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drama
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MULHER
ARTUR
MULHER
ARTUR
Boa noite, eu sou Artur. Vim pro apartamento 713, de Osmar. Ele disse
que ia deixar a chave aqui na portaria.
RAIMUNDO
Artur? É, ele deixou a chave aqui.
O porteiro abre o resto da porta. Depois, dirige-se à sua mesa de trabalho, onde está a
chave. Sobre a mesa, um radinho de pilha, ligado. Ouve-se um locutor que fala com
quem trabalha de madrugada.
RAIMUNDO
O porteiro dá livro e caneta para Artur assinar. Artur assina com a mão esquerda. O
porteiro olha o livro.
RAIMUNDO
ARTUR
É mesmo?
RAIMUNDO
Fazer prova.
RAIMUNDO
ARTUR
Boa noite!
RAIMUNDO
Artur olha para a tabuleta no elevador e olha para a escada. Dirige-se a ela. Na porta
do elevador, uma placa de madeirite:
“EM CONÇERTO”
Artur faz cara feia, coloca a mochila nas costas.
ARTUR
Que azar!
Artur, subindo a escada, para e observa através das grades da escada uma confusão
entre moradores do segundo andar, num corredor que dá acesso aos apartamentos.
Roberto Carlos canta numa vitrola qualquer. HOMEM descalço, sem camisa, com um
cabo de vassoura na mão, discute com OUTRO. Ao redor, TRÊS MULHERES.
Falam ao mesmo tempo. O clima é confuso e agressivo.
HOMEM 1
Corno!
HOMEM 2
MULHER 1
Já chega. Vambora!
MULHER 2
MULHER 1
MULHER 2
Acende a luz e observa o apartamento. É pequeno e tudo está desarrumado. Vai até a
janela, olha a paisagem, dá outra olhada geral no apartamento, vê a televisão, vai até
ela, liga. Só tem ruído no ar. Ele desliga a TV e desaparece na porta do quarto.
Quarto simples. Cama próxima da janela. Artur tenta dormir sob a luz dos neons que
vem da janela. Vira-se na cama. Uma réstia de luz atinge seus olhos. Artur não
consegue dormir. Levanta.
Sala pequena. Mesa de jantar, com cadeiras. Sofá velho ao fundo. A mesa foi
arrumada por ele, como para uma refeição. Artur, sentado, puxa para si a lata. Tenta
manejar o abridor com a mão esquerda e não encontra jeito. Troca o abridor de mão e
tenta novamente. Numa terceira tentativa, o abridor escorrega e ele termina sofrendo
um pequeno corte na própria mão. Sangra bastante. Gotas de sangue respingam na
brancura imaculada do prato.
ARTUR
Droga!
Artur fica paralisado quando vê o sangue escorrer pelo seu pulso. Perturbado, recorre
à toalha de prato e pressiona sobre o local ferido, para estancar o sangue. Enrola a
toalha na mão. Volta-se para a lata e o abridor. Quer tentar mais uma vez. A ferida
sangra bastante. Artur olha em volta, procurando algo.
ARTUR
Artur põe o interfone de volta na parede. Pega a lata e o abridor e vai para a porta.
Artur abre a porta do apartamento. O corredor está mal iluminado. O som de uma ária
cantada por voz feminina invade todo ambiente. Artur identifica, pelas luzes, de qual
apartamento vem a música. Ele vai até a porta desse apartamento e hesita. Olha para a
lata e o abridor em suas mãos. Artur bate levemente na porta. Espera, nada acontece.
Bate, de novo, um pouco mais forte. Espera. Nada. Artur bate forte, na porta, mas a
música continua abafando as batidas. Artur espera um pouco e bate muito mais forte.
Antes que o primeiro golpe a tinja a porta, a música, subitamente, se cala. As batidas
de Artur soam por todo sétimo andar. Ele se assusta. Uma corrente de vento bate a
porta de seu apartamento. Inesperadamente a porta do apartamento da Velha começa a
se abrir sozinha, lentamente, com um suave rangido. Artur espicha o pescoço para
olhar quem está no apartamento.
ARTUR
Dá licença?
A Velha se levanta e começa a dar aqueles passinhos curtos, de velho. Quando Artur
se aproxima e tenta dizer o que quer, ela grita.
VELHA
Aahhhh!
Artur pára, sem jeito, assustado. Começa a recuar, sem muita ação, fazendo gestos
com as mãos para acalmar a Velha, que não pára de gritar. Artur deixa cair a toalha de
prato, suja de sangue. A Velha suspende o grito num certo instante, arregala os olhos
e grita de novo.
Cama de casal. Cabeceira ladeada por abajur barato. Ouve-se o grito da Velha. O
SÍNDICO, homem corpulento, másculo, cara dura, aparentando 60 anos, que estava
dormindo sob as luzes dos neons lá de fora. Emerge dos lençóis com cara de espanto.
Acende um abajur, senta ainda na cama, estende a mão e pega uma escopeta, que
mantém sempre ao alcance. Na mesa de cabeceira há um retrato seu, com farda de
policial.
Corredor escuro. Luzes na escada. Artur acaba de se desvencilhar da Velha, que parou
de gritar. Olha ao redor e vai em direção à escada. Vendo que ninguém acordou,
procura sair rápido da cena, acelerando os passos à medida que se aproxima da
escada.
Escadas pouco iluminadas. Artur desce correndo. A lata de goiabada escapa de sua
mão e rola pela escada até o andar debaixo. A lata continua rolando pelo chão do
corredor e bate com violência na porta de um apartamento. Artur corre atrás, sempre
olhando ao redor para ver se vem alguém. Vai até a lata que repousa bem diante da
porta do 605. Quando ele se abaixa para pegar a lata, a porta se abre bruscamente. A
luz que vem de dentro do apartamento bate em seu rosto. Artur se assusta e olha para
cima. Um sapato de salto alto pisa a lata. Depois, o bico do sapato suspende o queixo
de Artur, fazendo-o olhar para cima. Ele vê uma longa e bem feita perna feminina
saindo de um penhoar preto. Uma MULHER LOURA, escultural, de
aproximadamente 40 anos, bonita, fala com voz sedutora. Artur se levanta e se
recompõe.
LOURA
SÍNDICO
Isto não está cheirando bem. Com esse tipo, é atirar primeiro e
perguntar depois. Cuidado! Esse cara é perigoso!
ARTUR
LOURA
Ela tenta puxá-lo ou atraí-lo para algum lugar lá dentro. O apartamento tem uma luz
suave, clima romântico. Vê-se uma mesa arrumada para um jantar à luz de velas.
LOURA
ARTUR
LOURA (maliciosa)
LOURA (excitada)
Seja o meu cavalinho!
ARTUR
LOURA
LOURA
ARTUR
LOURA
Na excitação ela começa a rasgar o próprio penhoar e avança para ele, que recua,
tropeçando nos móveis. Ela se agarra com ele. Os dois lutam. Ele se solta e dá-lhe um
empurrão. Ela esbarra na mesa, derruba as velas e destrói o “jantar” que havia
preparado. Artur aproveita par sair correndo. Volta, pega a lata e o abridor e são de
novo.
LOURA
Artur desce a escada apressado. Ao chegar ao quinto andar, pára, escuta e decide o
que fazer. Quando resolve seguir, ao dobrar para o corredor, dá de frente com uma
MOÇA de 22 anos, cabelos longos, claros, vestindo jeans e camiseta colorida,
carregando livros, cadernos e uma mochila. Artur quase esbarra com ela. Ele se
assusta, ela ri e vai em direção à porta do seu apartamento. Enquanto ela abre a porta,
Artur se aproxima, mostrando a lata e o abridor.
ARTUR
A Moça olha para a lata, para o abridor, percebe o ferimento e encara Artur,
interrogativa.
Enquanto tenta falar, Artur faz uma espécie de mímica. Demonstrando sua falta de
jeito.
Ela acaba de abrir a porta do apartamento e põe as suas coisas sobre uma mesa na
sala, próxima da porta.
O grupo do Síndico encontra a Loura na porta do seu apartamento. Sua roupa está
rasgada. Ela está com uma expressão de raiva.
SÍNDICO
LOURA
Quem? O tarado?
SÍNDICO
Ele te atacou?
A Loura chora, dramática, exagerada. Deve-se entender que ela chora porque ele foi
embora. O Síndico entende que ela chora porque foi atacada.
LOURA
Foi horrível...
O Síndico segura firme o seu braço.
SÍNDICO
LOURA
SÍNDICO
A Loura aumenta a crise de choro quando o Síndico garante que ele não volta. O
Síndico sai com o grupo. A Loura sai atrás do grupo.
Outro apartamento, semelhante aos outros. Móveis simples. Mesa e lugares para
sentar. Artur pára na porta, indeciso. Ela bota os livros e a mochila sobre a mesa. Vem
em direção à porta.
MOÇA
Pode entrar.
Artur entra, timidamente, uns poucos passos. Ela se dirige para ela, pega a lata e o
abridor. Vê o ferimento e sorri.
MOÇA
Artur limpa um pouco do sangue que voltou a escorrer, na própria camisa. Neste
instante o PAI da moça aparece. Artur se assusta. Do lado de fora do apartamento vem
o barulho dos perseguidores comandados pelo Síndico. O pai se aproxima dos dois.
PAI
Isso é hora de chegar em casa? O quê você está pensando? Que isso
aqui é motel? E agora deu pra trazer homem pra dentro de casa? Era só
o que faltava! É isso que você aprende na faculdade? (para Artur)
Cafajeste!
O Pai dá um soco em Artur, que é arremessado pela porta aberta e vai cair no
corredor.
23 INT. - CORREDOR DO QUINTO ANDAR. - NOITE
Artur cambaleia e para nos braços do Síndico, que o empurra em direção a um dos
outros que vêm chegando com ele. Este recebe Artur com um soco. Um a um, todos
têm a oportunidade de golpear Artur, que apanha no meio de uma roda. Ele ainda está
de pé, mas sem qualquer controle. A última pancada é uma coronhada de escopeta
desferida pelo próprio Síndico, evitando que Artur caísse sobre ele.
SÍNDICO
Tomaí, tarado!
Com o golpe do Síndico, Artur cai e agora é a vez das mulheres e dos menos
corajosos: pontapés, pauladas, socos e cusparadas histéricas. A Moça faz uma menção
de tentar intervir mas é contida pela mãe. As duas têm expressão de muito medo. A
Moça fecha os olhos, horrorizada.
Outro corredor, semelhante aos dos outros andares. Artur está no chão, todo
ensangüentado, inerte. As pessoas se afastam e o Síndico retoma o comando. Artur se
mexe. Está recobrando a consciência, parece que vai levantar. Uma SENHORA,
envolta num robe florido, bobes e lenço nos cabelos, cerca de 50 anos, dá-lhe uma
vassourada definitiva. Artur desmaia.
Trecho qualquer das escadas. O Porteiro sobe, correndo, a escada do quarto para o
quinto andar.
SÍNDICO
Seu Raimundo, como é que o senhor deixou este homem entrar no
prédio?
MULHER
O Porteiro fecha a cara para o Síndico e se ajoelha junto ao corpo, no chão. Fica
inquieta e pega a cabeça de Artur entre as mãos, sujando-se no seu sangue. Ouvem-se
ruídos de sirene.
PORTEIRO
MORADOR
SÍNDICO
PORTEIRO
SÍNDICO
Tenente Matias!
CAPITÃO
CAPITÃO
PORTEIRO
Sim, senhor.
CAPITÃO
PORTEIRO
CAPITÃO
Raimundo está perplexo, mas sem acreditar que possa acontecer algo tão louco. Olha
para os moradores, vão baixando a cabeça ou virando o rosto. Todos evitam o olho no
olho. Os soldados pegam o porteiro pelos braços e o levam escada abaixo. Ele ainda
tenta resistir, mas um cassetete encostado em seu queixo o demove. Vai.
CAPITÃO
O Capitão cumprimenta a todos com uma batida de cabeça, um tanto militar. Os dois
se despedem com um aperto de mãos. O policial desce. O Síndico começa a andar em
direção à escada. Cruza com a Loura. Ela abaixa os olhos e passa.
29 INT. - CORREDOR DO QUINTO ANDAR. - NOITE, MAIS TARDE
FRASES
Quando a cena já está quase vazia, a moça sai, discretamente, de seu apartamento e
recolhe a lata e o abridor. Sai de cena. No corredor vazio, fica o corpo de Artur.
FIM