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ENTRELETRAS, Araguaína/TO, v. 4, n. 2, p. 168-186, ago./dez.

2013 (ISSN 2179-3948 – online)

GONÇALVES, Sheila de Carvalho Pereira. Metalexicografia escolar no Brasil: história e contribuições.

METALEXICOGRAFIA ESCOLAR NO BRASIL: HISTÓRIA E CONTRIBUIÇÕES

SCHOOL META-LEXICOGRAPHY IN BRAZIL: HISTORY AND


CONTRIBUTIONS

Sheila de Carvalho Pereira Gonçalves

Resumo: O nascimento dos dicionários é remoto. É nas “glosas de equivalentes ingleses e


palavras e expressões difíceis” que, autores como Welker (2004), registram a sua origem.
Especialmente na Língua Portuguesa, um manuscrito alcobacense composto de uma listagem
de 3.000 verbos latinos marca a origem dessas obras lexicográficas. Sem dúvida, uma origem
que aponta para o papel normativo que os dicionários possuem. Porém, na atualidade isso
vem se transformando e, oferecendo cada vez mais informações ao consulente, os dicionários
assumem diversos papeis respondendo a questões sociais, pragmáticas, culturais, ideológicas,
didáticas, entre outras. Esse último papel do dicionário, uma obra de cunho didático, fez
surgir um ramo da Linguística relativamente novo, a Metalexicografia escolar, que busca
sistematizar os conhecimentos lexicográficos e metalexicográficos voltados ao público
escolar. No Brasil, a inclusão dos dicionários no Programa Nacional do livro didático – PNLD
do Ministério da Educação e Cultura – MEC representa um avanço nessa área. Esse trabalho
objetiva inicialmente proceder a um estudo comparativo entre a Lexicologia, a Lexicografia e
a Metalexicografia; abordar aspectos da Lexicografia escolar no Brasil e discutir as
contribuições dos critérios propostos pelo PNLD-MEC de 2006 e 2012 no contexto escolar.
Palavras-chave: metalexicografia escolar; dicionários escolares; Programa Nacional do livro
didático/dicionário- Ministério da Educação e Cultura.

Abstract: The Birth of the dictionaries is remote. It is in "disallowances of equivalent English


and difficult words and expressions" that authors like Welker (2004), record its origin.
Especially in Portuguese, an alcobaca originated manuscript composed of a list of 3,000 Latin
verbs, sets the origin of these lexicographical works. No doubt, a source that points to the
normative role that dictionaries have. However, nowadays this situation has been changed,
and is increasingly offering information to the inquirer, dictionaries assume different roles
responding to social, pragmatic, cultural, ideological, educational questions, among others.
This last role of the dictionary, a work of didactic nature, gave birth to a relatively new branch
of Linguistics, the School Meta-lexicography that seeks to systematize the lexicographical
and meta-lexicographic knowledge, targeting the school audience. In Brazil, the inclusion of
dictionaries in the National Program of the textbook - PNLD from the Ministry of Education
and Culture - MEC represents a breakthrough in this area. This paper aims initially to conduct
a comparative study between Lexicology, Lexicography and the Meta-lexicography; address
aspects of the school lexicography in Brazil and discuss the contributions of the criteria
proposed by PNLD-MEC from 2006 and 2012 in the school context.

*
Doutora em Análise Linguística pela UNESP- Universidade Paulista Júlio de Mesquita Filho; professora do
curso de Letras da UFT - Universidade Federal do Tocantins/Porto Nacional. E-mail:
sheilacpgoncalves@uft.edu.br; sheilacpgoncalves@yahoo.com.br

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GONÇALVES, Sheila de Carvalho Pereira. Metalexicografia escolar no Brasil: história e contribuições.

Keywords: school meta-lexicography; school dictionaries; National Program of the textbook


/dictionary- Ministry of Education and Culture.

Dicionários: algumas considerações iniciais

“Não sei se muita gente haverá reparado nisso — mas o


dicionário é um dos livros mais poéticos, se não mesmo o mais
poético dos livros. O dicionário tem dentro de si o universo
completo. Logo que uma noção humana toma forma de
palavra — que é o que dá existência às noções — vai habitar o
dicionário. As noções velhas vão ficando, com seus sestros de
gente antiga, suas rugas, seus vestidos fora de moda; as
noções novas vão chegando, com suas petulâncias, seus
arrebiques, às vezes, sua rusticidade, sua grosseria. E tudo se
vai arrumando direitinho, não pela ordem de chegada, como
os candidatos a lugares nos ônibus, mas pela ordem alfabética,
como nas listas de pessoas importantes, quando não se quer
magoar ninguém...”

Cecília Meireles

As palavras de Cecília Meireles retratam a essência do dicionário: “[...] é um dos


livros mais poéticos, se não mesmo o mais poético dos livros... ele tem dentro de si o universo
completo... [...].” Livro poético, instrucional, didático, os dicionários sempre estiveram entre
nós.
Para Welker (2004, p. 63), os primeiros dicionários tiveram suas origens “na glosa de
palavras e expressões difíceis”. O autor (WELKER, 2004, p. 64) cita as denominadas glosas
interlineares, ou seja, “equivalentes ingleses de palavras latinas, obviamente, das mais
difíceis, escritas entre as línguas dos manuscritos para ajudar os leitores cujo conhecimento do
latim era imperfeito.”
Na Língua Portuguesa, daquilo que “poderá ter sido a pré-Lexicografia medieval”,
Welker (2004, p. 65) cita o registro de um manuscrito alcobacense como sendo um “pequeno
texto residual” e registra a “notícia de outro.” Ele explica que esse documento compõe-se de
uma listagem quase alfabética de cerca de 3.000 verbos latinos, transcritos no início do século
XIV.
Nos dias atuais, o dicionário deixou de ser uma obra que lista palavras difíceis e é
visto sob diferentes pontos de vista: Bagno (2011, p. 119), por exemplo, aborda a questão do
registro da “norma correta.” Ele define dicionário como sendo “constituído, tradicionalmente,
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ao menos na cultura ocidental, de um dos principais instrumentos de descrição, prescrição,


codificação e legitimação do modelo idealizado de língua correta”, ou seja, além de descrever
o léxico, cabe ao dicionário o papel de estabelecer e orientar o “melhor uso da língua”.
Segundo Lara (1992, p. 20), “o dicionário representa a memória coletiva da sociedade
e ocupa um lugar importante.” Em outras palavras, ele ocupa lugar de destaque, pois ao seu
nome está vinculada a ideia de credibilidade e confiança, além de registrar e refletir aspectos
culturais de determinada comunidade.
Em seu artigo “Lexicografia pedagógica: definições, história, peculiaridades”, Welker
(2008, p. 14) discute o aspecto didático ou não dos dicionários e afirma que o “adjetivo
didático refere-se ao ensino. Obras didáticas são usadas no ensino, devem ensinar, e isso, de
preferência, de maneira didática. Os dicionários, em geral, não ensinam, eles informam”
(grifo do autor).
Postura diferente toma Krieger quando afirma que:

todo e qualquer dicionário é didático, na medida em que traz inúmeras informações sobre o
léxico, a língua e a cultura. E, como tal, ajuda o aluno a escrever, a expressar-se bem,
oferecendo-lhe informações sistematizadas sobre as palavras, seus usos e sentidos, bem como
sobre aspectos gramaticais e históricos. (KRIEGER, 2011, p. 109)

Com efeito e, retomando as citações acima, entendemos por dicionário, neste trabalho,
uma obra de cunho didático, que seleciona e organiza as unidades lexicais com base em
critérios lexicográficos bem elaborados, considerando o objetivo e o público-alvo a que a obra
se destina. De fato, para nós, o dicionário é uma obra utilizada para ensinar e um instrumento
útil no processo de ensino e aprendizagem.
Além disso, seu manuseio requer muito mais do que simples decodificação. Ele exige
do consulente um conhecimento específico, um pré-aprendizado, ou seja, é preciso que ele
seja levado a conhecer o dicionário, aprenda a manuseá-lo, possa se tornar “íntimo” dele e,
dessa forma, tirar o máximo de proveito.
Por isso, tendo o dicionário escolar como nosso objeto de trabalho, expomos, na
sequência, os subsídios teóricos que nortearam este trabalho, apresentando as semelhanças e
diferenças entre a Lexicologia, Lexicografia e a Metalexicografia, disciplinas ligadas a essas
obras lexicográficas, ou seja, os dicionários.

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1. Lexicologia, Lexicografia, Metalexicografia

A Lexicologia, a Lexicografia e a Metalexicografia são ramos da Linguística que se


ocupam do estudo do léxico e, até chegarem ao modo como estão hoje, passaram por diversas
transformações, que, sem dúvida, estão interligadas às necessidades dos falantes.
No dizer de Gomes (2007, p. 71), a origem do percurso que levou ao surgimento da
Lexicografia se deu pelos “falantes que precisavam de instrumentos que estabelecessem
equivalências entre as diversas línguas com as quais mantinham contato regular, fosse por
meio do comércio, da religião ou da vida social em si”.
Para Nunes (2006, p. 49), a Lexicografia foi impulsionada ainda no período
Renascentista, época em que surgiram os dicionários denominados de thesaurus, como o
Thesaurus lingua latinae (1532) e o Vocabulario degli Accademici della Crusca (1612).
Apesar de historicamente tão antigas, a Lexicologia e a Lexicografia ainda
apresentam, na atualidade, divergências entre os autores em relação às suas definições e aos
seus objetos de estudo: para Krieger e Finatto (2004, p. 43), por exemplo, a Lexicologia é um
“ramo da Linguística” que se dedica ao “estudo científico do léxico em geral”, ou seja, a
Lexicologia observa e descreve as “unidades lexicais de um idioma dentro do contexto dos
estudos linguísticos”, acrescentam as autoras.
No dizer das autoras, a Lexicologia

Relaciona-se intimamente com a gramática, em especial com a Morfologia, envolvendo a


problemática da composição e derivação das palavras, da categorização léxico-gramatical; bem
como vincula-se aos enfoques sobre a estruturação dos sintagmas; além das relações com a
Semântica. Por isso, diz-se que a Lexicologia se ocupa de aspectos formais e semânticos das
unidades lexicais de uma língua. (KRIEGER; FINATTO, 2004, p. 45)

Para Welker (2004, p. 11), a Lexicografia tem dois sentidos: “Lexicografia prática” –
entendida como “ciência, técnica, prática ou mesmo arte de elaborar dicionários” ou
“Lexicografia teórica”, também empregada em línguas como o inglês, francês e o alemão
como “Metalexicografia”, entendida como “o estudo de problemas ligados à elaboração de
dicionários, a crítica de dicionários, a pesquisa da história da Lexicografia, a pesquisa do uso
de dicionários (...) e ainda a tipologia”.

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Medina Guerra (2003, p. 34), em sua obra Lexicografia española, aponta para a
Lexicografia definida tradicionalmente como a “arte de fazer dicionários” 1 e mais
2
modernamente como “a técnica de fazer dicionários” , aliás, segundo a autora, arte e técnica
são termos considerados sinônimos, mas que negam o caráter científico da Lexicografia.
Por outro lado, para Casares (1992):

E de semelhante modo distinguimos uma ciência da gramática e uma arte da gramática,


podemos distinguir duas faculdades que têm como objeto em comum a origem, a forma, o
significado das palavras: a lexicologia, que estuda estas matérias do ponto de vista geral e
científico e a lexicografia, cuja função, principalmente utilitária, define-se acertadamente em
nosso léxico como a “arte de compor dicionários”. (CASARES, 1992, p. 59)3

Para Haensch et al., a Lexicologia é:

A descrição do léxico que lida com as estruturas e regularidades dentro da totalidade lexical de
um sistema individual ou coletivo. Se se trata somente das regularidades formais que se
referem aos significantes dentro do campo da lexicologia, falaremos de ‘morfologia léxica’, e
se se trata de regularidades nas relações lexicais com outros fatores da comunicação linguística
(especialmente com o conteúdo dos significantes), dentro do campo da lexicologia, falaremos
de ‘semântica léxica’. (HAENSCH et al., 1982, p. 93)4

Por outro lado, Lexicografia, para esses autores é:

todo domínio da descrição léxica que se concentre no estudo e na descrição dos monemas e
não-monemas individuais, dos discursos individuais, dos discursos coletivos, dos sistemas
linguísticos individuais, dos discursos coletivos, dos sistemas linguísticos individuais e dos
sistemas linguísticos coletivos. (HAENSCH et al., 1982, p. 93)5

1
El “arte de hacer diccionarios” (MEDINA GUERRA, 2003, p. 34).
2
“La técnica de hacer diccionarios”. (MEDINA GUERRA, 2003, p. 34).
3
Y de igual manera distinguimos una ciencia de la gramática y un arte de la gramática, podemos distinguir dos
facultades que tienen por objeto común el origen, la forma y el significado de las palabras: la lexicología, que
estudia estas materias desde el punto de vista general y científico y la lexicografía, cuyo cometido,
principalmente utilitario, se define acertadamente en nuestro léxico como el “arte de componer diccionarios”
(CASARES, 1992, p. 59)
4
A la descripción del léxico que se ocupa de las estructuras y regularidades dentro de la totalidad del léxico de
un sistema individual o de un sistema colectivo. Si se trata sólo de las regularidades formales que se refieren a
los significantes dentro del campo de la lexicología, hablaremos de “morfología léxica”, y si se trata de
regularidades en las relaciones del léxico con otros factores de la comunicación lingüística (especialmente con el
contenido de los significantes), dentro del campo de la lexicología, hablaremos de “semántica léxica.”
(HAENSCH et al., 1982, p. 93)
5
todo dominio de la descripción léxica que se concentre en el estudio y la descripción de los monemas y
sinmonemas individuales, de los discursos individuales, de los discursos colectivos, de los sistemas lingüísticos
individuales, de los discursos colectivos, de los sistemas lingüísticos individuales y de los sistemas linguísticos
colectivos. (HAENSCH et al., 1982, p. 93)
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Também fomos buscar as considerações acerca das diferenças e/ou semelhanças entre
Lexicologia e Lexicografia em Dapena (2002, p. 17) que, entre outros, cita Matoré (1953),
Martinez de Souza (1995) e Werner (1982).
Antes de se posicionar, Dapena (2002, p. 17), explica, por exemplo, que, para Matoré
(1953), apesar de a Lexicologia e de a Lexicografia estudarem o léxico, a Lexicografia se
constrói com base em um ponto de vista analítico, estuda o vocabulário e possui caráter
concreto e particular, enquanto a Lexicologia parte de um ponto de vista sintético, preocupa-
se com princípios e leis que regem o vocabulário e apresenta caráter abstrato e geral. 6
Martinez de Souza (1995), segundo Dapena (2002, p. 17), possui opinião contrária e
considera a Lexicologia como parte ou capítulo da Lexicografia. 7 Já Werner (1982), para
Dapena (2002, p. 17), considera as duas como descrições do léxico de um sistema individual
ou coletivo. A Lexicografia, para Werner, ocupa-se das unidades léxicas individuais ou
concretas e a Lexicologia estuda as regularidades formais referentes ao significante ou
significado.8
Dapena (2002, p. 24) diferencia a Lexicologia e a Lexicografia como disciplinas
autônomas: apesar de ambas se ocuparem do estudo do léxico, elas apresentam métodos e
finalidades distintas. O autor afirma

A lexicografia é a disciplina que se ocupa de todas questões relativas aos dicionários, tanto no
que diz respeito a seu conteúdo científico (estudo do léxico), quanto à sua elaboração material
e as técnicas adotadas em sua realização, ou, em suma, a estas análises; quando se refere a estes
dois últimos aspectos, falamos de lexicografia teórica ou metalexicografia, que estará
estruturada em duas partes: uma do tipo descritiva, crítica e histórica, que é o estudo de
dicionários existentes, juntamente com a outra de caráter técnico ou metodológico, que por sua
vez pode ter caráter geral, ao estudar as questões concernentes, igualmente, ao
desenvolvimento de qualquer trabalho lexicográfico [...]9 (DAPENA, 2002, p. 24) (grifos do
autor)

6
Siguiendo, precisamente, esta línea, Matoré basa la distinción entre lexicografía y lexicología en el punto de
vista analítico de la primera frente al sintético de la segunda, dado que aquella, estudia atomísticamente el
vocabulário, esto es palabra por palabra, mientras que la lexicología se preocupa por los principios y leyes
generales que rigen el vocabulario. Dicho de outro modo, estas disciplinas se distinguirían por el carácter
concreto y particular de una frente al abstracto y general de la otra; ambas como hemos dicho, estudarían el
léxico pero en niveles diferentes. (DAPENA, 2002, p. 17)
7
La lexicología como una parte o capítulo de la lexicografía. (DAPENA, 2002, p. 17)
8
Tanto la lexicografía como la lexicología serían descripciones del léxico de un sistema linguístico individual o
coletivo, pero con la diferencia de que, mientras la primera se ocuparía de las unidades léxicas individuales o
concretas, [...] La segunda estudaría las regularidades formales referentes al significante y al significado.
(DAPENA, 2002, p. 17)
9
La lexicografía es la disciplina que se ocupa de todo lo concerniente a los diccionarios, tanto en lo que se
refiere a su contenido científico (estudio del léxico) como a su elaboración material y a las técnicas adoptadas en
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É possível observarmos claramente a visão de Dapena no infográfico que o autor


apresenta em sua obra:

Figura 1: Características da Lexicologia e da Lexicografia propostas por Dapena (2002, p. 23)

Outros autores, como Hartmann; James (1998, p. 85), também definem Lexicologia,
Lexicografia, Metalexicografia, inclusive com definições, segundo Gomes (2007, p. 73),
“mais específicas e contemporâneas”. Na visão dos referidos autores, a Lexicografia é uma
atividade profissional e acadêmica e possui duas divisões básicas: a Lexicografia teórica e
prática.10
Para Hartmann; James (1998), o aspecto teórico e o prático da Lexicologia e da
Lexicografia também são características diferenciadoras, entretanto, para eles, é a
Metalexicografia que tem por objeto as discussões relativas ao conteúdo dos dicionários,
tipologia, críticas a partir do uso que se faz dessas obras. Para Hartmann; James (1998, p. 86),
“a Lexicografia é um termo arcaico para a arte de construir e expressar definições.” 11
Hartmann; James (1998) propõem o quadro a seguir:

su realización o, en fin, al análisis de los mismos; cuando se refiere a estos dos últimos aspectos hablamos de
lexicografía teórica o metalexicografía, que estará estrucutrada en dos partes: una de tipo descriptivo, crítico e
histórico, que se ocupa del estudio de los diccionarios existentes, junto a otra de caráter técnico o metodológico,
que a su vez puede tener carácter general, al estudiar cuestiones que atañen por igual a la elaboración de
cualquier obra lexicográfica. (DAPENA, 2002, p. 24)
10
Lexicography the Professional activity and academic field concerned with DICTIONARIES and other
REFERENCE WORKS. It has two basic divisions: lexicographic practice, or DICTIONARY-MAKING, and
lexicographic theory, or DICTIONARY RESEARCH. (HARTMANN; JAMES, 1998, p. 85)
11
“Lexicography: archaic term for the art of constructing and expressing DEFINITIONS of words.”
(HARTMANN; JAMES, 1998, p. 86)
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Quadro 1: Áreas de atuação da lexicografia (HARTMANN; JAMES, 1998, p. 86)

Diante de diferentes pontos de vista, necessário se faz tomarmos nossa posição: para
nós, existe uma inter-relação entre Lexicologia e Lexicografia e, no âmbito deste trabalho,
tomamos a posição de Barros (2002, p. 51), ao afirmar que “a Lexicologia se define como o
estudo científico do léxico e sua unidade padrão é a unidade lexical”, podendo ser “estudada
no eixo das substituições (eixo paradigmático) e no eixo das combinações (eixo
sintagmático)” em seus “diferentes aspectos (morfossintáticos, léxico-semânticos e
semântico-sintáticos)”.
Já a Lexicografia elabora “dicionários de língua ou especiais” e define este último do
seguinte modo:

Os chamados dicionários especiais, ou seja, dicionários de língua que registram apenas um tipo
de unidade lexical ou fraseológica, como, por exemplo, os dicionários de expressões
idiomáticas, de provérbios, de ditados, de gírias, de sinônimos, de antônimos etc. Podem ser
monolíngues, bilíngues ou multilíngues. (BARROS, 2002, p. 55-56)

Para nós, existe essa Lexicografia que é prática, a que elabora dicionários, porém, por
outro lado, existe também a denominada Lexicografia teórica ou Metalexicografia que, como

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especificou Welker (2004, p. 11), é o “estudo de problemas ligados à elaboração de


dicionários, à crítica de dicionários, à pesquisa da história da lexicografia, à pesquisa do uso
de dicionários (...) e ainda à tipologia.” Passemos a seguir à Metalexicografia escolar.

2. Metalexicografia escolar

Como afirmamos anteriormente, no âmbito deste artigo, Metalexicografia é entendida


como sinônimo de Lexicografia teórica. Para Gomes (2007, p. 75), a “atividade
metalexicográfica teve como marco a publicação do primeiro manual internacional de
Lexicografia, em inglês, de Ladislav Zgusta, datado de 1971”.
Em se tratando desse assunto, Medina Guerra (2003, p. 44) afirma:

A maioria dos autores que abordaram o tema (o início da lexicografia teórica ou


metalexicografia) situam o nascimento da teoria lexicográfica moderna, dependendo dos países
nos quais o fenômeno é observado, entre os anos sessenta e setenta do século XX.12

Ao tratar da época em que teve início a Lexicografia teórica ou Metalexicografia,


Medina Guerra (2003) cita diversos autores, entre eles: Quemada (1990), que afirma ter sido
em torno de 1960 que uma nova Lexicografia nasceu.
Outros autores citados por Medina Guerra (2003) são: Manuel Alvar Ezquerra, que
tem como ponto de referência o ano de 1971, e Franz Josef Hausmann (1988), que situa a
corrente metalexicográfica na Europa em dois momentos principais: o primeiro teria se dado
em torno dos anos de 1967/1968, na França, com o surgimento dos seguintes trabalhos: Les
vocabulaires français (1967), de Robert-Léon Wagner; o trabalho de Quemada Les
dictionnaires du français moderne, 1539-1863: Étude sur leur histoire, leurs types et leurs
méthodes (1967); e a Historie des dictionnaires français (1968), de Georges Matoré.
Ainda de acordo com Franz Josef Hausmann (1988), citado em Medina Guerra (2003,
p. 44), o segundo momento da Metalexicografia europeia aconteceu por volta dos anos 1970 e
1971 com a publicação de obras como Introduction à la lexicographie: le dictionnaire (1971),
de Jean Dubois e Claude Dubois; e Étude linguistique et sémiotique des dictionnaires français
contemporains (1971), de Josette Rey-Debove. A autora (MEDINA GUERRA, 2003, p. 45)
12
La mayoría de los autores que se han ocupado del tema (los inicios de la lexicografía teórica o
metalexicografía) sitúan el nacimiento de la teoria lexicográfica moderna, dependiendo de los países donde se
observe el fenómeno, entre los años sesenta y setenta del siglo XX. (MEDINA GUERRA, 2003, p. 44)
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também cita a corrente de estudos históricos que surgiu nos Estados Unidos a partir da
“publicação do dicionário Webster”.
Já Welker (2008, p. 2), tratando da Metalexicografia brasileira, cita inicialmente
Barbosa (1995). Esta autora afirma que as disciplinas de Lexicologia e Lexicografia estão
presentes nos currículos acadêmicos do curso de Letras desde 1971. Se, para Welker, era de
se esperar que tenha havido algum tipo de reflexão metalexicográfica desde essa época, ele
registra que é somente em 1980 que surgiram os primeiros trabalhos.
A Metalexicografia escolar é entendida, no âmbito deste trabalho, como a “análise
teórica que visa fornecer subsídios conceituais e técnicos à Lexicografia escolar” (GOMES,
2007, p. 77). Por sua vez, a finalidade da Metalexicografia escolar é:

fazer a crítica de obras lexicográficas escolares existentes com o intuito de gerar reflexão
linguística e metodológica sobre o próprio objeto de estudo, o dicionário escolar, específico por
seu público-alvo, configuração gráfica, discurso lexicográfico e finalidade pedagógica
(GOMES, 2007, p. 77)

Gomes (2007, p. 77) acrescenta ainda que os trabalhos nessa área no Brasil são
“praticamente inexistentes; o que leva a crer que se faz urgente a sistematização dos
conhecimentos lexicográficos e metalexicográficos voltados para o público escolar e infantil.”
Nossa intenção, ao partilharmos a opinião da autora sobre o que vem a ser
Metalexicografia escolar, é refletir sobre o fazer lexicográfico de dicionários escolares, tendo
em mente as suas contribuições para o ensino.
A seguir, abordaremos os aspectos da Lexicografia escolar no Brasil.

3. Aspectos da Lexicografia escolar no Brasil

Segundo Gomes (2007, p. 78), não há dúvidas de que os dicionários escolares têm nos
dicionários gerais de língua os seus antecessores, que por sua vez, têm origem remota. Para a
autora (GOMES, 2007, p. 92), “a Lexicografia monolíngue em Língua Portuguesa tem suas
origens, obviamente em Portugal e, em seguida, sua continuidade no Brasil, com
desdobramentos de vários tipos.”
Para Nunes (2006, p. 183), os dicionários de Língua Portuguesa em Portugal
“constituíram uma base para a Lexicografia, tanto em Portugal como no Brasil”. O autor

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GONÇALVES, Sheila de Carvalho Pereira. Metalexicografia escolar no Brasil: história e contribuições.

(NUNES, 2006, p. 183) afirma que “as obras Vocabulário Português e Latino, de Raphael
Bluteau (1712-1728) e Dicionário da Língua Portuguesa, de António de Moraes Silva (1789)
constituíram uma base para a lexicografia” dos dois países.
Ainda segundo o mesmo autor, especialmente no Brasil, foi durante o século XIX que
surgiram os primeiros dicionários monolíngues brasileiros, em razão de diversas condições
históricas. Num primeiro momento, para Nunes (2006, p. 205), surgem os pequenos
dicionários, “de complemento à Língua Portuguesa, de regionalismos, glossários apensos a
obras literárias e dicionários de termos técnicos”, para somente no século XX, surgirem as
primeiras grandes obras lexicográficas, ou seja, a produção lexicográfica brasileira é tardia.
Gomes (2007, p. 95) cita também a obra publicada em 1967, a pedido da Academia
Brasileira de Letras, o Dicionário da Língua Portuguesa de Antenor Nascentes, o Grande e
Novíssimo dicionário da Língua Portuguesa de Laudelino Freire, o Caldas Aulete, o
dicionário publicado pela editora Melhoramentos e, com especial destaque, o dicionário de
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, além do dicionário Houaiss.
Em se tratando especialmente de dicionário escolar, importante citarmos duas
questões: primeiro, a divergência de nomenclatura encontrada para designar a mesma obra:
minidicionário, dicionário escolar, pequeno dicionário júnior, entre outras e, segundo,
registrarmos que, antes de 2001, não havia qualquer discussão relativa aos parâmetros de
avaliação dessas obras.
Foi somente no ano de 2000 que o Ministério da Educação e Cultura (MEC), por meio
do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), deu início à inclusão dos dicionários
escolares de Língua Portuguesa às políticas oficiais para materiais didáticos. Com a
participação de universidades públicas, passou a selecionar obras que atendessem aos projetos
pedagógicos das escolas que, por sua vez, foram adquiridas e distribuídas pelo Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE.
O PNLD, apesar de muito antigo (sua primeira versão, sob outra denominação, data de
1929), é voltado à distribuição de obras didáticas. O objetivo principal desse programa era
selecionar os livros didáticos que seriam distribuídos em todo o Brasil.
Em 2001, o PNLD/MEC propôs pela primeira vez a avaliação de dicionários de 1ª a 4ª
séries do ensino Fundamental. Iniciativa essa que foi considerada de grande impacto na
educação.

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Na ocasião, foram avaliados 35 dicionários, dos quais 06 foram recomendados com


distinção, 06 recomendados, 11 recomendados com ressalvas e 12 foram excluídos (GUIA
PNLD/MEC 1999 5ª a 8ª série).
No ano de 2001, participaram da seleção os chamados minidicionários, obras que
continham entre 15 e 35 mil verbetes, voltados ou não ao público-escolar. Rangel (2008, p.
102) afirma que os minidicionários eram “concebidos quase sem exceção para um público
adulto já escolarizado e, via de regra, elaborados como simplificação editorial e/ou
compactação, muitas vezes pouco criteriosa, de dicionários padrão da língua.”
O autor acrescenta (RANGEL, 2008, p. 102):

a maior parte dos títulos aprovados mostrou-se distante do nível de letramento dos alunos, de
sua linguagem e de sua proficiência em leitura. Além disso, recorrem, quase sempre, a
estratégias e ferramentas de descrição linguística pouco familiares para esse público (e, em um
ou outro caso, até mesmo para os professores). Planejados, na origem, para uma ampla
cobertura do léxico, mas severamente limitados em seu escopo pelos limites do suporte
“minidicionário”, assim como por sua destinação escolar, esses dicionários parecem, antes de
tudo, dispersivos e arbitrários, em sua seleção vocabular.

Em 2002, com o objetivo de distribuir um dicionário de Língua Portuguesa a cada


aluno do ensino Fundamental, o PNLD/MEC 2006 continuou seu trabalho e, dessa vez,
atingindo os alunos das 5ª e 6ª séries.
No ano de 2003, houve uma nova ampliação na distribuição das obras e, nesse
momento, todos os alunos do ensino Fundamental passaram a receber os dicionários de
Língua Portuguesa.
Em 2004, o PNLD/MEC distribuiu cerca de 38,9 milhões de dicionários, que foram
entregues a cada aluno, que podia, inclusive, levá-lo para casa. Dos 19 dicionários avaliados,
01 foi recomendado com distinção, 05 foram recomendados, 10 foram recomendados com
ressalvas e 03 excluídos.
Em 2005, o modo como os dicionários eram entregues foi reformulado. Nesse
momento, foram entregues obras a todas as escolas de 1ª a 4ª séries do ensino Fundamental e
os parâmetros de avaliação de dicionários foram repensados.
Os dicionários, nesse momento, foram divididos em tipos, 1, 2 e 3 e compuseram
acervos que foram entregues às escolas. Cada tipo foi confeccionado para um público e uma

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faixa etária específicos visando a um aproveitamento mais direcionado ao ensino da


alfabetização e do letramento para os alunos do ensino Fundamental.
A seguir, o detalhamento desses acervos:

Quadro 2: Distribuição dos acervos propostos pelo PNLD/MEC 2006


Assim, os dicionários divididos em tipos, no ano de 2006, foram dessa forma
caracterizados:
 Dicionários do tipo 1 são aqueles que contêm um número mínimo de 1000 e máximo de 3000
verbetes e proposta lexicográfica adequada à introdução do alfabetizando ao gênero
dicionário;
 Dicionários do tipo 2, que possuem um número mínimo de 3.500 e máximo de 10.000
verbetes e proposta lexicográfica adequada a alunos em fase de consolidação do domínio da
escrita;
 Dicionários do tipo 3, mínimo de 19.000 e máximo de 35.000 verbetes e proposta
lexicográfica orientada pelas características de um dicionário padrão, porém adequada a
alunos das últimas séries do primeiro segmento do ensino Fundamental.
Nesse sentido, os dicionários do tipo 1 e 2 foram distribuídos ao grupo de alunos que
cursam do 1º ao 3º ano e os dicionários do tipo 2 e 3 ao grupo de alunos que cursam o 4º e 5º
anos do ensino Fundamental.
Vários autores comentam a respeito da iniciativa do PNLD/MEC, entre eles Krieger
(2006, p. 71). Para ela, essa atitude do governo “traduziu diretrizes de uma importante política
pública, de âmbito nacional, no plano da Lexicografia e, em particular, no da Lexicografia
direcionada para a escola.”
A autora (KRIEGER, 2006, p. 236) aponta também para o lugar de destaque dos
dicionários ao lado dos livros didáticos e acrescenta:
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Embora os dicionários de língua não possam ser classificados como livros didáticos stricto
sensu, seu potencial pedagógico é indubitável, pois ajudam o aluno a ler, a escrever, a
expressar-se bem, oferecendo-lhe informações sistematizadas sobre o léxico, seus usos e
sentidos, bem como sobre o componente gramatical das unidades que o integram.

Para Rangel (2008, p. 95), a inclusão dos dicionários no PNLD/MEC é um fato


positivo, pois depois da adoção desses parâmetros, o dicionário passou a ter um “caráter
didático-pedagógico fundamental.”
Por outro lado, na visão de Damin e Peruzzo (2006, p. 95), essa análise, num primeiro
momento, provocou uma imediata corrida das editoras para adequarem suas obras e,
consequentemente, poderem participar das avaliações propostas pelo respectivo órgão e, logo
após, uma melhoria na qualidade dessas obras.
A nosso ver, se antes de 2001 não dispúnhamos de nenhum parâmetro avaliador de um
dicionário dito escolar, realmente, podemos registrar um avanço. Krieger (2006, p. 17)
comenta “a total ausência, em nosso meio, de estudos que proponham parâmetros de
organização lexicográfica para a escola.”
Em 2012, o PNLD/MEC aumentou a sua área de atuação e incluiu os dicionários
especialmente destinados ao ensino Médio, com o objetivo de “equipar as escolas com um
número significativo de diferentes tipos e títulos de dicionários” (GUIA PNLD/MEC 2012-
Dicionários, p. 19).
A seguinte divisão foi proposta:
Tipos de Etapa de ensino Caracterização
dicionários
Dicionários de 1º ano do ensino  Mínimo de 500 e máximo de 1.000 verbetes;
tipo 1 Fundamental  Proposta lexicográfica adequada às demandas
do processo de alfabetização inicial.
Dicionários de 2º ao 5º ano do  Mínimo de 3.000 e máximo de 15.000
tipo 2 ensino Fundamental verbetes;
 Proposta lexicográfica adequada a alunos em
fase de consolidação do domínio tanto da escrita
quanto da organização e da linguagem típicas do
gênero dicionário.
Dicionários de 6º ao 9º ano do  Mínimo de 19.000 e máximo de 35.000
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tipo 3 ensino Fundamental verbetes;


 Proposta lexicográfica orientada pelas
características de um dicionário padrão de uso
escolar, porém adequada a alunos dos últimos anos
do ensino Fundamental.
Dicionários de 1º ao 3º ano do  Mínimo de 40.000 e máximo de 100.000
tipo 4 ensino Médio verbetes;
 Proposta lexicográfica própria de dicionário
padrão de uso escolar, porém adequada às
demandas escolares do ensino médio, inclusive o
profissionalizante.

Quadro 3: Distribuição dos acervos propostos pelo PNLD/MEC 2012

A partir do exposto, é possível percebermos que a divisão dos dicionários em tipos


agrupados em grupos continua: de um lado, as obras do tipo 1 e 2; de outro, as obras do tipo 3
e 4. A alteração proposta pelo PNLD/MEC 2012, nesse quesito, foi a inclusão dos dicionários
do tipo 4, ou seja, aqueles destinados ao ensino Médio e Profissionalizante. Também faz se
necessário considerar que prevalece o critério da quantidade de entradas e do publico alvo a
que a obra se destina.
Para o PNLD 2012, “os dicionários de um determinado tipo diferem dos demais não
só pela quantidade e pelo tipo de palavra que registram, mas, ainda, pelo tratamento que dão
às explicações de sentidos, à estrutura do verbete e à organização geral do volume”. (GUIA
PNLD/MEC 2012-Dicionários, p. 20).
Pelo fato de serem direcionados a um público em fase de alfabetização e consolidação
da escrita e, portanto, possuírem um porte limitado e distante da representação do léxico, o
PNLD 2012 acrescenta que os dicionários do tipo 1 e 2 não se “constituem, a rigor, como
dicionários. São, antes, repertórios de palavras organizados como tais, com o objetivo de
introduzir (Tipo 1) e familiarizar (Tipo 2) o aluno do primeiro seguimento [...]”.(GUIA
PNLD/MEC 2012-Dicionários, p. 21).
Por outro lado, segundo o PNLD 2012, os dicionários do tipo 3 e 4 são destinados a
pré-adolescentes e se inserem nos “padrões estabelecidos de representatividade e muito se

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aproximam de dois modelos bastante difundidos: o minidicionário e o dicionário padrão.”


(GUIA PNLD/MEC 2012-Dicionários, p. 21).
Além disso, o PNLD/MEC 2012 apresentou a publicação “Com direito à palavra:
dicionários em sala de aula”, cujo objetivo é apresentar esses dicionários aos professores,
inclusive, com sugestões de atividades para serem realizadas na sala de aula.
Como afirmarmos, sem dúvida, a inclusão dos dicionários no PNLD/MEC, bem como
a sua divisão em tipos destinados a um público específico e com um número determinado de
entradas representa um avanço no universo da Lexicografia escolar, mas apesar desses
avanços, para nós, a questão não se encerra aqui. Em uma análise superficial dessa divisão
poderíamos nos perguntar:
 Se os dicionários do tipo 1 possuem um número mínimo de 500 verbetes e máximo de
1.000 e os do tipo 2 um mínimo de 3.000 e máximo de 15.000, como se classificam as
obras que possuem entre 1.000 e 2.000 verbetes?
 Se os dicionários do tipo 3 possuem um número mínimo de 19.000 verbetes e máximo
de 35.000 e os do tipo 4 um mínimo de 40.000 e máximo de 100.000, como se
classificam as obras que possuem entre 35.000 e 40.000 verbetes?
Para avaliarmos as possibilidades pedagógicas dessas obras, além de uma divisão em
tipos, julgamos que há questionamentos mais importantes, tais como a qualidade dos
dicionários, quais são efetivamente as necessidades dos usuários, qual a origem e quais
unidades devem compor a nomenclatura, quais os critérios adotados pelos lexicógrafos na
confecção da microestrutura dessas obras, entre outros. Ademais, como citamos, a
Metalexicografia escolar, é relativamente nova, o que nos leva a crer que ainda há muito a se
refletir. A seguir, nossas considerações finais.

Considerações finais

Sem dúvida, quando o assunto é dicionário escolar, certamente, estamos vivenciando


momentos iniciais de atuação de uma política pública específica. Certamente, a inclusão dos
dicionários no PNLD/MEC fez surgir um produto específico, no caso, o dicionário escolar,
que está direcionado a um público-alvo determinado e com uma estrutura própria voltada para
esse fim.

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Por outro lado, apesar da reformulação da proposta feita pelo PNLD/MEC 2006,
(considerar o número de entradas, o público-alvo a que a obra se destina e o nível de
escolaridade do aluno), e agora a ampliação proposta pelo respectivo órgão PNLD/MEC 2012
incluindo dicionários especialmente destinados ao ensino Médio e Profissionalizante, ainda
assim elas se tornam, às vezes, insuficiente para resolver a problemática do dicionário escolar,
pois sabemos que ainda há muito a se fazer. No entanto, não podemos deixar de acrescentar
que, discutir essa problemática é uma possibilidade que dá início à construção do perfil dos
dicionários escolares.
Para concluir, diante do exposto, cremos que os princípios e critérios propostos pelo
PNLD/MEC 2012 que classifica os dicionários em tipos: 1, 2, 3 e 4 prezam sim pela
qualidade do material, entretanto, acrescentamos que são necessárias análises no âmbito da
Lexicologia/Lexicografia para que os lexicógrafos possam refletir a confecção de obras cada
vez mais funcionais e que possam atender e contribuir cada vez mais com os seus usuários.

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Artigo recebido em abril de 2013.


Aceito em julho de 2013.

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