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Direito das Obrigações II Luana Camilo Henriques

Direito das Obrigações


Responsabilidade Civil A responsabilidade Extracontratual
deriva da violação de deveres ou vínculos
1. Introdução jurídicos gerais, isto é, de deveres de conduta
impostos a todas as pessoas e que
O regime da responsabilidade civil assenta correspondem aos direitos absolutos, ou até
no dever de ressarcimento dos danos mesmo de práticas de certos atos, que mesmo
provocados a outrem, na chamada obrigação que lícitos produzem danos a terceiros.
de indemnização Artigo 562º
A responsabilidade civil contratual
Nas situações em que a reconstituição resulta da violação de um direito de crédito
normal não seja possível, deve o lesante ou obrigação em sentido técnico.
compensar o lesado através de indemnização
fixada em dinheiro Artigo 566º Mantem-se, contudo, diferenças, mesmo que
menores, entre os dois regimes, devendo-se
1.1 Classificações de Responsabilidade salientar:
civil b Presume-se culpa na responsabilidade
A responsabilidade pode ser classificada obrigacional, mas não na delitual.
como responsabilidade por culpa, pelo risco ou b A responsabilidade delitual tem prazos
pelo sacrifício.
de prescrição mais curtos (489º), enquanto a
Na responsabilidade por culpa, que é a obrigacional é sujeita aos pressupostos legais
regra geral (Artigo 483º), a responsabilização gerais (309º).
do agente pressupõe um juízo de censura sobre
É diferente o regime de responsabilidade
o seu comportamento.
por atos de terceiros (artigos 500º e 800º).
Na responsabilidade pelo risco, admitida
Em casos de pluralidade de responsáveis
só nos casos previstos por lei (artigos 483º a
na responsabilidade delitual, o regime
499º) prescinde-se desse juízo de desvalor,
aplicável é da solidariedade (497º), ao passo
como acontece na responsabilidade por culpa,
que na responsabilidade obrigacional tal só
efetuando-se a imputação de acordo com os
acontecerá se esse regime já vigorar na
critérios objetivos de distribuição do risco.
obrigação não cumprida.
Na responsabilidade pelo sacrifício,
As duas responsabilidades regem-se por
também se prescinde do juízo de valor da
regras de conflito diferentes.
culpa, sendo a imputação do dano baseada
numa compensação só lesado, justificada pelo Tradicionalmente a doutrina distingue
sacrifício suportado. responsabilidade deliqua da obrigacional
como tendo apenas diferenças quanto à sua
A responsabilidade civil pode ainda ser
natureza, como também tendo fontes de
classificada como delitual ou aquiliana e
situações jurídicas diferentes.
responsabilidade obrigacional.
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2. Responsabilidade Civil por Culpa 2.3 Culpa


O Artigo 483º vem estabelecer uma A culpa pode ser definida como “o juízo de
clausula geral de responsabilidade civil censura ao agente por ter adotado a conduta
subjetiva, fazendo a obrigação de indemnizar que adotou, quando de acordo com o comando
estar dependente do preenchimento de legal estaria obrigado a adotar uma conduta
diversos pressupostos, sendo eles: diferente”2.
1) Facto voluntario do agente O conceito de culpa preclude perante a
2) Ilicitude não verificação da existência de causas de
3) Culpa inimputabilidade (448º) e de causas de
4) Dano exclusão de culpa (erro desculpável, medo
5) Nexo de causalidade invencível e desculpabilidade).
A culpa pode ser dolosa ou negligente. No
dolo, o agente atuou com a intenção de
2.1 Facto Voluntario do Agente praticar o ato.
A responsabilidade por factos ilícitos b Atua com dolo direto “quem,
pressupõe um facto dominável ou controlável representando um facto que preenche um
pela vontade, ou seja, um comportamento. tipo de crime, atuar com intenção de o
O facto voluntario pode revestir a forma realizar”3
de ação ou de comissão b Age em dolo necessário “quem
representar a realização de um facto que
2.2 Ilicitude preenche um tipo de crime como
consequência necessária da sua
O facto antijurídico que se manifesta na conduta”4
ilicitude é traduzido na violação de direito de
b Como dolo eventual “quando a
outrem ou de qualquer disposição legal
realização de um facto que preenche um
destinada a proteger interesses alheios.
tipo de crime for representada como
A violação de direitos de outrem consequência possível da conduta, há
compreende os casos mais relevantes de dolo se o agente atuar conformando-se
ilicitude civil. O professor Antunes Varela com aquela realização”5
enumera na sua obra os diferentes tipos de
direitos absolutos abrangidos por esta
violação, sendo eles “principalmente os
absolutos, como dieritos reais, direitos de
personalidade, os direitos familiares e a
propriedade intelectual”1

1
Antunes Varela, op.cit, p.503
2
Conclusão de Almeida Costa, op. Cit, p.558
3
Artigo 14º/1, CP
4
Artigo 14º/2, CP
5
Artigo 14º/3, CP
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Na neglicência, o agente ao ter omitido o O artigo 496º permite a indemnização


dever de diligencia, merece igualmente do dano moral, que pela sua gravidade,
censura. mereça tutela do direito.8
Atua com negligencia consciente
b Quanto ao dano positivo (ou de
quem “representar como possível a cumprimento) e o dano negativo (ou de
realização de um facto que preenche um confiança), o primeiro pretende reconduzir o
tipo de crime, mas atuar sem se conformar lesado à situação em que estaria se tivesse
com essa realização”6 existido cumprimento (equacionando os
prejuízos sofridos pelo lesado pelo
Com negligencia inconsciente quem
b

incumprimento), e o segundo, visa repor o


“não chegar a representar a possibilidade
lesado na situação em que estaria se não
de realização do facto”7
tivesse, simples e puramente, contratado.
Esta importância é crucial, pois a
Os danos podem ser presentes (se já
indemnização em caso de mera culpa,
tiverem ocorrido) ou futuros (se previsíveis). Os
poderá ser limitada Artigo 494º
danos futuros são indemnizáveis, se previsíveis
e determináveis. Se não forem determináveis,
serão fixados por decisão ulterior (artigo
2.4 Dano 564º/2).
O comportamento do agente causou uma 2.5 Nexo de causalidade
ofensa material ou moral ao titular de um bem
ou interesse judicialmente protegido, A indemnização do lesado é consequência
provocando-lhe um dano (damnu). do dano resultante da violação.
Distingue-se entre dano patrimonial e O nexo de causalidade entre o facto e o
dano não patrimonial (também considerado dano desempenha, consequentemente, a dupla
como dano moral), conforme incida, função de pressuposto de responsabilidade
respetivamente, sobre o património de outrem civil e de medida da obrigação de indemnizar.
ou atinja a dignidade, a integridade, o bem-
estar do lesado.
O dano patrimonial abrange o dano 3. Prova da Culpa
emergente e os lucros cessantes - Artigo O ónus da prova (da culpa) cabe ao lesado,
564º/1 salvo havendo presunção legal de culpa
b O dano emergente compreende o (artigo 487º/1).
prejuízo causado nos bens ou direitos já A culpa é apreciada segundo o critério do
existentes na titularidade do lesado à data da bom pai de família (nº2). No direito romano a
lesão. expressão bonus pater familiae designava, em
b O lucro cessante abrange os abstrato. Um cidadão normal, que, de acordo
benéficos que o lesado deixou de obter por com os padrões socioculturalmente e cívicos,
causa do facto ilícito, mas que ainda não tinha atuava de forma diligente, ou seja, não
direito à data da lesão. culposa.

6
Artigo 15º/a), CP
7
Artigo 15º/b), CP
8
Entendimento jurisprudencial: Ac. STJ nº6/2014
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Hoje esta expressão é utilizada para 5. Conselhos/ Recomendações/ Inf.


indicar alguém que não agiu com culpa ou que
agiu com culpa leve, sem elevada censura A irresponsabilidade civil prevista no nº1
jurídica. do artigo 485º é afastada pelos três casos
previstos no nº2.

4. Causas de exclusão de ilicitude


Além das causas gerais que afastam a
ilicitude: o regular exercício de um direito e o
cumprimento de um dever jurídico, existem
causas especiais justificativas do ato ilícito,
como a ação direta, a legitima defesa, o estado
de necessidade e o consentimento do lesado.
A Exercício de um direito – Esta causa de
-

exclusão justifica que quem exerce um direito


não tem que suportar os danos inerentes a
esse exercício, desde que atue de forma
regular e não abusiva.
b Cumprimento de um dever – O sujeito
do dever opta por assumir um certo
comportamento, especialmente no âmbito de
uma obrigação legal, ainda que tal colida com
deveres relativos a posições jurídicas alheias.
b Legitima defesa – a legitima defesa
pressupõe uma agressão atual e contraria à lei
contra a pessoa ou património do agente ou
de terceiro, havendo impossibilidade de
recurso aos meios coercivos normais e não
sendo o prejuízo causando manifestamente
superior ao que pode resultar da agressão, de
acordo com o princípio da proporcionalidade.
b Ação Direta – A ação direta encontra-
se prevista e é admita nos limites impostos pelo
efeito útil imediato e pela proporcionalidade.
b Estado de necessidade – Esta previsto
no artigo 339º e tem sempre como pressuposto
o sacrifício de bens patrimoniais.
b Consentimento do lesado – A existência
de consentimento retira ao ato lesivo a sua
natureza ilícita, desde que conforme com a lei
e os bens costumes, no interesse do lesado e de
acordo com a sua vontade presumível.

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