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Catulo (canção 50)

Hesterno, Licini, die otiosi Lembro de ontem, Licínio, que ociosos


multum lusimus in meis tabellis, nós brincamos com minhas tabuletas,
no deleite que estava combinado
ut convenerat esse delicatos:
escrevíamos versos revezados
scribens versiculos uterque nostrum
a brincar variando cada metro
ludebat numero modo hoc modo illoc, numa troca de troca em jogo e vinho.
reddens mutua per iocum atque vinum. E de lá eu saí de brasa acesa
Atque illinc abii tuo lepore por teu charme, Licínio, e tua lábia,
incensus, Licini, facetiisque, que, coitado de mim, nem quis comida,
ut nec me miserum cibus iuvaret nem o sono cobria meus olhinhos;
nec somnus tegeret quiete ocellos, num indócil delírio sobre o leito
sed toto indomitus furore lecto revirei de desejo em ver o dia
versarer, cupiens videre lucem, para estar e sentar, falar contigo,
ut tecum loquerer, simulque ut essem. mas depois que meus membros fatigados
sobre o leito pousaram semimortos,
At defessa labore membra postquam
eu te fiz um poema, meu querido,
semimortua lectulo iacebant,
pra que visse desnudas minhas dores.
hoc, iucunde, tibi poema feci, Mas cuidado no abuso, luz dos olhos,
ex quo perspiceres meum dolorem. sim, cuidado, não cuspa neste prato,
Nunc audax cave sis, precesque nostras, pra que Nêmesis nunca te condene.
oramus, cave despuas, ocelle, Deus brava: cuidado! não ofenda.
ne poenas Nemesis reposcat a te.
est vehemens dea: laedere hanc caveto. [Tradução de Guilherme Gontijo Flores]

No dia de ontem, Licínio, ociosos


No ócio de ontem, Licínio, muitas lides muito brincámos nas minhas tabuinhas,
mantivemos em verso nas tabuinhas como acordáramos ser delicados.
quando o trato era sermos delicados. Versinhos um e outro escrevendo,
Cada qual escrevendo versos breves, brincávamos com o metro, ora com este ora com aquele,
lidava cá num metro, lá com outro, dedicando e recebendo entre as brincadeiras e o vinho.
em troca mútua em meio a riso e vinho. E daí me fui, pelo teu encanto
De lá parti, Licínio, tão aceso inflamado, Licínio, e pelas tuas graças,
por tua graça e teus encantamentos, a ponto de, pobre de mim, nem a comida me satisfazer,
que, ai de mim, nem a ceia me aprazia nem o sono os olhinhos tranquilo me tocar,
nem meus olhos cobria a paz do sono, mas, indómito, na cama de paixão tomado
mas indômito em fúria em todo o leito me voltar, ansiando ver a luz,
eu me virava ansiando ver o dia, para te falar e junto de ti estar.
falar contigo, estar contíguo a ti. Mas depois, quando os membros, pelo cansaço esgotados,
Porém, os membros lassos do trabalho, na caminha meio mortos jaziam,
depois de semimortos repousar, este poema, meu querido, para ti fiz,
a ti, meu caro, eu fiz este poema no qual perceberás a minha dor.
no qual perceberás a minha dor. Agora vê lá não sejas orgulhoso, e os nossos desejos,
Mas cuida bem, não sê ousado, minhas pedimos-te, vê lá não desprezes, minha joia,
preces, querido, peço, não desprezes, não te vá Némesis pedir contas.
por que não te prescreva penas Nêmesis. É deusa severa: cuida-te de a ofender!
É austera a deusa, e cuida não feri-la.
[Tradução de José Pedro Moreira & André Simões]
[Tradução de João Ângelo Oliva Neto]

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