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ADOLESCÊ NCIA E DROGAS

A adolescência, pelas características que lhe sã o peculiares, constitui um


período decisivo no ciclo vital para o início do uso de drogas, seja como mera
experimentaçã o seja como consumo ocasional, indevido ou abusivo.

As conquistas cognitivas, o raciocínio crítico, a instabilidade emocional, as


mudanças no relacionamento familiar, a busca por auto-conceito e inserçã o
social sã o fatores que contribuem para a inserçã o ou nã o do adolescente no
mundo das drogas.

O uso de drogas é um fenô meno bastante antigo na histó ria da


humanidade e constitui um grave problema de saú de pú blica, com sérias
consequências pessoais e sociais no futuro dos jovens e de toda a sociedade. O
consumo de drogas pelos adolescentes é muito frequente e de manejo complexo
pela multiplicidade de fatores envolvidos.

Os levantamentos epidemioló gicos sobre o consumo de á lcool e outras


drogas entre os jovens no mundo e no Brasil mostram que é na passagem da
infâ ncia para a adolescência que se inicia esse uso. Nos Estados Unidos, estima-se
que cerca de três milhõ es de crianças e adolescentes fumem tabaco. O á lcool é
usado pelo menos uma vez por mês por mais de 50% dos estudantes das ú ltimas
séries do que corresponde ao nosso ensino médio, sendo que 31% chega a se
embriagar mensalmente.
No Brasil, o panorama mudou completamente nas ú ltimas décadas. Até o
início da década de 80, os estudos epidemioló gicos nã o encontravam taxas de
consumo alarmantes entre estudantes. No entanto, levantamentos realizados a
partir de 1987 pelo Centro Brasileiro de Informaçõ es sobre as Drogas
Psicotró picas da Universidade Federal de Sã o Paulo (CEBRID) têm documentado
uma tendência ao crescimento do consumo.
Os danos provocados pelas drogas podem ser agudos (durante a
intoxicaçã o ou "overdose") ou crô nicos, com alteraçõ es mais duradouras e até
irreversíveis. O uso de drogas por adolescentes traz riscos adicionais aos que
ocorrem com adultos em funçã o de sua vulnerabilidade.
Cada droga ou grupo de drogas traz consequências orgâ nicas
relativamente peculiares. O á lcool pode causar intoxicaçõ es graves, além de
hepatites e crises convulsivas. O abuso de benzodiazepínicos pode potencializar
o efeito do á lcool e provocar depressã o respirató ria.
Os inalantes podem provocar síndromes neuroló gicas persistentes com o
uso crô nico, caracterizadas por neuropatia periférica, ototoxicidade e
encefalopatia, além de ocorrerem lesõ es renais, pulmonares, hepá ticas,
cardíacas.
A cocaína e anfetaminas podem produzir na intoxicaçã o, crises
convulsivas, isquemia cerebral e cardíaca, além de quadros paranoides e
maniformes; o uso crô nico provoca síndromes psiquiá tricas semelhantes a
depressã o, pâ nico, ansiedade, esquizofrenia além de prejudicar funçõ es
cognitivas, marcadamente dos lobos frontais. Cabe ressaltar que estudos
recentes mostram que os efeitos cognitivos deletérios sã o mais graves quando o
uso de cocaína se inicia na adolescência, provavelmente por afetar um cérebro
em amadurecimento. O uso endovenoso traz riscos adicionais de transmissã o de
doenças como a SIDA, hepatites B e C. Há também descriçã o de problemas
pulmonares como tosse, pneumonia, broncoespasmo, edema pulmonar.
A maconha pode produzir a síndrome amotivacional, caracterizada por
passividade, apatia, falta de objetivos, de ambiçã o com consequente queda no
desempenho escolar.
O LSD pode provocar quadros de delírios e alucinaçõ es que aumentam os
riscos de acidentes.
Todas as substâ ncias psicoativas usadas de forma abusiva produzem
aumento do risco de acidentes e da violência, por tornar mais frá geis os cuidados
de autopreservaçã o, que, como já vistos, está enfraquecidos no adolescente.
Um adolescente que usa uma determindada droga, em princípio, busca
prazer e não dor e sofrimento. Além das drogas, outros comportamentos,
considerados de risco, como fumar, beber, dirigir perigosamente, iniciar
atividade sexual precocemente, exercem um papel de relevância no
desenvolvimento deles porque visam conquistar autonomia em relação aos
pais, obter respeitos dos amigos, repudiar normas autoritárias, representar uma
ruptura com a infância, ajudar a lidar com a ansiedade, frustações e fracasso.
A aná lise do envolvimento do adolescente com as drogas é complexo e
multifatorial. Dentre os fatores de risco, podemos avaliar os ambientes
familiares, grupais, educacionais e comunitá rios.

Estudos diversos tem abordado e discriminado os fatores de risco


parentais para o uso das drogas, uma vez que devemos enxergar o adolescente
inserido no contexto familiar que pode ser favorá vel ou nã o a este. Diversos
fatores atuam em conjunto: falta de investimento em vínculos que unem pais e
filhos, envolvimento materno insuficiente, prá ticas disciplinares inconsistentes,
excessiva permissividade, dificuldade de estabelecer limites, tendência a
superproteçã o, educaçã o autoritá ria associada a baixa afetividade,
monitoramento grupal deficiente, aprovaçã o do uso de drogas pelos pais,
conflitos familiares sem desfecho de negociaçã o.
No que diz respeito aos grupos de pares, vê-se que existe uma
supervalorizaçã o de seu papel, muitas vezes tomando as consequências como
causas. É fato que os adolescentes se agrupam devido a sintonia de valores e
interesses, assim aqueles que querem iniciar ou aumentar o uso de drogas
procuram os colegas com há bitos semelhantes. Mas nã o podemos deixar de
considerar que este comportamento possa ser o final de um processo no qual
fatores individuais, familiares e outros sociais já indicavam o aumento da
probabilidade do uso abusivo de drogas.
A disponibilidade e presença de drogas na comunidade, dificuldades
econô micas, desemprego, baixo desempenho escolar tem sido apontada como
facilitadores do uso de drogas por adolescentes pois naturaliza o acesso. Esses
fatores aliados aos já mencionados potencializam os efeitos.
Acreditamos que uma avaliaçã o dos principais fatores de risco e
de proteçã o sejam fundamentais para nortear sejam políticas pú blicas de
prevençã o sejam abordagens terapêuticas eficientes. A abordagem unicausal tem
se mostrado ineficiente e portanto, inapropriada.

O vínculo e interaçã o familiar saudá veis e gratificantes sã o a base


para o desenvolvimento pleno das potencialidades das crianças e adolescentes.
Sã o importantes o apoio da família no processo de aquisiçã o da autonomia pelo
adolescente, monitoramento parental de seu crescimento e desenvolvimento,
estabelecimento de normas claras para comportamentos sociais.

Entre os fatores de proteçã o, tem-se buscado, atualmente,


enfatizar o processo de formaçã o da resiliência. Trata-se de uma abordagem
otimista que visa a conquista de ferramentas psíquicas para o desenvolvimento
de uma vida mais saudá vel a despeito das adversidades e traumas
experienciados e que no caso das drogas, busca reduzir sua vulnerabilidade.

Além disso, é inegá vel o papel da família e escola na vida do


adolescente, sendo que esses devem estar atentos a elementos que auxiliam a
formaçã o de um jovem saudá vel e maduro. Entre eles estã o: comunicaçã o livre
dos pais e outros adultos que lhes sirvam de modelo, elogio dos pais à s
conquistas do filho e dos educadores aos estudantes, colocaçã o clara de
expectativas por parte dos pais e professores aliada a uma educaçã o com
autoridade, afeto, controle e trato, monitoramento dos pais das atividades dos
filhos, conhecimento dos amigos e pais dos amigos, compartilhamento de
valores, atitudes e crenças frente à s drogas entre outras questõ es.

Já no caso de adolescentes que estejam envolvidos com o uso de


drogas, estudos indicam uma multiplicidade de tratamentos cuja eficá cia
dependerá de fatores individuais, familiares e socioeconô micos. Até meados da
década de 70, os adolescentes dependentes eram tratados como os adultos.
Depois disto, buscou-se diferenciar as terapias para adequá -las à s
particularidades deste grupo.

Cerca de 80% dos jovens com problemas associados ao uso de


drogas sã o tratados em ambulató rios por meio de abordagens individual, grupal,
familiar ou uma combinaçã o destas, aplicando-se modelos teó ricos variados. As
abordagens psicodinâ micas sã o relevantes pois promovem o desenvolvimento
mais satisfató rio de relaçã o consigo e com os outros. O modelo mais utilizado e
empregado pelos norte-americanos e ingleses é a terapia cognitivo-
comportamental, principalmente baseada na Teoria do Aprendizado Social de
Bandura, que considera o uso de drogas um comportamento aprendido,
desencadeado e reforçado por eventos e emoçõ es e, portanto, passível de ser
modificado.

Porém, qualquer que seja o modelo teó rico empregado, este deve
envolver o desenvolvimento global do adolescente, modificaçã o do
comportamento de uso abusivo e resoluçã o dos problemas identificados no
â mbito familiar, social e ambiental.

SCHENKER, Miriam; MINAYO, Maria Cecília de Souza. Fatores de risco e de proteção para o uso de
drogas na adolescência. Ciênc. saúde coletiva,  Rio de Janeiro ,  v. 10, n. 3, p. 707-717,  Sept.  2005 .
Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
81232005000300027&lng=en&nrm=iso>. 

MARQUES, Ana Cecília Petta Roselli; CRUZ, Marcelo S. O adolescente e o uso de drogas.Rev. Bras.
Psiquiatr.,  São Paulo ,  v. 22, supl. 2, p. 32-36,  Dec.  2000 .   Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-
44462000000600009&lng=en&nrm=iso>. access on  07  Sept.  2017.

https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-da-saude/cocaina-tem-acao-mais-
devastadora-no-cerebro-de-adolescentes/amp/ (acessado em 08/09/2017)

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