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ESTUDO DOS LIVROS DE

ESDRAS E NEEMIAS
J. DIAS

O AUTOR
Não se sabe quem juntou na presente forma os documentos reunidos em Esdras e
Neemias. Apesar de uma antiga tradição afirmar que um único autor escreveu os
livros de Crônicas, Esdras e Neemias, é consenso entre os estudiosos de que o
historiador que escreveu as Crônicas provavelmente não tenha sido o autor de
Esdras e Neemias. Mas conforme as tradições judaicas, Esdras é o compilador
dos livros de Esdras e Neemias.

UM ÚNICO LIVRO
Esdras e Neemias formavam originalmente um único livro composto por uma
variedade de fontes históricas, inclusive pelas memórias pessoais de Esdras e
Neemias. O historiador do 1º século d.C Josefo e o Talmude judaico referem-se ao
livro de Esdras, mas não a um livro de Neemias à parte. Os manuscritos mais
antigos da Septuaginta também apresentam Esdras e Neemias num só livro.

Na Vulgata Latina, Jerônimo - seu tradutor, chamou Neemias de Segundo livro de


Esdras. As traduções em inglês empreendidas por Wycliffe (1382) e por Coverdale
(1535), também chamavam Esdras de 1Esdras e Neemias de 2Esdras. A mesma
divisão apareceu pela primeira vez num manuscrito hebraico de 1445.

QUEM FORAM ESDRAS E NEEMIAS


 
ESDRAS – Sacerdote e escriba judeu. A história dele começa quando o rei persa
Artaxerxes, no ano de 458, resolve enviá-lo para Jerusalém com o fim de instalar
administradores e juízes por toda Judá (Ed 7). Assim que chega em Jerusalém ele
tem de resolver uma questão sobre casamentos mistos que havia entre o povo (Ed
9 e 10). Esdras como sacerdote e escriba perito na Lei de Moisés, é mais
conhecido pela leitura da Torá para a comunidade judaica e pelo reavivamento
consequente (Ne 8.1-12). Em virtude de sua linhagem levítica, acredita-se que
Esdras fosse um tipo de secretário ou conselheiro de assuntos judaicos no
gabinete real (Ed 7.1-6).
Diz a tradição que Esdras foi o fundador da sinagoga, que surgiu durante a
permanência dos judeus no cativeiro. Visto que o templo fora destruído e o povo
espalhado, precisavam de um lugar para a adoração ao Senhor.
A tradição o aponta como presidente de um conselho de 120 homens que
estabeleceram o cânon do Antigo Testamento.

NEEMIAS – Filho de Hacalias, da tribo de Judá, e provavelmente da casa de Davi.


É provável que Neemias tenha nascido no cativeiro. Aparece pela primeira vez em
Susã, o principal palácio dos reis da Pérsia, onde exercia o cargo de copeiro do rei
Artaxerxes Longímano (455 a.C.). Hanani, seu parente, havia chefiado uma
caravana de judeus libertos da Babilônia de volta a Jerusalém; ao retornar do
antigo território de Judá, descreveu a Neemias a deplorável condição dos seus
compatriotas. Ele ficou muito consternado. Ele é lembrado pela habilidade
administrativa demonstrada em organizar a comunidade para reparar e reconstruir
grande parte do muro de Jerusalém destruído pelos babilônios em 587 a.C.

Esdras e Neemias foram reformadores contemporâneos do período pós-exílico.


Como seus antecessores, Ageu e Zacarias, eles tiveram ministérios
complementares em Jerusalém de natureza física e espiritual. Ambos foram de
Susã - na Pérsia -, para Jerusalém durante o reinado de Artaxerxes I (464-424
a.C.), e eram membros respeitados da corte persa.

DATA E OCASIÃO
Os dois livros podem ser datados no período entre 430-400 a.C. As narrativas
foram escritas para encorajar os judeus que haviam retornado do exílio, revelando-
lhes que, embora Israel ainda estivesse sob o domínio persa, o seu Deus soberano
estava dando prosseguimento à sua obra redentora e restabelecendo o culto
verdadeiro entre eles.

TEMA
O livro registra que Deus cumpriu as promessas feitas aos profetas, ao fazer
regressar seu povo do cativeiro. Relata a restauração material, moral e religiosa da
nação depois do cativeiro. A fidelidade de Deus é contrastada com a infidelidade
do povo. Pouco tempo depois de terem regressado à sua pátria, cercados de
várias promessas divinas, o povo se deixou influenciar pelos inimigos e
interromperam temporariamente a reconstrução da Casa de Deus (Ed 4.24). Para
animar o povo, Deus levantou Ageu e Zacarias (520-518 a.C.) com a promessa
que: “A glória desta última casa será maior do que a da primeira, diz o SENHOR
dos Exércitos, e neste lugar darei a paz, diz o SENHOR dos Exércitos ” (Ag 2.9).
Mesmo assim a obra é embargada e só retomada a construção com a vinda de
Esdras em 458.

ESFERA DE AÇÃO
O livro de Esdras registra dois períodos distintos: do capítulo 1 ao 6 transcorrem
cerca de 23 anos, iniciando pelo decreto de Ciro, rei da Pérsia (538 a.C) permitindo
o retorno do primeiro grupo de exilados à Jerusalém, sob a liderança de Zorobabel
para a reedificação do Templo. Há um intervalo de quase 60 anos entre os fatos
narrados nos capítulos 6 e 7. Em 458, outro grupo de exilados, liderados pelo
escriba Esdras retorna a Jerusalém. Em linhas gerais, os livros relatam a história
pós-exílica desde aproximadamente 538 a.C, até depois de 433 a.C. Um período
de cerca de 100 anos.

CONTEXTO HISTÓRICO
A Jerusalém de Esdras e Neemias não era muito diferente da Jerusalém para a
qual Ageu e Zacarias profetizaram setenta anos antes (520-518 a.C./Ed 5.1,2). O
segundo templo era muito inferior ao prédio magnífico erguido por Salomão (Ed
3.12). Em vez de inspirar a esperança da restauração na comunidade, ele servia
apenas de monumento das expectativas messiânicas frustradas pela realidade do
domínio medo-persa. De fato, a promessa de Jeová de tornar Jerusalém emblema
entre as nações fora praticamente esquecida, enquanto Judá subsistia sob um
império pagão que na época controlava a maior parte do mundo (Ag 2.20-23).

A situação não mudou quando Esdras e Neemias chegaram em meados do século


V a.C. A iniciativa de restaurar os muros de Jerusalém foi realizada sob grande
resistência da coligação de estrangeiros locais, dos quais se destacam Sambalate
(governador de Samaria); Tobias, o amonita (membro influente da aristocracia de
Jerusalém); Gesém (oficial árabe) e os árabes, amonitas e cidadãos de Asdobe
(Ne 4.1-9).

A reforma religiosa e social de Ageu e Zacarias aparentemente não teve grande


efeito. Apenas uma geração mais tarde, o profeta Malaquias (500-475 a.C.)
repreendeu o povo por deslealdade ao Senhor Deus, e os chamou ao
arrependimento e à renovação da aliança. Agora duas gerações após a pregação
de Malaquias, Esdras e Neemias enfrentavam apatia religiosa e decadência social
semelhante. Na realidade as reformas instituídas por eles, foram dirigidas contra
muitas das mesmas violações censuradas pelos profetas pós-exílicos. Elas
incluíam o desânimo espiritual e a adoração imprópria, a injustiça social, o divórcio,
o casamento com mulheres estrangeiras, a negligência para com o dízimo, a
devassidão e o abuso de autoridade por parte dos sacerdotes.

O período exato da chegada de Esdras a Jerusalém ainda é tema de debate entre


os estudiosos, mas três hipóteses já foram levantadas:

1-    De acordo com a posição tradicional, Esdras chegou em Jerusalém no


sétimo ano de Artaxerxes I, ou seja, em 458 a.C. (Ed 7.8).

2-    A segunda teoria se baseia na suposição de que o texto de Esdras 7.8, foi
corrompido no decorrer da transmissão manuscrita e deveria dizer
“trigésimo sétimo” ano ao invés de Sétimo. Isso situaria Esdras na cidade
em 428 durante o segundo mandato de Neemias, como governador da
comunidade de Jerusalém. Essa posição é a mais fraca das três porque a
hipótese de erro textual em Esdras 7.8 não possui comprovação da crítica
textual.

3-    A terceira posição argumenta que Esdras ministrou em Jerusalém durante o


sétimo ano do reinado de Artaxerxes II, ou seja, em 398 a.C. Essa
cronologia da chegada de Esdras presume que o sacerdote Joanã
mencionado em Neemias 12.22, e o sumo sacerdote Joanã mencionado em
papiros de Elefantina do final do século V, devam ser considerados a
mesma pessoa.

Apesar dos problemas enfrentados na relação de Esdras e Neemias como co-


reformadores em Jerusalém, a posição tradicional continua a dar a explicação mais
satisfatória com base nas evidências. A data de 458 a.C. para a chegada de
Esdras em Jerusalém é a preferida. A data da chegada de Neemias está fixada no
vigésimo ano do reinado de Artaxerxes I, ou 445 a.C.

CRONOLOGIA DO PERPIODO PÓS-EXÍLICO


Xerxes, rei da Pérsia – 485-465.
Artaxerxes I, rei da Pérsia – 464-424.
Retorno de Esdras à Jerusalém – 458.
Retorno de Neemias à Jerusalém – 445.
Neemias, governador de Judá por 12 anos – 445-433.
Neemias, segundo mandato de governador – depois de 433.
Dario II, rei da Pérsia – 423-405.
Artaxerxes II Mnemon, rei da Pérsia – 404-359.
(Todas as data são a.C.).

GÊNERO LITERÁRIO
Assim como nos livros de 1 e 2 Crônicas, estreitamente relacionados, nata-se
como se destacam em Esdras e Neemias várias listas, que parecem ter sido
obtidas de fontes oficiais. Estão incluídas listas:

- dos artigos do Templo (Ed 1.9-11);


- dos exilados que voltaram (Ed 2 e Ne 7.6-73);
- dos chefes dos clãs (Ed 8.1-14);
- dos que entraram em casamentos mistos (Ed 7.1-5);
- dos que ajudaram a construir os muros (Ne 3);
- dos que selaram a aliança (Ne 10.1-27);
- dos sacerdotes e levitas (Ne 12.1-26).
Há em Esdras, sete documentos ou cartas oficiais:
- o decreto de Ciro (1.2-4);
- a acusação de Reum contra os judeus (4.11-16);
- a resposta de Artaxerxes (4.17-22);
- o relatório de Tatenai (5.1-17);
- o memorando com o decreto de Ciro (6.2-5);
- a resposta de Dario a Tatenai (5.7-17);
- a autorização que Artaxerxes I deu a Esdras (7.12-26).

Muitos desses documentos foram escritos em aramaico, a língua da diplomacia


internacional da época, e não contrariam os documentos seculares do período
persa.

É possível perceber a importância da palavra escrita, pois como foi exposto o


decreto escrito de Ciro foi o instrumento humano que gerou a ação de Esdras e
Neemias, outros documentos escritos também desempenharam papel importante
em relação a ações secundárias, cartas fizeram parar e recomeçar o trabalho no
templo (Ed 4.23; 6.6-7).

A SOBERANIA DE DEUS
O propósito geral de Esdras e Neemias é afirmar que Deus age soberanamente
por meio de agentes humanos responsáveis para realizar seu objetivo redentor:

- Ciro promulga o decreto porque o Senhor moveu seu espírito (Ed 1.1);
- Os que retornaram para Jerusalém o fizeram porque o Senhor moveu seus
corações (Ed 1.5);
- Esdras obteve sucesso porque a boa mão de Deus estava sobre ele (Ed 7.9);
- Artaxerxes patrocinou a obra da reconstrução porque o Senhor havia colocado
esse propósito em seu coração (Ed 7.27).

Seres humanos agiram livre e responsavelmente sob a providência de Deus a fim


de que seus planos se cumprissem.

COMPOSIÇÃO DOS LIVROS


A composição propriamente dita dos livros de Esdras e Neemias se deu em fases
distintas e, provavelmente foi concluída por volta de 400 a.C. A sequência de
composição e compilação pode ser resumida da seguinte forma:

1 – Esdras e Neemias esboçam memórias individuais;


2 – O cronista combina as memórias, entrelaçando intencionalmente as
informações;
3 – O cronista acrescenta a narrativa de Sesbazar e Zorobabel, às memórias para
formar o prólogo ou introdução das autobiografias de Esdras e Neemias.
A mistura intencional de memórias de Esdras e Neemias levantou suspeitas entre
certos eruditos quanto à integridade do compilador e da exatidão histórica das
narrativas. Mas é bem claro nos livros que tudo foi documentado com grande
exatidão e habilidade técnica, uma história muito pragmática do período da
restauração hebraica, enfatizando temas religiosos como: obediência a Lei, pureza
da religião, separação dos estrangeiros e etc. A prática de transmitir a mensagem
religiosa no contexto das narrativas é tendência comum nos livros do Antigo
Testamento.

Esdras e Daniel são os livros do Antigo Testamento que contém grandes trechos
escritos em aramaico em vez de hebraico. No Período Persa o aramaico era a
língua do comércio internacional, o que dificulta a determinação do local da
composição das autobiografias. Quer tenha completado a obra na Pérsia, quer
tenha sido na Palestina, é certo que o cronista teve acesso aos arquivos do Estado
Persa, já que passagens aramaicas de Esdras parecem ser citações literais de
cartas oficiais e documentos relacionados ao governo.

Portanto é possível que, ou Esdras ou Neemias tenha escrito a narrativa de


Sesbazar e Zorobabel, ou ainda auxiliado o cronista graças à influência junto ao rei
Artaxerxes (Ed 7.1-10; Ne 1.1-11). A adaptação hebraica do edito de Ciro (Ed 1.2-
4) e da carta de Artaxerxes (Ed 7.12-26) sugere que a compilação final de Esdras
e Neemias ocorreu na Palestina.

MENSAGEM
Esdras e Neemias descrevem parte significativa da história de Israel no período
persa ou pós-exílico. O registro altamente estilizado documenta os principais fatos
desde o edito de Ciro em 538 a.C. até o segundo mandato de Neemias no governo
de Jerusalém (algum tempo depois de 433 a.C.). O conteúdo básico pode ser
resumido da seguinte forma:

1-    O retorno dos judeus a Jerusalém após o exílio babilônico, incluindo a


reconstrução do altar e do templo;
2-    A chegada e o ministério de Esdras, incluindo a Reforma religiosa da
comunidade com base na Lei de Moisés;
3-    A chegada e o ministério de Neemias, com a reconstrução dos muros de
Jerusalém e a nova reforma social e econômica da comunidade.

A finalidade dos livros é contar e conservar a história da volta dos hebreus exilados


a Jerusalém após o exílio na Babilônia. Por isso os registros destacaram a
fidelidade do Senhor Deus, oferecendo esperança a Israel pela demonstração da
ação divina entre reis e governos humanos. Teologicamente, as narrativas dos
ministérios de Esdras e Neemias na restauração física e espiritual de Jerusalém,
confirmaram as promessas de Javé renovar o remanescente de Israel.

A principal ideia teológica do material biográfico de Esdras e Neemias é a


renovação da aliança na comunidade pós-exílica. O convite a renovação espiritual
e à justiça social pelos reformadores tinha o propósito de corrigir os abusos e a
conduta imprópria do remanescente e de dar ao povo esperança e ânimo. Era
importante que a comunidade desesperada pelo visível descaso de Deus,
reconhecesse que a obediência aos mandamentos contidos na aliança, era pré-
requisito para a benção e a restauração de Deus para com Israel, sua possessão
pessoal.

CONFIRMAÇÃO ARQUEOLÓGICA
A confiabilidade histórica de Esdras e Neemias tem sido confirmada por constantes
descobertas arqueológicas. As evidências extra-bíblicas reunidas em inscrições de
papiro, selos oficiais e utensílios comemorativos comprovam o relato bíblico em
vários aspectos, incluindo os nomes de personagens importantes da narrativa
bíblica.
 
ESBOÇO DE ESDRAS
I. O retorno sob a liderança de Zorobabel 1.1-2.70

Ciro proclama o retorno de Israel 1.1-4


O povo se prepara para o retorno 1.5-11
Os nomes e a numeração dos primeiros que voltaram 2.1-67
Ofertas voluntárias dos que retornaram 2.68-70

II. O processo de reconstrução do templo 3.1 –6.22

A reconstrução do altar e o começo dos sacrifícios 3.1-7


Os alicerces são colocados em meio a choro e louvor 3.8-13
Os inimigos desencorajam o projeto do templo 4.1-5
Bislão e seus companheiros se queixam a rei Artaxerxes 4.6-16.
Artaxerxes ordena a interrupção da obra 4.17-24
Tetenai tenta para a construção do templo 5.1-17
Dario assegura a Tatenai que o projeto é legal 6.1-12
Conclusão e dedicação do templo 6.13-18
Celebração da Páscoa 6.19-22

III. O retorno sob a liderança de Esdras 7.1-8.36

Esdras parte da Babilônia com outro grupo de exilados 7.1-10


Artaxerxes escreve uma carta de apoio a Esdras 7.11-28
Os nomes e a numeração do segundo grupo que retornou 8.1-20
Retorno dos exilados para Jerusalém 8.21-36

IV. A reforma de Esdras 9.1-10.44

Esdras confessa as transgressões de Israel 9.1-15


Os líderes de Israel concordam com a reforma 10.1-44

ESBOÇO DE NEEMIAS

I. Neemias: do exílio à reconstrução das muralhas de Jerusalém 1.1-7.73

Autorização de Artaxerxes para reconstruir as muralhas 1.1-2.8


Planejando o trabalho, motivando e organizando os trabalhos 2.9-3.32
Oposição e defesa 4.1-23
Rechaço contra a extorsão e usura pelo exemplo piedoso de Neemias 5.1-9
As muralhas são completadas apesar das intrigas maldosas 6.1-7.3
Restabelecimento dos cidadãos de Jerusalém 7.3-73

II. Esdras e Neemias trabalham juntos para estabelecer o povo 8.1-10.39

Lendo a Bíblia 8.1-12


Celebração da Festa dos Tabernáculos 8.13-18
Confissão de pecado pessoal e coletivo 9.1-37
Compromisso de guardar a lei e manter o templo 9.38– 10.39

III. Verdadeiro arrependimento produz justificação 11.1 –12.26

Censo de Jerusalém e vilas vizinhas 11.1 –12.26


Dedicação das muralhas e provisão para as finanças do templo 12.27-13.3
Segundo período de governo de Neemias, incluindo reformas posteriores e uma
oração final 13.4-31

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