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Arcadismo
! Por Luiza Brandino

O arcadismo foi um movimento literário


europeu do século XVIII. Caracterizou-se por
retomar as temáticas da Antiguidade greco-
latina e pela ênfase em descrições bucólicas da
natureza. O nome dessa escola estética refere-se
à Arcádia, região campestre da Grécia Antiga
onde viviam pastores e poetas.

Contexto histórico
O século XVIII é também conhecido como
século das luzes ou século da filosofia. Foi
durante esse período que aconteceu o
iluminismo, movimento intelectual que deu
origem às ideias de revolução, liberalismo,
cidadania, Direitos Humanos, bem como
impulsionou a busca pelo conhecimento em
áreas diversas. Os pensadores iluministas
baseavam-se no princípio da racionalidade: a
razão humana é que deveria conduzir o
desenvolvimento das ciências, da política e da
vida cotidiana das pessoas, iluminando-as do
obscurantismo da ignorância e do
desconhecimento.

Ninfa adormecida guardada por um pastor, de Angelika


Kauffmann, ilustrando o bucolismo árcade.

Saber mais

A influência do pensamento iluminista


culminou, por exemplo, na Revolução
Americana, em 1776, e na Revolução Francesa,
em 1789. Correspondia, por fim, à ruptura final
com o absolutismo e ao surgimento de um
governo constitucional, com participação
popular. Aqueles que antes eram apenas súditos
tornaram-se indivíduos, cidadãos. Foi o
iluminismo o principal motor das revoluções
burguesas, que, por sua vez, impuseram um
novo paradigma no modo de vida dos europeus.

O surgimento dessa burguesia ilustrada deus


origem às Arcádias, sociedades literárias
dedicadas a inserir as produções escritas nessa
nova ordem social, ditando, portanto, os
padrões estéticos desejados.

Veja mais: Humanismo – período transitório


entre a Idade Média e o Renascimento

Características do
arcadismo
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Embora tenha surgido em um período de


rupturas e muita agitação política e intelectual,
os escritores árcades faziam textos amenos,
contemplativos. Em busca do equilíbrio e da
restauração do caos reinante na escola barroca,
o arcadismo recorria ao bucolismo, aos temas
pastoris, aos elementos da natureza. Era
comum que os poetas árcades assinassem seus
versos em pseudônimos com nomes de pastores
gregos e romanos.

Temática e estilo greco-latino são, aliás,


recorrentes, seja pelo uso das formas
helenísticas de poesia (ode, epicédio, canto
etc.), seja pela presença de figuras que
compõem o imaginário da Grécia Antiga, como
as ninfas, as musas, os deuses e os pastores. Por
isso, o arcadismo é também chamado
neoclassicismo, ou seja, a retomada de
elementos da Antiguidade Clássica. Tanto é
que os principais temas árcades podem ser
resumidos em expressões latinas muito
populares na época:

Fugere urbem, ou seja, “fuga da cidade”. A


ordem natural dos ciclos da terra e do fluxo
das águas devolve o equilíbrio do espírito
humano.
Locus amoenus, “local ameno”, para onde o
poeta deve dirigir-se.
Aurea mediocritas, “o meio-termo é de
ouro”: em oposição aos excessos do barroco,
o arcadismo procura o equilíbrio.
Inutilia truncat, “eliminar o supérfluo”: a
linguagem deve ser simples, objetiva, clara e
racional, sem adornos.

Acesse também: Parnasianismo – a estética da


arte pela arte

Principais autores do
arcadismo
Manuel Maria Barbosa du Bocage

Nascido em Setúbal, Portugal, em 1765, Bocage


é considerado um dos principais autores do
arcadismo português. Foi também marinheiro e,
aos 21 anos, embarcou para a Índia. Ao ser
promovido tenente, desertou. Viveu em Macau
até 1790, quando retornou a Portugal e
associou-se à Segunda Arcádia portuguesa,
adotando o pseudônimo Elmano Sadino.

Em 1797, foi preso pela Inquisição pelo


conteúdo antiabsolutista e blasfemo dos versos
“Pavorosa Ilusão da Eternidade”. Encarcerado,
traduziu obras de poetas latinos e franceses.
Foi libertado apenas ao se mostrar conformado
com as tradições morais e religiosas da época.
Continuou seu trabalho de tradução e escrita até
sua morte, em Lisboa, em 1805.

Bocage foi um grande nome do arcadismo.

A obra de Bocage tem duas fases. A primeira é


composta de temas satíricos, permeada de
erotismo e humor profano. A segunda
corresponde a um período lírico, quando
adotou o procedimento literário do arcadismo,
sendo equiparado aos principais nomes da
poesia portuguesa.

A poesia de Bocage elegeu principalmente as


temáticas do amor e da desilusão amorosa,
permeada por dramas existenciais, cenas
noturnas, apreço pelo mistério e certa
sentimentalidade que transcenderam as
convenções árcades. Por isso, é também
considerado um autor pré-romântico.

Exemplo de poema de Bocage

Olha Marília, as flautas dos pastores,


Que bem que soam, como são cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha: não sentes
Os Zéfiros* brincar por entre as flores?

Vê como ali, beijando-se, os Amores


Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes
As vagas borboletas de mil cores!

Naquele arbusto o rouxinol suspira;


Ora nas folhas a abelhinha pára.
Ora nos ares sussurrando, gira.

Que alegre campo! Que manhã tão clara!


Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a morte me causara.

*Zéfiro é um deus grego que personifica o vento


oeste.

José Basílio da Gama

Natural de São José do Rio das Mortes, atual


cidade de Tiradentes (MG), Basílio da Gama
nasceu em 1741. Estudou no Colégio dos
Jesuítas, no Rio de Janeiro, até o Marquês de
Pombal, à frente da metrópole portuguesa,
banir do Brasil os padres jesuítas da Companhia
de Jesus. Anos depois, foi para a Itália e
associou-se à Arcádia Romana, assinando com
o pseudônimo de Termindo Sipílio.

Viveu também em Portugal, onde foi preso,


acusado de ser partidário dos jesuítas. Mudou
de ideia na prisão e tornou-se pombalino. Foi
membro da Academia das Ciências de Lisboa,
cidade em que faleceu em 1795.

“O Uraguai” (grafia atual) é a obra-prima de Basílio da


Gama.

A obra mais famosa de Basílio da Gama é o


poema épico O Uraguai, em que relata não as
paisagens bucólicas típicas do arcadismo, mas
um episódio de combate. Os Sete Povos das
Missões, indígenas liderados por padres jesuítas,
levantaram-se contra o Tratado de Madri,
assinado em 1750. Foram, então, chacinados
pelas tropas portuguesas e espanholas.

A obra também antecipa a figura do índio


heroico, elemento que aparecerá na fase
indianista do romantismo brasileiro. O tom do
poema, no entanto, é antijesuíta: dedicado ao
irmão do Marquês de Pombal, os versos de
abertura já demonstram que os verdadeiros
heróis da epopeia de Basílio da Gama são os
europeus:

Trechos de O Uraguai

Canto I

Fumam ainda nas desertas praias


Lagos de sangue tépidos e impuros
Em que ondeiam cadáveres despidos,
Pasto de corvos. Dura inda nos vales
O rouco som da irada artilheria.
MUSA, honremos o Herói que o povo rude
Subjugou do Uraguai, e no seu sangue
Dos decretos reais lavou a afronta.

[...]

No canto terceiro, Cacambo, um dos guerreiros


indígenas, conversa com o fantasma de Sepé e
ateia fogo na mata para atrasar o avanço das
tropas portuguesas e espanholas:

Canto III

[...]

Só na outra margem não podia entanto


O inquieto Cacambo achar sossego.
No perturbado interrompido sono
(Talvez fosse ilusão) se lhe apresenta
A triste imagem de Sepé despido,
Pintado o rosto do temor da morte,
Banhado em negro sangue, que corria
Do peito aberto, e nos pisados braços
Inda os sinais da mísera caída.

Cláudio Manuel da Costa

Nascido em 1729, em Ribeirão do Carmo, atual


cidade de Mariana (MG), Claudio Manuel da
Costa estudou no Colégio dos Jesuítas, no Rio de
Janeiro, e depois se formou em Direito pela
Universidade de Coimbra. De volta ao Brasil,
atuou como advogado em Vila Rica, hoje Ouro
Preto (MG). Depois assumiu o cargo público de
Secretário de Governo da Capitania.

Influenciado pelas ideias iluministas,


envolveu-se com o movimento da Inconfidência
Mineira, sendo preso no ápice da revolta. Foi
encontrado enforcado em sua cela no dia 4 de
julho de 1789. Cláudio Manuel da Costa assinava
seus versos com o pseudônimo Glauceste
Satúrnio. Apesar de ter sofrido alguma
influência barroca, os princípios árcades
orientam nitidamente seus versos. A paisagem
mineira é presente, especialmente na recorrente
menção a pedras e minérios.

Exemplo de poema de Cláudio Manuel


da Costa

XCVIII

Destes penhascos fez a natureza


O berço em que nasci: oh! quem cuidara
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!

Amor, que vence os tigres, por empresa


Tomou logo render-me; ele declara
Contra o meu coração guerra tão rara,
Que não me foi bastante a fortaleza.

Por mais que eu mesmo conhecesse o dano,


A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano:

Vós, que ostentais a condição mais dura,


Temei, penhas, temeis, que Amor tirano,
Onde há mais resistência, mais se apura.

Tomás Antônio Gonzaga

Nascido na cidade do Porto, em Portugal, no


ano de 1744, era filho de pai brasileiro. Chegou
ao Brasil aos sete anos e estudou com os
jesuítas na Bahia. Retornou a Portugal para
formar-se em Direito na Universidade de
Coimbra. De volta ao Brasil, em 1782, tornou-se
Ouvidor de Vila Rica (atual Ouro Preto – MG) e
apaixonou-se pela adolescente de 17 anos
Maria Doroteia de Seixas, a Marília a quem
dedicaria grande parte de sua obra.

LTomás Antônio Gonzaga utilizava o pseudônimo Dirceu.

Nunca chegou, contudo, a casar-se com a moça.


Acusado de envolvimento com a Inconfidência
Mineira, foi preso e levado para Ilha das Cobras,
no Rio de Janeiro. Foi deportado em 1792 para
Moçambique, onde permaneceu até sua morte,
em 1810.

Os versos dedicados a Marília, sob pseudônimo


árcade de Dirceu, são os mais célebres de
Tomás Antônio Gonzaga. De traço pré-
romântico, os poemas têm um tom pessoal que
escapa às características neoclássicas.

Exemplo de poema de Tomás


Antônio Gonzaga

Lira I

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,


Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, de expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Eu vi o meu semblante numa fonte,


Dos anos inda não está cortado:
Os pastores, que habitam este monte,
Respeitam o poder do meu cajado.
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste;
Nem canto letra, que não seja minha,
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Mas tendo tantos dotes da ventura,


Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
Depois que teu afeto me segura,
Que queres do que tenho ser senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
De um rebanho, que cubra monte, e prado;
Porém, gentil Pastora, o teu agrado
Vale mais q’um rebanho, e mais q’um trono.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
[...]

Leia também: Dez poemas de amor da literatura


brasileira

Diferenças entre barroco e


arcadismo
O arcadismo surgiu como escola estética que se
opôs ao barroco. Enquanto os versos barrocos
eram gestados no conflito da existência dual
(carne e espírito – céu e terra – teocentrismo e
antropocentrismo), nas contradições da
existência humana, o arcadismo procurou
reestabelecer o equilíbrio à luz da razão, da
racionalidade natural.

Se o barroco tinha por tema transversal o temor


pela fugacidade das coisas, ansioso com o fato
de que tudo se transforma e se dissolve, o
arcadismo, por sua vez, abraçou o eterno
devir: já que tudo é instável e fugaz, deve-se
viver cada momento com tranquilidade e leveza.

Ligado à mística cristã, o barroco preocupou-se


com o pecado, o inferno e a salvação; já o
arcadismo trouxe imagens do período da
Antiguidade Clássica: deuses, ninfas, musas.
Existem ainda as diferenças no uso da
linguagem: os poemas barrocos são
hiperbólicos, repletos de metáforas, exageros e
rebuscamentos, ao passo que os poetas do
arcadismo propõem a simplicidade, o fim dos
excessos e a clareza em seus versos.

Arcadismo no Brasil
Inaugurado no Brasil por Cláudio Manuel da
Costa, o arcadismo desenvolveu-se
principalmente na região aurífera que hoje
corresponde a Minas Gerais. Boa parte dos
poetas árcades viveu em Vila Rica, atual Ouro
Preto. Iniciavam no Brasil os preceitos estéticos
do bucolismo e do neoclassicismo europeus.

Graças aos ideais iluministas que influenciaram


diretamente o arcadismo, poetas como o
próprio Cláudio Manuel da Costa e Tomás
Antônio Gonzaga foram presos por se
envolverem no movimento da Inconfidência
Mineira. Para saber mais sobre como se deu
esse movimento literário no Brasil, leia:
Arcadismo no Brasil.

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