Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2. PROPOSTAS ABOLICIONISTAS
O Abolicionismo penal tem como posição nuclear a extinção de todo sistema
penal e tudo que é associado a ele. Defende-se, com isso, que o sistema penal
não é uma solução, mas um problema devido a suas precariedades e sua
ineficiência, uma vez que esse só funcionaria de modo segregacionista,
atingindo muito mais as classes menos favorecidas do que todo o conjunto de
atores que cometem delitos nocivos à vida social, deixando muitas vezes
imunes aqueles que mereciam ser punidos (Machado, 2008).
Nesse sentido, temos como característica dessa corrente deslegitimadora da
pena a alegação de que o sistema penal seria altamente seletivo, só punindo
uma parcela da sociedade, aquela de baixa renda, desprovidas de
oportunidades sociais. Com esses sujeitos, o processo penal seria bastante
rigoroso, sendo as penas altas até mesmo para crimes como o furto, em
hipóteses cujo valor subtraído foi ínfimo. Por outro lado, crimes como os
praticados por deputados, senadores, os chamados de “colarinho branco”
muitas vezes, ficam impunes, revelando a ineficácia global do sistema penal
moderno e a sua intimidade com os fatores de colaboração para a manutenção
das desigualdades sociais.
Criticando o Direito Penal e os seus efeitos, apontando seus métodos não
como solução, mas como problema, os membros dessa corrente exigem
projetos mais ou menos radicais, mais ou menos teóricos e mais ou menos
políticos. Seriam eles, segundo a Vera Regina Pereira de Andrade (2003):
1) abolir a pena privativa de liberdade;
2) colocar no lugar da pena mecanismos de reconciliação em uma
comunidade ansiosa;
3) descriminalizar a política dos jovens;
4) desmascarar a execução do tratamento;
5) desestatizar o controle social;
6) organizar a reparação e o esclarecimento dos conflitos;
7) acionar uma política criminal negativa;
8) elaborar uma teoria sensitiva do Direito Penal e da pena;
9) exercer uma crítica negativa ao “status quo” da justiça penal.
Seguindo essa linha de pensamento, Andrade (2003) aponta que os membros
dessa corrente estariam de acordo com uma imagem do ser humano
constituída por homens capazes de se organizar autonomamente e livres de
repressões. O Estado, com isso, acaba por ser visto, na opinião dos
abolicionistas, como portador do papel de opressor diante de uma natureza
positiva dos homens.
Um aspecto importante segundo a argumentação dos abolicionistas, é que a
história passada e a presente têm mostrado que o direito penal não conseguiu
resolver as questões para as quais foi criado. Pelo contrário, não raro, está
envolvido numa espiral que tem contribuído não só para alimentar o círculo
vicioso da violência e da delinqüência social, como se transformou num puro
instrumento do poder arbitrário sem qualquer outra finalidade que não seja a
materialização da política conjuntural do poder instituído. Argumentam que,
apresentando-se como preventivo e garantidor da segurança das pessoas, o
direito e o sistema penal modernos tornaram-se, na verdade, muitas vezes um
agente da própria violência e incerteza.
Decorre daí a crença de que só a abolição do direito penal, e não
simplesmente a mera descriminalização, permitirá às ciências criminais uma
abordagem multidisciplinar do mesmo fenômeno, assim como a substituição do
primado da punição sobre o delinqüente pela conseqüente valorização e
intervenção das vítimas e de toda a comunidade no sentido de garantir a justiça
compensatória que o delito praticado venha a determinar e exigir. Pouco a
pouco, emerge daí um novo paradigma de justiça social diametralmente
diverso daquele que tem existido nas nossas sociedades, e que tem no
aparelho repressivo do Estado o seu principal esteio e na pena privativa de
liberdade a sua penalidade de eleição, com todo o cortejo de perversões e
contra-sensos que tem acompanhado o sistema penitenciário e as prisões em
geral.
Para os abolicionistas, à medida que o aparelho de Estado vai declinando,
depois de ter preenchido as suas funções históricas que lhe foram atribuídas
ao longo da modernidade capitalista dos últimos três séculos, assiste-se
também ao naufrágio dos fundamentos que originaram o sistema penal estatal,
com os seus códigos, as suas perseguições policiais, as suas prisões, e todas
as instituições que lhe sobrevieram para materializar-se naquilo que hoje todos
nós conhecemos.
Segundo Zaffaroni, em seu livro Em busca das penas perdidas (1991), o
abolicionismo penal consiste numa das respostas à crise do sistema penal
recente, surgida em razão da deslegitimação dos sistemas penais. Afinal,
desse processo de deslegitimação, surgem duas grandes correntes de
proposta político-criminais, com variáveis relativamente consideráveis em cada
uma delas: a proposta de um direito penal mínimo ou “contração de direito
penal” e a proposta de sua abolição, como tratado aqui, do abolicionismo
penal.
Tendo como um dos seus principais objetivos – como já foi dito - a supressão
do sistema penal, tido como ineficiente e precário, buscar-se-ia através dos
outros ramos do direito como o civil, por exemplo, a solução para questões que
são resolvidas pelo poder coercitivo. Propõe-se, assim, a despenalização via
busca de solução de conflitos por meio da conciliação, bastante utilizada nos
ramos do direito processual civil, supondo que neste campo do direito ela
prevaleceria, e se encontraria o meio mais eficaz para a pacificação real da
violência.
REFERÊNCIAS: