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DIDÁTICA E EDUCAÇÃO

DE SURDOS

Autoria: Dra. Flaviane Reis

2ª Edição
Indaial - 2021
UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Jóice Gadotti Consatti
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci

Revisão de Conteúdo: Bárbara Pricila Franz


Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2021


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.
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XXX p.; il.

ISBN XXXXXXXXXXXXX
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CDD XXXX.XXX

Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS............................................ 7

CAPÍTULO 2
A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO
FUNDAMENTAL.............................................................................. 43

CAPÍTULO 3
O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS.............................. 81
APRESENTAÇÃO
Caro acadêmico, a Didática e Educação de Surdos tem se destacado pelo
modo como apresenta a educação bilíngue de surdos, incidindo na constituição
de identidade e subjetividade dos surdos, moldando maneiras de ser, de viver, de
pensar, enfim, ela se destaca pela forma como procura conhecer, ensinar e usar a
didática para alunos surdos. É também o que pretendemos neste livro.

A preocupação com questões didáticas na Educação de Surdos tem sido


tema central nos últimos tempos em todo o mundo. Muitos pesquisadores e
professores surdos indicam a ocorrência de um movimento em favor da educação
e cultura surda, o qual, após longos meses de discussão pela comunidade surda
e pelos povos surdos, abriu os domínios do que vínhamos designando como
educação bilíngue para surdos, expandindo-os e diversificando-os de uma forma
nunca antes pensada, movimentando-nos para os territórios dos sujeitos surdos.
As concepções da pós-Modernidade para a educação bilíngue estão sendo
revisitadas, criticadas amplamente nas discussões, implicando uma enorme
diversificação de temas e questões. Os complexos e os híbridos discursos
que caracterizam a era deslizante e fluída em que vivemos, encarregam-se de
inscrever-nos em um ambiente linguístico e educacional em que as fronteiras das
línguas entre a realidade e a ficção, entre a experiência e a representação, entre
o público e o privado, entre tantas outras, estão cada vez mais esmaecidas e
tendem a desaparecer as imposições sobre a nossa cultura surda.

Esta questão, caracterizada pelo local de cultura, tem consequências


importantes para a educação bilíngue para surdos. É a partir da consideração
das especificidades, das singularidades do tempo-espaço em que vivemos e
da complexidade das repercussões disso para a Educação Bilíngue de Surdos,
que o curso de Didática e Educação de Surdos está realizando um estudo, uma
discussão, um conhecimento amplo sobre a educação que nós surdos queremos,
e, ao mesmo tempo, busca entender e conhecer o jeito de ensinar para surdos.

Nas questões pedagógicas da Educação Bilíngue de Surdos, que nos fazem


percorrer os múltiplos caminhos entre o êxtase e a perplexidade, entre o esforço e
o não esforço, o presente livro se situa objetivando abrir um espaço de discussão
que possa contribuir para a análise e o debate das tão polêmicas questões,
implicadas na relação entre educação e cultura na Contemporaneidade, que estão
se transformando na educação que nós surdos queremos, e situar a posição do
jeito como são ensinadas as crianças surdas na sala de aula.
C APÍTULO 1
CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Incentivar os alunos a conhecer a pesquisa do ensino de Libras nos Estudos


Linguísticos e Estudos Surdos.

 Incentivar a formação dos alunos para serem profissionais de Libras.

 Incentivar os alunos à pesquisa na área de Libras.


DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Iniciaremos a nossa disciplina estudando alguns critérios que consideramos
fundamentais para a análise do ensino de Libras. Nossa perspectiva é a de
alcançarmos, pelo esforço da formação dos professores surdos e dos professores
bilíngues no ensino de Língua de Sinais, um ambiente linguístico na Educação
Bilíngue de Surdos voltada na área de Pedagogia Bilíngue, em universidades
públicas e privadas que se situam na posição de mais elevadas em qualidade.

Inicialmente, é importante explicitar a nomenclatura da política da Educação


Bilíngue de Surdos vinculada à área de Libras. A Constituição Federal do nosso
país define sujeitos surdos com direitos linguísticos e culturais, respeitando nossa
língua, identidade e cultura.

Os termos das condições do ensino de Libras são muito discutidos atualmente


e, apesar de ser reconhecida a sua importância, ainda falta clareza sobre o que
realmente significa qualidade quando se trata da Educação Bilíngue de Surdos,
o que se deve inserir na grade curricular de Libras nas instituições municipais,
estaduais, federais e privadas.

Os professores surdos, preocupados com as condições de ensino de Libras


para as crianças surdas, reuniram-se e organizaram uma discussão virtual mais
marcante: o fechamento do Ines (Instituto Nacional de Educação de Surdos),
localizado no Rio de Janeiro, iniciando o movimento em favor da Educação
de Surdos e Cultura Surda. A partir daí, analisando a discussão dos militantes
surdos com base nos documentos produzidos, defende-se a nossa Educação de
Surdos ou Educação Bilíngue de surdos, bem como a importância de permanecer
na Educação Básica do Ines, defendendo os direitos linguísticos das crianças
surdas, professores surdos e professores bilíngues nas escolas de surdos para
não dissolver esses valores linguísticos e culturais nos espaços educacionais.

Daquela discussão se procurava estruturar um documento definindo


os critérios para a análise da qualidade do ensino de Libras nos espaços
educacionais, a exemplo do documento da Convenção da ONU, que explicita os
direitos das pessoas com deficiência. No caso específico dos debates, a ideia
era gerar um documento defendendo a cultura surda e o direito linguístico do
surdo, em outras palavras, não se trata de criar uma receita, um modelo a ser
seguido rigorosamente, e sim parâmetros de análise e um roteiro de definição
da qualidade de ensino e de Educação de Surdos ou educação bilíngue de
surdos.

O documento divide-se em duas partes muito importantes para a Educação de


Surdos e Educação Bilíngue: Convenção da ONU e Decreto de Libras.
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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

O grupo de professores surdos da Comunidade Surda destacou, nos dois


documentos, uma das questões mais importantes para a comunidade surda:
a qualidade de ensino da Educação Bilíngue de Surdos. Os itens de cada
documento serão explicados a seguir, separadamente. É importante lembrar que
os itens não estão colocados em ordem de prioridade e também que apresentam
fortes argumentos sobre os nossos direitos humanos, ou seja, não são questões
isoladas nas legislações. Parte-se do pressuposto de que a qualidade na Educação
de Surdos corresponde à oportunidade de respeitar a nossa cultura surda com
relação ao acesso da comunidade surda, reforça-se, assim, o comprometimento e
a responsabilidade das estruturas públicas na concretização desse direito humano
das crianças surdas. Bem, vamos aos itens que correspondem às condições
para a qualidade, analisando em alguns itens e de forma geral as condições da
qualidade de ensino de Libras nos espaços educacionais no Brasil.

2 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O


ENSINO DE LIBRAS
Este item significa a prioridade da Educação de Surdos e Educação Bilíngue
de Surdos nas políticas públicas desenvolvidas pelos governos. É, assim, questão
importante para ser observada e definida como condição de qualidade de ensino
de Libras.

Hoje, no Brasil, a criança surda precisa estar sempre em destaque quando


se trata de diagnósticos da situação da aquisição da linguagem e cultura do
país, porém há uma grande distância entre os problemas que se observam, o
que se declara que será realizado e o que se realiza quando as crianças surdas
se desenvolvem precocemente em Língua de Sinais. É preciso, antes de tudo,
construir uma identidade cultural através da identificação com os professores
surdos para, então, entrar na dinâmica da convivência e relação surdo-surdo.

O assunto está continuamente na pauta dos povos surdos em cargos


públicos, ou seja, os professores surdos das Universidades, os quais declaram
suas concepções e apresentam suas propostas, que nem sempre são cumpridas,
como no caso da reunião para inserir a importância do currículo no documento
“Que Educação Nós Surdos Queremos”, na Conferência Nacional de Educação
(CONAE) e Relatório da Política Linguística de Educação Bilíngue – Libras/
Português (2014). Então, apresentam publicamente conceitos, como: Estimulação
em Língua de Sinais nas crianças surdas, mostrando como é a construção
de identidade cultural e compreender que as crianças surdas necessitam se
identificar com os professores surdos; o papel da creche para as crianças surdas

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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

e da comunidade surda na inclusão social; a função do setor público com relação


aos professores surdos nos espaços educacionais.

FIGURA 1 – ESCOLA BILÍNGUE PARA SURDOS

FONTE: <https://cutt.ly/dzLdC4t>. Acesso em: 27 jul. 2020.

A verificação da efetiva prioridade da Educação de Surdos e Educação


Bilíngue na mesma extensão das necessidades e dos compromissos políticos que
necessitam ser assumidos é, portanto, uma questão de qualidade de ensino a ser
observada.

O sistema de Educação de Surdos e Educação Bilíngue necessita acontecer


no misto entre duas línguas dentro da Educação: a Língua de Sinais e a Língua
Portuguesa. No entanto, para nós, surdos, a nossa primeira língua é a Língua de
Sinais e a segunda língua a Língua Portuguesa. Isso faz com que se tenha uma
estrutura gramatical diferente como acesso de comunicação para os surdos e
sua inserção na Educação. Levando tal aspecto em consideração, o Decreto de
Libras estabelece como um dos direitos fundamentais do ser humano surdo o
direito linguístico. Desse modo, as instituições públicas e privadas de ensino que
representam uma parte significativa na organização dos direitos linguísticos dos
surdos, precisam adaptar-se para atender principalmente às crianças surdas, que
necessitam ter sua estimulação precoce no processo de aquisição da linguagem,
tendo a Língua de Sinais como sua primeira língua. O Decreto de Libras nº
5.626/2004, no capítulo IV, em seu Artigo 14, define que:

As instituições federais de ensino devem garantir,


obrigatoriamente, às pessoas surdas acesso à comunicação,
à informação e à educação nos processos seletivos, nas
atividades e nos conteúdos curriculares desenvolvidos em
todos os níveis, etapas e modalidades de educação, desde a
Educação Infantil até a Superior (BRASIL, 2004).

Com relação ao Decreto, é importante difundir a Libras nos espaços


educacionais para formar profissionais que entendam a Língua de Sinais e
promover vários cursos de formação dos professores para o ensino e uso de
Libras, tendo, assim, a possibilidade de atuar nas atividades relacionadas à
Língua de Sinais para as crianças surdas.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

2.1 LEGISLAÇÃO E DEFINIÇÃO


As Leis para a área de Libras devem refletir as escolhas políticas já
declaradas e organizadas de forma não fragmentada; definir os poderes jurídicos
e as responsabilidades dos níveis federal, estadual e municipal; fixar objetivos
que possibilitem a garantia da qualidade de ensino de Libras; ser aplicadas para o
setor público e privado; prever sanções quando não forem respeitadas e enquanto
se obrigar os surdos a usarem o padrão linguístico dos ouvintes; respeitar a nossa
Língua de Sinais como a primeira língua e usar o material educativo adequado em
Língua de Sinais; definir as necessidades e as finalidades educativas na área de
Libras para crianças surdas.

Em termos de elaboração de leis, pode-se dizer que estabelecemos, no Brasil,


um grande marco histórico, sendo o problema fundamental o não cumprimento do
que foi decidido, acima de tudo, o não respeito à cultura surda.

Cultura surda: é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e


de modificá-lo, a fim de torná-lo acessível e habitável, ajustando-o
as suas percepções visuais, que contribuem para a definição das
identidades surdas e das “almas das comunidades surdas”. Isso
significa que abrange a língua, as ideias, as crenças, os costumes e
os hábitos do povo surdo.

Um exemplo se dá na formação dos professores surdos e professores


bilíngues. Não só ainda temos profissionais atuando como instrutores de Libras
sem formação acadêmica, como continuam sendo feitos concursos públicos nas
prefeituras estaduais e municipais. Hoje em dia, temos uma grande estimulação
aos profissionais surdos para terem a sua formação acadêmica, e, ainda, temos
vários professores surdos efetivos nas Universidades e Institutos Federais por
meio de concursos públicos na educação e em Letras.

Quer saber a quantidade de professores surdos nas


universidades públicas? Veja a relação de professores surdos na
Esfera Federal do Brasil. Dados atualizados sistematicamente pela
autora, demais líderes surdos e pesquisadores da área.

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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

REIS, F. A docência na educação superior: narrativas


das diferenças políticas de sujeitos surdos. Tese de
Doutorado em Educação. Uberlândia: Universidade Federal
de Uberlândia, 2015. Disponível em: https://repositorio.ufu.br/
bitstream/123456789/17759/1/DocenciaEducacaoSuperior.pdf.
Acesso em: 28 jul. 2020.

Chartier (1990) afirmará uma história cultural que busca o confronto, localizar
as lutas discursivas e de poder no campo do saber. Essa trajetória cultural nos
trouxe, principalmente:

Em 1997: UFRJ – primeiro professor surdo.


Em 1999: documento – Que Educação nós Surdos queremos (Educadores
Surdos e Surdos Universitários).
Em 2001: formação dos Instrutores e Agentes Multiplicadores pelo MEC.
Em 2002: criação da Lei de Libras.
Em 2003: Mestrado e Doutorado (UFRGS e UFSC).
Em 2005: Decreto que regulamenta a Libras.
Em 2006: criação do curso de Graduação de Letras/Libras.
De 1997 até hoje: Concursos Públicos de Libras na área de licenciatura e
Concursos Públicos de Letras/Libras.

Com esses anos históricos de conquistas, portanto, nós temos mais de


303 professores surdos, conforme dados atualizados pela professora Flaviane
Reis. Foi uma grande mudança, mas há pouca oportunidade de trabalhar em
conjunto com outros professores surdos na mesma universidade. A trajetória
histórica cultural tem permitido abrir um espaço na Educação Superior, mostrando
a necessidade de respeitar a identidade e o seu diferencial linguístico e cultural
com os maiores esclarecimentos dentro das bases teóricas, levando em conta
a riqueza de suas condições culturais, as resistências, as resiliências surdas, o
pensamento político e a negociação nas relações de poder na Educação Superior
com o ensino de Libras.

O ensino de Libras é uma experiência visual dos surdos, constituindo a


cultura surda, a arte surda, a literatura surda, a política surda etc., que devem
funcionar como ponto de partida para discussões. Há tensões nas relações
de poder entre os professores surdos na Educação Superior no contexto das
investigações desenvolvidas no campo de ensino de Libras.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

2.2 PROFISSIONAIS
Trata-se dos profissionais surdos que desenvolvem suas pesquisas voltadas
para a realização de alguns objetivos importantes: o atendimento às crianças
surdas para estimular sua aquisição de linguagem e difundir a Língua de Sinais
nos sistemas universitários. Os professores surdos têm papel fundamental,
mas também os profissionais e os pesquisadores surdos que não estão ligados
diretamente às crianças surdas, como os que ensinam a Língua de Sinais para
os ouvintes. Estes sujeitos surdos, além do desenvolvimento das suas tarefas
específicas, devem também ser considerados como participantes do projeto
educativo vinculado à área de Educação de Surdos, de Educação Bilíngue e de
Linguística aplicada à Língua de Sinais, devendo ter consciência da Educação de
Surdos, conhecimento e compreensão da realidade vivida como identidade surda.

Esses profissionais surdos têm a sua identidade surda reconhecida como


construção cultural na pós-Modernidade e devem ter estabelecidas condições
de trabalho respeitando o seu jeito de ensinar, o seu jeito cultural, o seu jeito
de produzir em Língua de Sinais, de contar as histórias, de se expressar
culturalmente, próprio dos surdos, e o seu jeito de sinalizar.

Pós-Modernidade: é a condição sociocultural de estar após a


Modernidade, que prevalece na Contemporaneidade, pode substituir
a Modernidade e pode significar englobar a consciência da filosofia
cultural, traçando artes, literaturas, questões socioculturais, política
cultural, identidade cultural, representando a diferença.

5 FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO
PROFISSIONAL
Ainda é frequente e equivocada a concepção de que o sujeito surdo possui,
naturalmente, as habilidades necessárias para a educação de crianças surdas,
portanto, há a necessidade de formação profissional para o trabalho nos espaços
educacionais onde estão os alunos surdos.

Além da formação, e por haver um desnivelamento de conhecimentos, é


de grande valor a atualização/aperfeiçoamento como prática e criar sistemas

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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

de surdos para isso na área de Educação de Surdos e Educação Bilíngue de


Surdos. Há, como em toda e qualquer profissão especializada, a necessidade de
acompanhar nos Estudos Surdos a contínua revisão das teorias especificamente
culturais, de identidade e linguística em Língua de Sinais, e das propostas
voltadas para a Educação que nós queremos. Também é preciso estarmos
atentos às transformações que ocorrem em nossa sociedade para podermos
acompanhá-las, bem como transgredir uma pedagogia da diferença, ou seja,
pedagogia bilíngue nos espaços educacionais.

O aperfeiçoamento deve ser encarado não como uma mera pedagogia


tradicional e sim como uma transformação contemporânea para a pedagogia da
diferença, ou seja, pedagogia bilíngue para tomar conhecimentos em atividades
culturais. Deve fazer parte da programação, ocorrendo periodicamente, como
também constituir em um trabalho cotidiano, que tem como base constantes
discussões em grupo dos pesquisadores surdos, a programação do seu
próprio trabalho, a definição de seus objetivos, a avaliação dos resultados e,
consequentemente, as reflexões sobre a visão dos surdos e as reformulações,
sempre que necessário, sobre a visão cultural dos surdos.

Nesse processo de aperfeiçoamento, a atuação da transgressão


pedagógica dos surdos é algo novo para ter uma boa qualidade de ensino
de Libras para as crianças surdas (a ideia de como ensinar através do jeito
dos professores surdos). Consideramos importante organizar os programas
culturais para aperfeiçoar o ensino de Libras, definindo os temas culturais em
Língua de Sinais que se adaptam melhor à cultura surda dentro do currículo, a
forma como serão trabalhados na sala de aula em Língua de Sinais, verificando
constantemente a adequação da proposta da Educação de Surdos e Educação
Bilíngue de Surdos. Isso requer o conhecimento das necessidades da formação
dos professores surdos quanto à satisfação de seus desejos, de forma que sejam
estimulados.

Transgressão pedagógica: é um ato de transformação,


transgredir algo para atualizar a forma de usar nessa transformação,
como transformar a pedagogia tradicional na pedagogia da diferença
na Educação de Surdos, uma quebra de regra, uma mudança com a
perspectiva de construir.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Podem-se elaborar e definir planos anuais de aperfeiçoamento, prevendo


trabalhos realizados por experts no assunto, daí a importância do contato surdo-
surdo e com a coordenação pedagógica com as suas experiências vividas pela
comunidade surda e saber usar a estratégia de ensinar de uma forma diferenciada
para alunos surdos, universidades e institutos que desenvolvem pesquisas
científicas e estudos sobre temas da Educação de Surdos e Educação Bilíngue
de Surdos no campo de Estudos Surdos.

A programação dos eventos de aperfeiçoamento deve ter toda a divulgação


possível na comunidade surda brasileira e internacional, pais de filhos surdos,
intérpretes de Libras e professores bilíngues junto às crianças surdas. É muito
importante que se saiba do trabalho cultural que está sendo realizado nas escolas
de surdos ou nas escolas bilíngues de surdos, inclusive dos assuntos tratados nos
cursos de aperfeiçoamento com os professores surdos, para que a comunidade
surda seja bem informada sobre o processo de qualificação das crianças surdas
que se desenvolvem no ensino bilíngue, como a Língua de Sinais e a Língua
Portuguesa.

Caro acadêmico, neste site você poderá ler um artigo intitulado


“Formação de professores para a educação bilíngue de surdos
na Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental”. No
artigo, os autores fazem algumas reflexões acerca do aluno surdo no
contexto educacional. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.
br/rpge/article/view/11913.

3 PESQUISA E DESENVOLVIMENTO
Os professores surdos nos espaços educacionais precisam estar
constantemente envolvidos nas pesquisas científicas sobre a Educação de
Surdos e Educação Bilíngue, valorizando a importância da reflexão e utilização de
conhecimentos produzidos.

A Educação de Surdos e a Educação Bilíngue necessitam de mais


informações e de um conhecimento mais aprofundado sobre a pedagogia surda
ou pedagogia da diferença, adequado à cultura surda através da forma de ensino
dos professores surdos. Por outro lado, produzir cultura surda nos espaços
educacionais é um campo privilegiado de pesquisa para estudiosos das áreas

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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

educacionais e linguísticas e, em especial, da Educação de Surdos e Educação


Bilíngue de Surdos.

Pesquisas que podem ser fundamentais na observação possibilitaram a


modificação de algumas teorias, como o desenvolvimento bilíngue de surdos, a
partir de um novo campo nos Estudos Surdos na área de Estudos Linguísticos
em Língua de Sinais, que mais tarde ficou conhecido como Educação Bilíngue, as
modalidades de interação entre as duas línguas, a Língua de Sinais e a Língua
Portuguesa para expor, tanto na modalidade oral quanto escrita, as relações do
encontro surdo-surdo, o currículo, a pedagogia bilíngue, a cultura surda, fazendo
com que se torne uma forma de acesso das pessoas ao mundo social e linguístico.

Assim, reforça-se a ideia da Educação Bilíngue como um verdadeiro sonho


dos professores e pesquisadores surdos, lugar em que é possível colher um
espaço bilíngue de surdos, utilizando as duas línguas como fronteiras de língua, e
suas motivações podem ser introduzidas na própria Educação Bilíngue, visando à
melhoria na qualidade do processo educacional.

CONVENÇÃO DA ONU COM RELAÇÃO À LÍNGUA DE SINAIS

[...] Art. 9.2 e) Oferecer formas de assistência humana ou animal


e serviços de mediadores, incluindo guias, ledores e intérpretes
profissionais da língua de sinais, para facilitar o acesso aos
edifícios e outras instalações abertas ao público ou de uso público.

[...] Art. 21 b) Aceitar e facilitar, em trâmites oficiais, o uso de línguas


de sinais, braille, comunicação aumentativa e alternativa, e de todos
os demais meios, modos e formatos acessíveis de comunicação, à
escolha das pessoas com deficiência.

[...] Art. 21 e) Reconhecer e promover o uso de línguas de sinais.

[...] Art. 24.3 b) Facilitação do aprendizado da língua de sinais e


promoção da identidade linguística da comunidade surda.

[...] Art. 30.4. As pessoas com deficiência farão jus, em igualdade de


oportunidades com as demais pessoas, a que sua identidade cultural
e linguística específica seja reconhecida e apoiada, incluindo as
línguas de sinais e a cultura surda.

FONTE: <https://cutt.ly/AzXM5vt>. Acesso em: 10 jul. 2020.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Sobre o fato de a Convenção da ONU vincular a área de Língua de Sinais


como um dos direitos humanos dos surdos, é importante destacar que essa
convenção é um marco muito importante da legislação para a comunidade surda,
pois fica garantido seu direito linguístico, e se não há direito linguístico, não há
direito humano!

1 Analisando as políticas voltadas para a área de Libras, o que


você percebe que é declarado, mas não é realizado na Educação
Bilíngue de Surdos?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
___________________________________________________.

2 Quais elementos você sugeriria que todo professor surdo e/ou


bilíngue precisaria melhorar e transformar no sistema educacional
para a Educação Bilíngue?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
___________________________________________________.

3 Dê algumas sugestões com relação à Convenção da ONU


sobre os direitos das pessoas com deficiência, especificamente
em Língua de Sinais, e o que necessita ser inserido na grade
curricular na Educação Bilíngue de Surdos:

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
___________________________________________________.

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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

4 Justifique a importância do aperfeiçoamento para os profissionais


surdos de Língua de Sinais e professores bilíngues na Educação
Bilíngue:

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
_______________________.

Para entender a pesquisa e o desenvolvimento é importante seguir o nosso


pensamento quanto aos documentos mencionados anteriormente. Precisamos refletir
para repensar o que nós surdos queremos na educação bilíngue. Segundo Larossa
(2001, p. 21):

Palavras determinam nosso pensamento porque não pensamos


com pensamentos, mas com palavras, não pensamos a partir de
uma suposta genialidade ou inteligência, mas a partir de nossas
palavras, e pensar não é somente “raciocinar” ou “calcular” ou
“argumentar”, como nos têm sido ensinado algumas vezes, mas
é sobretudo dar sentido ao que somos e ao que nos acontece,
e isto, o sentido ou sem sentido, é algo que tem a ver com as
palavras. Portanto, também tem a ver com as palavras, o modo
como nos colocamos diante de nós mesmos, diante dos outros
e diante do mundo em que vivemos. O modo como agimos em
relação a tudo isso.

Então, esse pensamento tem por objetivo mostrar como tem sido construída a
ideia de pesquisa levando em consideração a escolha metodológica do ensino de
Libras junto aos professores surdos e professores bilíngues e a identificação dos
professores surdos como perspectiva a um tema restrito com foco no ensino de
Libras. Apresentaremos aqui os caminhos de qualidade do ensino de Libras e as
metodologias escolhidas para construir o material didático em Libras.

Para entender a cultura surda, basta entender uma base teórica nos Estudos
Culturais, pois estes oferecem a oportunidade de escolher entre diferentes
metodologias a partir do objeto de pesquisa em questão, neste caso, o ensino de
Libras, bem como para o professor de Libras poder tecer seus próprios caminhos
em suas metodologias. De acordo com Wortmann (2005, p. 46), “os Estudos
Culturais valem-se de procedimentos e de metodologias que não lhes são próprios
ou particulares, mas dos quais se apropriam em determinadas circunstâncias e
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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

em função de propósitos específicos”. Na área de Estudos Surdos, por sua vez,


conectam-se à identidade surda e se apresentam como instrumento necessário para
fazer acontecer o diálogo cultural e entender o jeito de usar a metodologia diferenciada
para os alunos surdos.

A pesquisa é resultante das inquietações diante da realidade profissional, como


afirma a pesquisadora Bujes (2002, p. 14):

A pesquisa nasce sempre de uma preocupação com alguma


questão, ela provém, quase sempre, de uma insatisfação com
respostas que já temos, com explicações das quais passamos a
duvidar, com desconfortos mais ou menos profundos com relação
a crenças que, em algum momento, julgamos inabaláveis.

Este estudo ocorreu em decorrência de inquietações profissionais que levaram


a problematizar, no espaço educacional, as construções ocorridas no exercício
profissional dos professores de Libras, por meio de suas narrativas, em que aparece
desconforto ou mal-estar sentido nas relações de poder estabelecidas no ambiente
educacional e acadêmico. É importante destacar que a presença dos professores de
Libras nos espaços educacionais é uma conquista do povo surdo, fruto de sua luta
política, que nos dias de hoje, foi, em parte, traduzida em forma de Lei, como a Lei de
Libras nº 10.436/2002 e o Decreto nº 5.626/2005. Com essa conquista, foi possível a
criação de nível superior para a formação de professores licenciados em Letras/Libras
em nosso país.

Portanto, neste processo de construir e reconstruir, a metodologia de ensino de


Libras deve ser pensada e repensada, com muitas questões que devem ser debatidas
com os professores de Libras, pois não existem metodologias de ensino de Libras
prontas. Para o professor de Libras, sempre circulam novas ideias, transformações,
produções de materiais didáticos em Libras, construções de metodologias de
ensino de Libras, olhares e discussões. A metodologia de ensino de Libras deve ser
construída e reconstruída ao longo de discussões sobre a melhor forma de ensinar.
Como os professores surdos se posicionam politicamente nas relações de poder e
negociações estabelecidas para a construção de metodologia específica para o
ensino de Libras?

É importante ressaltar os professores de Libras atuantes nos espaços


educacionais para identificar, mapear e produzir algumas reflexões que se
desencadearam no fio desta metodologia de ensino de Libras. Elas contribuíram
para o melhor entendimento de inquietações com o fenômeno das produções do
pensamento político dos professores surdos nos espaços educacionais, ou seja, a
nova maneira de pensar nessa metodologia de ensino de Libras.

Esperamos que a qualidade do ensino de Língua de Sinais permita ultrapassar


ideias, levando as pessoas a terem outras concepções, outros entendimentos de
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Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

metodologia específica ao ensino de Libras, percebendo soluções para problemas


que muitas vezes não estão visíveis e se escondem nos espaços educacionais.

A respeito do ensino de Língua de Sinais, apresentaremos as qualidades


necessárias para o ensino de Libras, que determinam aspectos linguísticos nos
espaços educacionais, principalmente nas escolas de surdos e escolas bilíngues
para surdos, e permitem a análise do nível de qualidade da instituição, servindo o uso
de Língua de Sinais para o planejamento e a intervenção das práticas educativas.

A seguir, apresentaremos os itens relacionados às condições de qualidade de


ensino e os indicadores que estão envolvidos nesta modalidade de aprendizagem e
que têm entre si forte correlação.

4 ACESSIBILIDADE DE USO EM
LÍNGUA DE SINAIS NOS ESPAÇOS
EDUCACIONAIS
Nesta seção, falaremos sobre acessibilidade e a importância que isso tem para
que os alunos ou as pessoas surdas tenham independência e uma vida normal como
às demais pessoas. Além disso, a tecnologia favorece para que os surdos consigam
se comunicar e exercer as diversas práticas sociais do dia a dia.

Indica o nível de atendimento da demanda de acesso à comunicação entre


surdos e ouvintes, bem como a localização da comunidade surda, ambas exigidas
pela comunidade surda, por exemplo, como usar a tecnologia para surdos e
sua adaptação, que é o caso da última tecnologia chegada ao Brasil, a Viable, e
outras aparelhagens adaptadas para os surdos. Essas adaptações são: campainha
luminosa, celular vibratório, aparelho vibratório de bebê chorando, closed caption
para legenda na TV, intérprete na janela da TV, mídia em Língua de Sinais nos locais,
como aeroportos, bancos, entre outros.

Viable: é um aparelho de comunicação para surdos que atua


de forma independente. É uma central intermediária entre intérprete
e surdo de forma visual e sinalizada em Língua de Sinais. O usuário
sinaliza para o intérprete, o intérprete traduz para o ouvinte ao
telefone e o ouvinte responde aos intérpretes.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Se você quiser conhecer como funciona o Viable, acesse o link


a seguir e veja como um simples aparelho pode auxiliar tanto na
independência como na acessibilidade. Vale a pena assistir ao vídeo
e se inteirar das novas tecnologias que estão chegando no Brasil e
auxiliando os surdos. Disponível em: http://www.viable.net/.

Devido à situação em que a comunidade surda vive, é fundamental a questão


da acessibilidade para o povo surdo. Neste sentido, a questão do acesso precisa
ser vista com atenção através da experiência visual.

Povo surdo: denominar povo surdo é uma estratégia de poder,


de identidade. O que constitui este povo? As associações,
organizações locais, nacionais e mundiais de surdos, as lutas,
a cultura, as políticas. É uma representação simbólica, não
como uma simples comunidade a quem podem impor regras,
mas como uma estrutura forte que se defende, impõe suas
regras, seus princípios (REIS, 2006, p. 18).

A escola de surdos e a escola bilíngue são direitos que toda criança surda tem
para adquirir, como primeira língua, a Língua de Sinais. No entanto, o poder público
ou sociedade vem tendo dificuldade para cumprir sua obrigação constitucional e
precisa, nesta circunstância, priorizar o atendimento de comunicação em Língua
de Sinais para surdos, principalmente em famílias de filhos surdos.

Há, assim, a necessidade de planejamento com relação à acessibilidade aos


locais onde serão construídas as escolas de surdos e as escolas bilíngues para
que exista uma postura democrática destas com relação às crianças surdas que
poderão ser matriculadas.

Escolas bilíngues com modelos organizativos, um modelo bilíngue para


surdos, em que estes querem o seu jeito de ensinar, o porquê de ensinar o jeito
cultural dos surdos e ensinar a Língua de Sinais como a primeira língua são
iniciativas realizadas pelos pesquisadores que conhecem a área de Educação de
Surdos e que estão há muitos anos trabalhando e batalhando pela comunidade
surda. Eles querem sua nova proposta de educação bilíngue no documento do
PNE (Plano Nacional de Educação). Nós pensamos, sentimos e tentamos excluir
a visão equivocada dos ouvintes sobre nós, surdos, como acontece no Ministério
da Educação, na Secretaria de Educação Especial Federal, já que estes órgãos
não conseguem responder e cumprir as exigências para a educação que os
surdos querem, como no caso do CONAE. Quer conhecer a moção que nós,
surdos, propomos? Veja a moção a seguir:
22
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

MOÇÃO

DELEGADOS PROPONENTES: Cláudio Henrique Nunes


Mourão e Cristian Alexandre Strack (RS); Cristiano de C. A. Koyama,
Maria Inês Vieira, Moryse Vanessa Saruta e Neivaldo Augusto Zovico
(SP); Mardênio dos Santos Aguiar (CE). Apresentamos esta moção,
solicitando a inclusão de três parágrafos no Eixo VI, visto que as
redações aprovadas pelas Conferências realizadas nos estados do Rio
Grande do Sul, São Paulo, Paraná e Ceará, relacionadas à Educação
de Surdos, foram parcialmente contempladas. Devido à especificidade
da Educação de Surdos, cujo reconhecimento é reivindicado
pelos movimentos políticos, articulados pelas comunidades surdas
brasileiras, entendemos como fundamental a inclusão dos parágrafos
a seguir para a efetiva consolidação das propostas de educação do
nosso país.

PARÁGRAFOS A INCLUIR

Garantir a continuidade das escolas de surdos, desde a educação


infantil até as séries finais da educação básica, assegurando
sua regularidade no sistema de ensino, com projeto pedagógico
estabelecido. Nos casos em que a população de surdos não comportar
a existência de escola de surdos, garantir o atendimento dos alunos em
classes de surdos, estabelecidas em escolas regulares de referência,
ou ainda, nos casos em que isso não for possível, estimular espaços
de compartilhamento da língua de sinais e demais aspectos culturais
como condição do desenvolvimento linguístico, cognitivo, emocional,
social, cultural e de construção de identidade.
Garantir aos professores surdos e ouvintes que atuam nas escolas
de surdos, bem como nas classes de surdos, que tenham formação
específica e continuada sobre a história, aspectos linguísticos, culturais
e de identidade das comunidades surdas do Brasil e do Mundo.
Garantir o ingresso de surdocegos e surdos com outras
deficiências associadas, nas escolas de surdos, bem como nas
classes de surdos, pautada na perspectiva da educação inclusiva,
assegurando o direito à educação em língua de sinais como primeira
língua, bem como a presença de professor assistente, do instrutor
mediador ou do guia intérprete, de acordo com a necessidade do
aluno.

FONTE: A autora.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

1 Quais as principais vantagens que o documento “Que Educação


nós Surdos queremos” possibilita aos alunos surdos nos espaços
educacionais? Reflita sobre a importância e registre suas ideias.

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
_______________________.

2 Quais tecnologias adaptadas para surdos você já conheceu?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
________________________.

3 Quais são as suas vantagens e desvantagens para os surdos?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
________________________.

5 A ESCOLA BILÍNGUE
A escola de surdos e a escola bilíngue para surdos, considerada como
espaço visual e privilegiado de educação e desenvolvimento das crianças surdas,
24
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

precisa reconhecer o valor e a importância de uma programação educativa.

É fundamental a elaboração de um projeto pedagógico e material didático


adaptado para a experiência visual que contemple a concepção de escola,
de criança e de seu desenvolvimento, dando atenção visual à escolha dos
instrumentos da ação educativa, aos projetos a serem desenvolvidos, aos jogos
e aos materiais lúdico-didáticos em Língua de Sinais e Língua Portuguesa a
serem trabalhados como bilíngues. Portanto, enfatiza-se que a primeira língua
dos surdos é a língua de sinais e a segunda, a língua portuguesa, o que favorece
as relações de contato, o encontro surdo-surdo e o contato com a cultura surda.

Além disso, é necessário que o surdo se comunique na sua primeira língua


– língua de sinais –, da mesma forma que as pessoas oralizadas se comunicam
em língua portuguesa. A escola bilíngue exerce com isso um papel fundamental,
o de proporcionar uma interação entre a língua de sinais e até mesmo a pessoa
surda compreender as diferentes formas de se comunicar na língua de sinais nas
diversas situações sociais do dia a dia. A língua portuguesa será a língua em que
as crianças surdas poderão se comunicar de forma escrita e ter acesso a todos os
materiais escritos que estão presentes na sociedade.

A partir disso, vejamos alguns indicadores que se apresentam em uma


programação educativa:

• Permanência da construção da identidade surda das crianças e variação


linguística em língua de sinais, ou seja, da mesma forma que outras
crianças que nascem em comunidades que falam línguas migratórias
(alemão, italiano, francês, polonês, entre outras) as crianças surdas têm
o direito de manter a sua cultura surda, ou seja, a sua identidade surda.
Além disso, cabe lembrar que a língua de sinais é uma língua linguística
semelhante às demais, pois haverá diferentes variações sociolinguísticas
nos diferentes contextos sociais das comunidades surdas.

Identidade:

[...] a identidade é realmente algo formado, ao longo do


tempo, através dos processos inconscientes, e não algo inato,
existente na consciência no momento do nascimento. Existe
sempre algo “imaginário” ou fantasiado sobre sua unidade. Ela
permanece sempre incompleta, está sempre “em processo”,
sempre “sendo formada” (HALL, 2005, p. 38).

25
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

• Aceitação do jeito de ser surdo. Além de ser surdo, é preciso que a


criança se aceite como surdo na comunidade em que esteja inserido e
que exerça uma vida normal no seu cotidiano.
• Aceitação das crianças em usar a língua de sinais como a variação
linguística.
• Privacidade e sociabilidade como experiência visual.
• Uso das imagens, gravuras com as palavras para a contextualização da
criança surda.
• Captação das imagens e suas respectivas palavras devido à visualidade.
• Ensino e apresentação dos objetos e suas respectivas palavras para
trabalhar no contexto e usar a segunda língua como a modalidade
escrita.
• Sequencialidade e imprevisibilidade em contexto de Língua de Sinais.
• Os surdos usam o jeito em Língua de Sinais como contexto diferenciado
do jeito dos ouvintes.
• Uso da Língua de Sinais como cultural, o jeito dos surdos de se
expressarem.
• Ação e formalização/simbolização como expressão facial e corporal
em Língua de Sinais. Os surdos usam mais as expressões faciais
para facilitar a comunicação e perceber no contexto o que eles estão
sinalizando. Consideram-se como atividades de aprendizagem aquelas
que favorecem o desenvolvimento cognitivo, afetivo e sociocultural da
criança surda. Portanto, todas as atividades realizadas nas escolas de
surdos são atividades de aprendizagem, através da visualidade espacial,
inclusive as ações de Língua de Sinais.

Na próxima seção, conversaremos sobre o sistema de relações em Língua


de Sinais.

6 SISTEMAS DE RELAÇÕES EM
LÍNGUA DE SINAIS
Nesta seção, estudaremos o sistema de relações em Língua de Sinais,
além disso, compreenderemos essas relações tanto na visão dos pais como da
comunidade surda.

Capovilla (2008) comprova que a criança surda, desde bem pequena, é capaz
de estabelecer relações com o ambiente em que vive, ou seja, com as pessoas
se comunicando em Língua de Sinais, principalmente pais surdos e filhos surdos
com estimulação precoce em Língua de Sinais. Quanto mais elaborado e rico for

26
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

o sistema de relações de comunicação, mais a criança surda terá oportunidade


de aprender e crescer nas escolas bilíngues para surdos.

A escola de surdos e a escola bilíngue são espaços sociais entre surdos. A


complexidade e o equilíbrio das relações de comunicação são fundamentais, bem
como a qualidade das trocas de experiências visuais e a definição dos papéis.
A relação do professor surdo/aluno surdo, em particular, pode ser natural
e precisa ser considerada na construção de identidade, cultura e Língua de
Sinais, isto é, na identificação cultural dos surdos. O professor surdo é um sujeito
significativo e crucial ponto de referência, e precisa ser um ativo de comunicação
natural entre eles.

Na relação criança surda/criança surda como encontro surdo-surdo, por sua


vez, a criança aprende a estabelecer interações de prazer com outras crianças
surdas. É uma relação que dificilmente ocorre sem conflitos e negociações,
porém permite descobrir as diferentes identidades surdas. É nesta relação que ela
aprende o que significa cooperação cultural e desfruta de importantes momentos
de troca de igual para igual.

Vê-se que a relação professor surdo/professor surdo envolve grande


variedade de interações, podendo ocorrer nos espaços educacionais, nos
eventos, nos encontros, nos cursos ou no ambiente cultural dos surdos. Constitui
a “subjetividade surda”, que torna possível e significativamente as outras duas
dimensões relacionais, como identificar a identidade surda e a cultural.

7 PONTO DE VISTA DOS PAIS


O termo “pais” não faz distinção entre pai e mãe e também pode ser
representado por qualquer pessoa da família que se sinta e aja como responsável
pela criança. Ocorre que, muitas vezes, os pais utilizam o sistema linguístico da
Língua Portuguesa por não saberem a Língua de Sinais. Agindo dessa forma,
fazem com que as crianças surdas aprendam tardiamente a Língua de Sinais,
diferentemente do que ocorre entre pais surdos e filhos surdos, cujos estímulos
na Língua de Sinais já acontecem desde o início do processo de aquisição da
linguagem pela criança. A questão da relação com a família é ponto fundamental
em um projeto autenticamente pedagógico-cultural, ampliando o conhecimento
em Língua de Sinais. A participação dos pais é a base para que haja um
conhecimento articulado e amplo sobre as crianças surdas nas suas diversas
situações de vida através da experiência visual.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

FIGURA 2 – A IMPORTÂNCIA DOS PAIS NO DIA A DIA DA ESCOLA

FONTE: <https://cutt.ly/RcJdpgf>. Acesso em: 15 jun. 2020.

Como as crianças surdas podem construir a sua língua natural, a Língua


de Sinais, em uma casa cuja família não sabe ou não usa a Língua de Sinais?
Quando essa situação ocorre, as crianças aprendem tardiamente a língua,
somente quando chegam às escolas de surdos, a partir de três anos de idade.

Apesar de sua importância, essa relação entre pais surdos/ouvintes e


professores surdos/ bilíngues é bastante complexa. Envolve expectativas,
atribuições, interpretações que nem sempre são explicitadas. É comum gerar
conflitos por medo de julgamentos, disputas e discursos sobre quem sabe mais
sobre as crianças surdas, sentimento de culpa (pais) e superioridade (professores
surdos e bilíngues).

É preciso maturidade profissional. O professor surdo e bilíngue deve tornar


possível o estabelecimento de uma comunicação mais esclarecida entre as
famílias dos filhos surdos, cuja base está na consciência do professor surdo e
bilíngue a respeito do seu papel nessa relação: o colaborador, o clarificador, o
comunicador atento, o entendedor incansável.

É preciso buscar permanentemente caminhos para alcançar a compreensão


recíproca entre pais e professores. Devem-se criar novas formas de encontros
sobre Educação de Surdos, sobre educação bilíngue para surdos e o investimento
na formação profissional visando estes objetivos.

Dúvidas dos pais ouvintes sobre a língua preferida para os filhos


surdos. Reflita com as perguntas a seguir:

1 Se você tivesse um filho surdo, como você reagiria? Deixaria a

28
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

responsabilidade para o professor surdo ou bilíngue que entende


sobre crianças surdas?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
_______________________.

2 Imaginando que você tenha um filho surdo, buscaria entender a


situação para educá-lo melhor? Faria o uso da Língua de Sinais
na sua casa para se comunicar melhor com a família ou gostaria
de normalizar, oralizá-lo, seguindo o modelo ouvinte?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
________________________.

8 COMUNIDADE SURDA
Por que dizer comunidade surda? Tem alguma relação com os sujeitos
surdos? Por que sempre nos referimos à comunidade surda? Onde fica essa
comunidade? O termo “comunidade” pode gerar língua e cultura em qualquer
parte do mundo, conforme o conceito básico e geral da palavra.

Do ponto de vista da sociologia, uma comunidade é um conjunto de pessoas


que se organizam sob o mesmo conjunto de normas, geralmente vivem no
mesmo local, sob o mesmo governo ou compartilham do mesmo legado cultural
e histórico. Os estudantes que vivem no mesmo dormitório podem formar uma
comunidade, assim como as pessoas que vivem no mesmo bairro, aldeia ou
cidade. Fichter (1973), em suas definições para uso didático, ressalta que uma

29
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

palavra que é rodeada de significados múltiplos, requer uma cuidadosa definição


técnica, ao que propõe: comunidade é um grupo territorial de indivíduos com
relações recíprocas, que servem de meios comuns para lograr fins comuns.

Para compreender o conceito sociológico de comunidade, observe as figuras


a seguir sobre três grupos sociais distintos: os negros, os índios e os judeus.

FIGURA 3 – COMUNIDADE INDÍGENA

FONTE: <https://cutt.ly/ccJs5Tp>. Acesso em: 12 jul. 2020.

FIGURA 4 – COMUNIDADE JUDAICA

FONTE: <https://cutt.ly/WcJdwQ8>. Acesso em: 19 jul. 2020.

30
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

FIGURA 5 – COMUNIDADE NEGRA

FONTE: <https://cutt.ly/scJdyCr>. Acesso em: 25 jul. 2020.

Desse modo, a comunidade surda pode envolver-se nessa situação, ou seja,


pode fazer parte do conceito básico e geral citado anteriormente. O conceito da
comunidade surda fica esclarecido, bem como o pensamento dos povos surdos
nas afirmações dos autores surdos americanos Padden e Humphries (1993, p. 5):

Uma comunidade surda é um grupo de pessoas que vivem


num determinado local, partilham os objetivos comuns dos
seus membros, e que por diversos meios trabalham no sentido
de alcançarem estes objetivos. Uma comunidade surda pode
incluir pessoas que não são elas próprias surdas, mas que
apoiam ativamente os objetivos da comunidade e trabalham
em conjunto com as pessoas surdas para os alcançar.

Entendemos que a comunidade surda não é só de sujeitos surdos, mas


de qualquer pessoa que se envolva nessa comunidade e que compartilhe dos
mesmos interesses profissionais e pessoais, porém os povos surdos têm formas
próprias de se organizar: diferentes modos de vida, línguas e culturas.

Vê-se que é preciso ter como perspectiva da comunidade surda a forma de


gerir a escola de surdos com a participação dos professores e pesquisadores
surdos, dos professores bilíngues, intérpretes e representantes da comunidade
surda. Isso contribui para a construção da imagem da escola bilíngue como uma
instituição cultural e educativa de grande relevância, bem como um equipamento
que pertence a essa comunidade surda.

31
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

9 AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES


DE LIBRAS
Avaliar é saber ensinar e interpretar a postura dos professores de Libras
e, assim, melhor estabelecer a autoavaliação da programação educativa para
melhorar o seu desempenho quanto ao uso de estratégia de ensino através da
expressão facial e corporal e, preferencialmente, enfatizar o jeito cultural dos
professores surdos. Avaliação é o ato de conhecimento e de reconhecimento de
valores com base na subjetividade dos surdos. Portanto, não existe uma única
forma de avaliar.

Para que a avaliação se torne confiável e segura, podem-se definir os


critérios: autoconsciência, saber ensinar os outros, observar o desenvolvimento
das crianças surdas, solicitar a colaboração da criança surda, deixar claras as
intenções através da Língua de Sinais para as crianças surdas enquanto estão
construindo sua aquisição de linguagem, estar atento ao perigo dos instrumentos
utilizados que impõem a Língua Portuguesa como a primeira língua aos sujeitos
surdos. O importante é respeitar o jeito das crianças surdas que querem aprender
a Língua Portuguesa como segunda língua sem imposição.

9.1 VALORES ÉTICOS DOS


PROFISSIONAIS
Os princípios éticos de referência e o sistema adotado para a organização
das escolas bilíngues para surdos constituem pontos de equilíbrio de todos os
indicadores da qualidade de ensino na didática em Língua de Sinais.

Quanto maior for a dificuldade em usar a Língua de Sinais, misturando com a


Língua Portuguesa, maior será o risco de retardar a aquisição da Língua de Sinais
e, consequentemente, de promover uma comunicação efetiva da comunidade
surda. É preciso usar a Língua de Sinais desde o início do processo de aquisição
da linguagem.

Como usar os valores éticos dos profissionais no momento de usar a didática


na Educação de Surdos? Para que isso ocorra, é preciso:

• Saber bem a Língua de Sinais.


• Respeitar a cultura surda.
• Usar o currículo em Língua de Sinais nas várias disciplinas.

32
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

• Usar o jeito de ensinar, de preferência, dos professores surdos e


bilíngues.
• Contar histórias adaptadas à cultura surda, como “Rapunzel Surda”,
“Patinho Surdo”, “Adão e Eva”, “Ivo”, “Tibi e Joca”, entre outras histórias
utilizadas em Língua de Sinais que se relacionam ao mundo dos surdos.

Para que você conheça alguns desses livros infantis, a seguir você poderá
visualizar as capas desses livros, assim como uma pequena resenha de cada um
deles.

A literatura infantil “Rapunzel Surda” é um livro de literatura


infantil do Brasil escrito em língua de sinais. O livro Rapunzel Surda
é uma versão do tradicional conto, que insere elementos da cultura
e identidade surda. Essa releitura inédita da história é acompanhada
da escrita de sinais (SW), ilustrações e uma versão em português.
Voltada para o público surdo infantil, a obra é o resultado da pesquisa
desenvolvida por Lodenir Becker Karnopp, Caroline Hessel e Fabiano
Rosa.

FIGURA 6 – CAPA DO LIVRO RAPUNZEL SURDA

FONTE: <https://cutt.ly/gcJs3fm>. Acesso em: 5 maio 2020.

A literatura infantil “Patinho Surdo” narra o nascimento de uma


ave pertencente a outra espécie em um ninho de cisnes ouvintes e a
dificuldade em estabelecer-se uma comunicação entre eles. No livro,
o protagonista reencontra a sua família e aprende a linguagem de
sinais usada pelos bichinhos da lagoa.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

FIGURA 7 – CAPA DO LIVRO PATINHO SURDO

FONTE: <https://cutt.ly/FcJs18D>. Acesso em: 5 maio 2020.

A literatura infantil “Tibi e Joca” pode ser facilmente


compreendida por crianças surdas e ouvintes. Esta é a história de
Joca, um menino especial, e seu amigo Tibi. Joca é surdo. Juntos,
eles fazem uma descoberta que mudará as vidas de Joca e sua
família. Uma descoberta que pode ser importante para você também.

FIGURA 8 – CAPA DO LIVRO TIBI E JOCA

FONTE: <https://cutt.ly/hcJsVxU>. Acesso em: 5 maio 2020.

A literatura infantil “Adão e Eva” conta a origem da língua de


sinais através da criação do casal feito por Deus. Na história, os
dois ficam sem roupa após comerem a maçã e veem-se obrigados
a usar a fala, já que as mãos estão ocupadas em esconder a nudez
dos corpos. A versão desta história é recorrente de encontro entre
os autores e a comunidade de surdos, no qual são contados e
recontados vários clássicos da literatura.

34
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

FIGURA 9 – CAPA DO LIVRO ADÃO E EVA

FONTE: <https://cutt.ly/2cJsGhV>. Acesso em: 5 maio 2020.

É preciso fazer as crianças surdas construírem sua identidade


e sua cultura. Por acaso você já conhece os livros ilustrados nas
figuras? Caso não conheça, tente comprá-los para que sejam
trabalhados em sala de aula e incentivem as crianças surdas a se
aceitarem como surdas. Vamos lá! Além desses, existem outros
clássicos infantis que foram traduzidos para a língua de sinais, e com
isso estimulam a inserção das crianças surdas nas práticas sociais
de leitura.

Se houver uma valorização dos aspectos culturais da criança surda, ficará


mais fácil alcançar bons níveis de qualidade e de ética entre os profissionais.

Sugestões de critérios para um atendimento na educação bilíngue que


respeite os direitos fundamentais dos sujeitos surdos e o ambiente em que a escola
de surdos e a escola bilíngue para surdos precisam estar inseridas são também
considerados como fatores integrantes do processo educativo. A escola de surdos
e a escola bilíngue para surdos são espaços de educação que os surdos querem
e, portanto, incluídas no contexto do ambiente linguístico em Língua de Sinais de
um sistema formativo. Requer a sua articulação no espaço educacional com as
demais oportunidades, seja esse espaço público ou privado, de caráter linguístico
e cultural. Esta articulação pode ser direta: inserção na própria programação de
Educação de Surdos, momentos específicos para uma educação de qualidade
para surdos, conforme o documento criado pela comunidade surda de São Paulo
para o CONAE.

35
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

REIVINDICAÇÕES DA COMUNIDADE SURDA


DE SÃO PAULO AO CONAE:

a) Garantir que as escolas de surdos promovam a Educação


Bilíngue desde a Creche e Educação Infantil. Para tanto, devem
se constituir como ambiente linguístico no qual a língua de
comunicação e instrução seja a Língua Brasileira de Sinais, com o
objetivo de promover sua aquisição como primeira língua do surdo
e a Língua Portuguesa na modalidade escrita como segunda
língua.
b) Garantir a utilização da Língua Brasileira de Sinais como língua
de construção e transmissão de conhecimentos e não somente
como mecanismo de tradução, sem a exclusão do ensino da
Língua Portuguesa, possibilitando estratégias de manutenção,
fortalecimento e ampliação do uso dessas línguas em uma
perspectiva de educação bilíngue.
c) Garantir às famílias e aos surdos o direito de optar pela modalidade
de ensino mais adequada para o pleno desenvolvimento
linguístico, cognitivo, emocional, psíquico, social e cultural de
crianças, jovens e adultos surdos, garantindo o acesso à educação
bilíngue – Libras e Língua Portuguesa.
d) Garantir a oferta de atendimento educacional à criança surda,
do nascimento aos três anos, propiciando a imersão em Língua
de Sinais como primeira língua para promover a aquisição de
linguagem e de conhecimento de mundo desde o nascimento.
e) Assegurar a regularidade das escolas que ofertem educação para
o surdo no sistema de ensino, garantindo seriação e que tenham
projeto pedagógico estabelecido com base em um currículo
bilíngue.
f) Garantir o contato dos alunos surdos com professores surdos,
oportunizando sua identificação linguística e cultural, o que
colaborará para a construção de uma autoimagem positiva de
surdo e de sua constituição como cidadão.
g) Garantir que os professores surdos e ouvintes que atuem nas
escolas de surdos tenham formação sobre a história, cultura,
identidade e comunidades surdas do Brasil e do mundo, bem
como fluência em Libras.
h) Consolidar o ensino de Libras nos cursos de formação de
professores, ampliando os programas em uma perspectiva cultural
relacionada às comunidades surdas, com destaque nas artes,
literatura, gramática da Língua de Sinais, história dos movimentos

36
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

surdos, entre outros. Que essas temáticas sejam incluídas nos


currículos das escolas de surdos e nas escolas com alunos surdos
incluídos.
i) A escola de surdos deverá garantir o ingresso de surdos com
outras deficiências associadas, pautada na perspectiva da
educação inclusiva e assegurando o direito à educação em Língua
de Sinais como primeira língua.
j) Nos Municípios onde a população de surdos não comportar
a existência de escolas de surdos, garantir que a inclusão seja
cuidadosa, ou seja, classes de surdos em escolas de ouvintes, ou
ainda, nos casos em que isso não for possível, estimular espaços
de compartilhamento da Língua de Sinais e demais aspectos
culturais como condição do desenvolvimento linguístico, cognitivo,
emocional, social, cultural e de construção de identidade.
k) Na oferta de atendimento inclusivo em escolas regulares,
privilegiar a organização de escolas-polos, onde os surdos
possam ter contato com outros surdos, desenvolvendo, assim,
sua identidade, tendo contato com sua cultura, através da
troca com seus pares. É importante a presença de professores
surdos permanentes para desenvolver projetos de aquisição/
desenvolvimento da Língua de Sinais, como também ministrar
cursos de Libras para todos os setores da escola.
l) Os municípios devem oferecer transporte aos alunos surdos para
que possam frequentar as escolas de surdos ou as escolas-polos,
pois alunos surdos necessitam conviver com outras crianças,
jovens e adultos em sua primeira língua.
m) As escolas de surdos ou que tenham surdos incluídos devem
oferecer o curso de Libras aos pais e familiares, garantindo a
comunicação com seus filhos surdos.
n) Garantir a implementação da Lei nº 10.436, de 24 de abril de
2002 e do Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, no que
concerne à oficialização da Língua Brasileira de Sinais Libras – no
território nacional. Incentivar e apoiar financeiramente a criação de
cursos de graduação Letras/Libras (licenciatura e bacharelado) em
IES públicas, de modo a garantir que os profissionais que atuarão
como professores e tradutores-intérpretes dessa língua, tanto na
Educação Básica como no Ensino Superior, possam aprofundar o
conhecimento da Língua de Sinais. Consolidar o ensino de Libras
nos cursos de formação de professores, ampliando os programas
em uma perspectiva cultural relacionada às comunidades surdas,
com destaque nas artes, literatura, história dos movimentos
surdos, entre outros.
o) Incentivar e apoiar financeiramente a criação do curso de

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

graduação de Pedagogia Bilíngue em IES, de modo a garantir


a formação de professores bilíngues, surdos e ouvintes, para
atuarem na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. O
professor de surdos deve ter conhecimentos básicos e formação
em Educação de Surdos e esta formação deverá ser contínua e
atualizada.
p) Incentivar grupos de professores de surdos para que desenvolvam
pesquisas sobre essa educação. Promover formação (inicial e
continuada) e habilitação de professores surdos (em licenciatura
bilíngue) e demais profissionais das escolas de surdos ou das
escolas inclusivas com alunos surdos, propiciando a elaboração e
o desenvolvimento de propostas pedagógicas e materiais didático-
pedagógicos coerentes com as realidades e projetos bilíngues
para a comunidade surda.
q) Inserir prova de proficiência em Libras nos concursos e outros
processos seletivos para professores que atuarão com alunos
surdos na educação Básica e na Educação de Jovens e Adultos
surdos. Contemplar alternativas para os surdos quando da
participação em cursos de formação e em concursos públicos
para ingresso funcional.
r) Oficializar a profissão de Tradutor/Intérprete de Libras para surdos
e do Guia-Intérprete para surdocegos e garantir a presença
desses profissionais nas escolas e IES que atendam aos referidos
alunos. A presença de aluno surdo em sala do ensino inclusivo ou
em outros espaços educacionais é fator que determina a presença
destes profissionais.
s) Garantir a participação da comunidade surda em todos os
momentos de decisão, acompanhamento e avaliação relacionados
à educação, com representação na composição dos conselhos de
educação, em nível federal, estadual e municipal.
t) Garantir que a formulação e a execução da política linguística
sejam realizadas com a participação dos educadores surdos e
demais lideranças, professores, tradutores-intérpretes de Libras e
comunidades surdas, para que, junto ao gestor público, possam
elaborar propostas que respondam às necessidades, interesses e
projetos dessa comunidade.
u) Estimular e ampliar programas específicos para elaboração de
material didático e paradidático em Libras, utilizando-se dos
recursos de multimídias através do desenvolvimento de pesquisas
nesta área em parceria com secretarias estaduais e municipais
de educação, outros órgãos governamentais e da sociedade civil
que desempenhem atividades junto às comunidades surdas. Na
atualidade, não há como pensar a Educação de Surdos sem

38
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

pensar em tecnologias e mídias. Para o surdo, isso é de extrema


importância, pois sendo esta uma educação visuoespacial,
traz informações e possibilidades de registros do cotidiano,
cultura e identidade surdas, podendo, assim, ser preservados
e disseminados na comunidade escolar. Portanto, devem-se
distribuir livros e materiais didáticos que estão sendo produzidos
a partir de pesquisas sobre a cultura surda e não somente os
materiais adaptados.
v) Instituir e regulamentar nos sistemas estaduais de ensino a
profissionalização e o reconhecimento público do magistério
surdo, com carreira específica, com concurso de provas e títulos
adequados às particularidades linguísticas e culturais para
professores surdos.
w) Inserir provas didáticas em Libras nos concursos e outros
processos seletivos para professores que atuarão com alunos
surdos na Educação Infantil, na Educação Básica e na Educação
de Jovens e Adultos surdos. Contemplar alternativas para os
surdos quando da participação em cursos de formação e em
concursos públicos para ingresso funcional.

FONTE: BRASIL. CONAE: Documento Final. Brasília: MEC,


SEESP, 2010.

1 A partir dessas reinvindicações da comunidade surda, como


você acha que o ensino das crianças surdas melhorará e como
funcionarão as escolas bilíngues?

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
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____________________________________________________
____________________________________________________
_______________________.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Viu como é importante conhecer e entender a legislação voltada para a
área de Língua de Sinais? Então, continuaremos estudando sobre a prática do
conhecimento nas legislações, que é uma grande aliada nestas horas, quanto
mais exercitarmos, melhor entenderemos os nossos direitos linguísticos!

Já compreendemos as qualidades do ensino de Libras envolvendo a


comunidade surda. Este entendimento é algo para as nossas decisões como
professores surdos e/ou professores bilíngues que trabalham na Educação de
Surdos, pois são os nossos conceitos que embasam nossas escolhas pedagógicas
das diferenças.

Nesse capítulo vimos também sobre as políticas públicas, em especial o


CONAE, a quem a comunidade surda reivindicou o direito de as crianças surdas
frequentarem escolas bilíngues.

Além disso, foi possível compreender a importância das escolas bilíngues


para a comunidade surda, assim como a tecnologia, que auxilia no processo de
ensino-aprendizagem. No próximo capítulo, compreenderemos a experiência
visual dos surdos, assim como a construção da sua identidade e visualizaremos
como trabalhar com as crianças surdas nas realidades culturais.

40
Capítulo 1 CONDIÇÕES DE ENSINO DE LIBRAS

REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis
nos 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às
pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece
normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas
portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/
D5296.htm. Acesso em: 27 jul. 2020.

BUJES, M. I. Descaminhos. In: COSTA, M. V. (Orgs). Caminhos Investigativos


II: outros modos de pensar e fazer pesquisa em educação. Rio de Janeiro:
DP&A, 2002. p. 11-33.

CAPOVILLA, F. C. Recursos para educação de crianças com necessidades


especiais e articulação entre educação especial e inclusiva. O Mundo da Saúde,
São Paulo, v. 32, n. 2, p. 208-214, abr./jun. 2008.

CHARTIER, R. A. História cultural entre práticas e representações. Lisboa:


Difel, 1990.

FICHTER, J. H. Definições para uso didático. In: FERNADES, F. Comunidade e


sociedade: leitura sobre problemas conceituais, metodológicos e de aplicação.
São Paulo: Nacional, EDUSP, 1973.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A,


2005.

PADDEN, C.; HUMPHRIES, T. Sharing a Culture. New York: WFD News, 1993.

REIS, F. A docência na educação superior: narrativas das diferenças políticas


de sujeitos surdos. Tese de Doutorado. Uberlândia: Universidade Federal de
Uberlândia, 2015.

REIS, F. Professor surdo: a política e a poética da transgressão pedagógica.


Dissertação de Mestrado. Florianópolis: UFSC, 2006.

WORTMANN, M. L. C. Dos riscos e ganhos de transitar nas fronteiras de


saberes. In: COSTA, M. V.; BUJES, M. I. E. (Orgs.) Caminhos Investigativos III:
riscos e possibilidades de pesquisar nas fronteiras. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.
p. 45-67.

41
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

42
C APÍTULO 2
A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO
INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Entender o jeito da experiência visual dos surdos.

 Conhecer a construção das identidades surdas.

 Compreender como trabalhar com as crianças surdas, observando seus


aspectos culturais.

 Perceber as diferenças nos espaços educacionais


DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

44
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Faremos uma leitura a respeito do ser surdo, mas em uma experiência visual,
em que há uma inclusão na identidade cultural e na Educação de Surdos.

A referência para esta discussão está em entender o ser e estar sendo


surdo e se encaixar nessa experiência visual. Na sua história cultural, as crianças
surdas e a comunidade surda dedicam-se à inserção das pessoas surdas nas
práticas sociais do dia a dia. No ano de 2011, a comunidade surda se mobilizou
em Brasília, juntamente à Federação Nacional de Educação e Integração de
Surdos (FENEIS), para lutar pelo direito das crianças surdas de estarem em
ambientes bilíngues, tanto nos espaços educacionais como nos sociais, e, a partir
disto, construir a Língua de Sinais, a identidade e a cultura da comunidade surda,
tanto na Educação Infantil como no Ensino Fundamental. Para tanto, é preciso
construir três identidades:

1) A criança surda ou a identidade negada.


2) A criança surda filha de adultos ouvintes ou identidade construída pela
normalização.
3) A criança surda filha de adultos surdos ou sujeito cultural da comunidade surda.

Caro acadêmico, convidamos você, nas próximas seções, a estudar e


compreender essas três identidades da comunidade surda. Bons estudos!

2 PRIMEIRA CONSTRUÇÃO DE
IDENTIDADE: “A CRIANÇA SURDA
OU A IDENTIDADE NEGADA”
Nesta primeira seção, conversaremos sobre a criança surda e a construção
da sua identidade. Para iniciar a nossa conversa, convidamos você, caro
acadêmico, a assistir ao documentário “Sou surdo e não sabia”.

Este documentário conta a história de Sandrine, uma menina surda de


nascença que é filha de pais ouvientes. Ao frequentar a escola, a menina começa
a questionar como os demais colegas compreendem o que a professora estava
ensinando. A partir disso, compreenderemos com Sandrine como uma criança
surda descobre que as crianças de sua sala se comunicam através de sons, e que
esses sons são produzidos pelo movimento dos lábios através das palavras. Esse
documentário olha para a questão a partir de dentro, pela perspectiva de Sandrine
e sua história verídica. Paralelamente ao relato da autonomia conquistada com a
45
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Língua de Sinais, o filme levanta a discussão sobre a conveniência do implante


coclear e da oralização de crianças surdas.

Depois de assistir a esse filme, podemos fazer uma relação entre ele, seu
título e o texto que leremos a respeito da identidade surda. É muito importante
refletir sobre as crianças surdas nos espaços educacionais, onde devem construir
a sua identidade. Vamos assistir a esse filme!

FIGURA 1 – CENA DO FILME “SOU SURDO E NÃO SABIA”

FONTE: <http://filmessurdez.blogspot.com/2011/02/sou-
surdo-e-nao-sabia.html>. Acesso em: 10 jul. 2020.

Assista ao filme acessando o link a seguir: https://www.youtube.


com/watch?v=Vw364_Oi4xc.

Viu como esse filme é bem interessante? Continuaremos a estudá-lo neste


capítulo. Depois refletiremos sobre o texto e sua relação com o filme.

Abade L’Épée foi o reponsável por espalhar a Língua de Sinais na Educação


de Surdos, na época de 1700. Até por volta do século XX, a Educação de Surdos
não dava a devida importância à criança surda ou representava sua identidade
surda e, em casos mais graves, chegava-se a negar a representação da criança
e da identidade surda. É difícil crer que essa ausência da identidade surda
ocorresse em virtude da incompetência ou da falta de construção de identidade.

46
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

É mais provável que não houvesse lugar para a criança surda nesse mundo, cuja
visão dos ouvintes predomina, em que não há muito espaço para que os surdos
adultos ajudem as crianças surdas a se construírem na sua identidade surda, e
não pela identidade negada às crianças surdas, bem como pela imposição de
uma tentativa de normalização perante a sociedade.

Você já imaginou como as pessoas surdas haviam chegado à adolescência,


ou talvez à idade adulta, sem ter aprendido uma língua de qualquer tipo que fosse?
Há um relato de um surdo francês, considerado um educador surdo pioneiro,
Jean Massieu, que não conheceu a língua de sinais até quase quatorze anos. O
próprio Massieu escreveu uma autobiografia, contando como viveu na fazenda
com oito irmãos e irmãs, dos quais cinco eram, como ele, surdos congênitos. Veja
um relato dele:

Até os treze anos e nove meses permaneci em casa sem receber educação
de espécie alguma. Eu era totalmente analfabeto. Expressava minhas ideias com
sinais e gestos manuais [...] os sinais que eu usava a fim de expressar minhas
ideias para a minha família eram muito diferentes dos sinais dos surdos-mudos
instruídos. As pessoas estranhas não nos compreendiam quando expressávamos
nossas ideias com sinais, mas os vizinhos, sim. [...] As crianças de minha idade
não queriam brincar comigo, desprezavam-me, eu era como um cão. Passava o
tempo sozinho, brincando de pião, com um bastão e uma bola ou andando com
pernas de pau (SACKS, 1990, p. 58-59).

Percebe-se que ele teve uma ausência de uma língua genuína (tipo de língua
primitiva, mas usava os sinais nativos, que ele e seus irmãos haviam criado,
o que constituía um sistema gestual complexo, mas quase sem gramática).
Prosseguindo com o relato de Massieu: “Eu via bois, cavalos, burros, porcos,
cães, gatos, verduras, casas, campos, vinhas e, depois de ver todas essas coisas,
recordava-me bem delas” (SACKS, 1990, p. 59).

O que impressiona ao ler o relato de Massieu, é que ele não tinha uma noção
de números. “Antes de minha educação eu não sabia como contar; meus dedos
ensinaram-me. Eu não conhecia os números; contava nos dedos e, quando a
contagem ultrapassava dez, fazia marcas num pedaço de pau” (SACKS, 1990, p.
59).

A descrição feita por ele é bem fascinante. Massieu começou a aprender


na língua de sinais, começou a entender a ideia de uma representação abstrata
e simbólica. Quando ele usava desenhos, o professor os substituía pela escrita.
“Assim que Massieu percebeu que um objeto ou uma imagem podia ser
representado por um nome, surgiu nele um apetite enorme e arrebatador por
nomes” (SACKS, 1990, p. 59).

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Quer conhecer um pouco mais sobre Jean Massieu? Acesse o


site a seguir:

https://prezi.com/e20wrlnnrei4/jean-massieu/.

FIGURA 2 – JEAN MASSIEU

FONTE: <https://peoplepill.com/people/jean-massieu/>. Acesso em: 27 jul. 2020.

O que acontece com as crianças surdas quando não têm acesso à linguística
desde o seu nascimento? Hoje em dia, quase 10% são filhas surdas de pais
surdos, expostas desde o início à língua de sinais, e se tornam usuárias nativas
dessa língua. As demais têm de viver num mundo auditivo-oral, mal-equipado
biológica, linguística e emocionalmente para lidar com elas, pois as crianças
surdas, em sua maioria, crescem como estranhas na própria família (SCHEIN,
1984). É fundamental a aquisição de uma língua numa idade no ínicio da vida
– essa primeira língua pode ser a de sinais ou a falada, pois é a língua, e não
qualquer língua específica, que desperta a competência linguística e, com isso,
também a competência intelectual.

48
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

Imaginaremos a existência da identidade surda nas crianças surdas, uma


construção dentro da sua subjetividade, identificando-se nos surdos adultos,
nos espaços educacionais onde há muitos surdos, no encontro surdo-surdo, no
contato da primeira língua da família surda, nas associações e outros lugares:
como construir a identidade surda pela criança surda?

• As crianças na escola de surdos encontram outras crianças surdas e têm


mais facilidade de construir sua identidade, sentem-se mais seguras,
sentem mais liberdade em comunicar-se, sentem-se mais livres para
expressar suas emoções, sua dimensão intelectual, suas produções,
sentem mais necessidade de contato e de compartilhar as ideias,
sentem-se mais alegres, podem sinalizar tudo o que quiserem, é algo
natural na sua subjetividade devido ao fato de sua língua natural ser a
Língua de Sinais.

O que fazer com as crianças surdas quando negam assumir sua identidade
surda?

• Deixar as crianças agirem naturalmente, mostrar a história contada


sobre os surdos, mostrar que outras crianças, as quais têm postura de
identidade surda, estão felizes, mostrar o teatro em Língua de Sinais,
onde os surdos têm seu orgulho e estão felizes, é importante mostrar
tudo que os surdos estão fazendo, o que estão produzindo em Língua
de Sinais. Por exemplo, usar uma fantasia de palhaço, comunicando-se
em Língua de Sinais, para estimular a valorização da identidade surda.
A identidade surda é basicamente construída com base na Língua de
Sinais, que utiliza como meio de expressão o corporal e o facial. Assim,
as crianças podem assumir-se e construir sua identidade surda, saindo
da escola orgulhosas e felizes. Caso contrário, as crianças surdas podem
se sentir confusas, não sabendo escolher entre a identidade surda ou
a identidade imposta pelos ouvintes, que querem normalizar os surdos,
negando sua identidade.

2.1 SEGUNDA CONSTRUÇÃO DE


IDENTIDADE: “A CRIANÇA SURDA
FILHA DE ADULTOS OUVINTES OU
IDENTIDADE CONSTRUÍDA PELA
NORMALIZAÇÃO”
É difícil imaginar a existência da criança surda isolada na sociedade,
49
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

vivendo a complexidade de entender o que é ser surdo no meio de uma família


de ouvintes, que não tem o conhecimento básico sobre a Educação de Surdos,
da sua aquisição de linguagem no ambiente linguístico e ao mesmo tempo na
escola inclusiva também, sempre sentindo-se escondida da sua identidade,
que não pode construir de uma forma natural, sem ter contato com os surdos, e
tendo que assumir uma identidade construída pela normalização, sem o conceito
cultural como uma identidade complexa, tornando-se uma pessoa “jogada e
abandonada”. Isso ocorre com frequência quando se adquire a linguagem dos
surdos tardiamente.

Como ocorre quando se tem um bebê surdo no meio de sons? Oliver Sacks
(1990, p. 75) explica:

Imagine um bebê surdo com pouca ou nenhuma percepção


dos sons. [...] Quando olha para um objeto ou evento, ele nada
recebe da mood music [aquela que se destina a transmitir
determinado estado de espírito ao ouvinte] que acompanha a
experiência social do bebê ouvinte. Suponha que ele olha para
um objeto de sua atenção e depois para um adulto que está
“compartilhando” a experiência com ele, e que o adulto fale
sobre o que o bebê acabou de ver. Será que o bebê pelo menos
chega a perceber que está ocorrendo uma comunicação? Para
descobrir as relações entre uma palavra e seu referente, o bebê
surdo tem de lembrar algo que acabou de observar e associar
essa lembrança a uma outra observação. [...] O bebê surdo
tem de fazer muito mais, “descobrindo” as relações entre duas
experiências visuais muitos diferentes que são deslocadas no
tempo.

Os filhos surdos de pais surdos têm uma boa chance de


escapar dessas dificuldades interativas, pois seus pais sabem
muito bem, por experiência própria, que toda comunicação,
toda brincadeira, todos os jogos precisam ser visuais e, em
especial, “a conversa de bebê” tem de passar para um modo
visual-gestual. Carol Erting e seus colegas apresentaram
recentemente primorosos exemplos das diferenças entre
pais surdos e ouvintes nesse contexto (ERTING; PREZIOSO;
HINES, 1989). De fato, uma orientação incomunemente visual,
ou hipervisual, pode ser observada nas crianças surdas quase
desde o nascimento; e é isso, tipicamente, que seus pais, se
forem surdos, reconhecem desde cedo. As crianças surdas
demonstram desde o ínicio uma organização diferente, que
requer (e exige) um tipo de resposta diferente. Pais ouvintes
com sensibilidade podem reconhecer isso em certa medida e
tornar-se, eles próprios, muito habilidosos em interação visual,
mas existe um limite para o que os pais ouvintes, por mais
amorosos que sejam, podem proporcionar; porque eles são,
por natureza, seres auditivos e não visuais. É preciso uma
interação adicional, totalmente visual, para que a criança surda
possa desenvolver sua própria identidade, especial e única – e
isso só pode ser proporcionado por um outro ser visual, uma
outra pessoa surda (SACKS, 1990, p. 94).

50
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

Para isso, é preciso tirar muitas dúvidas para os filhos surdos de pais
ouvintes, é preciso entender que a criança simplesmente é surda e trabalha mais
na visualidade. Quando surgem as angústias, sempre aparecem muitas perguntas
pelos pais ouvintes à procura de causa e significado: meu filho é surdo, e agora?
Por quê? Como? E se? Esses questionamentos e a falta de compreensão dessas
formas interrogativas parecem ominosas. O que podemos refletir sobre a visão
das crianças surdas?

As crianças surdas perderam muito pela falta de construção de uma


identidade surda com base na utilização da Língua de Sinais e confundiram-se
rapidamente com os surdos adultos quanto descobrem tarde quem são.

Como é a construção de identidade de normalização imposta pelos ouvintes,


ou seja, pela família?

• Clínica, é claro! É uma visão clínica de quem se preocupa apenas em


curar os ouvidos, fazer falar melhor, integrar melhor esta criança na
sociedade para igualá-la aos demais, para que haja “uma vida melhor
para os filhos surdos”. Preocupa-se em usar o avanço da tecnologia para
fazer a criança “ouvir melhor”, como o implante coclear, por exemplo.
Esta identidade normalizada é uma imposição dos ouvintes, os quais
não querem que seus filhos se integrem com as outras crianças surdas
por desconhecimento da Língua de Sinais, pensando que não tem o seu
valor linguístico.
• As crianças surdas construídas pela identidade normalizada dos ouvintes
não podem desenvolver adequadamente seu cognitivo usando a Língua
de Sinais no meio das crianças surdas. A desculpa é que assim podem
ter uma “vida melhor”. Vida melhor? Por que estão preocupados com
isso? Vida melhor para quem? Para a sociedade? Sentem vergonha da
identidade dela? Mesmo usando a Língua de Sinais também se pode ter
uma vida melhor, como nos casos dos surdos que cursam mestrados e
doutorados. Será que isso quer dizer que não têm uma vida melhor? Sim,
há uma vida melhor mesmo usando a Língua de Sinais. É com a cultura
surda que nossas crenças são alimentadas, que temos nossos valores,
nossos costumes, nosso grupo social, nossos aspectos culturais, nosso
ambiente linguístico em qualquer lugar onde os surdos estejam.
• As crianças surdas e o contato com as crianças ouvintes. É importante
integrar as crianças surdas, mas a maioria vive isolada, sozinha, sem
poder comunicar-se com os outros. Às vezes, há crianças ouvintes
usando a Língua de Sinais, mas não há a liberdade de tratar-se de igual
para igual. Como a cultura surda é diferente da cultura dos ouvintes, é
preciso levar em consideração que há uma forma de contar piadas no
jeito dos surdos, há teatro no jeito dos surdos, há contação de história

51
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

sobre os surdos em Língua de Sinais. Em virtude dessas diferenças,


quase nunca acontecem situações como as mencionadas anteriormente
na Educação Inclusiva. A preocupação é impor a Língua Portuguesa
como a segunda língua, mesmo não respeitando a primeira língua, que
é a prioridade dentro do ambiente linguístico. Por outro lado, existe um
sentimento superficial da criança surda, filha de adulto ouvinte, de [ser]
reduzida ao contexto de Língua de Sinais em seus primeiros anos de vida.
A família se diverte com a criança surda como um animal de estimação,
sem compartilhar seu ambiente linguístico, sem usar a Língua de Sinais
dentro da sua casa para ter a linguagem rica, comunicando-se com toda
facilidade, recebendo todas as informações da família ouvinte. O que
nos preocupa é a imposição da construção de identidade normalizada
dos ouvintes, o que pode prejudicar o seu aprendizado, a sua aquisição
de linguagem e a construção e compreensão de informações.

Vejamos uma narrativa surda desse estado de educação no qual se perde a


construção dos sujeitos surdos por meio de uma educação inclusiva imposta pela
família de ouvintes.

[...] A típica criança surda, que nasceu surda ou que ficou surda
antes de aprender o inglês, está completamente perdida no
banco da turma de ouvintes. O que diz o professor? Como lhe
posso tornar claros os meus pensamentos? O que posso fazer
para ser aceito pelas outras crianças? Está aqui alguém que
possa me explicar certas coisas depois das aulas? (LANE,
1992, p. 39).

Ainda sobre a expressão “reduzida à língua de sinais”, podemos dizer que


mesmo atualmente tem-se um pouco deste sentimento, principalmente quando
muitas escolas de inclusão trabalham com essa imposição, distorcendo a visão
das crianças surdas, transformando-as em um animalzinho, em alguém que tem
dificuldade de ler e escrever, rotulando-as de “um mimo”, “um nervoso”, “um
louco”, “que grita”, “um coitadinho”, e vendo a Língua de Sinais como muleta,
como suporte de comunicação. Isto é perceptível pela reação das crianças surdas
em ambientes onde não há a Língua de Sinais. Lá elas se sentem inferiores no
ambiente linguístico, por isso é importante a criação da Escola Bilíngue, para que
seu ambiente linguístico seja respeitado e para conviver de igual para igual.

Podemos concluir que, neste campo de Educação Inclusiva, essa identidade


da criança surda está definida pela não construção do sujeito cultural da
comunidade surda, que ocorre não por haver um grande afeto pelas crianças
surdas, filhos dos adultos ouvintes, ou porque na totalidade eram abandonadas
ou desprezadas, mas sim porque não havia consciência da particularidade da
criança surda, ou seja, não se distinguia a cultura surda.

52
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

1 Depois de ver o filme, o que você sentiu e entendeu sobre a


relação das crianças surdas a partir da sua identidade influenciada
pelos pais ouvintes?

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2 Por que os pais ouvintes querem ver as crianças surdas com


“normalização” e com melhor vida perante a sociedade, mesmo
não aceitando a sua identidade surda?

R.: ____________________________________________________
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________________________.

2.2 TERCEIRA CONSTRUÇÃO: “A


CRIANÇA SURDA FILHA DE ADULTOS
SURDOS OU SUJEITO CULTURAL DA
COMUNIDADE SURDA”
Podemos conhecer o livro de Paddy Ladd, “Em busca da surdidade 1:
colonização dos surdos” (2013), o qual ajuda muito a conhecer a cultura surda,
a partir das crianças surdas com os pais surdos, e de como vive a comunidade
surda e o jeito cultural dos surdos. Vamos estudar e discutir nesta seção que

53
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

é muito importante ampliar o conhecimento e também sentir na pele o que os


surdos estão querendo mostrar, como entendem, como vivem, enfim, a educação
que querem.

FIGURA 3 – CAPA DO LIVRO ‘EM BUSCA DA SURDIDADE’

FONTE: <http://www.porsinal.pt/index.
php?ps=biblioteca&idt=liv&cat=31&idbib=917>. Acesso em: 27 jul. 2020.

Esse livro representa um “guia turístico” pela cultura surda, partindo da


premissa de que as culturas surdas são contributos importantes para outras
disciplinas acadêmicas e para as vidas humanas em geral. Dentro e fora das
comunidades surdas existe a necessidade de descrever um novo conceito de
cultura surda, o que permite aos leitores avaliarem o seu lugar ao lado do trabalho
realizado no âmbito de outras culturas minoritárias e de discursos multilíngues.

Esse livro mostra a importância da confiança que vem de uma identidade


focada no surdo, a capacidade de debater e a informação sobre a vida diária do
surdo e a vida da maioria da sociedade são as pedras basilares da influência

54
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

trazida das famílias surdas para a vida da escola dos surdos. Da mesma forma,
as suas visitas à escola de Raymond foram também sintetizadas em linguagem
igualmente poderosa: “levou-me a respeitar os surdos como comunidade, uma
forma de vida, uma cultura, antes de conhecer estas palavras” (LADD, 2013, p.
112).

As crianças surdas, filhas de pais surdos, famílias surdas, nesse tempo,


eram o meio pelo qual o paradigma mais abrangente do povo surdo podia ter
trazido para as escolas aquelas influências externas absorvidas nas suas próprias
tradições alternativas. Isso era especialmente verdade nas famílias surdas em
que se tinham construído aquelas tradições, no meio das escolas ao longo de
gerações sucessivas. Não há espaço aqui para detalhar as experiências dessas
famílias surdas, mas muitas explicaram em pormenor o peso da responsabilidade
que a maioria sentia ou era dada pelos pais e pela comunidade da associação de
surdos, para incutir nos outros ideias sobre o povo surdo.

Conheça a história de uma família surda (pais surdos que têm


duas filhas surdas), a família FFFF (pais Francielle e Fabiano e filhas
Fiorella e Florence). Veja a página do Facebook e curta: “O Diário da
Fiorella”. Disponível em: https://www.facebook.com/odiariodafiorella/.

Veja outros vídeos no YouTube com a família surda. Disponível


em:

https://cutt.ly/BcJhuau.

As pequenas Fiorella e Florence encantam a todos que as acompanham em


sua página no Facebook. Criada por seus pais (os surdos Fabiano e Francielle),
“O Diário da Fiorella” mostra, por meio de vídeos, fotos e textos, as descobertas
dessa linda mocinha – também surda – nos seus primeiros meses de vida. Os
dentinhos que começam a surgir, a história narrada em sinais, os primeiros
balbucios manuais, o carinho daqueles que a cercam, o passeio no parque, a
imagem refletida em um espelho, a língua nas mãos dos adultos, a luz que se
acende, um pássaro. As coisas vão ganhando sentido para Fiore, enquanto o
mundo se engraça aos seus olhos. Quem acompanha a página se convence da
importância (e da imprescindibilidade) da aquisição da Libras para bebês surdos,
bem como da urgência de se garantir (para os muitos bebês surdos que ainda

55
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

virão) programas de estimulação precoce – Fiorella já frequenta a Escola Especial


Professor Alfredo Dub, em Pelotas. A segunda filha, Florence, segue os mesmos
passos da sua irmã Fiorella.

Assim como os pais surdos de duas filhas surdas têm de ser, em certo
sentido, “superpais”, também as crianças surdas precisam ser, ainda mais
obviamente, “supercrianças”. Desse modo, a Fiorella, aos cinco anos, já lia com
fluência e demonstrava uma verdadeira e espontânea paixão pela leitura, e nessa
idade estava começando a mergulhar no mundo bilíngue e bicultural, enquanto
a maioria das crianças surdas passa a vida inteira com uma só língua e uma só
cultura.

Tais diferenças podem ser positivas e criativas, podem enriquecer a natureza


e a cultura humana, no caso dos surdos, as capacidades especiais da visualidade
e da língua de sinais.

Podemos começar perguntando: quem é a criança surda de hoje? Quando


observamos nossas crianças surdas, podemos dizer que, apesar da sua
construção de identidade surda e cultural, existem os aspectos culturais que
podem ajudar a construir a identidade surda:

• A da criança surda pertencente a uma família surda, usuária natural em


Língua de Sinais, que nasce já construindo sua aquisição de linguagem
nessa língua.
• A da criança surda que participa da comunidade surda e, por isso, tem
a sua fluência em Língua de Sinais e assume ser surda envolvida na
comunidade surda e povo surdo.
• A da criança surda, nas grandes cidades, que acompanha os contatos,
como o encontro surdo-surdo, sempre acompanha os eventos culturais
dos surdos, nas escolas de surdos, nas associações, nas casas de
surdos e festas comemorativas relacionadas aos dias de surdos.
• A da criança surda que ajuda o pai surdo ou a mãe surda a se relacionar
com a sociedade devido à tecnologia atual, isso é muito interessante!

Todas as crianças surdas, porém, precisam ter suas situações de construção


de sujeito cultural, condições de contato natural, tempo de escolarização, de
brincadeiras com as outras crianças surdas, que ajudam a desenvolver sua
própria língua, que possa ser valorizada e rica como a experiência visual. É
fundamental que tenhamos consciência desses aspectos culturais para que
saibamos conhecer melhor as crianças com quem convivemos e com quem, como
educadores, temos responsabilidade de ser firmes na sua construção cultural e
identidade surda.

56
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

A etapa histórica que as crianças surdas vivem na experiência visual, marcada


pela construção cultural e por mudanças de transformação visando à Educação
de Surdos e à educação bilíngue para surdos, apresenta o currículo cultural
que aceita o jeito dos surdos, que ensina para as crianças surdas na Educação
Infantil e Ensino Fundamental, que dá um salto nessa construção dentro de um
espaço cultural que se apresenta como uma forma de nos mantermos como
diferentes, além de melhor visualizar as mudanças pós-modernas no sentido de
compreender a criança surda como sujeito cultural e, portanto, um sujeito com
direitos linguísticos.

1 Escreva um texto sobre a importância da cultura surda e como as


crianças surdas podem se envolver na cultura surda.

R.: __________________________________________________
__________________________________________________
__________________________________________________
__________________________________________________
__________________________________________________
_________________________________________________
_________________________________________________
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_________________________________________________
_________________________.

2 Tente conversar com algum professor dos anos iniciais do Ensino


Fundamental e verifique o que ele sabe sobre o ensino bilíngue
para as crianças surdas.

R.: ____________________________________________________
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____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
_____________________________.

57
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

3 FUNÇÃO DOS ESPAÇOS


EDUCACIONAIS DE EDUCAÇÃO
INFANTIL: EDUCAR E IDENTIFICAR A
CULTURA SURDA
A partir desses conceitos de criança surda, perguntamos: qual seria, então, a
função dos espaços educacionais de Educação Infantil? A que eles se propõem?
Quem nos ajudará a responder a estas questões é a pesquisadora Gladis Perlin,
identificando sobre o seu ser surdo, vinculando essa experiência surda e cultura
surda por meio do texto a seguir.

A EXPERIÊNCIA DO SER SURDO

A colocação de Juan Eugenio é uma oportunidade para o


contato referente ao objeto final de interesse: ser surdo.

Ser surdo, na experiência, implica uma resposta àqueles que se


refugiam comodamente sob a palavra deficiência e a nomeiam em
sua epistemologia. Equivale a uma recusa a ser na diversidade, um
assumir a diferença.

O ENSINO DE LIBRAS

FONTE: Perlin (2003, p. 93)

Diga que queremos o direito de ser reconhecidos surdos como


somos, com este jeito, com este idioma, e queremos ser atores da
política surda também.

58
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

As identidades essenciais, imanentes aos surdos, mostram


narrativas constantes e idênticas a de Juan Eugenio. Nas pesquisas,
encontramos narrativas bastante enfatizantes da intenção de
desvendar a experiência referente a estas identidades orientadas no
sentido de ser surdo. Igualmente, o produto nestas pesquisas que,
em sua maioria, devem fazer-se presentes, identifica os aspectos da
experiência. Inclusive exibe o conceito “surdos” como um conceito
fluído no qual a epistemologia esgota o conhecimento presente
na experiência e no jeito de ser do povo surdo (sem deixar que
hibridismos fiquem à margem) e não mais o conceito da cura, da
incapacidade, da invalidez. Não mais o conceito de ser surdo falante
ou não falante, mas exclusivamente com sua língua e linguagem
próprias e que pode optar ou não por utilizar-se da fala ou da Língua
Portuguesa para intermediar o intercâmbio cultural na fronteira.

O que propõe a experiência? Larrosa (2000) acentua a


experiência do ser como algo que nos passa ou o que nos acontece
ou o que nos toca. No surdo, a experiência é algo que nos passa,
fica e que passa a ser parte de nós depois de termos experienciado.
A experiência fica, mas a informação que leva à experiência se
esvai, como diz o mesmo autor: a informação não faz outra coisa
que cancelar nossas possibilidades de experiências.

A incursão pela pesquisa enfatiza o momento em que sentimos


aproximar mais e mais os níveis de compreensão do ser e do
estar sendo surdo ou o conceito de ser surdo e estar sendo surdo.
Se perguntarmos aos surdos: o que é ser surdo? Entre as muitas
narrativas, temos resposta: ser surdo é uma questão de vida. Não
se trata de uma deficiência, mas de uma experiência que nos toca
(MW). Um fazer político que envolve a diferença. Experiência de ser
surdo ou experiência visual significa mais que a utilização da visão
como meio de comunicação. Desta experiência visual surge a cultura
surda, representada pela Língua de Sinais, pelo modo diferente de
ser, de ser povo surdo, de se expressar, de conhecer o mundo, de
entrar nas artes, no conhecimento cientifico e acadêmico. A cultura
surda comporta a Língua de Sinais, a necessidade do intérprete, de
tecnologia de leitura.

ESTAR SENDO SURDO E O OUTRO SURDO

A preocupação de Juan Eugenio com o seu outro semelhante


está transparecendo de forma a que ele se sinta responsável pelo
outro, pelo povo. E daí? O advento da nova linguagem, do memorável

59
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

do outro, da surpreendente juventude com que o surdo se ocupa com


o outro surdo, toca sobremaneira e não pode ser deixado ao acaso.
Por estas ideias de individuação, Levinas (2000, p. 80) chama a
atenção para as interativas com o processo: “Desde o momento que
o outro me olha, eu sou responsável por ele, sem nem sequer ter que
tomar responsabilidades com relação a ele; sua responsabilidade me
incumbe para que eu vá mais além”.

Este ir mais além entre os surdos se apresenta permeado de


significações. O que preocupa o surdo em relação ao outro surdo,
o que o preocupa com esta responsabilidade? O que faz do surdo
um agente responsável pelo rosto do outro surdo? O que o coloca
aí com tanto interesse pelo outro surdo? Voltar a pensar a questão
de relação de alteridade surda e a dependência ou responsabilidade
pelo outro surdo para espelhar-se? Completamente, estamos diante
de uma responsabilidade com o outro, responsabilidade que não é
baseada na vitimação e no sofrimento, no voltar-se contra a opressão
colonialista, na responsabilidade para que ele seja o outro surdo,
uma força moral, uma resistência. Um firmar-se como surdo; uma
agência rearticulando o ser surdo e repelindo o estereótipo. Vejamos
a narrativa surda:

Eles [ouvintes] determinaram que um grupo de crianças


surdas fosse enviada para outra escola. Por quê?
Porque para eles, ouvintes, estas crianças surdas são
muito difíceis. Claro que elas são e serão difíceis, elas
estão iniciando na escola, começando a conhecer
o mundo, e a sua sagacidade na desbravação é tão
intensa que elas se tornam hiperativas. Com um pouco
de paciência teríamos controlado a situação. O lugar
daqueles surdos era naquela escola, eu sou professora
lá e sei que eles precisam de tempo para se adaptar.
Se eles são tão rebeldes, precisamos saber que eu
também fui, mas que os tempos são outros. Importa
saber dialogar com estas crianças, mesmo que seja um
caso muito difícil (R.).

[...] A linguagem que entende o outro surdo está com o surdo na


sua experiência semelhante, na sua tensão de responsabilidade pelo
outro. Uma responsabilidade que admite a diferença e a alteridade,
inclusive admite epifania.

PASSAR PELA EXPERIÊNCIA DE SER SURDO

A experiência de ser surdo designa um passar a ser o “outro”.


Skliar (2002), em uma palestra, diz que a experiência é vista como

60
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

uma questão muito banalizada, pouco sublinhada e apresentada


como uma hipótese que já está quase pronta. A experiência surda
é muito mais que algo pronto, traduz-se como uma orientação, um
trabalho, uma ação para a liberação do jeito de ser surdo.

Os surdos nascem num povo de ouvintes e se transformam em


surdos. A experiência é este processo que nos passa e leva a ser
o outro surdo (LARROSA, 2002). Tudo parte de uma reflexão geral
sobre o que o termo surdo dá a entender. Ser surdo, numa palavra,
parece simplesmente se desenrolar. Então, parece que o que define
o processo de ser surdo não especifica por tempo de formação, de
transformação, mas o ato de estar sendo surdo agora, mas existe
o ato de transformação que se desenrola continuamente numa
temporalidade, a partir da experienciação do estar sendo surdo. O
surdo trabalha sua transformação em surdo, é a experiência que ele
está vivenciando. Essa agência experiencial tem três aspectos, como
citados por Skliar (2002):

• A experiência que o surdo faz no contato com a essência que


está no outro surdo. É um ato de ir construindo a identidade,
ato que permite novamente colocar a questão não resolvida das
identidades nunca prontas, fragmentadas, em contínua construção,
em uma temporalidade do deslocamento cultural.
• A experiência no ato do surdo de dar sua experiência, do estar
sendo surdo ao outro surdo. Novamente entra a pretensão das
identidades em questão de dependência, que tem necessidade do
outro semelhante.
• A experiência que simplesmente se transforma em resistência. Ela
vai além da resistência e transforma em pretensão a sua pureza
de origem, reposicionando as identidades transculturais. Uma
experiência que evidencia que somos multiformes plurais, visto que
acontecem inclusive outras trocas, como no caso de hibridismos.

Este aspecto permite entrever o conteúdo do nosso ser surdo,


nossa própria experiência como surdos. Tem a ver com o pessoal,
com a individualidade ou experiência de quem vai assumir ou
assumiu o outro ser surdo. Protagoniza sobre a experiência de quem
é surdo e está sendo surdo nesse tempo de formação. Manifesta-se
na passagem para o programa: vir a ser surdo. É a nossa experiência
pela maioria do povo surdo, mas digamos que o problema da
experiência formatação do ser surdo é essa experiência: é só a
experiência vivida, ela se refere à experiência dos outros surdos,
que tem a ver com essa responsabilidade ética de um povo, com a

61
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

política, com o intercâmbio com a outra cultura. Neste contexto de


experiência de si, Larrosa (1994, p. 43) diz mais:

(A) própria experiência de si não é senão o resultado de


um complexo processo histórico de fabricação, no qual
se entrecruzam os discursos que definem a verdade
do sujeito, as práticas que regulam seu comportamento
e as formas de subjetividade nas quais se constitui sua
própria interioridade. É a própria experiência de si que
se constitui historicamente como aquilo que pode e
deve ser pensado. A experiência de si, historicamente
constituída, é aquilo a respeito do qual o sujeito oferece
seu próprio ser quando se observa, se decifra, se
interpreta, se descreve, se julga, se narra, se domina,
quando faz determinadas coisas consigo mesmo etc.

Skliar (2002) dá ênfase a essas duas experiências: a experiência


vivida e a experiência pensada. Deduzindo de sua reflexão,
percebemos que as formas de viver a experiência surgem de dentro
e como a diferença entre ambas delineia os fatos. Assim, temos a
experiência que é vivida, o ser surdo que o inclui com sua diferença,
seu dia a dia. A experiência que é pensada e que se refere aos
líderes, ativistas, militantes surdos, os mais adentrados na cultura
surda, que implicam as experiências vividas.

COMUNICAÇÃO EM LIBRAS

FONTE: Perlin (2003, p. 101)

Aquilo que estava no outro surdo era o igual que eu queria, tinha
a comunicação que eu queria, o que era dele era meu também.

A experiência supõe uma transformação e não uma estatização


em vista do ser. Ela concebe a produção do sujeito, as articulações
da diferença, a constituição da alteridade e da identidade. Sendo
experiência, propõe o deslocamento contínuo do estar sendo surdo.
Como movimento, hospeda as projeções do estar sendo e do dever.
A experiência vivida, aquela da maioria dos surdos, a experiência
pensada se torna mais centrada nesta troca com o outro, neste ato

62
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

de ser com a responsabilidade ético/cultural de um povo.

O ser e o estar sendo surdo se constituem como identidade,


como diferença, como alteridade no interior das representações
surdas. A experiência de ser surdo nasce não entre ouvintes, mas
entre surdos. Segundo Woodward (2000, p. 55), “as posições que
assumimos e com as quais nos identificamos constituem nossa
identidade”, foi no sentido da experiência de identificação, de
ser. Eu sou o outro no sentido de que há outro semelhante, não
um modelo no sentido único, mas na identificação com outros
semelhantes, uma vez que estes outros também se identificam com
outros semelhantes. Para Woodward (2000), são posições, múltiplas
referências que constituem nosso ser surdo. Estas posições onde
nasce a experiência do ser surdo podem ser os amigos surdos, o
professor surdo, os colegas surdos. É como dizia aquele sujeito
altivo na defesa de sua diferença surda: “Devo a meu tio surdo
minha percepção de ser diferente. Ele se escondia de mim porque
há tendência da cópia, uma certa carência de ser, de identificação”.

FONTE: PERLIN, G. T. T. O ser e o estar sendo surdos:


alteridade, diferença e identidade. Projeto de qualificação (Doutorado
em Educação). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), 2003. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/bitstream/
handle/10183/5880/000521539.pdf. Acesso em: 27 jul. 2020.

Vê-se na leitura da pesquisadora surda, Gladis Perlin, a importância da


experiência do seu ser surdo, de como identificar-se na cultura surda. O que
podemos refletir é que muitos surdos conseguem recordar seu choque inicial
quando perceberam de fato que havia outras pessoas que levavam as suas
vidas numa língua completamente diferente. O que pode acontecer, às vezes, é
que esse egocentrismo, decorrido em nome do nosso interesse mútuo, consiga
superar a dificuldade da conscientização social como tal da criança surda, em
conjunto com a vitória sobre o egocentrismo, aceitando a sua experiência de ser
surdo perante a sociedade, mostrando a importância dessa cultura surda ser
reconhecida em sua língua natural e que essa língua possa ser ensinada.

63
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

1 Depois de entender como é a experiência do ser surdo, será


que os ouvintes podem continuar a diminuir o poder dos
líderes surdos em diversas áreas que para eles são as mais
importantes? Por exemplo: pensando que nós surdos queremos
uma escola bilíngue para surdos enquanto os líderes ouvintes
continuam pensando que somos segregados. Como fica essa
situação? Quais são os valores, os costumes, as formas de arte,
as tradições, as organizações interdependentes e a língua que
caracterizam a cultura?

R.: ____________________________________________________
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__________________________________________________.

4 POLÍTICA SURDA: A IDENTIDADE


SURDA
A “subjetividade do professor surdo, quando presente com toda a sua força,
gera uma política, a política da identidade surda, que hoje faz transparecer essa
cultura suavemente rica, particularmente com a presença de língua própria, um
de seus pontos mais fortes” (PERLIN, 2004, p. 81). A partir do momento que

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Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

nós, professores surdos, fazemos rompimento com a modernidade, seguindo os


exemplos de sujeitos surdos e seus múltiplos jeitos de ser professor surdo dentro
do processo histórico, mostrando a maneira de seu jeito de viver no momento da
modernidade do pós-estruturalismo, acontece uma desconstrução para uma nova
construção de ser professor surdo nos espaços educacionais.

Essa luta permite o desenvolvimento político dos professores surdos quando


em sua forma de ser professor surdo e estar sendo no mundo nos espaços
educacionais, inclusive, na Educação Superior. Vejamos a narrativa de uma
professora surda, que traz a questão de identidade:

[...] eu tenho procurado a minha identidade e é algo que muitas


vezes eu tenho explicado para as pessoas. Não estou em
busca de apresentar uma identidade ouvinte, mas apresento
a minha identidade enquanto “ser surda” e todos os elementos
que me constituem, que eu sou, surda profunda, e as diversas
outras variáveis que me constituem (Atena, 2014) (REIS,
2015, p. 132).

Fazendo as suas narrativas para que ele chegue não como uma construção
de identidade unificada, mas diferentemente dos ouvintes, como a cultura visual
e diferenciada e a Língua de Sinais Brasileira, que é a nossa língua. Somos
professores surdos e eles são professores ouvintes, e esta é a nossa identidade
diferenciada, como afirma Atena (2014):

Eu mostro a língua de sinais, a escrita que utilizo, que é uma


escrita interlíngua, diferente daquela de um falante nativo, mas
sempre tenho procurado transitar nos dois usos, o da língua
de sinais, e às vezes da oralidade também, porque às vezes
nesse contexto eles precisam acompanhar dessa forma. Então
o que tenho procurado mostrar para ouvintes nesse contexto
é o meu “ser surdo”, a minha identidade (REIS, 2015, p. 133).

Estas narrativas apresentadas pela professora surda são as narrativas e


práticas de uma descontrução de identidades unificadas na Educação Superior
e reconhecidas aos professores surdos, em seus aspectos elementares, como
desconstituição de identidades unificadas. É uma produção de estratégias
das relações de poder quanto à implantação dos professores surdos, de uma
produção exercida por meio da política e compreender que a identidade surda e a
identidade ouvinte dos professores não são as mesmas e são bases que usamos
para sermos professores surdos.

Compreender a narrativa dos professores surdos na Educação Superior, às


vezes a força de poder demonstra a inquietação já com vivências da alteridade,
na diferença e na identidade na Educação Superior, como afirma outra professora
surda: “O professor surdo precisa ter a sua subjetividade, sua identidade surda

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

forte, pois ao usar a língua de sinais ele demonstra o seu poder” (Afrodite 2014)
(REIS, 2015, p. 133).

Grossberg (1997) explica que as lutas pela identidade não mais envolvem
questões de distorção ou adequação, mas lutas de representação e de cuidado
de si, de produção de identidades adotadas pelas práticas de representação.

Estes espaços tendem a enfraquecer nossa cultura. Não podemos nos


comprometer com as identidades unificadas citadas por Joan Scott (1995), pois
são identidades que se unificam em torno de um eu presente, um eu modelo.
Com essa identidade não temos possibilidade de mostrar a nossa questão de
força e de poder como identidade surda sendo diferente, que já tem uma base
cultural envolvendo a Língua de Sinais Brasileira. Como ficamos na Educação
Superior? O que fazer com estas identidades unificadas?

No momento da luta liberatória, o povo argelino destrói as


continuidades e constâncias da tradição nacionalista que
fornecem uma salvaguarda contra a imposição cultural
colonial. Eles estão livres agora para negociar e traduzir
suas identidades culturais na temporalidade descontínua,
intertextual, da diferença cultural (BHABHA, 1998, p. 68 apud
REIS, 2015, p. 134).

Partindo disto, estamos rompendo com a tradição de ser politicamente


ouvinte e trazendo o nosso jeito de ser, que fornece uma salvaguarda contra
a imposição cultural colonial existente na Educação Superior, fazendo emergir
nossa cultura e a referida identidade cultural, enfrentando espaços de negociação.

5 POLÍTICA SURDA: EM BUSCA DA


CULTURA SURDA
Como fazer compreender as narrativas dos professores surdos a quem já
foram exigidas as necessidades culturais universais nos espaços educacionais?
Há uma narrativa em que um professor surdo é provocado a usar a visão cultural
como universal nos espaços educacionais. Uma narrativa de uma professora
surda mostra a visão do espaço cultural como universal:

Eu me recordo, por exemplo, da criação do curso de letras/


libras a distância, em que nós tinhamos que negociar e justificar
a necessidade de bolsas para os coordenadores de polo,
verbas para material, o ambiente virtual de aprendizagem,
a necessidade do uso de imagens e vídeos e muitas vezes
argumentavam pela necessidade de som, do registro de voz e

66
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

nós tinhamos que explicar que isso era desnecessário para a


nossa realidade, que a necessidade dos surdos era diferente
da dos ouvintes, então foi algo que demandou inúmeras
explicações, orientações, convencimento, não só para a não
necessidade desses elementos, mas para a necessidade
de adaptações específicas para a realidade da produção de
materiais para surdos, como iluminação adequada, claridade
nas imagens etc. Levou alguns anos até que a equipe
entendesse essa necessidade de adequação à cultura surda
a partir das nossas argumentações, depois disso a própria
equipe já sabia como proceder, de forma que a produção
técnica se adequasse à realidade surda, mas foi algo que
demandou um trabalho de conscientização de anos, não foi
rápido. Então, isso é algo importante que precisa ser explanado
por nós. Não podemos desconsiderar que há questões de
custos também que estão relacionadas aí. Porque surgiam
questões sobre a necessidade de se gastar com produção de
símbolos, imagens, por exemplo, com o símbolo que tivemos
que fazer para o curso de letras/libras, com a escrita de língua
de sinais. Nós tinhamos que justificar esses gastos a partir das
necessidades da cultura surda. Adequações, como aumento
da imagem dos sinais e diminuição da imagem de textos,
nos vídeos para surdos, por exemplo, questões nesse caso
relacionadas ao status do português como segunda língua e
a língua de sinais como primeira língua para surdos, tudo isso
demandou um longo processo de negociação (Deméter, 2014)
(REIS, 2015, p. 135).

Esse discurso mostra que a dificuldade não ocorre apenas em decorrência


de relações de poder, mas sim, pelo quanto é recente a entrada de surdos na
Educação Superior, em muitas situações, é puro desconhecimento. Essa
professora surda foi apresentando o trabalho até que se entendesse essa
necessidade de adequação à cultura surda, dependendo das argumentações
dos professores surdos na Educação Superior, por exemplo, uma negociação ao
INEP sobre os gastos culturais e adequações aos surdos.

FIGURA 4 – UM EXEMPLO DE VÍDEO PARA SURDOS,


A PARTIR DA SUA NEGOCIAÇÃO AO INEP

FONTE: <https://cutt.ly/YcJlEAj>. Acesso em: 29 jul. 2020.

67
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Na perspectiva da visão cultural universal, os termos do politicamente correto


causam mal-estar por se referirem aos diferentes atributos culturais. Ela se refere
aos gastos culturais, no entanto, percebe-se essa situação com os gastos com
materiais de ouvintes? Temos que interferir que os ouvintes abandonaram a
cultura visual. Nós surdos a utilizamos como imprescindível, os ouvintes não a
desenvolveram. Deve-se considerar que as questões culturais entram em cena.
Entretanto, é preciso distinguir a cultura visual e a cultura dos surdos, pois ambas
são constituídas de signos e significados visuais.

A cultura visual, um dos tópicos da política do professor surdo na Educação


Superior, emergiu no final dos anos 1980, principalmente entre estudiosos da
história da arte. Como cultura, direciona-se aos estudos constitutivos da história
da arte, dos espaços sociais digitais, estudos cinematográficos, além dos estudos
do campo da linguística e da literatura. Mais precisamente se refere aos estudos
de educação visual, leitura das artes, entre outros. Alguns anos antes a cultura
surda se constituiu científica. Em 1960, Stokoe provou a cientificidade da cultura
surda em sua tese sobre as Línguas de Sinais (LADD, 2003).

FIGURA 5 – A CIENTIFICIDADE DA CULTURA SURDA SOBRE A LÍNGUA DE SINAIS

FONTE: <http://www.terceironome.com.br/antropologia/
surdos1.html#>. Acesso em: 29 jul. 2020.

68
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

Para Hernández (2007, p. 22), “a cultura visual converge em termos


de práticas culturais relacionadas ao olhar e às maneiras de olhar a vida”. Os
estudos da cultura visual indicam que ao realizarmos a leitura de significados
visuais, realizamos também sua representação. Já para Hall (1987, p. 25 apud
HERNÁNDEZ, 2007, p. 22), ao realizarmos a leitura das coisas, construiremos
os seus sentidos e significados. “[...] nós construímos o sentido usando sistemas
de representação – conceitos e sinais”. Portanto, a representação que fazemos
das coisas reflete na produção de sentido, e usamos signos que dão sentido às
narrativas sobre as coisas. Estas narrativas não são somente produzidas a partir
dos signos e significados do som, mas também a partir dos signos e significados
visuais.

Uma professora surda codificou um tempo de entendimento destes


significados visuais. Perguntamos, então: em que a cultura ouvinte rejeitou
a cultura visual e qual a sua importância para a aquisição do conhecimento?
Questionamos por que a Educação Superior deixou de fora este aspecto e hoje
nos joga gastos? O que tem de ser feito no sentido de reativar esta cultura?

É possível deduzir que a cultura visual usada pelo ouvinte lhe é de importância
máxima para o acesso de conhecimento, embora muito pouco reconhecida e
apreciada. Já a cultura dos surdos é constituída com signos visuais especifícos.
Não é necessário dar uma descrição da cultura surda em sua essência, como
pura ou unificada, falamos de uma cultura surda composta de signos culturais
contemporâneos surdos e em crescente reinscrição. Ela é acrescida daqueles
signos e significados culturais constituídos pelos agentes que a compõem, no
caso, os surdos.

Bhabha (1998, p. 73) analisa a pergunta de Fanon sobre “o que quer o


homem negro?”, e explica: “não há uma narrativa mestra ou perspectiva realista
que forneça um repertório de fatos sociais e históricos”. O rechaço cultural da
cultura visual obriga a resistências e enfrentamentos nos espaços de negociação.
As políticas adotadas pelos surdos cumprem um objetivo oportuno e estratégico,
e se nos posicionarmos em lógicas que vislumbram e aceitam apenas uma forma
de conceber os fatos, as situações e as relações, provavelmente estaremos
vivendo numa perigosa aventura de pensar um limite ou em algo fixo.

Dentro da sala de aula a atuação pedagógica já está diretamente


ligada à cultura surda porque aparece aí a didática visual, há o
uso de língua de sinais, as atividades são em língua de sinais,
[...] a prática é em língua de sinais, então dentro da sala de
aula a cultura surda está presente no espaço pedagógico. Fora
da sala de aula, a exigência pela língua de sinais é que pede
o olhar para a cultura surda (Apolo, 2014 (REIS, 2015, p. 137).

69
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

FIGURA 6 – LÍNGUA DE SINAIS NA SALA DE AULA

FONTE: <https://cutt.ly/WcJzyxK>. Acesso em: 29 jul. 2020.

Para os professores surdos na Educação Superior, cultura visual surda já


está na sala de aula, usa instrumentos diferenciados e necessários, portanto, não
há retorno e o pensamento político está fixado, resistente e atuante. Essa força de
poder se constitui em algo importante, principalmente pela visão da cultura como
visual e não somente auditiva.

Para finalizar a contextualização sobre a cultura surda na comunidade surda,


é importante conceituar o que é “cultura surda”.

Cultura surda: este termo foi desenvolvido na década de


1990 para dar expressão à crença de que as comunidades surdas
possuíam os seus próprios modos de vida mediados através das suas
línguas de sinais. A crença na precisão existencial desta terminologia
ultrapassou largamente a investigação sobre ela, deixando os seus
utilizadores vulneráveis, quando eram chamados a explicar ou a
defender os seus príncipios. A falta de investigação também tornou
difícil a aceitação de normas e valores culturais em vários domínios
importantes, como a educação de surdos. No entanto, não se pode
nem dizer que a importante tarefa de compreender as comunidades
surdas já começou, enquanto a investigação cultural dos surdos
ainda não está reconhecida e nem é financiada (LADD, 2003).

70
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

FIGURA 7 – COMUNIDADE SURDA PEDE RESPEITO À


NOSSA LÍNGUA DE SINAIS E CULTURA SURDA

FONTE: <https://proincluir.org/surdez/cultura-surda/>. Acesso em: 29 jul. 2020.

1 Escreva sobre a concepção política da identidade surda e quais


identidades você identifica com seus amigos surdos:

R.: ____________________________________________________
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2 O conceito de ser surdo e estar sendo surdo te provocou uma

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

reflexão? Qual é a importância de uma visão sobre o grupo social


de ser surdo?

R.: ____________________________________________________
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3 O que pensam os pedagogos surdos que buscam uma pedagogia


fundamentada na identidade cultural que foi chamada de
“Pedagogia da Diferença”?

R.: ____________________________________________________
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6 PRESENÇA E RECONHECIMENTO
DA CULTURA SURDA NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR
Então, comece a refletir: que tipo de presença de reconhecimento é
este para se colocar a questão de cultura surda na Educação Superior? Essa
presença e reconhecimento da cultura surda são sempre complexos. Eles têm
a sua especificidade histórica; e embora sempre exponham semelhanças e

72
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

continuidades com outros momentos dos professores surdos, nunca aparecem


ao mesmo tempo. A semelhança com o que é diferente define não somente a
especificidade do momento, mas também a especificidade da questão e, portanto,
as estratégias políticas culturais com as quais tentamos interferir na Educação
Superior, bem como a forma que precisamos acompanhar as narrativas dos
professores surdos. Entendemos a cultura, de forma geral:

Já que a nossa maneira de ver as coisas é literalmente a nossa


maneira de viver, o processo de comunicação, de fato, é o
processo de comunhão: o compartilhamento de significados
comuns e daí, os propósitos e atividades comuns; a oferta,
recepção e comparação de novos significados, que levam a
tensões, ao crescimento e à mudança (WILLIAMS, 1965, p. 55).

Prosseguindo, aproximando com a enfatização da cultura que se refere às


práticas:

Se a arte é parte da sociedade, não existe unidade sólida fora


dela, para qual nós concedemos prioridade pela forma de
nosso questionamento. A arte existe aí como uma atividade,
com a produção, o comércio, a política, a criação de filhos.
Para estudar as relações adequadamente, precisamos
estudá-las ativamente, vendo todas as atividades como
formas particulares e contemporâneas de energia humana
(WILLIAMS, 1965, p. 61).

Já podemos entender que a cultura surda é um modo de vida global, a


questão do quê e como ela é estudada se resolve por si mesma, podem ser
descobertas como reveladoras de si mesmas, dentro de identidades, uma tentativa
de descobrir a natureza dos professores surdos que formam o complexo desses
relacionamentos, é assim que entenderemos como as inter-relações de todas
as práticas dos professores surdos são vividas e experimentadas, enfatizando a
cultura surda na Educação Superior.

Dessa forma, as narrativas dos professores surdos mostram como seria o


meio para proporcionar a negociação, e a interação seria a meditação de conflitos,
já que nela se estaria reconhecendo a nossa cultura surda, pois em todo o
processo existem indíviduos surdos inseridos em grupos sociais que constituíram
uma história cultural.

As falas dos professores surdos narram como eles negociam, ou seja,


como eles enxergam o papel dos professores surdos como sendo aquele que
coloca em diálogo a cultura surda com a dos ouvintes, e também há a presença
da enfatização da cultura surda na Educação Superior com o ingresso dos
professores na universidade.

73
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

7 ENFATIZAÇÃO DA CULTURA SURDA

Prosseguindo nesse caminho da Educação Superior, porque os professores


surdos também o seguiram, e se entendermos a complexidade da cultura surda
na Educação Superior, vemos que:

A cultura surda traz em si elementos importantes que se


identificam, a constituem e a colocam no rol das diferentes
culturas que perfazem o panorama das posições da
modernidade tardia. Os espaços das culturas são regidos
por poderosas tramas de poder. Cada cultura é em si mesma
autoridade. Uma cultura difere da outra pelo enunciado, pelas
tramas de poder e pelas narrativas que a constituem (PERLIN,
2006, p. 138).

Com a enfatização da cultura surda, gostaríamos de apresentar algumas


narrativas de professores surdos, que tornam o momento presente uma reflexão
para a questão da cultura surda na Educação Superior.

A narrativa de uma professora surda mostra o seu posicionamento quanto à


cultura surda na Educação Superior:

É muito importante o meu reflexo da cultura surda porque


a minha vida faz parte da cultura surda, eu sou usuária de
língua de sinais, tenho uma cultura visual. Eu mostro a minha
cultura surda e demonstro o seu valor, porque tem pessoas
que pensam que todas as culturas são iguais, mas não, elas
diferem uma das outras, precisamos mostrar que há diferentes
representações nos diversos grupos sociais. Eu tenho e
vivencio a cultura surda. Se não existisse ou se eu não tivesse
a cultura surda eu teria baixa autoestima, como eu conseguiria
viver? Por isso no meu ambiente laboral eu preciso mostrá-la
(Afrodite, 2014) (REIS, 2015, p. 181).

Essa professora surda produziu sua narrativa com sua relação usuária em
Língua Brasileira de Sinais e com o conhecimento da cultura visual na Educação
Superior, porém, a Libras é algo que se faz na produção da cultura, para ela, é
criar, simbolizar e fazer circular sentido, é um processo de interação na Educação
Superior.

Também há outra professora surda levantando dúvidas sobre os professores


surdos que têm trabalhado para apresentar a cultura surda na Educação Superior:

Eu não sei exatamente qual o número de professores surdos


inseridos nos espaços universitários hoje e de que forma
esses professores têm trabalhado para apresentar a cultura
surda nesses contextos, porque nós sabemos que há surdos
que reproduzem elementos da cultura ouvinte na sua atuação
(Atena, 2014) (REIS, 2015, p. 181).

74
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

Prosseguindo com a narrativa de uma professora surda no que se refere ao


seu contexto com relação ao seu lugar:

Só posso te falar com relação ao meu contexto, o do Rio


de Janeiro, em que tenho visto uma presença forte dos
professores surdos, como no Instituto Nacional de Educação
de Surdos, onde temos muitos professores surdos realizando
um trabalho bem sólido (Atena, 2014) (REIS, 2015, p. 181).

Ela está mostrando que conhece onde acontece o encontro surdo-surdo,


em que se produz uma forte cultura surda no espaço deles, ela afirma que há
muitos professores surdos que trabalham de maneira bem sólida. Isso significa
que eles têm o seu espaço para fazer, construir e enfatizar uma cultura surda
onde há Língua Brasileira de Sinais. Segundo o pesquisador Geertz (1989, p. 62),
“nossas ideias, nossos valores, nossos atos e até mesmo nossas emoções são,
como nosso próprio sistema nervoso, produtos culturais, na verdade, produtos
manufaturados a partir das tendências, capacidades, disposições com as quais
nascemos”.

A produção cultural na Educação Superior, às vezes, pode tornar o lugar de


modo diferente, como mostra a narrativa de outra professora surda:

A cultura dentro da instituição... é difícil... O espaço da


universidade não é o espaço da minha cultura, não é mesmo.
Grande parte das pessoas é ouvinte, não disse todas, mas
a maioria não utiliza a língua de sinais. Desta forma, como
poderia pensar na cultura surda neste espaço? Chama-me
atenção a UFSC, onde a língua de sinais circula no espaço
acadêmico, alguns professores sabem a língua de sinais e isso
promove a construção de vínculos. Eu não me sinto vinculada
à universidade, não mesmo, caso venham a se ampliar o
número de surdos nas instituições e as informações sobre os
sujeitos, isso pode mudar (Ártemis, 2014) (REIS, 2015, p. 182).

A professora surda, na Educação Superior, situada no meio das complexas


culturas, enquanto trabalha sozinha, transforma-se no processo de interação, a
ligação que constrói a diferença entre surdos e ouvintes. Ela há de ir e vir da
cultura surda, e afirma que a universidade não é cultura para ela enquanto não
houver professores surdos no espaço, mas há a possibilidade de um hibridismo
cultural que acolhe a diferença na Educação Superior, como acontece na UFSC.
“Sempre transitei de lá para cá entre designações raciais, designações da fisíca
ou outras designações simbólicas, todas essas coisas se embaralham de alguma
maneira. [...] desenvolver uma genealogia da maneira como as cores e não cores
funcionam é interessante para mim” (BHABHA, 1998, p. 23).

Sobre a possibilidade de hibridismo cultural na Educação Superior, vejamos


a narrativa de uma professora surda:

75
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Eu acredito que é importante que em todos esses espaços


os ouvintes estejam trabalhando em uma parceria com os
surdos, quando o trabalho é realizado para surdos somente
por ouvintes, os surdos não reconhecem os elementos da sua
cultura ali e aos poucos abandonam o processo. A Federação
Mundial de Surdos tem feito inúmeras campanhas, há a
necessidade de que qualquer pesquisa que seja feita a respeito
de surdos seja feita com a participação de surdos. Não é só
necessário saber como fazer, mas ter efetiva participação de
surdos é fundamental, é isso que garante o aparecimento da
cultura surda nesses projetos (Deméter, 2014) (REIS, 2015,
p. 182).

Ela está afirmando que há a possibilidade e que é fundamental realizar a


parceria entre surdos e ouvintes nesse projeto para acontecer o aparecimento
da cultura surda na educação de surdos, que pode acolher a diferença sem uma
imposição e com respeito. Como afirma Bhabha (1998, p. 35), “este é o momento
de distância estética que dá à narrativa uma dupla face que, como o sujeito sul-
africano de cor, representa um hibridismo, uma diferença “interior”, um sujeito
que habita a borda de uma realidade “intervalar”. Com essa possibilidade, o autor
argumenta que o sujeito habita onde haja uma diferença no interior, é como o
professor surdo, que é diferente, habita e trabalha na Educação superior, que cria
as parcerias na encruzilhada entre história e cultura, unindo Educação Superior e
a comunidade surda.

Como ficam as relações de poder enquanto criam a cultura surda na


Educação Superior?

Então, isso está inserido no que Foucault discorre e chama de


relações de poder. Quanto a isso, eu sempre tento promover
uma inversão de papéis, fazer com que o ouvinte passe a
se colocar no lugar do surdo e dessa forma desenvolver
estratégias para que ele também possa se conscientizar e
sentir aquilo que o surdo sente (Apolo, 2014) (REIS, 2015, p.
183).

As relações de poder podem ocorrer em qualquer lugar, mesmo na Educação


Superior. O professor surdo está mostrando a sua estratégia, colocando os
ouvintes no lugar do surdo. É como se fosse o representante do conhecimento
de algo do local da cultura surda, que contém em seu campo de experiência uma
nova afirmativa: a diferença cultural do sujeito surdo.

76
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

Procure assistir ao filme “A Familia Bélier”. Trailer disponível


em: https://www.youtube.com/watch?v=KuGtmX8B6EE. Depois de
assistir ao filme, reflita sobre a história de uma filha ouvinte de pais
surdos.

1 Segundo Hall (1997), se entendemos que a cultura que temos


determina uma forma de ver, de interpelar, de ser, de explicar, de
compreender o mundo, torna-se CORRETO afirmar que:

a) A cultura não apresenta interações sociais.


b) A cultura não é um produto humano.
c) A cultura surda organiza uma forma de existir no mundo.
d) A cultura surda não difere da dos ouvintes.

2 Assinale a alternativa CORRETA que apresenta uma característica


da identidade política surda:

a) Ser militante pela cultura surda.


b) Aceitar somente filhos de pais surdos em seus movimentos.
c) Aprender o oralismo.
d) Lutar pelos direitos dos ouvintes.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
A identidade surda é muito importante. Os surdos podem pensar em concordar
que uma pessoa que não seja surda nunca pode adquirir completamente aquela
identidade e tornar-se um membro habilitado da comunidade surda, porém falar
e pensar como uma pessoa ouvinte é negativamente considerado na cultura dos
surdos. Eles pensam como um pertencimento da cultura surda, como sentem a
mesma família, uma metáfora que é fundamental e que nunca vai se dissolver e
nem acabar com a cultura surda.

77
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Também sentem menos egoísmo do que na sociedade dos ouvintes. Às


vezes vemos que a comunidade surda se envolve em um “grande abraço”. Os
surdos abraçam-se, frequentemente, nos encontros e, principalmente, nas festas
– verdadeiros abraços! Na comunidade surda também acontece uma minoria
linguística, mas que possui uma rica cultura com as suas próprias formas de arte,
história e estrutura social dos surdos.

78
Capítulo 2 A EXPERIÊNCIA VISUAL: EDUCAÇÃO INFANTIL E ENSINO FUNDAMENTAL

REFERÊNCIAS
BHABHA, H. K. O local da cultura. Tradução de Myriam Ávila, Eliana Lourenço
de Lima Reis, Glaúcia Renata Gonçalves. Belo Horizonte: UFMG, 1998.

GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,


1989.

GROSSBERG, L. Identidade e estudos culturais: é tudo que há? In: HALL, S.;
GAY, P. D. (Orgs). Questions of cultural identity. Londres: Sage, 1997.

HALL, S. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais de nosso


tempo. Educação e Realidade: Cultura, Mídia e Educação, v. 22, n. 3, jul./dez.
1997.

HERNÁNDEZ, F. Catadores da cultura visual. Porto Alegre: Mediação, 2007.

LADD, P. Em busca da surdidade 1: colonização dos surdos. São Paulo:


SurdŽUniverso, 2013.

LADD, P. Understanding Deaf Culture: In Search of Deafhood. Clevedon:


Multilingual Matters Ltda., 2003.

LANE, H. A máscara da benevolência: a comunidade surda amordaçada.


Lisboa: Instituto Piaget, 1992.

PERLIN, G. T. A cultura surda e os intérpretes de língua de sinais. ETD –


Educação Temática Digital, Processos Tradutórios, Línguas de Sinais e
Educação, Campinas, v. 7, n. 2, p. 136-147, jun. 2006.

PERLIN, G. T. O lugar da cultura surda. In: THOMA, A. da S.; LOPES, M. C. A


invenção da surdez: cultura, alteridade, identidade e diferença no campo da
educação. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2004.

PERLIN, G. T. O ser e o estar sendo surdos: alteridade, diferença e identidade.


Projeto de qualificação (Doutorado em Educação). Porto Alegre: Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), 2003.

REIS, F. A docência na educação superior: narrativas das diferenças


políticas de sujeitos surdos. Tese de Doutorado. Uberlândia: UFU, 2015.
Disponível em: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/17759/1/
DocenciaEducacaoSuperior.pdf. Acesso em: 27 jul. 2020.

79
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

SACKS, O. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo:
Companhia das letras, 1990.

SCHEIN, E. H. Coming to a New Awereness of Organizational Culture. Sloan


Management Review, v. 25, n. 2, 1984.

SCOTT, J. W. Multiculturalism and the politics of identity. In: RACJCHMAN, J.


(org.) The identity in question. Nova York: Routledge, 1995.

WILLIAMS, R. The Long Revolution. Harmondsworth: Penguin, 1965.

80
C APÍTULO 3
O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE
SURDOS

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Conhecer o currículo na Educação de Surdos.

 Perceber a polêmica sobre os currículos influenciados pelos ouvintes.

 Identificar as formas adequadas de usar o currículo dos surdos.

 Discutir sobre as diferenças nos dois currículos.


DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

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Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Neste capítulo, estudaremos sobre o currículo na Educação de Surdos e o
porquê de trabalhar com tal currículo por meio do jeito cultural dos surdos na sala
de aula, bem como com toda a dinâmica em Língua de Sinais e a adequação da
cultura surda dentro do currículo. Vamos, também, conhecer, pesquisar e discutir
sobre esse currículo completamente diferente do jeito dos ouvintes, devido ao fato
de a primeira língua ser a de Sinais e a segunda, a Língua Portuguesa.

É importante entender e trabalhar esse currículo cultural, que deve ser


ensinado para alunos surdos na sala de aula sem receber a influência dos
ouvintes, ou seja, que não haja a influência do jeito dos ouvintes no ensino para
alunos surdos. No entanto, há sempre polêmica quando se trata da relação
ensino-aprendizagem entre surdos e ouvintes, do currículo, do plano de aula, das
atividades, dos jogos (jeito dos ouvintes, por exemplo, no jogo de batata quente,
telefone sem fio). Então, precisamos refletir sobre as crianças surdas na sala de
aula que não estão adequadas à cultura surda, fazendo com que sejam excluídas
das brincadeiras, das atividades e das dinâmicas, muitas vezes não relacionadas
às crianças surdas. Outra questão é o ensino de português, de gramática. Por
exemplo, aprender como é uma oxítona, uma paroxítona, uma proparoxítona,
entre outras temáticas que são trabalhadas como modalidades orais fora da
realidade dos surdos.

Neste capítulo, aprenderemos a usar o currículo na Educação de surdos, a


adequar o ensino à cultura surda, à experiência visual, a trabalhar no contexto
em Língua de Sinais, a ensinar a Língua Portuguesa como a segunda língua
para surdos, na modalidade escrita. Também vamos estudar e comparar os dois
currículos: o de surdos e o de ouvintes.

Com esse contexto, precisamos refletir melhor sobre o currículo adequado à


cultura surda. Vamos lá!

2 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE
SURDOS
Iniciaremos discutindo sobre o currículo na Educação de Surdos. Você já
ouviu falar nesta discussão? Trata-se de um material elaborado e publicado pela
pesquisadora surda Carolina Hessel Silveira, intitulado “O currículo de Língua de
Sinais na Educação de Surdos” (2006). O próprio nome já explica que é um texto
fundamental para a estruturação do currículo, sendo de caráter cultural para a

83
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Educação Infantil. É um currículo que deve ser amplamente divulgado, por isso,
dedicaremos esta seção para a apresentação dos detalhes necessários.

Esse currículo cultural sofreu e ainda sofre críticas por parte de alguns
educadores que não são favoráveis à cultura surda, porém, é consenso o seu
valor de normalizar e padronizar o currículo escolar perante a sociedade. Isso
porque a Educação Infantil costuma ser posta em segundo plano e, neste caso, a
publicação desse currículo cultural significou relevante avanço para a Educação
de Surdos e educação bilíngue para surdos. Considerando que os materiais,
práticos e teóricos, nesta área são muito raros, o que a pesquisadora produziu
sobre o currículo da Língua de Sinais na Educação de Surdos acabou sendo um
marco, reforçando a importância da Educação de Surdos.

O que precisamos é de uma política nacional para a educação das crianças


surdas desde o nascimento, para que recebam as orientações da família e para
construir sua aquisição de linguagem em Língua de Sinais adequada aos currículos
culturais, para que seja respeitada a cultura surda sem descolonizar a educação
ouvintista. Segundo Silva (1999, p. 207), “uma estratégia de descolonização do
currículo supõe, evidentemente, o projeto, a construção e a elaboração de novos
materiais que possam refletir as visões e representações alternativas dos grupos
subordinados”.

É necessário ressaltar que todas as ideias e propostas contidas no currículo


em Língua de Sinais são somente sugestões dadas pelos povos surdos, ou seja,
pretende-se que sirvam de base para discussões ou que orientem os trabalhos a
serem desenvolvidos. Achamos importante segui-las. É aí que se coloca a grande
diferença em relação à política nacional do MEC, a qual já conhecemos, e o que
quer nos impor na Educação Inclusiva.

Vamos a um resumo do currículo, ou seja, a descrição de como foi estruturado


esse currículo de Língua de Sinais para a Educação de Surdos, quais são os
assuntos que aborda, quais as principais ideias e propostas.

O currículo de Língua de Sinais foi organizado pela experiência dos surdos


na Educação de Surdos, comprovando que os professores surdos são uma das
formas mais claras de resistência ao poder ouvintista, mas os professores surdos
não estão nas disciplinas convencionais, tradicionais. Outra conclusão: a maioria
dos educadores ouvintes desconhece ou conhece pouco a estrutura da Língua de
Sinais, conforme demonstrou a pesquisadora Márcia Lunardi (1998) ao discutir a
questão do currículo na visão dos surdos.

Continuando a discussão sobre o currículo em Língua de Sinais na Educação


de Surdos:

84
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

[...] é necessário que o currículo possa ser visto como um


espaço privilegiado de relações de poder. Essas relações não
se processam simplesmente através de formas homogêneas,
repressivas, proibitivas; elas também se dão de formas
benéficas, ou seja, heterogêneas, produtivas, provocativas.
Portanto, analisar o currículo envolvido pelas relações de poder
significa trazer esta discussão para o campo da educação, mais
precisamente para o projeto educacional crítico (LUNARDI,
1998, p. 70 apud SILVEIRA, 2006, p. 28).

É interessante produzir o currículo de Língua de Sinais na Educação de


Surdos ou educação bilíngue para surdos para ser trabalhado com as crianças
surdas, respeitando-o e adequando-o à linguística em Língua de Sinais e cultural.
Tal currículo ajuda a construir a identidade surda para assumir o jeito de ser surdo,
através de uma proposta pedagógica diferenciada, específica e bilíngue, que é
um grande encontro entre os fundamentos teóricos adotados e as orientações
metodológicas da pedagogia bilíngue, adequados para surdos, ou seja, a maioria
das propostas não deixa claro como deve ser a articulação entre o que se deseja
fazer e o que realmente se faz na Educação Inclusiva, na qual não há cultura
surda, mas uma tentativa desesperada de sobrevivência da cultura surda das
crianças na inclusão. Consideramos que tal tentativa tem caráter temporário,
utilizada enquanto não há um currículo cultural visando à Língua de Sinais como a
primeira língua, respeitando a sua política linguística e cultural.

Por isso, a estrutura do currículo de Língua de Sinais foi pensada na intenção


de tornar visível esta articulação, relacionando objetivos gerais e específicos,
conteúdos e orientações didáticas, envolvendo a identidade cultural dentro do
currículo, conforme podemos observar a seguir.

85
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

FIGURA 1 – IDENTIDADE CULTURAL

FONTE: Silveira (2006, p. 50)

Precisamos refletir sobre como trabalhar as estratégias com os alunos


através desse método bilíngue, um método que deve trabalhar a Língua de
Sinais como primeira língua e a Língua Portuguesa como segunda língua, na
modalidade escrita. Acerca do trabalho pedagógico no currículo para surdos,
voltado aos alunos surdos, devemos considerar um trabalho desenvolvido em um
ambiente bilíngue, em um espaço em que se utilize a Língua de Sinais e a Língua

86
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

Portuguesa. A educação bilíngue para surdos deve acontecer em período diurno


ou noturno, isto é, no contraturno dos estudos desses alunos.

Não podemos esquecer que o trabalho do currículo cultural para o ensino de


Libras deve contribuir para promover um ambiente educacional bilíngue, por isso,
o professor que ministra aulas em Libras deve ser qualificado para evitar a prática
do bimodalismo, ou seja, a mistura de Libras e Língua Portuguesa, que são duas
línguas de estruturas diferentes.

Bimodalismo: é uma mistura de uso do oralismo e do português


sinalizado ao mesmo tempo.

Agora você entende como é a Educação Bilíngue, mas e a posição dos alunos
surdos na sala de aula? Como devemos trabalhar com eles, adaptando o jeito dos
surdos? O importante é entender que a posição cultural dos alunos surdos na
sala de aula mostra os resultados das mudanças de visão que os surdos têm hoje
sobre ‘um novo jeito de ser surdo’, ou seja, sobre buscar identificação naquilo
que rompe com os aspectos que envolvem a educação, que nos entendia como
deficientes.

Assim, vemos como é a didática cultural para trabalhar com os alunos surdos,
que se encaixa no currículo cultural, por exemplo:

FIGURA 2 – DIDÁTICA CULTURAL

FONTE: A autora

87
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Sobre esta questão, aqui estamos nos referindo ao sujeito surdo, somos
sujeitos diferentes, somos os outros, somos estranhos, como se fôssemos
estrangeiros. Há uma visão dos surdos distinta da visão dos ouvintes. Como
afirma Hall (2000, p. 90), “o conceito de representação desenvolve-se como uma
teorização sobre identidade e diferença”.

Ainda sobre a questão da diferença e da identidade dos sujeitos surdos:

[...] É evidente que a representação engloba determinadas


significações, como a alteridade, a diferença e a identidade. A
representação é concebida como um sistema de significação
culturalmente aceitável e está constituída de forma que os
pressupostos das significâncias híbridas perdem força e nesta
medida vão sendo descartados. Deste modo, existe um contínuo
ventilar de significações que promovem determinada cultura
e captam-se ou descartam-se significações que pertencem
a outras culturas. Este processo não é estável de forma que
dê o veredicto. De acordo com as constantes mudanças
culturais, igualmente se percebem aspectos de tolerância para
determinadas significações de outras representações culturais
em vista da instabilidade cultural (PERLIN, 2002, p. 12).

Como podemos pensar sobre o que os sujeitos surdos querem e o seu


significado quando nos veem? O que eles pensam sobre nós? Os surdos sempre
se sentem como diferentes em virtude do uso da Língua de Sinais e de sua
performance, mostrando sua expressão facial e corporal, como se ‘flutuassem
no ar’ com toda a visualidade, seu olhar como representação cultural que molda
os sujeitos surdos. Desse modo, temos a possibilidade de cruzar as fronteiras
das línguas, da Língua de Sinais e da Língua Portuguesa, assim somos sujeitos
surdos, diferentes identitária e culturalmente. O que temos dessa alteridade de
nossa subjetividade surda? Vamos entender o significado de alteridade.

A alteridade pode formar parte da diferença cultural entendida


e aceitável. Sem que se tenha de pesquisar a cultura, ela pode
imbuir-se de aspectos aceitáveis culturalmente nas marcas da
identidade presente na cultura. Cultura e alteridade encontram-se
juntas, ao mesmo tempo em que são diferentes. Contraditoriamente,
a alteridade pode formar parte da diversidade cultural, pode sujeitar
o outro aos discursos da invenção da alteridade, do estereótipo, da
marginalização (PERLIN, 2002).

88
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

Percebemos a importância de provarmos que o discurso hegemônico


produzido na sociedade deve fazer com que o sujeito sinta e perceba forças
culturais contraditórias e propostas discursivas homogeneizadoras enquanto
segue com a teoria cultural para a diferença.

Então, o que surge com essa nova teorização, a qual relaciona a nova
didática cultural, envolvendo os sujeitos surdos do seu ponto de vista cultural
como um ‘estranho’, ‘diferente’ (alteridade), é uma forma de visão cultural sobre
os surdos.

Qual é a melhor estratégia de ensino através do cultural? Como podemos


entender quem é o sujeito surdo? Como podemos usar a didática em Libras
através do seu jeito de ensinar, do seu jeito cultural? Vamos trabalhar com essas
atividades para descobrir qual é a melhor estratégia de ensino para os alunos
surdos.

1 O que pode motivar a política de identidades surdas?

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2 Por que é importante usar a didática não como ouvinte, mas sim
ensinar de forma cultural?

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

3 No filme Sociedade dos Poetas Mortos, o professor de Literatura,


John Keating (Robin Williams), segue qual teoria do currículo,
tendo em vista que ele repele a ideia de métodos tradicionais
imperativos da instituição escolar?

CENA DO FILME SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS

FONTE: <https://www.feedobem.com/single-post/2019/11/26/A-
Sociedade-dos-Poetas-Mortos>. Acesso em: 27 jul. 2020.

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4 No filme Filhos do Silêncio, o professor (Willian Hurt) usa uma


didática mais próxima, ou seja, Teoria Crítica, teoria em que pode
discutir o que pensa, diferente da metodologia utilizada por outros
professores, com a qual não concorda. O professor procura
melhorar a metodologia e, para isso, toma sua aluna (Marlee
Matlin) como exemplo, pois ela realmente insiste em se inserir e
continuar com a cultura surda. A partir disso, descreva os pontos
diferentes entre os dois filmes.

90
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

CENA DO FILME FILHOS DO SILÊNCIO

FONTE: <http://clenio-umfilmepordia.blogspot.com/2017/10/
filhos-do-silencio.html>. Acesso em: 27 jul. 2020.

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5 Escolha qualquer uma das escolaridades, da Educação Infantil


ao Ensino Superior, bem como um dos temas a seguir e faça um
planejamento de aula para os alunos surdos.

a) Cultura Surda.
b) Identidades Surdas.
c) Escrita de Língua de Sinais.
d) Significados de normalidade/anormalidade.
e) Literatura Surda.
f) Políticas Educacionais de Surdos.
g) História Cultural de Surdos.
h) Dia dos Surdos.
i) Dia do Índio Surdo.
j) Crianças Surdas.

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Caro acadêmico, depois de discutir algumas questões sobre o currículo,


os alunos surdos e a escola bilíngue, chegou a hora de discutirmos sobre a
pedagogia da diferença e o papel social do professor que estará em sala de aula
com esses alunos. Cabe ressaltar que este é o início de longos estudos, como
vimos nos capítulos anteriores, a tecnologia é uma grande aliada para as pessoas
surdas, e a cada dia que passa há mais pessoas preocupadas com que os surdos
tenham uma vida normal e independente como as demais pessoas.

Antes do fim deste capítulo estudaremos sobre a pedagogia da


diferença ou dos surdos, situando a pedagogia do surdo. Para saber
mais, acesse o link a seguir:

https://cutt.ly/UcJQAUa.

3 PEDAGOGIA DA DIFERENÇA OU
DOS SURDOS
A educação ocupa um lugar estratégico no pensamento dos professores
surdos. Ela é a própria prática de que se ensina enquanto se produz o próprio
processo de transgressão pedagógica, seguindo uma nova pedagogia da
diferença, mesmo que nem todos os professores surdos tenham a mesma
estratégia. A preocupação em incentivar professores surdos capazes de
transformar a pedagogia de surdos que está no povo surdo é sempre presente.
Os professores surdos intelectuais traçam os caminhos da pedagogia dos
surdos. Hoje em dia, há uma articulação explícita entre educação e luta política.
A educação traz um objetivo em si para guerrear contra a ignorância e a miséria,
e, também, é instrumento de atuação política contra os privilégios, as injustiças e
todas as formas de exploração.

Nós, professores surdos, já temos condições de entender a questão da


enfatização da pedagogia: o que já sabemos e fizemos em Pedagogia? O que
se vê, hoje em dia, temos condições de saber e fazer? O que poderemos fazer
com tudo isso? Também temos condições de responder sobre o que já aconteceu
conosco, o ser surdo. Veremos, a seguir, uma narrativa de uma professora surda
(CH, 2006), sua percepção sobre a pedagogia, sua identificação e diferenças
pedagógicas existentes:

92
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

Vou narrar sobre a pedagogia que temos em nossa escola.


Formei-me em pedagogia há uns quase quatro anos. Percebi
que há muito tempo não tinha nenhuma pedagogia de surdos,
não tinha algo específico à Educação de Surdos, para saber
ensinar aos alunos surdos, estimular os surdos, entre outras
coisas. É com isso que eu me preocupo, a Educação de
Surdos no Brasil e, também, principalmente, nas cidades do
interior, porque percebi que a pedagogia aqui na minha escola
é igual à pedagogia dos ouvintes, segue sua pedagogia normal
e não específica sobre o surdo com uma pedagogia própria,
ou seja, com identidade surda, como aprender é igual a dos
ouvintes (REIS, 2006, p. 83).

É uma observação no sentido da pedagogia que o professor surdo estava


usando na sala de aula, onde demonstra a sua estratégia pedagogicamente clara
sobre a sua concepção de diferença. Mostraremos agora uma nova vivência, a
respeito de um outro professor surdo, FF (2006), que narra a sua profissão de
pedagogia. Ele é professor surdo, formado em outra área que não a pedagogia.
Ele é professor surdo na sala de aula e sempre utiliza a disciplina Língua de
sinais, seguindo o currículo da escola. Adapta-a ao seu jeito usando a história dos
surdos, a cultura, a língua escrita em sinais, a narrativa de poesia, as identidades
surdas, entre outros assuntos, associando-os ao mundo dos surdos.

Assim, na medida em que está por dentro dos Estudos Culturais, a


aproximação ao campo da Educação de Surdos justifica que ele está recolhendo,
adaptando e aproveitando metodologias que coincidem com a diferença neste
caráter híbrido, tanto da educação no contexto moderno quanto no contexto dos
Estudos Culturais.

Neste cenário, portanto, de compreensão das diferenças, no qual está sujeito


à influência destas no seu processo de significação pessoal e de mundo, temos o
surgimento da pedagogia da diferença, através dos Estudos Culturais. Segundo
Silva (2000, p. 101):

Em certo sentido, “pedagogia” significa precisamente


“diferença”: educar significa introduzir a cunha da diferença
em um mundo que sem ela se limitaria a reproduzir o mesmo
e o idêntico, um mundo parado, um mundo morto. É nessa
possibilidade de abertura para um outro mundo que podemos
pensar na pedagogia como diferença.

Essa pedagogia da diferença induz a uma nova construção, novas relações


de poder ligadas a novas estruturas discursivas, bem como narrativas e
representação. Sobre o que se pode entender como a pedagogia da diferença e
o que quer dizer a diferença de que é o outro, além do seu respeito, Pardo (1996,
p. 154) afirma:

93
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

Respeitar a diferença não pode significar “deixar que o outro


seja como eu sou” ou “deixar que o outro seja diferente de
mim tal como eu sou diferente (do outro)”, mas deixar que o
outro seja como eu não sou, deixar que ele seja esse outro
que não pode ser eu, que eu não posso ser, que não pode
ser um (outro) eu; significa deixar que o outro seja diferente,
deixar ser uma diferença que não seja, em absoluto, diferença
entre duas identidades, mas diferença da identidade, deixar
ser uma outridade que não é outra “relativamente ao mesmo”,
mas que é absolutamente diferente, sem relação alguma com
a identidade ou com a mesmidade.

A pedagogia cultural trata de trabalhar sempre com as diferenças,


reforçá-las e enfatizar pelo seu próprio jeito de ensinar, ou seja, no caso de os
surdos viverem todas as suas experiências visuais, políticas e de representação.
É por nossa alteridade que estamos sendo desafiados como professores surdos.
Para que aconteça essa pedagogia, é importante assumir a responsabilidade de
orientar a própria diferença.

Com tudo isso, torna-se muito importante criar um novo currículo específico
para os surdos. Os currículos, além de sempre apresentarem novas estratégias
pedagógicas, também necessitam de disciplinas que em suas práticas estimulem
e promovam a identidade cultural. Ao utilizar na sala de aula a primeira língua
como contação de histórias dos surdos, a utilização de recursos como poesia e
narrativa dos surdos, isto levaria a uma maior consciência sobre a cultura surda.
O ensino de uma forma escrita da língua de sinais dentro de uma disciplina de
língua de sinais, além da discussão em torno da teoria de identidade surda,
apresenta-se como muito importante a transmitir aos alunos surdos. Isso é
uma abordagem da pedagogia dos surdos que levaria em conta precisamente
as contribuições da teoria cultural e da qual emergiria uma nova produção da
identidade e da diferença do professor surdo na sala de aula.

O que podemos verificar na observação do professor surdo, é que ele enfatiza


a pedagogia da diferença e, também, se relaciona com a cultura de acordo com
o jeito de ensinar, de uma forma cultural que tem a realidade da cultura dentro
da subjetividade dos sujeitos surdos. Por exemplo, o professor surdo, FF (2006),
explicou na sala de aula a respeito da tecnologia para surdos, pois sente na
mesma realidade deles. O jeito do professor surdo que ministrou a aula, segue
em forma de diálogo.

94
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

Os dados que você lerá a seguir foram coletados durante a


pesquisa de mestrado.

O QUE TEM DE TECNOLOGIA PARA OS SURDOS?

Responderam-lhe os alunos surdos: mensagem de celular, TDD


(telefone para surdos), televisão com legenda. O professor surdo
logo acrescentou mais claramente a respeito do TDD. Mostrando o
desenho do TDD numa propaganda comercial, explicou que é muito
importante usar a experiência visual para os surdos. Continuou
explicando que há uma empresa em São Paulo que tem aparelhos
à venda e está sob a responsabilidade de um surdo. Continuando a
conversa sobre o responsável da empresa de São Paulo, explicou
que este surdo foi a Porto Alegre e deu uma palestra sobre a
importância da tecnologia para os surdos e do TDD. Na palestra ele
diz que há muitos ouvintes que usam o telefone público e os surdos
também têm o direito de usá-los em qualquer espaço público, sendo
que é importante divulgar para os interessados poderem adquirir o
TDD e também lutar para conseguir sua fixação em espaço público
como: na prefeitura, em escolas, entre outros lugares. Na sua falta,
explicou: os surdos podem sofrer por não conseguir se comunicar
com os policiais, hospitais, bombeiros etc. em casos de emergência.
Por isso é muito importante disponibilizar o TDD para os surdos
poderem se comunicar com qualquer pessoa ouvinte em casos
necessários. Explicou de uma forma clara para os surdos entenderem
como funciona o centro de comunicação entre surdo e ouvinte. A este
respeito ele fez uma dramatização na sala de aula sobre o uso do
TDD:

Surdo: Preciso falar com mamãe? Ouvinte: O que quer?


Surdo: Vou teatro sexta-feira tarde, pode? Ouvinte (traduzindo
oralmente para a mãe) Mãe: Pode ir, mas cuidado.
Ouvinte: (escrevendo para a surda) Surda: Por que cuidado?
Ouvinte: (traduzindo para a mãe) Mãe: tem namorado, tem que
respeitar. Ouvinte: (escrevendo para a surda).
Surda: Sério, pare brincar. Eu sei respeito e fiel meu namorado.
Tchau, beijos e abraços!
Ouvinte: (traduzindo para a mãe). E desligou o TDD.

Sintetizou que é muito importante a comunicação entre a


mãe ouvinte e a filha surda, e os alunos surdos iniciaram o diálogo

95
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

desabafando com as histórias que acontecem com eles referentes


ao telefone público. O professor surdo os deixou conversando sobre
a importância do TDD em público. Respondeu todas as dúvidas
dos alunos, inclusive disse que a funcionária da empresa telefônica
que intermedia a ligação tem a sua ética profissional, e ela não vai
transgredir o diálogo na hora de traduzir. Em caso de não ter ética,
pode ser processada pelo Ministério Público, por isso é certo ter
uma funcionária atendente ética. Explicou por que precisa de uma
funcionária para ter uma comunicação com qualquer pessoa que não
tem TDD, em caso de ter, apenas liga direto.
Para finalizar, toda a tecnologia para os surdos são TDD,
mensagem de celular, televisão com legenda, intérprete na TV,
campainha luminosa, campainha para os bebês, internet, entre
outros.
O Professor surdo FF continuou perguntando:
O que tem de comunicação sem tecnologia? E deu um exemplo
que aconteceu na casa dele.
Lá na minha casa só tinha uma pessoa surda, e um dia não tinha
ninguém em casa, e também não tinha campainha luminosa. Quando
veio uma pessoa apertar a campainha, o que aconteceu? O cachorro
iniciou a latir. Claro que dá para perceber que tinha gente apertando
a campainha. O cão ajudava a atender às pessoas quando vinham
apertar a campainha. Realmente é muito diferente, e até também se
consegue se comunicar com os cachorros através de sinais, mas
não são todos, e apenas alguns sinais. Por exemplo: “sentar” e o
cachorro senta; “rolar” e o cachorro rola. Neste caso, deve-se treinar
com o sinal. Então o professor explicou que há um costume entre
os surdos de treinar o visual, como no caso do cachorro que late e
lembra a campainha da porta. Os alunos perguntaram então: deve-
se ensinar língua de sinais ao cachorro na idade precoce?
O professor respondeu: isso mesmo, só se for de cinco meses
e se for tarde nunca vai conseguir aprender o sinalizar básico dos
surdos para este fim como: “comer”, “passear” etc.

FONTE: <hhttps://cutt.ly/vcJWiju>. Acesso em: 27 jul. 2020.

96
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

1 A partir do que você leu, converse com algumas pessoas que


estão inseridas no contexto educacional e ouça qual é a opinião
delas sobre a educação bilíngue e a pedagogia escolar com a
inserção de crianças surdas. A partir do que você ouviu escreva
as suas impressões positivas e negativas acerca da temática.

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Entendemos essa pedagogia cultural como a possibilidade de aproximar a


forma cotidiana de existência do sujeito com a sua prática de ensino, que não
se reduza a um conjunto de habilidades técnicas ou profissionais. A pedagogia
dos surdos pretende ir além da sala de aula para desenvolver sua potencialidade.
Ela se mostra diferente da pedagogia tradicional, tem essa nova perspectiva, pois
rompe com aquela.

Lançaremos mão agora de um olhar sobre o professor surdo neste


emaranhado de significações e concepções. Trata-se de um sujeito surdo que por
muito tempo permaneceu na sombra do professor ouvinte. Este professor surdo
está reivindicando seu papel de agente formador, de identidade, de construtor
da história. Isso tudo, obviamente, com muita luta e resistência. Surgem aqui
algumas perguntas: há importância na identidade cultural do professor surdo?
Que cultura é essa do sujeito surdo? Que identidades e concepções culturais o
professor surdo têm passado aos seus educandos?

É significativo para o professor desenvolver a sua cultura e entender sua


história, construindo a sua identidade a partir da diferença. Nós, os professores
surdos, vivemos, atualmente, a busca da identificação de nossa diferença
porque tem o sentido da produção da subjetividade. O professor surdo que se

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DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

relaciona com a cultura tem atitudes política e poeticamente de produzir o seu


jeito de ensinar, o seu jeito de percepção do aprendizado dos alunos surdos, o
seu jeito de entender o que os alunos explicam. Entre outras coisas, tem contato
com a mesma cultura. Segundo uma narrativa de uma professora surda, CH
(2006), sobre a sua subjetividade: “Agora, dentro da minha subjetividade, o que
é importante, atualmente, é que a pedagogia transforma muitas coisas porque as
pessoas se preocupam com a pedagogia e como fazer: é igual ou não, é diferente,
como? Como ensinar, precisa aprender? Não é isso, é importante perceber o
surdo, o que ele é?” (REIS, 2006, p. 88).

Desse ponto de vista, o surdo não se considera como fazendo parte


da diversidade, mas, sim, da diferença, devido ao poder cultural e da sua
subjetividade. Essa dificuldade de reconhecimento é percebida nas palavras de
Skliar (1998, p. 5):

[...] habitualmente se utilizam termos como “deficiência” ou


“diversidade”. Estes, no geral, mascaram e neutralizam as
possíveis consequências políticas, colocam os outros sob um
olhar paternalista e se revelam como estratégias conservadoras
para ocultar uma intenção de normalização. A diferença como
significação política é construída socialmente; é um processo
e um produto de conflitos e movimentos sociais, de resistência
às assimetrias de poder e de saber, de uma outra interpretação
sobre a alteridade e sobre o significado dos outros no discurso
dominante.

Vê-se que um professor surdo na sala de aula tem a sua liberdade em dar as
suas aulas. Dentro da sala de aula regular ele é posto numa situação em que se
lhe impõe uma aparente norma, ele é incluso dentro da diversidade. Muitas vezes,
a inclusão está trabalhando na perspectiva da diversidade na escola regular, mas
na verdade os surdos não estão dentro desta, porque são considerados como
pertencentes à diferença devido ao uso da sua própria língua, de sua cultura, de
sua identidade. Um fato que pode atestar isso é o olhar de pedagogos surdos na
sala de aula e de seu bom relacionamento com os alunos surdos devido ao uso
de mesma língua e identificação cultural.

Vemos ainda surdos com identidades construídas, nas múltiplas identidades,


o que pode explicar a identidade dos surdos em geral para esclarecer quanto a
sua diferença (PERLIN, 1998).

Ao pontuar o conceito de que o surdo é diferente, é de se esperar que o


professor surdo participe das lutas políticas pelo poder cultural. A melhoria da
educação dos surdos é resultado das suas práticas devido a sua experiência,
que está por dentro da sua identidade cultural. É preciso refletir sobre a prática
para buscar a defesa dos povos surdos. Particularmente, os professores surdos

98
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

buscam desvendar as relações de poderes que subjugam e segregam a cultura


surda. Isso dependerá do meio cultural em que estes surdos tiveram a sua
experiência. Ser professor surdo pode significar poder político, mas há muitos
professores surdos que não apresentam uma identidade surda porque alguns
deles tiveram desde pequenos influência ouvintista.

Isso pode prejudicar as relações entre o professor surdo e o aluno surdo.


Por outro lado, há professores surdos que apresentam uma identidade surda
e conseguem ensinar fluentemente em língua de sinais e desenvolvem uma
metodologia sem interferência dos padrões ouvintes. Estes teriam uma maior
facilidade para ensinar as crianças, para que elas pudessem ter a aquisição da
língua e da sua identidade com o professor surdo com a identificação.

Salientaremos o hibridismo presente na atuação do professor surdo. O que


acontece no momento do hibridismo, com relação às misturas, aos cruzamentos,
sendo que está no seu processo de construção a partir do ouvintismo, devido
à metodologia própria dos ouvintes. Este aspecto não fortalece a cultura surda
em razão do domínio dos ouvintes, mas mesmo assim ele usa a língua de sinais
sem a metodologia pedagógica própria dos surdos. Enfim, o professor surdo não
possui aspectos suficientes da identidade cultural para a sua subjetividade.

É um processo de construção de si mesmo ao ensinar para os alunos surdos


mesmo sendo a sua subjetividade, ou seja, de identidade surda, tem a sua
cultura, usa a metodologia longe do domínio dos ouvintes. Cria a sua produção
textual em língua de sinais, além de utilizar a sua própria língua, usa a resistência
contra a prática dos ouvintismos, que pode entrar numa relação de negociação
no espaço educacional, onde há o hibridismo presente na atuação do professor
surdo. Segundo os autores Fleuri e Souza (2003, p. 62):

[...] Nesse espaço do hibridismo, é provável que tenha


acontecido o que Bhabha denomina de processos simbólicos
de negociação ou tradução, dentro de uma temporalidade
que tornou possível a articulação de elementos antagônicos
ou contraditórios. Tal espaço de hibridismo teria possibilitado
a ultrapassagem das bases de oposição dadas (dominantes/
dominados). Não se trataria mais, nesse espaço de hibridismo,
de uma coisa (dominantes), nem de outra (dominados), nem
mesmo de uma superposição de ambas as 90 categorias
(dominantes e dominados), mas de um entrelugar que
contestaria os termos e o território de ambas as categorias.
Isso possibilita ir além e despertar o desejo de outro lugar e
de outra coisa que, nesse caso, poderia ser identificado como
novas possibilidades de relações pessoais e sociais entre
sujeitos marcados por uma política de diferenças.

É fundamental ter um espaço de negociação com os outros professores

99
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

quando intervirem na cultura dos surdos, mas também é importante aceitar


os professores ouvintes que conhecem a língua de sinais e esclarecer o
que acontece dentro da sala de aula para aceitarem a nossa cultura, a nossa
identidade, a nossa língua, para respeitarem os professores surdos no espaço
educacional, e os surdos poderem respeitar a cultura dos professores ouvintes
dentro de um contexto político. Importa que continue acontecendo a resistência
contra as práticas dos ouvintismos para não produzir a exploração e a dominação
de uns aos outros.

Assim, surge uma complexa relação de negociação a partir de uma


necessidade de fronteira cultural, que intervém a nossa cultura de que os
professores estimulam os alunos surdos a terem cultura dentro de um espaço
educacional, mas é importante ter uma relação que pode ajudar a estimular.
Conforme Bhabha (1998, p. 27), [...] “fronteira cultural”, uma “borda deslizante
e intervalar nas relações”, que estimula “o desejo de reconhecimento de ‘outro
lugar’ e de outra coisa”.

Mais um desafio é o de elaborar a nova metodologia que os professores


surdos querem, porém, situa-se como a pedagogia da diferença, em que é
considerado ser diferente dos outros. Esse desafio também pode acontecer
dentro do sistema de negociação entre os professores surdos e ouvintes para
valorizar o espaço educacional.

Este recente despertar para o contexto pedagógico aceita a diferença dos


professores surdos a partir da pedagogia da diferença, que é considerada uma
celebração nos processos de negociação, há o ir e vir, o retorno, a resistência, a
marcação da diferença para a garantia de acesso e igualdade. Na prática ainda
existe alguma influência dos ouvintes, mas os professores surdos continuam
resistindo enquanto despertam por si mesmos, sendo independentes a partir da
transgressão pedagógica.

4 SITUANDO A PEDAGOGIA DOS


SURDOS
A pedagogia dos surdos é uma tentativa de reconstruir no espaço educacional
da experiência visual, as políticas e histórias passadas aos alunos surdos. Apesar
dos esforços dos professores surdos, ela ainda é desconhecida. Pesquisas estão
sendo feitas, tímidas, insistentes. A chance da pedagogia da identidade enquanto
pedagogia de surdos depende do que ela expressa e os trabalhos atuais que ela
motiva.

100
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

O objetivo deste livro é focalizar a prática dos professores surdos na sala


de aula para chamar a atenção sobre o despertar desta pedagogia, que é
diferente daquela dos professores ouvintes, para ativar a pedagogia de surdos.
A sua diferença se dá devido à cultura, ou seja, à língua de sinais, à identidade,
à diferença. Aborda elementos condizentes às necessidades pedagógicas dos
surdos. Os professores surdos estão despreparados com relação a ela. É em
sala de aula que começam a entender e a atender à atualidade da transformação
pedagógica que se processa.

Os professores surdos vivem em inquietações constantes, e a ansiedade


pela pedagogia de surdos na sala de aula já a ultrapassa. Nota-se que quase
nunca deram espaço e atenção aos professores surdos. Cada professor tem uma
ideia que está ligada a interesses pela nova produção cultural, em particular, nas
suas relações com o poder e o conhecimento. Conforme o autor McLaren (1997,
p. 182), “minha perspectiva agora não é apontar um dedo inquisidor para qualquer
grupo específico de pessoas, mas sim para as ideologias, estruturas e mitos que
ajudam a reproduzir nossa presente cultura”.

O que acontece com os professores surdos? Eles estão situando, reforçando,


mostrando as estratégias para tornar a pedagogia dos surdos presentes.
Identificam seus locais, onde podem se sentir à vontade para ensinar e usar os
instrumentos dessa pedagogia. Isso concorre para ganhar o seu valor e senso de
controle de negociação no espaço educacional cultural. É importante mostrar o
sucesso dos professores surdos que trabalham de maneira própria e cultural.

Geralmente, alguns professores ouvintes não têm experiência nem conhecem


a verdadeira Educação de Surdos, somente se preocupam que os alunos saibam
falar, ler e se integrar com os alunos ouvintes e mais nada, talvez devido à falta
de conhecimento específico e de metodologias culturais para os surdos.

Os esforços atuais de reformas demonstram uma falta de


vontade de construir e sustentar um projeto político claramente
articulado, no qual a pedagogia possa ser relacionada à criação
de práticas educacionais e referentes morais necessários para
a construção de uma esfera pública democrática (MCLAREN,
1997, p. 266).

O tema da prática do professor surdo, sua política e poética de transformação


da pedagogia dos surdos envolve muito conhecimento. Desta forma, a ideia é de
que a nossa educação seja cada vez mais respeitada, devida valorização à língua
de sinais, nossa cultura, nossa diferença em sua nova metodologia, visto que a
pedagogia dos surdos já é aplicada por alguns professores surdos.

Todos os professores surdos que desenvolvem esta pedagogia a

101
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

desenvolvem como uma política pedagógica, que traz a marca da sua identidade,
sua diferença, ao questionarem, reconhecerem e celebrarem a identidade. Como
afirma Lara (2003, p. 11), “então, o que é dado se apresenta diante de nós como
algo que não só não deve ou não pode ser superado como também com o que
está ainda por ser alcançado em sua plenitude, visto que é o desejável”.

A pedagogia dos surdos está aí, aguardando melhores dias, aguardando


ser despertada, descrita, narrada, contada com as ferramentas que os Estudos
Culturais têm. Mesmo que tivesse perspectivas em vista da formação pedagógica
dos surdos e o olhar pela pedagogia da diferença devido à centralidade da cultura,
da primeira língua, da identidade surda, de forma totalmente diferente, a tarefa
de descrevê-la é instigante. O importante é ter a reflexão pedagógica na prática
educativa, que resgata a possibilidade de criar, moldar, imaginar e dramatizar,
representar o seu mundo, construindo-se como cidadãos em seu cotidiano
escolar. Como afirma McLaren (1997, p. 31):

No centro desta posição está a necessidade de desenvolver


modos de investigação que examinem não apenas como a
experiência é moldada, vivida e tolerada dentro de formas
sociais particulares, tais como as escolas, mas também como
certos aparatos de poder produzem formas de conhecimento
que legitimam um tipo particular de verdade e estilo de vida.

Os professores surdos estão preparados pedagogicamente e produzem


formas de conhecimento que se aplicam na Educação de Surdos. Um novo terreno
se apresenta, uma experiência que é moldada e vivida, mas a pedagogia dos
surdos parece ser realidade. Eles têm língua de sinais, aos poucos descobrem
que necessitam de instrumentos que os capacitem a exercer a função docente.
Para buscar os instrumentos para o seu aperfeiçoamento, é necessária uma
busca na área pedagógica.

Ao identificar seu problema, ocorrem pequenas mudanças, porém têm sido


lentas e ainda pouco profundas, especialmente nas escolas de surdos ocupadas
por profissionais ouvintes, na maioria. Como espaço ocupado por profissionais
surdos, estas escolas precisam incorporar e endossar as novas práticas.

Essas escolas de surdos oferecem espaço a mudanças, embora seus


resultados exaustivamente não sejam notados e comprovados como eficientes
e seus procedimentos chegam muitas vezes a passar despercebidos em
pressupostos científicos que apontam caminhos bastante claros e possíveis.

É preciso entender o professor surdo como o sujeito surdo possuidor de uma


cultura e membro do povo surdo no sentido de uma diferença cultural que, devido
à língua e à cultura, também desenvolveu um meio de relacionar-se, construir

102
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

história e compartilhar as mesmas experiências, ou seja, se de alguma forma esse


sujeito foi privado ou privou-se de estar inserido nesta cultura constituída pelos
sujeitos surdos através dos tempos, a esse sujeito definimos como identidade
diferente de identidade cultural surda e não como surdo no contexto da palavra.

Vê-se a identidade do professor surdo como possível de transgressão, sem


negar, no entanto, a possibilidade também de estagnação da forma como foi
moldada. Segundo a pesquisadora surda Perlin (1998, p. 52), “a identidade é algo
em questão, em construção, uma construção móvel que pode frequentemente
ser transformada ou estar em movimento, e que empurra o sujeito em diferentes
posições”.

O professor surdo culturalmente identificado deve estar inserido no povo


surdo. Segundo Padden e Humphries (1998, p. 58):

Uma comunidade surda é um grupo de pessoas que vivem


num determinado local, partilham os objetivos comuns dos
seus membros, e que por diversos meios trabalham no sentido
de alcançarem estes objetivos. Uma comunidade surda pode
incluir pessoas que não são elas próprias surdas, mas que
apoiam ativamente os objetivos da comunidade e trabalham
em conjunto com as pessoas surdas para alcançá-los.

Vemos também, no campo escolar, a influência do ouvintismo nas práticas


pedagógicas do professor surdo, que tende a moldar-se naquilo que ao ouvinte
parece correto.

Ouvintismo: trata-se de um conjunto de representações dos


ouvintes, a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e a narrar-
se como se fosse ouvinte. Além disso, é nesse olhar-se e nesse
narrar-se que acontecem as percepções do ser deficiente, do não ser
ouvinte; percepções que legitimam as práticas terapêuticas habituais
(SKLIAR, 1998).

O autor tece um enunciado que é motivado pela compulsão colonial. Perlin


(1998) deixa claro esta interferência do problema da questão da imposição
cultural sobre a identidade do professor surdo. É evidente que as identidades
surdas assumem formas multifacetadas em vista das fragmentações a que estão
sujeitas face à presença do poder ouvintista que lhes impõe regras, inclusive,

103
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

encontrando no estereótipo surdo uma resposta para a negação da representação


da identidade surda ao sujeito surdo.

Para representar o professor surdo, nos basearemos nos conceitos definidos


por Hall (2000), entendendo a representação como sendo o processo pelo
qual a linguagem é utilizada para produzir significados culturais. É fundamental
procurar perspectivas não no campo que comumente é trabalhada a Educação
de Surdos: educação especial, medicalização da surdez, supervalorização da
incapacidade. O discurso do campo da educação especial passou, assim como os
demais conceitos criados pela Modernidade, a vestir uma aparência bem aguda
e estereotipada. Analisando, por exemplo, os Planos Nacionais de Educação
Especial, podemos perceber a indução de certa “Pedagogia Corretiva”, que tenta
corrigir e “normalizar” o surdo. Segundo Lunardi (2002, p. 23):

A educação especial como um dispositivo de normalização, ao


diagnosticar a surdez como uma anormalidade, lança mão de
suas estratégias terapêuticas e corretivas, a fim de docilizar,
disciplinar, “ouvintizar” os sujeitos em indivíduos produtivos e
governáveis para os pressupostos da episteme moderna.

Nesse contexto, os Estudos Surdos se aliam aos Estudos Culturais. Nesse


campo, há muitas identificações, principalmente quando passamos a olhar
além da carga pejorativa e clínica embutida na visão tradicional como sujeito da
episteme moderna. Segundo propõe Skliar (1998, p. 7):

As ideias dominantes, nos últimos cem anos, são uns claros


testemunhos do sentido comum segundo o qual os surdos
correspondem, se encaixam e se adaptam com naturalidade
a um modelo de medicalização da surdez, numa versão que
amplifica e exagera os mecanismos da pedagogia corretiva,
instaurada nos princípios do século XX e vigente até nossos
dias. Foram mais de cem anos de práticas enceguecidas
pela tentativa de correção, normalização e pela violência
institucional; instituições especiais que foram reguladas tanto
pela caridade e pela beneficência quanto pela cultura social
vigente que requeria uma capacidade para controlar, separar
e negar a existência da comunidade surda, da língua de
sinais, das identidades surdas e das experiências visuais, que
determinam o conjunto de diferenças dos surdos em relação a
qualquer outro grupo de sujeitos.

É o sujeito transcendental e único, o sujeito que na definição kantiana é,


simultaneamente, o sujeito cognoscente e objeto de seu próprio conhecimento.
Para Veiga-Neto (2000), o sujeito compreendido pelo pensamento moderno
representa as concepções de sujeito instauradas pela filosofia platônica e pela
tradição hebraica, que mais tarde foram retomadas pelo Cristianismo, Humanismo
e Idealismo Alemão.

104
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

Na pedagogia, podemos voltar então à adaptação do trabalho a ser feito


sobre o professor surdo, agora baseados em um novo olhar, que reflete o antigo
e situa a pedagogia de surdos do novo. A respeito dessa reflexão, podemos
destacar o pensamento de Klein (2004, p. 88) sobre a luta para a pedagogia da
diferença.

Dirigindo nosso olhar aos ‘movimentos’ surdos, encontramos


uma história de lutas em diferentes sentidos, na qual se
procura marcar, entre os próprios surdos e a sociedade em
geral, questões referentes a sua língua, suas identidades, sua
cultura. Uma das marcas mais efetivamente colocadas diz
respeito às formas de entender a surdez e a experiência do
estar sendo surdo a partir da diferença. Podemos problematizar
daí, a relação de significados entre diversidade, termo tão
disseminado nas políticas públicas, e diferença, assumida por
diferentes grupos, entre os quais, os dois surdos.

Na perspectiva dos Estudos Culturais, partimos então da ideia do sujeito


surdo como possuidor de uma cultura própria. Na relação de sua cultura com
as diferentes culturas existem relações de poder e dominação que devem ser
questionadas. Os Estudos Culturais podem fundamentar as ações educativas
para a diferença, comprometidos com a construção de uma pedagogia dos surdos
fundada na convivência entre identidades culturais e surdas. Para que isso ocorra
é necessário que sejam questionadas as relações de poder assimétricas que se
manifestam nas atitudes preconceituosas e excludentes.

Ao analisar a atuação do professor surdo, vemos também de que forma


sua postura tem sido determinada pela cultura dominante para que, caso seja
necessário, possa ocorrer a desconstrução das “condições que têm impedido
outras pessoas de falar em locais onde aqueles que são privilegiados em virtude
do legado do poder colonial assumem a autoridade e as condições para a ação
humana” (GIROUX,1999, p. 39).

Nossa pretensão, com base nessas premissas teóricas e com a perspectiva


analítica aqui retratada, foi a de caracterizar o professor surdo dentro da sala de
aula, identificar a existência do hibridismo cultural, tentando desvendar e fornecer
ferramentas para a atuação competente e completa do docente surdo.

Contudo, não se consegue fugir ainda da visão do coletivo que produz


estes discursos e práticas: a que patologiza a relação professor/ouvinte e aluno
surdo, colocando este como deficiente. Tomam seu discurso, sempre imperfeito
na forma, com locuções muitas vezes só compreendidas em parte, escrita
incorreta, como uma voz que há de ser muito pouco levada em conta. Desvaloriza
suas contribuições à pedagogia dos surdos, visto que ela é invisível. Como as
explicações feitas em uma língua incompreensível não surtem efeito, o surdo

105
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

permanece à deriva, diz-se que não se esforça para aprender, não se sabendo
ver o outro lado nobre e rico da pedagogia dos surdos.

Todo surdo é adaptado para fazer acontecer a pedagogia dos surdos?


De que modo a pedagogia dos surdos se apresenta no cotidiano do professor
surdo? Ela é perceptível, palpável, pode ser adaptada? Como ela afeta a vida do
professor surdo e do aluno surdo?

Antes de finalizar, vamos discutir sobre o papel do professor de língua de


sinais nos currículos? Ao longo de nossas articulações políticas sobre o currículo,
é importante a concepção do homem como ser sociocultural, na qualidade de
sujeito interativo e que se constitui nas relações sociais.

Então, quando tratamos de conceituar o papel do professor e,


consequentemente, a relação do professor/aluno no currículo no meio da
educação de surdos, nos referimos a uma relação cultural determinada, que está
constituída por um grupo cultural, isto é, uma relação em que ambos interagem
no espaço da sala de aula e da escola. Esta relação está determinada de maneira
particular pela cultura e valores instituídos pelo meio social.

Talvez você esteja se perguntando: será possível que o entorno cultural do


ambiente escolar refletirá em minha sala de aula? Será que na minha postura
como professor está definida minha concepção de como compreendo a construção
do saber cultural nos currículos? Minha prática contribui para combater atitudes
discriminatórias?

Então, para complementar nosso diálogo nesse exercício de identificação de


nosso discurso pedagógico, observaremos as seguintes perguntas:

• As nossas salas de aula continuam oferecendo verdades prontas?


• Continuamos no nosso tradicional ponto de observação em que os
currículos e a educação de surdos não mudam, as verdades vistas são
estabelecidas, cômodas e definitivas?
• Como os professores têm abordado a noção de conhecimento, seu
desenvolvimento e competência linguística em Língua de Sinais?
• Onde nos posicionamos perante as diferentes possibilidades da
construção de currículo do saber cultural envolvendo a comunidade
surda?

Com o objetivo de contribuir nas respostas aos questionamentos anteriores,


apresentaremos, de maneira breve, algumas concepções teóricas e, como,
através delas, podemos explicar ou compreender as diferentes metodologias e
abordagens de ensino no currículo: como estas abordagens têm considerado a

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Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

construção do conhecimento e, implicitamente, como têm refletido na prática do


professor surdo e professor bilíngue e suas relações em sala de aula.

Neste sentido, o professor não deverá depender de uma determinada


metodologia, pois nenhuma por si só daria conta da heterogeneidade do universo
de nossos alunos surdos. É determinante que a escola e o professor criem
condições para a inovação, para a autoconstrução, por exemplo, a construção
de cultura e identidade surda. O professor precisa aproximar-se dos alunos
surdos e garantir um ambiente linguístico de aproximação também entre seus
alunos surdos, percebê-los como jeito de usar a língua de sinais heterogêneas,
imprescindíveis na elaboração de currículo e de conhecimento.

Para entender o jeito cultural ao ensinar a Língua de Sinais, a escola deve


trabalhar no sentido de abafar os diferentes jeitos de ensinar que constituem o
sujeito, tornando-o mera “estratégia de interpretar a língua de sinais” do livro
didático e/ou do professor surdo, seguidor de esquemas e fornecidos a priori, cujo
objetivo parece ser o de dar consciência linguística de um processo que também
é construído a partir de generalizações e de modelos ideais do “bom leitor em
língua de sinais”, “do bom produtor de língua de sinais”, “do bom aluno surdo”.

“Faz-se necessário ressaltar que a surdez não é homogênea, ou seja, o


grupo de surdos não é uniforme. Dentro do que denominamos surdos, fazem
parte os surdos das classes populares, as mulheres surdas, os surdos negros,
surdos de zona rural, entre outros” (SKLIAR, 1998 apud GESUELI, 2006, p. 283).

Assim, temos surdos oralizados que não consideram necessária a


oficialização da língua de sinais e, em contrapartida, os surdos filhos de
pais surdos, usuários da língua de sinais brasileira, e que não se consideram
deficientes auditivos. Enfim, podemos considerar a possibilidade de múltiplas
identidades surdas, ou seja, elas são heterogêneas e apresentam diferentes
facetas.

Como reflexo dessa concepção, surge, nos métodos de ensino de línguas


nos currículos, uma abordagem comunicativa. Embora esta abordagem
tenha recebido atenção e influências de distintos paradigmas da linguística –
pragmática, linguística textual, análise do discurso e paradigmas de educação,
cultura surda na literatura surda, artes visuais, história de surdos etc. –, continuou
apresentando e conceituando a linguagem como instrumento de comunicação e
de sujeito dotado de razão e capaz de atingir a consciência linguística em Língua
de Sinais, o controle do processo de ensino-aprendizagem.

Pela construção de currículo surdo, Skliar e Lunardi (2000, p. 13)


argumentam:

107
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

O currículo nas escolas de surdos também é um artefato


cultural pelo qual o ouvintismo se atualiza e se reforça;
assim, no marco do último século foram estabelecendo-
se, sucessivamente, diferentes mecanismos e “textos” de
colonização curricular: o currículo para deficientes mentais,
para deficientes da linguagem [....].

A escola de surdos – vista como um espaço de aproximação surda – e o


que estamos denominando de “currículo surdo” – visto como uma produção feita
com a participação efetiva dos surdos para o próprio surdo – têm se configurado
mais como utopias geradas na modernidade. Utopia porque vem depositando na
presença surda e nas pedagogias surdas uma pretensa ideia de conscientização
surda, de emancipação e de salvação da condição de submissão surda ao
ouvinte.

A escola de surdos possui práticas distintas da escola especial ou da escola


de ouvintes, mas o fato de ser de surdos não rompe com a função primeira de
qualquer escola, que é a de disciplinar, socializar, normalizar e garantir a ordem
na sociedade. Nas palavras de Skliar e Lunardi (2000), o currículo nas escolas
de surdos também é um artefato cultural pelo qual o ouvintismo se atualiza e se
reforça.

Vê-se que o currículo surdo não pode ser entendido apenas no âmbito
das práticas cotidianas, de metodologias, de ter ou não ter domínio de um
vocabulário em língua de sinais; ele nem mesmo pode ser entendido como sendo
uma inclusão simplificada de conteúdos sobre a história surda, sobre a língua
escrita dos surdos etc. Um currículo surdo exige que nós pensemos na nossa
capacidade de olhar para os surdos colocando-os em outras tramas, que não
aquelas atreladas às pedagogias corretivas.

Talvez possamos compreender o currículo surdo como acontecimento, como


profanação das pedagogias que temos e que propõem pensar os surdos pelo viés
da diferença; enfim, um currículo surdo talvez exista na possibilidade cotidiana da
experiência.

É nesse currículo surdo que podem se inscrever práticas surdas não


pensadas e nem mesmo usadas com o propósito de ensinar aos sujeitos uma
forma de ser surdo, a língua de sinais, histórias surdas etc., porém, um currículo
surdo que acontece é um currículo que não conta nem com a intencionalidade
nem com a garantia de ensinar alguma coisa para alguém; ele nem mesmo conta
a possibilidade de transformar a história surda em uma história oficial. O currículo
surdo simplesmente acontece em meio às relações estabelecidas no espaço
escolar.

108
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

É importante deixar claro que contratar professores surdos para as escolas


de surdos não garante que os alunos aprendam a ser surdos. Continuamos
frisando a importância dos referenciais surdos, não para serem um modelo a ser
atingido, mas sim para funcionarem como um referente linguístico.

Enfim, pensar em um currículo surdo que possa produzir, nas relações que
se estabelecem dentro dele, outros marcadores surdos, pressupõe espaços para
a leitura do devir e para o sabor de viver o acontecimento. Devir e acontecimento
não podem constituir nem propostas pedagógicas acabadas nem, muito menos,
um currículo surdo, só podem estabelecer no acontecimento e na possibilidade de
espaço nas escolas para que outras relações e outras verdades possam circular
e formar outras marcas naqueles que vivem o currículo e fazem dele algo sempre
em movimento.

Para finalizar esse capítulo, esperamos que você tenha gostado dessa
reflexão a respeito do currículo e de como usar a didática para os alunos surdos,
respeitando o seu jeito de ensinar de uma forma cultural.

Não se esqueça de que o nosso objetivo é contribuir para que a educação


não permaneça com a visão dos deficientes, mas apresente orientações práticas
que ressaltem nossa diferença a partir da visão cultural.

E o currículo dos alunos surdos? Como devemos trabalhar com os alunos


surdos nos espaços educacionais a partir da sua identidade cultural? Também não
se esqueça de como é importante que o currículo esteja plenamente adaptado à
identidade cultural para que se possa trabalhar com base nesta nova metodologia.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Ao longo desse livro, vimos o currículo na Educação de Surdos, aprendemos
como usar o currículo por meio do jeito cultural dentro da identidade cultural e
as diversas possibilidades de identidade, bem como a questão da diferença e
da alteridade como ponto de fuga da representação proposta pelo ouvintismo.
Também evidenciamos a necessidade de usar um material didático adequado a
este sujeito e priorizar o ensino de Língua de Sinais, que se encaixa na cultura
surda. Ressaltamos que é preciso analisar a didática aplicada em Língua de
Sinais nas escolas de surdos para captar essa prática dos professores surdos e
entender o jeito como eles ensinam os alunos surdos.

Precisamos refletir e perguntar a nós mesmos: o que é o currículo para


surdos? A resposta pode variar muito e pode depender da visão de mundo que se

109
DiDáTiCA E EDuCAÇÃo DE SurDoS

tem, mas é importante perguntar a opinião dos professores surdos, o que pensam
desse currículo adequado à cultura surda e o que pensam que deve ser inserido
na grade curricular? Devemos pensar sobre como situar o papel do professor
surdo nas escolas de surdos e a visão dos ouvintes sobre ele, bem como o
currículo na Educação de Surdos. Por isso, é importante trabalhar nessa prática
para perceber como é o jeito cultural de se ensinar para alunos surdos na sala
de aula de uma forma diferenciada, específica e bilíngue, promovendo, assim, a
transgressão pedagógica dos professores surdos.

Sucesso!

110
Capítulo 3 O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

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