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BRANCO NO ACRE.
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Graduando do Curso de Bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Acre – UFAC.
Artigo apresentado à Coordenação do Curso de Bacharelado em Ciências Sociais do Centro de Filosofia e
Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre - CFCH, como requisito avaliativo para a obtenção
do Grau de Bacharel em Ciências Sociais – Habilitação em Antropologia.
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INTRODUÇÃO
criativos, eles moldam a realidade continuamente por meio de suas decisões e ações”.
Esse, contudo é o caso da Capoeira enquanto linguagem cultural artística por meio da
musica e da dança, a qual na contemporaneidade expressa uma experiência
compartilhada de aprendizagem cultural se inserindo como formas de sociabilidade
artística capaz de promover as interações sociais.
Assim a vida social é permeada de simbolismos aonde vão sendo acrescidos
modo de vestir, os costumes, padrões de trabalho, diferentes formas de linguagens
artísticas que vão caracterizando a cultura como um sistema aberto e com isso
permitindo com que a análise e a interpretação do cotidiano possam se tornar possíveis.
Nesse aspecto destaca Guiddens (2012, p. 189) que os gestos, as posturas corporais são
usados constantemente e mesmo modelados pela cultura, para completar falas, bem
como para transmitir significados quando não se diz nada. A dança na capoeira é um
caso disso, a expressão do corpo no desenrolar do toque do Berimbau transmite um
significado organizado entre o jogar do corpo em movimentos circulares, envolvendo
defesas e ataques, assumindo então seu aspecto de luta.
A Capoeira nesse sentido como linguagem artística e cultural carrega em si
mesma uma identidade social, a qual revela a nossa compreensão de quem somos e de
quem são as outras pessoas inseridas em suas culturas, isso inclui a compreensão delas
sobre si mesmas e também sobre nós, permitindo com isso que as “identidades sociais,
possam ser formadas nos processos contínuos de interação na vida social, deste modo
as identidades são construídas e não dadas” destaca Guiddens (2012, p. 191). Deste
modo a Capoeira integra um conjunto de identidades sócio-artísticas de um povo que foi
sendo construída no processo continuo das interações sociais, mas que servindo a
diferentes papeis. Se em seus primórdios nas senzalas podiam ter um papel de
resistência e sobrevivência simbólica, nas atuais relações da vida democrática esse papel
é, sobretudo, o de promover às interações sócio-culturais na vida contemporânea,
demarcando com isso um simbolismo de permanência às tradições dentro da linguagem
artística que lhe confere.
Sob esse olhar a Capoeira reflete e evidencia sob a vida social contemporânea
tanto o exercício dos direitos culturais de um povo quanto sua contribuição no processo
de participação social. Em relação aos direitos culturais é preciso entender que a
Capoeira corresponde a uma prática cultural em meio a uma diversidade de outras, para
isso, é preciso considerar que: “No contexto atual da diversidade, uma das principais
estratégias para o reconhecimento de grupos tão diversos é garantir direitos e
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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
tanto que para as novas gerações a Capoeira tem papel de hábitos e crenças transmitidos
na comunidade pelos costumes de sua cultura, aqui entendida como afro-brasileira. Pois
nas palavras de Ruth Benedict “A herança cultural humana, aconteça o que acontecer,
não é biologicamente transmissível” onde “No papel do processo cultural da
transmissão da tradição do homem nenhum item de sua organização social tribal, de
sua língua, de sua religião local é trazido em sua célula reprodutora”. (Benedict,
1970).
Contudo, é importante destacar que a valorização da cultura nacional e popular
na percepção e condução da política cultural é pouco estimulada e valorizada por não
levar muito em conta, a tradição e mesmo os costumes, entendidos aqui como um
direito cultural, o direito a sua cultura, que de outro modo, seria também o direito às
suas tradições e costumes. Nesse sentido a Capoeira enquanto linguagem artística por
meio da musica e da dança em interação com um ambiente sociolingüístico deve ser
vista também como promotora de participação social, não sendo vista fora dessas vozes
e falas que atravessam a sociedade de forma mais ampla. Assim sendo, a prática da
Capoeira integra, também de forma mais ampla, os reflexos culturais, enquanto hábitos
e costumes que referem-se aos “direitos e às responsabilidades dos diversos agentes de
usufruto criativo dos múltiplos códigos e sistemas de pensamento, ideologias, religiões,
modos de fazer e viver”, os quais se constituem de aspectos, tão importantes quanto o
direito à prática da liberdade, igualdade perante a lei e à seguridade social. (Silva, 2007,
p. 162).
Com base nisso a prática da Capoeira vai muito além de uma prática esportiva e
integra mesmo o caráter cultural do seu simbolismo e de sua linguagem artística
alicerçada na tradição de sua cultura. Deste modo a Capoeira segue como fluxos de
oralidades e tradição possíveis manifestas através da dança e da música. Nesse sentido o
valor representativo da Capoeira segue em certo sentido o valor do mito o qual tem “um
valor de passagem, explicação de interação e de apropriação, não deve ser entendido
apenas como ficções decorativas” (Turner, 1990, p. 11). Assim, muitas vezes sem
percebermos, a prática da Capoeira pode nos enredar em um compósito de signos, ou
qual explica Charles Peirce (1989) “Cada um de nós é um compósito de signos que
adquirem significado em contextos também sígnicos” e segue dizendo: “é um nó de
intenções, um dialogo conosco mesmos, propiciado pelo dialogo dos outros e com os
outros. É somente pela voz do outro que podemos falar a nós mesmos” (Peirce, apud
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Rodrigues, 1989, p. 191). A Capoeira encerra uma linguagem do corpo porque é dança é
movimento, e ao mesmo tempo, da música pelo som dos instrumentos e de suas letras.
Deste modo essa prática cumpre uma função tanto de ampliação das relações
culturais, quanto de integração aos saberes artísticos, uma vez que permite a capacidade
de simbolização em um nó de intenções que adquirem significado em contextos também
sígnicos. Portanto se é sígnico, é também revestido de uma ação de simbolização. Sob
essa perspectiva a prática da Capoeira se insere ainda em territórios que também podem
ser entendidos como territórios étnicos e de alteridades múltiplas. Pois é preciso levar
em conta que “O Brasil conta com um imenso patrimônio de expressões e
manifestações da cultura populares, historicamente marginalizadas”. (Ministério da
Cultura 2010, p. 47).
Bordieur (1989, p.10) destaca que os símbolos são “instrumentos por excelência
da integração social, enquanto instrumento de conhecimento e comunicação, eles
tornam possível o consenso acerca do sentido do mundo social”. A Capoeira tem como
seu principal símbolo o Berimbau e o traje de roupas brancas, os quais, em suas práticas
integram um contexto sígnico, ao mesmo tempo em que, também incorpora um
elemento lúdico, nesse sentido destaca: Huizinga (2000) que:
diferentes origens. A mais bem aceita se remete ao negro escravo que fugia das
senzalas e se escondia nas matas. Nesse momento ele “abria clareiras” denominadas
de capoeira onde surpreendia os capitães-do-mato que tentavam recapturá-los.
regime de trabalho altamente desumano, tinham de lançar mão da capoeira para a sua
defesa pessoal. Os senhores de engenho não permitiam que os negros escravos
conduzissem armas e, assim, só a capoeira os socorreria nos momentos que tinham
de se defender. Marinho (1945), conta que Zumbi considerado o rei do Quilombo dos
Palmares depois de assumir a liderança do quilombo situado na Serra da Barriga em
Recife, teria ensinado capoeira aos jovens negros nascidos no Brasil. Em suma a
capoeira surgiu no Brasil por um processo de aculturação em prol da liberdade da
raça negra, escravizada durante o período do Brasil colonial.
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Denominação dada ao praticante de capoeiragem na época.
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A roda de rua, não é apenas uma roda de capoeira realizada fora do ambiente da
academia, é um momento que os capoeiristas chamam de encontro de camaradas, é
um ambiente mais amplo que não se limita somente aos componentes de um mesmo
grupo de capoeira, ao contrário todos os capoeiristas e não capoeiristas estão
convidados pela força dos costumes. Um capoeirista não pode ser impedido de jogar
numa roda de rua pelo mestre do grupo que está organizando a roda ou qualquer
outro, o que seria plenamente aceitável em uma roda de academia. É um momento
pra se rever os amigos antigos, de fazer novas amizades, de compartilhar vivências e
de interagir socialmente com os demais. A roda de rua funciona como uma espécie
de imã que atrai os capoeiristas e não capoeiristas sob o toque cadenciado do
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berimbau. Todos os principais rituais só jogo são mantidos, quem comanda a roda é
o berimbau, mas pra jogar capoeira nesse ambiente cheio de axé não precisa de um
rito formal de academia, a pessoa é sempre bem vinda do jeito que quiser jogar, o
clima de descontração é que rege todo o desenrolar do jogo. Em Rio Branco, existe
uma roda de rua que acontece todos os primeiros Domingos de cada mês, no
mercado dos colonos, organizada pelo professor "chiclete" do centro cultural
senzala de capoeira. É uma roda aberta a todos praticantes ou não de capoeira,
iniciantes ou graduados, todos são convidados a experimentar toda energia emanada
de uma roda de capoeira, com respeito e alegria! Iêeeeee. (Entrevista fornecida por
um Capoeirista participante da Roda de Rua em Rio Branco).
“O meu envolvimento com a Capoeira se iniciou quando eu ainda era criança mais ou
menos com seis anos de idade através de um projeto social que tinha lá no bairro 15 no
segundo distrito de Rio Branco, e tinha um projeto social para meninos e meninas e pra
quem optasse tinha outras modalidades e eu me interessei pela capoeira mais pela parte do
entretenimento né.. que ela une três artes numa modalidade só que é a dança a arte marcial
e a música e quando ainda criança quando eu ouvia aqueles homens tocando aqueles
instrumentos fora do comum fora do padrão foi o meu interesse em me envolver. Então foi
a partir desse projeto social que eu me interessei, entrou eu alguns familiares, colegas e
isso reuniu muita gente, crianças e adolescentes da Escola Abada da Capoeira e agente
sempre se reunia também no barracão do 15, mas hoje infelizmente é um espaço
abandonado e agente se reunia também no clube do Rio Branco ali no centro ao lado da
loja do formigão, que também se tornou um lugar abandonado, isso foi por volta de 1999-
98 né... por volta desses anos aí, eu tinha 6-7 anos nessa faixa etária. Esse projeto foi
realizado através de educadores, da Casa Rosa Mulher né que era um projeto que existia
na época pelo Estado voltado para diversas atividades como bijuterias, voleibol, futebol,
capoeira e muitas mulheres optavam por fazer cursos profissionalizantes e tinha a capoeira
que era oferecida como um entretenimento esportivo. Nessa época ali no 15 o índice de
marginalização era muito grande né, tráfico de drogas, e aí houve uma necessidade em que
os assistentes sociais viam uma necessidade na época de criar um projeto social pra fazer
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embora esteja sendo resignificada contemporaneamente como atividade física que pode
contribuir para melhorar a qualidade de vida de seus habitantes.
uma política cultural que se faça mais presente, continuar garantindo o direito ao
usufruto criativo dos múltiplos códigos culturais que essa prática permite.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Raimundo César Alves de. Bimba, perfil do mestre. Salvador: centro
editorial e didático da UFBA. 1982.
LUCCHESI, Dante. Africanos, crioulos e a língua portuguesa. In: LIMA, Stolze Ivana
(org). História Social da Língua Nacional. Rio de Janeiro, Ed. Casa de Rui Barbosa.
2008.
LIMA, Stolze Ivana (org). História Social da Língua Nacional. Rio de Janeiro, Ed. Casa
de Rui Barbosa. 2008.
ROCHA, Luiz C.K. Teses que comprovam a brasilidade da capoeira. Revista praticando
capoeira, São Paulo, ano II, n 17, p.10- 13, 2001.