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As Bacantes

(Eurípedes)

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Escrita há mais de dois mil anos, tem como palco a cidade de Tebas, na Grécia, com algumas
partes perdidas no tempo, reconhecemos aqui o culto prestado a Dionísio, conhecido também
como Baco ou Deus do Vinho.

Dionísio a Tebas e fez com que todas as mulheres da cidade, em especial as descendentes de
Cadmo, lhe prestassem as devidas homenagens, uma vez que as suas próprias tias, irmãs de
Sémele, que era filha de Cadmo, não acreditavam que ele era filho de Zeus, considerando-o
com um bastardo, sendo portanto o inicio da sua vingança, para mostrar a todos os tebanos
que ele nasceu Deus.

Sémele, seduzida por Zeus, o rei dos Deuses, ficou grávida deste e tendo a sua esposa Hera
descoberto, não hesitou em matá-la com um raio, cabendo a Zeus criar o seu filho, nas suas
coxas, de forma dissimulada para que Hera não o descobrisse.

Em festa, dançam e trajam vestes comemorativas, carregando instrumentos musicais e de


heras engrinaldadas, partem as mulheres cadmenianas para o alto do Monte Citéron, para
festejar o culto dionísico, implementado por toda a Grécia, como um culto filosófico,
apresentando-se mais com uma religião exuberante, apelando, ainda que indirectamente, à
fecundidade fálica, através dos efeitos extasiantes do vinho, já que é precisamente nestas
comemorações que surgiram as orgias nocturnas. Neste escrito encontramos o culto vedado
apenas às mulheres, sacerdotisas de Baco, Bacantes ou Ménades e apercebemo-nos de que o
Deus Baco, através das danças frenéticas, as arrasta sob o aguilhão do delírio, para um castigo,
por terem feito troça da sua origem divina. Assim, Dionísio, não é simplesmente o divertido
Baco ou o deus do vinho, mas representa uma força destruidora (tal como Nietzche bem
descreve na Origem da Tragédia) em que o vinho consegue perverter, com os seus efeitos
delirantes, colocando em causa a ordem, o equilíbrio e mesmo a virtude de uma comunidade
inteira.

Logo que Dionísio fez todas as mulheres sair da cidade, surge Penteu, que se recusa a venerar
aquele que se diz filho de Zeus. Triste fim seria de antever, em punição da renegação deste seu
primo divino, filho de seu tia.

Penteu não quis ouvir seu avô que o chamava à razão e pedia-lhe para que cultivasse os cultos
de Baco, para não sofrer a sua ira. Penteu negou-se a faze-lo e depois de avisado por um
mensageiro, de que um estrangeiro estava em terras de Tebas e do que se passava no Monte,
pediu para que lho trouxessem. Dionísio não ofereceu resistência e a ele se apresentou, sem
dizer quem era na realidade.

Mediante a suposta insolência do estrangeiro, para com Penteu, relativamente aos festins
celebrados, este mandou cortar-lhe os lindos caracóis loiros e prende-lo nos cárceres. Sémele
chama a trovoada e com o raio que a matou faz incendiar o Palácio de Penteu.

Dionísio no meio dessa confusão liberta-se dos cárceres e apresenta-se novamente a Penteu,
convencendo-o a espiar os “bacanais”, a que as mulheres da cidade se entregaram, fazendo-o
vestir-se de bacante, por forma a que ele possa acabar com essas comemorações imorais.

Penteu ofuscado pela doentia curiosidade, aceitou e dá o passo decisivo para a tragédia que o
assolará. O seu hino seria Vamos combater contra as Bacantes!.

Ao chegar ao monte, Dionísio que lhe serviu de guia, apresentado como aquele que castiga
dentre os mortais, aqueles que prestam culto à iniquidade e aos deuses não veneram, chama a
atenção das Bacantes fazendo reconhecer a sua voz, como o Deus cujos cultos eram
celebrados, anunciando: ”Ó jovens trago aquele que de vós, de mim e de minhas orgias
escarnece. Castigá-lo podeis, pois!”

Foi Agave, sua mãe, a primeira a lançar-se sobre Penteu, tomando-o como um leão inimigo,
começando as despedaçar-lhe a carne, não ouvindo as suas suplícas que a chamavam à razão
”Mãe, sou eu, o teu filho Penteu, que na mansão de Equíon deste à luz; apieda-te de mim, ó
mãe, e, não obstante meus erros, um filho teu não queiras imolar!”. Em vão foram os seus
apelos e às suas mãos morreu.

Após a sua morte Agave, resolveu descer à cidade e exibir a cabeça de Penteu como um troféu
de caça, caindo em si e reconhecendo-o como filho, apenas quando o efeito báquico a
libertou, por palavras sensatas de seu pai, que tentava faze-la reconhecer a sua desgraça.

A desgraça atingiu toda a família, levando à partida para o exílio, de todos os membros.

A análise que podemos retirar daqui é que o Deus do Vinho, tanto pode servir de antídoto para
o sofrimento do Homem, pois a ingestão de tal substância leva os homens ao doce
esquecimento dos males de cada dia, afastando os desgostos através da delícia do vinho, mas
ao mesmo tempo, Dionísio poderá ser também o mais terrível, fazendo “saltar” os instintos
mais aterradores de cada um de nós.
Outra coisa que aqui parece estar presente é a força da multidão. A desgraça só se deu porque
de tão cega que estava Agave, pela ira despoletada pelo vinho, agiu em conjunto com suas
irmãs e demais seguidoras dos cultos, não “viu” a atrocidade que cometia ao próprio filho.
Ora, este tema é ainda hoje debatido em estudos socio-psicológicos, onde actualmente se
encontram os comportamentos de por exemplo, dos Hooligans, que quando agem em
conjunto não sabem o que fazem e reconhecem que se agissem individualmente nunca
cometeriam actos impensados dos quais são geralmente acusados.

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