
Com o valor da densidade computado dessa forma, estima-se a porosidade com base
na equação 4.2.1, rearranjada da seguinte forma:
ρm − ρ
φ= (4.2.5)
ρm − Sh ρh − (1 − Sh )ρa
ou, considerando o fluido que satura os poros como uma mistura,
ρm − ρ
φ= (4.2.6)
ρm − ρ f

Pode-se perceber facilmente que a densidade é um parâmetro relativamente bem


entendido, do ponto de vista teórico e, graças à simplicidade do conceito, facilmente
aplicável no dia-a-dia. No caso da velocidade, contudo, os modelos descritos acima são
empı́ricos e, com exceção da fórmula de Gardner, se aplicam melhor a rochas submetidas
a altas pressões efetivas (ver Mavko et al., 1996). Por isto, torna-se necessário recorrer à
teoria da elasticidade, para que se compreendam melhor os conceitos envolvidos no tema.

4.2.1 A elasticidade e os meios porosos


Na forma mais simplificada possı́vel, a lei de Hooke pode ser definida por
ESFORÇO COMPRESSIVO= − (MÓDULO de ELASTICIDADE × DEFORMAÇ ÃO)

Por sua vez, o módulo de elasticidade relaciona-se à velocidade de propagação das ondas
e à densidade da seguinte forma:
MÓDULO de ELASTICIDADE = (VELOCIDADE AO QUADRADO × DENSIDADE)

Aplicada ao caso das ondas compressionais, P, viu-se, no item 2.1, que esta expressão
pode ser escrita da seguinte forma:
s
Kb + 43 µ
vP = (4.2.7)
ρ
3
No caso da velocidade em metros por segundo, a = 0.3095.
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 475

onde vP , Kb e µ são, respectivamente, a velocidade de propagação de ondas compres-


sionais, ou P, o módulo bulk e o módulo de rigidez do meio. Já no caso de uma onda
cisalhante, S, a velocidade é dada por
r
µ
vS = (4.2.8)
ρ

No item 2.1, as equações 4.2.7 e 4.2.8 foram apresentadas sem se fazer qualquer
referência à complexidade do material envolvido. Considere-se agora o caso de uma rocha
porosa, como um arenito, saturada de um fluido qualquer. Em função da diferença entre
as propriedades elásticas dos diversos constituintes da rocha, uma onda de compressão
deve fazer com que o fluido, a matriz e o esqueleto poroso sejam submetidos a diferentes
graus de deformação4 . Apenas como exemplo, citam-se alguns módulos bulk tı́picos, em
unidades de pressão: (1) água, de 2.25 a 3GPa; (2) óleo, de menos de 0.1 a 2GPa; (3)
matriz (grãos de rocha), de 25 a 80GPa e; (4) esqueleto poroso (rocha seca), de 4 a
20GPa.
Nestas circunstâncias, os módulos de elasticidade exigem uma análise mais sofisticada.
Partindo-se do modelo mais simples, suponha-se que a estimativa da composição dos
diversos módulos de elasticidade envolvidos em um meio qualquer possa ser feita com
base em valores médios. A este respeito, pode-se imaginar inúmeras formas para o cálculo
da média a ser aplicada. Entretanto, o universo de possibilidades pode ser reduzido, se
forem levadas em conta a distribuição de esforços e deformações e sua relação com a lei
de Hooke. Neste caso, aplicam-se três diferentes médias dos módulos de elasticidade: a
de Voigt, a de Reuss e a de Voigt-Reuss-Hill (ver, por exemplo, Mavko et al., 1996).
Considere-se um meio que, submetido a um esforço qualquer, sofre deformações dis-
tribuı́das de maneira uniforme entre os seus diversos componentes. Levando em conta
a lei de Hooke, esta condição leva à sugestão de que uma simples média aritmética dos
módulos elásticos seria adequada. Ou seja, aplicar-se-ia ao caso a média de Voigt, que é
definida da seguinte forma: X
MV = f i Mi (4.2.9)
i

onde fi é a fração do componente cujo módulo é dado por Mi , sendo que M pode ser
tanto o módulo bulk quanto o de rigidez.
Considere-se agora o caso em que, ao invés das deformações, os esforços é que são dis-
tribuı́dos uniformemente entre os constituintes do meio. Esta situação ocorre, por exem-
plo, em um fluido, o qual se caracteriza pela independência de movimento das partı́culas
correspondentes (ver o item 2.1). Nestas condições, a média mais indicada é a harmônica.
Ou seja, aplica-se ao caso a média de Reuss, que é definida da seguinte forma:
!−1
X fi
MR = (4.2.10)
i
Mi
4
No caso em que a onda é constituı́da por componentes de altas freqüências, maiores ou equivalentes
às vigentes no registro de perfis sônicos (1 a 20kHz), o mesmo fenômeno pode até mesmo fazer com
que barreiras de permeabilidade criem reflexões mensuráveis, ainda que de pequena amplitude. Isto
ocorre quando o deslocamento do fluido na rocha, introduzido pela onda, sofre interrupções causadas
pela variação espacial na permeabilidade.
476 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

30
Módulo "bulk" (kbar)

20 Voigt

V−R−H
10

Reuss

0
0 20 40 60 80 100
Percentagem de água

Figura 4.2: Módulos bulk médios — Voigt, Reuss e Voigt-Reuss-Hill


(V-H-R) — de uma mistura hipotética de água e gás. Os módulos bulk
individuais são, respectivamente, 27kbar (ou 2.7GPa) e 1.0kbar.

As médias de Voigt e Reuss levam a valores extremos dos módulos elásticos, o superior
no primeiro caso e o inferior no segundo. Valores intermediários dos módulos elásticos
podem ser obtidos através, por exemplo, da média de Voigt-Reuss-Hill (V-R-H), a qual
é definida, em função das outras duas, por

1
MV RH = (MV + MR ) (4.2.11)
2

Na Figura 4.2, vê-se um exemplo de aplicação das três médias ao cálculo do valor
do módulo bulk da mistura de gás e água. Com base nas condições em que as médias
de Reuss e Voigt são definidas, pode-se induzir que os melhores resultados são obtidos
no caso em que se busca estimar o módulo de elasticidade da mistura de materiais do
mesmo tipo. A maior complexidade envolvida na mistura de sólidos faz com que, no caso,
a melhor média seja a de Voigt-Reuss-Hill. Nas aplicações práticas, as misturas de fluido
e de sólidos são tratadas individualmente, tanto no cálculo dos respectivos módulos de
elasticidade médios quanto na aplicação de conceitos mais sofisticados, como a equação
de Biot-Gassmann (ver discussão no subitem 4.2.2).
Outra aplicação das médias das propriedades elásticas relaciona-se ao conceito de
porosidade crı́tica. Considere-se uma rocha qualquer cuja porosidade pode variar entre
0 e 100%. Na faixa de porosidades próximas de zero, o arcabouço poroso é capaz de
sustentar a rocha. Acima de um certo valor de porosidade, os grãos minerais tendem a
perder contato entre si e a rocha passa a ser sustentada pelo fluido, em um regime de
suspensão. A porosidade que separa esses dois estados, chamada de porosidade crı́tica,
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 477

oscila em torno de 35-40%, no caso de um arenito, e pode atingir valores elevados em


alguns tipos de rocha carbonática.
Acima da porosidade crı́tica, a velocidade P e o módulo de elasticidade correspondente
podem ser bem definidos com base na média de Reuss. Abaixo da mesma porosidade,
estabelece-se uma região cujo valor máximo de velocidade é controlado pela média de
Voigt e cujo valor mı́nimo é controlado pela média de Reuss. Nesta mesma região,
pode-se estabelecer relações lineares entre os módulos bulk ou de rigidez e a porosidade
normalizada pela porosidade crı́tica, como foi feito por Nur (in Mavko et al., 1996). Ou
seja:  
φ
KR = K m 1 − , φ < φc (4.2.12)
φc
e  
φ
µR = µ m 1 − , φ < φc (4.2.13)
φc
onde os subscritos R e m se referem à rocha seca (arcabouço e grãos, sem fluidos) e aos
grãos minerais, respectivamente, enquanto φc é a porosidade crı́tica. As duas equações
são empı́ricas e se aplicam melhor a arenitos (Mavko et al., 1996).
Também para porosidades inferiores à crı́tica, Nur et al. (1991) obtiveram a seguinte
relação entre porosidade e os módulos elásticos, definida como uma média de Voigt mo-
dificada:  
φ φ
MM V = 1 − Mm + Mc (4.2.14)
φc φc
onde M é o módulo elástico (bulk ou de rigidez), Mm é o módulo válido para a porosidade
igual a zero (ou seja, para a própria matriz mineral) e Mc é o módulo na porosidade crı́tica,
obtido através da média de Reuss envolvendo os minerais e o fluido.
A média de Reuss é usada também na forma mais simples do conceito de meio efe-
tivo. De acordo com o que se viu no item 2.8, sabe-se que, quando uma onda sı́smica
atravessa um meio multiacamadado, a velocidade de propagação depende da relação en-
tre o comprimento de onda do sinal e a espessura média das camadas. Neste caso, se o
comprimento de onda for relativamente grande, o tempo de propagação não corresponde
mais a uma simples soma das contribuições individuais dos tempos de percurso das di-
versas camadas, cada uma dessas contribuições calculada pela razão entre a espessura e
a velocidade nominal correspondente.
De acordo com a discussão sobre o filtro estratigráfico, apresentada no subitem 2.8.5,
sabe-se que uma das formas de contornar a complexidade desse tipo de problema consiste
em se determinar uma velocidade efetiva, calculada com base na média de Reuss do
módulo de elasticidade correspondente, como proposto por Backus (1962). Assim, no
caso de uma onda compressional, tem-se:
s
ME
vP E = (4.2.15)
ρ̄

onde ρ̄ é a média aritmética das densidades e ME é a média de Reuss dos módulos de


onda P das camadas.
As estimativas de velocidade obtidas através de médias dos módulos de elasticidade,
embora bem fundamentadas e, ao contrário da expressão de Wyllie, aplicáveis também
478 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

a rochas pouco consolidadas, não possibilitam a obtenção de relações rigorosas entre as


propriedades elásticas e a porosidade das rochas. Ou seja, apesar de mais sofisticadas,
as relações resultantes também apresentam caráter empı́rico e não permitem a profundi-
dade necessária ao entendimento da propagação de ondas em meios complexos, tornando
necessário o recurso a modelos mais rigorosos.

4.2.2 A equação Biot-Gassmann


Enorme esforço, na busca de modelos representativos da propagação em meios porosos,
tem sido registrado na literatura especializada. No caso da propagação de ondas na faixa
das freqüências sı́smicas (até 100-200Hz), o mais bem-sucedido desses modelos é o de
Gassmann (1951), generalizado mais tarde por Biot (1956a,b). Uma boa dedução do
resultado obtido por Gassmann foi apresentada por Berryman (1999)5 . De acordo com
esse modelo, o módulo da onda P é desmembrado entre os seus constituintes de acordo
com a seguinte expressão (ver também Geerstma, 1961):
  2 
KR
 1− 
4  Km  4
Kb + 3 µ =  KR +  + 3µ (4.2.16)
 φ 1 − φ K R 
+ − 2
Kf Km Km
onde K é o módulo bulk, enquanto os subscritos R, m e f correspondem à rocha seca
(arcabouço e grãos, sem fluidos), à matriz (grãos) e ao fluido, respectivamente. Por sua
vez, o subscrito b se refere à rocha completa, com os grãos, poros e fluido. Observe-se
que, como seria de se esperar, o fluido saturante não afeta o módulo de rigidez da rocha.
Este conceito é fundamental para o entendimento do conceito de bright-spot, discutido
no item 4.3.
A combinação entre as equações 4.2.7 e 4.2.16 leva à seguinte relação entre os módulos
de elasticidade e a velocidade de onda compressional em uma rocha porosa:
  2 
KR
1−
2 1 Km 
+ 43 µ
 
v P =  KR + (4.2.17)
ρ φ 1 − φ KR 
+ − 2
Kf Km Km
Usando-se a relação entre a razão de Poisson e os módulos bulk e de rigidez descrita pela
equação 2.1.22, pode-se também escrever:
  2 
KR
  Kf 1 −
2 1 1 − σR Km

vP = 3KR +   (4.2.18)
ρ 1 + σR Kf KR 
φ+ 1−φ−
Km Km
5
A separação dos papéis da rocha seca e dos fluidos, na equação 1 de Berryman (1999), estava presente,
de uma forma diferente, em um trabalho de Biot, publicado em 1941. Esta é uma forte indicação de
que a equação de Gassmann foi obtida com base em um contexto teórico que o próprio Biot ajudou a
construir e, um pouco mais tarde, aprofundou. Justifica-se assim denominar “equação Biot-Gasmann”
a chamada “equação de Gasmann”.
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 479

onde σR é a razão de Poisson da rocha seca e a densidade foi definida pela equação 4.2.1.
Uma observação interessante: no caso de reservatórios de boa qualidade, o termo que
envolve a multiplicação pela razão Kf /Km tende a ser bem menos importante do que a
porosidade, uma vez que Km é normalmente muito maior do que Kf .
No caso de uma rocha saturada de petróleo e água, pode-se calcular o módulo bulk
da mistura através da seguinte forma da média de Reuss:
 −1
1 − Sh Sh Kh
Kf = + = (4.2.19)
Ka Kh Kh
(1 − Sh ) + Sh
Ka
onde os subscritos h e a representam petróleo e água, respectivamente, enquanto S se
refere à saturação. Observe-se que, no caso do gás, o termo que envolve a água pode se
tornar relativamente desprezı́vel, principalmente se o valor de Sh for alto.
Quanto ao módulo bulk da rocha seca, tem-se (ver Mavko et al., 1996):
 −1
1 φ
KR = + (4.2.20)
Km Kp

onde os subscritos p, R e m se referem, respectivamente, ao esqueleto poroso da rocha, à


rocha seca (o esqueleto poroso mais os grãos, sem fluidos6 ), e à matriz. Uma expressão
equivalente é (Mavko et al., 1996):
 
∆Vp
KR = Km (1 − β) = Km 1 − (4.2.21)
∆VR

onde β é o coeficiente de Biot, enquanto ∆VR e ∆Vp representam a variação do volume


da rocha seca e dos poros, respectivamente, ambas avaliadas sem a influência dos fluidos.
Forma explicitamente independente do módulo de rigidez pode ser obtida também no
caso das ondas cisalhantes. No caso, a velocidade é dada por
  
1 3KR 1 − 2σR
vS2 = (4.2.22)
ρ 2 1 + σR

Observe-se que a velocidade de onda cisalhante é afetada pelo fluido apenas através de
sua densidade.
As velocidades de onda compressional e cisalhante da rocha relacionam-se com a razão
de Poisson do conjunto rocha-fluido através da seguinte expressão:
s
vP 1−σ
q= = 1 (4.2.23)
vS 2
−σ
6
A compressibilidade de poros — o inverso de Kp — é definida, no meio geofı́sico, pela razão
−(dVp /dph )/Vp , onde Vp é o volume de poros e ph é a pressão hidrostática externa. A medida cor-
respondente, em uma rocha saturada de um fluido qualquer, é feita de tal forma que a pressão de poros
não varie durante o experimento, garantindo-se assim que nem os grãos nem o fluido sejam comprimidos.
Para isto, um acréscimo no valor de ph deve ser acompanhado da expulsão de parte do fluido que ocupa
os poros.
480 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

ou, de uma forma inversa,


1 2
2
q −1
σ= (4.2.24)
q2 − 1
A aplicabilidade da equação Biot-Gassmann depende de algumas premissas, as mais
importantes das quais, resumidas por Mavko et al. (1996), são: (1) os minerais envolvidos
são homogêneos; (2) o espaço poroso é estatisticamente isotrópico; (3) a freqüência de
propagação é baixa (ou seja, há tempo para que a variação de pressão introduzida pela
onda se dissipe e não induza a geração de novas ondas). Deve-se ainda incluir, entre as
limitações do modelo, a interação rocha-fluido em situações que envolvam viscoelastici-
dade, como parece ser o caso das rochas geradoras, nas quais a matéria orgânica sólida
é lentamente convertida em petróleo. As limitações associadas à freqüência e à aniso-
tropia foram contornadas por Biot (1956b, 1962) e por diversos outros trabalhos que se
seguiram, a maior parte dos quais relacionados e descritos por Mavko et al. (1996). Em
particular, destaca-se a linha que se dedicou ao estudo dos efeitos associados ao fluxo
local de fluidos (squirt flow ), fluxo este responsável por introduzir dispersão da ordem da
tratada por Biot.
No caso de arenitos limpos ou com baixo teor de argila, não cimentados, ou com
baixo nı́vel de cimentação, a equação Biot-Gassmann é aplicável na faixa de freqüências
sı́smicas. Da mesma forma, é aplicável também ao caso de reservatórios carbonáticos
com caracterı́sticas bioclásticas. Em outras litologias e mesmo em arenitos que não
atendam às premissas de aplicabilidade do modelo, o resultado de sua aplicação pode
tanto subestimar quanto superestimar o papel dos fluidos e da porosidade.

4.2.3 O controle da velocidade e da razão de Poisson


A primeira e mais óbvia aplicação das equações 4.2.18 e 4.2.22 consiste em avaliar, de
forma direta, como os diversos parâmetros petrofı́sicos afetam a velocidade de propaga-
ção das ondas elásticas em rochas porosas. Como se pode depreender de uma análise
rápida das duas equações, há que se destacar, em primeiro lugar, o papel dos módulos
de elasticidade. Considere-se inicialmente a rocha seca, isenta de fluidos, cujo módulo
bulk, KR , pode ser definido pela equação 4.2.20. Com base nesta definição, conclui-se
facilmente que a redução da porosidade leva a um maior valor de KR , uma vez que, neste
caso, a razão ∆Vp /∆VR tembém é reduzida. No limite em que a porosidade torna-se
igual a zero, KR torna-se igual a Km . Desta forma, qualquer processo geológico que
reduza a porosidade tende a aumentar o módulo bulk da rocha seca e, conseqüentemente,
a velocidade P. Ressalte-se que, normalmente, o aumento do módulo bulk da rocha seca é
acompanhado de um aumento no módulo de rigidez, em um grau relativo a ser discutido
adiante.
O aumento dos módulos de elasticidade, associado à evolução das bacias sedimentares,
pode levar a constatações aparentemente conflitantes com a teoria. O caso mais flagrante
é o da densidade. Observa-se, na equação 4.2.18, que a velocidade P é inversamente
proporcional à densidade, ao contrário do que se vê na expressão empı́rica de Gardner
(equação 4.2.4), na qual a velocidade é diretamente proporcional à densidade. Este
conflito é, na verdade, apenas aparente, já que os processos geológicos descritos fazem
com que os módulos de elasticidade aumentem de forma mais pronunciada do que a
densidade, criando as condições que fundamentam a fórmula de Gardner.
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 481

Entre os processos geológicos que levam ao aumento da velocidade P, citam-se: (a)


acréscimo na carga sedimentar; (b) aumento nos esforços laterais, causados seja por
eventos tectônicos, seja por subsidência diferencial mais acentuada do que a criação de
espaço lateral; (c) cimentação. Nos dois primeiros casos, o efeito prático é da expulsão
de água da rocha e, em conseqüência, aumento da compactação, o que leva a valores
maiores dos módulos bulk e de rigidez. Resultado similar ocorre no terceiro caso, mesmo
na ausência de compactação, em função da substituição parcial do espaço poroso por
material sólido e da maior ligação entre os grãos.
Sabe-se que a perda de água é normalmente acompanhada de aumento na pressão efe-
tiva — definida, na ausência de tectonismo, como a diferença entre a pressão geostática e
a de poros — à qual estão sujeitas as rochas. Desta forma, pode-se esperar o comporta-
mento ilustrado através da Figura 4.3, ou seja, a velocidade P é proporcional à pressão
efetiva. Isto significa que uma alteração isolada na pressão geostática, ou na pressão de
poros, resulta em variação na velocidade P. Um exemplo clássico é o das regiões geopres-
surizadas, nas quais a velocidade P é anomalamente baixa.
Para ilustrar a influência da pressão de poros, considere-se o caso de uma rocha
altamente impermeável, sobre a qual se depositam outros sedimentos. A progressão
desse processo faz com que a carga sedimentar passe a ser, pelo menos parcialmente,
sustentada pelo fluido. Nestas circunstâncias, o módulo da onda P da rocha tende a se
tornar menor do que o normal, levando a uma velocidade P também menor do que a
normal. Este é exatamente o caso das rochas geradoras, as quais se comportam de forma
temporariamente impermeável, no perı́odo entre o inı́cio da geração e a fase de expulsão
do petróleo. Os fenômenos capilares, responsáveis por esta impermeabilidade temporária,
associados à substituição de matéria orgânica sólida por fluidos, substituição esta devida
à geração de petróleo, podem ser importantes a ponto de fazer com que, em alguns
casos, a velocidade de uma mesma rocha geradora chegue a se manter aproximadamente
constante, mesmo com o aumento da profundidade.
Aumentos na pressão efetiva e no grau de cimentação são processos relacionados com a
evolução natural das bacias sedimentares. Pode-se assim dizer que, em geral, a velocidade
P é diretamente proporcional à idade e à profundidade. Em bacias sedimentares com
predominância de litologias clásticas, observa-se freqüentemente o crescimento linear da
velocidade com a profundidade (ver o item 4.4 e o subitem 2.5.2). Ressalte-se que,
nos casos em que a história da bacia gera esforços laterais importantes, a variação da
velocidade pode espelhar o fenômeno, no caso através da intensificação local do mesmo
crescimento. Este é um efeito associado à compactação triaxial, ou seja, a compactação
devida ao peso dos sedimentos sobrepostos e aos esforços laterais, os quais podem causar
a expulsão de água das rochas.
Observa-se em perfis de poços e testemunhos que uma areia limpa e um folhelho puro
apresentam velocidade P menor do que a de uma areia argilosa. A correspondente fração
de argila, em peso, é denominada “teor crı́tico de argila” e oscila em torno dos mesmos
40% que caracterizam a porosidade crı́tica, já discutida. Este fenômeno, reportado por
Hilterman (1983), Marion et al. (1992) e Zhu et al. (2001), é observado em diversos con-
textos. Curiosamente, existem registros de estudos petrofı́sicos que associam o aumento
na argilosidade ao decréscimo da velocidade P (ver Han et al., 1986; Castagna et al.,
1985). Esta é uma discrepância explicada quando se leva em conta que tipo de material
a argila substitui — fluido ou matriz.
482 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Figura 4.3: Medidas de velocidade P em função da pressão efetiva


(feitas no Centro de Pesquisas da Petrobrás em arenitos da Bacia do
Espı́rito Santo). Obs.: (1) 1000psi equivale a 6895kPa; (2) cada sı́mbolo
representa uma amostra diferente.

Para analisar o tema, imagine-se uma areia quartzosa limpa, saturada de água. Ima-
gine-se agora que a água seja progressivamente substituı́da por argila. Na fase inicial
desse processo, observa-se redução na compressibilidade e aumento na rigidez da rocha,
em função da troca de fluido por sólido. O resultado prático é um aumento na velocidade
da mistura7 . Quando a argilosidade ultrapassa a porosidade crı́tica da areia original, os
próprios grãos de quartzo passam a ser substituı́dos por argila e a perderem o contato
entre si. Em conseqüência, a compressibilidade total da rocha aumenta e a velocidade P
é reduzida, até o valor mı́nimo que ocorre no caso de uma argila pura. Explica-se assim
a semelhança numérica entre o teor crı́tico de argila e a porosidade crı́tica.
A influência dos fluidos sobre o comportamento da velocidade P das rochas porosas
pode ser melhor compreendida com base na equação Biot-Gassmann, particularmente na
forma das expressões 4.2.16 e 4.2.18. É fácil perceber, na primeira delas, que a redução
no módulo bulk dos fluidos saturantes reduz o módulo bulk da rocha e não altera sua
rigidez. Como o módulo bulk do petróleo é normalmente menor do que o da água, pode-
se induzir, combinando-se as expressões 4.2.19 e 4.2.18, que a velocidade P é diretamente
proporcional à saturação de água.
A Figura 4.4, construı́da com dados do arenito eocênico do campo de Bicudo, na
Bacia de Campos (ver a Tabela 4.1), representa um bom exemplo de como a saturação
de petróleo influencia a velocidade P, nos casos da presença de óleo e de gás. Observe-
se que a aplicação da média de Reuss, ao cálculo do módulo bulk da mistura gás-água,
7
Neste caso, há ainda que se levar em conta o efeito da alteração na arquitetura da rocha e, con-
seqüentemente, em sua compressibilidade de poros.
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 483

Material K ρ σ vP φ
Matriz (quartzo) 40. 2.65 − − −
Água 2.37 1.04 − − −
Óleo 0.944 0.8 − − −
Gás 0.131 0.36 − − −
Rocha seca 5.50 − 0.15 − 28.
Rocha c/água − 2.2 0.30 2845. 28.

Tabela 4.1: Parâmetros usados na construção das figuras


4.4, 4.5 e 4.7. Os módulos bulk, K, são dados em GPa,
as densidades, ρ, em gramas por centı́metro cúbico, a velo-
cidade, vP , em metros por segundo e a porosidade, φ, em
percentagem. A razão de Poisson, σ, é adimensional.

100
Velocidade (%)

95
Óleo

90

Gás

85
0 25 50 75 100
Saturação de água (%)

Figura 4.4: Velocidade P (em percentual do valor máximo) do arenito


eocênico do campo de Bicudo (Tabela 4.1), em função da saturação de
água.

faz com que cerca de 5% a 10% de gás sejam suficientes para provocar uma redução
significativa na velocidade P, a qual cresce de forma lenta com o aumento na saturação
de gás, a partir de um mı́nimo situado nas saturações de água em torno de 50%. No
caso do óleo, observa-se uma relação aproximadamente linear entre a velocidade P e a
saturação de água.
Como notaram Han e Batzle (2001), a drástica redução na velocidade, causada pela
introdução, no reservatório, de uma pequena quantidade de gás8 , é particularmente mais
8
Este fenômeno — associado ao termo fizz-water — é conhecido desde o inı́cio da década de 1970, prin-
cipalmente depois da publicação do trabalho de Domenico (1974). Relacionada com o mesmo tema está
484 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

100
Impedância acústica (%)

95

Óleo
90

85 Gás

80
0 25 50 75 100
Saturação de água (%)

Figura 4.5: Impedância acústica (em percentual do valor máximo)


do arenito eocênico do campo de Bicudo (Tabela 4.1), em função da
saturação de água.

intensa onde as pressões de poros são inferiores à do ponto de bolha e, em conseqüência,


o gás pode ocorrer na forma de pequenas bolhas misturadas à água. As profundidades
que caracterizam este limite são normalmente inferiores a 2000m, portanto ligeiramente
menores do que a profundidade do arenito usado na construção da Figura 4.4. Observe-
se, por outro lado, que o aumento na saturação de gás altera a impedância acústica de
acordo com um padrão mais linear do que no caso da velocidade P, como se pode ver no
exemplo da Figura 4.5. Este resultado se deve ao fato de que a influência do gás sobre a
densidade da mistura gás-água obedece a uma equação linear.
Dentro do mesmo tema, um importante aspecto a considerar são as condições de
reservatório, particularmente no caso das grandes profundidades e baixas porosidades.
Na presença de variação espacial na saturação de gás e de fenômenos capilares, que
são comuns nestas circunstâncias, a distribuição de esforços na mistura dos fluidos pode
não ser homogênea. Neste caso, a média de Reuss não seria aplicável. Duas formas de
contornar esta eventualidade consistem em: (1) recorrer a experimentos de laboratório
ou; (2) estimar o módulo bulk da mistura gás-água com base em outras médias, como
a de Voigt-Reuss-Hill. Neste caso, a influência do gás torna-se mais parecida com a do
óleo.
Outro efeito importante, relacionado à compressibilidade dos fluidos, é causado pela
variação na temperatura. Com base em dados de laboratório, sabe-se que a velocidade
uma discussão interessante sobre as propriedades termodinâmicas da interação entre as ondas sı́smicas e
as rochas saturadas de água, na presença de gás em solução. No caso, a dúvida é (ver McLean e Alberty,
2001): durante a propagação de uma onda, há tempo para que o calor gerado se dissipe (condição isoter-
mal), ou a variação de pressão é tão rápida que a temperatura do fluido aumenta (condição adiabática)?
A importância desta dúvida reside no fato de que a compressibilidade da mistura de água e gás em
solução é maior na condição isotermal, como a vigente nas medidas estáticas da grandeza.
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 485

Figura 4.6: Velocidade P (em percentual do valor a 25 graus


centı́grados) de um arenito, em função da temperatura e três diferentes
saturações de água (modificado de Tosaya et al., 1987).

P das rochas saturadas de alguns tipos de óleo é inversamente proporcional à tempera-


tura e que a mesma relação não se observa com a mesma clareza em rochas saturadas
de água ou gás. Uma razão para este resultado, ilustrado na Figura 4.6, é a maior in-
fluência da temperatura sobre a compressibilidade do óleo, em comparação com outros
fluidos. Ressalte-se que o mesmo fenômeno é mais evidente no caso de rochas inconsoli-
dadas, situadas junto à superfı́cie (menos de 1000m de profundidade), onde é freqüente a
ocorrência de óleos densos, biodegradados. Estes são óleos que, para serem produzidos,
exigem freqüentemente o uso de técnicas secundárias de recuperação baseadas no efeito
da temperatura sobre a permeabilidade relativa dos reservatórios.
No caso da razão de Poisson, deve-se, inicialmente, mencionar o trabalho pioneiro
de Koefoed que, já em 1955, preocupava-se com a possibilidade de utilizá-la como uma
ferramenta de identificação litológica. Para avaliar esta possibilidade, o primeiro aspecto
a destacar é o da influência da rigidez das rochas sobre a propagação das ondas S. Como
foi dito acima, pode-se esperar que todos os fenômenos geológicos que levem ao aumento
do módulo bulk devem também afetar o módulo de rigidez das rochas. A intensidade
relativa dos dois fenômenos pode ser avaliada com base na influência da pressão efetiva
sobre o comportamento da razão de Poisson.
Em bacias sedimentares com predominância de sedimentos clásticos, observa-se que
a razão de Poisson tende a reduzir com o aumento na profundidade, como no exemplo
da Figura 4.18 (página 511). Isto equivale a dizer que a velocidade S aumenta com a
profundidade de forma mais acentuada do que a velocidade P e, portanto, o módulo de
rigidez aumenta também de forma mais acentuada do que o módulo bulk. Trata-se de
um fenômeno em grande parte devido à perda de fluidos e à alteração da estrutura das
rochas no sentido de um padrão laminado, caracterı́sticas da compactação uniaxial.
486 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

100

90
Razão de Poisson (%)

Óleo
80

70

60
Gás

50
0 25 50 75 100
Saturação de água (%)

Figura 4.7: Razão de Poisson (em percentual do valor máximo) do are-


nito eocênico do campo de Bicudo (Tabela 4.1), em função da saturação
de água.

Do ponto de vista econômico, o aspecto mais importante, relacionado à propagação de


ondas S, se refere à influência dos fluidos. Neste caso, percebe-se, com base nas equações
4.2.1 e 4.2.22, que a saturação de água não afeta o módulo de rigidez e somente pode
modificar a velocidade S através da densidade bulk da rocha. Com base na fórmula de
Gardner et al. (1974), sabe-se também que, em bacias sedimentares tı́picas, variações so-
fridas pela densidade tendem a ser equivalentes a apenas 25% das variações da velocidade
P. Como a velocidade S é inversamente proporcional à raiz quadrada da densidade, não
é difı́cil concluir que a saturação de água pouco influencia a velocidade S.
Com base nesta constatação, pode-se concluir que, como a velocidade P é diretamente
proporcional à saturação de água, espera-se que a razão de Poisson também seja direta-
mente proporcional à saturação de água. Esta tendência, observada na prática, pode ser
constatada no exemplo da Figura 4.7, construı́da a partir dos mesmos dados usados na
elaboração da Figura 4.4. Observe-se que as duas figuras são semelhantes, até mesmo no
caso do gás. Um caso particular merece destaque: embora não se conheça exatamente
qual é a relação entre a saturação de petróleo e as propriedades elásticas dos folhelhos
geradores de petróleo, sabe-se que, na fase de geração, a correspondente razão de Poisson
se assemelha, em alguns casos, à de um arenito saturado de gás. Esta caracterı́stica foi
observada, por exemplo, através de medidas petrofı́sicas, feitas pelo Centro de Pesquisas
da Petrobrás, em um folhelho gerador da bacia do Amazonas.
Na linha das preocupações de Koefoed (1955), a influência da composição mineral
sobre a razão de Poisson merece uma discussão à parte. Com base em medidas de
laboratório, sabe-se que a razão de Poisson tı́pica de alguns minerais é (ver, por exemplo,
Mavko et al., 1996): 0.06-0.08 para o quartzo; 0.34-0.36 para a argila e alguns feldspatos
e; 0.29-0.32 para a calcita. Estes dados podem nortear a previsão do comportamento da
razão de Poisson das rochas. Por exemplo, sabe-se que o aumento na argilosidade ou no
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 487

teor de feldspato deve aumentar a razão de Poisson de arenitos saturados de água, a qual
oscila entre 0.1 e 0.4, dependendo do grau de compactação. No caso dos carbonatos, cuja
razão de Poisson oscila em torno de 0.3, espera-se que a dolomitização a reduza, já que
a dolomita tende a ter razão de Poisson menor do que a da calcita.

4.2.4 A substituição de fluido


Talvez a mais importante aplicação prática da equação Biot-Gassmann seja a chamada
substituição de fluido. Neste processo, conhece-se a rocha preenchida por um determinado
fluido (por exemplo, água) e se deseja estimar como seriam as propriedades elásticas da
mesma rocha se os seus poros estivessem preenchidos por outro fluido (por exemplo,
uma mistura de água e óleo). Com esses dados, pode-se validar e prever a existência de
reflexões associadas à presença de petróleo (ver o item 4.3).
Suponha-se o caso em que se conhecem os seguintes parâmetros de uma dada rocha:
velocidade P, velocidade S, porosidade, caracterı́sticas do fluido saturante e propriedades
da matriz. Com esses dados, pode-se determinar, através de um processo inverso aplicado
às equações 4.2.17 e 4.2.22, o módulo bulk da rocha seca. O resultado permite substituir o
fluido dado pelo desejado nas mesmas equações e, assim, estimar as propriedades elásticas
resultantes da aplicação direta das mesmas equações.
Neste processo, o primeiro passo consiste em se determinar os módulos bulk e de
rigidez da rocha conhecida, o que é feito através das seguintes expressões, a primeira
delas resultante da combinação entre as equações 4.2.7 e 4.2.8:

Kb = ρ vP2 − 34 vS2 (4.2.25)
e
µ = vS2 ρ (4.2.26)
Com o módulo bulk da rocha original, pode-se agora determinar o módulo bulk da rocha
seca, o que se faz através da seguinte expressão, resultante de uma manipulação algébrica
da equação 4.2.16:  
Kf
Kb φ + (1 − φ) − Kf
Km
KR = (4.2.27)
Kb Kf Kf
φ+ 2
− (1 + φ)
Km Km
Observe-se, nesta expressão, que KR é igual a Kb no limite em Kf tende a zero.
Conhecidos os módulos bulk, KR , e de rigidez, µ, pode-se agora calcular as velocidades
P e S da rocha saturada com os fluidos desejados, em substituição aos originais. Isto é
feito através da aplicação direta das equações 4.2.1, 4.2.8 e 4.2.17. Ressalte-se que, nesta
técnica, parte-se do conhecimento da velocidade S da rocha, o qual nem sempre é possı́vel.
Na ausência de informações diretas sobre a velocidade S, utilizam-se com freqüên-
cia valores estimados para a razão de Poisson da rocha seca, a qual tende a apresentar
variação relativa menor do que o módulo bulk da rocha seca. Com essa estimativa, que
deve preferencialmente ser obtida através de medidas em laboratório, pode-se aplicar a
equação 4.2.18 de forma inversa e calcular KR . Neste processo, resolve-se a seguinte
equação do segundo grau:
     
KR2 1 − σR 2 vP2 ρ 2 φ 1−φ
2
+ KR 3 − + + vP ρ + +1=0 (4.2.28)
Km 1 + σR Km Km Kf Km
488 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

onde KR é o único elemento desconhecido. Nas aplicações práticas, é comum a utilização


de valores em torno de 0.15 a 0.25, para a razão de Poisson de arenitos secos.
Considere-se agora o caso em que a velocidade S de uma rocha é desconhecida, mas
se conhece a velocidade P e a densidade da mesma rocha saturada por duas diferentes
misturas de fluido. Neste caso, é possı́vel estimar os dois módulos elásticos, KR , e µ,
através da chamada técnica Gregory-Pickett (Hilterman, 1983). Este é um algoritmo
baseado na idéia de que as duas incógnitas podem ser determinadas pelo simples fato
de que, no caso, dispõem-se de duas equações. Assim, aplicando-se a expressão 4.2.17 às
duas rochas conhecidas, obtém-se a seguinte equação do segundo grau:

AX 2 + BX + C = 0 (4.2.29)

onde  
KR
X= 1− ,
Km
∆M φ φ
A= 2
− + ,
Km Kf 1 Kf 2
 
∆M φ φ 2φ
B= + − ,
Km Kf 1 Kf 2 Km
  
φ φ φ φ
C = ∆M − −
Kf 1 Km Kf 2 Km
e
∆M = vP2 2 ρ2 − vP2 1 ρ1
Nestas equações, os subscritos 1 e 2 se referem às duas situações em que se conhece
a rocha e os demais sı́mbolos já foram identificados anteriormente. Com o valor de
X, determinado a partir da solução da equação 4.2.29 e, conseqüentemente, o de KR ,
determina-se em seguida o módulo de rigidez, o que pode ser feito através da equação
4.2.17.
A técnica Gregory-Pickett pode ser útil para: (a) obter valores de compressibilidade
para aplicação em processos de simulação de produção; (b) fornecer dados para a subs-
tituição de fluido com uma mistura diferente das duas conhecidas e; (c) avaliar a aplica-
bilidade da substituição de fluidos a uma determinada rocha. Considere-se por exemplo,
neste último caso, que os valores de módulo bulk e razão de Poisson da rocha seca, esti-
mados com a técnica, sejam absurdos. Neste caso, conclui-se que, ou os dois conjuntos
de dados não correspondem a uma mesma rocha saturada de dois fluidos distintos, ou a
equação Biot-Gassmann não se aplica.

4.2.5 Fontes de dados para a modelagem petrofı́sica


No caso dos fluidos, os valores de módulo bulk, usados na equação 4.2.17, podem ser
obtidos através de medidas de laboratório, preferencialmente as de caráter dinâmico,
ou seja, feitas através de estimativas das velocidades P e S. Na ausência desse tipo de
informação, pode-se recorrer a expressões resultantes da combinação entre teoria e ex-
pressões empı́ricas (ver Batzle e Wang, 1992). No caso particular da água de formação,
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 489

30
Módulo bulk (kbar)

25

50 100 150
Temperatura (graus centígrados)

Figura 4.8: Módulo bulk da mistura de água e sal em


função de temperatura, pressão de poros e salinidade. As
salinidades usadas, em ppm, foram 35000 (linhas cheias),
70000 (linhas tracejadas) e 105000 (linhas pontilhadas); as
pressões de poros, em bar, foram 100 (valores menores do
módulo bulk, para cada salinidade), 200 e 300. Observação:
1bar equivale a 100kPa, ou a 1.0197kgf/cm 2 .

usam-se dados de temperatura, pressão de poros e salinidade para, nas condições de reser-
vatório, obter-se o valor do correspondente módulo bulk, como no exemplo da Figura 4.8.
Nas aplicações práticas, o módulo bulk e a densidade da água, determinados dessa forma,
oscilam em torno de 22.5 a 35GPa e 0.98 a 1.1g/cm3 , respectivamente. Combinados com
a equação 4.2.7, esses dados podem ser usados também para se determinar a velocidade
da água. Um exemplo prático, fora da área da petrogeofı́sica, pode ser visto na Figura
4.9, na qual se vê como varia a velocidade média da água em função da batimetria e de
variações isoladas na temperatura da água junto à superfı́cie e da salinidade da água.
Quanto ao óleo e ao gás, as estimativas de módulo bulk e densidade são obtidas com
base em dados facilmente disponı́veis, como a densidade relativa (no caso do óleo, grau
490 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

T1

1
N
Batimetria (km)

T2
2 S1 S2

4
1480 1500 1520 1540
Velocidade média da água (m/s)

Figura 4.9: Variação da velocidade média da água do mar entre a


superfı́cie e o fundo do mar, em função da batimetria. Legenda: N
- caso normal (temperatura junto à superfı́cie igual a 20 0 C, salinidade
igual a 35000ppm); T 1 e T 2 - temperaturas junto à superfı́cie iguais a
100 C e 300 C, salinidade igual a 35000ppm; S1 e S2 - salinidades iguais a
25000 e 45000ppm, temperatura junto à superfı́cie igual a 20 0 C. Foram
usados dados de temperatura obtidos na Bacia de Campos pelo Centro
de Pesquisas da Petrobrás.

API) e a razão gás/óleo, além da pressão e da temperatura, já mencionadas (ver Batzle
e Wang, 1992). A densidade relativa do óleo, avaliada a 15.60 centı́grados, é definida por
141.5
gAP I = − 131.5 (4.2.30)
ρo
onde ρo é a densidade absoluta do óleo. Valores extremos de densidade relativa oscilam
entre menos de 10, para óleos muitos densos, e 70, com as correspondentes densidades
variando entre 1.0 e 0.7g/cm3 , respectivamente. No caso da razão gás-óleo, a unidade
tı́pica é m3 /m3 e os valores mais representativos oscilam entre 30 e 150m3 /m3 . A densi-
4.2. NOÇÕES DE PETROGEOFÍSICA 491

dade relativa do gás é definida como a razão entre as densidades do gás e do ar a 15.6 0
centı́grados, na pressão atmosférica. Valores extremos oscilam entre 0.56 (metano) e 1.8
(gás denso), segundo Mavko et al. (1996), sendo que a faixa mais representativa está entre
0.7 e 1.0.
O módulo bulk e a densidade dos minerais que constituem a matriz são normalmente
estimados com base em medidas de laboratório publicadas na literatura especializada.
Uma vez que a influência de ambos, nas equações 4.2.17 e 4.2.22, não é muito acentuada,
este tipo de fonte de informações torna-se bastante aceitável. Neste particular, um erro na
estimativa do material que constitui a matriz pode ser mais importante do que eventuais
diferenças nos valores das propriedades do material correto. Intervalos representativos dos
valores do módulo bulk, em GPa, são 36-40, para um grão de quartzo, 15-25 para a argila e
65-77, para um grão de calcita. Para os mesmos materiais, as densidades representativas,
em gramas por centı́metro cúbico, são 2.65, 2.55-2.6 e 2.70-2.71, respectivamente.
Na discussão sobre a substituição de fluido, ficou evidente que a obtenção das proprie-
dades da rocha seca representa a maior dificuldade enfrentada nas aplicações mais comuns
da modelagem petrofı́sica. Viu-se também que, no caso, a situação mais confortável ocorre
quando existem perfis de velocidade S das rochas saturadas, já que, através da aplicação
das equações 4.2.25 a 4.2.27, pode-se estimar os módulos bulk e de rigidez da rocha seca.
Entretanto, na maioria dos poços perfurados, em todo o mundo, não existem perfis de
velocidade S, os quais só passaram a ser adquiridos de forma sistemática já nos anos 90,
em função do desenvolvimento das ferramentas dipolares (ver Harrison et al., 1990). Este
fato, aliado à má qualidade de muitos perfis de velocidade S, tem levado com freqüência
ao uso de técnicas empı́ricas, as quais, muitas vezes parcialmente suportadas pela teoria,
tentam compensar a ausência desse tipo de dado.
Uma das mais conhecidas das técnicas empı́ricas é baseada na aproximação obtida
por Castagna et al. (1985), a qual permite estimar a velocidade S a partir da velocidade
P de um folhelho e é dada por
1
vS = (vP − c) (4.2.31)
m
ou, usando os valores m e c originalmente obtidos pelos mesmos autores,

vS = 0.862vP − 1172 (4.2.32)

onde ambas as velocidades são dadas em metros por segundo.


Ressalte-se que expressões de caráter empı́rico, similares ou não à equação 4.2.31,
podem ser obtidas para diferentes litologias. No caso de rochas porosas monominerálicas,
saturadas de água, Castagna et al. (1993) desenvolveram uma representação polinomial
para a relação entre as velocidades P e S, a qual constitui a base para a aplicação da
técnica Greenberg-Castagna, discutida em seguida (Greenberg e Castagna, 1992). A
forma geral dessa representação é:

vS = ai + bi vP + ci vP2 (4.2.33)

onde i é o ı́ndice que identifica a litologia monominerálica e a, b e c são constantes estima-


das com base em medidas de laboratório. Observe-se que a expressão 4.2.31 corresponde
a um caso particular da equação 4.2.33. Na Tabela 4.2, podem ser vistos os valores das
constantes usadas por Greenberg e Castagna.
492 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Litologia-mineral a b c
Arenito-Quartzo −0.85588 0.80416 0.000002
Argila-Ilita −0.86735 0.76969 0.000000
Dolomita −0.07775 0.58321 0.000004
Calcário-Calcita −1.03049 1.01677 −0.055080

Tabela 4.2: Coeficientes das relações empı́ricas obtidas


por Castagna et al. (1993), para velocidades dadas em
km/s.

Na aplicação da técnica Greenberg-Castagna, é necessário o conhecimento da porosi-


dade e das propriedades dos fluidos e dos minerais constituintes, além da velocidade P
da rocha. A aplicação da técnica envolve os seguintes passos, dos quais, no caso de uma
rocha saturada de água, apenas os três primeiros são necessários:

1. A velocidade P da rocha corrente é considerada igual à velocidade P fornecida.

2. Com a velocidade P e a expressão 4.2.33, calcula-se a velocidade S de cada um dos


componentes monominerálicos da rocha corrente.

3. Calcula-se a velocidade S da rocha com base em uma média Voigt-Reuss-Hill das


velocidades S obtidas na etapa anterior (equação 4.2.11). Se a rocha for saturada
de água, o processo é interrompido.

4. Com a velocidade S obtida e a densidade da rocha saturada de água, estima-se o


módulo de rigidez da rocha corrente (equação 4.2.26).

5. O módulo de rigidez obtido, combinado com a densidade da rocha saturada de


petróleo, é usado para se estimar a velocidade S da rocha saturada de petróleo
(equação 4.2.8).

6. Com a velocidade P da rocha dada e a velocidade S estimada na etapa anterior,


além dos demais dados relativos à rocha saturada de petróleo, determinam-se os
módulos bulk da rocha saturada de petróleo e seca (equações 4.2.25 e 4.2.27).

7. A densidade da rocha saturada de água, o módulo de rigidez estimado na etapa 4


e o módulo bulk da rocha seca são utilizados para estimar a velocidade P da rocha
saturada de água com a fórmula de Gassmann (equação 4.2.17).

8. Se a velocidade P estimada na etapa anterior for diferente da velocidade P da rocha


corrente, aumenta-se a velocidade P da rocha corrente de acordo com um pequeno
percentual e se repetem os passos 2 a 8. No caso contrário, considera-se aceita a
velocidade S estimada na etapa 5.

Observe-se que a técnica Greenberg-Castagna se baseia na velocidade P da rocha


saturada de água, ainda que a rocha dada seja saturada de petróleo. Isto se deve ao fato
de que a expressão 4.2.33 foi obtida com base em rochas saturadas de água. Portanto,
no caso de uma rocha saturada de petróleo, a técnica envolve o conceito de substituição
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 493

de fluido, discutido anteriormente. Do ponto de vista matemático, o processo iterativo


descrito pode ser melhorado através da utilização do chamado método secante (ver Ortega
e Rheinboldt, 1970).

4.3 Indicadores Sı́smicos de Petróleo e Litologia


Com os trabalhos de Gassmann e Biot, criaram-se as condições básicas para avaliar
a influência da saturação de petróleo sobre as amplitudes sı́smicas. Mas foi somente
durante os anos 60 que o assunto amadureceu, em grande parte por causa do intenso
esforço dedicado à teoria da fı́sica de rochas e do advento da aquisição e processamento de
dados sı́smicos digitais com base na técnica CDP. Existem informações de que o conceito
de bright-spot, ou seja, uma anomalia de amplitude causada pela presença de petróleo, já
estava em uso alguns anos antes da divulgação do tema, o que ocorreu apenas em 1973.
Na primeira metade da década de 1970, a idéia do bright-spot, aplicada inicialmente
ao caso do gás, tornou-se universalmente conhecida, em grande parte por causa do tra-
balho de Domenico, publicado em 1974. A indústria do petróleo percebeu então que
poderia usar as amplitudes sı́smicas para identificar jazidas de gás, o que, sem dúvida,
representava uma novidade economicamente revolucionária. Seguiu-se um perı́odo febril,
em grande parte reforçado pela primeira crise do petróleo, no qual foram feitas inúmeras
descobertas, uma das quais no Brasil em 1975, através de um poço perfurado na Bacia da
Foz do Amazonas pela Petrobrás. Na mesma época, percebeu-se que o tratamento ade-
quado de amplitude, necessário para a aplicação da idéia do bright-spot, favorecia também
a caracterização de alguns tipos de reservatório. Aplicada pela Petrobrás na Bacia de
Campos, esta idéia levou à descoberta de diversos campos de petróleo, em muitos casos
sem que se notasse a influência do óleo sobre as anomalias de amplitude.
Da mesma forma que o conceito de bright-spot causado por gás foi certamente utilizado
antes de vir a público, a sua extensão para o caso do óleo também o foi. Poucos trabalhos
sobre o tema foram publicados até meados da década de 1980. Um dos primeiros foi
o de Rosa et al. (1985), resultante da aplicação do conceito a acumulações da Bacia de
Campos, a partir de 1983. Estima-se que, pelo menos desde o inı́cio da década de 1980,
idéias semelhantes9 já eram conhecidas na intimidade de um número restrito de empresas.
Também no mesmo perı́odo, entre 1975 e 1985, intensificaram-se as pesquisas em torno
da possibilidade de se detectar a influência das propriedades elásticas das rochas sobre as
medidas de amplitude feitas em função do ângulo de incidência. Estava nascendo então
o conceito conhecido mais tarde por AVO (Amplitude Versus Offset). Neste particular, o
esforço feito por Fred Hilterman, em grande parte inspirado nas idéias de Koefoed (1955)
e voltado para a identificação de litologia, foi muito importante10 . Mas não era somente
ele a se dedicar ao tema. Assim, em 1984, foi publicado o trabalho de Ostrander, que
representou, para o conceito de AVO, marco equivalente ao do trabalho de Domenico
para o bright-spot.
Seguiram-se então diversos trabalhos importantes, a maior parte deles dedicada à
influência do gás sobre as medidas de amplitude em função do ângulo de incidência. Sob
9
Em ciência, não existem autores isolados de idéias novas. Existe quem as publica em primeiro lugar.
E esta não é uma idéia nova.
10
Ver, por exemplo, a tese de Rosa (1976).
494 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

o aspecto metodológico, a mais interessante linha de pesquisa desenvolvida nessa fase


fundamenta-se em gráficos cruzados (em inglês, crossplots) das estimativas de interseção
e gradiente. Neste caso, o trabalho de Smith e Gidlow (1987) e, novamente, a participação
de Fred Hilterman, foram fundamentais.
Durante um certo tempo, o tema AVO provocou uma verdadeira inundação de traba-
lhos que reportavam tanto casos bem-sucedidos quanto exemplos de fracassos. Por outro
lado, exatamente como ocorreu com o bright-spot, as publicações ficaram, por bastante
tempo, restritas ao caso do gás. Com a estabilização dos algoritmos de processamento
dedicados ao tema e a popularização dos gráficos cruzados de interseção e gradiente,
criaram-se condições mais favoráveis para perceber, como no caso do bright-spot também
sem muita divulgação, que o óleo poderia provocar anomalias significativas. Atualmente,
análise de AVO já faz parte da rotina dos geofı́sicos.
Em conjunto, as técnicas dedicadas à detecção sı́smica de petróleo, que são utilizadas
também na caracterização de reservatórios, reúnem uma série de atributos, genericamente
agrupados, na literatura internacional, pela sigla DHI (Direct Hydrocarbon Indicators 11 ).
Entre esses atributos, incluem-se o bright-spot, o flat-spot, o dim-spot e toda a famı́lia
resultante da técnica AVO, parte dos quais é empregada não somente na detecção direta
de petróleo mas também na caracterização de litologias. Discutem-se neste item aspectos
interpretativos do tema, com base na teoria discutida nos itens 2.6, 3.7 e 4.2, aplicados a
alguns exemplos da Bacia de Campos.

4.3.1 Bright-spots, flat-spots, dim-spots e AVO


Pede-se ao leitor que analise a Figura 4.10. Ele poderá ver os perfis de raio gama, re-
sistividade, sônico e densidade de um poço do campo de Bicudo, ao nı́vel dos arenitos
eocênicos, produtores de óleo na Bacia de Campos. Percebe-se, no perfil sônico, uma
súbita mudança de velocidade, coincidente com o contato óleo-água, o qual é evidente no
perfil de resistividade. O coeficiente de reflexão, ao nı́vel do contato, é de aproximada-
mente 0.050, o que representa um valor absoluto bem acima da média RMS observada
na área.
Na Figura 4.11, pode-se ver uma seção sı́smica registrada nas vizinhanças do poço que
deu origem aos dados da Figura 4.10. Observe-se que o módulo da amplitude da reflexão
situada em torno de 1.83-1.87s é maior nos ápices do que nos flancos dos dois anticlinais.
Na época em que se percebeu a associação entre as anomalias ilustradas pelas duas
figuras, a primeira explicação que ocorreu a Rosa et al. (1985) foi a diagênese diferencial.
De acordo com esta idéia, a presença de óleo teria inibido a diagênese, a qual afetaria de
forma mais pronunciada a zona de água, criando um contraste de impedância acústica
no contato óleo-água. Entretanto, as descrições de amostras de calha não confirmaram
esta possibilidade.
A mais provável explicação para o fenômeno passou a ser a própria influência do fluido.
Em outras palavras, a presença do óleo seria responsável pela baixa velocidade da areia,
acima do contato óleo-água. Para testar a idéia, usaram-se as seguintes informações,
extraı́das dos perfis de poços do campo e de outras fontes (ver também a Tabela 4.1,

11
Há quem critique o termo DHI e prefira alternativas como SHI (Seismic Hydrocarbon Indicators).
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 495

Figura 4.10: Perfis de raios gama, resistividade, sônico e densidade do poço BI-1D,
no campo de Bicudo.

na página 483): (a) módulo bulk, em GPa, de 0.944 para o óleo, 2.37 para a água12 e
40, para os grãos da rocha; (b) velocidade, em metros por segundo, de 2820-2870, para
a rocha com água, e 2610-2650, para a rocha com óleo; (c) densidades, em gramas por
centı́metro cúbico, de 2.12 a 2.15, para a rocha com óleo, 2.17 a 2.22, para a rocha com
água, 2.65 para os grãos, 0.80 para o óleo e 1.04, para a água; (d) porosidade de 28%; (e)
saturação de óleo de 90%.
Como o módulo bulk e a razão de Poisson da rocha seca não eram conhecidos, fez-se
uso da técnica Gregory-Pickett, discutida no item 4.2. Sabe-se que, para a aplicação
bem-sucedida desta técnica, é necessário que as caracterı́sticas do reservatório sejam as
mesmas, acima e abaixo do contato entre os fluidos. Com efeito, no caso do campo de
Bicudo, as descrições de amostras de calha e estudos de perfis parecem confirmar relativa
homogeneidade no reservatório.
No caso do campo de Bicudo, a técnica Gregory-Picket conduziu a valores de 0.15,
para a razão de Poisson da rocha seca e 5.5GPa, para o módulo bulk da rocha seca.
Ambos os resultados estão perfeitamente de acordo com o que a literatura especializada
registra, no caso de arenitos do mesmo tipo. Pôde-se confirmar, portanto, que o fenômeno
observado nos perfis sônico e de densidade é devido à presença de óleo (Rosa et al., 1985).
Em resumo, a anomalia de amplitude da Figura 4.11 corresponde a um exemplo do
mais antigo dos DHI’s: o bright-spot (em português, mancha brilhante), ou seja, uma
amplitude anômala resultante da presença de petróleo, explicada com base na teoria
discutida no item 4.2. Na mesma figura, observa-se, ainda que de forma pouco óbvia,
uma feição normalmente associada ao bright-spot: o flat-spot. Trata-se de uma reflexão
gerada no contato entre o petróleo (gás ou óleo) e a água e que, por isto mesmo, tende a
12
Percebeu-se, mais tarde, que o valor correto do módulo bulk da água é maior do que o usado. Entre-
tanto, a utilização do valor correto não alterou significativamente os resultados originalmente obtidos.
496 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Figura 4.11: Seção sı́smica migrada em tempo na área do campo de


Bicudo. A escala do eixo vertical é tempo em segundos.

ser aproximadamente plana, justificando o termo flat (em português, plano). No caso do
campo de Bicudo, os fenômenos de interferência e variação lateral na velocidade média
deformaram a reflexão do contato, o que dificulta a caracterização da feição.
Também da mesma famı́lia que o bright-spot é o dim-spot (em português, mancha
esmaecida), gerado quando a presença de petróleo provoca uma redução no módulo da
amplitude. Isto ocorre quando a rocha saturada de água apresenta impedância acústica
maior do que a da rocha encaixante. Assim, quando a água é substituı́da por petróleo,
a correspondente redução na impedância acústica provoca uma redução no módulo da
amplitude. Ressalte-se que, como sugere a intuição, não é muito fácil identificar, nos
dados sı́smicos, anomalias deste tipo.
Um aspecto importante a destacar é que, nas seções empilhadas com base na técnica
CDP, os bright-spots, como qualquer reflexão, são anomalias resultantes da média de
amplitudes obtidas em diferentes ângulos de incidência. O impacto desse fenômeno sobre
os bright-spots pode ser avaliado com base em um exemplo sintético, como o da Figura
4.12, a qual foi construı́da tomando-se como modelo as seguintes rochas, encaixadas em
um folhelho representativo: (a) um arenito saturado de petróleo; (b) o mesmo arenito,
saturado de água e; (c) um folhelho de baixa impedância acústica e razão de Poisson
compatı́vel com a fórmula de Castagna et al. (1985). Nos três casos, foram usados como
referência — mas não exatamente – os dados do campo de Bicudo.
Observe-se, na Figura 4.12, que: (1) na incidência normal, o topo da rocha saturada
de água dá origem a um coeficiente de reflexão (ou a uma amplitude) de módulo mais
baixo do que o correspondente ao arenito saturado de petróleo, o que representa um
resultado compatı́vel com o conceito de bright-spot; (2) a influência do petróleo é mais
clara no traço empilhado do que no traço de incidência normal, ou seja, nas condições da
figura, o empilhamento reforça a importância relativa do bright-spot; (3) a distribuição
das amplitudes nos traços não empilhados pode ser usada como um DHI ainda mais
poderoso do que o bright-spot, na medida em que incorpora também a influência da razão
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 497

b
Coeficiente de reflexão −0.025

−0.050 c

−0.075
a
−0.100

0 10 20 30 40
Ângulo de incidência (graus)
2.00

vP σ ρ
a
100
2.1
Tempo (s)

b
200
2.2

c
300
2.3

400
2.4
0 10 20 30 40 S
Figura 4.12: Coeficientes de reflexão (no alto), perfis elásticos
e sismograma sintético (embaixo), correspondentes ao modelo de-
finido pelas seguintes rochas, encaixadas em um folhelho: (a) um
arenito saturado de petróleo; (b) o mesmo arenito saturado de
água; (c) um folhelho de baixa impedância acústica. No gráfico
superior, a escala horizontal é linear com o quadrado do seno do
ângulo de incidência. No inferior, os números no eixo horizontal
são os ângulos de incidência em graus, enquanto a letra S iden-
tifica o resultado do empilhamento dos traços. Os sı́mbolos v P ,
σ e ρ identificam velocidade de ondas compressionais, razão de
Poisson e densidade. Pulso sı́smico: filtro passa-banda de 8-40Hz.

de Poisson13 . Reside nestas observações a raiz da análise de AVO, discutida em seguida.

13
A Figura 4.12 poderia levar a uma correlação direta entre presença de petróleo e aumento do módulo
da amplitude com o ângulo de incidência. Ver-se-á adiante que a realidade pode ser mais complexa.
498 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

4.3.2 Análise de AVO


O termo “análise de AVO” se refere a um processo interpretativo, conduzido com o obje-
tivo especı́fico de discriminar anomalias em um meio geológico estatisticamente represen-
tativo, o qual é caracterizado através do que se convencionou denominar “tendência de
fundo”. Para fundamentar esta caracterização, utilizam-se expressões empı́ricas robustas
que, a partir da velocidade P , permitem estimar a densidade e a razão de Poisson, ou
a velocidade S. Este é o caso das equações de Gardner et al. (1974) e Castagna et al.
(1985), as quais caracterizam um meio que se poderia denominar “Gardner-Castagna”.
Para ilustrar a discussão, preparou-se a Figura 4.13, a qual representa um exemplo
de como as propriedades elásticas de um conjunto de arenitos variam em função da
profundidade e da substituição da água de formação por óleo e gás. Na geração da
figura, que envolveu um intervalo de profundidades (z) entre 500m e 5500m, adotaram-se
as seguintes regras empı́ricas: (a) a velocidade P, em m/s, variou de acordo com a lei
vP = 1800 + 0.6z; (b) a temperatura, em graus centı́grados, variou de acordo de acordo
com a expressão T = 20+0.03z; (c) a salinidade, em ppm, obedeceu à lei S = 35000+16z;
(d) a pressão de poros, em kgf/cm2 , foi definida por 10 + z/9.807; (e) a densidade, em
g/cm3 , foi estimada, a partir da velocidade P, com a equação 4.2.4 e os parâmetros
a = 0.3095 e b = 0.25; (f) a velocidade S foi estimada, também a partir da velocidade
P, com a equação 4.2.31 e os parâmetros m = 1.16 + .00001z e c = 1360, sendo que
a alteração no parâmetro m foi introduzida para reproduzir a tendência de a razão de
Poisson de arenitos se tornar constante nas grandes profundidades; (g) a porosidade variou
de acordo com a equação 4.2.6; (h) as saturações de óleo (300 API) e de gás (densidade
relativa de 0.7) foram iguais a 90%. A linha de folhelhos (mudrock line) foi obtida com
os parâmetros originais da fórmula de Castagna et al. (1985).
A Figura 4.13 é ilustrativa do fato de que, em uma bacia sedimentar predominante-
mente clástica, sem cimentação, a compactação faz com que o aumento da velocidade P
com a profundidade tenda a ser acompanhado por uma redução na razão de Poisson, já
que, em função da expulsão da água e do rearranjo das partı́culas de rocha, o aumento
do módulo de rigidez tende a ser proporcionalmente mais acentuado do que a redução
da compressibilidade bulk. Nestas circunstâncias, a troca de água por petróleo introduz
uma forte anomalia, na medida em que um reservatório saturado de petróleo tende a
apresentar velocidade P (ou impedância acústica) compatı́vel com uma rocha mais nova,
enquanto a correspondente razão de Poisson é compatı́vel com uma rocha mais antiga.
No que diz respeito à velocidade S, observa-se que, em concordância com a redução da
razão de Poisson mencionada acima, a velocidade S cresce de forma proporcionalmente
mais pronunciada do que a velocidade P. Por outro lado, a substituição da água de
formação por petróleo pouco afeta a velocidade S. O leve crescimento observado é devido
à redução na densidade (ver a equação 4.2.22). Estas são caracterı́sticas parcialmente
responsáveis pelo fato de o petróleo tender a introduzir alteração mais pronunciada na
razão de Poisson do que na impedância acústica.
A mais óbvia aplicação destas idéias consiste em se obter indicadores sı́smicos da pre-
sença de petróleo, ou de tipos litológicos, indicadores estes que se baseiam em desvios
das propriedades elásticas, em relação aos valores esperados. Fortuitamente, os compo-
nentes de freqüência tı́picos desses desvios são compatı́veis com a banda de freqüência
disponı́vel nos dados sı́smicos, na medida em que correspondem a feições verticalmente
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 499

0.45

0.40
W
Razão de Poisson

0.35
O

0.30 G

0.25

0.20

1500 2000 2500 3000 3500 4000 4500 5000


Velocidade P (m/s)

3000

2500
Velocidade S (m/s)

2000

1500
G
W
1000
O
500
1500 2000 2500 3000 3500 4000 4500 5000
Velocidade P (m/s)

Figura 4.13: Relação entre velocidade de ondas compressionais


(P), razão de Poisson e velocidade de ondas cisalhantes (S), no caso
de um conjunto de arenitos representativos, antes (W ) e depois da
substituição da água de formação por óleo (O) e gás (G). As curvas
tracejadas representam a linha de folhelhos (mudrock line). Não
foi levado em conta o efeito de uma eventual cimentação.

localizadas. Por outro lado, de acordo com a discussão apresentada no item 3.7, sabe-se
que é substancialmente simples a obtenção de estimativas dos parâmetros de AVO, os
quais representam combinações dos parâmetros elásticos básicos e, portanto, possibilitam
a obtenção dos indicadores desejados.
500 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

A tendência de fundo e as anomalias de AVO


Na forma convencional da análise de AVO, utilizam-se dados sı́smicos constituı́dos de
valores de interseção, Ā, e de gradiente, B̄, definidos através da equação 3.7.2, ou seja,

r̂t (θ̄) ∼
= Ā + B̄ sen 2 θ̄ (4.3.1)

onde Ā e B̄ são coeficientes obtidos numericamente através da técnica discutida no Apên-


dice A.4, a qual é aplicada às estimativas dos coeficientes de reflexão r̂t (θ̄), representadas,
para cada ı́ndice de tempo t, em função do quadrado do seno do ângulo de incidência,
sen 2 θ̄.
De acordo com a equação 4.3.1, a interseção, Ā, e o gradiente, B̄, são considerados
aproximações de A e B, na forma das seguintes expressões, baseadas nas equações 2.6.34,
2.6.36 e 2.6.40:  
∼ 1 ∆vP ∆ρ ∼
Ā = A = + = r(0) (4.3.2)
2 v̄P ρ̄
e    
∆v 1 + k ∆ρ
B̄ ∼
=B =A−k S
+ (4.3.3)
v̄S 2k ρ̄
ou  
∼ 1 − k ∆vP ∆σ
B̄ = B = −kA + + (4.3.4)
2 v̄P (1 − σ̄)2
onde vP é velocidade de onda compressional, vS é velocidade de onda cisalhante, ρ é
densidade e σ é razão de Poisson. A barra sobre as mesmas variáveis indica que se trata
de uma média envolvendo os dois meios responsáveis pela interface. Por sua vez, k é
definido por 1 
− σ̄ v̄ 2
k=4 2
= 4 2S (4.3.5)
1 − σ̄ v̄P
Percebe-se, na equação 4.3.4, que o termo explicitamente dependente da velocidade
tende a ter sua influência restrita às situações em que k é diferente de 1. A este respeito,
sabe-se que, em bacias sedimentares tı́picas, a razão de Poisson oscila normalmente entre
0.25 e pouco acima de 0.4, fazendo com que o parâmetro k oscile em torno de 1, variando
entre pouco acima de 4/3 e pouco abaixo de 2/3. Esta é a razão que tem levado muitos
autores a fixar o valor de k em 1, o que permite transformar a equação 4.3.4 na seguinte
aproximação (ver, por exemplo, Verm e Hilterman, 1995):
∆σ
=B∼
B̄ ∼ = −A + (4.3.6)
(1 − σ̄)2
Nesta forma, o gradiente é uma combinação entre uma aproximação do coeficiente de re-
flexão na incidência normal, A, e um termo correspondente a uma hipotética refletividade
restrita à razão de Poisson.
Levando em conta que o aumento na velocidade P é normalmente acompanhado pela
redução na razão de Poisson, conclui-se que o comportamento esperado para A e B é tal
que, quando A é positivo, B é negativo, e vice-versa, o que pode ser percebido através de
uma análise das equações 4.3.4 e 4.3.6. Caracteriza-se assim uma anti-correlação entre
as funções A e B. Para avaliar de forma mais direta — e quantitativa — a relação
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 501

entre as duas funções, evitando parte das aproximações que permitiram a obtenção da
expressão 4.3.6, é necessário aprofundar o enfoque estatı́stico, para o quê se faz uso das
expressões 4.2.4 e 4.2.31, obtidas por Gardner et al. (1974) e Castagna et al. (1985).
Levando em conta que, com base na primeira delas, ∆ρ/ρ̄ ∼ = b∆vP /v̄P e, com base na

segunda, ∆vP /∆vS = m, obtêm-se as seguintes relações:
∆vP ∼ 2A ∆ρ ∼ 2Ab ∆vS ∼ 1 v̄P 2A
= , = e = (4.3.7)
v̄P 1+b ρ̄ 1+b v̄S m v̄S 1 + b
onde, nas versões originais, b e m são iguais, respectivamente, a 0.25 e 1.16. Estas relações
possibilitam, a partir da equação 4.3.3, obter a seguinte aproximação (ver Castagna et al.,
1998):   
∼ A 2 v̄P
B= 1−k +b (4.3.8)
1+b m v̄S
Em alguns casos, pode-se considerar aproximadamente constante a razão v̄ P /v̄S . Esta
caracterı́stica implica dizer que, na expressão 4.2.31, o parâmetro c é igual a zero e,
portanto, m é igual a v̄P /v̄S . Criam-se, assim, condições para estabelecer a seguinte
relação:
A
B∼= [1 − k(2 + b)] (4.3.9)
1+b
ou, para b = 0.25,  
4A 4.5 − 9σ̄
B∼= 1− (4.3.10)
5 1 − σ̄
Observe-se, na primeira expressão, que, se k = 1, B = −A.
Com base nas expressões 4.3.8 a 4.3.10, conclui-se que as reflexões correspondentes ao
topo e à base das litologias Gardner-Castagna apresentam, no que diz respeito à relação
entre A e B, um padrão linear bem definido, o qual recebe, na literatura especializada,
a denominação “tendência de fundo” (em inglês, background trend ). Matematicamente
este conceito é resumido por
B = gA (4.3.11)
De acordo com este resultado, induz-se que, em um gráfico em que se representam os
valores de B em função de A, as reflexões devem aparecer distribuı́das na forma de uma
nuvem de pontos alinhada de acordo com a declividade g.
Analisando-se a expressão 4.3.8, conclui-se que, para b = 0.25, m = 1.16 e v̄P /v̄S ≤ 7,
o termo entre colchetes é negativo. Considerando que estas são condições realistas, pode-
se afirmar que a declividade g tende a ser uma grandeza negativa. Para avaliar a validade
desta afirmação em outro contexto, considere-se a equação 4.3.10. Neste caso, percebe-se
que valores positivos de g ocorrem apenas quando a razão de Poisson σ̄ suplanta 0.44.
Observe-se que esta condição — ou a de que v̄P /v̄S ≥ 7 — tende a se restringir, em bacias
sedimentares tı́picas, às camadas próximas do fundo do mar.
Sabe-se que a tendência de fundo é um conceito definido na ausência de petróleo,
uma vez que esta foi a condição em que as expressões 4.2.4 e 4.2.31 foram obtidas. A
pergunta que se faz agora é: o que acontece com os valores de A e B, correspondentes aos
coeficientes de reflexão que caracterizam o topo e a base de um reservatório, se a água
que o reservatório contém for substituı́da por petróleo? De acordo com a Figura 4.13 e
a teoria discutida no item 4.2, sabe-se que esta substituição leva às seguintes alterações:
502 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

(1) a impedância acústica do reservatório torna-se menor do que a original; (2) a razão
de Poisson da rocha também se torna menor do que a original e; (3) a redução no valor
da razão de Poisson tende a ser proporcionalmente maior, particularmente no caso do
gás. Uma vez que as propriedades da rocha encaixante não são alteradas, a equação 4.3.6
permite prever as seguintes tendências:

AHC − AW < 0
TOPO (4.3.12)
BHC − BW ≤ 0
e 
AHC − AW > 0
BASE (4.3.13)
BHC − BW ≥ 0
onde os subscritos HC e W indicam a presença de petróleo e de água, respectivamente.
Na Figura 4.14, pode-se ver um exemplo dos deslocamentos descritos pelas expressões
4.3.12 e 4.3.13, no caso em que se substitui água por óleo em um conjunto de arenitos
representativos. Observe-se que o resultado desses deslocamentos pode ser caracterizado
como um conjunto de anomalias, uma vez que os novos pares (A, B) situam-se afastados
da reta que caracteriza a tendência de fundo. É fácil induzir que a dimensão de cada
um desses afastamentos e, portanto, da correspondente anomalia, depende, entre outros
fatores, das caracterı́sticas do tipo de petróleo que satura a rocha. Em particular, uma
anomalia mais expressiva seria observada na Figura 4.14 se o petróleo fosse gás.
É evidente, na Figura 4.14, o fato de que as anomalias obtidas poderiam ser separadas
em diferentes categorias, em função da relação entre os correspondentes valores de A e B.
Esta é a base da proposta de Rutherford e Williams (1989), que criaram as três primeiras
classes de anomalia de AVO. Castagna e Swan (1997) introduziram uma quarta classe e,
na Petrobrás, diagnosticou-se em 1998 a conveniência de se acrescentar uma quinta classe,
denominada 3.5. As cinco classes de anomalia, válidas para reflexões correspondentes
ao topo dos reservatórios, são representadas graficamente na Figura 4.15 e podem ser
descritas da seguinte forma:
1. Classe 1 – A positivo e B negativo, impedância acústica mais alta do que a da
rocha encaixante. São tı́picas de regiões onde ocorrem folhelhos com impedância
acústica anomalamente baixa. Normalmente, aparecem como números positivos em
seções sı́smicas empilhadas. Podem fazer com que se criem dim-spots nas mesmas
seções, se o valor de B for negativo o suficiente para levar à troca de polaridade ao
longo do lanço e, no empilhamento, a uma soma próxima de zero.
2. Classe 2 – Módulo de A próximo de zero e B negativo, impedância acústica re-
lativamente igual à da rocha encaixante. Nas seções empilhadas, correspondem a
anomalias negativas e podem ser confundidas com as da classe 3. São geradas em
reservatórios que, saturados de água, tendem a apresentar impedância acústica mais
alta do que a das rochas encaixantes.
3. Classe 3 – Valores negativos de A e B, impedância acústica mais baixa do que a da
rocha encaixante. Correspondem a feições que, em geral, aparecem bem nas seções
empilhadas, onde se mostram mais anômalas do que nas seções A. São geradas
em reservatórios que, saturados de água, tendem a apresentar impedância acústica
similar à das rochas encaixantes. Na Figura 4.12, pode-se ver um exemplo deste
tipo de anomalia.
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 503

0.20
0.2

0.10
0.1
B

−0.10
−0.1

−0.20
−0.2

−0.15 −0.10
−0.1 −0.05 0 0.05 0.10
0.1 0.15
A
Figura 4.14: Comportamento dos parâmetros A e B antes e depois da
substituição de água por óleo em um conjunto de arenitos encaixados em
folhelhos. O sı́mbolo • corresponde ao topo ou base do arenito saturado
de água, enquanto o quadrado e o losango identificam, respectivamente,
as posições do topo e da base, após a substituição por óleo. Como
referência, o quadrado e o losango preenchidos correspondem ao topo e à
base de uma mesma camada de arenito, saturada de óleo. Os parâmetros
básicos do meio são: v̄P = 2845m/s, ρ̄ = 2.26g/cm 3 e v̄S = 1280m/s. As
propriedades dos fluidos são as mesmas listadas na Tabela 4.1 (página
483).

4. Classe 3.5 – Valores de A negativos e B próximos de zero, impedância acústica


mais baixa do que a da rocha encaixante. Nesta classe de anomalia, a amplitude,
no traço sı́smico empilhado, é proporcional a A. São geradas em reservatórios que,
saturados de água, tendem a apresentar impedância acústica um pouco mais baixa
do que a das rochas encaixantes.

5. Classe 4 – Valores negativos de A e positivos de B, impedância acústica bem mais


baixa do que a da rocha encaixante. São geradas em reservatórios que, saturados
de água, tendem a apresentar impedância acústica mais baixa do que a das rochas
encaixantes.

A aplicação prática desses conceitos é baseada nas aproximações descritas pelas ex-
pressões 4.3.2 e 4.3.4, o que implica substituir A pela interseção, Ā, e B pelo gradiente,
B̄. No processo, é comum a construção de gráficos similares ao da Figura 4.14, para o
quê as estimativas sı́smicas de Ā e B̄, em uma mesma posição espacial, são transforma-
das em coordenadas de um gráfico cartesiano, o que caracteriza um gráfico cruzado (em
inglês, um crossplot). De acordo com esta técnica de representação dos dados sı́smicos,
desenvolvida no final dos anos 80, pode-se estabelecer a distribuição estatisticamente re-
presentativa dos parâmetros Ā e B̄ e, a partir daı́, a caracterização das anomalias de
504 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

0.20
II I

0.10

Te
Classe 4

nd
0.02

ên
ci
Classe 3.5
B

a
de
−0.02

fu
nd
o
−0.10 Classe 3 Classe 2

III Classe 1 IV
−0.20
−0.20 −0.10 −0.02 0.02 0.10 0.20
A
Figura 4.15: Classes de anomalias de AVO no plano AB (modifi-
cado de Castagna et al., 1998). Os algarismos romanos identificam
os quadrantes. Observação: em dados reais, a orientação e a lar-
gura da região que define a tendência de fundo são estatisticamente
estimadas com base na equação 4.3.11.

AVO atribuı́das ao petróleo.


Para ilustrar a discussão, preparou-se a Figura 4.16, na qual as retas tracejadas,
que definem a tendência de fundo, foram obtidas com base na minimização da distância
entre elas e cada ponto dos gráficos respectivos. Os valores de A e B foram calculados
a partir dos perfis, enquanto os de Ā e B̄ foram estimados com o algoritmo descrito
no Apêndice A.4, aplicado a dados sı́smicos sintéticos. O padrão “lemniscata” obtido é
devido à atenuação das altas freqüências.
Um aspecto importante da Figura 4.16 é o fato de que, com relação às retas que
definem a tendência de fundo, o topo e a base do reservatório se destacam mais no
gráfico de interseção e gradiente do que no de A e B. A razão para esta diferença pode
ser inferida a partir da equação 3.7.5 e da Figura 3.61 (página 445), ou seja, a estimativa
do gradiente foi contaminada pelo termo C da equação 2.6.33, o qual é normalmente
desprezado no processo de cálculo do gradiente. Ou seja, trata-se de uma anomalia de
AVO não linear que não seria observada com a mesma nitidez no plano ĀB̄, fosse o
máximo ângulo de incidência inferior a 200 . Observe-se ainda o fato de que anomalias
deste tipo tendem a se enquadrar na classe 3, ou 3.5.
A discrepância entre os dois gráficos da Figura 4.16 pode ser parcialmente contornada,
sem reduzir a faixa de ângulos de incidência usada no processo. Para isto, faz-se uso da
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 505

0.06
.06

0.04
.04

0.02
.02
B

−0.02
−.02

−0.04
−.04

−0.06
−.06
−0.06
−.06 −0.04
−.04 −0.02
−.02 0 0.02
.02 0.04
.04 0.06
.06
A
0.06
.06

0.04
.04

0.02
.02
Gradiente

−0.02
−.02

−0.04
−.04

−0.06
−.06
−0.06
−.06 −0.04
−.04 −0.02
−.02 0 0.02
.02 0.04
.04 0.06
.06
Interseção

Figura 4.16: Gráfico cruzado dos parâmetros A e B (no alto) e de


interseção e gradiente (embaixo), gerados com os mesmos dados usados
na construção da Figura 3.60 (página 444). Os pontos destacados cor-
respondem aos tempos 382 a 399ms, ou seja, entre o topo e a base de um
arenito saturado de óleo. As retas tracejadas representam a tendência
de fundo. Máximo ângulo de incidência: 40 graus. Pulso sı́smico: filtro
passa-banda de 8-40Hz.

melhor qualidade das técnicas ABC e ĀD̄, discutidas no item 3.7 e no Apêndice A.4.
A aplicação da primeira técnica é imediata, uma vez que uma boa estimativa de B faz
parte do processo. Já no caso da segunda técnica, recorre-se à igualdade B = A + D e à
506 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

seguinte versão da expressão proposta por Fatti et al. (1994):

r(θ̄) ∼
= Ā(1 + tan 2 θ̄) + D̄ sen 2 θ̄ (4.3.14)

onde Ā e D̄ são coeficientes obtidos numericamente, à semelhança da interseção e do


gradiente. No primeiro parâmetro, aplica-se a expressão 4.3.2, enquanto que, no segundo,
tem-se a seguinte aproximação (ver a Tabela 2.1, na página 181):
   
∼ ∆vS 1 + k ∆ρ
D̄ = D = B − A = −k + (4.3.15)
v̄S 2k ρ̄
ou  
k−1 ∆ρ ∆σ
D̄ ∼
= D = B − A = −2kA + + (4.3.16)
2 ρ̄ (1 − σ̄)2
onde k é dado pela equação 4.3.5.
A estimativa de B, feita com base na aproximação B ∼ = Ā + D̄, é superior à da
interseção convencional, o que representa um resultado natural do fato de que, para uma
faixa de ângulos de incidência relativamente ampla, a equação 4.3.14 é mais precisa do
que a 4.3.1. Na mesma linha, levando ainda em conta a relação B = A + D, pode-se
aplicar o conceito de tendência de fundo também à equação 4.3.14. Isto é feito usando-se
as relações 4.3.7, as quais permitem transformar a equação 4.3.15 na seguinte expressão:
   
∼ 2kA 1 v̄P 1+k
D=− + b (4.3.17)
1 + b m v̄S 2k

ou, no caso em que m = v̄P /v̄S ,


   
∼ 2kA 1+k
D=− 1+ b (4.3.18)
1+b 2k

A partir destes resultados, a tendência de fundo passa a ser matematicamente definida


por
D = hA (4.3.19)
Ou seja, em um gráfico em que se representam os valores de D em função de A, as
reflexões devem aparecer distribuı́das na forma de uma nuvem de pontos alinhada de
acordo com a declividade h.
Se o meio for realmente do tipo Gardner-Castagna, pode-se dizer que a declividade h é
uma grandeza sempre negativa. Nas mesmas condições, uma inspeção das equações 4.3.17
e 4.3.18 permite induzir que a mesma declividade deve oscilar em torno de −2. Por outro
lado, combinando-se a expressão 4.3.17 com a 4.3.8, conclui-se que h = g−1+(1−k)b/2 ∼ =
g − 1. Reforça-se assim a idéia de que a declividade g é uma grandeza negativa.

Atributos de AVO
O leitor deve ter observado na Figura 4.16 que, entre os pontos associados à presença
de petróleo, alguns são caracterizados por uma grande distância até a nuvem de pontos
estatisticamente representativa, ou seja, até a reta que define a tendência de fundo. À
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 507

parte fenômenos de interferência, os mais afastados, nos quadrantes III (ou IV) e I, cor-
respondem, respectivamente, ao topo e à base do reservatório. Para fazer uso exploratório
desta caracterı́stica, é conveniente o recurso aos chamados atributos de AVO, os quais
são normalmente apresentados na forma de uma seção (ou volume), computada a partir
de dados sı́smicos adequadamente processados.
Historicamente, o primeiro atributo de AVO foi o fator de fluido (Smith e Gidlow,
1987). Para defini-lo, leva-se em conta que os eventos situados ao longo da tendência
de fundo apresentam comportamento compatı́vel com a igualdade ∂vP /∂vS = m, obtida
a partir da expressão 4.2.31. Discretizando-se essa igualdade e multiplicando ambos os
lados pela razão v̄S /v̄P , criam-se condições para definir da seguinte forma o fator de fluido:

∆vP v̄ ∆vS
FF = −m S (4.3.20)
v̄P v̄P v̄S

onde, como antes, pode-se atribuir o valor 1.16 a m.


Percebe-se, na expressão 4.3.20, que o fator de fluido representa a diferença entre o
valor obtido e o esperado para ∆vP /v̄P . Em termos explı́citos, é função da diferença
entre a variação relativa na velocidade P e uma versão ponderada da variação relativa
na velocidade S, diferença esta que é igual a zero, se o evento analisado estiver situado
sobre a reta que define a tendência de fundo. A interpretação desse conceito é quase
imediata, desde que se considere a teoria discutida no item 4.2 e se analise a Figura 4.13.
Ou seja, a redução na velocidade P e o ligeiro aumento na velocidade S, introduzidos
pela substituição de água por petróleo, geram uma anomalia que, nos termos do fator de
fluido, FF , é negativa no topo e positiva na base da camada envolvida.
O fator de fluido pode também ser escrito de forma explicitamente dependente dos
parâmetros A e B, ou A e D, sem qualquer aproximação adicional. O resultado é:
   
v̄S ∆vS k − 1 ∆ρ
FF = A + B} + k − m + (4.3.21)
| {z v̄P v̄S 2 ρ̄
2A+D | {z }
R

Observe-se que, no uso do fator de fluido como um DHI, o termo R torna-se pouco
importante, uma vez que a velocidade S não é muito influenciada pelo petróleo e, além
disso, os termos entre parênteses tendem a apresentar módulos pequenos. Esta observação
leva à definição do seguinte atributo de AVO:

FAD = A + B = 2A + D (4.3.22)

Nesta forma, tem-se um atributo similar ao fator de fluido, mas que não exige o uso de
parâmetros adicionais.
Um atributo da mesma famı́lia do fator de fluido é o “desvio ortogonal”, FDO , o
qual é definido, no plano AB, pela distância mais curta entre cada amostra e a reta que
caracteriza a tendência de fundo. Neste caso, o primeiro passo do processo envolvido
em sua computação consiste em estimar os parâmetros que definem a mesma reta, como
se fez na geração da Figura 4.16. Em seguida, calcula-se a distância que caracteriza o
atributo e se aplica a ele uma convenção de sinal equivalente à do fator de fluido.
A expressão algébrica que define o desvio ortogonal, FDO , pode ser deduzida através
da Figura 4.17, na qual se observa a seguinte relação: |FDO | = DO = |(B1 − gA1 ) cos β|,
508 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

gA1

O
B=
β gA

B1
D
α

B=0
0
A1

A=0
0
Figura 4.17: Geometria envolvida na dedução da ex-
pressão que define o desvio ortogonal, no caso particular
de uma anomalia de classe 4. A reta tracejada, que define a
tendência de fundo, obedece à equação B = gA.

onde g é a declividade da tendência de fundo, ou seja, g = tan α. Considerando que


cos β = − cos α, obtém-se a seguinte expressão para o mesmo atributo14 , válida quando
g < 0:
r
1
FDO = (B − gA) (4.3.24)
1 + g2

De acordo com as equações 4.3.11 e 4.3.24, um evento situado em qualquer posição


da reta que caracteriza a tendência de fundo apresenta um valor de desvio ortogonal
igual a zero, independentemente dos valores de A e B, ou dos coeficientes de reflexão
correspondentes. Em contrapartida, os eventos que mais se distanciam da tendência
de fundo, associados a rochas potencialmente portadoras de petróleo, ou a litologias
anômalas, apresentam valores expressivos de desvio ortogonal.
Analisando-se a igualdade B = A+D, percebe-se que o deslocamento introduzido pelo
petróleo no parâmetro B é predominantemente devido à variação no parâmetro A, uma
vez que a velocidade S é pouco afetada pela saturação de petróleo e, em conseqüência, a
diferença DHC − DW é próxima de zero15 . Nestas condições, pode-se definir um atributo
de AVO correspondente a uma medida do afastamento de A, em relação ao valor esperado,
14
Se a reta que define a tendência de fundo não passar pela origem (A = B = 0), há necessidade de
substituir a expressão 4.3.24 por
r
1
FDO = (B − B0 − gA) (4.3.23)
1 + g2

onde B0 é a interseção da mesma reta com o eixo B.


15
Ressalte-se entretanto que, para valores de AW muito diferentes de zero, esta diferença tende a ser
positiva para AW > 0 e negativa para AW < 0, uma vez que, nestes casos, a velocidade S é um pouco
mais afetada pela presença de petróleo.
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 509

o qual é dado, a partir da equação 4.3.19, por D/h. O resultado é:

D
Fh = A − (4.3.25)
h

onde, em termos práticos, a declividade h é estimada numericamente através da mini-


mização da distância entre cada par (A, D) e a reta que define a tendência de fundo,
caracterizada neste caso pela expressão D = hA.
Outro atributo, até certo ponto equivalente a Fh , baseia-se no fato de que, na expressão
4.3.15, o termo (1 + k)/2k é aproximadamente igual a 1 (0.83 para σ̄ = 0.2 e 1.25 para
σ̄ = 0.4). Neste caso, torna-se possı́vel estimar um parâmetro diretamente baseado no
efeito do fluido sobre a variação nas velocidades P e S, definido por16 ,

D
rP − r S ∼
=A+ (4.3.26)
2k

onde rP = A e rS é a aproximação do que se poderia denominar um pseudo-coeficiente


de reflexão S, ou seja,  
1 ∆v ∆ρ
rS ∼= S
+ (4.3.27)
2 v̄S ρ̄
Os atributos apresentados até agora apresentam marcante similaridade, principal-
mente ao se levar em conta que: (1) B = A + D; (2) h tende a não ser muito diferente
de −2 e; (3) g ∼ = h + 1. Para deixar mais clara esta observação, construiu-se a Tabela
4.3, na qual os diferentes atributos foram escritos de forma a enfatizar a semelhança
entre eles. Observe-se que esta semelhança torna-se ainda mais acentuada quando: (a) o
desvio ortogonal é substituı́do
p pelo desvio vertical, o qual é definido pela equação 4.3.24
sem a divisão pelo fator 1 + g 2 ; (b) Fh é calculado de forma relativa, sem a divisão
por −h e; (c) rP − rS é também calculado de forma relativa, sem a divisão por 2k. A
mesma semelhança leva à indução de que, em termos práticos, o desvio ortogonal (ou
vertical) e os fatores FAD e Fh são mais facilmente aplicáveis, uma vez que se baseiam
em parâmetros diretamente estimáveis.
Os parâmetros e atributos de AVO apresentam desdobramentos interessantes. Em
primeiro lugar, o caráter estatı́stico inerente ao desvio ortogonal favorece o seu uso como
um fator de ponderação dos dados resultantes do empilhamento, seja ele total ou parcial.
É exatamente esta a idéia que levou ao atributo DHIP (DHI da Petrobrás), o qual pode
ser empregado, por exemplo, para enfatizar anomalias das classes 2, 3 e 4, através da
multiplicação do desvio ortogonal, ou seu módulo, pelos dados resultantes do empilha-
mento dos traços sı́smicos correspondentes a altos ângulos de incidência, denominados F
(ver o item 3.7).
Os mesmos interseção e gradiente, usados na estimação do desvio ortogonal, são ele-
mentos básicos para o cálculo do chamado “produto”. Este é um atributo resultante
da anti-correlação, freqüentemente observada, entre os parâmetros A e B, ou seja, en-
quanto A é positivo, B tende a ser negativo, e vice-versa. A conseqüência imediata dessa
anti-correlação, expressa na equação 4.3.11 por um valor negativo de g, é o fato de que,
16
Uma alternativa de pior qualidade para o atributo rP − rS é dada por (A + B)/2, a qual se baseia
na aproximação rS ∼
= (A − B)/2.
510 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Fator de fluido - FF B+A+R 2A + D + R


Fator de fluido 2 - FAD B+A 2A + D
B − gA 2A + D − A(1 + g)
Desvio ortogonal - FDO p p
1 + g2 1 + g2
B − (1 + h)A −hA + D
Fh
−h −h
B + (2k − 1)A 2kA + D
rP − r S
2k 2k

Tabela 4.3: Alguns atributos de AVO, em função de A e B, ou


de A e D. Observe-se
p que, na faixa de freqüências sı́smicas, as
divisões por 1 + g 2 , −h e 2k, presentes nos atributos FDO , Fh
e rP − rS , podem representar uma simples mudança de escala.

ao longo da tendência de fundo, o produto A × B é negativo. Nestas condições, uma


anomalia de classe 3, para a qual tanto A quanto B são negativos, tende a ser destacada
na forma de um produto positivo com amplitude parcialmente controlada pela distância
até a reta que define a tendência de fundo.
Na Figura 4.18, vê-se o resultado do processo de determinação de quatro parâmetros
de AVO e dos atributos a eles relacionados, aplicado aos mesmos dados sintéticos usados
na construção da Figura 3.60 (página 444). Merece destaque na figura a semelhança
entre os atributos FAD e FDO , particularmente no que diz respeito ao arenito saturado de
óleo, que se situa entre os tempos de 382 e 399ms17 . Observe-se que, nos dois atributos,
os eventos correspondentes se destacam, aliás de forma consistente com a Figura 4.16.
O mesmo ocorre com o resultado do produto entre a interseção e o gradiente, o qual é
positivo tanto no topo quanto na base do arenito.
Ainda na Figura 4.18, percebe-se que a razão de Poisson da camada saturada de
óleo é similar à da rocha sobreposta, ou seja, no contato entre as duas, ∆σ ∼
= 0. Nestas
condições, pode-se perguntar porque a presença de óleo gera uma anomalia de AVO. Para
responder a esta pergunta, leva-se em conta que o atributo FAD pode ser definido por
 
∆vP 1 ∆ρ ∆σ
FAD = 2A + D = (1 − k) + + (4.3.28)
v̄P 2 ρ̄ (1 − σ̄)2
Com base neste resultado, conclui-se que a anomalia observada no topo do arenito é
gerada exclusivamente porque o valor de k, na mesma posição, é igual a 0.65 e, portanto,
diferente de 1. Neste caso, o valor do atributo FAD distancia-se de zero pelo fato de ser
descrito, aproximadamente, por .35∆vP /v̄P + .175∆ρ/ρ̄. Já no que diz respeito à base
17
Esta semelhança seria menor se a janela usada na estimação da declividade g tivesse comprimento
de 100 ou 200ms, em vez de 800ms. Em termos dos valores absolutos dos dois atributos, seria também
menor se a estimativa de B envolvesse ângulos de incidência na faixa entre 0 0 e 200 , ou se fosse obtida
através da técnica ABC. Uma comparação entre os dois gráficos cruzados da Figura 4.16, aliada à
análise da equação 3.7.5, permite entender a razão da última afirmação. Ou seja, o gradiente,
p B̄, foi
contaminado pelo parâmetro C, compensando parcialmente, no cálculo de FDO , a divisão por 1 + g 2 .
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 511

0
vP σ ρ

A −
D/2 −
A −
B FAD FDO P

200
Tempo (ms)

400

600

800

Figura 4.18: Perfis elásticos, juntamente com estimativas de


parâmetros e atributos de AVO, correspondentes aos dados sı́smicos
sintéticos usados na construção da Figura 3.60 (página 444). Dentre os
dois traços Ā, o situado à direita corresponde à interseção, enquanto o
situado à esquerda foi obtido com base na equação 4.3.14. Na estimação
do atributo FDO , usou-se uma única janela, de comprimento igual ao
dos traços. O sı́mbolo P refere-se ao produto entre a interseção, Ā, e o
gradiente, B̄. Máximo ângulo de incidência: 40 graus. Pulso sı́smico:
filtro passa-banda de 8-40Hz.

da camada saturada de óleo, a anomalia é reforçada em função do maior valor da razão


de Poisson da camada sotoposta.

Aplicação a dados sı́smicos invertidos


Os conceitos apresentados neste subitem admitem, em muitos casos com vantagem, a
utilização de dados sı́smicos invertidos. Para a aplicação da idéia, a opção mais simples
envolve a utilização da função et (θ̄), a qual corresponde à integração numérica adimensio-
nal da série de coeficientes de reflexão, ao longo do tempo, para cada ângulo de incidência,
na forma da equação 3.7.27. Em condições favoráveis, aplica-se ao caso a equação 3.7.28,
ou seja,
et (θ̄) ∼
= ĀI + B̄I sen 2 θ̄ (4.3.29)

onde ĀI é a interseção e B̄I é o gradiente, ambos estimados com base em regressão linear
aplicada à curva dos valores de et (θ̄), representada em função do quadrado do seno do
ângulo de incidência para cada ı́ndice de tempo t.
De acordo com a expressão 3.7.28, a interseção e o gradiente, ĀI e B̄I , podem ser
considerados aproximações de AI e BI , os quais são definidos pelas equações 3.7.18 e
3.7.19, ou 3.7.20. De acordo com a discussão apresentada no item 3.7, sabe-se que essas
aproximações são válidas nas mesmas condições em que se adotam as aproximações das
equações 4.3.2 e 4.3.3, ou 4.3.4. Nas mesmas circunstâncias, aplicam-se as seguintes
512 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

equações:  
1 v ρt
ĀI ∼
= AI = ln Pt + ln (4.3.30)
2 v P1 ρ1
e    
vS 1 + k̄ ρt
B̄I ∼
= BI = AI − k̄ ln t + ln (4.3.31)
v S1 2k̄ ρ1
ou  
1 − k̄ v Pt σt − σ 1
B̄I ∼
= BI = −k̄AI + ln + (4.3.32)
2 vP1 (1 − σt ) (1 − σ1 )
onde t é o ı́ndice da amostra e k̄ é o valor médio de k, o qual é definido pela equação
4.3.5.
Os parâmetros de AVO obtidos com dados sı́smicos invertidos apresentam uma im-
portante caracterı́stica: eles são grandezas proporcionais a combinações dos próprios
parâmetros elásticos. Segue-se daı́ a idéia de que o valor de um parâmetro em um dado
tempo, ou profundidade, é teoricamente independente das propriedades das rochas ver-
ticalmente vizinhas. Entretanto, se for levado em conta o limite inferior da faixa de
freqüências sı́smicas — tipicamente, 5 ou 6Hz —, conclui-se que os parâmetros de AVO
correspondem na verdade a uma variação, em relação a médias locais, dos parâmetros
absolutos. Ou seja, neste caso não existe um contraste elástico mas sim uma “variação
elástica”.
A ausência dos componentes de baixas freqüências tem outra importante implicação:
a possibilidade de, com base na linearidade envolvida nos processos de inversão, aplicar
a dados invertidos quase toda a lógica empregada na análise convencional de AVO, a
começar pelo conceito de tendência de fundo. Neste caso, assumindo-se que o meio seja
do tipo Gardner-Castagna, observa-se uma relação linear entre AI e BI , descrita pela
expressão BI = gI AI , onde gI é uma declividade que tende a ser igual a g e, por isto, a
ser negativa.
Outro aspecto a destacar é o fato de que, de acordo com a equação 4.3.31, o valor de
BI pode ser obtido a partir da estimativa de DI e da relação BI = AI + DI . No processo,
utilizam-se as seguintes expressões:

et (θ̄) ∼
= ĀI (1 + tan 2 θ̄) + D̄I sen 2 θ̄ (4.3.33)

e    
vS 1 + k̄ ρt
D̄I ∼
= DI = −k̄ ln t + ln (4.3.34)
v S1 2k̄ ρ1
onde ĀI + D̄I ∼
= BI .
Resta discutir os atributos de AVO estimados a partir de dados sı́smicos invertidos.
Do ponto de vista matemático, sua descrição pode ser obtida com base na Tabela 4.3,
bastando, para isto, substituir cada parâmetro de AVO convencional pelo correspondente
aos dados invertidos e levar em conta a relação DI = hI AI , onde hI é uma declividade
negativa. A tı́tulo de exemplo, o atributo FAD , aplicado a dados sı́smicos invertidos,
passa a ser definido por
 
v Pt 1 ρt σt − σ 1
FAD = 2AI + DI = (1 − k̄) ln + ln + (4.3.35)
v P1 2 ρ 1 (1 − σt )(1 − σ1 )
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 513

0.4
.4

0.3
.3

0.2
.2

0.1
.1
I
B

−0.1
−.1

−0.2
−.2

−0.3
−.3

−.5 −0.4
−.4 −.3 −0.2
−.2 −.1 0 .1 0.2
.2 .3 0.4
.4
AI
Figura 4.19: Gráfico cruzado dos parâmetros AI e BI , gerados com
os mesmos perfis usados na construção da Figura 3.60 (página 444).
Os pontos destacados correspondem aos tempos 382 a 399ms, ou seja,
entre o topo e a base de um arenito saturado de óleo. A reta tracejada
representa a tendência de fundo. Máximo ângulo de incidência: 40 graus.
Pulso sı́smico: filtro passa-banda de 8-40Hz.

Para ilustrar esta discussão, prepararam-se as figuras 4.19 e 4.20. Através de uma
comparação entre a primeira delas e a Figura 4.16, percebe-se uma importante carac-
terı́stica da análise de AVO aplicada a dados sı́smicos invertidos: uma vez que esse tipo
de dado é proporcional às próprias propriedades elásticas do meio, as correspondentes
anomalias de AVO associadas ao petróleo se restringem à região abaixo da reta que de-
fine a tendência de fundo. Ou seja, não existe mais um topo e uma base caracterizados
por eventos anômalos, mas sim a própria camada. Esta caracterı́stica torna-se mais clara
a partir de uma comparação entre as figuras 4.18 e 4.20. Observe-se, na segunda delas,
que a anomalia associada ao petróleo corresponde a valores exclusivamente negativos dos
atributos FAD e FDO .
Analisando-se a Figura 4.20, percebe-se uma boa correlação entre o perfil de razões
de Poisson e os atributos FAD e FDO , com exceção das posições onde existem importantes
anomalias acústicas, como é o caso do intervalo portador de óleo. Uma das razões para
este comportamento pode ser extraı́da da equação 4.3.35, na qual o termo (1 − k̄) tende
a reduzir a importância relativa da impedância acústica, de forma tão mais pronunciada
quanto mais próximo de 1 for o parâmetro k̄. Outra razão é o fato de que, na média, as
variações locais da razão de Poisson tendem a ser maiores do que a dos outros perfis 18 .
18
A este respeito, deve-se ressaltar que os três perfis foram apresentados de forma proporcional à
sua importância no cálculo dos parâmetros e atributos de AVO. Para isto, substituı́ram-se os valores
absolutos de vPt , ρt e σt pelas seguintes expressões, baseadas nas equações 4.3.30 e 4.3.32: .5 ln vPt /vP1 ,
(σt − σ1 )/[(1 − σt )(1 − σ1 )] e .5 ln ρt /ρ1 . A normalização final para a apresentação dos três perfis foi feita
514 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

0
vP σ ρ

AI −
DI /2 −
AI −
BI FAD FDO P

200
Tempo (ms)

400

600

800

Figura 4.20: Perfis elásticos, juntamente com estimativas de


parâmetros e atributos de AVO, correspondentes aos dados sı́smicos
sintéticos usados na construção da Figura 3.60 (página 444). Na apre-
sentação dos perfis, manteve-se o peso relativo de cada um deles. Dentre
os dois traços ĀI , o situado à direita corresponde à interseção, enquanto
o situado à esquerda foi obtido com base na equação 3.7.3. Na estimação
do atributo FDO , usou-se uma única janela, de comprimento igual ao dos
traços. O sı́mbolo P refere-se ao produto entre a interseção, ĀI , e o gra-
diente, B̄I . Máximo ângulo de incidência: 40 graus. Pulso sı́smico: filtro
passa-banda de 8-40Hz.

Até agora, assumiu-se que a análise de AVO, aplicada a dados sı́smicos invertidos, en-
volve freqüências superiores a 5 ou 6Hz, o que significa a impossibilidade lógica de se obter
valores absolutos dos parâmetros elásticos. Admitindo-se que os processos de inversão
tenham incluı́do uma estimativa dos componentes de baixa freqüência, a análise de AVO
pode se tornar muito semelhante à análise de perfis. Entretanto, os parâmetros elásticos
resultantes da inversão somente são representativos quando submetidos a correções e ca-
libração com base em dados de poços. Este é o caso do atributo IP − IS (impedância P
menos a pseudo-impedância S), gerado a partir da versão de banda ampliada do atributo
rP − rS . É também o caso do atributo λρ, ou IP2 − 2IS2 , gerado de forma similar19 .

4.3.3 Aspectos práticos da análise de AVO


Do ponto de vista da aplicação rotineira, a discussão sobre a análise de AVO exige a
separação em dois temas: processamento e análise propriamente dita, ou interpretação.
Trata-se de uma conseqüência lógica do fato de que dados mal processados podem invali-
dar qualquer esforço de análise, por mais bem feito que seja. Neste subitem, discutem-se

com base nas velocidades P.


19
À semelhança do fator de fluido, ambos os atributos se baseiam na idéia de que o petróleo aumenta
muito pouco a velocidade S, ao mesmo tempo em que reduz a impedância acústica.
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 515

esses dois temas, juntamente com a relação entre AVO e bright-spots em dados sı́smicos
empilhados.

Processamento
No processamento voltado para a análise de AVO, um tema crı́tico é o tratamento da
assinatura, uma vez que toda a teoria envolvida assume que a fase dos traços sı́smicos
é exclusivamente devida aos coeficientes de reflexão. Ou seja, se a fase do pulso sı́smico
residual, presente nos dados a analisar, não for virtualmente nula, os resultados podem
ser desastrosos. Dentre os processos que visam evitar este problema, um dos que exigem
preocupação especial é a compensação Q, em parte porque a correção da dispersão varia
com o tempo, em parte porque esta correção ainda não representa um tema teoricamente
consolidado. Reforça-se neste caso a necessidade de calibração com os dados de poços.
Outro aspecto fundamental é a correção dos fatores de caráter geométrico que inter-
ferem na distribuição das amplitudes em função do ângulo de incidência. Em particular,
não se admite que estejam presentes nos dados sı́smicos efeitos como o ilustrado através
da Figura 2.25, na página 115. Para corrigi-los, o processo mais efetivo é a migração pré-
empilhamento, preferencialmente em três dimernsões, a qual é particularmente essencial
no caso em que as feições geométricas são localizadas, tanto no tempo quanto no espaço.
Relacionada também à migração pré-empilhamento está a correção de NMO, a qual
representa uma etapa implı́cita do processo. Neste caso, dois temas se destacam: (1)
o NMO residual e; (2) o efeito de estiramento. O segundo tema pode não representar
um fator crı́tico para a forma convencional da análise de AVO, embora há quem procure
corrigi-lo sistematicamente. Já o primeiro é fundamental, uma vez que os resı́duos de
NMO podem introduzir significativas distorções de fase e gerar, destruir ou modificar
anomalias de AVO. É esta uma das caracterı́sticas que favorecem a análise de AVO base-
ada em empilhamentos parciais, em especial na forma de mapas (ver discussão adiante).
No que diz respeito à amplitude, os algoritmos de processamento afetam a análise
de AVO de forma controlada pela dimensão das anomalias. Em particular, os proces-
sos que não corrijam adequadamente — ou até mesmo deformem — a distribuição das
amplitudes tornam-se crı́ticos apenas quando envolvem perı́odos relativamente curtos, da
mesma ordem ou pouco maiores do que os das anomalias de AVO. Isto significa, por
exemplo, que uma correção inadequada do espalhamento geométrico — um processo que,
normalmente, envolve longos perı́odos — pode não destruir nem criar anomalias de AVO
mas, tão somente, introduzir um fator de escala e afetar sua classe no plano AB. Uma
abordagem estatı́stica para a análise de AVO poderia facilmente contornar este problema.
Ressalte-se entretanto que a mesma idéia não se aplica a qualquer processo de tratamento
de fase, ainda que este também envolva longos perı́odos.
Na obtenção dos parâmetros de AVO, é conveniente a utilização de empilhamentos
parciais, os quais são muito úteis na interpretação. Em sua geração, pode-se optar por
dividir os dados sı́smicos por faixa de afastamentos fonte-receptor ou por faixa de ângulos
de incidência. Embora a segunda opção seja teoricamente mais indicada, ela esbarra em
uma dificuldade importante: nem sempre a faixa nominal de ângulos de incidência coin-
cide com a efetivamente disponı́vel, o que ocorre com freqüência nos ângulos maiores 20 .
20
Deve-se ainda ter em mente a situação em que os afastamentos fonte-receptor são acentuados o
suficiente para, pontualmente, se atingir ou ultrapassar o ângulo crı́tico. A menos que uma técnica
516 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Esta dificuldade não existe na segunda opção, a qual apresenta outra vantagem: fazendo
com que o número de traços de todas as faixas escolhidas seja igual, garante-se que a
correspondente razão sinal-ruı́do seja pelo menos semelhante (ver o Apêndice A.4).
Considere-se agora a computação do desvio ortogonal, para o qual uma etapa crı́tica
é a determinação da declividade g da reta que define a tendência de fundo. Para isto,
aplica-se regressão linear sobre um conjunto representativo de valores de interseção e
gradiente21 , buscando minimizar a distância entre cada ponto e a reta que se deseja
estimar. A opção por esta técnica, que é diferente da regressão linear convencional, é
justificada pelo fato de que o desvio ortogonal, como sugere o nome, envolve a menor
distância de cada par (A, B) e a reta que define a tendência de fundo.
Os ruı́dos aleatórios influenciam a computação da declividade g de uma forma peculiar,
digna de registro. Para apresentar a idéia, considere-se que exista nos dados sı́smicos
apenas ruı́do aleatório com média igual a zero. Neste caso, os correspondentes traços
Ā e B̄ apresentariam correlação negativa, o que se pode deduzir através de uma análise
baseada no resultado 2 da Tabela 1.6 (página 39) e nas equações A.4.10 e A.4.11. Em
conseqüência, a declividade da reta que define a tendência de fundo, computada com
base nos mesmos traços, seria também negativa. Isto significa que, na presença de ruı́do
aleatório, uma declividade negativa pode não ser exclusivamente devida à anti-correlação
teórica entre os parâmetros A e B.
Toda esta argumentação é também válida para a análise de AVO aplicada a dados
sı́smicos invertidos, desde que a banda de freqüências disponı́veis tenha um limite inferior
acima de zero. Quando a inversão objetiva a obtenção de valores absolutos dos parâmetros
elásticos, o nı́vel de exigência quanto à qualidade do resultado é naturalmente mais alto,
até porque envolve informações não contidas nas amplitudes (ver o item 3.7).

Interpretação e análise
Admitindo-se que os dados sı́smicos apresentem as caracterı́sticas de amplitude e fase
adequadas para a análise de AVO, pode-se perguntar se a banda de freqüências resultante
do processamento permite a identificação segura das anomalias. A este respeito, deve-se
considerar que, nem sempre, a presença de um espectro de amplitude amplo favorece
esta tarefa. Um exemplo pode ser extraı́do de uma comparação entre as figuras 4.21
e 4.16. Observe-se que, no plano AB, o topo do reservatório saturado de óleo é mais
visı́vel no gráfico cruzado gerado com dados de mais baixa freqüência, enquanto o oposto
ocorre com a base. Estas são caracterı́sticas explicadas pelos fenômenos de interferência
inerentes ao método sı́smico e que certamente não podem ser generalizadas, tornando
obrigatória uma análise caso-a-caso.
A mesma idéia pode ser melhor avaliada através da Figura 4.22, na qual se vêem
diferentes versões do atributo FAD . Nos traços 1 a 3, obtidos sem inversão, percebe-se
que a base do reservatório é bem definida e que, ao nı́vel do topo, não se repetem, nas
freqüências mais altas, a anomalia presente na Figura 4.18. No que diz respeito aos

de inversão mais sofisticada seja utilizada, os dados sı́smicos obtidos nesta condição podem se tornar
imprestáveis para a análise de AVO.
21
Neste processo, deve-se garantir que a janela usada corresponda a uma representação adequada da
tendência de fundo. Na mesma linha, deve-se evitar que a estimativa do valor de g seja contaminada
pelo reservatório estudado, particularmente no caso em que a ele se associa uma forte anomalia.
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 517

0.06

0.04

0.02
B

−0.02

−0.04

−0.06
−0.06 −0.04 −0.02 0 0.02 0.04 0.06
A
Figura 4.21: Repetição do gráfico superior da Figura 4.16,
substituindo-se o filtro 8-40Hz por 8-60Hz e mantendo-se inalterados
os demais parâmetros.

traços que incluı́ram inversão, percebe-se que o reservatório se destaca nas três faixas de
freqüência usadas. Esta é uma conseqüência natural do fato de que ele já se destaca nos
perfis acústicos, em especial no perfil de velocidades P.
Comparando-se, na Figura 4.22, os resultados sem e com inversão, poder-se-ia advogar
a idéia de que a análise de AVO deveria sempre ser feita a partir de dados sı́smicos
invertidos. Entretanto, existem inúmeras circunstâncias a favor da utilização de dados
sı́smicos convencionais, ou seja, sem inversão. Uma delas merece ser destacada: o contato
entre petróleo e água, que representa um contraste de propriedades elásticas e, portanto,
tende a ser mais facilmente percebido em dados convencionais, principalmente no caso
de reservatórios espessos.
Os exemplos de atributos de AVO apresentados até agora foram todos gerados com
dados sı́smicos sintéticos. Situações mais ilustrativas da realidade podem ser vistas nas
figuras 4.23 e 4.24, as quais correspondem a seções de desvio ortogonal de dados sı́smicos
invertidos. O leitor poderá perceber que, nas duas anomalias mencionadas na descrição
das figuras, os lobos laterais têm dimensões semelhantes e ambos apresentam módulo
menor do que o pico ou a cavidade a eles associados. Este é o tipo de situação que, na
ausência de intercalações, favorece a identificação da polaridade das anomalias.
As figuras 4.23 e 4.24 representam exemplos em que a identificação das anomalias
de desvio ortogonal é relativamente fácil. Em muitas circunstâncias, isto não ocorre, em
particular se o fluido saturante é petróleo lı́quido e a camada analisada ocorre em uma
seqüência em que se empilham materiais separados por altos contrastes elásticos. Nestas
circunstâncias, os fenômenos de interferência podem gerar distorções importantes, entre
as quais se inclui o efeito de sintonia (em inglês, tuning), na forma variável com o ângulo
de incidência (ver o item 4.4).
518 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

0
vP σ ρ

200
Tempo (ms)

400

600

800
1 2 3 4 5 6
Figura 4.22: Atributo FAD , obtido com três diferentes pulsos sı́smicos
de fase nula, juntamente com os correspondentes perfis elásticos (os mes-
mos da Figura 4.20). Traços 1, 2 e 3: resultado sem inversão e pulsos
definidos pelos filtros 8-30, 8-60 e 8-90Hz. Traços 4, 5 e 6: resultado com
inversão e pulsos definidos pelos filtros 8-30, 8-60 e 8-90Hz. Os dois gru-
pos de traços foram normalizados separadamente. Para a apresentação
dos perfis, adotou-se o mesmo procedimento usado na Figura 4.20, além
da aplicação de um filtro corta-baixas de 8Hz.

Figura 4.23: Exemplo de seção de desvio ortogonal de dados sı́smicos


parcialmente invertidos, com destaque para a anomalia negativa situada
junto à extremidade esquerda, entre 3.0 e 3.1s, a qual é devida à presença
de petróleo.
4.3. INDICADORES SÍSMICOS DE PETRÓLEO E LITOLOGIA 519

Figura 4.24: Exemplo de seção de desvio ortogonal de dados sı́smicos


parcialmente invertidos, com destaque para a anomalia positiva situada
entre 1.2 e 1.3s, a qual é causada por uma rocha anomalamente rı́gida
(possivelmente, um calcário).

Um exemplo simples pode ser usado para ilustrar a idéia. Imagine-se um meio cons-
tituı́do de duas camadas caracterizadas por anomalias positivas de desvio ortogonal, se-
paradas por uma litologia Gardner-Castagna. Imagine-se agora que os correspondentes
traços sı́smicos invertidos sejam submetidos a um simples filtro passa-banda. Depen-
dendo das caracterı́sticas do filtro e do espaçamento vertical entre as duas camadas, o
resultado pode ser a superposição dos lobos laterais associados às duas camadas e, em
conseqüência, a transformação do desvio ortogonal da litologia Gardner-Castagna em
uma feição falsamente negativa. Uma forma de atenuar este fenômeno consiste em in-
cluir, na seqüência de processamento, técnicas de deconvolução mais sofisticadas, como a
deconvolução iterativa, descrita no subitem 3.2.6.
Outro procedimento, útil em qualquer situação, consiste na análise diferencial dos atri-
butos de AVO. De acordo com esta idéia, procura-se avaliar como a saturação de petróleo
afeta o comportamento da reflexão do topo (ou da base) do reservatório, em comparação
com o do mesmo reservatório saturado de água, de forma parcialmente independente das
demais litologias. Para que este tipo de trabalho seja bem-sucedido, é conveniente a
adoção das seguintes medidas: (1) geração dos atributos de AVO na forma de mapas de
dados sı́smicos parcialmente empilhados22 e; (2) avaliação da correlação entre as seções ou
mapas dos atributos de AVO e a presença de armadilhas (trapas). As variações laterais
no comportamento sı́smico do reservatório tendem a ser mais facilmente identificadas nos
dados obtidos com essas medidas, desta forma facilitando a caracterização da presença
de petróleo23 .
Sabe-se que a presença de petróleo é, em si, uma anomalia. Sabe-se também, com base
na discussão apresentada no item 3.7, que a forma mais robusta da inversão elástica tende
a se restringir à obtenção de estimativas relativas das propriedades elásticas. Aplicadas
22
Uma das vantagens desse procedimento é a possibilidade de redução, pelo menos parcial, do efeito
de eventuais resı́duos de NMO.
23
Ressalte-se que esta é uma tarefa facilitada se o procedimento descrito for aplicado duas vezes, uma
com atributos de AVO convencionais e outra com atributos baseados em dados invertidos.
520 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

à análise de AVO, estas idéias fundamentam uma importante técnica: a quantificação


estatı́stica das anomalias de AVO. Para aplicá-la, mede-se o tamanho da anomalia em
relação ao desvio padrão dos dados estatisticamente representativos. Este conceito se
aplica a qualquer atributo sı́smico, embora possa ser mais útil no caso das seções, ou
mapas, de atributos de AVO. Em termos práticos, valores de 3 ou mais desvios padrões
podem ser considerados anômalos. Deve-se entretanto ressaltar que regras empı́ricas
desse tipo devem sempre ser reavaliadas localmente, com base em testes de substituição
de fluido.

Bright-spots e AVO em seções empilhadas


No caso, tı́pico, em que a declividade da reta que define a tendência de fundo, g, é nega-
tiva, as correspondentes reflexões apresentam uma importante caracterı́stica: o módulo
da amplitude tende a cair com o aumento no ângulo de incidência, pelo menos até que este
atinja 30 ou 40 graus. Isto significa que, para um evento Gardner-Castagna, o módulo
da amplitude no afastamento fonte-receptor igual a zero deve ser maior do que o módulo
da amplitude resultante do empilhamento.
Já no caso de uma anomalia de AVO da classe 3, o módulo da correspondente am-
plitude aumenta com o afastamento fonte-receptor. Isto significa que, para essa classe
de anomalia, o módulo da amplitude resultante do empilhamento deve ser maior do que
o módulo da amplitude no afastamento fonte-receptor igual a zero. O caso a da Figura
4.12, na página 497, pode ser usado com exemplo.
Sabe-se também que, após a correção de NMO, um evento qualquer, registrado em
um traço sı́smico afastado da fonte, deve apresentar conteúdo de freqüências um pouco
mais baixo do que em um traço registrado a uma distância menor. Há pelo menos duas
razões para isto: (1) o maior tempo de percurso implica maior absorção no traço mais
afastado e; (2) a correção de NMO é mais acentuada no traço mais afastado e portanto,
também o correspondente estiramento (em inglês, stretch).
Combinando essas observações, pode-se dizer que o empilhamento de uma anomalia
de classe 3 deve levar a um sinal com conteúdo de freqüências mais baixo do que o
empilhamento de um evento Gardner-Castagna. A principal razão para isto é o fato de
a anomalia de classe 3 apresentar módulo da amplitude mais acentuado exatamente nos
afastamentos fonte-receptor em que a freqüência é mais baixa, enquanto o oposto ocorre
com um evento Gardner-Castagna.
Em resumo, em uma seção empilhada, uma anomalia de classe 3 tende a apresentar
módulo da amplitude mais alto e conteúdo de freqüências ligeiramente mais baixo do que
os eventos Gardner-Castagna. Desta forma, pode-se dizer que é teoricamente possı́vel
identificar anomalias de AVO em seções empilhadas. Ressalte-se ainda que as respostas
sı́smicas, em seções empilhadas, das classes 2 e 3, ou, até mesmo, da 3.5, podem ser
similares. O bright-spot da Figura 4.11 (página 496) pode servir como exemplo: em
termos relativos, a mesma feição poderia ter sido causada por uma anomalia de qualquer
uma das classes 2, 3 ou 3.5, sem alteração significativa do resultado obtido.
O conceito de AVO pós-empilhamento permite entender porque, em determinadas
circunstâncias, alguns intérpretes conseguem, com base no conhecimento empı́rico, se-
parar um bright-spot de uma anomalia de caráter litológico. A este respeito, há ainda
que se considerar dois efeitos adicionais, ainda que secundários: (1) a absorção causada
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 521

pela própria presença de petróleo, que pode reduzir o conteúdo de freqüências da reflexão
da base do reservatório24 e; (2) o espessamento da coluna de petróleo nos ápices das
acumulações, que pode levar a uma sugestão de redução do conteúdo de freqüências.

4.4 Quantificação Sı́smica


A etapa final dos trabalhos de interpretação sı́smica consiste normalmente na geração de
mapas voltados para quantificar propriedades volumétricas dos reservatórios. Entre estas
propriedades, incluem-se a profundidade do topo ou da base, a espessura e a porosidade
do reservatório. Discutem-se em seguida alguns dos conceitos relacionados com o assunto,
juntamente com uma análise de algumas importantes limitações do método sı́smico.

4.4.1 Resolução vertical


Define-se resolução vertical como a capacidade de resolver (separar) refletores vertical-
mente adjacentes. Assim, o limite de resolução vertical é dado pela mı́nima espessura
de camada, acima da qual pode-se isolar, de forma correta, os refletores do topo e da
base da camada. Muito embora este seja um conceito associado ao limite superior da
banda espectral disponı́vel, pode-se estendê-lo ao limite inferior, que define a resolução
de camadas espessas.
Com o fim de se analisar os fenômenos associados ao limite de resolução vertical do
método sı́smico, é freqüente a utilização do clássico modelo de cunha (ver Widess, 1973;
Brown, 1988), o qual pode ser definido com base na seguinte função:

r(τ, t) = r0 δ(t) − r0 δ(t − τ ) (4.4.1)

onde r é o coeficiente de reflexão, t é o tempo vertical, τ é a espessura da camada, medida


em tempo duplo, e δ é a função delta de Dirac.
Observe-se que a equação 4.4.1 pode ser vista como a descrição matemática de uma
seção de coeficientes de reflexão, desde que se considere cada valor de τ como representa-
tivo de um único traço. Por outro lado, a mesma função descreve uma camada, na forma
de uma cunha, caracterizada por: (1) topo correspondente a uma interface horizontal no
tempo t = 0; (2) coeficiente de reflexão do topo constante e igual a r0 ; (3) base constituı́da
por uma interface plana e mergulhante no tempo t = τ e; (4) coeficiente de reflexão da
base constante e igual a −r0 .
Se a seção de coeficientes de reflexão definida pela equação 4.4.1 tiver cada um de
seus traços convolvido com um pulso sı́smico, o resultado é:

s(τ, t) = w(t) ∗ r(τ, t) = r0 w(t) − r0 w(t − τ ) (4.4.2)

onde w é o pulso sı́smico e s é o resultado da convolução de w com todos os traços da seção


de coeficientes de reflexão. A expressão assim obtida representa a descrição matemática
da resposta sı́smica correspondente à equação 4.4.1.
24
Este efeito, que tem sido superdimensionado na literatura, deve ser importante apenas no caso de
reservatórios muito espessos.
522 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

−50

−25

0
Tempo (ms)

25

50

75

100

120

0ms 20 40 60 80 100ms

Figura 4.25: Resultado da convolução entre o modelo de cunha


(equação 4.4.1, assumindo que r0 < 0) e um pulso sı́smico (primeiro
traço à esquerda). As linhas pontilhadas indicam as posições reais do
topo e da base da camada, enquanto as cruzes marcam as posições apa-
rentes do topo. O intervalo de amostragem usado foi 1ms.

Percebe-se na equação 4.4.2 que, dependendo do espectro de amplitude do pulso


sı́smico, o modelo sı́smico obtido pode se afastar ou não do resultado ideal, que corres-
ponde à forma descrita pela própria equação 4.4.1. Este conceito é ilustrado através da
Figura 4.25, a qual foi elaborada sobre um modelo em que as espessuras, em tempo
duplo, variaram entre 1 e 100ms. Na geração da figura, usou-se um pulso sı́smico de
fase nula. Para facilitar a visualização, optou-se por apresentar apenas os traços sı́smicos
correspondentes a espessuras reais múltiplas de 4ms.
Uma avaliação mais profunda dos resultados da Figura 4.25 pode ser feita com base
nas seguintes medidas, obtidas em cada traço sı́smico sintético gerado: (1) a amplitude
da reflexão correspondente à base da camada (igual ao módulo da amplitude da reflexão
do topo) e; (2) a espessura aparente da camada, simbolizada por τ̂ e correspondente à
distância, em tempo duplo, entre a reflexão do topo e a reflexão da base da camada. Na
Figura 4.26, estão representadas, em função da espessura real, as medidas obtidas.
Pode-se perceber, nas duas figuras: (1) amplitude significativa das reflexões, em toda
a extensão do modelo, até mesmo no caso de espessuras reais da ordem de 4ms; (2)
enriquecimento da amplitude nas espessuras situadas em torno de 22ms; (3) estabilização
da espessura aparente em um valor mı́nimo entre 15 e 16ms; (4) diferenças importantes
entre as espessuras real e aparente, em especial na região em que a última se estabiliza;
(5) na mesma região, criação de mergulho falso no topo da camada.
O enriquecimento da amplitude, que se vê nas figuras 4.25 e 4.26, é chamado efeito
de sintonia (em inglês, tuning). Este fenômeno é facilmente explicável pela interferência
construtiva entre o pico central do pulso, associado à reflexão do topo (ou base) da
camada, e o lobo lateral do pulso, associado à reflexão da base (ou topo) da camada. O
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 523

140

120
Amplitude (%)
100

80

60
Espessura aparente (ms)
40

20

0
0 20 40 60 80 100
Espessura real (ms)

Figura 4.26: Amplitude da reflexão da base da camada e espessura


aparente correspondentes aos dados da Figura 4.25. A linha pontilhada
indica a espessura real.

máximo enriquecimento, que permite definir a espessura de sintonia, τtun , ocorre quando
a espessura, em unidades de tempo, é dada por

τtun = 12 bw (4.4.3)

onde bw é igual ao tempo entre os dois lobos laterais do pulso sı́smico. Adotando-se a
definição de bw do pulso Ricker, na forma da equação A.6.2, a espessura de sintonia passa
a ser dada pela seguinte expressão:

6 1
τtun = (4.4.4)
2π fm

onde fm é a freqüência de pico.


Induz-se facilmente que o efeito de sintonia é uma função direta do tamanho relativo
do lobo lateral do pulso sı́smico. A dimensão do fenômeno pode ser avaliada pelo fator
de sintonia, ou seja, o fator de acréscimo de amplitude da reflexão, o qual é definido pela
seguinte expressão, aplicável a um pulso de fase nula:

w(0) − w(τtun )
Ftun = (4.4.5)
w(0)

onde w(0) é a amplitude correspondente ao pico central do pulso sı́smico. No caso das
figuras 4.25 e 4.26, o fator de sintonia é aproximadamente igual a 1.37.
524 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Com base nos resultados apresentados nas figuras 4.25 e 4.26, pode-se induzir que
o problema da resolução vertical deve ser dividido em dois: capacidade de detecção e
resolução vertical propriamente dita. Vê-se que camadas tão finas quanto 4ms podem ser
detectadas sem problemas, já que a amplitude correspondente é significativa. Em traba-
lhos práticos conduzidos com dados sı́smicos da plataforma continental brasileira, já se
observaram expressivas anomalias de amplitude comprovadamente associadas a camadas
com espessuras inferiores a 8-10m e situadas a profundidades superiores a 2500m. Na
verdade, pode-se constatar que, para a detecção de camadas finas, o limite de resolução
horizontal é mais importante.
No que diz respeito à resolução vertical, um tema recorrente é a busca por uma
expressão analı́tica que defina o correspondente limite. Uma alternativa bem conhecida
é a seguinte:
1 1 vI
emin = λm ∼ = (4.4.6)
4 8 fm
ou, com base na expressão 4.4.4,
π
emin = √ vI τtun (4.4.7)
4 6
onde e é a espessura da camada, em unidades de distância, vI é a velocidade intervalar
da camada e λm é o comprimento de onda associado à freqüência de pico, fm . Aplicada
ao caso da Figura 4.25, a expressão 4.4.7 levaria a um limite, em unidades de tempo,
aproximadamente igual a 14ms, o que representa um resultado menor do que a espessura
aparente mı́nima medida.
Uma melhor compreensão desse tema envolve uma análise do papel da deconvolução,
que reconhecidamente aumenta a resolução vertical dos dados sı́smicos. Este efeito pode
ser observado nas figuras 4.27 e 4.28, a primeira das quais resultou da aplicação da
deconvolução iterativa linear aos dados da Figura 4.25. Comparando-se a Figura 4.27
com a 4.25 e a Figura 4.28 com a 4.26, percebe-se claramente o ganho no conteúdo de
freqüências introduzido pela deconvolução, ganho este refletido na atenuação do efeito
de sintonia e no melhor ajuste entre as espessuras real e aparente. Em particular, a
espessura aparente mı́nima foi reduzida para 10-11ms.
Para aprofundar a discussão, é conveniente analisar, no domı́nio da freqüência, o efeito
da deconvolução iterativa linear. Para isto, leva-se em conta que, no caso da Figura 4.27,
o espectro de amplitude de cada traço deconvolvido é definido pelo produto entre o
espectro de amplitude do correspondente traço de coeficientes de reflexão e o espectro de
amplitude do pulso sı́smico deconvolvido. Com base na equação 4.4.1, sabe-se que, para
um valor fixo de τ , a transformada de Fourier do traço de coeficientes de reflexão é dada
por  ωτ   π ωτ 
R(τ, ω) = 2 r0 sen exp i + i , r0 < 0 (4.4.8)
2 2 2
onde ω é a freqüência angular. Observe-se que, no limite em que τ tende a zero, R(τ, ω)
tende ao conjugado complexo da transformada de Fourier do operador de derivada, o que
explica o comportamento observado nas menores espessuras das figuras 4.25 e 4.27 (ver
a equação 1.2.28).
Com a equação 4.4.8, pode-se analisar melhor a Figura 4.29, na qual se vêem os
espectros de amplitude correspondentes aos resultados da aplicação da deconvolução ite-
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 525

−50

−25

0
Tempo (ms)

25

50

75

100

120

0ms 20 40 60 80 100ms

Figura 4.27: Resultado da aplicação da deconvolução iterativa linear


aos dados da Figura 4.25 (ver o subitem 3.2.6). O primeiro traço à
esquerda é o resultado da deconvolução aplicada ao pulso sı́smico isolado.

rativa linear ao pulso sı́smico isolado e a alguns traços selecionados, alguns dos quais não
incluı́dos nas figuras 4.25 e 4.27. No caso do espectro de amplitude do pulso sı́smico
deconvolvido, observa-se uma região plana, limitada por uma freqüência mı́nima, f min , e
uma freqüência máxima, fmax . A forma obtida difere bastante do espectro de amplitude
do pulso sı́smico original, como se pode observar na Figura 3.15 (página 321), a qual foi
gerada com as duas formas de onda envolvidas.
Ainda na Figura 4.29, é possı́vel perceber que, acima da freqüência fmax , a forma
dos espectros de amplitude dos traços sı́smicos deconvolvidos afasta-se da desejada, a
qual é definida por uma versão truncada da função 2|r0 sen (ωτ /2) |. Admitindo-se que
pelo menos o primeiro meio ciclo dessa função deva ser bem amostrado e que fmax seja a
freqüência correspondente à máxima amplitude desse meio ciclo, conclui-se que o limite de
resolução vertical pode ser aproximado pela razão 1/2fmax . Ressalte-se que a qualidade
desta aproximação depende da forma com que se comporta o espectro de amplitude do
pulso sı́smico deconvolvido nas freqüências superiores a fmax .
Um perfil de pseudo-impedâncias acústicas, sem baixas freqüências, representa uma
boa forma de se caracterizar, com base no conceito apresentado no parágrafo anterior, o
limite de resolução vertical. Como se vê na Figura 4.30, uma camada, nesse tipo de dado,
pode ser representada pela metade do perı́odo de um dado componente de freqüência.
Desta forma, a menor espessura que se poderia corretamente estimar corresponde à me-
tade do perı́odo da máxima freqüência adequadamente amostrada, fmax . Na mesma
figura, incluiu-se um limite não convencional, o da espessura correspondente à metade
do perı́odo da mı́nima freqüência adequadamente amostrada, fmin . Os dois limites são
dados por
1 1 vI
emin = λmin = (4.4.9)
2 4 fmax
526 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

140

120
Amplitude (%)
100

80

60
Espessura aparente (ms)
40

20

0
0 20 40 60 80 100
Espessura real (ms)

Figura 4.28: Amplitude da reflexão da base da camada e espessura


aparente correspondentes aos dados da Figura 4.27. A linha pontilhada
indica a espessura real.

100

22
75
Amplitude (%)

50

25 4

0
0 25 50 75 100 125
Freqüência (Hz)

Figura 4.29: Espectros de amplitude extraı́dos do modelo usado na


geração da Figura 4.27. As linhas finas correspondem a traços em que
o valor da espessura real, τ , varia entre 4 e 22ms, com intervalo de 2ms.
A linha espessa representa o espectro de amplitude do pulso sı́smico
deconvolvido.
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 527

Figura 4.30: Resolução vertical de um traço sintético de pseudo-


impedâncias acústicas sem baixas freqüências.

e
1 1 vI
emax = λmax = (4.4.10)
2 4 fmin
onde λmin é o comprimento de onda correspondente à freqüência fmax e λmax é o com-
primento de onda correspondente à freqüência fmin . Aplicadas ao caso da Figura 4.27,
estas expressões levariam a limites, em unidades de tempo, aproximadamente iguais a
12.5ms e 100ms, para fmax ∼ = 40Hz e fmin ∼= 5Hz, respectivamente.
O limite emax , associado à metade do perı́odo da mı́nima freqüência adequadamente
amostrada, exige uma análise não convencional. Uma vez que, normalmente, o espectro
de freqüência dos dados sı́smicos não contém componentes úteis abaixo de 5-6Hz, pode-
se dizer que não é possı́vel estimar corretamente, nesse tipo de dado, as propriedades de
camadas com espessuras superiores a, aproximadamente, 85-200m, admitindo-se veloci-
dades no intervalo 2000-4000m/s. Ou seja, uma camada com espessura superior a esse
limite aparecerá fragmentada em várias outras mais finas. No caso em que o processo
de inversão introduziu componentes de baixa freqüência obtidos a partir das velocidades
sı́smicas, este problema tende a desaparecer, embora o resultado ainda seja, na maioria
dos casos, pouco satisfatório. Analisando-se as figuras 3.59, 3.62 e 3.63 (páginas 440,
448 e 449), pode-se perceber bem a importância do tema.

4.4.2 Deconvolução transversa de mapas sı́smicos


Admita-se, por um momento, que os dados sı́smicos interpretados não tenham sido pre-
viamente submetidos a um processo de deconvolução sofisticado e que, por isto, a es-
pessura de sintonia seja relativamente alta. Esta situação faz com que as espessuras
sı́smicas mapeadas e, conseqüentemente, as isópacas, devam ser corrigidas. Nas mes-
mas circunstâncias, também os mapas de amplitude são questionáveis, por causa de sua
relação com as espessuras.
Discute-se em seguida uma técnica que se propõe a corrigir não somente mapas de
espessuras sı́smicas mas, também, os correspondentes mapas de amplitude. Como sub-
produto do processo, ela gera uma estimativa do pulso sı́smico, a qual pode ser usada na
construção de sismogramas sintéticos orientados para o objetivo. Por causa destas carac-
terı́sticas, a técnica descrita é denominada deconvolução transversa de mapas sı́smicos.
528 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Considere-se inicialmente o que representa a curva de amplitude, em função da espes-


sura sı́smica, da Figura 4.26, a qual foi obtida através de medidas feitas no resultado da
aplicação da equação 4.4.2. Matematicamente, a mesma curva pode ser descrita por

As (τ ) ∼
= r0 Aw (τ ) (4.4.11)

onde As é a amplitude correspondente à espessura real em tempo duplo da camada,


definida por τ , enquanto r0 é o coeficiente de reflexão. Por sua vez, Aw (τ ) é a função
que depende do pulso sı́smico de acordo com a seguinte igualdade, baseada na expressão
4.4.2:
Aw (τ ) = s(τ, tT ) (4.4.12)
onde tT é o tempo correspondente à reflexão no topo da cunha, medido na resposta
sı́smica sintética sem a influência do coeficiente de reflexão, resposta esta dada por

s(τ, t) = w(t) − w(t − τ )

A generalização da equação 4.4.11 depende de duas premissas muito importantes.


A primeira delas consiste em considerar espacial e temporalmente invariante o pulso
sı́smico. A segunda premissa consiste em considerar as propriedades elásticas da camada
e da rocha encaixante espacialmente estacionárias e diferentes entre si, o que leva a um
valor aproximadamente constante para r0 . Por outro lado, a equação 4.4.11 descreve
uma situação em que se conhece o valor da espessura real da camada estudada, τ , o que
não acontece quando se trabalha com dados reais. Nestas circunstâncias, pode-se medir
apenas a espessura aparente τ̂ , a qual é definida pela diferença entre os tempos da base,
tB , e do topo da camada, tT :
τ̂ = tB − tT (4.4.13)
Viu-se anteriormente que, em particular no caso das espessuras reais menores do
que a de sintonia, a espessura definida pela equação 4.4.13 é diferente da correta, já
que a interferência entre as reflexões do topo e da base levam à obtenção de tempos de
reflexão inadequados. No caso dos dados reais, há ainda que se considerar o papel do erro
nas medidas de espessura aparente e amplitude. Estas limitações implicam substituir a
equação 4.4.11 pela seguinte função:

As (τ̂s ) ∼
= r0 Aw (τ̂s ) (4.4.14)

onde τ̂s é a espessura aparente medida, a qual equivale a uma estimativa, sujeita a erro,
da espessura aparente teórica τ̂ .
A Figura 4.31 é um exemplo teórico do comportamento das curvas de amplitude de-
finidas pelas equações 4.4.11 e 4.4.14. Observe-se na figura que, abaixo da mı́nima espes-
sura aparente, não existem informações que possam ser extraı́das diretamente dos dados.
Reside neste ponto o problema básico da deconvolução transversa de mapas sı́smicos, cujo
objetivo é o de estimar valores corretos de amplitude e espessura a partir de medidas de
amplitude e espessura aparente. Para resolver o problema proposto, é necessário obter
estimativas das funções teóricas Aw (τ̂ ) e Aw (τ ), correspondentes à função observada,
As (τ̂s ), o que somente é possı́vel com o conhecimento do pulso sı́smico envolvido.
A solução para o problema proposto depende de dois tratamentos alternativos para o
pulso sı́smico: (1) ele é estimado a priori ou; (2) ele é estimado durante a aplicação da
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 529

técnica. A primeira alternativa nem sempre é facilmente aplicável, enquanto a segunda


apresenta a vantagem de levar a uma estimativa do pulso sı́smico orientada para o obje-
tivo. Para que esta opção seja bem-sucedida, o pulso sı́smico deve ser definido com base
no menor número de parâmetros possı́vel já que, em dados reais, dificilmente a variação
na espessura da camada é suficientemente ampla para permitir uma inversão confortável.
Por outro lado, apenas um ou dois parâmetros podem não ser suficientes para uma boa
descrição de diferentes formas de Aw (τ̂ ). Esta argumentação fundamenta a opção pelo
pulso cujo espectro de amplitude é dado pela equação A.6.425 (ver o Apêndice A.6).
Como o pulso sı́smico baseado na equação A.6.4 depende de três parâmetros, é óbvio
que, para que se possa estimá-lo com base em dados de espessura e amplitude, há ne-
cessidade de, no mı́nimo, três medidas independentes. No caso, estas medidas são: (1) a
espessura aparente mı́nima, τ̂min ; (2) a espessura de sintonia, τtun , que é igual à espessura
aparente de sintonia e; (3) o fator de sintonia, definido pela equação 4.4.5, que equivale à
razão entre a amplitude, na espessura de sintonia, e a amplitude de pico do pulso. Para
a solução do problema proposto, é necessária também a obtenção de uma estimativa
confiável do fator de escala que permite tratar a função As (τ̂s ) como uma aproximação
da função Aw (τ̂s ), tarefa esta que equivale à obtenção de uma estimativa confiável de r 0 ,
ou de uma grandeza proporcional a ele.
As três medidas citadas, além do fator de escala necessário, são obtidas em crossplotes
de amplitude versus espessura aparente. Ressalte-se que o fator de sintonia pode, alter-
nativamente, ser estimado durante o processo inverso já que, para uma dada espessura
de sintonia e uma dada razão τtun /τ̂min , o fator de sintonia não pode ser menor do que
um determinado valor. Ou seja, um par de espessuras aparentes, mı́nima e de sintonia,
está associado a um valor mı́nimo possı́vel para o fator de sintonia, o qual é, em geral,
maior do que 1.2. Ressalte-se entretanto que, neste caso, torna-se possı́vel optar por um
pulso sı́smico definido com base em apenas dois parâmetros, como é o caso daquele cujo
espectro de amplitude é dado pela expressão A.6.3.
Com esses dados, pode-se estimar o pulso sı́smico e as correspondentes funções teóricas
Aw (τ̂ ) e Aw (τ ). Neste processo, utilizam-se métodos numéricos de solução de equações,
aplicados às expressões 4.4.2, 4.4.11 a 4.4.14 e A.6.4. Uma das técnicas usadas para
controlar a qualidade da solução obtida consiste em superpor, ao gráfico cruzado de
amplitude versus espessura aparente, medidas nos dados reais, as formas teóricas de
r0 Aw (τ ) e r0 Aw (τ̂ ). A Figura 4.31 pode ser tomada com um exemplo de apresentação
conjunta destas duas formas teóricas, sem as medidas reais correspondentes.
Para a correção dos mapas de espessura e amplitude, um aspecto fundamental é a
alta declividade da função As (τ̂s ) observada na região abaixo da espessura de sintonia.
Esta caracterı́stica, evidente no exemplo da Figura 4.31, faz com que uma ampla gama
de valores de amplitude possa ser associada a uma faixa restrita de espessuras aparentes.
A conseqüência prática desta constatação é o fato de que o valor a usar na correção
da espessura aparente, τ̂s , não pode ser estimado de forma diretamente dependente da
mesma espessura. Nestas condições, a correção das espessuras medidas é feita com base
na seguinte expressão:
τc = τ̂s + (τ − τ̂ ) (4.4.15)
25
A opção por esta descrição do espectro de amplitude do pulso sı́smico implica dizer que, na decon-
volução transversa de mapas sı́smicos, pode-se obter informações a respeito da absorção do meio.
530 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

140

120

100
Amplitude (%)

80

60

40

20

0
0 10 20 30 40 50 60
Espessura (ms)

Figura 4.31: Exemplo de apresentação conjunta da amplitude


em função da espessura real (linha fina) e da espessura aparente
(linha espessa). Dados: τtun = 22ms, Ftun = 1.37, τ̂min = 15.5ms.

onde τc é a espessura corrigida e a diferença τ − τ̂ é obtida exclusivamente com base


na amplitude medida nos dados reais, a qual pode ser associada, na resposta teórica do
modelo de cunha, à diferença τ − τ̂ mais provável.
A aplicação da equação 4.4.15 pode ser vista como um mapeamento dos dados ob-
servados, As (τ̂s ), para uma nova distribuição, em torno da função r0 Aw (τ ), definida por
As (τc ). A mesma idéia pode se estender à correção das amplitudes, a qual é aplicada com
base na seguinte expressão:

Ac (τc ) = As (τc ) + r0 [1 − Aw (τ )] (4.4.16)

onde Ac (τc ) é a função final obtida, após as correções de espessura e amplitude. Isto
significa que a correção de amplitude depende também da relação entre espessura e am-
plitude26 usada na aplicação da expressão 4.4.15.
Dentre as limitações da deconvolução transversa de mapas sı́smicos, há que se desta-
car a variação espacial do coeficiente de reflexão que define o topo ou a base da camada.
Onde esta limitação está presente, podem ser adotadas as seguintes medidas: (1) deter-
minar, através de gráficos cruzados envolvendo os mapas de amplitude do topo e da base
do reservatório, qual dos dois é mais representativo; (2) aplicar correções aos mapas de
amplitude, de forma a reduzir a eventual influência de reflexões verticalmente adjacen-
tes; (3) aplicar a técnica de forma setorizada, ou seja, evitar agrupar regiões em que o
coeficiente de reflexão apresente comportamentos distintos. Ressalte-se que os resultados
da técnica podem ser melhorados através da determinação de um valor mı́nimo, para o
módulo da amplitude, correspondente ao limite do reservatório.
26
A mesma relação pode ser usada também para a correção do relevo estrutural da camada, na região
de espessuras inferiores à de sintonia, a qual é caracterizada, no caso do topo, por tempos menores do
que os corretos, como se pode ver no exemplo da Figura 4.25 (página 522).
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 531

4.4.3 Resolução horizontal


A resolução vertical do método sı́smico está intimamente relacionada com a resolução
horizontal, cujo limite pode ser definido como a mı́nima distância horizontal entre duas
feições geológicas, acima da qual torna-se possı́vel isolar os refletores correspondentes às
bordas das duas feições. Em distâncias menores, os eventos interferem entre si, tornando
impossı́vel a sua individualização, à semelhança do que ocorre com camadas muito finas,
na resolução vertical.
Com base na Figura 4.32, pode-se demonstrar como o limite de resolução vertical é
usado para se estimar o limite de resolução horizontal. Na figura, d é a mı́nima distância
que permite separar, na posição horizontal x0 , as respostas sı́smicas dos difratores D0
e D1 . As respostas de difratores situados em posições intermediárias, ou seja, dentro
de distâncias menores do que d, interferirão com a resposta do difrator D0 , de acordo
com um atraso de tempo menor do que o tempo correspondente ao limite de resolução
vertical. Nesse caso, não se poderia isolar a contribuição correspondente a cada difrator.
Com base nesta idéia, um procedimento semelhante ao usado na obtenção da equação
2.2.9 leva à seguinte aproximação para o valor de d:

d∼
= 2zemin (4.4.17)

onde emin é o limite de resolução vertical. Alternativamente, adota-se o limite de resolução


vertical dado pela equação 4.4.6, o que permite a obtenção da seguinte aproximação:
q
d∼
= 1
2
zλm (4.4.18)

Percebe-se, nesta equação, que d é igual ao raio da primeira zona de Fresnel, aplicado ao
comprimento de onda associado à freqüência de pico.
Neste ponto, pode-se perguntar se a expressão 4.4.18, aplicável a dados sı́smicos não
migrados, é válida após a migração. Como se mostrou no Capı́tulo 3, sabe-se que a
migração leva ao colapso das difrações e corrige o mergulho das camadas. Estas pro-
priedades, aplicadas a eventos lateralmente adjacentes, resultam em menor interferência
entre eles. Em conseqüência, pode-se dizer que a migração melhora a resolução horizon-
tal. Ou seja, mesmo que se assumam valores baixos para a freqüência de pico, espera-se
que, em dados sı́smicos migrados, o limite de resolução horizontal seja bem menor do que
o estimado com base na expressão 4.4.18.
Através da Figura 4.32, pode-se obter uma estimativa do limite de resolução ho-
rizontal de linhas migradas. Uma vez que o ângulo de migração α define também o
máximo ângulo de mergulho corretamente migrado, a distância horizontal entre dois
refletores paralelos, com ângulo de mergulho igual ao de migração, pode ser usada para
se estabelecer o limite de resolução procurado. Assim, ainda com base na Figura 4.32,
obtém-se:
emin
dM IG ∼
= (4.4.19)
sen α
ou, utilizando-se como limite de resolução vertical o valor dado pela equação 4.4.6,

λm
dM IG ∼
= 1
4
(4.4.20)
sen α
532 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

Figura 4.32: Relação entre resolução vertical e resolução horizontal


de dados sı́smicos migrados.

Observe-se que, se o ângulo de migração atingir 900 , os limites de resolução horizontal e


vertical tornam-se iguais.
Na Figura 4.33, vê-se uma comparação entre o raio da primeira zona de Fresnel e o
limite de resolução horizontal de dados sı́smicos migrados, em função do comprimento de
onda correspondente à freqüência de pico do pulso sı́smico. Uma boa análise do assunto
deve levar em conta que o comprimento de onda do sinal pode oscilar entre menos de 16m
(assumindo-se freqüência de pico de 40Hz e velocidade pouco maior do que a da água)
até valores superiores a 130m (junto ao embasamento, com freqüência de pico de 15Hz).
Nestas condições, pode-se esperar limites aproximados de resolução horizontal de linhas
migradas entre 4m e 32m e raios da primeira zona de Fresnel entre 100m e 500m.
A experiência mostra que, mesmo em seções sı́smicas não migradas, é possı́vel detectar
descontinuidades dentro de distâncias freqüentemente menores do que 100m, o que sig-
nificaria descartar o raio da primeira zona de Fresnel, aplicado ao comprimento de onda
da freqüência de pico, como um limite de resolução horizontal de linhas não migradas.
Na verdade, à semelhança do que ocorre com o limite de resolução vertical, existe uma
diferença sensı́vel entre resolução horizontal propriamente dita e a capacidade de detecção
de descontinuidades. Assim, mesmo que não se possa isolar com segurança a fonte de dois
eventos lateralmente adjacentes, é possı́vel, com freqüência, detectar a descontinuidade
correspondente.
Um tema ainda não discutido diz respeito à resolução horizontal de seções sı́smicas
registradas na presença de expressivos afastamentos entre a fonte e os receptores. De
acordo com a expressão 2.3.31, sabe-se que a área, em subsuperfı́cie, que influencia o
registro de uma amostra é diretamente proporcional ao afastamento entre a fonte e o
receptor (ver também a Figura 2.32, na página 126). Nestas condições, a versão conven-
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 533

600

500 4000m

3000m
Distância (m)

400
2000m
300
1000m
200

100
d MIG
0
0 50 100 150 200
Comprimento de onda (m)

Figura 4.33: Limite de resolução de linhas migradas, d M IG , definido


pela equação 4.4.20 (α = 900 ), e o raio da primeira zona de Fresnel
para refletores em quatro diferentes profundidades, definido pela equação
2.2.9.

cional do raio da primeira zona de Fresnel não pode ser considerada representativa de um
hipotético raio da área que influencia uma reflexão empilhada. Adicionalmente, o efeito
de estiramento, associado à correção de NMO, ou à migração de seções de afastamento
fonte-receptor comum, afeta também de forma negativa a resolução vertical e, conseqüen-
temente, a resolução horizontal de dados sı́smicos empilhados. Desta forma, se nenhuma
correção for aplicada, pode-se dizer que, quanto maior for o afastamento fonte-receptor
envolvido no empilhamento, menor será a resolução horizontal dos dados sı́smicos.

4.4.4 Previsão de profundidade


Uma das tarefas mais importantes da interpretação sı́smica é a determinação da pro-
fundidade em que se encontra um determinado evento. Existe uma grande variedade de
técnicas aplicadas com este objetivo, a maioria das quais pode ser reduzida à obtenção de
uma função que relaciona, implı́cita ou explicitamente, tempo de reflexão e profundidade.
As mais conhecidas delas podem ser separadas em dois grupos, discutidos em seguida.
No primeiro grupo de técnicas, a interpretação exige que os dados sı́smicos sejam
apresentados já em função da profundidade, o que favorece também a própria visualiza-
ção das feições geológicas. Para isto, adotam-se três procedimentos distintos: (1) simples
conversão tempo-profundidade, usando velocidades de empilhamento, ou de migração em
tempo; (2) migração residual em profundidade com base no raio imagem (ver o item 3.5)
e; (3) migração em profundidade, preferencialmente antes do empilhamento.
Na migração em profundidade, a interpretação e o processamento dos dados sı́smicos
se confundem, já que a profundidade correspondente a um evento migrado envolve um
534 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

processo de escolha de parâmetros controlado pela qualidade da imagem obtida. Esta


caracterı́stica gera um acentuado grau de incerteza, uma vez que nem sempre a velocidade
mais indicada para a obtenção de uma boa imagem representa a velocidade adequada
para uma boa previsão de profundidade. Em outras palavras — repetindo um conceito
apresentado no item 3.6 —, a velocidade de migração adequada à obtenção da melhor
imagem possı́vel pode levar a uma estimativa errada da profundidade.
A conversão tempo-profundidade e a migração residual em profundidade sofrem in-
diretamente do mesmo mal, agravado pelo fato de que, em muitos casos, a migração em
tempo tende a gerar imagem de pior qualidade do que a migração em profundidade. Por
outro lado, ambos os procedimentos apresentam uma aparente vantagem operacional em
relação à migração em profundidade: a modificação dos resultados obtidos, ou seja, uma
nova etapa de conversão tempo-profundidade, ou uma nova migração residual, pode ser
substancialmente mais rápida do que uma nova migração em profundidade27 . De qualquer
forma, a manipulação recursiva dos dados sı́smicos, necessária nos três casos, implica um
baixo grau de flexibilidade operacional, problema este que as técnicas do segundo grupo
não apresentam.
No segundo grupo de técnicas, os dados básicos são mapas de tempo de reflexão ob-
tidos através da interpretação de dados sı́smicos migrados em tempo, ou migrados em
profundidade e reapresentados em escala de tempo. As técnicas mais usadas desse grupo
são: (a) multiplicação entre mapas de tempo de reflexão e mapas de velocidade média; (b)
multiplicação entre mapas de tempo de reflexão e mapas de velocidade de empilhamento
ou de migração em tempo; (c) aplicação de expressões analı́ticas que relacionam veloci-
dade intervalar e profundidade ou tempo de reflexão; (d) empilhamento de camadas, ou
seja, a soma das estimativas de espessuras das camadas situadas acima do horizonte de
interesse; (e) conversão de mapas de tempos de reflexão em mapas em profundidade com
base no conceito de raio imagem.
Em áreas onde se dispõe de um razoável número de poços perfurados, a técnica de
previsão de profundidade mais simples é baseada na obtenção de mapas de velocidade
média, os quais são construı́dos em função da razão entre a profundidade medida nos
poços e a metade dos tempos de reflexão estimados nos dados sı́smicos. Na geração
desses mapas, é conveniente o recurso a modelos geológicos, usados para o estabelecimento
das tendências de comportamento da velocidade média. As profundidades desejadas são
resultantes da operação expressa pela seguinte equação:

z = 12 vm t (4.4.21)

onde z é profundidade, t é o tempo de reflexão e vm é a velocidade média. Obviamente, a


qualidade do resultado depende de quão lateralmente variável é o campo de velocidades.
Assim, em muitas áreas, o resultado final pode ser satisfatório.
Uma técnica similar à descrita é baseada na determinação de profundidades a partir
de velocidades de empilhamento ou velocidades de migração em tempo. Neste caso, cada
função velocidade obtida poderia ser vista da mesma forma que um perfil de velocidades
em um poço. Entretanto, para que a técnica seja bem-sucedida, é fundamental que as
27
A ênfase empregada no adjetivo “aparente” deve-se ao fato de que uma nova migração em profundi-
dade poderia ser substituı́da pela conversão de profundidade para tempo, com as velocidades usadas na
migração, seguida da conversão de tempo para profundidade, neste caso usando novas velocidades.
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 535

velocidades sı́smicas tenham sido obtidas de forma adequada e tenham sofrido correções
de forma a aproximá-las das velocidades médias. No primeiro caso, as velocidades sı́smicas
a usar devem preferencialmente corresponder a velocidades de migração em tempo ou a
velocidades de empilhamento com correção de DMO, o que evita ou reduz a influência
do mergulho das camadas.
No que diz respeito à correção das velocidades obtidas, talvez o fator mais importante
seja a remoção de ruı́dos associados a problemas de interpretação ou de amostragem. É
comum, particularmente no caso de mapas de velocidade de empilhamento, a presença
de variações locais falsas, caracterizadas por feições arredondadas, as quais podem levar
à criação ou à deformação de estruturas. Uma das formas de correção desses mapas
é baseada em gráficos cruzados entre as velocidades sı́smicas e os tempos de reflexão.
Normalmente, as feições correspondentes aos ruı́dos aparecem destacadas nos gráficos
cruzados, o que facilita sua substituição por médias espaciais das velocidades vizinhas.
Neste caso, as velocidades situadas nas feições ruidosas não são usadas na computação
dos valores que as substituem.
Outra correção das velocidades sı́smicas consiste na remoção do chamado bias, o qual
corresponde a um desvio na velocidade de empilhamento, em relação à velocidade NMO,
ou RMS, causado pela associação entre o afastamento fonte-receptor e a lei de Snell,
ou pela anisotropia. Aplicando-se técnicas como as descritas no item 3.1, a remoção
do bias permite a obtenção de velocidades médias verticais a partir de velocidades de
empilhamento. O mesmo conceito se aplica às velocidades de migração em tempo.
Com ou sem remoção do bias, dados de poços podem ser usados para corrigir as
velocidades de empilhamento, ou de migração em tempo. Para isto, elas podem ser mul-
tiplicadas por um fator de correção que deve, preferencialmente, ser tratado na forma de
mapas. No caso das velocidades de empilhamento sem correção de bias, valores tı́picos
deste fator oscilam em torno de 95%. Há que se destacar que as velocidades de empilha-
mento ou de migração em tempo atuam no sentido de fornecer tendências, necessárias
para que se obtenham valores de velocidade nas posições distantes dos poços.
A previsão de profundidade pode também ser baseada em relações empı́ricas entre
velocidade e profundidade. As expressões desse tipo mais usadas são lineares e obedecem
ao seguinte padrão, discutido no subitem 2.5.2 (Slotnick, 1959):

v = v0 + az (4.4.22)

onde v é a velocidade intervalar, z é profundidade e a é uma constante. Valores tı́picos de


v0 e a dependem da idade da bacia e das caracterı́sticas de seus sedimentos. Observa-se
entretanto que, no caso de litologias clásticas não submetidas a cimentação, a pressões de
poros anômalas ou à compactação lateral das rochas, a constante a tende a se situar em
torno de 0.6. No exemplo citado por Slotnick, aplicável a sedimentos clásticos da chamada
Costa do Golfo, v0 e a são 1829m/s e 0.6, respectivamente. Trabalhos executados na Bacia
de Campos por J. Rizzi e Pierre Magalhães levaram a valores similares.
A velocidade média vm correspondente à expressão 4.4.22 pode ser computada a partir
da relação entre o tempo de reflexão e a velocidade intervalar, a qual é dada por
Z z
1 2
t=2 dz = (ln v − ln v0 ) (4.4.23)
0 v a
536 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

onde t é o tempo de reflexão. Este resultado permite a obtenção das seguintes expressões:

v = v0 exp 12 at (4.4.24)
e, com base na relação entre velocidade e tempo,
v − v0
vm = (4.4.25)
ln v − ln v0
ou   
1
v0 exp 2
at −1
vm = 1 (4.4.26)
2
at
As velocidades médias assim obtidas são então usadas para se converter tempo de reflexão
em profundidade.
Em suas primeiras versões, os parâmetros v0 e a, na equação 4.4.22, eram obtidos
exclusivamente com base em dados de poços. Mais recentemente, tornou-se comum a
obtenção de relações empı́ricas entre velocidade intervalar e espessura (ou profundidade)
através de gráficos cruzados entre dados interpretados. Um exemplo tı́pico de aplicação
desta idéia é o da previsão de profundidade em regiões de águas profundas. No caso,
o primeiro passo consiste em se obter valores de espessura entre o fundo do mar e o
horizonte de interesse, espessuras estas comumente determinadas com velocidades inter-
valares extraı́das das velocidades de migração ou de empilhamento, preferencialmente
após a remoção do bias. Com base em gráficos cruzados entre as espessuras obtidas e as
velocidades intervalares usadas, estimam-se, através de técnicas de mı́nimos quadrados,
os valores de v0 e a adequados, na forma da equação 4.4.22. Outra técnica da mesma
famı́lia consiste em se obter, em cada coordenada horizontal, um par de valores de v0 e
a, com base no resultado da análise de velocidade feita na mesma posição.
Com as constantes v0 e a obtidas e os tempos do fundo do mar e da reflexão de
interesse, calculam-se as profundidades desejadas com a seguinte equação:
z = zM + 21 vI (t − tM ) (4.4.27)
onde zM e tM são a profundidade e o tempo de reflexão correspondentes ao fundo do
mar, enquanto z e t correspondem à profundidade e ao tempo de reflexão do horizonte de
interesse. Por sua vez, vI corresponde à velocidade intervalar média entre o fundo do mar
e a camada de interesse calculada, por exemplo, com a equação 4.4.25. Observe-se que
resultados similares podem ser obtidos através de relações empı́ricas entre a velocidade
intervalar e os tempos de reflexão, em vez da profundidade. Nos dois casos, é essencial
ajustar o mapa final aos dados de poços disponı́veis.
A equação 4.4.27 representa um caso particular de uma das mais conhecidas técnicas
de previsão de profundidade: a do empilhamento de camadas. Esta é uma técnica que
consiste em somar as espessuras das camadas situadas acima do horizonte de interesse,
cada uma delas estimada de forma parcialmente independente. Nesta técnica, o intérprete
deve dispor de mapas de espessura em tempo e de mapas de velocidade intervalar das
diversas camadas situadas acima do horizonte de interesse. A soma das isópacas corres-
pondentes equivale à profundidade procurada. De uma forma sintética, tem-se:
n−1
X
1
zn = 2
(ti+1 − ti ) vi (4.4.28)
i=1
4.4. QUANTIFICAÇÃO SÍSMICA 537

onde t é o tempo de reflexão correspondente ao topo de cada camada identificada pelo


ı́ndice e zn é a profundidade do topo da camada de interesse.
Na técnica descrita, o maior problema consiste na obtenção de estimativas confiáveis
das velocidades intervalares, as quais devem ser geradas preferencialmente na forma de
mapas, a partir das espessuras das camadas medidas nos poços e os correspondentes
intervalos de tempo de reflexão sı́smica. Na construção desses mapas, podem ser uti-
lizados modelos geológicos capazes de permitir melhor previsão do comportamento das
velocidades intervalares em locais distantes dos poços. Com a mesma finalidade, podem
ser utilizadas velocidades intervalares obtidas com base nas velocidades de empilhamento
ou de migração em tempo. Neste caso, é recomendável também o uso de gráficos cru-
zados, nas formas citadas acima, os quais possibilitam uma avaliação da qualidade das
velocidades e, além disso, a aplicação de técnicas de redução de ruı́dos.
A técnica descrita pode ser melhorada através de um ajuste relativamente simples 28 .
Depois de calculadas as profundidades, pode-se gerar o mapa correspondente às velocida-
des médias implicitamente calculadas no processo, as quais equivalem ao dobro da razão
entre as profundidades estimadas e os tempos de reflexão, em cada posição espacial. A
simples inspeção visual do resultado desta operação pode indicar a presença de proble-
mas locais, freqüentes no caso em que ocorrem grandes variações laterais de velocidade.
A solução mais recomendada para esses problemas consiste em suavizar o mapa obtido,
levando em conta as profundidades corretas nas posições dos poços. As profundidades
finais são obtidas através da metade do produto entre o mapa de velocidade corrigido e
o mapa dos tempos de reflexão (equação 4.4.21).
Uma técnica interessante, baseada no conceito de raio imagem, foi tema de tese de
mestrado de Amorim (1984), a partir de idéia de Peter Hubral. Para aplicá-la, as in-
formações básicas são mapas isópacos em tempo, obtidos através da interpretação de
seções migradas em tempo, além dos correspondentes mapas de velocidade intervalar, os
quais podem ser obtidos através de técnicas como as descritas no caso do empilhamento
de camadas. Dispondo-se dos dois tipos de mapas em todas as principais camadas entre
a superfı́cie e o nı́vel de interesse, a técnica é aplicada através dos seguintes passos:

1. Calculam-se as profundidades e os mergulhos da primeira interface, usando uma


expressão equivalente à 4.4.21, aplicada a todos os pontos da superfı́cie. Esta sim-
plicidade se justifica pelo fato de que o raio imagem percorre a primeira camada na
direção vertical, a partir da superfı́cie.

2. Escolhida uma coordenada horizontal qualquer, determina-se a inclinação do raio


imagem correspondente dentro da segunda camada, usando a lei de Snell, a qual
depende do mergulho da primeira interface, das duas velocidades envolvidas e da
inclinação do raio imagem na primeira camada.

3. Estimam-se as coordenadas espaciais (x, y, z) da posição em que o raio corta a


segunda interface, com base na inclinação obtida na etapa anterior, na velocidade
da camada e no tempo de trajeto ao longo do raio, o qual é extraı́do do mapa
isópaco em tempo da camada correspondente, na posição horizontal em que o raio
partiu da superfı́cie.
28
Pelo que sabe o autor, trata-se de uma idéia de Sérgio Michelucci Rodrigues.
538 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

4. Repetem-se as etapas 2 e 3 para todos as coordenadas horizontais dos pontos ma-


peados, o que permite obter as profundidades e os mergulhos correspondentes à
segunda interface. O resultado pode ser usado para se construir uma descrição ade-
quada da mesma interface, descrição esta que pode ser representada, por exemplo,
através de uma malha regular.

5. Um processo semelhante aos das etapas 2 a 4 é repetido tantas vezes quantas ca-
madas existirem abaixo da segunda interface.

Na aplicação da técnica descrita, alguns cuidados devem ser tomados. Em primeiro


lugar, não podem haver mudanças de velocidade muito acentuadas em cada interface, sob
pena de criar distorções no resultado final. Na mesma linha, pode ser conveniente adotar
gradientes verticais de velocidade dentro de cada camada, na forma da equação 4.4.22,
o que pode reduzir os contrastes de velocidade, além de melhorar o resultado final. Por
fim, deve-se lembrar a necessidade de se fazer ajustes no mapa em profundidade obtido,
na mesma linha adotada no caso da técnica de empilhamento de camadas.
Constata-se na prática que, por mais sofisticada que seja a técnica de previsão de
profundidade, é pouco provável que o resultado final seja absolutamente satisfatório. Isto
significa que todas as técnicas discutidas levam a resultados que, normalmente, devem
ser corrigidos com base em procedimentos de caráter interpretativo. Neste caso, é comum
o recurso a algoritmos geoestatı́sticos que otimizem o ajuste dos resultados obtidos aos
dados de poços. Uma solução mais simples consiste simplesmente em distribuir os erros
constatados nas posições dos poços.

4.4.5 Previsão de porosidade


Dentre os mais importantes usos de seções de pseudo-impedâncias acústicas ou de pseudo-
velocidades intervalares, podem ser relacionados o mapeamento de isópacas e a estimativa
das porosidades dos reservatórios. No primeiro caso, o principal cuidado a se tomar
consiste em observar as variações laterais de velocidade e tentar corrigir os fenômenos
de interferência, antes de se transformar unidades de tempo em unidades de distância.
Da mesma forma, há que levar em conta os fatores limitantes associados às resoluções
vertical e horizontal, já discutidos.
A interpretação de seções de pseudo-impedâncias acústicas sem as informações de
baixa freqüência deve ser particularmente cuidadosa, uma vez que a escala de trabalho e o
conteúdo de freqüências dos dados sı́smicos pode levar à interpretação de falsas indicações
de porosidade. Por esta razão, nos trabalhos que exigem extrapolação para áreas mais
afastadas, como é o caso da locação de poços pioneiros, torna-se mais recomendável dados
com baixas freqüências.
Na previsão de porosidades a partir de dados sı́smicos, feita através das equações
4.2.4 e 4.2.6, alguns cuidados devem ser tomados, tais como: (1) a equação 4.2.4 deve
ser adaptada localmente, se necessário; (2) a importância do efeito dos fluidos deve ser
analisada, com base na equação 4.2.17, para que, se necessário, as estimativas de porosi-
dade possam ser corrigidas; (3) os dados sı́smicos e a interpretação resultante devem ser
calibrados com auxı́lio dos dados de poços situados na vizinhança.
Deve-se ressaltar que qualquer estimativa de porosidade, obtida com base na inversão
de traços sı́smicos, deve ser tratada como uma indicação de tendência do comportamento
4.5. FONTES DE CONSULTA 539

das porosidades reais. Ressalte-se que esta restrição inclui também as estimativas base-
adas em técnicas determinı́sticas suportadas por dados de poços, uma vez que a região
abrangida por um perfil de poço é bem mais limitada do que a que influencia a resposta
sı́smica no mesmo local. Com base nestas restrições, pode-se dizer que o tratamento mais
indicado para a determinação das porosidades implica o ajuste estatı́stico entre os dados
confiáveis (hard ), obtidos nos poços, e os dados de tendência (soft), estimados através
dos volumes sı́smicos.
Quando as impedâncias acústicas da rocha encaixante e do reservatório se aproximam,
os coeficientes de reflexão se reduzem em valor absoluto, prejudicando indiretamente a
identificação do topo e da base de uma camada. Por outro lado, a capacidade de se
identificar corretamente um coeficiente de reflexão de pequeno valor absoluto é controlada
pela faixa dinâmica disponı́vel, ao final do processamento. Pode-se perfeitamente aceitar,
em áreas de boa qualidade, uma faixa dinâmica superior a 40dB, o que significa uma razão,
entre os maiores e os menores coeficientes de reflexão, acima de 100. Nestas condições,
coeficientes de reflexão com valores absolutos menores do que .005 ou .001 misturam-se
com os ruı́dos. Valores desta ordem correspondem a contrastes de impedância acústica
menores do que 1% e a contrastes de porosidade ainda menores. Conseqüentemente,
poder-se-iam esperar estimativas de porosidade relativa, com base em dados sı́smicos,
com resolução próxima de 1%.

4.5 Fontes de Consulta


Na área de petrogeofı́sica, recomendam-se os trabalhos de Domenico (1974, 1976, 1977),
Gregory (1976), Castagna et al. (1985), o Memoir 97 da GSA (Clark, 1966), a coletânea
de artigos editada por Nur e Wang (1989), o volume editado por Castagna e Backus
(1993) e, em especial, o “Rock Physics Handbook” de Mavko et al. (1996). No que diz
respeito à resolução, às limitações do método sı́smico e à interpretação em geral, citam-se
os livros de Sheriff (1980b), Anstey (1977, 1980), Lindseth (1982), Brown (1988), e o
volume editado por Sheriff (1992), além dos livros de leitura básica citados nos capı́tulos
anteriores e do trabalho de Widess (1973).

4.6 Exercı́cios
1. Imagine que, em um teste de formação (experimento voltado para avaliar a capacidade de
produção de petróleo em um poço), tenha ocorrido uma acentuada redução de pressão em
um tempo curto, indicando que o reservatório apresenta dimensões reduzidas. O que você
esperaria da amarração, no mesmo nı́vel, entre o sismograma sintético correspondente e
um traço sı́smico no mesmo local?

2. No item 4.1, afirmou-se: “...em uma seção de pseudo-velocidades intervalares, os marcos


acústicos, em especial aqueles cujos topos e bases não são caracterizados por fortes va-
riações na impedância acústica, tendem a ser melhor visualizados do que em uma seção
convencional.” Por que isto ocorre?

3. Analise as figuras 4.2, 4.4 e 4.7 (páginas 476, 483 e 486) e diga o que se pode induzir a
partir da comparação entre elas.
540 CAPÍTULO 4. INTERPRETAÇ ÃO

4. De que forma os parâmetros petrofı́sicos, incluı́dos na equação 4.2.17, devem mudar para
satisfazer a equação 4.2.4?

5. Como seriam as expressões 4.2.17 e 4.2.22 se a rocha não tivesse porosidade? E se esta
mesma rocha fosse constituı́da de puro quartzo alfa, quais seriam as velocidades P e S?

6. Na equação 4.2.18, o que ocorre se o corpo for água? Assumindo-se que, nesse caso, a
velocidade seja 1500m/s e a densidade seja 1 grama por centı́metro cúbico, qual seria o
módulo bulk ? E se a mesma pergunta fosse aplicada à equação 4.2.22?

7. Quais são os limites teóricos (mı́nimo e máximo) para a razão v P /vS ?

8. Sabendo que, no caso de um gás, P V = RT , onde R é uma constante e T é a temperatura


(assumida como constante), estime a compressibilidade do gás em função da pressão.

9. Explique, intuitivamente, por que um acréscimo na pressão de poros, ou seja, a pressão


no fluido que satura uma rocha, diminui a velocidade sônica da mesma rocha.

10. Explique, também intuitivamente, por que uma areia argilosa apresenta normalmente
velocidade sônica maior do que uma areia limpa.

11. Suponha que, na aplicação da equação 4.2.4, a rocha seja porosa (φ > 0.3), o fluido original
seja gás e a profundidade seja pequena. Neste caso, qual seria a relação (aproximada)
entre os módulos KR e Kb ?

12. Analise, no plano ĀB̄, o comportamento relativo da reflexão do topo e da base de um


arenito em dois casos: (a) saturado de água e; (b) saturado de gás.

13. Como se comportam as anomalias de AVO das classes 1, 2, 3.5 e 4 em seções de produto
entre a interseção, Ā, e o gradiente, B̄? Quais são os atributos de AVO mais indicados
para identificá-las?

14. Imagine uma combinação, entre uma seção do atributo desvio ortogonal e outra de em-
pilhamento parcial, capaz de enfatizar a presença de anomalias de AVO.

15. Imagine um material que apresente acréscimo de impedância acústica e de razão de Pois-
son, em relação à rocha encaixante. Imagine também que a reflexão ao nı́vel do topo do
mesmo material gere um produto positivo entre a interseção, Ā, e o gradiente, B̄. Res-
ponda às perguntas: (a) quão comum é este material nas bacias sedimentares puramente
clásticas? (b) como distingui-lo de uma areia saturada de petróleo que também apresente
produto A × B positivo?

16. Sabendo que, em função do aumento na idade dos sedimentos, a impedância acústica tende
a crescer e a razão de Poisson tende a decrescer, o que se pode esperar do comportamento
do traço resultante da soma corrida e t (equação 3.7.27), nas mesmas circunstâncias?

17. No exercı́cio anterior, diga o que se poderia esperar do gráfico cruzado entre a interseção,
ĀI , e o gradiente, B̄I , nos casos em que o espectro de freqüências do pulso sı́smico
apresenta as seguintes caracterı́sticas: (a) o espectro é plano e; (b) faltam os componentes
de baixas freqüências.

18. Compare a resposta sı́smica ao nı́vel do topo de um reservatório em duas situações: (a)
uma areia que, saturada de água, tem impedância acústica maior do que a rocha encai-
xante; (b) a mesma areia saturada de óleo. Avalie os atributos de AVO nos dois casos.
4.6. EXERCÍCIOS 541

19. Suponha que se adotem as seguintes aproximações: (1) Ā = N ; (2) B̄ = F − N . Neste


caso, o volume F corresponde a uma aproximação de qual atributo?.

20. Assuma que o componente de freqüência igual a 2.5Hz não está presente nos dados
sı́smicos. Quais seriam, na correspondente seção de pseudo-impedâncias acústicas, as
espessuras de camada afetadas por esta ausência? Apresente o resultado em função da
faixa de velocidade intervalares entre 2500 e 3500m/s.

21. Assumindo que a máxima freqüência potencial de um pulso sı́smico seja de 60Hz, calcule
a resolução vertical correspondente aos seguintes casos: (a) v = 2000m/s e; (b) v =
6000m/s. O que você conclui?

22. Com os mesmos dados do exercı́cio anterior, calcule a resolução horizontal de dados
migrados (α = 600 ) e não migrados (profundidade de 2000m). O que você conclui?
BIBLIOGRAFIA

Akbar, F. E., Sen, M., e Stoffa, P. L., 1996. Prestack plane-wave Kirchhoff migration in laterally
varying media. Geophysics, 61, p. 1068–1079. 3.6.3

Aki, K. e Richards, P. G., 1980. Quantitative Seismology, Theory and Methods. Freeman, S.
Francisco. 15, 2.6.2, 2.6.3, 2.6.5, 2.9.2, 44, 2.10, 3.7.1

Al-Chalabi, M., 1974. An analysis of stacking, RMS, average and interval velocities over a
horizontally layered ground. Geophysical Prospecting, 22, p. 458–475. 3.1.2, 3.1.2, 3.8

Al-Chalabi, M., 1979. Velocity determination from seismic reflection data. (In Fitch, 1979).
3.1.2, 3.8

Alkhalifah, T. e Tsvankin, I., 1995. Velocity analysis for transversely isotropic media. Geophys-
ics, 60, p. 1550–1566. 2.8.5, 2.8.5, 42, 3.1.2

Amorim, G. A. S., 1984. Migração 3D tempo-profundidade utilizando raios normais e raios


imagem. Tese de Mestrado, UFBa/PPPG, Salvador, Ba. 4.4.4

Amorim, W. N. de, Hubral, P., e Tygel, M., 1987. Computing field statics with the help of
seismic tomography. Geophysical Prospecting, 35, p. 907–919. 3.1.1

Anstey, N. A., 1977. Seismic interpretation: the physical aspects. IHRDC. 4.5

Anstey, N. A., 1980. Seismic exploration for sandstone reservoirs. IHRDC. 4.5

Backus, G. E., 1962. Long-wave elastic anisotropy produced by horizontal layering. Journal of
Gephysical Research, 67, p. 4427–4439. 2.8.5, 2.8.5, 4.2.1

Backus, M. M., 1959. Water reverberations – their nature and elimination. Geophysics, 24, p.
233–261. 2.8.2, 2.10

Bahorich, M. S. e Farmer, S. L., 1995. 3-D seismic discontinuities for faults and stratigraphic
features: the coherence cube. The Leading Edge, 15, p. 1053–1058. 8

Banik, N. C., 1984. Velocity anisotropy of shales and depth estimation in the North Sea basin.
Geophysics, 49, p. 1411–1419. 2.8.5

Banik, N. C., Lerche, I., e Shuey, R. T., 1985. Stratigraphic filtering, Part I: Derivation of
O’Doherty-Anstey formula. Geophysics, 50, p. 2768–2774. 2.8.4

Batzle, M. e Wang, Z., 1992. Seismic properties of pore fluids. Geophysics, 57, p. 1396–1408.
4.2.5, 4.2.5

542
BIBLIOGRAFIA 543

Baysal, E., Kosloff, D., e Sherwood, J. W. C., 1983. Reverse time migration. Geophysics, 48,
p. 1514–1525. 3.5.3, 3.5.3, 3

Baysal, E., Kosloff, D., e Sherwood, J. W. C., 1984. A two-way nonreflecting wave equation.
Geophysics, 49, p. 132–141. 2

Beasley, C. e Lynn, W., 1992. The zero-velocity layer: Migration from irregular surfaces.
Geophysics, 57, p. 1435–1443. 3.5.4

Beasley, C., Lynn, W., Larner, K., e Nguyen, H., 1988. Cascaded f-k migration: Removing the
restrictions of depth varying velocity. Geophysics, 53, p. 881–893. 3.5.2, 3.5.4

Beasley, C. e Mobley, E., 1988. Amplitude and antialiasing treatment in (x-t) domain DMO.
In 58th SEG Annual International Meeting, Expanded Abstracts. Anaheim. 3.6.2

Bednar, J. B., 1983. Applications of median filtering to deconvolution, pulse estimation, and
statistical editing of seismic data. Geophysics, 48, p. 1598–1610. 3.1.1

Berkhout, A. J., 1980. Seismic migration. Elsevier. 2.7.4, 2.7.4, 2.10, 3.8

Berkhout, A. J., 1987. Applied seismic wave theory. Elsevier. 2.7.4, 2.7.4, 2.10, 3.8

Berkhout, A. J. e Verschuur, D. J., 1997a. Estimation of multiple scattering by iterative in-


version, part I: Theoretical considerations. Geophysics, 62, p. 1586–1595. 2.8.3, 2.10, 3.2.1,
3.3.2, 3.3.2

Berkhout, A. J. e Verschuur, D. J., 1997b. Estimation of multiple scattering by iterative


inversion, part II: Practical aspects and examples. Geophysics, 62, p. 1596–1611. 2.8.3, 2.10,
3.2.1, 3.3.2, 3.3.2

Berryhill, J. R., 1979. Wave-equation redatuming. Geophysics, 44, p. 1329–1344. 3.6.1, 3.6.3

Berryman, J. G., 1979. Long-wave elastic anisotropy in transversely isotropic media. Geophysics,
44, p. 896–917. 2.8.5, 2.8.5, 2.8.5

Berryman, J. G., 1999. Origin of Gassmann’s equations. Geophysics, 64, p. 1627–1629. 4.2.2,
5

Beylkin, G., 1987. Discrete Radon transform. IEEE Trans. on Acoustics, Speech and Signal
Processing, 35, p. 162–172. A.1

Biersteker, J., 2001. Shell’s surface multiple attenuation technique. In 71st SEG Annual
International Meeting, Expanded Abstracts. San Antonio. 20

Biondi, B., Fomel, S., e Chemingui, N., 1998. Azymuth moveout for 3-D prestack imaging.
Geophysics, 63, p. 574–588. 3.1.1, 3.6.2

Biot, M. A., 1941. General theory of three-dimensional consolidation. J. of Applied Physics,


12, p. 155–164.

Biot, M. A., 1956a. Theory of propagation of elastic waves in a fluid-saturated porous solid: I.
Low frequency range. J. of the Acoust. Soc. of America, 28, p. 168–178. 4.2.2
544 BIBLIOGRAFIA

Biot, M. A., 1956b. Theory of propagation of elastic waves in a fluid-saturated porous solid: II.
High frequency range. J. of the Acoust. Soc. of America, 28, p. 179–191. 4.2.2, 4.2.2

Biot, M. A., 1962. Mechanics of deformation and acoustic propagation in porous media. Journal
of Applied Physics, 33, p. 1482–1498. 4.2.2

Bishop, T. N., Bube, K. P., Cutler, R. T., Langan, R. T., Love, P. L., Resnick, J. R., Shuey,
R. T., Spindler, D. A., e Wyld, H. D., 1985. Tomographic determination of velocity and
depth in laterally varying media. Geophysics, 50, p. 903–923. 3.1.2

Bleistein, N., 1984. Mathematical methods for wave phenomena. Academic Press, Inc. 14,
2.5.3, 2.7.5, 2.7.5, 2.7.5, 30, 2.10, 3.6.3, 3.6.3, A.5

Bleistein, N., 1987. On the imaging of reflectors in the earth. Geophysics, 52, p. 931–942. 3.6.3,
3.6.3, 3.6.3, 3.7.1, A.5

Bortfeld, R., 1961. Approximation to the reflection and transmission coefficients of plane lon-
gitudinal and transverse waves. Geophysical Prospecting, 9, p. 485–503. 2.6.3, 2.10

Bracewell, R. N., 1986. The Fourier transform and its applications. McGraw-Hill International
Editions. 1.1.1, 1.6

Brown, A. R., 1988. Interpretation of three-dimensional data. AAPG Memoir 42. 4.4.1, 4.5

Byun, B. S., editor, 1990. Velocity analysis on multichannel seismica data. No. 12 em Geophysics
Reprint Series, SEG. 3.8

Canales, L. L., 1984. Random noise reduction. In 55th SEG Annual International Meeting,
Expanded Abstracts. Washington. 1.4.2, 3.1.1

Carvalho, P. M., 1992. Método de eliminação de múltiplas relacionadas com a superfı́cie li-
vre baseado em inversão não linear de dados sı́smicos. Tese de Doutorado, UFBa/PPPG,
Salvador, Ba. 2.8.3, 3.2.1, 3.3.2, 3.3.2

Castagna, J. P. e Backus, M. M., editores, 1993. Offset-dependent reflectivity - Theory and


practice of AVO analysis. Investigations in Geophysics 8, SEG. 2.10, 4.5, 4.6

Castagna, J. P., Batzle, M. L., e Eastwood, R. L., 1985. Relationships between compressional-
wave and shear-wave velocities in clastic silicate rocks. Geophysics, 50, p. 571–581. 3.7.3,
4.2.3, 4.2.5, 4.3.1, 4.3.2, 4.3.2, 4.5

Castagna, J. P., Batzle, M. L., e Kan, T. K., 1993. Rock physics - the link betwen rock properties
and AVO response. (In Castagna e Backus, 1993). 3.7.3, 4.2, 4.2.5, 4.2

Castagna, J. P. e Swan, H. W., 1997. Principles of AVO crossplotting. The Leading Edge, 16
(04), p. 337–342. 4.3.2

Castagna, J. P., Swan, H. W., e Foster, D. J., 1998. Framework for AVO gradient and intercept
interpretation. Geophysics, 63, p. 948–956. 4.3.2, 4.15

Castle, R. J., 1994. A theory of normal moveout. Geophysics, 59, p. 983–999. 2.5.2, 2.5.2,
2.5.2
BIBLIOGRAFIA 545

Cerveny, V., Molotkov, I. A., e Psencik, I., 1977. Ray method in seismology. Universita Karlova,
Praga. 14, 2.5.1, 2.5.1, 2.10

Cerveny, V. e Ravindra, R., 1971. Theory of seismic head waves. University of Toronto Press.
14, 2.5.1, 2.6.2, 2.10

Chang, W. e McMechan, G. A., 1986. Reverse-time migration of offset vertical seismic profiling
data using the excitation-time imaging condition. Geophysics, 51, p. 67–84. 3.6.3, 3.6.3

Claerbout, J. F., 1970. Coarse grid calculations of waves in inhomogeneous media with appli-
cation to delineation of complicated seismic structure. Geophysics, 35, p. 407–418. 2.7, 3.5,
3.5.3

Claerbout, J. F., 1976. Fundamentals of geophysical data processing. McGraw-Hill. 1.4.3, 1.5,
1.6, 2.10

Claerbout, J. F., 1985. Imaging the Earth’s Interior. Blackwell. 1.2.4, 1.6, 2.2.2, 2.3.1, 2.3.2,
2.7.2, 2.10, 3.5.2, 3.5.3, 3.5.3, 3.5.3, 3.6.1, 3.6.2, 3.8, 1, A.1, A.3, A.3, A.3, A.3

Clark, S. P., 1966. Handbook of physical constants. GSA Memoir 97. 4.5

Connelly, D. e Hart, D., 1985. Model-based wavelet processing of deconvolved seismic data. In
55th SEG Annual International Meeting, Expanded Abstracts. Washington. 3.2.4

Connolly, P., 1999. Elastic impedance. The Leading Edge, 18(4), p. 438–452. 55

de Bazelaire, E., 1988. Normal moveout revisited: Inhomogeneous media and curved interfaces.
Geophysics, 53, p. 143–157. 2.5.2, 3.1.2

Deregowski, S. e Rocca, F., 1981. Geometrical optics and wave theory of constant offset sections
in layered media. Geophysical Prospecting, 29, p. 374–406. 3.6.2, 3.6.2

Dix, C. H., 1955. Seismic velocities from seismic measurements. Geophysics, 20, p. 68–86. 2.5.2

Dobrin, M. B., 1976. Introduction to geophysical prospecting. McGraw-Hill. 8

Docherty, P., 1991. A brief comparison of some Kirchhoff integral formulas for migration and
inversion. Geophysics, 56, p. 1164–1169. 3.6.3

Domenico, S. N., 1974. Effect of water saturation on seismic reflectivity of sand reservoirs
encased in shale. Geophysics, 39, p. 759–769. 8, 4.5

Domenico, S. N., 1976. Effect of brine-gas mixture velocity in an unconsolidated sand reservoir.
Geophysics, 41, p. 882–894. 4.5

Domenico, S. N., 1977. Elastic properties of unconsolidated porous sand reservoirs. Geophysics,
42, p. 1339–1368. 4.5

Duarte, O. de O., 2003. Dicionário enciclopédico inglês-português de Geofı́sica e Geologia.


Sociedade Brasileira de Geofı́sica, Rio de Janeiro, RJ. 1.6, 1

Fatti, J. L., Smith, G. C., Vail, P. J., Strauss, P. J., e Levitt, P. R., 1994. Detection of gas
in sandstone reservoirs using AVO analysis: A 3-D seismic case history using the Geostack
technique. Geophysics, 59, p. 1362–1376. 2.6.3, 3.7.1, 4.3.2
546 BIBLIOGRAFIA

Filpo, E. e Tygel, M., 1999. Deep water multiple suppression in the near-offset range. The
Leading Edge, 18(1), p. 81–84. 3.3.2, 3.3.2, 3.3.2

Fitch, A. A., editor, 1979. Developments in Geophysical Exploration Methods - 1. Applied


Science Publishing Ltd., London. 4.6

Foster, D. F. e Mosher, C. C., 1992. Suppression of multiple reflections using the Radon
transform. Geophysics, 57, p. 386–395. 3.3.1, A.1

Frazer, L. N., 1994. A pulse in a binary sediment. Geophysical Journal International, 118, p.
75–93. 2.8.4, 2.8.4

Freire, S. L. M., 1986. Aplicações do método de decomposição em valores singulares no proces-


samento de dados sı́smicos. Tese de Doutorado, UFBa/PPPG, Salvador, Ba. 3.3.1

Futterman, W. I., 1962. Dispersive body waves. Journal of Geophysical Research, 67, p.
5279–5291. 2.8.1, 3.3.4, 3.3.5

Gardner, G. H. F., editor, 1985. Migration of seismic data. No. 4 em Geophysics Reprint Series,
SEG. 2.10

Gardner, G. H. F., Gardner, L. W., e Gregory, A. R., 1974. Formation velocity and density –
the diagnostic basis for stratigraphic traps. Geophysics, 39, p. 770–780. 54, 3, 3, 4.1.1, 4.2,
4.2.3, 4.3.2, 4.3.2

Gassmann, F., 1951. Elastic waves through a packing of spheres. Geophysics, 16, p. 673–685.
4.2.2

Gazdag, J., 1978. Wave equation migration with the phase shift method. Geophysics, 43, p.
1342–1351. 2.7.1, 3.5, 3.5.2

Gazdag, J. e Sguazzero, P., 1984. Migration of seismic data by phase shift plus interpolation.
Geophysics, 49, p. 124–131. 3.5.2, 3.6.3

Geerstma, J., 1961. Velocity-log interpretation: The effect of rock compressibility. SPE Journal,
1, p. 235–248. 4.2.2

Ghosh, S. G. e Kumar, P., 2002. Divergent and asymtotic nature of the time-offset Taner-
Koehler series in reflection seismics. Geophysics, 67, p. 1913–1919. 2.5.2

Gibson, B. e Larner, K., 1984. Predictive deconvolution and the zero-phase source. Geophysics,
49, p. 379–397. 3.1.1, 3.2.5, 3.3.4

Greenberg, M. L. e Castagna, J. P., 1992. Shear-wave velocity estimation in porous rocks:


theoretical formulation, preliminary verification and applications. Geophysical Prospecting,
40, p. 195–209. 4.2.5

Gregory, A. R., 1976. Fluid saturation effects on dynamic elastic properties of sedimentary
rocks. Geophysics, 41, p. 895–921. 4.5

Gulunay, N., 1986. F-x deconvolution and complex Wiener prediction filter. In 56th SEG
Annual International Meeting, Expanded Abstracts. 3.1.1
BIBLIOGRAFIA 547

Hake, H., Helbig, K., e Mesdag, C. S., 1984. Three-term Taylor series for x 2 − t2 curves of
P- and S-waves over layered transversely isotropic ground. Geophysical Prospecting, 32, p.
828–850. 2.5.2, 2.5.2, 2.8.5

Hale, D., 1982. Q-adaptive deconvolution. Relatório Técnico 30, Stanford Exploration Project,
U. de Stanford. 3.3.4, 3.3.5, A.2, A.2, A.2

Hale, D., 1984. Dip-moveout by Fourier transform. Geophysics, 49, p. 741–757. 3.6.2, 3.8

Hale, D., 1991a. Dip moveout processing. Course Notes 4, SEG. 3.8

Hale, D., 1991b. Stable explicit depth extrapolation. Geophysics, 56, p. 1770–1777. 3

Hale, D., editor, 1995. DMO processing. No. 16 em Geophysics Reprint Series, SEG. 3.8

Hampson, D., 1986. Inverse velocity stacking for multiple elimination. In 56th SEG Annual
International Meeting, Expanded Abstracts. 3.3.1, A.1

Han, D. e Batzle, M., 2001. “Fizz water” and low gas saturated reservoirs. In 71st SEG Annual
International Meeting, Expanded Abstracts. San Antonio. 4.2.3

Han, D., Nur, A., e Morgan, D., 1986. Effects of porosity and clay content on wave velocities
in sandstones. Geophysics, 51, p. 2093–2107. 4.2.3

Hargreaves, N. D., 1984. Far-field signatures by wavefield extrapolation. In 54 SEG Annual


International Meeting, Expanded Abstracts. 3.2.1

Hargreaves, N. D., 1992. Air-gun signatures and the minimum phase assumption. Geophysics,
57, p. 263–271. 3.2.1

Hargreaves, N. D., 1996. Far-field signatures by wavefield extrapolation. (In Osman e Robinson,
1996). 3.2.1

Harrison, A. R., Randall, C. J., Aron, J. B., Morris, C. F., Wignall, A. H., Dworak, R. A.,
Rutledge, L. L., e Perkins, J. L., 1990. Acquisition and analysis of sonic waveforms from
a borehole monopole and dipole source for the determination of compressional and shear
speeds and their relation to rock mechanical properties and surface seismic data. SPE20557,
p. 267–282. 4.1.1, 4.2.5

Helbig, K., 1998. Fifty years of amplitude control. Geophysics, 63, p. 750–762. 43

Hildebrand, S. T. e Carroll, R. J., 1993. Radon depth migration. Geophysical Prospecting, 41,
p. 229–240. 3.6.3

Hilterman, F. J., 1983. Petrophysics. Notas de aula, Rio de Janeiro, RJ. 4.2.3, 4.2.4

Hovem, J. M. et al., editores, 1991. Shear waves in marine sediments. Kluwer Academis
Publishers, Holanda. 4.6

Hubral, P., Höcht, G., e Jäger, R., 1998. Introduction to the common reflection surface stack.
In 60th EAGE Annual International Meeting. 3.1.2

Hubral, P. e Krey, T., 1980. Interval velocities from seismic reflection time measurements. SEG.
2.10, 3.5.4, 3.8
548 BIBLIOGRAFIA

Ikelle, L. T., Amundsen, L., Gangi, A., e Wyatt, S. B., 2003. Kirchhoff scattering series: Insight
into the multiple attenuation method. Geophysics, 68, p. 16–28. 38

Ikelle, L. T., Roberts, G., e Weglein, A. B., 1997. Source signature estimation based on the
removal of first order multiples. Geophysics, 62, p. 1904–1920. 3.2.1, 3.3.2

Jack, I., 1997. Time-lapse seismic in reservoir management. 1998 Distinguished Instructor
Short Course. SEG. 4.1.1

Jakubowski, H. e Levin, S., 1983. A simple exact method of 3-D migration. Geophysical
Prospecting, 31, p. 34–56. 3.5.4

Johnston, D.H., editor, 1981. Seismic wave attenuation. No. 2 em Geophysics Reprint Series,
SEG. 2.8.1, 2.10

Kanasewich, E. R., 1975. Time sequence analysis in geophysics. University of Alberta Press.
1.3.2, 1.4.1, 25

Keho, T. H. e Beydon, W. B., 1988. Paraxial ray Kirchhoff migration. Geophysics, 53, p.
1540–1546. 3.6.1, 3.6.3

Kelly, K. R. e Marfurt, K. J., editores, 1990. Numerical modeling of seismic wave propagation.
No. 13 em Geophysics Reprint Series, SEG. 2.10

Koefoed, O., 1955. On the effect of Poisson’s ratio of rock strata on the reflection coefficients
of plane waves. Geophysical Prospecting, 3, p. 381–388. 2.10, 4.2.3, 4.3

Kolsky, H., 1956. The propagation of stress pulses in viscoelastic solids. Philosophical Magazine,
1, p. 693–710. 2.8.1

Kolsky, H., 1963. Stress waves in solids. Dover. 2.1.1, 2.4.2

Kosloff, D. e Baysal, E., 1983. Migration with the full wave equation. Geophysics, 48, p.
677–687. 3.5.3

Kosloff, D. e Kessler, D., 1987. Accurate depth migration by a generalized phase-shift method.
Geophysics, 52, p. 1074–1084. 3.5.2

Landro, M., Strandenes, S., e Vaage, S., 1991. Use of near-field measure to compute far-field
marine source signatures – evaluation of method. First Break, 9, p. 375–385. 3.2.1

Larner, K. L. e Beasley, C., 1987. Cascaded migration: Improving the accuracy of finite-
difference migration. Geophysics, 52, p. 618–643. 3.5.4

Larner, K. L., Chambers, R., Yang, M., Lynn, W., e Wai, W., 1983. Coherent noise in marine
seismic data. Geophysics, 48, p. 854–886. 2.3.1

Larner, K. L., Hatton, L., Gibson, B. S., e Hsu, I-Chi, 1981. Depth migration of imaged time
sections. Geophysics, 46, p. 734–750. 3.5.4

Lavergne, M. e Willm, C., 1977. Inversion of seismograms and pseudo velocity logs. Geophysical
Prospecting, 25, p. 231–250. 3.7.2
BIBLIOGRAFIA 549

Lee, M. W. e Suh, S. Y., 1985. Optimization of one-way wave equations. Geophysics, 50, p.
1634–1637. A.3, .5, A.3

Leite, L. W. B., 1998. Introdução à análise espectral em geofı́sica. FADESP, Belém, Pará. 1.6

Levin, S., 1989. Surface consistent deconvolution. Geophysics, 54, p. 1123–1133. 3.2.3

Li, Z., 1991. Compensating finite-diference errors in 3-D migration and modeling. Geophysics,
56, p. 1650–1660. 3.5.3

Lindseth, R. O., 1979. Synthetic sonic logs - a process for stratigraphic interpretation. Geo-
physics, 44, p. 3–26. 3.7.2

Lindseth, R. O., 1982. Digital processing of geophysical data – a review. Continuing Education
Program. SEG. 3.8, 4.5

Lines, L. R., editor, 1988. Inversion of geophysical data. No. 9 em Geophysics Reprint Series,
SEG. 3.8

Loewenthal, D., Lu, L., Robertson, R., e Sherwood, J., 1976. The wave equation applied to
migration. Geophysical Prospecting, 24, p. 380–399. 2.1.4, 2.2.1

Loewenthal, D., Stoffa, P. L., e Faria, E. L., 1987. Suppressing the unwanted reflections of the
full wave equation. Geophysics, 52, p. 1007–1012. 1, 1

Mack, C., 1975. Essentials of statistics for scientists and technologists. Plenum Press, Londres.
1.3.2

Marion, D., Nur, A., Yin, H., e Han, D., 1992. Compressional velocity and porosity in sand-clay
mixtures. Geophysics, 57, p. 554–563. 4.2.3

Mavko, G., Mukerji, R., e Dvorkin, J., 1996. Rock Physics Handbook. Rock Physics Laboratory,
Stanford University. 4.2, 4.2.1, 4.2.1, 4.2.1, 4.2.2, 4.2.2, 4.2.2, 4.2.3, 4.2.5, 4.5

McLean, M. e Alberty, M., 2001. Dissolved gas in brine: its impact on fluid susbtitution. In
42nd Annual Logging Symposium. SPWLA. 8

McMechan, G. A., 1983. Migration by extrapolation of time-dependent boundary values. Ge-


ophysical Prospecting, 31, p. 413–420. 3.5.3, 3.5.3, 3.5.3

McMechan, G. A. e Chen, H. W., 1990. Implicit static corrections in prestack migration of


common-source data. Geophysics, 55, p. 757–760. 3.5.4, 3.6.3

Meissner, R., 1965. Multiple events in refraction shooting. Geophysical Prospecting, 13, p.
197–219. 2.8.2, 34, 2.10

Mufti, I. R., Pita, J. A., e Huntley, R. W., 1996. Finite-difference depth migration of exploration-
scale 3-D seismic data. Geophysics, 61, p. 776–794. 5

Musgrave, A. W., editor, 1967. Seismic refraction prospecting. SEG. 3.1.1

Müller, T., 1998. Common reflection surface versus NMO/stack and NMO/DMO/stack. In
60th EAGE Annual International Meeting. 2.5.2, 3.1.2
550 BIBLIOGRAFIA

Newman, P., 1973. Divergence effects in a layered earth. Geophysics, 38, p. 481–488. 2.5.3,
2.10

Nur, A. M., Marion, D., e Yin, H., 1991. Wave velocities in sediments. (In Hovem et al., 1991).
4.2.1

Nur, A. M. e Wang, Z., editores, 1989. Seismic and acoustic velocities in reservoir rocks. No. 10
em Geophysics Reprint Series, SEG. 4.5

O’Doherty, R. F. e Anstey, N. A., 1971. Reflections on amplitudes. Geophysical Prospecting,


19, p. 430–458. 2.8.4, 2.8.4, 2.8.4, 2.8.4, 41, 3.3.5

Oliveira, A. S. de, 2000. Seismic pulses obtained from the analysis of direct wave: A comparison
to simulated pulses obtained with modeled notionals. The Leading Edge, 19(1), p. 68–71.
3.2.1, 11, 3.2.4

Oppenheim, A. V. e Schafer, R. W., 1989. Discrete-time signal processing. Prentice Hall. 1.2.3,
1.5.2, 1.5.2, 1.6, 3.2.3, A.2

Ortega, J. M. e Rheinboldt, W. C., 1970. Iterative solution of nonlinear equations in several


variables. Academic Press. 3.2.6, 3.2.6, 4.2.5

Osman, O. M. e Robinson, E. A., editores, 1996. Seismic source signature estimation and
measurement. No. 18 em Geophysics Reprint Series, SEG. 2.10, 3.8, 4.6

Ostrander, W. J., 1984. Plane-wave reflection coefficients for gas sands at nonnormal angles of
incidence. Geophysics, 49, p. 1637–1648. 2.10

Parkes, G., Ziolkowski, W. A., Hatton, L., e Haugland, T., 1984. The signature of an air
gun array: Computation from near-field measurements including interactions – practical
considerations. Geophysics, 49, p. 105–111. 3.2.1

Press, W. H., Flannery, B. P., Teukolsky, S. A., e Vettering, W. T., 1986. Numerical Recipes.
Cambridge University Press. 2.7.4, 3.5.1

Raymer, L. L., Hunt, E. R., e Gardner, J. S., 1980. An improved sonic transit time-to-porosity
transformation. Schlumberger. 4.2

Richards, P. G. e Frasier, C. W., 1976. Scattering of elastic waves from depth dependent
inhomogeneities. Geophysics, 41, p. 441–458. 2.6.3, 3.7.1

Richards, P. G. e Menke, W., 1983. The apparent attenuation of a scattering medium. Bulletin
of the Seismological Society of America, 73, p. 1005–1021. 2.8.4, 2.8.4, 3.3.5

Ricker, N. H., 1977. Transient waves in visco-elastic media. Elsevier. A.6, A.6

Robinson, E. A., 1967a. Multichannel time series analysis with digital computer programs.
Holden-Day. 1.6

Robinson, E. A., 1967b. Statistical communication and detection. Hafner. 25

Robinson, E. A., 1983. Migration of geophysical data. IHRDC. 2.10


BIBLIOGRAFIA 551

Robinson, E. A. e Osman, O. M., editores, 1996. Deconvolution 2. No. 17 em Geophysics


Reprint Series, SEG. 1.6, 3.8

Robinson, E. A. e Treitel, S., 1980. Geophysical signal analysis. Prentice-Hall. 1.4.2, 1.4.3,
1.4.3, 1.6, 3.8

Robinson, J. C., 1979. A technique for continuous representation of dispersion on seismic data.
Geophysics, 44, p. 1245–1351. 2.8.1, 3.3.4, A.2

Rosa, A. L. R., 1976. Extraction of elastic parameters using seismic reflection amplitude with
offset variation. Tese de Mestrado, Universidade de Houston. 2.6.3, 3.7.3, 10

Rosa, A. L. R., Arso, L. R., e Jaegher, R., 1985. Mapping oil-water contact with seismic data
from Campos Basin, offshore Brazil. In 55th SEG Annual International Meeting, Expanded
Abstracts. Washington. 4.3, 4.3.1, 4.3.1

Rosa, A. L. R. e Schinelli, M. C., 1985. Deconvolution tests with deep water experimental data
from Campos Basin, Brazil. In 55th SEG Annual International Meeting, Expanded Abstracts.
Washington. 3.2.4, 3.11, 3.13

Rosa, A. L. R. e Ulrych, T., 1991. Processing via spectral modeling. Geophysics, 56, p.
1244–1251. 23, 2.6.5, 2.8.4, 3.2.8

Rothman, D. H., 1986. Automatic estimation of large residual statics correction. Geophysics,
51, p. 332–346. 3.1.1

Rothman, D. H., Levin, S. A., e Rocca, F., 1985. Residual migration: applications and limita-
tions. Geophysics, 50, p. 110–126. 3.5.4

Rutherford, S. R. e Williams, R. H., 1989. Amplitude-versus-offset variations in gas sands.


Geophysics, 54, p. 680–688. 4.3.2

Schleicher, J., Tygel, M., e Hubral, P., 1993. 3-D true-amplitude finite-offset migration. Geo-
physics, 58, p. 1112–1126. 3.6.3, 3.6.3

Schneider, W. A., 1978. Integral formulation for migration in two and three dimensions. Geo-
physics, 43, p. 49–76. 2.7.1, 24, 3.5, 3.5.2

Schneider, W. A., Grupp, S. R., Guderjahn, C. G., Janak, P. M., Rimmer, D. H., e Sixta, D. P.,
1982. Land seismic source study. In 52th SEG Annual International Meeting, Expanded
Abstracts. Dallas. 3.2.1

Schoenberger, M. e Levin, K., 1974. Apparent attenuation due to intrabed multiples. Geophys-
ics, 39, p. 278–291. 2.8.4, 2.8.4

Schultz, P. S. e Sherwood, J. W. C., 1980. Depth migration before stack. Geophysics, 45, p.
376–393. 3.6.1, 3.6.3

Selby, S. M., 1973. Standard Mathematical Tables. CRC Press, Inc. 3.5.3

Shah, P. M., 1973. Use of wavefront curvature to relate seismic data with subsurface parameters.
Geophysics, 38, p. 812–825. 2.5.1, 2.5.3
552 BIBLIOGRAFIA

Shapiro, S. A., Hubral, P., e Zien, H., 1994. Frequency-dependent anisotropy of scalar waves in
a multilayered medium. Journal of Seismic Exploration, 3, p. 37–52. 2.8.4, 2.8.5

Sharpe, J. A., 1942. The production of elastic waves by explosion pressures I - Theory and
empirical observations. Geophysics, 7, p. 144–154. 2.9.1, 3.2.1

Sharpe, J. A., 1944. The effect of charge size on reflection records. Geophysics, 9, p. 131–142.
2.9.1, 3.2.1

Shatilo, A. P., 1992. Seismic phase unwrapping: methods, results, problems. Geophysical
Prospecting, 40, p. 211–225. 3.2.1

Sheriff, R. E., 1980a. Nomogram for Fresnel-zone calculation. Geophysics, 45, p. 969–971. 2.2.2

Sheriff, R. E., 1980b. Seismic stratigraphy. IHRDC. 4.5

Sheriff, R. E., 1991. Encyclopedic dictionary of exploration geophysics. SEG. 1.6

Sheriff, R. E., editor, 1992. Reservoir geophysics. Investigations in Geophysics 7, SEG. 4.5

Sheriff, R. E. e Geldart, L. P., 1982. Exploration seismology Volume 1 - History, theory and
data acquisition. Cambridge University Press. 1.6, 2.10

Sheriff, R. E. e Geldart, L. P., 1985. Exploration seismology Volume 2 - Data-processing and


interpretation. Cambridge University Press. 1.2.1, 1.6, 2.10

Shuey, R. T., 1985. A simplification of Zoeppritz equations. Geophysics, 50, p. 609–614. 2.6.3,
2.10, 3.7.1

Sixta, D. P., 1982. Comparison and analysis of downgoing waveforms from land seismic sources.
Tese de Mestrado, Colorado School of Mines, Golden. 3.2.1, 13

Slotnick, M. M., 1959. Lessons in Seismic Computing. SEG. Editado por R. A. Geyer. 2.5.2,
2.5.2, 2.5.2, 2.5.2, 3.1.1, 4.4.4

Smith, G. C. e Gidlow, P. M., 1987. Weighted stacking for rock property estimation and
detection of gas. Geophysical Prospecting, 35, p. 993–1014. 4.3, 4.3.2

Spitz, S., 1991. Seismic trace interpolation in the f-x domain. Geophysics, 56, p. 785–794.
1.4.2, 3.1.1

Stoffa, P. L., Fokkema, J. T., Freire, R. M. de L., e Kessinger, W. P., 1990. Split-step Fourier
migration. Geophysics, 55, p. 410–421. 3.5.2, 32

Stolt, R. H., 1978. Migration by Fourier transform. Geophysics, 43, p. 23–48. 3.5, 3.5.2, 3.5.2,
3.5.4

Stolt, R. H. e Benson, A. K., 1986. Seismic Migration. No. 5 em Handbook of Geophysical


Exploration – Seismic Exploration. Geophysical Press. 2.10, 3.8

Swann, H. W., 1993. Properties of direct AVO hydrocarbon indicators. (In Castagna e Backus,
1993). 2.6.3

Sá, O. R. de, 1985. Influência da função refletividade na deconvolução de fase mı́nima. Tese de
Mestrado, UFBa/PPPG, Salvador, Ba. 2.6.5
BIBLIOGRAFIA 553

Taner, M. T. e Koehler, F., 1969. Velocity spectra – digital computer derivation and applications
of velocity functions. Geophysics, 34, p. 859–881. 2.5.2

Taner, M. T. e Koehler, F., 1981. Surface consistent corrections. Geophysics, 46, p. 17–22.
3.1.1, 3.1.1

Taner, M. T., Koehler, F., e Alhilali, K. A., 1974. Estimation and correction of near-surface
time anomalies. Geophysics, 39, p. 441–463. 3.1.1

Taner, M. T., Koehler, F., e Sheriff, R. E., 1979. Complex seismic trace analysis. Geophysics,
44, p. 1041–1063. 7

Tassini, J. e Rosa, A. L. R., 1982. Qualidade dos dados sı́smicos na Bacia do Paraná. Relatório
Técnico, Petrobrás. 2.64, 2.65, 2.8.2

Thigpen, B. B., Dalby, A. E., e Landrum, R., 1975. Special report of the subcomittee on polarity
standards. Geophysics, 40, p. 694–699. 2.9.5

Thomsen, L., 1986. Weak elastic anysotropy. Geophysics, 51, p. 1954–1966. 2.8.5, 2.8.5, 2.8.5,
2.8.5, 3.1.2, 3.1.2

Thorson, J. R. e Claerbout, J., 1985. Velocity stack and slant-stack sthocastic inversion. Geo-
physics, 50, p. 2727–2741. A.1

Tosaya, C., Nur, A., Vo-Thanh, D., e Da Prat, G., Maio de 1987. Laboratory seismic methods
for remote monitoring of thermal EOR. SPE Reservoir Engineering. 4.6

Trad, D. O., Ulrych, T. J., e Sacchi, M. D., 2002. Accurate interpolation with high-resolution
time-variant Radon transforms. Geophysics, 67, p. 644–656. A.1

Treitel, S., 1974. The complex Wiener filter. Geophysics, 39, p. 1276–1289. 1.4.2, 3.1.1

Tribolet, J. M., 1977. A new phase unwrapping algorithm. IEEE Trans. on Acoustics, Speech
and Signal Processing, ASSP-5, p. 170–177. 1.5.2

Tsvankin, I., 1996. P-wave signatures and notation for transversely isotropic media: An over-
view. Geophysics, 61, p. 467–483. 2.8.5

Tsvankin, I. e Thomsen, L., 1994. Nonhyperbolic reflection moveout in anisotropic media.


Geophysics, 59, p. 1290–1304. 2.8.5, 2.8.5

Tygel, M., Schleicher, J., e Hubral, P., 1992. Geometrical spreading corrections of offset reflec-
tions in a laterally inhomogeneous media. Geophysics, 57, p. 1054–1063. 2.5.3, 2.10

Tygel, M., Schleicher, J., e Hubral, P., 1994. Pulse distortion in depth migration. Geophysics,
59, p. 1561–1569. 3.6.1

Tygel, M., Schleicher, J., e Hubral, P., 1996. A unified approach to 3-D seismic reflection
imaging, Part II: Theory. Geophysics, 61, p. 759–775. 3.6.3

Ulrych, T. J., 1971. Application of homomorphic deconvolution to seismology. Geophysics, 36,


p. 650–660. 3.2.1
554 BIBLIOGRAFIA

Ursin, B., 1990. Offset-dependent geometrical spreading in a layered earth. Geophysics, 55, p.
492–496. 2.5.3

Varela, C. L., Rosa, A. L. R., e Ulrych, T. J., 1993. Modeling of attenuation and dispersion.
Geophysics, 58, p. 1167–1173. 3.3.4, 3.3.5, A.2, A.2, A.2

Verm, R. e Hilterman, F. J., 1995. Lithology color-coded seismic sections: The calibration of
AVO crossploting to rock properties. The Leading Edge, 14(8), p. 847–853. 4.3.2

Verschuur, D. J., Hermann, P., Kinneging, N. A., Wapenaar, C. P. A., e Berkhout, A. J., 1988.
Elimination of surface-related multiply reflected and converted waves. In 58th SEG Annual
International Meeting, Expanded Abstracts. 2.8.3, 3.2.1, 3.3.2, 3.3.2

Volker, A. W. F., Blacquière, G., J., Berkhout A., e Ongkiehong, L., 2001. Comprehensive
assessment of seismic acquisition geometries by focal beams – Part II: Practical aspects and
examples. Geophysics, 66, p. 918–931. 46

Walden, A. T., 1991. Wavelet estimation using the multitaper method. Geophysical Prospecting,
39, p. 625–642. 3.2.1, 3.2.4

Walden, A. T. e Hosken, J. W. J., 1985. An investigation of the spectral properties of primary


reflection coeficients. Geophysical Prospecting, 33, p. 400–435. 2.6.5, 2.6.5

Webster, G. M., editor, 1978. Deconvolution. No. 1 em Geophysics Reprint Series, SEG. 1.6,
3.8

Weglein, A. B., Gasparotto, F. A., Carvalho, P. M., e Stolt, R. H., 1997. An inverse-scatttering
series method for attenuating multiples in seismic reflection data. Geophysics, 62, p. 1975–
1989. 2.8.3, 2.10, 3.2.1, 3.3.2, 3.3.2

Weglein, A. B. e Secrest, B. G., 1990. Wavelet estimation for a multidimensional acoustic or


elastic earth. Geophysics, 55, p. 902–913. Erratum - v. 55, p. 1524. 3.2.1

Weglein, A. B. e Stolt, R. H., 1990. The wave physics of wavelet estimation, downward con-
tinuation and surface volume scattering. Notas de Aula, Rio de Janeiro, RJ. 2.7.4, 2.7.4,
3.5.1

Whitmore, N. D., 1983. Iterative depth migration by backward time propagation. In 53th SEG
Annual International Meeting, Expanded Abstracts. Las Vegas. 3.5.3, 3.5.3, 3.5.3

Widess, M. B., 1973. How thin is a thin bed? Geophysics, 38, p. 1176–1254. 4.4.1, 4.5

Wiggins, J. W., 1988. Attenuation of complex water-bottom multiples by wave-equation-based


prediction and subtraction. Geophysics, 53, p. 1527–1539. 3.3.2, 21, 3.3.2

Wiggins, R. A., Larner, K. L., e Wisecup, R. D., 1976. Residual statics analysis as a linear
inverse problem. Geophysics, 41, p. 922–938. 3.1.1

Wiggins, W., 1999. Multiple attenuation by explicit wave extrapolation to an interpreted


horizon. The Leading Edge, 18(1), p. 46–54. 21, 22

Wombell, R., 1996. Water velocity variations in 3-D seismic processing. In 66th SEG Annual
International Meeting, Expanded Abstracts. Denver. 3.1.1
BIBLIOGRAFIA 555

Wylie, C. R., 1975. Advanced Engineering Mathematics. McGraw-Hill. 2.4.1, 2.7.4, 2.7.4, 2.7.4,
3.5.1, A.3

Wyllie, M. R. J., Gregory, A. R., e Gardner, L. W., 1956. Elastic wave velocities in heterogeneous
and porous media. Geophysics, 21, p. 41–70. 4.2

Yilmaz, O., 1987. Seismic Data Processing. Investigations in Geophysics 2, SEG. 3.5.2, 3.5.3,
3.8

Yilmaz, O. e Taner, M. T., 1994. Discrete plane-wave decomposition by least-mean-square-error


method. Geophysics, 59, p. 973–982. A.1

Zhu, F., Gibson, R., e Estill, R., 2001. A critical clay content model of sand-shale mixtures
from log data in the Gulf of Thailand. In 71st SEG Annual International Meeting, Expanded
Abstracts. San Antonio. 4.2.3

Zhu, J. e Lines, L. R., 1997. Implicit interpolation in reverse-time migration. Geophysics, 62,
p. 906–917. 34, 3.6.3

Ziolkowski, W. A., 1991. Why don’t we measure seismic signatures? Geophysics, 56, p. 190–201.
2.9.1, 3.2.1

Ziolkowski, W. A., 1993. Determination of the signature of a dynamite source using source
scaling, Part 1: Theory. Geophysics, 58, p. 1174–1182. 2.9.1, 3.2.1, 3.2.1

Ziolkowski, W. A. e Bokhorst, K., 1993. Determination of the signature of a dynamite source


using source scaling, Part 2: Experiment. Geophysics, 58, p. 1183–1194. 3.2.1

Ziolkowski, W. A., Parkes, G., Hatton, L., e Haugland, T., 1982. The signature of an air gun
array: Computation from near-field measurements including interactions. Geophysics, 47, p.
1143–1421. 2.9.1, 3.2.1, 3.2.1, 11, 2
APÊNDICE

A.1 Empilhamento Oblı́quo


No método sı́smico, é muitas vezes conveniente decompor os dados sı́smicos de forma a destacar
determinadas caracterı́sticas. Este é o caso do empilhamento oblı́quo 1 , também denominado
transformada τ -p, que corresponde a uma versão linear da transformada Radon. No caso,
procura-se reapresentar os traços sı́smicos na forma de diferentes componentes de ondas planas,
cada um deles associado — se o meio for homogêneo — a um único ângulo de propagação.
Em um sismograma convencional, organizado na forma de fonte comum, o empilhamento
oblı́quo consiste em somar amplitudes sı́smicas ao longo de uma reta definida por

t = τ + px (A.1.1)

onde t é o tempo de reflexão, p é o parâmetro de raio, ou vagarosidade horizontal, definido por


dt/dx, x é o afastamento entre a fonte e o receptor e τ é o tempo de interseção, correspondente
à posição da fonte, onde x = 0. Matematicamente, o empilhamento oblı́quo pode ser definido
pela seguinte expressão: Z ∞
s̄(p, t = τ ) = s(x, t = τ + px)dx (A.1.2)
−∞

onde s é o sismograma original e s̄ é o resultado da operação, já no domı́nio τ -p.


Na equação A.1.2, tudo se passa como se o sinal situado no tempo t e no afastamento fonte-
receptor x fosse deslocado na direção da origem, de acordo com o intervalo de tempo τ + px,
para a subseqüente aplicação da integração ao longo do eixo x. O resultado destas operações é
posicionado nas coordenadas (p, τ ). Esta analogia permite aplicar o teorema do deslocamento
da transformada de Fourier e transformar a expressão A.1.2 na seguinte igualdade:
Z ∞ Z ∞ 
1
s̄(p, τ ) = S(x, ω) exp[−iω(τ + px)]dω dx (A.1.3)
2π −∞ −∞

onde S(x, ω) é a transformada de Fourier temporal dos dados sı́smicos em cada posição x. Este
resultado pode ser reescrito da seguinte forma:
Z ∞ Z ∞ 
1
s̄(p, τ ) = S(x, ω) exp(−iωpx)dx exp(−iωτ )dω (A.1.4)
2π −∞ −∞

Nas equações A.1.3 e A.1.4, dois aspectos devem ser destacados. Na primeira delas, a integral
em ω é uma operação que corresponde a obter o valor da transformada inversa de Fourier no
1
“Empilhamento oblı́quo” é uma tradução do termo slant stack (Duarte, 2003), atribuı́do a J. Claer-
bout. Como destaca o próprio Claerbout (1985), a idéia é antiga e envolve, já nos anos 1930, os nomes
dos professores Rieber e Riabinkin. Matematicamente, é um caso particular da transformada proposta
por J. Radon em 1917 e que, mais tarde, recebeu seu nome.

556
A.1. EMPILHAMENTO OBLÍQUO 557

s(x, t) S̃(ωp, ω) s̄(p, τ )


1 RETA PONTO
δ(t − t0 − p0 x) δ(p − p0 ) exp(iωt0 ) δ(τ − t0 )δ(p − p0 )
2 PONTO RETA
δ(t − t0 )δ(x − x0 ) exp[iω(t0 − px0 )] δ(τ − t0 + px0 )
3 HIPÉRBOLE p ELIPSE
p
δ(t − 2t0 / cos θ)δ(x − 2t0 tan θ) exp(iω2t0 1 − p2 v 2 ) δ(τ − 2t0 1 − p2 v 2 )

Tabela .4: Representação matemática da geometria de algumas funções no


domı́nio t-x e as correspondentes respostas nos domı́nios ω-ωp e τ -p.

tempo t = 0, após o deslocamento associado ao termo −τ − px. Já na segunda, percebe-se que
o termo entre colchetes corresponde a uma transformada de Fourier de S(x, ω) ao longo do eixo
x, uma vez que o produto ωp equivale ao número de onda K x (ver a equação 1.2.50).
Sabe-se que a função desejada, s̄(p, τ ), deve ser obtida para valores especı́ficos de p e τ .
Combinando-se estas idéias, pode-se transformar a expressão A.1.4 na seguinte igualdade:
Z ∞
1
s̄(p, τ ) = S̃(ωp, ω) exp(−iωτ )dω (A.1.5)
2π −∞

onde S̃(ωp, ω) corresponde a uma função unidimensional de ω para cada valor especı́fico de p.
Nesta forma, a obtenção de s̄(p, τ ) envolve uma simples transformada inversa de Fourier, ao
longo do eixo ω, de dados sı́smicos representados, no domı́nio ω-K x , em função de p.
Nas aplicações do empilhamento oblı́quo, é conveniente ter em mente a forma como alguns
eventos particulares são tratados no processo. A representação matemática da geometria de
três deles, juntamente com as correspondentes transformadas para os domı́nios ω-ωp e τ -p,
podem ser vistas na Tabela .4. Os resultados apresentados, que foram obtidos com base nas
propriedades da função delta de Dirac e da transformada de Fourier, são resumidos da seguinte
forma: (1) uma reta, no domı́nio t-x, corresponde, no domı́nio τ -p, a um ponto; (2) um ponto,
no domı́nio t-x, corresponde, no domı́nio τ -p, a uma reta; (3) uma hipérbole, no domı́nio t-x,
corresponde, no domı́nio τ -p, a uma elipse.
Na Tabela .4, o caso mais interessante é certamente o da hipérbole, a qual representa a
geometria de uma reflexão horizontal em um meio homogêneo e isotrópico, registrada em um
agrupamento de fonte comum. Trata-se de uma geometria que, para a construção da tabela, foi
parametrizada com base nas equações 2.2.30 e 2.2.31. Nesta forma, o afastamento fonte-receptor
x é dado pelo produto entre a profundidade, vt 0 , e a tangente do ângulo de propagação, θ, cujo
seno é igual ao produto entre o parâmetro de raio e a velocidade, ou seja, pv. Similarmente,
o tempo de reflexão é dado pela razão entre o tempo vertical, 2t 0 , e o cosseno do ângulo de
propagação. Na transformação para o domı́nio ω-ωp, obedeceu-se a uma seqüência de passos
similar à adotada na dedução da equação 2.2.33. Para tornar mais claro o fato de que, no
domı́nio τ -p, o mesmo evento tem geometria de uma elipse, basta elevar ao quadrado o termo
entre parênteses e transformá-lo na seguinte expressão:
 2
τ
+ p2 v 2 = 1 (A.1.6)
2t0
558 APÊNDICE

Tempo de interseção (s)

A
2

3
B

4
0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5
Parâmetro de raio (s/km)

Figura .34: Geometria, no domı́nio τ -p, das reflexões que separam


três camadas horizontais, as duas mais rasas das quais com velocidades
dadas por: v1 = 2000m/s e v2 = 3000m/s. O sı́mbolo • identifica o
evento correspondente ao ângulo de incidência crı́tico na interface mais
rasa.

Este resultado pode também ser convertido em uma versão ida-e-volta da equação iconal, bas-
tando, para isto, dividir os três termos por v 2 e levar em conta que dt/dz = τ /2vt0 .
O caso 3 da Tabela .4 é fundamental para a compreensão de como se distribuem, no domı́nio
τ -p, as reflexões obtidas em um meio no qual a velocidade não varia na direção horizontal.
Para analisar o tema, deve-se observar que, no domı́nio τ -p, o tempo de interseção intervalar,
correspondente a uma camada e a um valor de p, é dado pelo produto entre o intervalo de
tempo de reflexão vertical, 2∆z/v, e o fator cos θ. Aplicando-se esta idéia a uma pilha de N
camadas horizontais, cada uma delas com uma velocidade distinta, pode-se calcular o tempo de
interseção, τN , correspondente à base da camada mais profunda, através da seguinte expressão:
N
X 2∆zn p
τN = τn−1 + 1 − p2 vn2 (A.1.7)
vn
n=1

onde τ0 = 0, enquanto ∆zn e vn são a espessura e a velocidade intervalar da camada n.


Com base na equação A.1.7, conclui-se que, no domı́nio τ -p, a reflexão correspondente à
interface entre cada par de camadas da pilha descrita é representada na forma de uma elipse,
deslocada pelos tempos associados às reflexões sobrejacentes. Pode-se ainda concluir, com base
no caso 1 da Tabela .4, que a onda frontal, gerada no ângulo de incidência crı́tico, é representada
no mesmo domı́nio como um ponto no limite superior da elipse que caracteriza a reflexão a ela
associada. Esta idéia é exemplificada na Figura .34, na qual se vê, no domı́nio τ -p, a geometria
correspondente a duas reflexões que separam três camadas horizontais.
Neste ponto, o leitor poderá estar se perguntando: como transformar os dados do domı́nio
τ -p para o domı́nio t-x? Para isto, parte-se da função S̃(ωp, ω), ou S̃(Kx , ω), à qual se aplica
a transformada inversa bidimensional de Fourier. Neste processo, leva-se em conta que, como
A.1. EMPILHAMENTO OBLÍQUO 559

Kx = ωp, deve-se substituir dKx por ωdp. Considerando ainda a diferença na convenção de
sinal usada nas transformadas de Fourier temporal e espacial, o resultado, obtido com base na
expressão A.1.5, é a seguinte igualdade (ver Claerbout, 1985):
Z ∞ Z ∞ 
1
s(x, t) = S̃(ωp, ω) exp(iωpx)|ω|dp exp(−iωt)dω (A.1.8)
2π −∞ −∞
ou, adotando-se forma similar à da equação A.1.3,
Z ∞Z ∞
1
s(x, t) = S̃(ωp, ω) exp[−iω(t − px)]|ω|dωdp (A.1.9)
2π −∞ −∞
Percebe-se assim que, para se retornar ao domı́nio x-t, deve-se deslocar as amostras s̄(p, τ )
na direção da origem, de acordo com o intervalo de tempo t − px e, em seguida, integrar o
resultado ao longo do eixo dos parâmetros de raio, p. Percebe-se ainda que, no processo de
ida-e-volta entre os domı́nios t-x e τ -p, há necessidade de se aplicar um fator, dado por |ω|,
que atenua os componentes de baixas freqüências enriquecidos pela integração ao longo do eixo
do parâmetro de raio. No domı́nio do tempo de interseção τ , a multiplicação por este fator
equivale à convolução com o chamado filtro “rho”, ou seja, ρ(τ ).
Nas aplicações práticas, o empilhamento oblı́quo e sua transformada inversa são afetados pe-
los seguintes problemas, o primeiro dos quais caracterı́stico das técnicas de migração da famı́lia
Kirchhoff: (1) o chamado “álias do operador” e; (2) o limite lateral dos dados sı́smicos subme-
tidos ao processo. Ambos os problemas podem ser resolvidos com base na minimização do erro
médio quadrático definido em função da diferença entre os dados originais e o correspondente
empilhamento oblı́quo inverso. Esta é a base dos trabalhos de Thorson e Claerbout (1985),
Beylkin (1987) e Yilmaz e Taner (1994).
Levando em conta apenas o efeito de álias, a forma discreta mais simples dos empilhamentos
oblı́quos direto e inverso é descrita, com base nas equações A.1.4 e A.1.8, por
" x #
X max
−1
s̄(p, τ ) = F S(x, ω) exp(−iωpx)∆x (A.1.10)
x=xmin ω≤ωc
e " #
pX
max
−1
s(x, t) = F S̃(ωp, ω) exp(iωpx)|ω|∆p (A.1.11)
p=pmin ω≤ω̄c
onde F −1 denota transformada inversa de Fourier ao longo do eixo ω, ∆x é a distância entre
traços e ∆p é o intervalo entre valores sucessivos de p. Por sua vez, as freqüências angulares ω c
e ω̄c , que representam limites até os quais a operação não envolve o efeito de álias, são dadas
por (ver o Capı́tulo 1 e, em particular, a equação 1.1.9):
π
ωc = (A.1.12)
|p∆x|
e
π
ω̄c = (A.1.13)
|x∆p|
A transformada Radon, apresentada até aqui em sua versão linear — o empilhamento oblı́quo
—, pode ser facilmente generalizada através da substituição da reta τ +px por uma função qual-
quer de tempo de interseção e distância, f (x, τ ). Este é o caso, por exemplo, da transformada
Radon parabólica, de acordo com a qual f (x, τ ) = τ + ax 2 , onde a é uma variável que exerce
papel equivalente ao quadrado da vagarosidade horizontal. É também o caso da transformada
Radon hiperbólica. A primeira delas é normalmente aplicada à atenuação de reflexões múltiplas
(ver Hampson, 1986), enquanto a segunda é aplicável tanto à atenuação de reflexões múltiplas
(Foster e Mosher, 1992), quanto à interpolação de traços sı́smicos (Trad et al., 2002).
560 APÊNDICE

A.2 Versão Alternativa da Compensação Q


Como se afirmou no subitem 3.3.4, a compensação Q baseada no algoritmo de deslocamento
de fase é relativamente lenta. Esta é uma deficiência que pode ser parcialmente contornada
através da aplicação da técnica desenvolvida por Hale (1982) e generalizada por Varela et al.
(1993). Para deduzi-la, parte-se de uma sugestão de Fábio Rocca (Hale, 1982), que consiste em
expandir a expressão 2.8.9 (página 223) na forma de uma série Taylor. Aplicada à compensação
Q, esta expansão é dada por
"   #
πτ 1 πτ 2 2
R(f ) = S(f ) 1 + G(f ) + G (f ) + · · · (A.2.1)
Q 2! Q

onde τ é o equivalente em tempo da profundidade, Q é o fator de qualidade, enquanto S e R


são as transformadas de Fourier do traço sı́smico antes e depois da correção da absorção. Por
sua vez, a função G é definida por
2f f
G(f ) = f + i ln (A.2.2)
π f0
onde f0 é a freqüência de referência (ver o subitem 3.3.4).
Na transformada inversa de Fourier da equação A.2.1, a variável τ não é afetada, uma
vez que corresponde ao equivalente em tempo da profundidade. Entretanto, já no domı́nio do
tempo, a mesma variável pode ser substituı́da pelo tempo de reflexão, o qual é preferencialmente
expresso pelo dobro da razão entre a profundidade e a velocidade, ou pelo tempo vertical medido
em dados migrados. Com esta providência, obtém-se, como resultado, a seguinte expressão:
 
πt 1 πt 2
rt = s t + (st ∗ gt ) + (st ∗ gt ∗ gt ) + · · · (A.2.3)
Q̄t 2! Q̄t
onde t corresponde ao ı́ndice da amostra, r t , st e gt são as formas discretas das transformadas
inversas de Fourier das funções R, S e G, enquanto ∗ denota convolução ao longo do eixo do
tempo.
Na expressão A.2.3, a série Q̄t é uma versão efetiva do fator de qualidade, correspondente,
em cada amostra t, a uma média harmônica dos valores intervalares das camadas sobrepostas.
Ou seja, aplica-se ao caso a seguinte expressão:
t
1 1X n
= (A.2.4)
Q̄t t n=1 Qn

onde n é o ı́ndice da amostra e Q é o correspondente valor intervalar do fator de qualidade.


Reside na forma da função discreta g t a diferença entre os trabalhos de Hale (1982) e de
Varela et al. (1993). No primeiro, gt é uma função de fase mı́nima digital e, portanto, tem
espectro de fase controlado pela freqüência de Nyquist. Matematicamente, é descrita, com base
na teoria apresentada no item 1.5.3, pela seguinte forma analı́tica:

gt = 2at ut (A.2.5)

onde ut é a versão discreta da função degrau e t é o ı́ndice da amostra. Por sua vez, a t
corresponde à transformada inversa de Fourier da função f , obtida no intervalo de freqüências
entre −1/2∆t e 1/2∆t, para ∆t igual a 1. O resultado é:
 
−1 1 sen πt cos πt − 1
at = F (f ) = + (A.2.6)
2 πt π 2 t2
A.3. MELHORANDO O ALGORITMO IMPLÍCITO 561

Pode-se, assim, definir gt da seguinte forma2 :


 1
 4 , para t = 0


gt = 2 (A.2.7)
− , para t = +1, t = +3, t = +5 . . .
 π t22


0, para os demais valores de t

No caso do trabalho de Varela et al. (1993), a forma original da função G, dada pela expressão
A.2.2, é integralmente respeitada. A correspondente transformada inversa de Fourier é uma
expressão analı́tica relativamente mais complicada do que a equação A.2.5, embora também
baseada na função discreta at . Dificuldades de ordem numérica na sua manipulação fazem com
que a opção mais indicada consista em obtê-la através de algoritmos de janelamento aplicados
em conjunto com a transformada de Fourier (ver, por exemplo, Oppenheim e Schafer, 1989).
Do ponto de vista teórico, a principal vantagem da opção adotada por Varela et al. (1993),
em relação à proposta por Hale (1982), é a possibilidade de se aplicar uma compensação Q mais
rigorosa, uma vez que a dispersão passa a ser estimada com base no modelo de Robinson (1979)
e não mais na “camisa de força” digital. Por outro lado, seria possı́vel dizer que, se f 0 fosse
igual à freqüência de Nyquist, as funções g t obtidas nos dois casos seriam iguais. Na verdade,
esta é apenas uma aproximação que, como mostraram Varela et al. (1993), se aplica melhor nas
freqüências intermediárias a baixas, incluindo as vizinhanças das freqüências de pico tı́picas.
Independentemente da forma da função discreta g t , a expressão A.2.3 permite tratar a com-
pensação Q como um processo virtualmente contı́nuo, uma vez que a função Q̄t pode ser definida
em qualquer ı́ndice de tempo. Permite ainda tratar isoladamente as distorções introduzidas pela
atenuação e pela dispersão, bastando, para isto, escolher a forma apropriada para a função g t .
Assim, quando se deseja corrigir apenas a atenuação, g t é igual a at . No caso em que se deseja
corrigir apenas a dispersão, gt é dada pela transformada inversa de Fourier de i2f ln(f /f 0 )/π.
Nas aplicações práticas da técnica descrita, há necessidade de se estimar qual é o número de
termos da equação A.2.3 que possibilita a melhor razão custo/benefı́cio. Este é um parâmetro
que pode ser obtido com base na convergência da série descrita pela equação A.2.1 e que,
tipicamente, é menor do que 50. Outro problema diz respeito à estabilidade numérica da
equação A.2.3, particularmente nos altos valores da razão t/Q (da ordem de 0.05 para cima).
Neste caso, a solução consiste em aplicar a compensação Q em cascatas, cada uma delas com
um valor de Q intervalar dado por Qc = N Q, onde N é o número de cascatas e Q c é o valor
de Q em cada cascata. Um exemplo: para N = 2 e Q = 100, o processo é aplicado duas vezes,
sendo que na segunda vez, a compensação Q é aplicada sobre o resultado da primeira e, em
ambas, o valor original de Q é substituı́do por Q c = 200.

A.3 Melhorando o Algoritmo Implı́cito


No subitem 3.5.3, discutiram-se alguns problemas associados à migração por diferenças finitas
baseada no algoritmo implı́cito. Existem diversas técnicas voltadas para resolver ou contornar
estes problemas, todas elas dedicadas a aumentar a eficácia do termo das difrações, D, cuja
forma exata é dada, no domı́nio ω-K x , por
 
∆z
D(Kx , ∆z, ω) = exp iω (1 − cos θ) (A.3.1)
v
2
Para t = 0, o termo entre parênteses da expressão A.2.6 é igual a 1/2, o que se demonstra multipli-
cando e dividindo a segunda razão envolvida por cosπt + 1 e levando em conta que sen πt/πt = 1.
562 APÊNDICE

Sabe-se que, no domı́nio ω-Kx , a velocidade não pode variar lateralmente, o que leva à
necessidade de se transformar a expressão A.3.1 para o domı́nio ω-x, onde esta dificuldade não
existe. Na tarefa correspondente, esbarra-se na presença do fator cos θ, o qual envolve uma
raiz quadrada (ver a equação 3.5.45). Uma solução elegante para este problema, proposta por
Francis Muir (in Claerbout, 1985), consiste em expandir o fator cos θ através da técnica das
frações contı́nuas3 . Aplicada ao caso, esta expansão é definida pela seguinte expressão:

S2
Cn+1 = 1 − (A.3.2)
1 + Cn
onde C é a aproximação de cos θ e
vKx
S = sen θ = (A.3.3)
ω
A expressão A.3.2 corresponde a uma recorrência, ou seja, cada aproximação é determinada
em função da anterior. Assim, a aproximação de 15 graus, dada pela equação 3.5.45 e represen-
tada por C1 , é obtida tomando-se C0 = 1. O segundo termo da recorrência, que corresponde
a C2 , é estimado através da substituição, na equação A.3.2, da expressão correspondente a C1 .
O resultado é:
S2
cos θ ∼= C2 = 1 − (A.3.4)
2 − 1/2S 2
A aplicação da aproximação A.3.4 à equação A.3.1 leva ao chamado algoritmo de 45 graus.
No caso, tem-se a seguinte expressão:
  " !#
∆z ∆z Ŝ 2
exp iω (1 − cos θ) ∼= exp iω (A.3.5)
v v 2 − 1/2Ŝ 2

Nesta expressão, Ŝ é uma aproximação do seno do ângulo θ, dada por

v K̂x
Ŝ = (A.3.6)
ω
onde K̂x é definido com base na expressão 3.5.57.
Conforme demonstraram Lee e Suh (1985), a equação A.3.5 pode ser escrita de uma forma
mais geral, que inclui tanto a aproximação de 45 graus, quanto outras de mais alta, ou mais
baixa, ordem. O resultado é dado por
  Y N
" !#
∆z ∆z α Ŝ 2
n
exp iω (1 − cos θ) ∼= exp iω
v n=1
v 1 − βn Ŝ 2
ou !
  N 2
∆z ∆z X α n Ŝ
exp iω (1 − cos θ) ∼= exp iω (A.3.7)
v v 1 − βn Ŝ 2
n=1
onde α e β são constantes que dependem da ordem da aproximação N . Assim, para N igual
a 1, se α for igual a 1/2 e β a 0, tem-se o algoritmo de 15 graus. Se, por outro lado, para N
também igual a 1, α for igual a 1/2 e β a 1/4, tem-se o algoritmo de 45 graus.
Observe-se que a expressão A.3.7 pode ser analisada na forma de um problema numérico,
de acordo com o qual se procura estimar diferentes valores, para α k e βk , que permitam reduzir
3
Outra solução, baseada em expansão Taylor, faz parte da técnica explı́cita desenvolvida por Hale
(1991b).
A.3. MELHORANDO O ALGORITMO IMPLÍCITO 563

Algoritmo α1 β1 α2 β2
150 0.500000000 0.000000000 - -
450 0.500000000 0.250000000 - -
650 0.478242060 0.376369527 - -
800 0.040315157 0.873981642 0.457289566 0.222691983

Tabela .5: Valores de α e β, para as quatro primeiras versões do


algoritmo implı́cito (Lee e Suh, 1985).

o erro da estimativa do ângulo θ, estimativa esta implı́cita na migração. Neste caso, o objetivo
é o de determinar os N valores dos dois parâmetros de tal forma que, no intervalo entre zero e
noventa graus, a diferença entre o ângulo real e o estimado no processo seja a menor possı́vel.
No mesmo intervalo, a posição em que o erro, ou a diferença entre os dois ângulos, é igual a zero,
para uma freqüência temporal também igual a zero, define a ordem da aproximação. Assim,
por exemplo, no caso do algoritmo de 45 graus, o ângulo estimado torna-se igual ao real quando
este atinge 45 graus. Observe-se que, neste caso, o erro estimado também leva em conta todas
as aproximações das derivadas espaciais, diferentemente da equação 3.5.45, a qual considera
apenas o erro associado ao ângulo θ.
Tratada na forma de um problema numérico, a equação A.3.7 torna possı́vel, ainda fixando-
se o valor de N em 1, obter o algoritmo de 65 graus. Para a obtenção de resultados de mais
alta ordem, deve-se empregar um valor de N superior a 1, o que leva a diferentes valores de α
e β. Na Tabela .5, pode-se ver os resultados obtidos por Lee e Suh (1985) até o caso em que N
é igual a 2.
Na migração de dados sı́smicos feita com base nas equações A.3.7 e 3.5.61, ordens N maiores
do que 1 significam que o campo atrasado Q é extrapolado mais de uma vez em cada intervalo
de profundidade ∆z, cada uma delas com um par diferente de valores para α e β. Assim, no
caso em que N é igual a 2, o que corresponde ao algoritmo de 80 graus, aplica-se duas vezes a
equação 3.5.61, sem o termo das lentes finas entre elas. Ou seja, os dados de saı́da da primeira
aplicação correspondem aos dados de entrada da segunda aplicação, cujo resultado deve ser
submetido ao efeito do termo das lentes finas.
Observe-se que, até agora, nada foi feito para melhorar a qualidade da derivada segunda
com relação à coordenada espacial, x, cuja transformada de Fourier é baseada na equação
3.5.57. Para aprimorá-la, a alternativa aparentemente mais lógica consistiria na substituição
do operador definido pela expressão 3.5.55 por uma versão de melhor qualidade, que inclua
maior número de coeficientes. Para se obter a forma desejada, faz-se uso da fórmula Gregory-
Newton para interpolação (ver Wylie, 1975, página 124), a qual, aplicada ao caso, leva à seguinte
expansão:

∂2 δ2 ∆x2 δ 4
= − + ··· (A.3.8)
∂x2 δx2 12 δx4

onde δ 4 /δx4 é a autoconvolução do operador δ 2 /δx2 , o qual é dado por (1, −2, 1) / ∆x2 .
A utilização de um operador de derivada com maior número de pontos do que 3, obtido
ou não com base na expressão A.3.8, apresenta um grande inconveniente: a matriz A, na
equação 3.5.61, deixa de ser tridiagonal, o que faz com que se reduza bastante a velocidade
de computação da migração implı́cita. Para contornar esta dificuldade, pode-se fazer uso da
564 APÊNDICE

seguinte aproximação da equação A.3.8 (ver Claerbout, 1985):

δ2
∂2 ∼ δx2
= (A.3.9)
∂x2 δ2
1+ b∆x2
δx2
onde b é uma variável que, na forma original, é dada pela razão 1/12. O efeito prático de b é o
de compensar a ausência de termos de mais alta ordem, na expansão do operador de derivada
segunda.
Para se obter, no domı́nio ω-Kx , a expressão equivalente à equação A.3.9, aplica-se o teorema
da derivada (ver o item 1.2) à série A.3.8 e, em seguida, adota-se a aproximação A.3.9, o que
leva à seguinte expressão:
   
2 Kx ∆x
sen
ˆ2 4  2 
K̂x =     (A.3.10)
∆x2  K x ∆x 
1 − 4b sen 2
2

ˆ
onde K̂x2 é a aproximação de segunda ordem para K x .
Com as equações A.3.10 e A.3.7, criam-se condições para melhorar a qualidade do termo
das difrações. No caso do algoritmo implı́cito, a combinação das duas equações com a expressão
3.5.58 leva ao seguinte resultado:
 
∆z

∆z
 1 + iK̂z
exp iω (1 − cos θ) ∼
=
 2  (A.3.11)
v ∆z 
1 − iK̂z
2
onde
N ˆ
ω X αn Ŝ 2
K̂z =
v n=1 1 − β Ŝˆ2
n

ˆ
Nesta expressão, o termo Ŝ 2 é dado por

ˆ
ˆ v 2 K̂x2
Ŝ 2 =
ω2
ˆ
onde K̂x2 é definido pela expressão A.3.10.
De acordo com Claerbout (1985), a escolha de um valor apropriado para b, como 1/6, pode
melhorar substancialmente a aproximação descrita pela equação A.3.11. A mesma idéia foi
aprofundada por André R. Rosa e Jairo Panetta, em 1990, através de um trabalho não publicado.
Neste trabalho, pôde ser demonstrado que, no domı́nio da freqüência, se for usado um valor de
b para cada razão ω/v, é possı́vel um ajuste ainda melhor entre K x e sua aproximação. Foi
também possı́vel demonstrar que, para cada ângulo θ e cada razão ω/v, existe um valor de b que
torna a equação A.3.11 virtualmente exata. Isto significa que, no caso de um meio homogêneo
e isotrópico, uma reflexão plana pode ser corretamente migrada com qualquer uma das versões
do algoritmo implı́cito (mesmo a de 15 graus). Para isto, basta usar o valor adequado para b.
Na forma geral da equação A.3.11, o parâmetro b é estimado através da aplicação de métodos
numéricos iterativos. Entretanto, no caso particular do algoritmo de “15 graus”, para o qual
A.3. MELHORANDO O ALGORITMO IMPLÍCITO 565

α = 1/2 e β = 0, é possı́vel obter uma forma explı́cita para a definição do valor de b, para cada
ângulo de mergulho, θ e cada razão ω/v. O resultado é:
r !
1 K̂x2 ∆z 1 + R
b(θ, k) = 1− (A.3.12)
K̂x2 ∆x2 4k 1−R

onde k = ω/v,
R = cos [k∆z(1 − cos θ)]
e  
4 ∆x
K̂x2 = sen 2 k sen θ
∆x2 2
Ressalte-se que, nas vizinhanças de θ = 0, o valor de b não afeta a extrapolação, já que na
mesma situação, Kx tende a zero.
Sabe-se bem que, em uma seção sı́smica, existem múltiplos eventos com diferentes ângulos
de mergulho, o que leva à necessidade de se estimar diferentes valores de b para cada razão
ω/v e, em conseqüência, a uma impossibilidade prática de aplicar todo o potencial da expressão
A.3.12. Esta dificuldade é contornada utilizando-se um único valor de b para cada razão ω/v
e toda a faixa de possı́veis ângulos de mergulho (entre 0 e o máximo valor sem a influência do
efeito de álias espacial). Neste caso, o valor de b é estimado através de técnicas fundamentadas
na minimização do erro dos ângulos de mergulho. Pode-se ainda aplicar ponderação que reforce
a importância dos ângulos estatisticamente representativos.
A eficiência da técnica descrita pode ser bem demonstrada no caso do algoritmo de “15
graus”, o qual é transformado por ela em um algoritmo de 50 graus. Observa-se, além disso,
que o erro médio, na estimativa implı́cita dos ângulos de mergulho, é substancialmente menor do
que o observado na técnica convencional, levando a resultados práticos muito superiores. Deve-
se ainda mencionar que a forma elı́ptica, caracterı́stica do operador de 15 graus, é substituı́da,
na versão de 50 graus, por uma geometria cardióide, semelhante à observada no algoritmo de
65 graus. No caso dos demais algoritmos, a técnica descrita leva a resultados também melhores
do que as versões convencionais, embora os ângulos de mergulho com erro igual a zero se
mantenham iguais. Ou seja, no caso, as denominações dos algoritmos devem ser mantidas.
Mesmo com todas as alterações descritas, a migração com o algoritmo implı́cito é aplicada,
no domı́nio ω-x, através de uma expressão similar à 3.5.61, dada por

AQz+∆z = BQz (A.3.13)

Nesta expressão, as matrizes A e B são também tridiagonais mas, em relação à equação 3.5.61,
os correspondentes elementos são diferentes. A diagonal principal da nova versão da matriz A
é definida por a − 2ab − 2c + 1 e as diagonais superior e inferior são dadas por ab + c − 1/2. O
parâmetro b foi definido com base na expressão A.3.10, ou A.3.12, e a e c são dados por

iω∆x2
a= (A.3.14)
αv∆z
e
ivβ
c= (A.3.15)
αω∆z
Por sua vez, a nova versão da matriz B tem sua diagonal principal dada por a − 2ab − 2c − 1,
enquanto as diagonais superior e inferior são dadas por ab + c + 1/2.
Até agora, analisaram-se temas exclusivamente relacionados com a dispersão numérica do
algoritmo implı́cito. Um aspecto adicional a discutir é a geração de eventos falsos associados
566 APÊNDICE

aos limites dos dados sı́smicos. No caso do limite temporal, o principal problema é a geração
do chamado wraparound, fenômeno este causado por qualquer processo que, no domı́nio da
freqüência, aumente artificialmente o comprimento dos dados sı́smicos, além do máximo previsto
durante o cálculo da transformada de Fourier (ver o item 1.2). Assim, no caso da migração feita
no domı́nio ω-x, eventos de amplitude anômala, situados junto a t = 0, podem, quando mal
resolvidos, gerar artefatos que, na seção resultante, aparecem nas maiores profundidades. A
solução mais simples para este problema consiste em acrescentar zeros após o final dos dados
sı́smicos, o que equivale à criação de uma região de acomodação dos artefatos.
Um problema um pouco mais sério é o das bordas laterais. A este respeito, sabe-se que, para
qualquer algoritmo de migração de dados sı́smicos, as descontinuidades podem levar à geração
de eventos falsos que se misturam aos refletores reais (um exemplo: os “sorrisos”). No caso das
bordas das seções sı́smicas, existem diversas técnicas para controlar o fenômeno, a mais simples
das quais envolve a expansão lateral do campo de velocidades de migração e a repetição dos
traços sı́smicos situados nas bordas, acompanhada de redução gradual nos valores de ambos.
Uma vez que esta solução aumenta o tempo de computação e nem sempre é eficaz, opta-se pela
alteração local da própria equação da onda. Isto é feito através da modificação dos valores
situados nos dois extremos das diagonais principais das matrizes A e B da equação A.3.13.
Para ilustrar a técnica de uma forma mais simples, recorre-se à expressão 3.5.61, através da
qual se obtém a seguinte igualdade, neste caso aplicável à extremidade direita do eixo x (ver
Claerbout, 1985):
 
1 1−γ
− 2 Q(x, z + ∆z, ω) + a + Q(x + ∆x, z + ∆z, ω) =
 2 
1 1−γ
2 Q(x, z, ω) + a − 2
Q(x + ∆x, z, ω)

onde a é dado pela expressão 3.5.63 e γ é a variável responsável pela absorção dos eventos
gerados nas bordas, na medida em que possibilita combinar o último traço sı́smico com ele
mesmo (observe-se que, se γ = −1, nenhuma atenuação é aplicada na borda). Transformando
este resultado em derivadas com relação aos eixos espaciais e substituindo-se a pela expressão
correspondente, obtém-se a seguinte equação da onda:

∂Q γvQ v ∂Q
= 2
− (A.3.16)
∂z 2iω∆x 2iω∆x ∂x
Ressalte-se que, na dedução desta equação, desconsiderou-se a influência da técnica Crank-
Nicolson. A relação de dispersão correspondente é uma função complexa dada por

γv vKx
iKz = 2

2iω∆x 2ω∆x
Considere-se agora que γ seja igual ao fator 1−exp(iω∆x/2v), o qual equivale à transformada
de Fourier da função associada a uma espécie de fantasma, gerado com atraso controlado por
∆x. No caso em que γ é aproximado por iω∆x/2v, a relação de dispersão obtida corresponde
ao seguinte operador:  
∆z ∆z sen θ
exp(iKz ∆z) = exp − −
4∆x 2∆x
Observe-se que este resultado equivale a um operador de absorção, que atenua a geração artificial
de reflexões nas bordas laterais dos dados sı́smicos. Esta é uma afirmação baseada no fato de
que o módulo de sua amplitude é sempre menor do que 1. Observe-se ainda que a atenuação é
proporcional ao ângulo de propagação e à razão ∆z/∆x.
A.4. OBTENÇÃO DOS PARÂMETROS DE AVO 567

A.4 Obtenção dos Parâmetros de AVO


Na discussão sobre a técnica AVO, apresentada no subitem 3.7.1, propôs-se o seguinte problema:
como obter valores dos parâmetros de AVO, a partir de medidas de amplitude em função do
ângulo de incidência? Considere-se inicialmente a técnica ABC, através da qual se procura, com
base na equação 3.7.1, estimar A, B e C. Para isto, minimiza-se o erro definido pela seguinte
função, aplicada a n valores de amplitude obtidos em um mesmo tempo de reflexão vertical,
cada um deles associado a um ângulo de incidência:
n
X 2
I= ak − A − B sen 2 θ̄k − C sen 2 θ̄k tan 2 θ̄k (A.4.1)
k=1

onde ak é a amplitude correspondente ao ângulo de incidência θ̄k , medida em cada tempo de


reflexão de um agrupamento CMP, após correção de NMO, ou em cada profundidade de uma
famı́lia CI (do inglês Common Image), após migração pré-empilhamento.
Derivando-se a função de erro I com relação aos parâmetros A, B e C e igualando-se os
resultados a zero, obtêm-se as equações normais e, partir delas, os valores de A, B e C. As mes-
mas equações podem também ser resolvidas através do recurso a três diferentes empilhamentos
parciais dos agrupamentos de traços sı́smicos usados no processo. Aplica-se ao caso a seguinte
seqüência de processamento:
1. Os traços sı́smicos de cada agrupamento CI, ou CMP, são separados em três partes, de
acordo com o seguinte critério:
1
(a) os traços próximos, do afastamento x min até xN = 3 (xmax + xmin );
2
(b) os traços intermediários, do afastamento x N até xM = 3 (xmax + xmin );
(c) os traços afastados, do afastamento x M até xF = xmax ;

onde xmin e xmax correspondem aos afastamentos fonte-receptor mı́nimo e máximo para
cada amostra, o segundo dos quais é normalmente controlado pelo silenciamento (mute)
externo.

2. Os três conjuntos de traços sı́smicos obtidos na etapa anterior são empilhados separada-
mente, o que leva à geração de três traços médios, denominados N , M e F e definidos,
para cada valor do tempo de propagação vertical, ou de profundidade, por
1 X 
N= A + B sen 2 θ̄N + C sen 2 θ̄N tan 2 θ̄N = A + BSN + CQN , (A.4.2)
J
θ̄N

1 X 
M= A + B sen 2 θ̄M + C sen 2 θ̄M tan 2 θ̄M = A + BSM + CQM (A.4.3)
K
θ̄M
e
1 X 
F = A + B sen 2 θ̄F + C sen 2 θ̄F tan 2 θ̄F = A + BSF + CQF (A.4.4)
L
θ̄F

onde, no intervalo de traços sı́smicos indicado pelo subscrito, S N , SM e SF representam


médias dos quadrados do seno do ângulo de incidência, enquanto Q N , QM e QF represen-
tam médias dos produtos entre o quadrado do seno e da tangente do ângulo de incidência.
Por sua vez, J, K e L representam o número de amostras somadas em cada tempo, ou
profundidade. De acordo com a etapa 1, J = K = L, o que faz com que os três traços
tenham razão sinal-ruı́do similar.
568 APÊNDICE

3. As amostras dos traços A, B e C são calculadas com as seguintes expressões:


(M SF − F SM ) − RSQ (N SM − M SN )
A= , (A.4.5)
(SF − SM ) − RSQ (SM − SN )

(F − M ) − RQ (M − N )
B= (A.4.6)
(SF − SM ) − RQ (SM − SN )
e
(F − M ) − RS (M − N )
C= (A.4.7)
(QF − QM ) − RS (QM − QN )
onde
SF − S M QF − Q M QF SM − Q M SF
RS = , RQ = e RSQ =
SM − S N QM − Q N QM SN − Q N SM

Considere-se agora a técnica ĀB̄, através da qual se procura, com base na equação 3.7.2,
obter os parâmetros Ā e B̄, ou interseção e gradiente. Neste caso, o problema se reduz ao de uma
regressão linear simples, já que apenas duas incógnitas estão envolvidas e as amplitudes sı́smicas
podem ser descritas exclusivamente em função do quadrado do seno do ângulo de incidência.
As duas incógnitas podem também ser estimadas através do recurso a dois empilhamentos
parciais dos dados sı́smicos, adotando-se seqüência de processamento similar à da técnica ABC.
Seguem-se, no caso, os seguintes passos:

1. Os traços sı́smicos de cada agrupamento CI, ou CMP, são separados em duas partes, de
acordo com o seguinte critério:
1
(a) os traços próximos, do afastamento x min até xN = 2 (xmax + xmin );
(b) os traços afastados, do afastamento x N até xF = xmax .

onde, como no caso da técnica ABC, x min e xmax correspondem aos afastamentos fonte-
receptor mı́nimo e máximo para cada amostra, o segundo dos quais é normalmente con-
trolado pelo silenciamento (mute) externo.

2. Os dois conjuntos de dados resultantes são empilhados separadamente, o que leva à


geração de dois traços sı́smicos, denominados N e F e definidos, para cada valor do
tempo de propagação vertical, ou de profundidade, por
1 X 
N= Ā + B̄ sen 2 θ̄N = Ā + B̄SN (A.4.8)
J
θ̄N

e
1 X 
F = Ā + B̄ sen 2 θ̄F = Ā + B̄SF (A.4.9)
K
θ̄F

onde, no intervalo de traços sı́smicos indicado pelo subscrito, S N e SF representam médias


dos quadrados do seno do ângulo de incidência, enquanto J e K representam o número
de amostras somadas em cada tempo, ou profundidade. De acordo com o passo 1, J = K.
Como foi dito na descrição da técnica ABC, esta providência garante maior homogenei-
dade na razão sinal/ruı́do dos dois traços sı́smicos parcialmente empilhados.

3. As amostras dos traços Ā e B̄ são calculadas com as seguintes expressões:


N SF − F S N
Ā = (A.4.10)
(SF − SN )
A.5. ESTIMATIVAS DO ÂNGULO DE INCIDÊNCIA 569

e
F −N
B̄ = (A.4.11)
(SF − SN )

Resta discutir a técnica ĀD̄, através da qual se procura, com base na equação 3.7.3, estimar
os parâmetros Ā e D̄. Neste caso, a função que define o erro a minimizar é dada por
n
X  2
I= ak − Ā(1 + tan 2 θ̄) − D̄ sen 2 θ̄k (A.4.12)
k=1

Na solução desta equação, pode-se adotar o mesmo esquema empregado na obtenção dos parâ-
metros Ā e B̄, o que significa a possibilidade se trabalhar com o resultado de dois empilhamentos
parciais. Neste caso, Ā e D̄ são dados por

N SF − F S N
Ā = (A.4.13)
SF (1 + TN ) − SN (1 + TF )
e
F (1 + TN ) − N (1 + TF )
D̄ = (A.4.14)
SF (1 + TN ) − SN (1 + TF )
onde S já foi definido e T representa a média do quadrado da tangente de θ̄ nos intervalos de
afastamento fonte-receptor indicados pelos subscritos.

A.5 Estimativas do Ângulo de Incidência


Em muitas circunstâncias, pode-se obter estimativas razoáveis do ângulo de incidência, com
base nos princı́pios adotados na técnica CDP, em particular quando as camadas são horizontais
e a velocidade varia apenas na direção vertical. Neste caso, o ângulo de incidência pode ser
computado com base na expressão que define a vagarosidade horizontal na equação 3.1.1, a qual
é dada por dt/dx, ou seja,
dt x
= 2 (A.5.1)
dx vE t
onde vE é a velocidade de empilhamento e t é o tempo no afastamento fonte-receptor x. Com
base na teoria discutida no item 2.1, esta expressão permite estimar o ângulo de incidência
através de:  
−1 vx
θ = sen 2 (A.5.2)
tvE
onde v é a velocidade intervalar do meio em que a onda incide. Uma expressão alternativa a
esta é a seguinte:
 
2 v2 t20
sen θ = 2 1 − 2 (A.5.3)
vE t
onde t0 é o tempo vertical.
O ângulo de incidência pode também ser relacionado às interfaces superiores, através da
relação seguinte, válida para camadas horizontais:

N
!
Y vn
senθN +1 = sen θ0 (A.5.4)
vn−1
n=1
570 APÊNDICE

onde o subscrito N + 1 se refere à interface em estudo e θ 0 é o ângulo de emergência do sinal


na superfı́cie. Por sua vez, θ0 pode ser obtido através da expressão A.5.2, substituindo-se a
velocidade v pela velocidade intervalar da camada superficial.
As expressões aproximadas que definem o ângulo de incidência podem ser melhoradas se a
velocidade de empilhamento, vE , for substituı́da por uma velocidade dependente do afastamento
fonte-receptor, como a implı́cita na equação 3.1.19. Estimativas ainda mais precisas podem
ser obtidas no contexto da migração pré-empilhamento dos dados sı́smicos. Em particular,
o conceito de fase estacionária (Bleistein, 1984) fornece condições para, com uma pequena
manipulação da integral de Kirchhoff, permitir a obtenção de uma estimativa do ângulo de
incidência nas interfaces entre camadas (ver Bleistein, 1987).
Uma forma relativamente simples de se entender a técnica proposta por Bleistein se baseia
nos princı́pios de Huygens e Fermat. Neste sentido, pede-se ao leitor que analise a Figura 2.33,
na página 128. Na figura, percebe-se que as difrações se combinam para gerar uma reflexão
nas posições em que a lei da reflexão é respeitada. Uma percepção um pouco mais abrangente
pode ser extraı́da da combinação entre as partes alta e baixa da Figura 2.58 (página 221). No
caso, o respeito à lei da reflexão, inerente ao princı́pio de Huygens, faz com que a amplitude
da reflexão obtida seja proporcional ao coeficiente de reflexão estimado no ângulo de incidência
correto.
Pode-se extrapolar esta idéia até o ponto de se afirmar que as informações “carregadas” pelas
difrações, na posição correspondente ao chamado ponto de fase estacionária (caracterizado com
base no princı́pio de Fermat), são respeitadas pela integral de Kirchhoff, enquanto as situadas
nas demais posições são atenuadas. Ou seja, todos os fatores que, na difração, ponderam o
sinal gerado nas condições em que a lei da reflexão é respeitada, são transferidos para a reflexão
obtida.
Esta linha de raciocı́nio, combinada com a migração de dados sı́smicos, foi generalizada
mais recentemente por Bleistein, de forma a permitir diversas aplicações 4 . No caso particular
do ângulo de incidência, a técnica pode ser resumida pela seguinte expressão (ver o item 3.6):
PP
[ cos θAp0 (x, y, z = 0, h0 , t = τ )] ∆x∆y
y x
cos θ0 (x0 , y0 , z0 , h0 ) = P P (A.5.5)
[Ap0 (x, y, z = 0, h0 , t = τ )] ∆x∆y
y x

onde θ0 é o ângulo de incidência correspondente ao refletor e θ é o ângulo de incidência no difra-


tor5 . Entre os demais elementos da equação, A envolve a correção do espalhamento geométrico
da energia e o fator de obliqüidade, p 0 representa a derivada, com relação ao tempo, dos dados
sı́smicos registrados no afastamento fonte-receptor 2h 0 e τ corresponde à soma dos tempos entre
a fonte e o difrator (τs ) e entre este e o receptor (τg ). Por sua vez, x e y são as coordenadas do
ponto médio entre a fonte e o receptor que iluminam o difrator.
O leitor já familiarizado com a migração Kirchhof poderá identificar, no numerador da
equação A.5.5, a extrapolação inversa do sinal sı́smico ponderado pelo cosseno do ângulo de
incidência e, no denominador, a mesma extrapolação sem ponderação. Com o fim de evitar
problemas numéricos, a equação A.5.5 deve ser transformada, por exemplo, em uma divisão entre
dois valores de amplitude instantânea, precedida de filtragem que atenue comprimentos de onda
4
Entre estas aplicações, inclui-se a obtenção das velocidades de migração a partir das velocidades de
empilhamento. Uma rotina com esta finalidade foi desenvolvida, na Petrobrás, por Eduardo Filpo.
5
O ângulo θ é definido com base na bissetriz do ângulo formado pelos raios que abandonam o difrator
na direção da fonte e do receptor. Isto significa que, na aplicação da equação, o ângulo de incidência varia
ao longo da difração (ver a Figura 2.57, na página 214). Por outro lado, admite-se que esta variação é
pouco afetada pelo tempo de percurso, ou seja, a derivada ∂ cosθ/∂t tende a zero.
A.6. MODELOS DE PULSO SÍSMICO 571

não amostrados nas análises de velocidade, para o quê é necessário obter um conjunto sucessivo
de sinais inversamente extrapolados, ou migrados. Em qualquer caso, o aspecto importante a
destacar é que a mesma expressão pode ser vista como uma aplicação adicional dos princı́pios
de Huygens e Fermat.

A.6 Modelos de Pulso Sı́smico


No subitem 3.2.5, discutiram-se duas famı́lias de técnicas usadas para a obtenção de uma esti-
mativa do espectro de amplitude do pulso sı́smico residual. Uma delas é baseada na suavização
do espectro de amplitude dos traços sı́smicos, através da aplicação de filtros de mediana e média
móveis. Outra consiste em ajustar, ao espectro de amplitude do traço sı́smico, um modelo es-
tabelecido para o espectro de amplitude do pulso sı́smico residual, de acordo com a técnica
denominada “modelagem espectral”. Para isto, busca-se a adoção de modelos que, além de
serem representativos, possam ser descritos por um pequeno número de parâmetros. Um desses
modelos é dado pela expressão 3.2.32. Outros são discutidos em seguida.
Um modelo que se propõe a representar a realidade com base em apenas um parâmetro é o
do pulso Ricker (Ricker, 1977), cujo espectro de amplitude é definido pela seguinte equação:
 
f2 f2
P (f ) = 2 exp − 2 (A.6.1)
fm fm

onde fm é a freqüência de pico e f é uma freqüência arbitrária. No domı́nio do tempo, t, o


pulso Ricker é representado na forma da seguinte expressão analı́tica:
√    
π 1 2 1 2
p(t) = 1 − u exp − u (A.6.2)
4 2 4

onde √
2 6
u= t = 2πfm t
b
sendo b a distância em tempo entre os dois lobos laterais do pulso.
Em um nı́vel de sofisticação um pouco mais alto situa-se o modelo de espectro de amplitude
descrito pela distribuição lognormal 6 . Trata-se de uma alternativa baseada no fato de que o
espectro de amplitude tı́pico de um traço sı́smico tende, com freqüência, a se aproximar de
uma distribuição desse tipo, particularmente se o mesmo traço ainda não foi submetido a uma
deconvolução sofisticada. A correspondente descrição matemática é dada por
" #
1 (ln f − η)2
P (f ) = √ exp − (A.6.3)
f γ 2π 2γ 2

Nesta expressão, η e γ são definidos, em função da freqüência de pico, f m , e do desvio padrão,


σ, com base nas seguintes expressões:

η = ln fm + γ 2

e  2
2
 2
  fm
exp 3γ exp γ −1 =
σ
6
Corresponde a uma distribuição normal das amplitudes quando estas são representadas em função
do logaritmo da freqüência.
572 APÊNDICE

Observe-se que o desvio padrão, σ, é responsável pelo controle da largura da banda espectral.
A expressão A.6.3, ainda que seja representativa da realidade, corresponde a uma descrição
meramente estatı́stica do espectro de amplitude do pulso sı́smico. Em muitos casos, é conveni-
ente dispor de descrições — ainda que parcialmente — fundamentadas nos processos fı́sicos, na
linha seguida por Ricker (1977). Este é o caso do modelo definido pelo produto entre o espectro
de amplitude de um filtro corta-baixas e o da atenuação. O resultado é a seguinte expressão 7 :
"  β #−1/2  
fb πf τ0
P (f ) = 1 + exp − (A.6.4)
f Q

onde Q é o fator de qualidade, τ0 é o equivalente em tempo duplo da profundidade do refletor,


fb é a freqüência corta-baixas e β é uma constante que controla a declividade do espectro de
amplitude do filtro corta-baixas.
O pulso sı́smico definido com base na equação A.6.4 tem a grande vantagem de incluir
explicitamente a atenuação e, com uma pequena modificação, a dispersão (ver a equação 2.8.12).
Levando em conta que os pulsos sı́smicos tı́picos tendem a ter as baixas freqüências controladas
por filtros corta-baixas e as altas pela absorção, pode-se dizer que o pulso correspondente ao
espectro de amplitude definido pela expressão A.6.4 é representativo. No domı́nio do tempo,
ele é descrito pela seguinte convolução:

pt = f t ∗ a t

onde ft é o filtro corta-baixas e at é o pulso de atenuação, definido pela expressão 3.3.15.


Um modelo de pulso sı́smico particularmente abrangente é o do filtro passa-banda But-
terworth já que, com freqüência, os dados sı́smicos são deconvolvidos e, ao final, submetidos a
filtros desse tipo. Uma versão generalizada do correspondente espectro de amplitude, adaptada
para a aplicação à modelagem espectral, é dada pela seguinte expressão:
("  β #   α )−1/2
fb f
P (f ) = 1+ 1+ (A.6.5)
f fa

onde os subscritos b e a indicam as freqüências de corte baixa e alta, respectivamente. Por


sua vez, os parâmetros β e α, que controlam as declividades inferior e superior do espectro de
amplitude, equivalem grosseiramente ao dobro do número de polos de um filtro Butterworth
convencional.

7
O pulso sı́smico correspondente foi proposto no âmbito interno da Petrobrás e, por isto, recebeu seu
nome.
ÍNDICE REMISSIVO

A artefatos de migração, 398, 566


absorção, 87–89, 92, 215, 220–227, 239, 244, atenuação, 220, 222–225, 243, 244, 316, 317,
290, 303, 312, 317, 327, 336–338, 338, 339, 456, 459, 561, 572
341, 342, 457, 520, 560, 572 atraso da energia, teorema do, 33
absorção nas bordas, 566 atraso unitário, operador de, 6, 20
absorção, coeficiente de, 222 autocorrelação, 11
adiabática, condição, 484 AVO, 130, 329, 455, 465, 493, 494, 497, 514,
air-gun, canhão de ar, 253, 300 519, 520
Al-Chalabi, técnica, 295 análise de, 401, 416, 464, 494, 498–521
aleatórias, séries, 36–40 anomalia de, 464, 502, 504, 520, 540
aleatório atributos de, 400, 464, 465, 472, 506–
espectro, 187, 303, 306, 307, 540 514, 517, 519, 540
ruı́do, 39, 40, 43, 46, 91, 279, 280, 309– não linear, 446
311, 315, 325, 341, 516 parâmetros de, 439, 441–446, 453, 567–
álias, 1–4, 27, 28, 61, 255, 291, 311, 372, 398, 569
399, 423, 565 técnica, 439, 441, 494, 567
amarração, 462, 464, 472, 539 azimute de aquisição, 121
AMO, Azimuth MoveOut, 279, 424
amostragem, 1–5
B
background normal, veja desvio ortogonal
amostragem, teorema da, 2, 30
background trend, veja tendência de fundo
amplitude
Backus, M., 290
correções de, 277–278, 406, 443, 530
Backus, média de, 246, 477
instantânea, 466, 570
balanceamento espectral, 280, 316, 317, 457
verdadeira, 334 Bartlett, função, 26
analı́tico, sinal, 62 bias, 295, 296, 535, 536
anisotropia, 87, 154, 245–252, 281, 287, 289, Biot, 478, 480, 493
291–293, 296, 298, 327, 341, 376, Biot, coeficiente de, 479
455, 480 Biot-Gassmann, equação, 476, 478–480, 487,
azimutal, 252 488
elı́ptica, 250 Blackman, função, 26
fraca, 250 Born, série de, 238
HTI, 252 box, função, veja caixa, função
VTI, 252 bright-spot, 478, 493–496, 520
antecipação, componentes de, 44, 224, 312, Butterworth, filtro, 572
313
aplanática, superfı́cie, 121, 402–404, 406– C
408 CA, Common Angle, 416
aquisição submergente, veja migração com o cabo de fundo, 263
conceito de caixa, função, 26
área variável, apresentação em, 467 camadas, despimento de, 297

573
574 ÍNDICE REMISSIVO

campo próximo, termo de, 107, 208 constante, teorema da, 19


campo remoto, termo de, 208 conversão de modo, 87, 88, 171–175, 199,
campos de onda 232, 327
atrasados, 380–382, 384, 385, 387, 563 convolução, 6–10
extrapolação de, 111, 168, 188–220, 224, bidimensional, 9, 204, 266, 420, 423
271, 279, 336, 375, 458 teorema da, 21
extrapolação inversa de, 337, 350, 353, correções estáticas, 274–277, 291, 310, 458
360–362, 366, 368, 373, 375, 381, correlação cruzada, 10–12
382, 384, 385, 410, 411, 459, 570 correlação, teorema da, 21
Castagna, fórmula de, 451, 491, 501 Crank-Nicolson, 384, 566
cáustica, 164 CRP, Common Reflection Point, 416
CDP CRS, Common Reflection Surface, 159
álias de, 278, 290 CS, Common Shot, 114–120
aplicabilidade da técnica, 182, 284 curvatura, 87, 95, 100, 107, 127, 130, 145–
deficiências da técnica, 289–291, 401, 418 148, 158, 159, 164, 167, 289, 378
eficácia da técnica, 400
técnica, 40, 64, 90, 91, 119, 155, 156, D
250, 274, 275, 278, 280–296, 327, datum, 276
395, 400, 401, 416, 418, 419, 455, final, 274–276
456, 493, 496, 569 flutuante, 276, 396–397, 435
cepstrum, 52–55, 57, 58, 62, 242, 304 reposicionamento do, 374, 413, 458
CFP, Common Focus Point, 416 dB, deciBel, 167
CG, Common Geophone, 114–120 deconvolução, 10, 11, 30, 39, 46, 59, 254, 306
check-shot, 244, 461, 462 f − x, 279
CI, Common Image, 297, 416, 443 da assinatura, 274, 298–300, 304, 307,
cı́rculo unitário, 13, 31, 33 314, 315
cisalhante, onda, 64 de fase mı́nima, 186, 254, 280, 305–315,
CMP, Common MidPoint, 90, 114–120 317, 325, 335, 341, 456
CO, Common Offset, 115–120 de fase nula, 315–317, 325, 338, 340, 456
cobertura, 91, 274 de Noé, 329
coeficiente de reflexão determinı́stica, 304–306, 314
acústico, 76, 170 do fantasma, 302, 305, 313
aproximações do, 177–180 estatı́stico-determinı́stica, 306, 311–315,
elástico, 173 325, 340, 456
coeficiente de transmissão homomórfica, 303, 304
acústico, 76, 170 iterativa, 316, 318–324, 456, 457
aproximação do, 182 no domı́nio τ -p, 329, 336
elástico, 173 operador de, 309, 315, 336
perda de amplitude devida ao, 182–183 preditiva, 329, 335–336
coerência, atributos de, 466, 467, 469, 470 residual, 324
compensação Q, 295, 336–341, 560–561 transversa de mapas sı́smicos, 472, 527–
compressibilidade, 66, 484, 488, 540 530
compressional decremento logarı́tmico, 222
energia, 174 degrau, função, 25
fonte, 70 delta de Dirac, função, 24
onda, 64 delta de Kronecker, função, 24
condições de contorno, 75, 169, 170, 172, 173 demigração, 109, 193, 419
condicionamento geométrico, 279, 432 densidade variável, apresentação em, 467
consistência superficial, 275, 277, 280, 310 derivada, teorema da, 22
ÍNDICE REMISSIVO 575

deslocamento de fase, algoritmo de, 188–191 conservação da, 55, 75, 87, 161, 163,
deslocamento, teorema do, 19 169, 174, 270
desvio fluxo de, 74, 76, 171, 174, 200
ortogonal, 465, 507, 516, 517 potencial, 74
vertical, 509 ensemble, 37
desvio padrão, 37 equação acústica da onda, 130–139
detuning, veja deconvolução transversa de na presença de uma fonte, 136–139
mapas sı́smicos versão 1-D, 132
devilish, 419 versão 2-D, 133
DHI, 494, 495 versão 3-D, 134
DHIP, 509 versão unidirecional 1-D, 133
difração, 78, 92, 100, 109–120, 122, 123, 127, equação da onda
219–220, 272, 343, 347, 348, 353– solução assintótica da, 140
357, 359, 362, 372, 381, 397, 402, solução da, 136, 139, 164, 169, 173, 188,
403, 406–413, 415, 419, 422, 459 189, 193, 210
difrações, termo das, 379 equação elástica da onda, 139
dilatação, 131 equações normais, 41, 47, 567
dim-spot, 494, 496, 502 ergódico, processo, 37
dinamite, 253, 300 escala, teorema da, 20
Dirichlet, condição de contorno de, 206, 209, espalhamento geométrico, 87, 88, 109, 130,
388 139, 145, 160–168, 199, 215, 218,
disco unitário, veja circulo unitário 219, 260, 262, 266, 268, 270, 290,
dispersão, 81, 133, 134, 220, 223, 224, 247, 305, 326, 327, 350, 370, 423, 457,
295, 339–341, 461, 480, 561, 572 459
relação de, 81, 134, 195, 378, 380, 382, estabilidade, 374, 561
394, 566 estabilidade numérica, 194, 196, 270, 382,
dispersão numérica, 196, 383, 386, 390, 561– 384, 390
566 estacionária, série, 38, 44, 45, 241, 242, 335,
divergência 341, 528
de um vetor, 161, 200 estiramento, efeito de, 289, 418, 459, 520,
teorema da, 138 533
divergência esférica, 87, 88, 103, 160 estocástico, processo, 37
diving waves, veja ondas mergulhantes evanescentes, ondas, 191
Dix, 153 extinção, teorema da, 206, 213, 214, 302
fórmula de, 296 extrapolação
velocidade intervalar de, 296 abertura do operador de, 397
DMO, 419–424 operador de, 111, 397, 411, 412
abertura do operador de, 422, 423
correção de, 91, 279, 291, 327, 401, 419– F
421, 423, 424, 455, 535 faixa dinâmica, 225, 230, 272, 291, 539
operador de, 419–423 fantasma, 260–266
DSR, equação, 116, 191–193 fase
convenção de, 18, 20
E correções de, 406
eikonal, veja iconal da função refletividade, 303
emergência, ângulo de, 158 estacionária, 218, 219, 408, 570
empilhamento oblı́quo, 556–559 instantânea, 63, 466
energia máxima, 31, 33, 35, 36, 43, 44, 52, 54,
cinética, 73 59, 61, 62
576 ÍNDICE REMISSIVO

mı́nima, 31, 33, 35, 36, 43, 44, 52–59, 61, teorema de, 138, 161, 199, 200
62, 230, 239, 243, 254, 304, 307–309, gaussiana, distribuição, veja normal, distri-
311–314, 335, 341, 342, 456 buição
misturada, 31, 33, 44, 59, 254 geoestatı́stica, 441, 472, 538
nula, 36, 52 geofone, resposta ao impulso do, 256
residual, 313 Gibbs, fenômeno, 30, 105
fator de fluido, 507 gradiente, 442, 500, 511
fator de qualidade, 222, 223, 337, 341, 560, Green
572 função de, 138, 139, 201, 204–210, 212–
fatoração espectral, 52–59 217, 219, 271, 301, 365, 366, 368,
Fatti, fórmula de, 179 370, 371, 373
Fermat teorema de, 199, 200
princı́pio de, 79, 82, 218, 570, 571 Greenberg-Castagna, técnica, 491, 492
FFT, 29 Gregory-Pickett, técnica, 488, 495
filtro
de predição, 44–46, 278, 280, 335, 336
H
Hamming, função, 26
estratigráfico, 182, 220, 239–244, 247,
Hankel, função de, 209, 210, 368, 369, 374
293, 303, 307, 312, 317, 327, 336,
Hanning, função, 26
338, 341, 342, 477
head waves, veja ondas frontais
passa-banda, 40, 44, 110, 191, 311, 316,
Heaviside, veja degrau, função
519, 572
Helmholtz, equação de, 138
fizz-water, 483
hidrofone, resposta ao impulso do, 256
flat-spot, 494, 495
Hilbert, técnica, 57, 308
fluido, substituição de, 464, 487, 488, 491,
Hilbert, transformada, 24, 57, 62, 342, 466
492
hipérbole achatada, 123, 127, 404
focalização, 289, 355–359, 395, 413, 414, 416
Hooke, lei de, 65–68, 71, 73, 75, 78, 131–133,
foco enterrado, 95
136, 137, 139–475
Fourier
Huygens
técnica, 196, 390, 392
Christiaan, 78
transformada bidimensional de, 26–29
forma recursiva do princı́pio de, 110, 113,
transformada de, 12–30
360, 409, 431
freqüência
princı́pio de, 77–79, 81, 82, 92, 97, 100,
de referência, 223, 224, 337, 338, 342,
102, 108–111, 113, 123, 126, 127,
560
136, 199, 200, 205, 218, 348–350,
de ressonância, 257
360, 361, 401, 404, 570, 571
instantânea, 466
Fresnel I
Augustin, 78 iconal, equação, 81, 120, 141, 143, 148, 149,
primeira zona de, 97 151, 372, 406, 558
iluminação, 285, 400, 463, 468
G imageamento, 244, 361–363, 374, 398, 400,
Gardner, fórmula de, 448, 474, 480 416, 439
Gardner-Castagna imagem, condição de, 361, 385, 413, 427,
evento, 520 428, 431, 434, 436
litologia, 501, 519 imaging, veja imageamento
Gassmann, 493 impedância
equação de, 478, 492 acústica, 70, 164, 170, 181, 184, 446,
Gauss 447, 450, 460, 463, 484, 494, 496,
equação de, 37 502, 503, 539, 540
ÍNDICE REMISSIVO 577

instabilidade numérica, veja estabilidade nu- abertura do operador de, 120, 347, 354,
mérica 397, 418
instantâneo, 197, 198 algoritmo explı́cito de, 382, 385, 562
instrumento, resposta, ao impulso, do, 255 algoritmo implı́cito de, 379–387, 561–
integral, teorema da, 23 566
intercept, veja interseção com base no raio imagem, 395–396
interpolação, 28, 30, 46, 274, 278, 377, 396, com o conceito de aquisição submergente,
441, 474, 563 409–413, 425–427
interseção, 442 de agrupamentos CO, 402–406, 433
IP − IS , 514 de agrupamentos CS, 406–408, 427–429,
isotermal, condição, 484 434
de tempo reverso, 365, 379, 384, 387–
K 392, 434, 435
Kirchhoff em cascatas, 393, 394
aproximação, 169, 213–220, 234, 235, em duas passagens, 394, 437, 438
326, 430 em profundidade, 355–359, 370–373
integral de, 12, 130, 135, 199–203, 206, em tempo, 353–359, 369–370
207, 211, 215, 219, 271, 302, 365, geométrica, 342–347
366, 369, 458, 570 Kirchhoff, 365–374
Kolmogoroff, método, 52, 54–57 por deslocamento de fase, 375–377
krigging, 46, 278 por diferenças finitas, 378–392
por frentes de onda, 343, 348, 406, 420–
L 422
λρ, 514
por soma de difrações, 348, 353–355, 369,
layer stripping, veja camadas, despimento
370, 406, 422
de
pré-empilhamento Kirchhoff, 425–433
lentes finas, termo das, 379
pré-empilhamento por diferenças finitas,
Levinson
433–435
algoritmo de, 48
PSPI, 438
Norman, 40, 47
recursiva, 360–364, 373–374
recursão, 42, 47–51, 62
residual, 393–395
lognormal
Stolt, 375, 377–378, 394
distribuição, 571
espectro de amplitude, 571 velocidade de, 279, 297, 355, 357, 359,
luz branca, 43, 186, 306, 313, 315, 325, 456, 383, 393, 394, 413–419, 441, 458,
534
467
modelagem espectral, 316, 571, 572
M modelagem sı́smica
média de uma série, 38 abertura do operador de, 120
mediana, filtro de, 280, 316, 571 com a aproximação Kirchhoff, 216–220
meio efetivo, 246, 477 com a equação DSR, 193
memória, componentes de, veja antecipação, com o princı́pio de Huygens, 109–110
componentes de por deslocamento de fase, 190
MEMS, acelerômetro, 256 por diferenças finitas, 195–199
microespalhamento da energia, 88, 244, 341 modelo convolucional, 84–87, 109, 227, 253,
migração 269, 306, 318, 462, 463
álias do operador de, 399 modulação, teorema da, 22, 25
ângulo de, 347, 354, 397, 459, 531 módulo bulk, 66, 68, 71, 475–480, 482, 484,
a partir do datum flutuante, 393, 396– 485, 487–489, 491, 492, 495, 540
397 módulo de elasticidade, 130, 474–478, 480,
578 ÍNDICE REMISSIVO

481 Petrobrás, i, ii, 318, 482, 490, 493, 502


módulo de rigidez, 67, 71, 475, 477–480, 485– pulso, 572
488, 491, 492 Petrobrás, pulso, 572
momento de uma série, 38 phase shift, veja deslocamento de fase, algo-
mudrock, equação, veja Castagna, fórmula ritmo de
de pirâmide de Queops, 116, 192
múltiplas polaridade, convenção de, 170, 260, 267–268
peg leg, 88 potência de uma série, 38
atenuação das, 327–336 potência, espectro de, 22
da superfı́cie livre, 88, 213, 215, 216, predição, distância de, 313, 335, 336
227, 228, 231, 234–240, 329 pressão
internas, 88, 89, 227, 228, 231, 239, 240 de poros, 481, 489, 540
efetiva, 481, 485
N geostática, 481
néper, 222 gerada pela onda, 68–70, 72, 135–139
Neumann, condição de contorno de, 206, 389, programação, folha de, 114
390 pseudo-impedância acústica, i, 441, 447, 449,
NMO, Normal MoveOut, 419 464, 466, 467, 471, 472, 538
correção de, 282, 284–289, 292, 293, 328, pseudo-impedância elástica, 174, 451
402, 403, 407, 408, 419–423, 459, pseudo-migração pré-empilhamento, 438
520, 533, 567 pseudo-velocidade intervalar, 449, 464, 466,
correção implı́cita de, 404, 408, 413 471–473, 538
diferença de, 327, 328
pulso sı́smico, 70, 252–268, 300–304
relativo, 329
residual, 276, 416 Q
supercorreção de, 287, 289 Q, veja fator de qualidade
variação de, 119
quadratura
velocidade, 159, 250, 281, 292, 293, 535
filtro de, 24, 56, 57, 63, 243, 308
normal, distribuição, 37
função, 24
notch, 186
traço, 63, 466
notional, 301
quarta ordem, aproximação de, 153–156, 292–
O 295
OBC, Ocean Bottom Cable, veja cabo de 4-D, sı́smica, 464
fundo
obliqüidade, fator de, 107, 108, 208, 211, R
219, 352, 353, 370, 423, 457, 570 Radon, transformada, 328, 556, 559
onda, frente de, 77 raio, 77
ondas frontais, 83, 172, 232 imagem, 96, 269, 356, 393, 395, 396,
ondas mergulhantes, 151, 372 533, 534, 537
opacidade, veja transparência normal, 95, 147, 148
parâmetro de, 79
P teoria do, 139–148, 268
Parceval, teorema de, 22 traçamento do, 115, 120, 141, 148, 149,
partı́culas, deslocamento de, 70, 73–76, 78, 295, 297, 371–373, 376, 379, 406,
131–133, 136, 169, 270 413, 415
partı́culas, velocidade de, 70, 74, 75, 135– raı́zes de polinômio, método das, 52–53
136, 163, 164, 184, 203, 210, 211, Rayleigh
270, 329 extrapolação inversa com a integral de,
pente, função, 25 365–369
ÍNDICE REMISSIVO 579

integrais de, 204–211 efeito de, 517, 522


integral de, 219, 370, 371, 373, 375, 379, espessura de, 523, 527–530
397, 424–433 fator de, 523, 529
ondas, 64, 280 sismograma sintético, 85, 324, 325, 462, 463,
teorema de, 22 539
Raymer-Hunt-Gardner, fórmula de, 473 sistemas lineares, 6
reciprocidade, princı́pio da, 84 slant stack, veja empilhamento oblı́quo
redatumação, veja datum, reposicionamento snapshot, veja instantâneo
do soma, teorema da, 19
redatuming, veja datum, reposicionamento sorrisos, 328, 398, 566
do spectral whitening, veja balanceamento es-
refletividade, função, 84–87, 183–188, 242– pectral
244, 303, 306, 324, 335, 341, 438, split-step, 379
446, 450 Stolt, 424
cor da, 186, 188, 325–326, 448 stretch, 378
refletor explosivo, 87, 92, 94, 103, 109, 116, migração, veja migração Stolt
117, 120, 123, 190, 213, 219, 272, stretch, veja estiramento
337, 342, 350, 376, 377, 381, 400, survey sinking, veja migração com o con-
401, 405 ceito de aquisição submergente
regularização, 278
reservatórios, caracterização de, 465, 470– T
472 τ -p, 184, 229, 244, 336, 556–559
resolução horizontal, 531–533 tempo de excitação, 427, 428
resolução vertical, 521–530 tendência de fundo, 465, 498, 500–511, 520
Reuss, média de, 473, 475–477, 479, 482, 484 TI, veja anisotropia
rho, filtro, 559 time-average equation, veja Wyllie, fórmula
Ricker, pulso, 571 de
RMS, Root Mean Square time-lapse, veja 4-D, sı́smica
média, 40, 185, 277, 317, 443, 446, 448, Toeplitz
470, 494 método, 52, 57–59
velocidade, 152, 155, 160, 167, 251, 271, propriedade, 42
281, 285, 286, 291, 293, 296, 357, traço-ângulo, 452
458, 535 transiente, 73
rochas geradoras, 246, 247, 480, 481, 486 transparência, 468
RTM, Reverse-Time Migration, veja migra- transporte, equação de, 141, 161, 163, 372
ção de tempo reverso 3C, três componentes, 257
ruı́do branco, 309, 310, 456 triângulo, função, 26
ruı́dos, perfil de, 232 triplicação, 95
tuning, veja sintonia
S turning waves, veja ondas mergulhantes
Shannon, veja amostragem, teorema da
Shell, 329 V
Sherwood, 87, 91, 92, 419 vagarosidade
Σ-δ, tecnologia, 255 em dados não empilhados, 123
simetria, teorema da, 18 horizontal, 3, 80
sinal, função, 23 vertical, 80
sinal/ruı́do, razão, 39, 40, 291, 438, 568 variância de uma série, 38
sinc, função, 26, 30 velocidade nula, camada de, 397
sintonia velocidade, variação linear da, 149–153
580 ÍNDICE REMISSIVO

Vibroseis, 253, 300


visualização de dados sı́smicos, 465–468
Voigt, média de, 475–477
Voigt-Reuss-Hill, média de, 475, 476, 484,
492
VSP, Vertical Seismic Profile, 304, 324, 462–
464
walkaway, 463

W
Wiener-Hopf
equação, 42, 45, 57, 58, 307, 324, 335
filtro, 40, 42–44, 46, 59, 62, 279, 316
técnica, 59
Wiener-Hopf-Levinson
deconvolução, 184
filtro, 40–51, 307, 335
wiggle, apresentação em, 467
WKBJ, aproximação, 140
Wold, decomposição de, 186
wraparound, 29, 566
Wyllie, fórmula de, 473, 477

Z
Z, transformada, 5
zero velocity layer, veja velocidade nula, ca-
mada de
Zoeppritz, equações de, 173, 178

Você também pode gostar