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O ENFRAQUECIMENTO DO ESTADO E O PROCESSO DE


SIMULAÇÃO DO CAPITAL

André Felipe Malta Santos1


Matheus Alef Pereira Santos2
Paulo Victor Bispo Santana3

Resumo: O objetivo desta pesquisa é abordar de maneira argumentativa e objetiva


que a ideologia neoliberal não é mais satisfatória, pois não conseguiu cumprir sua
proposta de que a liberação do mercado aperfeiçoa o crescimento e o
desenvolvimento das nações. O Estado perdeu sua autonomia e autenticidade e
com a valorização do mercado globalizado o capital passou a mover o mundo a
medida que o país e sua autonomia ficam em segundo plano. O enfraquecimento do
Estado por conta da globalização por ele financiada é uma das principais
consequências da atual crise estrutural do capital e mais do que nunca o mundo vê-
se obrigado a buscar um novo sistema econômico.

Palavras-chave: Ideologia neoliberal. Enfraquecimento do Estado. Crise estrutural


do Capital.

Abstract: The objective of this research is to address the argumentative and


objective manner that neoliberal ideology is no longer acceptable, because its
proposal failed to meet that market liberalization enhances growth and development
of nations. The state lost its autonomy and authenticity and the recovery of the global
capital market began to move around the world as the country and its autonomy are
in the background. The weakening of the state due to the globalization financed by

1
Aluno do curso de Ciências Econômicas, UESC, andrefelipemalta@gmail.com.

2
Aluno do curso de Ciências Econômicas, UESC,matheusalef@yahoo.com.br.

3
Aluno do curso de Ciências Econômicas, UESC,p.victor_santana@hotmail.com.
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him is one of the main consequences of the current structural crisis of capital and
more than ever the world is forced to seek a new economic system.

Key-words: Neoliberal Ideology. Weakening of the state. Structural Crisis of Capital.

Introdução

A teoria neoliberal não conseguiu cumprir o anseio de uma suposta


otimização da prosperidade mundial. O Estado nacional perdeu sua autonomia e a
dificuldade em absorver o excedente de capital transformou-se em crise. Com a
valorização do mercado global, o capital é hoje aquilo que move o mundo. O país e
sua autonomia ficam pra trás e a política econômica nos leva a descentralização de
todo um sistema que coloca o capital num pedestal.

Esse é o ponto de partida para a continuidade deste artigo com um olhar


sobre a problemática citada e o objetivo de apresentar uma idéia do que poderia ser
feito para sanar tais problemas advindos do enfraquecimento do Estado. Aqui
também, utilizaremos dos trabalhos de outros teóricos para respaldar tudo que aqui
está sendo tratado e reforçar tais idéias para que de forma alguma caiam no
esquecimento.

Diante deste contexto, será exposta a problemática em que está inserido o


atual sistema vigente diante da perda de autonomia do Estado através da
supervalorização do capital e seu processo de simulação, tal como a viabilidade de
se moldar o atual sistema ou migrarmos para uma nova estrutura econômica através
da reeducação dos princípios que remontam as bases da essência humana.

Além desta introdução, contendo uma breve contextualização dos objetivos


do trabalho, este artigo está estruturado em mais três seções: a Seção 2 apresenta
uma contextualização sobre a valorização do capital e a perda de autonomia do
Estado, na Seção 3 tem-se as consequências da simulação do capital. Na Seção 4
encontram-se as considerações finais.
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A perda de autonomia do Estado

O processo de perda da autenticidade e autonomia do Estado a partir do


século XX deve-se em grande parte ao neoliberalismo que age como um facilitador
em prol tanto das instituições supranacionais como das subnacionais percorrendo
um sistema que se deixa levar pela força do capital (KURZ, 1997; FORJAZ, 2000).O
Estado Nacional formou-se entre os séculos VIII e XIV na Europa Ocidental, durante
o feudalismo, e tinha um caráter soberano e ativo.No entanto, a intervenção do
Estado na promoção do bem-estar econômico e social,  assim como a sua soberania
vem sofrendo mudanças gritantes num processo de inversão dos poderes
autonômicos que agora passam ao capital(FAGUNDES, 2005).

Se antes o Estado tinha a obrigação de prover ao cidadão emprego, moradia,


qualidade de vida, educação, saúde e segurança (Políticas Públicas), hoje, o que
acontece é a diminuição de todos os investimentos às necessidades humanas em
prol do crescimento da economia mundial e não necessariamente sustentável
(KURZ, 1997). Entrelaçado no caos que a economia global tem sobrevivido,
passamos a indagar se já não seria o momento de formularmos ou incitarmos a
mudança para outro sistema menos irracional que o capitalista e mais viável que o
socialista. (KURZ, 1997; PRZEWORSKI, 1991)

O enfraquecimento do Estado pode ser definido por fatores externos


(supranacionais) e internos (subnacionais), mas se tratando de sua relação com a
Globalização por onde permeia o principal motivo de seu esmorecimento, as
instituições supranacionais se destacam. Em relação a isso fica notório que com o
advento da globalização o Estado perdeu suas fronteiras e o neoliberalismo
propaga-se ao redor do mundo(FORJAZ, 2000).

Um bom exemplo das instituições supranacionais são as empresas


transnacionais: “As empresas transnacionais são entidades que transcendem as
fronteiras dos Estados Nacionais e sua lógica de operação e suas estratégias não
estão condicionadas por razões de Estado, mas sim pela busca de mercados
atraentes e melhores condições de investimento, estejam elas onde estiverem”
(FORJAZ, 2000 p.42).Cresceram como empresas de determinado país, mas não se
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sabe se o país lucrou alguma coisa, já que a nação perdeu o controle sobre o
mercado que age como um filho que cresce, torna-se independente, cria asas e voa
para os quatro cantos do mundo deixando por onde passa um pouco de sua marca.
É assim com as multinacionais hoje em dia: sede em um lugar, montagem de peças
em um país vizinho, setor de finanças em outro continente. (KURZ, 1997).

Neste contexto, o Estado deixa de ser o acionista ideal anulando os meios de


seu próprio crescimento ao se deparar com um processo em que o excesso de
capital já não consegue ser absorvido. Com os adventos tecnológicos providos pela
globalização viu-se uma descentralização no que antes era apenas comércio
externo. A expansão do comércio mundial trouxe a autonomização dele próprio. A
repartição das funções produtivas não se encontra mais no mesmo lugar e percorre
o mundo. E isso se leva ao problema do desemprego. A diminuição da força de
trabalho e do poder de compra nacional. Mais uma vez a liberdade que o Estado deu
ao sistema corroeu a si mesmo e pode-se ver que o capital das empresas não faz
mais parte do estoque de capital nacional, mas sim, se internacionalizou (KURZ,
1997).

Mas nem sós as instituições Supranacionais são responsáveis pelo


enfraquecimento do Estado. Além de acabar enfraquecido por fatores externos,
também se fragmenta internamente. As entidades subnacionais, forças centrífugas
como o tribalismo e o fortalecimento dos níveis de poder infranacional como
municípios ou províncias, cada vez mais se tornam autônomos e poderosos
(FORJAZ, 2000).

FORJAZ (2000, p.44), em seu texto “Globalização e crise do Estado Nacional”


faz uma breve definição sobre os representantes das entidades subnacionais:

As “tribos” ou “grupos de identidade” são novos grupos


sociais definidos por etnia, religião, gênero, cultura e até
mesmo idioma, cuja lealdade e identidade abrangem menos
que o Estado Nacional e dentro dele pressionam por autonomia
e aspiram,freqüentemente, a constituir um novo, menor e mais
inclusivo Estado Nacional. Exemplo clássico dessa situação é o
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Canadá ou mesmo a Espanha dos bascos e catalães. Aqui


estamos nos referindo a um dos paradoxos da
contemporaneidade: o Estado Nacional em crise engendra a
multiplicação de Estados Nacionais em geral menores e mais
unitários em termos culturais, ou seja, ao mesmo tempo em
que os Estados Nacionais estão declinando e se modificando,
estão surgindo novos Estados.

Em seu texto, FORJAZ também afirma que os Municípios e províncias são a


origem dos processos de descentralização política que os Estados Nacionais vêm
sofrendo diante do fortalecimento que os níveis subnacionais de poder conseguiram.
De fato, a Globalização mais do que nunca vem pressionando o Estado e as
consequências dessa pressão eclodem na subordinação do Estado diante das
instituições Infra e Supranacionais (KURZ, 1997; FORJAZ, 2000).

Assim as empresas, ou os grupos de identidade, ganham poderes e adquirem


a autonomia de um país, enquanto os países tornam-se menores. As instabilidades
geradas pelo atual sistema falam mais fortes. A crise estrutural, principalmente vista
da ótica que tange as instituições transnacionais, é cada vez mais notória. A questão
não se trata dos vencedores entre o neoliberalismo e o socialismo, mas sim das
incongruências deste atual sistema desigual e suas contradições internas (KURZ,
1997).

O processo da simulação do capital

Atuando como serviçal dos interesses do mercado, o Estado nacional perdeu


muito do seu poder e riqueza interior e ascendeu os problemas de um sistema de
irracionalidade e simulação. Este último adjetivo reflete outro problema do sistema
vigente. Com a globalização a idéia de se ter a tecnologia e suas facilidades dentro
de casa trouxeram algumas consequências curiosas, porém negativas.Parece que
da mesma forma que o Estado perdeu sua real identidade, o homem assim também
o fez. A fronteira entre a existência e a aparência se desfez. A realidade e a
simulação passaram a se confundir. Com o auxílio da mídia, pouco a pouco o
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homem foi perdendo o poder sobre sua própria consciência, como que num
autorretrato da relação entre o Estado e a globalização. (KURZ, 1997)

Talvez coubesse aqui a indagação que fez Schumpeter sobre a “destruição


criadora”, a qual poderia se usar diante de toda esta situação sobre as inovações
tecnológicas e suas consequências (SCHUMPETER, 1961). Mas veja que esta
situação é negativa não necessariamente pela tecnologia utilizada, mas sim pelo
exagero dos investimentos em tecnologia, pois:“pela 1ª vez na história, a velocidade
de racionalização eliminadora de trabalho supera a expansão dos mercados”
segundo LUTZ (1925) citada por KURZ (1997, p. 115).

A máquina parece ganhar alma, e o ser humano transparece perdê-la. São


pessoas reclusas dentro de casa, escondendo-se boa parte delas, por trás da tela
de um monitor, ou nos tempos mais atuais, presas e focadas a qualquer aparelho
que possua uma tela sensível ao toque. Novas formas de satisfação com o auxilio
das máquinas são criadas, e assim as relações sociais ficam em segundo plano. O
ser humano se torna um produto simulado e manipulado pela mídia. O cidadão
torna-se assim um ser supérfluo, tal como propôs Marx ao questionar a existência de
um mecanismo geral para toda transformação social (KURZ, 1997; MARX, 1857/58).

Mas esse processo de simulação não se restringe a mente humana. O


sistema também o absorve. Fica difícil saber quem influenciou quem. Será o homem
o reflexo da economia política da simulação ou a economia política resultado de
homens alienados? A verdade é que a consciência simuladora, como uma bola de
neve que rola ladeira abaixo, cresceu e invadiu as estruturas do sistema corroendo
sua estabilidade. E esta consciência tem seu fundamento econômico(KURZ, 1997).

Pode-se entender este fundamento ao se analisar a relação do trabalho e o


capital. Sabe-se que o que gera valor ao capital é o trabalho, isto é, a energia
humana que é consumida pelo trabalho e se manifesta em sociedade é o que
constitui a substância do dinheiro. O que se viu com o enfraquecimento do Estado e
com o surgimento da economia política da simulação foi que o trabalho deixou de
ser visto como o real agente de valor do capital que se tornou fictício. Esta ficção
está implícita nas formas de crédito governamental e a especulação. Em ambos os
casos se vê a simulação do crescimento do capital (MARX, 1857/58; KURZ, 1997).
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O crédito Governamental constitui-se um paradoxo no momento em que uma


atividade econômica é tratada de forma simulada como produção sendo na verdade
consumo social. O Estado só consegue resolver isso ao capitalizar o trabalho futuro.
É tirar do amanhã os meios necessários para o consumo social do presente. O
desenvolvimento do capitalismo foi responsável pelo crescimento improdutivo do
consumo estatal. Quando o Estado passou a investir mais em tecnologia e ciência,
os custos aumentaram e os impostos já não eram mais suficientes para aguentar o
financiamento. O crédito governamental foi lançado e por algum tempo funcionou.
Mas com o passar dos anos o capital mais uma vez perde o valor e ingressa no
estágio de simulação (KURZ, 1997).

O panorama nada agradável é de que o neoliberalismo é um modelo caótico.


Ao que se incita a indagação: seria este um sistema vencedor, onde reina o êxito
que tende a “otimizar o crescimento e a riqueza do mundo” (HOBSBAWM, 2000)?
Lógico que não. A guerra fria pode até ter revelado um vencedor, mas um vencedor
doente e com prazo de validade (KURZ, 1997). A liberalização do mercado não
otimizou o crescimento e a riqueza no mundo. Muito pelo contrário, esta liberdade
enfraqueceu o Estado que passou a prover o crescimento da globalização em
detrimento de sua própria autonomia.

A desigualdade cresce a cada dia, criando-se ilhas de riqueza e


conglomerados de pobreza ao redor do globo terrestre. O investimento exagerado
em tecnologia deixou milhões de desempregados. O capital perdeu seu valor real e
passou a se auto simular. Como um rolo compressor esta simulação invadiu o
inconsciente popular, deixando os cidadãos cada vez mais alienados. As crises
passam a compreender intervalos menores. Diante de tudo isso que foi discutido fica
fácil de entender que a era neoliberal não demorará muito a ter seu fim (KURZ,
1997).

Considerações Finais

Diante do que foi exposto no texto, vimos que o Estado está enfraquecido não
só por aspectos exógenos (Instituições Supranacionais, Globalização), mas também
endógenos (Tribos e Grupos de Identidade). Esse enfraquecimento vem gerando
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consequências cada vez mais problemáticas à economia atual como (a simulação


do capital e alienação do ser humano). Assim conseguimos chegar ao nosso
objetivo de mostrar mais uma vez que o Neoliberalismo não é mais satisfatório. Ele
não conseguiu cumprir a proposta de que a liberação do mercado otimiza o
crescimento e desenvolvimento das nações.

É necessário que se repense o sistema econômico atual. Que a população


fomente idéias e se inclua de uma vez por todas na busca do real
desenvolvimento,“fazer do homem um elemento de transformação possível de
interagir sobre a sociedade e si mesmo, não obstante, ampliar suas potencialidades”
(FURTADO, 2002). Sendo assim, corroboramos com Kurz ao compreender que mais
do que nunca a crise econômica é consequência do enfraquecimento do Estado que
virou vítima da mesma globalização que deixou libertar, tirando de si mesmo os
meios necessários ao desenvolvimento do próprio mercado global (autofagia do
capital). É, portanto, imprescindível que a camada popular descruze os braços e
reivindique um sistema melhor, onde diante desse impasse torna-se cada vez mais
real a idéia de se repensar a criação de um novo modelo econômico.

Referências

FAGUNDES, Jeferson. O Enfraquecimento do Estado-Nação no processo de Globalização


Econômica.Santa Maria: UFSM, 2005. Disponível em:
http://www.angelfire.com/sk/holgonsi/jeferson1.html. Acesso em 10/06/14.

FORJAZ, Maria Cecília Spina. Globalização e Crise do Estado Nacional. São


Paulo: Revista de Administração de Empresas, 2000.

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HOBSBAWM, Eric. O novo século: entrevista a AntonioPolito. 4ª reimpressão.


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KURZ, Robert. A Economia Política da Simulação. In: Os últimos combates.


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KURZ, Robert. A Realidade Irreal. Folha de São Paulo, São Paulo, p.14, 03 set.
1995.

______. O fim da Economia nacional (Perdedores Globais). In: Os últimos


combates. Petrópolis: Vozes, 1997. P.135-141.

______. O programa suicida da economia. In: Os últimos combates. Petrópolis:


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______. A Estupidez dos Vencedores. In: Os últimos combates. Petrópolis: Vozes,


1997,p. 119 - 125.

______. Os depósitos de lixo tóxico do crédito.Neues Deutschland , 2011. Disponível em:


http://o-beco.planetaclix.pt/rkurz392.htm. Acesso em 20/06/14.

MARX, Karl. Grundrisse. Manuscritos econômicos de 1857-1858. Esboço da


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PRZEWORSKI, Adam. Capitalismo irracional, socialismo inviável: Podemos alimentar a todos?


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em:http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_18/rbcs18_08.htm. Acesso em
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SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia.Rio de Janeiro:


Editora Fundo de Cultura, 1961.

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