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3 UNIDADE 1 – Introdução
6 UNIDADE 2 – Os antecedentes históricos das políticas públicas sociais
20 UNIDADE 3 – Políticas públicas para saúde
34 UNIDADE 4 – Políticas públicas para educação
37 UNIDADE 5 – Políticas públicas para habitação
42 UNIDADE 6 – A política social do século xxi – A transferência de renda
44 REFERÊNCIAS
SUMÁRIO
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UNIDADE 1 – Introdução
o leitor a refletir criticamente (sem fazer República Velha, onde tanto a história como
apologia ou sair em defesa a teorias ou a literatura nos mostram que as iniciativas
doutrinas políticas) sobre as políticas volta- do governo para produzir habitação ou re-
das para saúde, educação e habitação, não gular o mercado era praticamente nulo, mas
esquecendo que segurança pública, lazer, há que se constatar o problema do déficit
seguridade também são extremamente im- habitacional persistente nos tempos atuais.
portantes para o desenvolvimento saudá-
De acordo com Santos (1999) e Morais
vel de um país.
(2000), a habitação é um bem com algumas
Assim, identificar os antecedentes his- características que indicam a necessidade
tóricos das políticas sociais, compreender de uma forte intervenção do Estado. É um
as políticas brasileiras específicas para as bem de primeira necessidade, que depende
áreas de educação, saúde e habitação e re- do dispêndio de valores monetários expres-
fletir sobre a política social do século XXI – a sivos.
transferência de renda – através dos pro-
A Pesquisa Nacional de Amostragem Do-
gramas sociais são os objetivos principais
miciliar PNAD (2001) mostra que no Brasil,
desta apostila.
4% da população morava em favelas, na
No contexto atual em que a educação é mais absoluta informalidade e amplamente
vista como chave para o desenvolvimento, desprovida de infraestrutura urbana com
voltada para a competência, produção de acesso restrito a serviços públicos de saú-
trabalho e riqueza, o papel do Estado tem de, educação e transporte.
sido o de racionalizar o sistema educacional
Enfim, como diz Silva (2009), a imple-
para otimizar os resultados, como veremos
mentação de Políticas Públicas quer uma
no capítulo sobre o rumo que tomaram as
disseminação do conhecimento com a ga-
políticas públicas voltadas para educação.
rantia de acesso das pessoas aos recursos
Em relação a saúde, é muito pertinente tecnológicos, garantia de motivação para
promover uma retrospectiva histórica para a participação e demanda não só o investi-
percebermos que os avanços foram consi- mento adequado, mas também a existên-
deráveis, mas ainda há muito a se construir. cia de pessoal habilitado a lidar com tais
ferramentas para que tais ações possam
A história das conquistas, dos avanços,
ser concebidas realmente como públicas.
das dificuldades e dos desafios em relação
Política pública refere-se, portanto, à ação
à promoção da saúde no Brasil, vem sendo
dos governantes que detêm a autoridade e
construída ao longo de décadas e perpassa
o poder para dirigir a coletividade organiza-
por conceitos relacionados aos programas,
da, bem como às ações da coletividade em
ações, projetos, agentes comunitários de
apoio ou contrárias às autoridades gover-
saúde, dentre outros, os quais formam uma
namentais.
imensa rede interligada e ao mesmo tempo
descentralizada. Salientamos que esta apostila é uma
compilação de tópicos que acreditamos se-
Para falarmos das políticas públicas de
rem importantes para o conhecimento dos
habitação, nosso ponto de partida será o
profissionais que estão se especializando
período de 1889 a 1930, denominado de
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e em que grau; e também (b) o modo pelo tos sociais surgidos naquele século pos-
qual os resultados, esperados ou não, fo- suíam entre suas causas a contestação às
ram alcançados. A primeira avaliação diz condições sociais de vida que se degrada-
respeito aos resultados e a segunda ao vam e a reivindicação por mudanças que
processo ou à implementação. De acordo proporcionassem sua melhoria.
com Silva (1999), o primeiro tipo de ava-
Bandeiras políticas relativas a um pro-
liação é realizado a partir da pergunta: “em
jeto de independência nacional ou à con-
que medida os resultados esperados fo-
quista de áreas territoriais na fronteira
ram atingidos com sua implementação?” E
brasileira tinham sua base social ampliada
a questão que interessa ao segundo tipo
à medida que se encontravam associadas
é: “como o programa funciona e quais os
a reivindicações sociais da população da
mecanismos que o fizeram atingir tais re-
época.
sultados?”.
A influência das transformações políti-
Breve retrospectiva histórica
cas no contexto internacional também se
As políticas destinadas ao atendimento fazia sentir na motivação dos movimen-
das necessidades básicas principalmente tos sociais do país, especialmente por in-
da população mais pobre, agrupadas sob o termédio de membros da elite agrária que
rótulo de políticas sociais, não chegaram a retornavam da Europa, os ideais liberais
ocupar ao longo da história papel de des- da República Francesa chegavam ao Bra-
taque nos planos de governo e nas dota- sil e compunham o substrato de legitima-
ções orçamentárias, quadro também que ção dos movimentos sociais emergentes.
se fez presente na década de 80. Gohn (1995) contabiliza para o período da
primeira metade do século XIX, o número
Quando o assunto é política pública so-
de quarenta e duas lutas sociais impor-
cial e após consultar vários autores como
tantes que, entretanto, por aglutinarem
Faleiros (2008); Silva, Yasbek, Giovanni
em sua base social segmentos muito di-
(2008); Bonduki (2004), podemos de-
versificados, não logravam constituir um
marcar o seu início, na década de 1930,
projeto de transformação política e social,
mas como é de praxe, faremos um breve
devido, especialmente, à dificuldade de
resumo histórico da evolução das políti-
superar as divergências entre interesses
cas sociais no Brasil, buscando facilitar o
imediatos dos segmentos envolvidos.
entendimento das enormes deficiências
Mas, em todos eles, a sustentação do pro-
observadas no início dos anos 90.
pósito de independência política e finan-
Os movimentos sociais que emergiram ceira do país em relação a Portugal e os
no contexto brasileiro do século XIX ca- ideais de liberdade e igualdade encontra-
racterizaram-se, essencialmente, pela vam-se condicionados à incorporação de
inexistência de algum projeto político e reivindicações concretas de melhoria das
social que lhes dotasse de unidade históri- condições sociais de vida no Brasil.
ca quanto às estratégias de intervenção e
Dentre as principais lutas e movimen-
à base social na qual se apoiavam. É certo,
tos sociais da época, três episódios mere-
porém, que todos os principais movimen-
cem ser destacados pela abrangência de
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tes que engrossavam suas fileiras. Nes- surgiam como desestabilizadores do es-
se particular aspecto, Canudos constitui tablishment constituído. De outro, o cres-
o exemplo maior da associação de várias cimento das cidades modificava o perfil da
dessas expressões: com o movimento de população e acelerava o crescimento das
contestação ao domínio dos latifundiários carências urbanas no país.
e de reivindicação da resolução da ques-
Para Rizotti (2001), a natureza des-
tão agrária aliava, também, preocupações
sa dupla transformação permite explicar
com o socorro aos pobres e inválidos e
adequadamente a origem e o desenvolvi-
com a superação das condições de miséria
mento das novas lutas sociais que domi-
que caracterizavam a vida da massa pobre
naram o cenário político do país naquele
sertaneja, da fome em especial – e não era
momento. Os movimentos sociais que
sem razão que o Conselheiro evocava, em
surgiam caracterizavam-se por reunir, sob
suas pregações, as imagens de um mundo
uma única bandeira, a reivindicação de
de fartura que deveria suceder o fim da
ampliação dos direitos de cidadania no país
luta.
e o objetivo de conquista do poder políti-
Esse período demarca o momento a co no aparelho de Estado. É este também
partir do qual as reivindicações populares, um período no qual as filosofias políticas
expressas nos movimentos sociais, pas- revolucionárias, de inspiração socialista e
saram a ser respondidas através de ações anarquista, ganham expressão através da
assistenciais que, a despeito de seu cará- organização de trabalhadores recrutados
ter pontual, introduziam na pauta política dentre as fileiras de imigrantes que ha-
do país a questão da desigualdade social. viam chegado ao país desde a década de
Além disso, já se pode localizar, no perío- 1910.
do, o surgimento consistente de organi-
De acordo com Gohn (1995), no ano de
zações da sociedade civil que se destina-
1914, na cidade do Rio de Janeiro, saques
vam a prover serviços de atendimento às
a casas comerciais colocavam em evidên-
demandas sociais da população.
cia a luta contra a carestia levada a termo
Mas o princípio do século XX seria real- pelos movimentos populares da época. A
mente o período durante o qual essas or- expressão política desses movimentos
ganizações proliferariam. Brasil o período tornou-se ainda mais evidente com sua
de uma dupla transformação. De um lado, unificação no Movimento Contra a Cares-
o fim do regime escravocrata enfraque- tia de Vida, que alcançou repercussão em
cera o domínio político e econômico das várias das cidades mais importantes do
antigas oligarquias rurais, promovendo país e culminou com a realização, na ca-
o surgimento de uma nova classe de se- pital da República, do comício contra a ca-
nhores, cujo principal interesse na cena restia que reuniu mais de dez mil pessoas.
política nacional foi adequadamente ex-
Em 1917, o movimento de trabalhado-
presso na política do “café com leite”; mas
res organizados promoveu em São Paulo
a fragilidade política das novas oligarquias
um conjunto de grandes manifestações,
dominantes seria logo evidenciada pelas
culminando com a deflagração de uma
ações dos novos movimentos sociais que
greve geral que reivindicava a redução
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da jornada de trabalho para oito horas e sou a regular pelo viés da repressão ins-
a regulamentação do trabalho feminino e titucional as ações destinadas à infância
infantil. no país. A esse respeito, Oliveira (1989,
p. 109) assinala, apropriadamente, como
Em 1925, eclodiu no Rio Grande do Sul
a ausência do Estado no provimento de
a Coluna Prestes que encontraria ampla
políticas sociais nessa época decorreu da
base social para crescer no interior do país
inexistência de organização política sufi-
e, nos dois anos seguintes, percorreria o
cientemente expressiva dos segmentos
Brasil organizando levantes populares
específicos que a demandavam: a política
contra a deterioração das condições so-
social relativa à prestação de serviços que
ciais de vida e reivindicando a criação de
se refere às demandas gerais da popula-
direitos civis e políticos, tais como a ins-
ção (saúde, educação, saneamento, entre
tituição do voto secreto, a extensão do
outras), como não tinha grupos específi-
direito de voto às mulheres e o respeito à
cos que a demandasse, foi delegada a se-
liberdade de imprensa.
gundo plano na agenda social do governo,
Não obstante o relativo sucesso dos haja vista o reconhecimento social de gru-
movimentos populares surgidos naquele pos profissionais.
momento – cuja mais expressiva vitória
De acordo com Rizotti (2001), apenas
parece ter sido a organização do movi-
na década de 1930 o país seria palco de
mento sindical nos principais centros do
importantes transformações no papel
país, com o surgimento de comitês de fá-
desempenhado pelo Estado para a propo-
brica que se mostraram eficazes na mobi-
sição de alterações no campo de direitos
lização dos trabalhadores para reivindica-
sociais no Brasil. O regime surgido da Re-
ção de melhorias salariais e de condições
volução, ao contrapor-se em suas táticas
de trabalho – poucos avanços se fizeram
de domínio às oligarquias regionais tradi-
sentir na organização dos serviços sociais
cionalmente instaladas no poder, requeria
demandados pela população.
a constituição, pela primeira vez levada a
Como afirmamos anteriormente, o perí- termo no Brasil, de um projeto político
odo foi marcado pela proliferação de orga- nacional que estendesse a ação do poder
nizações corporativas e de auxílio mútuo, central a todas as regiões do país.
fazendo os serviços criados dependerem
Naturalmente, a ação do governo cen-
quase que exclusivamente de gestões de
tral teria de afirmar-se por meio de artifí-
cunho privado e filantrópico, cuja ação de
cios múltiplos que fossem capazes de evi-
maior relevância pode ser registrada nas
denciar o novo papel desempenhado pela
iniciativas das Santas Casas no campo da
União, ao mesmo tempo em que ofuscava
saúde e da assistência.
a proeminência dos governos regionais.
Da parte do Estado, as iniciativas de- Para tanto, o novo regime utilizou-se do
senvolvidas restringiram-se ao surgi- expediente de encerrar o regime político
mento de novos elementos na legislação enquanto, concomitantemente, buscava
que regulava o trabalho assalariado e na difundir sua presença por meio de políti-
edição do Código de Menores que pas- cas públicas diretamente operadas pelos
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der galgado pela nova elite emergente re- ao moderno parque produtivo e, de outro,
queria, ainda que de modo centralizador em amplo conjunto de trabalhadores, cujo
e seletivo, a ação social do Estado para precário vínculo empregatício tornava im-
proporcionar a qualificação da força de praticável à efetiva integração econômica
trabalho e o desenvolvimento econômico e social. Ao mesmo tempo, as caracterís-
correspondentes ao processo de indus- ticas políticas do regime influíam negati-
trialização que se instaurava no país. vamente na possibilidade de organização
política dessa nova classe social urbana,
As políticas sociais iniciadas a partir da
chegando a ocorrer apenas nos maiores
década de 1930 destinaram-se então a
centros urbanos do país a organização da
permitir alcançar, concomitantemente,
atividade sindical eficaz e da luta política
os objetivos de regulação dos conflitos
operária por melhores condições de vida e
surgidos do novo processo de desen-
de trabalho.
volvimento econômico e social do país e
de legitimação política do Governo. Para A descrição apresentada acima por Ri-
compreendermos como isso se tornou zotti (2001) explica porque as políticas
possível, faz-se mister relacionarmos os sociais nascidas no período não surgiriam
novos serviços sociais realizados pelo po- determinadas diretamente pelas deman-
der público às emergentes necessidades das populares expressas nos movimentos
de reprodução e qualificação da força de sociais da época, mas encontrariam sua
trabalho nacional. origem na iniciativa estratégica do Esta-
do. Respondendo à necessidade seletiva
Com efeito, a política de substituição
de garantia apenas parcial das condições
de importações iniciada pelo governo ge-
básicas de reprodução da força de tra-
tulista sustentava-se na introdução no
balho no país, o Estado desempenhava o
país de um padrão tecnológico exterior à
papel de guardião dos interesses da nova
dinâmica econômica nacional que, se de
elite industrial e, ao mesmo tempo, inter-
um lado proporcionava a modernização
feria nas possibilidades de organização
das formas tradicionais de produção e a
política reivindicatória, sempre presente
rápida criação de um eficiente parque in-
devido à intensificação das relações de
dustrial, de outro encontrava à sua dis-
trabalho assalariado.
posição fartos contingentes de força de
trabalho, cuja qualificação não correspon- Foi da ação centralizadora do Estado
dia à requerida e cujo volume era dema- que surgiram as iniciativas de intervenção
siadamente superior ao demandado pelas social consolidadas desde então, tal qual
indústrias que surgiam. a ordem social competitiva que se instau-
rava, as políticas sociais que lhes davam
Conforme Rizotti (2001), como resulta-
parte da sustentação necessária conver-
do dessa inadequação inicial, a integração
giam para a integração apenas parcial da
da força de trabalho ao setor produtivo
força de trabalho nacional.
ocorreria de forma parcial, e sua maior
consequência consistiria na cisão do mer- Ao lado da resposta privativista, a
cado de trabalho urbano, resultando, de questão social no Brasil produzia, a par-
um lado, em uma elite operária integrada tir de então, a ação estatal seletiva como
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foi durante o período populista que, final- políticas sociais estender-se-ia ainda ao
mente, a extensão de direitos sociais no campo da Previdência Social, resultando
país encontrou-se definitivamente selada na promulgação da Lei Orgânica da Previ-
pela marca corporativa, em virtude de sua dência Social, em 1960, que estabeleceu
associação às modificações na legislação a uniformização dos benefícios previden-
trabalhista vigente, quase sempre impul- ciários.
sionadas pela pressão política daquelas
Segundo Fagnani (1989), dessa rees-
camadas e categorias mais bem organiza-
truturação parcial, desenvolveu-se um
das e plenamente integradas à ordem so-
modelo de financiamento das políticas so-
cial competitiva.
ciais que expressava contundentemente
De acordo com Mestriner (1992), é sig- as contradições do regime populista. De
nificativo o sentido da criação de novos um lado, os serviços para os quais foi pos-
serviços e de reestruturação da gestão sível criar fontes de financiamento que
dos serviços sociais existentes na época. contavam com a contribuição de empre-
Isso porque o modelo de cooptação instau- gados e empregadores (o exemplo mais
rado pelas políticas populistas de Estado importante aqui é política previdenciária,
encontrar-se-ia alinhado a iniciativas de à qual encontravam-se agregados os ser-
privatização daqueles serviços de alguma viços de assistência médica, habitação e
maneira rentáveis, tais como os serviços saneamento básico); de outro, políticas
médicos, previdenciários e de produção inteiras dependentes exclusivamente do
de habitações e, no período, ganharia for- orçamento fiscal, tais como a saúde públi-
ça o modelo de prestação de serviços so- ca, a educação, a suplementação alimen-
ciais sob gestão do empresariado – como tar e o transporte de massas.
atesta a criação do Serviço Nacional de
Não podemos nos esquecer em mo-
Aprendizagem da Indústria (SENAI), com o
mento algum que o Banco Mundial, em
objetivo de adequação da força de traba-
negociações com o governo brasileiro,
lho às demandas emergentes das empre-
foi o principal organismo internacional
sas. Isso também porque àqueles serviços
a interferir sobre o padrão das políticas
cujas características eram impróprias à
sociais no país. Como consequência mais
gestão privada – os serviços assistenciais,
importante dessa interferência, perde-
em particular – foi dada nova formulação,
ram força as ações de regulação no cam-
que sinalizava um reforço aos modelos de
po do trabalho e sobrevieram medidas de
gestão científica, com a criação de servi-
atenção às necessidades sociais ligadas
ços próprios, tais como creches, hospitais
ao saneamento básico e à educação. Tais
e lactários vinculados à Legião Brasileira
medidas foram impostas, sobretudo, pelo
de Assistência (LBA) e a criação da Fun-
modelo de desenvolvimento econômico
dação Estadual do Bem-Estar do Menor
adotado em toda a América Latina, e no
(FEBEM), encarregada da difusão de ser-
Brasil em particular, que tornava indis-
viços de atendimento social a crianças em
pensável a constituição de políticas glo-
situações de risco, a partir da perspectiva
bais para o atendimento à questão social
da educação e da prevenção. A preocupa-
que se apresentava.
ção com a reformulação dos serviços de
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Para o mesmo autor, os efeitos dessa Cardoso (1994 apud Rizotti, 2001)
nova condição financeira seriam rapida- apresenta-nos uma análise dos movimen-
mente sentidos no campo das políticas so- tos sociais na fase da transição para a de-
ciais. O sistema educacional passou a ter mocracia no Brasil, interpretando-os de
seu orçamento limitado a percentual fixo acordo com o papel que desempenharam
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Nesse sentido, as políticas de saúde enças, que por sua vez, eram executadas
pública assumem um papel de extrema em serviços de saúde pública, organiza-
importância, enquanto estratégias go- dos em estrutura governamental diversa
vernamentais, capazes de criar condições e com aporte financeiro extremamente
sanitárias favoráveis, visando preservar reduzido. Os serviços de saúde pública de
a saúde dos membros de uma sociedade, responsabilidade do Ministério da Saúde e
principalmente para os segmentos sociais das Secretarias Estaduais de Saúde, cui-
menos favorecidos economicamente. Se- davam basicamente das doenças infec-
gundo Lucchese (2004), nesse processo ciosas de caráter endêmico e epidêmico,
foram ainda intensamente valorizados o com alguma ênfase na educação em saú-
potencial individual e comunitário para de. A assistência médica nesses serviços
participar das escolhas e decisões públi- era completamente subordinada ao enfo-
cas sobre a política de saúde. que coletivo, sendo oferecida com o obje-
tivo de controlar a incidência/prevalência
A municipalização da Saúde no Brasil,
das doenças infecciosas, em detrimento
nosso ponto de chegada, é fruto de um
da demanda espontânea por assistência
longo processo, surgindo na década de
médica individual.
1950, pautada pelas concepções do cha-
mado “sanitarismo desenvolvimentista”. Devido às consequências do modelo
econômico vigente na década de 70 e o
Segundo Fadul (1978) “a idéia funda-
endividamento do país, mais precisamen-
mental era criar uma rede flexível, que a
te após a segunda metade da década, o
nível municipal se adequasse à realida-
modelo previdenciário brasileiro entrou
de do município e que fosse se tornando
numa aguda crise financeira, que foi o pri-
mais complexa à medida que o próprio
meiro passo para a descentralização.
município se desenvolvesse [...]”, mas, se-
gundo Heimann et al (2008), somente na Até a década de 1980, o sistema de
década de 70 surgiram, em algumas cida- saúde era centralizador e em 1987, inicia-
des, como Londrina (PR), Campinas (SP) e -se a criação do Sistema Unificado e Des-
Niterói (RJ), experiências de formulação centralizado de Saúde (SUDS) - primeiro
de políticas locais de saúde e de organi- movimento na direção da descentraliza-
zação de redes municipais baseadas nos ção e hierarquização. Na Constituição Fe-
princípios da atenção primária, divulgada deral de 1988 foram estabelecidos os
pela Conferência de Alma Ata/OMS e da princípios de universalização do direito à
medicina comunitária. saúde e ao atendimento médico gratuito
como deveres do Estado. Rede regionali-
De âmbito nacional, a assistência mé-
zada e hierarquizada. Criação do Fundo de
dica previdenciária era a principal forma
Seguridade Social. Em 1990, foi criado o
de prestação de atenção à saúde, carac-
Conselho Nacional de Saúde e instituída
terizando-se pelo atendimento clínico
a Lei 8.080 que dispõe sobre a criação do
individual, com privilégio da atenção hos-
Serviço Único de Saúde (SUS) e estabele-
pitalar e especializada, estando ausen-
ce o conjunto de ações que devem ser se-
te qualquer medida de saúde pública de
guidas por instituições públicas, federais,
promoção da saúde ou prevenção de do-
22
De acordo com Lucchese (2004), as po- Articula um conjunto de ações que con-
líticas públicas no Brasil se orientam pelos correm para um objetivo comum prees-
princípios da universalidade e equidade tabelecido, mensurado por indicadores
no acesso às ações e serviços e pelas dire- estabelecidos no Plano Plurianual (PPA),
trizes de descentralização da gestão, de visando à solução de um problema ou o
integralidade do atendimento e de parti- atendimento de uma necessidade ou de-
cipação da comunidade, na organização manda da sociedade.
de um sistema único de saúde no territó-
rio nacional.
Os programas são compostos por
atividades, projetos e uma nova cate-
Uma vez que elas se materializam goria de programação denominada
através de ações concretas envolvendo operações especiais:
sujeitos e atividades institucionais, em
determinado contexto e condicionando Atividade – é um instrumento de pro-
resultados, elas precisam de acompanha- gramação para alcançar o objetivo de um
mento e avaliação permanentes. Aconte- programa, envolvendo um conjunto de
cem através dos programas, definido no operações que se realizam de modo con-
glossário temático referente ao sistema tínuo e permanente, das quais resulta
de Planejamento, Monitoramento e Ava- um produto necessário à manutenção da
liação das Ações em Saúde, lançado pelo ação de governo.
Ministério da Saúde em 2006, como: Projeto – é um instrumento de pro-
gramação para alcançar o objetivo de um
Instrumento de organização da ação
programa, envolvendo um conjunto de
governamental com vistas ao enfren-
operações que se realizam num período
tamento de um problema e à concre-
limitado de tempo, das quais resulta um
tização dos objetivos pretendidos,
produto que concorre para a expansão ou
sendo mensurado por indicadores.
o aperfeiçoamento da ação de governo.
Nota: articula um conjunto coerente
de ações (orçamentárias e não-orça- Operação Especial – são ações que
mentárias), necessárias e suficientes não contribuem para a manutenção das
para enfrentar o problema, de modo a ações de governo, das quais não resulta
superar ou evitar as causas identifica- um produto e não geram contraprestação
das, como também aproveitar as opor- direta sob a forma de bens ou serviços. Re-
tunidades existentes. Resumidamen- presentam, basicamente, o detalhamen-
te, são ações permanentes para atingir to da função “Encargos Especiais”. Porém,
objetivos precisos. um grupo importante de ações com a na-
tureza de operações especiais quando as-
Segundo Piscitelli et al (2004), o pro- sociadas a programas finalísticos podem
grama representa o elo de ligação e in- apresentar produtos associados.
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96) dividiu as condições em: Gestão Ple- várias foram as mudanças, principalmen-
na do Sistema Municipal, que incorpora te na década de 90, como por exemplo, a
a gestão de média e alta complexidade e criação do SUS, modelo amplo de assis-
Gestão Plena de Atenção Básica, onde os tência à saúde da população, independen-
municípios se responsabilizam pela ges- te da classe social.
tão dos serviços básicos de saúde. Para
Como sabemos, as políticas públicas
garantir a operacionalização desses no-
para o setor da saúde são definidas a par-
vos procedimentos, em 1998, foi criado o
tir de critérios técnicos, bem como atra-
Piso de Atenção Básica (PAB), no qual os
vés de órgãos deliberativos, com a partici-
recursos passaram a ser diretamente pro-
pação de vários segmentos da sociedade
porcionais ao número de habitantes do
brasileira, como, por exemplo, o Conselho
município, o que possibilitou uma maior
Nacional de Saúde, cujas competências
estabilidade no planejamento das ações
também foram elencadas acima.
de saúde local.
Quanto aos limites para a atuação do
Ainda, segundo Ortiz (2007) com a des-
Poder Executivo na área da saúde no Bra-
centralização, o sistema de saúde melho-
sil, estes são bastante amplos. É o Poder
rou na transferência dos recursos que
Executivo, geralmente através do Minis-
passou a ser direta para estados e municí-
tério da Saúde, que define quais serão
pios, houve transferência de responsabi-
as políticas públicas prioritárias durante
lidades e atribuições do nível federal fun-
a gestão de um governo e o Congresso,
damentalmente para o municipal. Houve
conjuntamente, pelo menos em sintonia,
também expansão e desconcentração
deve decidir e aprovar qual a área prio-
da oferta de serviços, aumento da parte
ritária para investir em saúde. Dito isto,
de alguns municípios no financiamento
vamos tentar analisar, mesmo que super-
à saúde, criação de instâncias mais de-
ficialmente, o que o último governo tem
mocráticas de participação da sociedade
feito para entendermos um pouco a dinâ-
na implementação da política de saúde,
mica daqueles que vivem e trabalham no
formação de instâncias intergestoras de
sistema de saúde.
gestão entre estados e municípios, ex-
pansão da atenção primária à saúde e mu-
dança nas práticas assistenciais da saúde
Diagnóstico e perspectivas atuais das
mental.
políticas públicas para saúde
Segundo Appio (2008), a forma como
Segundo Bravo (2008), a análise que se
o Estado interfere na sociedade e as re-
faz do governo atual é que a política ma-
percussões do modelo econômico adota-
croeconômica do antigo governo foi man-
do por boa parte dos países ocidentais, ao
tida e as políticas sociais estão fragmen-
longo dos últimos vinte anos, trouxe se-
tadas e subordinadas a lógica econômica.
veras consequências para os respectivos
Nessa setorização, a concepção de segu-
sistemas de assistência pública à saúde.
ridade social não foi valorizada, mantendo
Até o ano de 1985, o Brasil convivia com
a segmentação das três políticas: saúde,
um regime de ditadura militar. Depois,
assistência social e previdência social.
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Com relação à saúde, havia uma expec- projetos. Em algumas proposições procu-
tativa que o governo atual fortalecesse o ra fortalecer o primeiro projeto e, em ou-
projeto de reforma sanitária que foi ques- tras, mantém o segundo projeto quando
tionado nos anos 90, havendo, no perío- as ações enfatizam a focalização e o des-
do, a consolidação do projeto de saúde financiamento.
articulado ao mercado ou privatista, en-
O quadro abaixo fornece alguns aspec-
tretanto, apesar de explicitar como desa-
tos que Bravo (2008) considera inovado-
fio a incorporação da agenda ético-políti-
res e outros de descontinuidade relacio-
ca da reforma sanitária, pelas suas ações
nados com os dois projetos em disputa.
tem mantido a polarização entre os dois
Inovação Descontinuidade
- Retorno da concepção de Reforma Sanitá- - Ênfase na focalização, na precarização,
ria, que, nos anos 90, foi totalmente aban- na terceirização dos recursos humanos, no
donada; desfinanciamento e a falta de vontade po-
- Escolha de profissionais comprometidos lítica para viabilizar a concepção de Seguri-
com a luta pela Reforma Sanitária para ocu- dade Social:
par o segundo escalão do Ministério; - O programa Saúde da Família, por exem-
- Alterações na estrutura organizativa do plo, precisaria ter sua direção modificada
Ministério da Saúde, sendo criadas quatro na perspectiva de prover atenção básica
secretarias e extintas três; em saúde para toda a população de acordo
- Convocação extraordinária da 12ª Confe- com os princípios da universalidade. Para
rência Nacional de Saúde e a sua realização garantir a integralidade, o mesmo precisa
em dezembro de 2003; ter como meta a (re)organização do siste-
- Participação do ministro da saúde nas ma como um todo, prevendo a articulação
reuniões do Conselho Nacional de Saúde da atenção básica com os demais níveis de
e a escolha do representante da CUT para assistência.
assumir a secretaria executiva do Conselho - Em relação à precarização e terceirização,
Nacional de Saúde; refere-se a ampliação da contratação de
- Criação da Secretaria de Atenção à Saúde agentes comunitários de saúde e a inserção
que visou unificar as ações de atenção bá- de outras categorias que não são regula-
sica, ambulatorial e hospitalar integrando mentadas: auxiliar e técnico de saneamen-
as atribuições das extintas secretarias de to, agente de vigilância sanitária, agentes
Política de Saúde e de Assistência à Saúde; de saúde mental.
- Criação da Secretaria de Gestão do Traba- - A questão do desfinanciamento é a mais
lho em Saúde que tem como função formar séria, pois está diretamente articulada ao
recursos humanos para a saúde e regula- gasto social do governo e é a determinan-
mentar as profissões e o mercado de tra- te para a manutenção da política focal, de
balho na área. A criação desta secretaria precarização e terceirização dos recursos
busca enfrentar a questão de recursos hu- humanos.
manos para o SUS que é um grande proble-
ma de estrangulamento do sistema.
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próteses mamárias e demais ajudas técni- anterior, que se pautava pela internação
cas necessárias. em hospitais especializados. Por este
novo modelo, preconizado pela reforma
Para as pessoas do campo psiquiátrica, a atenção à saúde mental
deve ter base comunitária e territorial,
As políticas voltadas para as pessoas do
avançando na redução do número de lei-
campo objetivam organizar e estruturar
tos hospitalares e na expansão da rede
uma rede de serviços do SUS, de forma re-
de serviços de atenção diária. A desinsti-
gionalizada e hierarquizada, com garantia
tucionalização da assistência psiquiátrica,
do acesso às ações integrais de atenção
a defesa dos direitos humanos dos porta-
básica, de média e de alta complexidade,
dores de transtornos mentais, o comba-
em um modelo humanizado, que dialogue
te ao estigma, o cuidado à saúde mental
com os princípios do modelo agrícola ado-
através de dispositivos extra-hospitala-
tado por cada movimento social organiza-
res e sua inclusão na atenção básica são
do no campo e com os princípios do etno-
algumas das diretrizes da política de saú-
-desenvolvimento.
de mental do SUS.
De acordo com o MS serão desenvolvi-
Maiores informações: Lei nº 10.216, de
das ações que permitam o enfren-tamen-
6 de abril de 2001, que dispõe sobre a pro-
to de questões como: combate ao uso de
teção e os direitos das pessoas portado-
agrotóxicos, implantação da política de fi-
ras de transtornos mentais e redireciona
toterápicos, acesso humanizado, comba-
o modelo assistencial em saúde mental.
te à discriminação e defesa de um modelo
autossustentado.
Para a saúde da família
Maiores detalhes podem ser obtidos na
Estratégia prioritária adotada pelo Mi-
Portaria nº 719, de 2004, que cria o Grupo
nistério da Saúde (MS) para a organização
da Terra com a finalidade de acompanhar
da atenção básica, no âmbito do SUS, dis-
a implantação da Política de Saúde para a
pondo de recursos específicos para seu
População do Campo e detalhar as ações a
custeio, sendo que suas ações abrangem
serem implementadas.
promoção, prevenção, tratamento e rea-
bilitação.
Para as pessoas com pro-
Reservamos um tópico específico para
blemas mentais apresentar toda a estrutura do Programa
O Ministério da Saúde diz que a preva- Saúde da Família, visto ser ponto primor-
lência de transtornos mentais é elevada dial deste curso e, com certeza ser, não
na população brasileira e, em geral, com somente de interesse, mas de extrema
peso relevante entre as principais causas importância aos futuros gestores.
de anos de vida saudável perdidos, assim,
o Brasil enfrenta o desafio de aumentar a No sistema penitenciário
acessibilidade e a qualificação da atenção
Política interministerial elaborada pe-
em saúde mental de forma paralela e ar-
los Ministérios da Saúde e Justiça, objeti-
ticulada com a transformação do modelo
33
va incluir nas ações e serviços de Saúde plementar brasileiro reunia mais de 2 mil
do SUS a população confinada em estabe- empresas operadoras de planos de saúde.
lecimentos prisionais, considerando que Essa rede prestadora de serviços de Saú-
o atual padrão de confinamento da maio- de atende a mais de 37 milhões de benefi-
ria das unidades prisionais favorece uma ciários que utilizam planos privados de as-
série de fatores de risco à Saúde dessa sistência à Saúde para realizar consultas,
população (superlotação, precárias con- exames ou internações.
dições de higiene, relações violentas, uso
Pela Lei nº 9.961/02 foi criada a Agên-
indiscriminado de drogas, entre outros).
cia Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
Lançada em 2003, com a instauração com atribuição de regular, normalizar,
do Plano Nacional de Saúde no Sistema controlar e fiscalizar as atividades que ga-
Penitenciário (Portaria nº 1.777/03), essa rantem a assistência suplementar à Saú-
política prevê a organização das ações e de em todo o território nacional.
serviços de atenção básica em unidades
Maiores informações consultar a Lei nº
prisionais, além da referência aos demais
9.656, de 3 de junho de 1998, que dispõe
níveis de atenção à Saúde (média e alta
sobre os planos e seguros privados de as-
complexidade) pactuados nas Comissões
sistência à saúde.
Intergestores Bipartites (CIBs), conforme
preconizado pelo SUS.
Saúde Suplementar
Temos ainda um conjunto de institui-
ções privadas que oferece serviços de
atenção à Saúde sob a forma de pré ou
pós-pagamento, os planos e seguros de
saúde. Em 2005, o setor de Saúde su-
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UNIDADE 4 – Políticas públicas para
educação
No capítulo II da CF de 1988, encon- nos e diretrizes;
tramos no artigo 6º que fazem parte dos
2. Definir as políticas para infância e ju-
direitos sociais, a educação, a saúde, o
ventude; para a diversidade étnico-racial;
trabalho, a moradia, o lazer, a segurança,
para a educação inclusiva, para educação
a previdência social, a proteção à mater-
infantil, ensino fundamental, ensino mé-
nidade e à infância, a assistência aos de-
dio, educação de jovens e adultos, pós-
samparados, na forma desta Constituição.
-médio profissionalizante; para o ensino
Especificamente para a educação, a CF superior; para a educação a distância;
reserva a partir do artigo 205 os desejos, para a inclusão digital; para a educação
direitos e deveres para sua promoção, não-formal;
com vistas ao pleno desenvolvimento da
3. Erradicar o analfabetismo;
pessoa.
4. Ampliar as universidades públicas;
Não há dúvidas de que é dever do Es-
tado implementar políticas públicas capa- 5. Promover avaliação educacional e
zes de garantir sua qualidade social, bem institucional e o compromisso social;
como o acesso e permanência de todos e
de todas; construir espaços de participa-
6. Favorecer e incentivar a gestão de-
mocrática, direta, participativa e repre-
ção direta, indireta e representativa, nos
sentativa;
quais a sociedade civil possa atuar efeti-
vamente na definição, gestão, execução 7. Valorizar os profissionais da educa-
e avaliação de políticas públicas educa- ção, dentre outras mais específicas.
cionais. É necessário que os governos ga-
rantam prioridade de recursos financeiros O movimento de descentralização tam-
para a educação pública, pois o compro- bém vale para a educação, transferindo
misso com a qualidade é também compro- para os municípios uma série de respon-
misso financeiro com a educação. sabilidades e expectativas, cuja maioria
das localidades por falta de infraestrutura
Também se constitui tarefa de todos física e financeira, tem encontrado sérias
acreditarem no direito à educação e exi- dificuldades em atender, mesmo com o re-
gir que o Estado efetive políticas públicas passe de recursos financeiros.
para a educação de qualidade, conceben-
do-a não como simples acesso às cadeiras Se faz mister abrir espaço para falar da
escolares e sim à garantia ao conhecimen- importância da educação no trabalho do
to historicamente construído. profissional do Serviço Social, uma vez
que a escola e educação, em geral, consti-
Como sub-eixos das políticas públi- tuem-se por excelência em veículo de dis-
cas para educação, podemos enume- seminação de conhecimentos e ideologias
rar: e, é justamente ai que se vislumbra a pos-
sibilidade de intervenção do profissional.
1. Organizar a educação através de pla-
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ra, a valorização imobiliária era acentuada população paulistana foi despejada neste
e se constituía numa importante opção de período. Essa imensa dimensão dos despe-
investimento para reserva de valor, na au- jos é explicada pelos mecanismos formais e
sência de um mercado de capitais. informais que passaram a reger o mercado
de locação.
Sinteticamente, pode-se dizer que a re-
volução de 1930 marcou um ponto de rup- O decreto de 1942 congelou por dois
tura na forma de intervenção do Estado na anos todos os aluguéis pelos valores de de-
economia e na regulamentação das rela- zembro de 1941. Os proprietários passaram,
ções capital/trabalho. De acordo com Olieira assim, a ter rendimentos reais declinantes,
(1971), a partir da destruição das regras do sendo fortemente penalizados numa eco-
jogo que faziam do poder público um mero nomia crescentemente inflacionada. Sem
representante dos interesses da economia instrumentos legais para aumentar os alu-
agro-exportadora, vai-se desenvolver, de- guéis, o jeito passou a ser despejar os in-
pois de 1930, um longo processo de criação quilinos para, na nova situação, elevar os
das novas condições que passam a fazer das valores locativos, alterar a destinação dos
atividades urbano-industriais as centrais na imóveis ou mesmo renovar a construção.
nossa economia. A base de sustentação po-
Como as novas construções eram insu-
lítica do novo regime teve de ser modificada
ficientes para atender uma demanda cres-
através da incorporação de novos setores
cente, o proprietário que tivesse sua casa
sociais emergentes — entre os quais se des-
desocupada poderia alugá-la a um preço
tacam as massas populares urbanas.
muitas vezes superior ao valor congelado.
A necessidade de Vargas em legitimar Além disso, frente à cada vez mais grave
seu poder a partir de 1930 e o surgimento falta de moradia, os locatários passam a só
das massas populares acabou servindo de alugar suas moradias mediante o pagamen-
base para formular uma política econômica to antecipado de uma quantia fixa, a título
e social que, embora contraditória e des- de luvas. Assim, despejar o inquilino antigo
contínua, apresenta certas características passa a ser um excelente negócio, pelo me-
bem definidas. nos a curto prazo, pois com o tempo nova-
mente os aluguéis tendiam a se desvalori-
Por volta de 1940, a grande maioria dos
zar.
trabalhadores e da classe média eram inqui-
linos, o aluguel representava uma parcela De acordo com Melo (1991); Aureliano e
fixa de grande peso a ser despendida men- Azevedo (1980 apud Bonduki, 1994), era
salmente, e quando veio a crise pós 1948, preciso então uma ação articulada entre os
o congelamento teve forte impacto para as vários órgãos e ministérios que de alguma
massas urbanas. maneira interferissem na questão. Assim,
no governo Dutra, em 1946, foi criada a
De acordo com Bonduki (1994), é difícil
Fundação da Casa Popular, uma resposta do
estimar o total de famílias despejadas du-
Estado à crise de moradia no pós-guerra, é,
rante o período mais agudo da crise de habi-
contraditoriamente, o melhor exemplo des-
tação, entre 1945 e 1948. Uma estimativa
ta ausência de política.
aproximada calcula que cerca de 10% da
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REFERÊNCIAS