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Lei de “combate” ao bullying?
Professora Tatiana Takeda

No dia 15/10/2015, os deputados da Câmara Federal aprovaram uma


proposta que, a meu ver, desperdiçou a chance de poder, realmente, impor
medidas punitivas ao praticante de bullying, bem como aos pais/responsáveis
(quando for o caso).
De acordo com o texto, bullying é definido como “todo ato de violência,
física ou psicológica, intencional e repetitiva, que ocorre sem motivação
evidente, praticado por indivíduo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o
objetivo de intimidá-la ou agredi-la, causando dor e angústia” (Câmara Notícias
de 15/10/2015).
Segundo noticiado por aquela Casa, a proposta em questão, Projeto
de Lei nº 5369/2009, não aponta punições para os agressores, os conhecidos
“bullies”. Parece que o legislador não quis entrar nessa questão, resumiu-se a
apenas privilegiar “mecanismos e instrumentos alternativos que promovam a
efetiva responsabilização e a mudança de comportamento hostil”. Também foi
informado que a proposta “prevê a adoção de medidas para evitar e combater o
bullying praticado por alunos, professores e outros profissionais integrantes de
escola e de comunidade escolar”.
Pesquisando junto ao site da Câmara, verifico que a intenção foi no
mínimo tímida demais. Após aprovação da Comissão de Constituição e Justiça
e de Cidadania (CCJ), a Casa publicou no dia 25/06/2013 que “ao instituir um
programa de combate ao bullying, a proposta lista metas como a prevenção do
bullying e a capacitação de professores para atuar na solução do problema.
Também são objetivos da iniciativa a realização de campanhas de
conscientização e a assistência psicológica às vítimas. Busca-se ainda
conscientizar os agressores, em vez de puni-los, a fim de que mudem de
comportamento”.
Pois bem. Diante desta notícia, procedo a duas perguntas: 1) Cadê
as punições? 2) O legislador vai tratar do bullying praticado somente nas escolas

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ou vai reconhecer que ele também ocorre nas universidades, vizinhanças,
ambientes de trabalho... ou seja, em todo lugar!?
Provavelmente, um pai que possui um filho que é ou já foi vítima dos
“bullies” vai ter muitas outras perguntas acerca desta proposta de lei. Claro que
devem ser realizados programas antibullying, mas o Ministério da Educação já
não recomendava isso às escolas? E nos outros ambientes? Serão prevenidos
por programas de combate? Como chegar às empresas ou universidades?
Será mesmo que o legislador acredita que com programas de
prevenção vai conseguir evitar que crianças e adolescentes, principalmente,
deixem de ser agredidas verbal e fisicamente por aqueles que possuem por
característica primordial a truculência, preconceito e covardia? Esse tipo de
pessoa, criança ou não, vai, no máximo, levar uma advertência ou “ouvir um
sermão”? É isso que vai coibir a prática de uma ação que transforma a vítima
em uma pessoa de baixa autoestima, angustiada e com tendências suicidas?
Novamente, remeto a trechos de depoimentos de familiares de
autistas vítimas de bullying citados pela jornalista Fátima de Kwant no site
Autimates (2015):

“Meu filho sofreu tanto bullying que ele chegou a pensar em se matar.
Começou a se cortar. Agora faz terapia para aprender a trabalhar isso.
A gente acha que ele nunca vai se recuperar desses sentimentos...”
“Minha filha passou de uma menina confiante, feliz e despreocupada a
um comportamento paranoico, depressivo e suicida. Ela até pensou
em mudar de sexo, porque achava que sendo menino poderia
sobreviver melhor ao bullying...”
“A escola negava o bullying. Ele só falava em morrer. Meu filho tinha
sete anos e falava em morrer... A ansiedade dele era tanta, que se
tornou hipersensível e nem podia usar alguns tipos de roupa. Bullying
era, com certeza, responsável pela ansiedade...”
“Nós tivemos que tirá-lo da escola. Eles (escola) diziam que aquilo era
‘brincadeira de coleguinhas’...”
“Primeiro ele aguentou os tapas, depois começou a revidar. Quando
não aguentou mais e machucou um dos bullies, foi expulso da
escola!...”

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No dia 21/09/2015, o Programa Encontro, apresentado por Fátima
Bernardes, em homenagem ao dia Nacional da Luta das Pessoas com
Deficiência, mostrou o caso de uma cadeirante que apanhava dos colegas pelo
simples fato ser uma pessoa com deficiência. Ela chegou a ter um pé quebrado.
Anos depois, seu filho começou a ser vítima de bullying na escola porque tinha
uma mãe “aleijadinha”. Hoje, mãe e filho dançam juntos em uma tentativa de
demonstrar que ela pode ir além do que os outros imaginam (Gshow).
O “bullie” pode ser aquela criança/adolescente/adulto que agride com
palavras verbais ou espanca o outro pelo simples fato deste ser ou estar
diferente daquilo que o agressor entende como “ideal”. A criança/adolescente
que espanca a outra pelo fato desta ser cadeirante já demonstra do que vai ser
capaz quando tornar-se um adulto.
Observando casos de bullying, percebo que a discriminação está
intrinsecamente ligada a esta conduta. Ainda mais quando a vítima é uma
pessoa com deficiência, seja física ou intelectual.
Nestes casos, acredito que, no mínimo, os pais, mesmo com pouco
amparo jurídico, devem denunciar o agressor e por que não tentar enquadrá-lo
no artigo 88 do Estatuto de Proteção à Pessoa com Deficiência?
Por oportuno, veja-se teor do mencionado dispositivo:

Art. 88. Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão


de sua deficiência:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
§ 1º. Aumenta-se a pena em 1/3 (um terço) se a vítima encontrar-se
sob cuidado e responsabilidade do agente.
§ 2º. Se qualquer dos crimes previsto do caput deste artigo é cometido
por intermédio de meios de comunicação social ou de publicação de
qualquer natureza:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Aí a celeuma vai girar entorno da responsabilidade. Os pais serão


responsabilizados pela conduta de seus filhos agressores? De que forma?

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Quem é pai sabe o quanto é difícil educar nos dias de hoje. A televisão
e a internet talvez atrapalhem mais que ajudam. No entanto, como aluna do
ensino fundamental dos anos 80, vejo que naquela época, quando a crianças
erravam na escola, os pais cobravam mudança de atitude dela e ficavam
constrangidos diante dos professores. Hoje, existem pais que “atacam” os
professores que relatam as “malcriações” de seus filhos. Não acho difícil o filho
de uma pessoa assim se tornar um “bullie”.
Assim, embora sejam relativamente poucos os julgados no âmbito dos
Estados e os tribunais superiores não terem se pronunciado a respeito, acredito
que, a partir do momento que os pais consigam comprovar o constrangimento
dos filhos, devem sim acionar a Justiça. Se aos olhos do legislador, o bullying
não é crime ou ato infracional, que pelo menos existam condenações na seara
cível.
Aliás, quanto ao legislador, o que não entendo é o fato dele citar no
artigo 2º do Projeto de Lei que o bullying caracteriza-se, dentre outros, pelos
ataques físicos e ameaças por quaisquer meios e não confeccionar nenhum
dispositivo que puna o agressor. Nem “multa”!
Imagino que aquele tipo de pai que não se importa com o que o filho
faz ou deixa de fazer, ao receber pelo menos uma “multinha”, ia atentar-se
melhor às ações truculentas do rebento.
Demais disso, chamo a atenção para o fato de que a proposta de lei
aprovada pela Câmara Federal e encaminhada para a sanção da Presidente da
República também cita em seu artigo 4º que o “programa de combate ao bullying”
possui como um de seus objetivos prestar “assistência psicológica, social e
jurídica às vítimas e agressores”. Concordo, especialmente as vítimas precisam
de tratamento psicológico. Todavia, acho que faz parte da prevenção criar regras
que punam o agressor ou seu responsável, seja na seara criminal ou civil.
Não estou dizendo que a solução deste problema é apenas punir, mas
que um projeto de lei que trata de um assunto tão sério deveria ter se atido ao
fato de que um programa de combate ao bullying, ação que envolve violência
física e moral, deveria ter, no mínimo, ter criado sanções que não fossem
somente as de caráter pedagógico. Em miúdos, é necessário prevenir e

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combater o bullying, bem como punir a prática como crime ou ato infracional
(respeitada a idade do “bullie”) e civilmente (danos morais a serem arcados pelos
pais/responsáveis no caso de menor).

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