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RESENHA DO ARTIGO
International Exercise Recommendations in Older Adults (ICFSR): Expert
Consensus Guideline
Rio de Janeiro
2021
O artigo “International Exercise Recommendations in Older Adults (ICFSR):
Expert Consensus Guidelines” escrito por M. Izquierdo, (Professor titular e chefe do
Departamento de Ciências da Saúde. Universidade Pública de Navarra) e colaboradores
foi publicado na “The Journal of Nutrition, Health and Aging”, periódico médico
mensal cuja publicação é feita pela Springer Science com fator de impacto 4.075.
Em introdução ao texto, os autores expõem as justificativas para implementação
da atividade física e exercício estruturado para a promoção da saúde, prevenção e
tratamento de doenças em idosos. A parte inicial do artigo evidencia a necessidade de
voltarmos as atenções para o aumento da população de idosos no mundo, haja visto que
esta será cerca de 1,5 bilhões de indivíduos em 2050. Os autores ratificam ainda que o
processo de envelhecimento é universal, onipresente e inevitável e que, portanto, muitos
setores como saúde, aposentadoria e qualidade de vida serão diretamente impactados.
Alguns processos associados ao envelhecimento como doenças crônicas e
incapacidades são responsivos a dois tipos de fenótipos moldados pelas experiências de
vida, comportamento e sobretudo pela ausência ou presença em níveis ótimos de
atividade física (qualquer movimento que eleve significativamente o gasto energético) e
exercícios estruturados (atividade física planejada, estruturada e repetitiva que pode
levar a manutenção ou melhora de componentes da aptidão física).
O exercício pode atuar de forma preventiva promovendo a manutenção da
função fisiológica e capacidade funcional na velhice enquanto sua ausência está
relacionada ao aparecimento de doenças e disfunções de maneira prematura e excessiva.
Embora haja outros fatores constituintes do estilo de vida como por exemplo o padrão
alimentar, o foco do artigo é contextualizar os aspectos da atividade física e exercício e
suas respectivas doses e modalidades adequados. Os autores ainda reconhecem que
muitas vezes fatores socioeconômicos podem impactar de sobremaneira na
incorporação das atividades e exercícios como hábitos de vida.
Por mais que o envelhecimento seja por si só um fator de risco atenuante para a
maioria das doenças crônicas, as mesmas, em conjunto com as síndromes geriátricas e
efeitos crônicos de seus tratamentos também contribuem para acelerar o processo de
envelhecimento. Sendo assim, a OMS define o envelhecimento saudável como o
desenvolvimento e manutenção da capacidade funcional.
A evidente relação entre genética, ambiente e comportamento, comprova que há
uma interdependência entre natureza e criação. Nesse sentido, a contribuição destes
fatores para o envelhecimento e sua influência na manifestação de doenças crônicas e
comorbidades pode ser modificada através da atividade e exercícios físicos, mesmo em
idosos mais velhos, impactando nos processos inflamatórios, disfunção mitocondrial
entre outros citados dos pelos autores.
Para além da prevenção e tratamento de doenças como diabetes, hipertensão,
câncer, depressão, demência, Parkinson, etc. Ter uma vida mais ativa com prática de
exercícios físicos auxilia na diminuição da mudança de composição corporal vivida
pelos idosos (perda de densidade óssea e muscular, aumento do tecido adiposo e
redistribuição deste para regiões mais centrais e viscerais). Os autores lembram ainda
que, declínios do condicionamento cardiorrespiratório, função muscular, cognição,
raciocínio, processamento, atenção, função executiva e memória, comprometem a
realização de atividades da vida diária, impactando na independência e autonomia do
idoso.
Portanto, sendo a atividade física e o exercício estruturado uma forma de
prevenção e tratamento de todas estas condições inerentes do processo de
envelhecimento, os autores chamam para uma reflexão acerca da necessidade de
considerar em todas as idades uma relação de dose-resposta do exercício levando em
consideração não somente o volume e intensidade, mas também de forma específica as
adaptações promovidas pelas modalidades escolhidas, visando resultados específicos a
serem alcançados.
No que tange as recomendações globais, embora haja níveis mínimos de
atividade recomendados por instituições como OMS, ACSM e outras, as mesmas
raramente são seguidas, sobretudo na população mais idosa. Os autores apresentam
dados de que o não cumprimento dessas recomendações é responsável por mais de 1
milhão de mortes de adultos a cada ano.
Por outro lado, os autores levantam um ponto de extrema relevância no que diz
respeito a promoção da incorporação dessas atividades físicas. Frequentemente os
incentivos à prática se concentram em estimular escolhas no dia a dia dos indivíduos
como utilizar escadas em detrimento de elevadores. Atualmente, estudos buscam
compreender se há maior adesão a esse tipo de prática quando comparado a programas
de treinamento padrão e estruturados e se as adaptações promovidas por essas escolhas
são de fato tão relevantes.
Com base nas evidências de que o exercício atua de forma preventiva para
doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, entre outras e que de maneira específica
o treinamento de equilíbrio contribui para redução de quedas, assim como exercícios
resistido atenuam a sarcopenia. Os autores demonstram que o exercício pode ter papel
fundamental, principalmente em síndromes cujo tratamento farmacológico apresenta
controversas.
Entretanto só haverá um verdadeiro impacto do exercício estruturado na vida do
indivíduo se houver, no princípio, a adesão do programa de treinamento e atividades.
Para que isto ocorra, não são suficientes os esforços em limitar o acesso ou mesmo
desestimular práticas como tabaco, álcool e sedentarismo. Faz-se necessário também
melhorar o acesso às instalações e áreas de prática das atividades físicas, seja em
ambientes estritamente de lazer ou até mesmo locais de trabalho.
A literatura aponta que a capacidade aeróbia é beneficiada principalmente de
exercícios aeróbios de intensidade moderada à vigorosa. Enquanto o treinamento
resistido ou de força tem se mostrado o mais indicado para o tratamento da sarcopenia,
melhora do equilíbrio e até mesmo, embora menos conhecido, benefício na capacidade
aeróbia. Nesse sentido, é razoável imaginar que no planejamento inicial de um treino,
possamos inserir estágios, priorizando o treinamento resistido por ser capaz de
modificar as condições de força, equilíbrio e capacidade aeróbia do indivíduo. Esses
conhecimentos são fundamentais para que haja uma prescrição mais assertiva para os
idosos que facilite a adesão ao programa de treino.
É importante que todos os profissionais da saúde se atentem para a necessidade
de implementar as práticas, fornecer o suporte devido e monitorar os resultados. Outro
ponto levantado pelos autores é a injustificável omissão de prescrição para idosos com
deficiências físicas ou mentais significativas. Embora hoje as diretrizes recomendem
uma abordagem de exercícios de forma multimodal, não se pode esquecer que a
prescrição deve ser individualizada e voltada para a maior necessidade do idoso em
questão imprescindivelmente avaliando cada caso. Se há por exemplo uma dificuldade
no caminhar, é preciso identificar a causa, seja ela na falta de força, equilíbrio ou até
mesmo resistência. Em alguns casos, se há benefício similar entre duas modalidades de
exercício para uma síndrome, devemos avaliar se há uma segunda doença que se
beneficie majoritariamente de uma das modalidades e utiliza-la a fim de otimizar as
respostas ao exercício de maneira geral.
Em seguida os autores fragmentam em tópicos as recomendações de diferentes
tipos de treinos e modalidades.
Treino de marcha
Sabe-se que a marcha é um importante preditor da qualidade de vida em idosos,
e, portanto, deve-se haver esforços para sua manutenção. Exercícios como caminhadas,
subir escadas e outros podem levar a adaptações aeróbias com impacto sobre a marcha e
mobilidade. Ademais, deve-se inserir cargas nestas atividades que simulam a vida e o
dia a dia sempre que possível. Não obstante, indivíduos que possuam limitações e
menor condicionamento, muitas vezes não suportando sustentar o próprio peso, deverão
priorizar o treinamento resistido e de força para posteriormente inserir os demais
exercícios.
Durante as semanas iniciais, a duração pode variar de 5 a 10 minutos
progredindo para 20 a 30 minutos a longo prazo.
Treinamento resistido
No tocante o treinamento resistido, mesmo idosos com fragilidade podem se
beneficiar desta prática. Visando otimizar as adaptações e tornar o treinamento mais
eficiente, recomenda-se uma frequência de 2 ou 3 vezes semanais, inicialmente com 1
ou 2 séries progredindo para 2 a 8 séries de 8 a 12 repetições. Priorizando os principais
grupamentos musculares tanto da parte superior como inferior. Novamente exercícios
que simulem as atividades da vida diária tem fundamental importância. Apesar da
recomendação no que diz respeito às cargas seja extensa (50% a 80% de 1RM), meta-
análises recentes demonstram que melhor resultados podem ser obtidos em intensidades
maior entre 70 e 80% de 1 RM.
Embora haja muitos benefícios para tal prática é necessário um cuidado especial
sobretudo na primeira fase de adaptação pois qualquer lesão nessa população pode levar
a um extenso período de inatividade seja pela recuperação da lesão em questão ou até
mesmo pelo abandono e falta de adesão da prática.
Treinamento de força
Dentro do treinamento resistido há uma subcategoria a qual denominamos de
treinamento de força. A produção de força é extremamente necessária para capacidade
funcional do indivíduo, em especial na população idosa a manutenção deste componente
está diretamente associada a realização das atividades de vida diária. A prescrição deste
treinamento deve ser feita para todos os públicos, indivíduos saudáveis, idosos com
sarcopenia, fragilidade, entre outras comorbidades.
Visando maximizar a potência muscular, a fase concêntrica da contração
muscular deve ser feita com velocidade, evitando sempre a falha concêntrica e com
cargas entre 30-45% (membros superiores) 60-70% (membros inferiores). Deve-se
ainda estar atento ao risco de lesões de menisco ou tendões.
Esses exercícios podem ser realizados com o peso corporal de forma inicial,
progredindo para pesos livres ou máquinas, tendo a pliometria como alternativa que
deve ser observada com cautela, haja visto que o comprometimento do equilíbrio e
condições como artrite podem impedir a prática pliométrica por idosos frágeis.
Lesões no manguito rotador e osteoartrites podem ser um impeditivo para a
prática do treinamento de força e potência, mas de forma alguma representam uma
contraindicação para a prática do treinamento resistido tradicional ou até mesmo
isométrico.
Treinamento aeróbio
A diminuição da capacidade cardiorrespiratória nos idosos se dá pela diminuição
do débito cardíaco máximo em função da redução do volume sistólico e frequência
cardíaca. Portanto, o treinamento aeróbio é de suma importância, pois pode induzir
adaptações centrais e periféricas que impactam na captação do oxigênio e na sua
utilização pelo músculo. Embora as adaptações do volume sistólico sejam semelhantes
em jovens e idosos, não há evidências de que a frequência cardíaca máxima possa ser
aumentada, havendo apenas uma melhora da resposta ao exercício submáximo.
Esse declínio característico do envelhecimento pode ser explicado muito em
função da perda de massa muscular. Sendo assim, idosos que apresentem severa queda
da capacidade funcional podem não ser capazes de realizar o treinamento aeróbio
tradicional e colher seus benefícios. Os principais programas envolvem, caminhadas
com mudança de ritmo ou direção, esteira, escada, cicloergômetro, dança, entre outros.
Podendo ser substituídos por ciclismo reclinado ou ergometria de braços em casos de
impossibilidade de utilização das extremidades inferiores.
Os autores destacam a importância de estar atento a intensidade dos exercícios,
uma vez que a frequência cardíaca não é um índice tão confiável nessa população
devido ao uso de marca-passos, betabloqueadores farmacológicos e até mesmo presença
de fibrilação atrial. Portanto, uma maneira viável de avaliação da intensidade da
atividade pode ser a escala de percepção subjetiva de esforço de Borg.
Para os autores a sequência de introdução do treinamento de força, exercícios de
equilíbrio com posterior inclusão do treinamento aeróbio, pode ser a chave para a
eficiência e segurança.
Treinamento multicomponente
Geralmente inclui em seu programa a combinação de força, potência, marcha,
equilíbrio e treinamento funcional. Podendo ser prescrito inclusive para populações
mais vulneráveis, idosos hospitalizados e até mesmo institucionalizados. Ainda não está
claro na literatura se esse tipo de intervenção é mais eficaz do que um programa único
de exercícios, nem mesmo há evidências de que esses programas multimodais, em baixa
e moderada intensidade, melhorem a cognição de pacientes com demência leve ou
moderada.
Os autores apresentam um exemplo de programa de exercícios
multicomponentes baseado em evidências científicas. O guia VIVIFRAIL consiste em
exercícios voltados para membros inferiores, membros superiores, equilíbrio e
recondicionamento da marcha. Estudos recentes observaram que 4 semanas desse
protocolo supervisionado, 3 vezes ao ano com no máximo 14 semanas de inatividade
entre os períodos de atividade resultaram em benefícios na manutenção da capacidade
funcional e são capazes inclusive de melhorar a fragilidade em idosos
institucionalizados.
Deficiência cognitiva
Os fatores pelos quais o exercício melhora a função cognitiva vão desde
aumento do fluxo cerebral e fatores neurotróficos (BDNF, IGF-1), e regulação de
fatores neurotóxicos (insulina, interleucina) até prevenção de doenças crônicas como
avc’s, hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, etc. Embora haja alguns estudos
nesse campo, a heterogeneidade dos idosos com demência e da própria intervenção,
muitos resultados apontam apenas para melhoras físicas em detrimento da cognição.
Portanto, a prescrição ideal para este fim ainda não está definida, mas devemos refletir
sobre a ausência de resultados positivos quando observamos intervenções de baixa
intensidade e mínima supervisão. Haja visto as evidências atuais, não há necessidade de
diminuir a intensidade do exercício para indivíduos com demência caso haja devida
supervisão.
Quando acompanhada de fragilidade, a deficiência cognitiva mesmo em estágios
mais avançados pode também se beneficiar das atividades e exercícios físicos. Estudos
mostraram uma melhora da capacidade de marcha, equilíbrio e força muscular e
consequente redução da incidência de quedas, a partir de uma intervenção combinada de
exercício resistido de moderada intensidade, caminha, equilíbrio, exercícios cognitivos e
terapia ocupacional. Sendo assim as intervenções multimodais podem melhorar a
função física e cognitiva simultaneamente.
Conclusão
Conclui-se, portanto, que a atividade física bem como o exercício físico
estruturado são ferramenta potentes capazes de incidir sobre a vida de todos os
indivíduos independentemente da idade. No que diz respeito aos idosos, a vida distante
do sedentarismo é fundamental para que haja uma maior capacidade funcional durante a
terceira idade, e concomitantemente redução dos declínios cognitivos, físicos e
funcionais. Há ainda uma forte relação dose-resposta entre a intensidade dos exercícios
e os benefícios por eles promovidos, de maneira que devemos estar atentos também às
maiores necessidades do indivíduo em questão para que possamos selecionar a melhor
modalidade de treinamento e estruturar as possíveis progressões.
Referência
IZQUIERDO, Mikel et al. International Exercise Recommendations in Older Adults
(ICFSR): Expert Consensus Guidelines. The journal of nutrition, health & aging, v.
25, n. 7, p. 824-853, 2021.