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SOCIEDADE E

POLÍTICAS SOCIAIS

Autoria: Luiza Maria de Assunção

1ª Edição
Indaial - 2020

UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Jairo Martins
Jóice Gadotti Consatti
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci
Marcio Kisner

Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2020


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.
A851s

Assunção, Luiza Maria de

Sociedade e políticas sociais. / Luiza Maria de Assunção. – Indaial:


UNIASSELVI, 2020.

152 p.; il.

ISBN 978-65-5646-065-9
ISBN Digital 978-65-5646-066-6

1. Políticas sociais. - Brasil. Centro Universitário Leonardo da


Vinci.

CDD 300

Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS....................................... 7

CAPÍTULO 2
TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS................................................... 51

CAPÍTULO 3
GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS............................................. 103
APRESENTAÇÃO
A disciplina “Saúde Pública” pretende colocar você em contato com conceitos
essenciais para a compreensão do processo de constituição dos Direitos
Humanos, bem como para a concretização de políticas sociais. Para tanto, trará à
luz reflexões relacionadas às declarações e pactos relativos aos Direitos Humanos
e o seu impacto em nível nacional e internacional. Buscaremos também mostrar
a relação deles com a constituição de políticas sociais em nível local e global. Ao
trazer à tona tais questões, essa disciplina possibilita a você fazer uma inserção
teórico-prática em aspectos conceituais das políticas sociais, do seu planejamento
e da sua concretização na realidade brasileira.

No Capítulo 1, você entrará em contato com os diferentes direitos que


compõem o mundo social. Para isso traremos as principais declarações e pactos
internacionais sobre Direitos Humanos. A partir daí será possível que ocorra a
reflexão sobre a interface entre direitos e políticas sociais, apontando as diferentes
demandas sociais existentes. Apresentaremos a trajetória das políticas sociais,
por meio de sua história e de seu desenvolvimento, assim como conheceremos
os seus aspectos conceituais e operacionais, introduzindo ao final como se deu a
construção das políticas sociais no Brasil. 

No Capítulo 2, você terá a oportunidade de entrar em contato com os


diferentes tipos de políticas sociais. Nesse sentido, procuraremos auxiliá-lo a
compreender como elas são constituídas, quais são suas atribuições, assim
como buscaremos apresentar as políticas setoriais enquanto nova estratégia
de concretização das políticas sociais. Por fim, refletiremos a interface entre as
políticas sociais e as demais políticas, expondo as reais possibilidades de sua
articulação, problematizando a viabilidade de concretização da intersetorialidade
na execução das políticas sociais.

No Capítulo 3, você terá informações importantes a respeito do papel


desempenhado pelos municípios na gestão das políticas sociais. Te auxiliaremos
também a compreender como a gestão em políticas sociais deve ser conduzida,
tendo por base as diretrizes nacionais oficiais. Traremos neste momento a reflexão
sobre a importância do planejamento, monitoramento e avaliação de Políticas
Sociais no Brasil. Além disso, realizaremos uma explanação de como é operado
o seu financiamento. Para tanto, procuraremos abordar conceitos e casos que
implicam na direção, na gestão e no financiamento de políticas sociais.
C APÍTULO 1
TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS
SOCIAIS

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Fazer uma explanação dos diferentes direitos que compõem o mundo social.

 Refletir a interface entre direitos e políticas sociais, apontando as diferentes


demandas sociais existentes.

 Apresentar a trajetória das políticas sociais, por meio de sua história e de seu
desenvolvimento.

 Conhecer aspectos conceituais e operacionais das políticas sociais.

 Introduzir como se deu a construção das políticas sociais no Brasil.


SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Na história das políticas sociais temos de, obrigatoriamente, fazer uma
digressão com relação ao momento na história da humanidade onde as sociedades
começaram a aventar a ideia de direitos. Fazendo essa incursão retomamos
momentos históricos singulares de constituição dos direitos humanos. Traremos
a luta daqueles que foram os maiores responsáveis por exigir e lutar por direitos:
a classe trabalhadora. Traremos igualmente os marcos relacionados ao que se
aventou, inicialmente, ser tratado como momentos introdutórios de concretização
de direitos. Por isso, relataremos a importância da perspectiva Keynesiana e o
chamado Welfare State ou Estado de bem-estar social.

A constituição de políticas sociais, ainda que esteja vinculada a momentos


e fatos históricos que as influenciaram, se dá de modo particular em cada
contexto e realidade social. Como veremos, no caso do Brasil, isso ocorrerá de
modo paulatino e posteriormente aos demais países europeus. Isso tem relação,
dentre outros fatores, com a nossa realidade colonialista e escravocrata e com
a predominância de uma elite agrária que por longo tempo foi obstáculo para o
desenvolvimento do país.

No nosso país, o primeiro arremedo de proteção de direitos veio a


ocorrer muito recentemente, por meio da Constituição de 1988 e da criação
da Seguridade social, a qual tem como pilares a saúde, a assistência social e
a previdência. Depois de muitas mobilizações pós-ditadura e com o processo
de redemocratização do país, a aprovação da Constituição Cidadã de 1988 foi
o grande passo em direção à delimitação dos deveres do estado e dos direitos
dos cidadãos, porém, ainda convivemos com a fragilidade das políticas sociais
no Brasil e a necessária luta diária para que ela seja considerada um motor de
desenvolvimento da nossa sociedade.

Importante marco para a proteção social e a implementação de políticas


sociais no Brasil, a Seguridade Social é um modelo que deve ser aprimorado
e burilado a cada dia no sentido de constituir ações e de ser cada vez mais
expressiva no objetivo de dirimir as desigualdades sociais que assolam a realidade
brasileira.

2 A SOCIEDADE E SEUS DIREITOS


Antes de falarmos sobre a história e os fundamentos das políticas sociais,
faz-se necessário introduzirmos o que se entende por direito. Para tanto, devemos
necessariamente buscar o nascimento da ideia de Direitos Humanos. Isso nos

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leva a resgatar os direitos em nível internacional e tecer a relação da defesa


desses direitos com a implantação e defesa de direitos no Brasil, ou seja, faremos
uma digressão e traremos à luz os primórdios de defesa dos Direitos Humanos e
como isso desembocou no Brasil.

Nesse sentido, é mister discorrer sobre esforços relacionadas à


implementação e à concretização de direitos em âmbito internacional, a
Declaração dos Direitos Humanos e o Welfare State. Buscamos, então, identificar
em que medida esses acontecimentos repercutiram na realidade brasileira,
identificando a partir de que momento e em que contexto surge a defesa de
direitos no Brasil.

2.1 A CARTA INTERNACIONAL DOS


DIREITOS DO HOMEM
Quando discorremos sobre Direitos Humanos devemos explorar o que foi
acordado até hoje com relação a sua efetivação. Nesse sentido, temos a Carta
Internacional dos Direitos do Homem, a qual é constituída pela Declaração
Universal dos Direitos do Homem, pelo Pacto Internacional sobre os Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais e pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Civis
e Políticos.

2.1.1 A Declaração Universal dos


Direitos do Homem
Houve em determinado momento da história uma mobilização em torno da
internacionalização dos Direitos Humanos. Isso ocorreu em consequência das
barbaridades ocorridas em função do nazismo. Assim, o pós-guerra foi o marco
dessa dinamização em torno dos direitos (PIOVESAN, 2000).

A restauração dos Direitos Humanos ocorrerá nesse cenário, em que há a


devastação dos sujeitos de direitos. Assim, acontece no ano de 1948 a aprovação
da conhecida Declaração Universal dos Direitos Humanos (PIOVESAN, 2000).

Contraditoriamente ao que postulam as declarações e convenções em


direitos humanos, os seres humanos seguem desiguais em nível de dignidade,
o que pode ser enxergado a partir das péssimas condições de vida e das
constantes transgressões no que diz respeito aos seus direitos fundamentais. Se,

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

por um lado, florescem tratados em direitos humanos, por outro lado, prolifera
a quantidade de indivíduos sem alcance aos direitos fundamentais (MODELL,
2000).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi divulgada em 1948,


depois da Segunda Grande Guerra, e tem como cerne os direitos tidos como
imprescindíveis para o ser humano. A referida declaração foi bem-aceita pela
comunidade internacional, de modo a se tornar um símbolo de orientação para
as nações, tornando-se universal, porém, ocorreu o seguinte fato: houve a
fragmentação dos Direitos Humanos, os quais se partiram em direitos civis e
políticos, por um lado, e direitos sociais e econômicos, por outro (MODELL, 2000).

O conflito entre Leste-Oeste refletiu na preferência entre as categorias de


direitos: enquanto os Estados Unidos deram ênfase aos direitos civis e políticos,
que são parte integrante da herança liberal, a União Soviética deu importância
para os direitos sociais e econômicos, que são parte da herança socialista. No
auge da Guerra Fria, o conflito entre as duas categorias de direitos – civis e
políticos versus sociais e econômicos – encontrou uma solução de compromisso.
A tentativa de avançar na aplicação da Declaração de 1948 e dar aos direitos
humanos uma conotação jurídica vinculante resultou, dezoito anos após (1966),
em dois pactos internacionais separados em dois grandes grupos: Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais. A dicotomia estava sacramentada (MODELL,
2000).

Como é possível perceber, a divisão relativa às duas categorias de direitos


foi constituída historicamente num momento em que o mundo se encontrava
polarizado pela Guerra Fria (MODELL, 2000).

Acesse o site a seguir e faça uma leitura atenta da Declaração


Universal dos Direitos Humanos:
https://cutt.ly/ugxDhfR.

Na Declaração Universal dos Direitos Humanos é adotada uma perspectiva


contemporânea de Direitos Humanos, que será identificada por questões como:
universalidade e indivisibilidade dos direitos. A primeira remetendo ao caráter
universal dos direitos humanos, que deve se estender a todos os seres humanos.

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A segunda, referindo-se à articulação que há entre os distintos direitos: direitos


civis, políticos, sociais, econômicos e culturais, ou seja, são interdependentes, de
modo que a violação de um deles reflete nos demais (PIOVESAN, 2000).

Essa dinâmica de internacionalização dos direitos, concretizada por meio


da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pode ser encarada como uma
garantia complementar de proteção dos direitos, visto que possibilita acionar o
Estado, que se omite no dever de efetivar direitos fundamentais (PIOVESAN,
2000).

Assista ao vídeo contido no site das Nações Unidas e reflita a respeito


do seu conteúdo. Disponível em: https://cutt.ly/wgxDeWZ

Tendo completado em 2018 seus 70 anos, a Declaração Universal dos


Direitos Humanos continua atual em suas propostas, porém, ainda temos muito a
caminhar no que diz respeito à garantia de direitos fundamentais.

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Oito ativistas contam suas experiências no 70°


aniversário da Declaração dos Direitos Humanos

FIGURA 1 – DECLARAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

FONTE: <loeilduplafond.com>. Acesso em: 18 ago. 2020.

Ativistas falam de suas experiências no aniversário da


Declaração dos Direitos Humanos.
No aniversário de 70 anos da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, a RFI conversou com oito ativistas de todas as partes do
mundo.
Cada um deles revela, em sua experiência individual, um
combate para levar adiante os 30 princípios defendidos no texto
oficial, do direito à vida e ao trabalho até a livre circulação e o acesso
à nacionalidade.
“O artigo número 2 fala do direito à igualdade. Ele proíbe a
discriminação baseada na orientação sexual, na raça, nas opiniões
políticas ou religiosas. Então, por exemplo, ninguém pode recusar
o acesso a um hospital por causa de sua orientação sexual ou
porque você é visto como lésbica ou gay”, explica Sheila Muwanga,
especialista dos direitos das mulheres da Fundação Human Rights
Initiative, em Uganda.
“Trabalhamos muito com a não discriminação. O casamento
gay é punido por lei, e as relações entre pessoas do mesmo sexo
são criminalizadas, mas a orientação sexual, não. Hoje, temos mais
tolerância. Antes, as famílias renegavam as crianças por essa razão,
mas agora elas começam a se abrir para essas questões”, revela
Sheila Muwanga.
Alice Mogwe, do Centro dos Direitos Humanos de Botswana,
afirma que sua organização é a única a militar pela abolição da pena
de morte na África, outro tema abordado na Declaração. “Colocamos
o fim da pena de morte no coração de todas as nossas ações. Não
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somente com relação ao governo, mas também aos cidadãos, já que


nossa atividade se baseia nos valores culturais”.

Liberdade: direito fundamental

No Oriente Médio, onde o trabalho doméstico é disfarce para


a escravidão moderna, a filipina Rosemarie Rajano, da Alliance
of Human Rights Advocates, denuncia o sofrimento de várias
conterrâneas. “Algumas são obrigadas a pular pela janela para
escapar. Elas são privadas de liberdade, seus passaportes são
confiscados, além de precisarem roubar comida e se alimentarem
escondidas nos banheiros”, revela.
“Elas trabalham para vários empregadores, várias casas,
algo que não está no contrato. O governo filipino tomou algumas
medidas, mas não que não foram suficientes. Elas são obrigadas a
deixar as Filipinas por falta de oportunidades econômicas, portanto,
as autoridades devem cuidar desse assunto”, ressalta Rosemarie
Rajano.
A fundadora da ONG Bir Duino-Quirguistão (One World
Quirguistão), Tolekan Ismailova, foi detida em 2007, passou muito frio
e guarda até hoje as sequelas. “O artigo 9 da Declaração, sobre as
detenções arbitrárias, é muito importante para meu país. A primeira
vez que fui detida foi durante as eleições dos anos 2000, quando o
presidente Akaiev prendeu vários manifestantes”, disse.
“Em 2007, fui presa com outras pessoas em condições sub-
humanas, num prédio abandonado, num frio terrível e carrego
até hoje as sequelas. Minhas articulações sofreram muito e tenho
dificuldade em me locomover”.
Para Shawan Jabareen, diretor da ONG palestina Al Haq, o
artigo 13, que fala da liberdade de circulação, deve receber mais
destaque. “Em Gaza, mais de 2 milhões de pessoas são impedidas
de sair. É proibido circular livremente fora de Gaza e isso afeta
muitos estudantes, doentes, professores. A Declaração dos Direitos
Humanos diz que toda pessoa ‘tem o direito de sair de todo país,
incluindo o seu, e de retornar’ livremente, sem restrições”.
Debbie Stothard, fundadora da Alt-sean Burma, alerta para
o desrespeito do artigo 15, sobre o direito à nacionalidade, em
Mianmar. “Para muitos, na Europa, isso não é um problema, mas é
a realidade dos refugiados e dos migrantes. Na Ásia, é um problema
enorme. Muitas pessoas tiveram a nacionalidade recusada e o direito
de circular sem perigo de um país a outro. Em Mianmar, os rohingyas
eram cidadãos birmaneses até 1982, mas uma lei confiscou a
nacionalidade”, disse. “É uma violação grave dos direitos humanos”.

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

‘Emprego é direito social’

O artigo 19, sobre a liberdade de expressão, é um verdadeiro


desafio em Bangladesh, de acordo com Adilur Rahman Khan, vice-
presidente da Federação Internacional dos Direitos Humanos (FIDH).
“Não há liberdade de expressão, de associação, ou de reunião. Os
jornalistas, os militantes nas redes sociais, os defensores de direitos
humanos são alvos recorrentes das autoridades”.
Dimitris Christopoulos, presidente da FIDH e professor de
ciência política na Universidade Panteão, de Atenas, levanta o
problema do direito ao trabalho na Grécia.
“É um direito social, e não individual, que depende da implicação
efetiva do Estado, que deve fazer de tudo para que as pessoas
tenham acesso a esse direito. Sou professor na universidade e posso
dizer que metade dos meus estudantes ficam desempregados após
obterem o diploma. Estamos falando de 54% de desemprego da
juventude grega, 26% de desemprego geral. Metade da sociedade é
afetada”, afirmou à RFI.

FONTE: <https://cutt.ly/Of583HP>. Acesso em: 18 ago. 2020.

1 Analisando a charge a seguir, em que a personagem Mafalda faz


um contraponto entre os direitos humanos e os 10 mandamentos
bíblicos, o que ela sugere com essa comparação?

FONTE: <https://brainly.com.br/tarefa/30568000>.

R.: _______________________________________________
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2.1.2 Pacto Internacional dos Direitos


Econômicos, Sociais e Culturais
Resultado, como visto anteriormente, da cisão dos Direitos Humanos em
decorrência da Guerra Fria, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais possui no seu cerne determinados direitos, são eles: direito ao
trabalho com igualdade de gênero em relação à remuneração; direito de formação
de sindicatos; direito à greve; direito à previdência e assistência social; direitos
relativos à maternidade; direitos da criança, coibindo o trabalho infantil; direito a
nível de vida justa relacionado às necessidades básicas; direito de estar a salvo
da fome; direito à saúde física e mental; direito à educação; direito à cultura e
acesso à ciência (MODELL, 2000).

Ocorre, porém, uma certa diferenciação no que concerne à aplicabilidade


dos dois pactos. Enquanto o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
deve ser obrigatoriamente assegurado pelos Estados, o Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais não é obrigatório para os Estados, os
quais apenas devem se comprometer a adotar medidas econômicas e técnicas
necessárias, tanto de ordem interna como por meio da cooperação internacional,
a fim de conseguir a plena efetividade dos direitos nele contemplados (MODELL,
2000).

Acesse o site a seguir e faça uma leitura atenta do Pacto Internacional


dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Disponível em:
https://cutt.ly/XgxDj5z

2.1.3 Pacto Internacional dos Direitos


Civis e Políticos
Demorou um tanto para que todos os países fossem adeptos do Pacto
dos Direitos Sociais e Políticos. Isso se deu devido às consequências jurídicas
relacionadas a essa adesão. Acontece que essa categoria de direitos se define
por ocasionar responsabilidades aos Estados, os quais se veem obrigados a
empregar capital para concretizá-los (MODELL, 2000).

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Há um conjunto de direitos que compõe o Pacto Internacional dos Direitos


Civis e Políticos, são eles: direito à garantia judicial; igualdade de direitos entre
homens e mulheres; direito à vida; proibição da tortura; proibição da escravidão,
servidão e trabalho forçado; liberdade e segurança pessoal; proibição de prisão
por não cumprimento de obrigação contratual; liberdade de circulação e de
residência; direito à justiça; direito à personalidade jurídica; proteção contra
interferências arbitrárias ou ilegais; liberdade de pensamento, de consciência e
de religião; liberdade de opinião, de expressão e informação; direito de reunião;
liberdade de associação; direito de votar e de ser eleito; igualdade de direito
perante a lei e direito à proteção da lei sem discriminação; e ainda direitos da
família, das crianças, das minorias étnicas, religiosas e linguísticas (MODELL,
2000).

Nesse pacto, ao contrário do anterior, para que os direitos sejam de fato


concretizados, os Estados ficam compelidos a remeter relatórios, periodicamente,
ao Comitê de Direitos Humanos, relatando quais as providências tomadas para a
execução do que foi acordado em nível de direitos.

Acesse o site a seguir e faça uma leitura atenta do Pacto Internacional


dos Direitos Civis e Políticos: https://cutt.ly/WgxDosG.

2.2 OUTROS TRATADOS


INTERNACIONAIS
Existem outros tratados internacionais de Direitos Humanos que foram
assumidos a partir de 1945 e que ampliaram a estrutura internacional dos Direitos
Humanos.

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2.2.1 Convenção para a Prevenção e


a Repressão do Crime de Genocídio
(1948)
Crucial para o desenvolvimento do Direito Internacional, emergiu a
Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, o que
ocorreu no contexto posterior às duas Grandes Guerras (SOUZA, 2011).

Ainda que a ele sejam dirigidas críticas quanto a sua factibilidade, é


considerado o primeiro tratado de Direitos Humanos da ONU, tendo conseguido
a façanha de fazer com que os países-membros introduzissem em seus códigos
penais o crime de genocídio (SOUZA, 2011).

Infelizmente, em vigor há mais de 60 anos, a Convenção não tem mostrado


muita eficiência frente à prevenção do crime de genocídio, que ocorreu em
diversos contextos e momentos e não foi coibido. Acredita-se que essa ineficácia
tenha relação com a soberania dos Estados, que muitas vezes consideram “a
questão da soberania nacional como superior à defesa e preservação dos direitos
humanos” (SOUZA, 2011, p. 89).

1 Observe a imagem a seguir referente ao campo de concentração


de Auschwitz, localizado na Polônia. Leia também o trecho do
texto “Educação após Auschwitz”, do filósofo Theodor Adorno,
pertencente à Escola de Frankfurt.

FONTE: <https://cutt.ly/ugxDxiR>. Acesso em: 18 ago. 2020.

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

“Milhões de pessoas inocentes – e só o simples fato de citar


números já é humanamente indigno, quanto mais discutir quantidades
– foram assassinadas de uma maneira planejada. Isto não pode ser
minimizado por nenhuma pessoa viva como sendo um fenômeno
superficial, como sendo uma aberração no curso da história, que
não importa, em face da tendência dominante do progresso, do
esclarecimento, do humanismo supostamente crescente” (Theodor
Adorno, Educação após Auschwitz).

FONTE: <https://cutt.ly/dgxDltj>. Acesso em: 18 ago. 2020.

Agora que você observou a imagem e leu o trecho do texto de


Adorno, realize uma pesquisa no site https://www.infoescola.com/
historia/campo-de-concentracao-de-auschwitz/ e redija ao menos um
parágrafo a respeito da relação que o campo de concentração de
Auschwitz tem com a questão do genocídio.

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2.2.2 Convenção Internacional sobre


a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial (1965)
A Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial ilustra um enorme progresso em Direitos Humanos. A
referida convenção evidencia que houve um entendimento da comunidade
internacional em torno da necessidade urgente de extirpar o racismo da vida
em sociedade. Este consenso internacional ultrapassou a própria complexidade
cultural das sociedades, de modo que todas passaram a compartilhar de uma

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linguagem quando o que está em jogo é a questão da discriminação racial


(PIOVESAN; GUIMARÃES, c2020).

Valores, como igualdade, tolerância e respeito à diferença devem ser


resguardados por meio da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de
Discriminação Racial. A grande meta é a erradicação da discriminação racial e o
incentivo de estratégias para promover a igualdade, porém, está claro que apenas
uma legislação repressiva seja suficiente para asseverar a igualdade e eliminar a
discriminação. Além disso, é preciso que se faça uso de métodos que auxiliem na
inclusão social de segmentos sociais que estiveram historicamente em situação
de vulnerabilidade (PIOVESAN; GUIMARÃES, c2020).

A Convenção possui mecanismos de monitoramento dos direitos, exigindo


dos diferentes países a apresentação de relatórios que identifiquem a maneira
através da qual cada país vem cumprindo os dispositivos da Convenção.
Sugere-se que para que a eliminação da discriminação racial se efetive, sejam
combinadas estratégias repressivas e estratégias promocionais (PIOVESAN;
GUIMARÃES, c2020).

Prezado acadêmico, a seguir, uma imagem de integrantes da


Ku Klux Klan, nos EUA, organização racista que propagava o ódio
contra os negros.

FIGURA 2 – KU KLUX KLAN

FONTE: <https://cutt.ly/kgxDcVD>. Acesso em: 18 ago. 2020.

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Acesse o site https://cutt.ly/AgxDv0G, leia o texto e reflita a


importância da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas
as Formas de Discriminação Racial, tendo em vista tal acontecimento
histórico.

2.2.3 Convenção sobre a Eliminação


de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher (1979)
A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher (CEDAW, 1979) é resultado de longa data de esforços em nível
internacional. Tem-se aí o primeiro tratado internacional que discorre acerca dos
direitos humanos das mulheres (SCHIAVO; OBREGON, 2018).

É importante esclarecer que a referida Convenção está amparada pela Carta


das Nações Unidas, na qual já consta a imprescindível igualdade de direitos
entre homens e mulheres. Tem igualmente como suporte a Declaração Universal
dos Direitos Humanos, que também faz referência a tais direitos (SCHIAVO;
OBREGON, 2018).

No artigo 1º da Convenção é colocado o conceito de discriminação contra a


mulher. A Convenção expõe também um conjunto de responsabilidades que os
estados devem observar com relação ao combate à discriminação e em defesa da
igualdade de gênero (SCHIAVO; OBREGON, 2018).

É colocada a necessária atuação dos Estados Partes de maneira que


garantam o andamento dos direitos da mulher. Nesse sentido, eles deverão
adotar medidas específicas que agilizem a concretização desses direitos, porém,
é apontado que apenas o meio normativo é insuficiente na promoção dos direitos
das mulheres, devendo haver o incentivo a medidas socioculturais e educacionais
(SCHIAVO; OBREGON, 2018).

É necessário ainda que haja o incentivo da inclusão das mulheres no âmbito


político e público do país e que a elas sejam supridas as carências nos âmbitos:
do mercado de trabalho, da área da saúde, do setor financeiro e do setor jurídico
(SCHIAVO; OBREGON, 2018).

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Observe as imagens a seguir e reflita o quanto elas significam:

FIGURA 3 – CONQUISTA DO VOTO FEMININO

FONTE: <https://cutt.ly/of6jAYr>. Acesso em: 18 ago. 2020.

FIGURA 4 – QUEIMA DE SUTIÃS

FONTE: <https://cutt.ly/2f6jSpk>. Acesso em: 18 ago. 2020.

A primeira imagem, no Brasil, em 1932, mostra a ocasião


em que o Código Eleitoral passou a garantir o direito ao voto às
mulheres brasileiras. A segunda imagem, que data de 1968, retrata
simbolicamente, mediante a queima de sutiãs, a oposição à opressão
estética a qual as mulheres estavam submetidas. A partir da sua
observação, converse com outras alunas sobre a efetividade dos
direitos das mulheres na atualidade.

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

2.2.4 Convenção sobre os Direitos da


Criança (1989)
A Convenção sobre os Direitos da Criança foi adotada em 20 de novembro
de 1989, em Assembleia Geral das Nações Unidas. Ao longo dos seus 54 artigos,
a referida convenção auxiliou em grande medida na admissão dos direitos de
crianças e adolescentes em nível internacional. A Convenção foi ratificada por
193 países, de modo que muitos deles inseriram em suas legislações estatutos
relativos ao tema (SOUZA; ALBUQUERQUE; ABOIM, 2019).

Em 1989, a Convenção sobre os Direitos da Criança aponta a necessária


proteção da infância, de modo a colocar a criança como sujeito de direitos.
Assim, as crianças começam a ser encaradas como sendo titulares de direitos
universalmente reconhecidos e que o Estado, a família e a sociedade devem
assegurar (SOUZA; ALBUQUERQUE; ABOIM, 2019).

Comparativamente à postura anteriormente vigente, que desconsiderava a


criança enquanto sujeito de direito, a Convenção sobre os Direitos da Criança
pode ser vista de forma revolucionária devido à grande mudança proporcionada
em termos culturais, normativos e sociais no que concerne ao tratamento da
criança (SOUZA; ALBUQUERQUE; ABOIM, 2019).

No Brasil, especificamente, temos o Estatuto da Criança e do Adolescente


(ECA), criado mediante a Lei nº 8.069/1990, que dispõe sobre a proteção à criança
e ao adolescente, garantindo a estes os direitos fundamentais e o exercício da
cidadania (BRASIL, 1990). Entretanto, na realidade brasileira, o que percebemos
ainda é a continuidade do trabalho infantil e o desrespeito ao direito da criança.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

1 Assista ao vídeo a seguir e descreva o que a reportagem fala da


exploração infantil no Brasil e as propostas para o seu término.

FONTE: <https://cutt.ly/igxDa1W>. Acesso em: 18 ago. 2020.

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2.2.5 Convenção sobre os Direitos das


Pessoas com Deficiência (2006)
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi assinada no
fim de março de 2007, durante a Assembleia das Nações Unidas. Essa convenção
trata do instrumental legal para fazer valer a promoção e proteção dos direitos
humanos das pessoas com deficiência (PEREIRA; LARA; ANDRADE, 2018).

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Para tanto, a referida Convenção assume um conceito social de deficiência,


de modo a distanciar-se de perspectivas estritamente biomédicas ou funcionais.
No artigo 1, as pessoas com deficiência são definidas de modo bem amplo,
incorporando tanto as deficiências físicas quanto as deficiências mentais ou
intelectuais. Mediante essa conceituação, a Convenção coloca como seus
objetivos a promoção, a proteção e a garantia do exercício integral e justo de todos
os Direitos Humanos e de todas as liberdades fundamentais para a totalidade
das pessoas com deficiência. A ideia é que os Estados Partes empreguem
providências para a inclusão das pessoas com deficiência na sociedade, bem
como para que se concretize o respeito aos seus Direitos Humanos (PEREIRA;
LARA; ANDRADE, 2018).

1 Acesse o link https://cutt.ly/Wf6kjSk e assista ao vídeo. Em


seguida, escreva um pequeno parágrafo refletindo como a ONU
tem se posicionado com relação às pessoas com deficiência.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

3 HISTÓRIA E FUNDAMENTOS DAS


POLÍTICAS SOCIAIS
Antes de mais nada, é necessário expor aqui o que se entende por política
social. De acordo com Fleury e Ouverney (2008), política social consiste em
um termo empregado de forma restrita para se referir a todas as políticas que
os governos desenvolvem voltadas para o bem-estar e a proteção social. Em
uma concepção mais ampla, a política social abrange tanto os meios pelos
quais se promove o bem-estar em cada sociedade quanto os determinantes do
desenvolvimento social. Neste sentido, deixa de ser uma ação exclusivamente
governamental para envolver outros atores sociais.

Existem muitas formas de se definir política social, por exemplo, de acordo


com os propósitos, setores, problemas, processos decisórios, relações de poder e
funções. Cada uma delas apresenta vantagens e desvantagens específicas. Uma
das definições mais utilizadas concebe a política social como conjunto de ações
que objetivam a promoção da igualdade e do bem-estar, enfatizando, assim, os
valores que guiam tais ações. Este é um aspecto importante porque as políticas
sociais são sempre orientadas por valores, embora, em muitos casos, não haja
correspondência entre o resultado final e os objetivos iniciais da política.

A criação de políticas sociais se deu em resposta ao modo como a questão


social vinha sendo encaminhada na sociedade capitalista, a qual tem no seu cerne
uma relação desigual e de exploração pelos que detêm o capital em detrimento
daqueles que dele são despossuídos e que têm apenas a sua mão de obra
enquanto moeda de troca (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

Para início de conversa, o que o Coeficiente de Gini nos mostra é que há


desigualdade social. Lembrando que o Coeficiente de Gini realiza suas medidas
tomando um número entre 0 e 1, de modo que 0 pode ser identificado com a
absoluta igualdade e 1 pode ser referido como a absoluta desigualdade. O que de
forma mais ilustrativa pode ser apresentado por meio do mapa a seguir.

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

FIGURA 5 – COEFICIENTE DE GINI

FONTE: <https://cutt.ly/Yf6kSOc>. Acesso em: 18 ago. 2020.

Conforme o mapa apresentado anteriormente, ao tomar o coeficiente de


Gini, é possível medir o nível de desigualdade na distribuição de renda, de modo
a identificar numa população determinada onde está localizada a parcela da
população que detém mais renda e a que detém menos renda.

3.1 O LIBERALISMO, O CAPITAL E A


FORÇA DO MERCADO
De acordo com Behring e Boschetti (2011), o liberalismo, extremamente
arraigado no intervalo que vai da metade do século XIX até a terceira década do
século XX, tem como pilar a perspectiva do trabalho como mercadoria, bem como
a sua regulação pelo mercado.

Baseada na perspectiva smithiana do livre mercado, a ideia é que essa


liberdade ilimitada é que proporciona o bem-estar e o bem comum. Nessa direção,
para que o mercado regule as relações sociais, é necessário que o Estado tenha
atuação mínima, sendo visto na perspectiva liberal como um mal necessário
(BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

Na perspectiva liberal, existem capacidades presumidamente inatas e cabe


a cada indivíduo potencializá-las. Além disso, o capitalismo liberal argumenta a

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

favor da frágil intervenção do Estado na garantia de direitos sociais (BEHRING;


BOSCHETTI, 2011).

Existem alguns aspectos cruciais do liberalismo relativos à atuação mínima


do Estado no sentido de introdução de políticas sociais. As autoras apontam:
o predomínio do individualismo; o bem-estar individual maximiza o bem-estar
coletivo; o predomínio da liberdade e competitividade; a naturalização da miséria;
o predomínio da lei da necessidade; a manutenção de um Estado mínimo; as
políticas sociais estimulam o ócio e o desperdício; a política social deve ser um
paliativo (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

1 Acesse o link: https://cutt.ly/qgxDnVk e assista à entrevista da


professora Ivanete Boschetti a respeito da política social. Qual a
reflexão que a especialista realiza com relação às políticas sociais
de um modo geral e no contexto brasileiro em específico?

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

3.2 O PAPEL DA CLASSE


TRABALHADORA
As origens das políticas sociais têm estreita relação com as lutas travadas
pela classe trabalhadora. A imagem a seguir é paradigmática de como o
trabalhador teria sido transformado numa engrenagem das máquinas, perdendo
sua identidade e sendo consumido pelo modo de produção capitalista, em que
realiza um trabalho alienado, sem contato com o resultado do produto do seu
trabalho.

FIGURA 6 – CENA DO FILME TEMPOS MODERNOS

FONTE: <https://cutt.ly/zf6zuuF>. Acesso em: 18 ago. 2020.

O filme Tempos Modernos, que tem como protagonista Carlitos, ilustra a vida
urbana nos EUA em 1930, onde já predominava o modo de produção industrial
ancorado na divisão do trabalho, bem como na sua especialização. O operário
se responsabiliza por determinada fase da produção, a qual deve acontecer em
tempo reduzido e de forma repetida. A repetição e a destituição do produto do seu
trabalho fazem com que esteja alienado nesse processo. Trata-se de uma forte
crítica ao modo de produção industrial capitalista, que tem no seu cerne a busca
pelo lucro desenfreado e a exploração sem limites da classe trabalhadora, a qual
é engolida pelo poderio do capital.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Acesse o link: https://cutt.ly/AgxDQJj e assista ao trecho do filme


“Germinal”, baseado no romance de Émile Zola. Converse com seus
colegas sobre suas reflexões acerca do filme.

A Revolução Industrial provocou uma série de transformações


políticas, econômicas e sociais na história. O escritor francês Émile
Zola (1840-1902) representou essas transformações brilhantemente
em uma das suas mais célebres obras, “O Germinal”. Inspirado pela
obra de Zola e pela escola literária denominada “Naturalismo”, o
romance foi adaptado para o cinema sob a direção de Claude Berri,
em 1993.
O filme “O Germinal” aborda as relações de trabalho, as lutas de
classe existentes na sociedade capitalista, o processo de instalação
do capitalismo nas cidades e o ritmo da produção e da exploração
dos trabalhadores pelos patrões através do trabalho desumano
nas minas de carvão francesas, retratando claramente as severas
transformações sociais impostas pelo modo de produção capitalista.
O título do filme faz relação com o processo de desenvolvimento
e de amadurecimento dos movimentos grevistas das minas de carvão
do século XIX na França. Essas manifestações foram provocadas
pelas condições precárias de trabalho, pela miséria, exploração e
pelos baixos salários impostos pelos patrões ao operariado.

FONTE: <https://cutt.ly/vf6zdxe>. Acesso em: 18 ago. 2020.

30
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Os trabalhadores, na metade do século XIX, estruturaram as caixas de


poupança e previdência como artifício para a organização operária e com
vistas a possibilitar que os trabalhadores se mantivessem em greve (BEHRING;
BOSCHETTI, 2011).

O empenho e a mobilização dos trabalhadores enquanto classe foram


fundamentais para que ocorresse uma significativa transformação no que
concerne ao formato do Estado liberal relativamente ao fim do século XIX e início
do século XX. A classe trabalhadora, ancorada em pautas, como emancipação
humana, socialização da riqueza e sociabilidade não capitalista, proporcionou
consideráveis conquistas no que diz respeito aos direitos políticos, como direito ao
voto, direito à organização sindical e partidária, direito à liberdade de expressão e
de manifestação (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

O fato é que a atuação da classe trabalhadora auxiliou em grande medida na


ampliação dos direitos sociais, bem como no tensionamento, no questionamento
e na mudança com relação ao papel do Estado no contexto do capitalismo
(BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

Importante salientar que a emergência de políticas sociais ocorreu de


forma paulatina e distinta de acordo com os diferentes países e contextos
sociais, estando vinculada em grande parte a já referida pressão exercida por
parte da classe trabalhadora, bem como do nível de desenvolvimento das forças
produtivas. Há um consenso quanto ao fato de que o final do século XIX seria a
fase em que o Estado capitalista começa a adotar e a concretizar ações sociais
de modo mais estruturado e com natureza obrigatória (BEHRING; BOSCHETTI,
2011).

Ao longo do processo de Depressão, nos EUA, ocorre uma multiplicação


lenta em termos de políticas sociais, que se estenderá até 1939, e se difundirá
no início da fase de expansão após a Segunda Guerra Mundial (BEHRING;
BOSCHETTI, 2011).

A “revolução keynesiana”, em sintonia com a experiência do New Deal, foi


uma forma de inspiração principalmente para as tentativas da Europa em sair da
crise. Nesse contexto, ocorre uma generalização das políticas sociais, tendo sido
resultantes do estabelecimento de um acordo social com frações do movimento
operário, crucial nessas mudanças (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

3.3 O WELFARE STATE OU ESTADO


DE BEM-ESTAR SOCIAL
O Estado de Bem-Estar Social é constituído, na Europa, depois da Segunda
Guerra Mundial. Importante salientar que um dos pilares para o sistema de
proteção social em diversos países europeus foi o Plano Beveridge, que data de
1942.

Esse sistema de proteção teve como norte a concepção de Seguridade


Social, a qual era tomada enquanto um rol de programas focados na proteção
contra as seguintes adversidades humanas e sociais: doença, desemprego, a
morte de arrimo da família, envelhecimento, deficiência, acidentes etc. (YAZBEK,
2008).

De modo geral, o Estado de Bem-Estar Social tem sido definido em torno


da responsabilidade que o Estado possui com relação ao bem-estar de seus
cidadãos. Nesse sentido, ele deve proporcionar um nível básico de vida para
todos mediante um conjunto de serviços (YAZBEK, 2008).

Ocorre que há uma relação entre as Políticas de Bem-Estar Social e a


demanda por administrar as contradições inerentes à reprodução da sociedade
capitalista. Nessa perspectiva, o que vemos é que o Estado social nada mais é
do que uma modalidade de Estado ajustado às determinações econômicas e que
tem na Política Social uma maneira de admitir os direitos sociais, os quais são, no
final das contas, corretivos de uma estrutura de desigualdade (YAZBEK, 2008).

Na realidade brasileira, em particular, o sistema de proteção social pode ser


visualizado, inicialmente, por meio da Lei Eloy Chaves, de 1923. Nela, iniciam-se
as chamadas Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs).

É somente nos anos de 1930 que a questão social toma maiores proporções.
Nesse momento, são criados os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs) na
perspectiva do seguro social. Aos poucos, o Estado vai ampliando mecanismos de
proteção social, objetivando diminuir as desigualdades e garantir direitos sociais.
No entanto, isso não proporcionou o reconhecimento e o status de Estado de
Bem-Estar Social. O que o Estado brasileiro fez nesse momento foi privilegiar o
seguro social e se posicionar em termos de direitos sociais de forma paternalista
e controladora (YAZBEK, 2008).

Foi no Estado Novo, com Getúlio Vargas, que as políticas sociais começam
a se desenvolver como reflexo do processo de industrialização e das demandas

32
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

sociais advindas dele. Nessa ocasião, porém, institui-se uma divisão: de um lado, a
atenção previdenciária aos trabalhadores formais, de outro lado, os trabalhadores
informais, sem respaldo algum, dependendo de instituições sociais. O trabalhador
pobre sem carteira assinada se valia de obras sociais e filantrópicas. Nesse
sentido, em termos estatais, a atenção a essa parcela da população se calcará na
lógica da benemerência (YAZBEK, 2008).

No Brasil, com a Constituição de 1988, é estabelecido o sistema de


Seguridade Social. Ainda assim, mesmo dando esse grande passo, é necessário
apontar que as políticas sociais brasileiras acabaram por tomar uma tendência
compensatória e seletiva, o que as colocaram no rumo dos não direitos e da não
cidadania (YAZBEK, 2008).

Ocorre que a incipiente proposta de Seguridade Social estabelecida pela


Constituição de 1988 será rapidamente colocada diante de uma contradição
(consequência do avanço do neoliberalismo) difícil de desfazer: se, de um lado, o
Estado brasileiro com a Constituição Federal indica o necessário reconhecimento
de direitos, por outro lado, esse mesmo Estado compactua com a nova ordem
capitalista, tendo de se moldar a ela (YAZBEK, 2008).

De acordo com Fleury e Ouverney (2008), os sistemas de proteção social


emergiram na Europa no final do século XIX. Considerando que esses sistemas
emanaram em sociedades nacionais específicas, o modo como foram conduzidos
tem estreita relação com a configuração social de cada sociedade, ou seja, com
a realidade e o contexto próprios de cada sociedade. No entanto, a despeito das
diferenças existentes em cada contexto, Fleury e Ouverney (2008) consideram
possível traçar três tipos ideais de sistemas de proteção social.

Analisando casos históricos do desenvolvimento dos sistemas de proteção


social em países considerados industrializados, foi possível construir uma tipologia
das formas de proteção social. A construção de tipos ideais organiza em grupos
as características que, em geral, aparecem em conjunto nos sistemas de proteção
social. Contudo, nem todas as características de cada grupo se apresentaram
em cada caso histórico concreto. Daí utilizarmos a noção de tipos ideais. O uso
desses tipos ideais tem como objetivo identificar distintos modelos de proteção
para a comparação entre países e para a análise de realidades concretas.

Nesta tipologia, além dos elementos ideológico e valorativo que estão nas
bases dos sistemas de proteção, são apresentados os elementos organizativos
e institucionais que viabilizam a implementação das opções políticas adotadas
em cada caso. Por fim, nessa tipologia, são assinaladas as relações entre os
modelos de proteção social e as condições de cidadania geradas em cada caso.
Vamos observar que os sistemas de proteção social, ainda que possam oferecer

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

benefícios similares, tendem a projetar efeitos políticos com relação à cidadania,


que podem ser altamente diferenciados. Em outras palavras, cada sociedade
responde à necessidade de criar políticas de proteção social de acordo com os
valores compartilhados, com suas instituições, com a relação de maior ou menor
peso do Estado, da sociedade e da comunidade. Em cada contexto singular, com
uma dada relação das forças sociais, emergirá um modelo de proteção social
peculiar àquela sociedade.

Os diferentes modelos podem ser entendidos a partir da modalidade


de proteção social que provê os critérios de organização dos sistemas e
de incorporação das demandas sociais, por meio de uma institucionalidade
específica. Assim, encontramos as seguintes modalidades da proteção social: a
assistência social, o seguro social e a seguridade social. Os modelos variam no
que toca à concepção de políticas sociais e suas instituições.

Fleury e Ouverney (2008) apresentam os seguintes modelos de proteção


social.

QUADRO 1 – MODELOS DE PROTEÇÃO SOCIAL

FONTE: Fleury e Ouverney (2008, p. 10)

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Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

No modelo denominado assistência social, o indivíduo somente é foco


da política social se comprovar sua condição de miserabilidade. Por isso, é
denominada cidadania invertida, visto que o indivíduo não é enxergado como
possuidor de um direito, mas alguém que recebe o benefício por sua condição
carente (FLEURY; OUVERNEY, 2008).

Enquanto a assistência é direcionada para os despossuídos, o seguro


social está orientado para trabalhadores formais e organizados politicamente. O
que vemos, então, é uma vinculação da política social à inserção no mercado
de trabalho, situação denominada de cidadania regulada (FLEURY; OUVERNEY,
2008).

No modelo de Seguridade Social, o que se tem são políticas públicas


calcadas na justiça social, na qual para todos os cidadãos é assegurado o direito
a um mínimo vital. Baseado historicamente no plano Beveridge, o qual pela
primeira vez na história prevê a necessária garantia da condição de cidadania dos
indivíduos, de modo que estes tivessem a manutenção de seus direitos sociais
por parte do Estado. A garantia de direitos se dá independente de contribuições
anteriores, havendo como norte apenas a necessidade dos indivíduos. Isso
torna possível o caminhar para uma redistribuição que prima pela reparação
das desigualdades. Fala-se, assim, nesse modelo, de uma cidadania universal
(FLEURY; OUVERNEY, 2008).

Welfare States (Estados de Bem-Estar Social)

Este termo designa as políticas desenvolvidas em resposta ao


processo de modernização das sociedades ocidentais, consistindo
em intervenções políticas no funcionamento da economia e na
distribuição social de oportunidades de vida, que procuram promover
a seguridade e a igualdade entre cidadãos, com o objetivo de
fomentar integração social das sociedades industriais altamente
mobilizadas. Primeiro, os Welfare States consistem em uma resposta
às crescentes demandas por seguridade socioeconômica em um
contexto de mudança na divisão do trabalho e de enfraquecimento
das funções de seguridade das famílias e associações debilitadas
pela Revolução Industrial e a crescente diferenciação das sociedades.
Segundo, eles representam respostas às crescentes demandas por
igualdade socioeconômica surgidas no processo de crescimento dos
Estados nacionais e das democracias de massa com a expansão da
cidadania. Nesta perspectiva, os Welfare States são um mecanismo

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

de integração que neutraliza as características destrutivas da


modernização, e sua essência reside na responsabilidade pela
seguridade e pela igualdade, realizada por meio de políticas
distributivas.

FONTE: FLEURY, S.; OUVERNEY, A. M. Política e sistema


de saúde no Brasil. 2008. Disponível em: https://cutt.ly/Df6zQVX.
Acesso em: 27 ago. 2020.

3.4 OS DIREITOS NO BRASIL:


A REDEMOCRATIZAÇÃO, A
CONSTITUIÇÃO CIDADÃ DE 1988 E A
SEGURIDADE SOCIAL
No contexto brasileiro, assim como no contexto de outros países, existem
particularidades que condicionam a constituição das políticas sociais, bem como
o modo como elas se desenvolvem. O Brasil, país periférico, não foge a essas
particularidades que, inclusive, relacionam-se ao seu status de país marginal no
mundo capitalista (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

O que se desenrolou no contexto brasileiro foi, desde o início, a inexistência


de engajamento convincente com relação à proteção dos direitos dos indivíduos,
que se apresenta enquanto algo inabalável na formação brasileira e como algo
imprescindível para realizar uma reflexão sobre a configuração da política social
no Brasil (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

Vivíamos num país onde predominavam os interesses de uma aristocracia


agrária e onde a modernização não havia sido concretizada com efetividade
para que trilhássemos um caminho diferente. A condição estrutural brasileira não
propiciou, ao contrário de outros países, a elaboração de uma conscientização,
bem como de uma ação política do operariado, o que apenas veio a ocorrer no
começo do século XX. Assim, podemos afirmar que o advento da política social
no Brasil não acontece em momento histórico equivalente ao dos países de
capitalismo central (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

Assim, a questão social apenas se apresentou como questão política no Brasil


a partir da primeira década do século XX, graças ao esforço e enfrentamento dos

36
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

trabalhadores que pressionaram no sentido da criação de legislação direcionada


para o mundo do trabalho. A classe trabalhadora, ainda que tardiamente se
comparada a outros países, reivindicou direitos sociais, principalmente direitos
trabalhistas e previdenciários (BEHRING; BOSCHETTI, 2011).

Greve Geral de 1917

A Greve Geral de 1917 foi um movimento urbano de paralisações


no trabalho iniciadas por empregados de fábricas do setor têxtil na cidade
de São Paulo, em julho de 1917. Desde o início do ano de 1917, houve
paralisações nas fábricas da cidade, reivindicando melhores condições
de trabalho e aumento salarial, que ao longo daquele ano difundiram-
se até constituírem uma Greve Geral no mês de julho. A carestia e o
aumento da carga horária de trabalho foram os fatores materiais que
levaram os trabalhadores a suspender dias de exercício das funções
que realizavam. A emergência dos ideais anarquistas e socialistas foram
os fatores subjetivos necessários à expansão do movimento grevista.
A conjuntura internacional da Primeira Guerra Mundial e o
crescimento dos movimentos operários impactaram a política e a
economia brasileiras, inclusive, influenciando o desencadeamento
da Greve Geral. A ampliação da exportação de insumos básicos da
alimentação aos países aliados na Primeira Guerra Mundial gerou
aumento dos preços no mercado interno e acarretou na carestia que
atingiu, sobretudo, os trabalhadores. A ampliação da exportação dos
produtos nacionais também ocasionou o aumento da carga horária de
trabalho para a ampliação da produção voltada ao mercado externo.
Já o crescimento dos movimentos operários pelo mundo possibilitou
aos trabalhadores o desenvolvimento teórico que os respaldou. No
caso da Greve Geral, em São Paulo, destacou-se a interpretação do
“anarcossindicalismo” dos pensadores Malatesta e Sorel.
O movimento grevista de 1917 foi composto, sobretudo, por
imigrantes italianos. Esses imigrantes trouxeram do país de origem os
ideais anarquistas e socialistas que embasaram a greve. Não somente
os operários eram majoritariamente italianos, também predominavam
entre os proprietários das fábricas os imigrantes dessa nacionalidade,
que já haviam entrado em contato anteriormente com a forma de
organização dos trabalhadores na Itália. A participação da Itália na
Primeira Guerra Mundial era outro elemento que se somava ao conflito
entre patrões e empregados, pois havia quem era favorável à entrada
do país na guerra e aqueles que eram contrários. Havia, inclusive, a

37
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

obrigatoriedade de doação de parcela do salário dos trabalhadores ao


Comitê Italiano Pró-Pátria de São Paulo, que enviava verbas para o
empenho bélico da Itália na Grande Guerra. Entre as pautas da greve
da fábrica Crespi estava a abolição dessa contribuição (Cf. BIONDI).
O cotonifício Crespi foi a primeira indústria na qual eclodiram
paralisações. Os trabalhadores do cotonifício estavam insatisfeitos com
a nova exigência do trabalho noturno e, por isso, entraram em greve
para reivindicar, além da extinção da contribuição ao esforço bélico
italiano, aumento salarial e a regulamentação do trabalho de mulheres
e crianças. Esse movimento grevista influenciou o desencadeamento
de paralisações em outras fábricas, e as greves disseminaram-se
rapidamente entre as pequenas oficinas e fábricas de grande porte,
como Crespi, Antarctica, Fábrica Mariangela de Matarazzo, Estampería
Matarazzo, Tecidos de Juta, Lanifício De Camillis (Cf. Idem).
Para coordenar as greves, foi criado o Comitê de Defesa
Proletária, em 9 de julho, composto por lideranças sindicais anarquistas
e socialistas. Além das paralisações, houve também em julho embates
de rua com assaltos e com ataques à cavalaria da polícia. Nesses
protestos de 11 e 13 de julho ocorreram as mortes de Nicola Salermo,
José Gimenez Martinez e da menina Edoarda Bindo, que causaram
comoção popular e praticamente destituíram os poderes de governo na
cidade (Cf. Idem).
Somente em 14 de julho houve a assinatura de um acordo entre
empresários, o secretário de segurança pública Eloy Chaves e o Comitê
de Defesa Proletária. Nesse acordo, os empresários e os secretários
comprometiam-se em não fazer retaliações aos operários grevistas, em
aumentar os salários, em libertar os operários que foram detidos em
manifestações e garantir o direito de reunião. Apesar dessa negociação,
o movimento grevista alcançava o ápice e, em 16 de julho, as greves
espalhavam-se por cerca de 90 estabelecimentos e contavam com
quase cinquenta mil trabalhadores. Somente no fim do mês de julho
ocorreu o descenso do movimento com a diminuição de grevistas e de
estabelecimentos com operários em greve (Cf. Idem).
A Greve Geral de 1917 foi o primeiro movimento grevista expressivo
ocorrido até aquele momento no Brasil. Como punição aos grevistas,
muitos foram expulsos do país com a aplicação da Lei Adolfo Gordo
(de 1907), que tinha como foco desmobilizar o anarcossindicalismo. Os
líderes sindicais Teodoro Monicelli e Luigi Damiani tiveram que retornar
à Itália com a aplicação dessa lei. A legislação trabalhista da década
de 1920 também foi criada a partir das necessidades de respostas ao
movimento grevista e como forma de contenção de sublevações. Após
a Greve Geral de 1917 ressurgiram ligas de ofício que existiam antes de
1914 e surgiram várias ligas operárias (Cf. Idem). O período ascensional

38
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

do movimento operário perdurou de 1917 a 1920, irradiando-se para as


regiões periféricas da cidade de São Paulo e para a cidade do Rio de
Janeiro.

FONTE: RODRIGUES, N. Greve geral de 1917. 2020. Disponível


em: https://cutt.ly/df6zONL. Acesso em: 18 ago. 2020.

A adesão brasileira à dinâmica internacional dos Direitos Humanos ocorre


com o processo de redemocratização do país, efetuado em 1985. Com a
Constituição Federal de 1988 a incorporação de direitos fica mais evidente. Na
Carta Magna foram ratificados: a Convenção Interamericana para Prevenir e
Punir a Tortura; a Convenção sobre os Direitos da Criança; o Pacto Internacional
dos Direitos Civis e Políticos; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais; a Convenção Americana de Direitos Humanos; a Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.

1 Acesse o link a seguir, leia o artigo e descreva o que significou o


movimento das Diretas Já e qual a sua relação com os Direitos
Humanos. Disponível em: https://cutt.ly/egxDROm.

R.: ____________________________________________________
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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

De acordo com Piovesan (2000), existe uma relação clara entre a democracia
e os Direitos humanos. Tal relação acontece no seguinte sentido: o processo
de democratização brasileira consente a certificação de importantes tratados
internacionais sobre Direitos Humanos, por seu turno esta certificação consente o
robustecimento do processo democrático.

FIGURA 7 – SEGURIDADE SOCIAL

FONTE: A autora

Historicamente, as áreas que são contempladas pelas políticas sociais


são as áreas da saúde, da previdência e da assistência social, as quais estão
tradicionalmente vinculadas ao bem-estar social. De acordo com Fleury e
Ouverney (2008), cada uma dessas áreas está voltada para a proteção coletiva
contra riscos específicos e, portanto, possuem aspectos singulares de elaboração,
organização e implantação, assim como diferem em termos de técnicas,
estratégias, instrumentos e objetivos específicos almejados. Esses aspectos da
dinâmica de cada uma das áreas da política social são complexos e importantes
no desenvolvimento dos sistemas de proteção social, uma vez que são nesses
aspectos que os sistemas adquirem forma concreta e agem diretamente sobre a
realidade social.

40
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Prezado acadêmico, acesse o link: https://cutt.ly/2gxDT2L,


assista ao vídeo e reflita sobre a importância da Seguridade Social
Brasileira.

1 Acesse o site a seguir e leia o Artigo 194 da Constituição Federal,


que trata da Seguridade Social. Aponte quais os objetivos do
poder público para organizar a Seguridade Social. Disponível em:
https://cutt.ly/rgxDUeY.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

3.5 A LEI ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA


SOCIAL (LOAS), A POLÍTICA
NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
(PNAS) E O SISTEMA ÚNICO DE
ASSISTÊNCIA SOCIAL (SUAS)
Nesse contexto, tem-se a assistência social direcionada para os direitos de
cidadania e não como algo vinculado à caridade ou a favor. A Assistência Social,
direito do cidadão e dever do Estado, é política de seguridade não contributiva,
que provê os mínimos sociais (Art. 1° da LOAS) (BRASIL, 1993).

A partir de 1988, a assistência social no Brasil passou a ser tida como


direito do cidadão e dever do Estado. Antes, existiam ações assistencialistas,
as quais não tinham como foco o atendimento das demandas básicas dos
cidadãos. Posteriormente, a assistência social foi assumida enquanto política
pública de Seguridade, devendo assim consumar direitos sociais mencionados na
Constituição Federal de 1988, bem como na Lei Orgânica da Assistência Social
(LOAS) de 1993 (PEREIRA, 2007).

A assistência social passou a ser considerada enquanto: política pública;


política de natureza incondicional; política de competência do Estado com
o controle da sociedade. Enquanto política pública, ela obteve um espaço
institucional específico, a Secretaria Nacional de Assistência Social, junto ao
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. A Política Nacional de
Assistência Social (PNAS), de 2004, desenvolvida junto a esse Ministério, prevê e
define o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) (PEREIRA, 2007).

Assim, o SUAS torna-se um instrumento de organização no que diz respeito


a preceitos, ações e procedimentos anunciados pela LOAS e pela PNAS, de
modo a garantir operacionalmente que a Política seja implementada e gerida.
Nesse sentido, o SUAS proporcionará informações sobre a organização, a oferta,
a localização e a destinação de serviços, benefícios, bem como de programas
e projetos previstos na LOAS e na Política. Também é por meio dele que será
definido de que maneira serão realizados o monitoramento e a avaliação do
próprio sistema e de seus alcances e limitações (PEREIRA, 2007).

42
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Acesse o link http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8742.htm


e leia a Lei nº 8.742/93, que dispõe da Lei Orgânica da Assistência
Social (LOAS). Acesse também o link: https://cutt.ly/uf6zMWr e
conheça o Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

A concepção e a efetivação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)


significam uma grande evolução em termos de edificação das políticas sociais
no Brasil, em particular no que concerne à política de assistência social. Ainda
que tenha demorado para se tornar parte da Seguridade Social e que sua
regulamentação enquanto direito social tenha sido tardia, o que ocorreu por meio
da Lei Orgânica da Assistência Social em 1993, a assistência social revela as
contradições e os obstáculos, no Brasil, quando o que se pretende é a garantia e
a consolidação de direitos (BOSCHETTI, 2005).

1 Observe a charge a seguir e escreva um parágrafo refletindo o


que ela quer dizer em termos de direitos fundamentais e políticas
sociais.

FONTE: <https://cutt.ly/QgxDIv2>. Acesso em: 18 ago. 2020.

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As políticas sociais devem assegurar direitos fundamentais, mas nem sempre


conseguem intervir de forma efetiva na realidade desigual e discriminatória
vivenciada no contexto brasileiro. Atualmente, mais do que nunca, temos visto
por meio da drástica crise advinda com a pandemia da COVID-19, o quanto as
políticas sociais são imprescindíveis.

Leia a reportagem a seguir.

Os impactos da pandemia no sistema de Seguridade Social

“Todo o sistema de Seguridade Social no Brasil, criado com


a Constituição Federal de 1988, foi colocado em prova diante da
equação dos problemas nas áreas da Saúde, Assistência Social
e Previdência”. A afirmação é do advogado, especialista em
Seguridade Social e professor da Unit, Guilherme Teles, que faz uma
análise da crise de saúde mundial provocada pelo novo coronavírus
(COVID-19), que estabeleceu um dos cenários mais complexos no
que diz respeito à importância da preservação à vida, à saúde e ao
seu bem-estar.
“Importante lembrar que em 1947, a Organização Mundial
da Saúde (OMS), estabeleceu como conceito universal de saúde:
“Um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não
apenas a ausência de doença ou enfermidade”. No entanto, alguns
pesquisadores e profissionais da área da saúde relatam que esta
definição é mais utópica do que operacional, porém esta definição é
válida até os dias atuais”, diz também o historiador.
Guilherme Teles destaca a relevância dos direitos sociais
constitucionais na vida dos cidadãos brasileiros diante dos impactos
que a pandemia da COVID-19 está causando. “É fato que mesmo
após 31 anos da promulgação da Constituição Federal, um dos
maiores desafios do Estado brasileiro é exatamente reduzir ou
mesmo erradicar a desigualdade social, um dos maiores problemas
do país há anos e que parece estar longe de encontrar uma solução
eficiente e eficaz em um curto espaço de tempo”.
No entendimento do prof. Guilherme, Presidente da Comissão de
Direito Previdenciário da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional
Sergipe (OAB/SE), em meados do mês de março de 2020, quando foi
declarada a pandemia pela OMS, caberia ao Estado brasileiro adotar
todas as medidas possíveis, sobretudo, amparado na Seguridade
Social, para que os danos causados à população fossem os menores

44
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

possíveis. “O Art. 6º da Constituição Federal aduz explicitamente


os direitos sociais. Para reforçar a importância da proteção social,
o Art. 194 traz o seguinte: “A seguridade social compreende um
conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da
sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social”. Os direitos sociais originam-se de
algo ainda maior, ou seja, da própria justiça social, tão fundamental
para uma vida em sociedade pautada na fraternidade e mais do que
isso, pois o Art. 1º da Constituição traz como um dos fundamentos da
República exatamente a dignidade da pessoa humana”.

Proteção social

Um dos maiores sistemas de proteção social do mundo existe


no Brasil. Previsto na Constituição Federal a partir do Art. 194,
está composto pela Saúde, Assistência Social e a Previdência,
fundamentais neste momento de enfrentamento ao novo coronavírus
(COVID-19). “A universalidade da cobertura e do atendimento
à saúde, por exemplo, é o que tem minimizado os impactos da
COVID-19 para praticamente 70% da população brasileira que
depende exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS). A
saúde pública e gratuita é de fácil percepção na sociedade brasileira,
mas nem sempre foi assim na história do país e somente a partir
de 1988 que a Saúde recebeu o status constitucional, sendo criado
posteriormente um dos maiores sistemas públicos de saúde do
mundo, o SUS”, lembra.
Guilherme Teles levanta ainda a questão da importância
da Assistência Social, voltada àqueles que, comprovadamente,
necessitam da ajuda do Estado, a exemplo das medidas adotadas
pelo governo federal em conjunto com o Congresso Nacional com
a aprovação da Lei nº 13.982/2020, que trouxe a possibilidade
de pagamento de R$ 600,00 para aquelas pessoas que estão em
situação de vulnerabilidade social neste momento de pandemia,
mas critica a operacionalização desta ajuda. “Parece estar aquém
das reais necessidades e da urgência daqueles que mais precisam,
dos mais vulneráveis socialmente. Na outra ponta, ainda sobre a
Assistência Social, estados e municípios estão se empenhando
dentro das suas possibilidades para amparar os mais necessitados
com programas de transferência de renda. Os esforços são muitos,
por partes de alguns entes federativos, mas ao mesmo tempo,
deve-se ressaltar que assistência social vai muito além de propiciar
transferência de renda, sobretudo, quando o isolamento adotado
por causa da pandemia reduz diversos serviços prestados pelas
secretarias de serviço social”, atenta.
45
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Previdência Social

Os impactos da COVID-19, na perspectiva da Seguridade Social,


estão ligados diretamente à queda na quantidade de contribuições
previdenciárias e ao mesmo tempo ao aumento das solicitações de
pagamentos dos mais diversos benefícios previdenciários em escala
crescente.
Algumas medidas estão sendo adotadas pelo INSS para
minimizar os impactos da COVID-19, como a possibilidade da perícia
médica indireta para concessão do auxílio-doença, antecipação
do pagamento do 13º salário dos aposentados, suspensão de
prazo para a realização da prova de vida, suspensão por 120 dias
de determinadas exigências para manutenção de benefícios,
a intensificação dos serviços ofertados pelo portal MEU INSS,
extensão do auxílio emergencial para os contribuintes individuais
da Previdência e mudanças nas taxas e prazos nos contratos dos
empréstimos consignados de aposentados e pensionistas do INSS.
“Em um Estado de bem-estar social é esperado que exista um
verdadeiro compromisso da tutela estatal diante das garantias dos
direitos sociais, porém o Brasil vinha adotando nos últimos anos
distanciamento da Seguridade Social, principalmente do SUS após
a promulgação da EC 95, que limitou os gastos públicos por pelo
menos 20 anos. Inevitável a alegação de que a Seguridade Social
não pode ser vista como um gasto para o Estado brasileiro, mas
como um investimento na sociedade, principalmente na parcela que
mais precisa da assistência de serviços essenciais para a redução
das desigualdades sociais”, assegura.
Guilherme Teles ressalta que na história recente do Brasil,
nunca foi tão relevante a presença da Seguridade Social: Saúde,
Assistência Social e Previdência, no cotidiano das vidas dos
brasileiros, como sendo o maior sistema de proteção social do
país e um dos maiores do mundo. “São muitos os desafios quanto
à eficácia e à aplicabilidade das ações deste sistema de proteção
social, especialmente quando há uma crise política, um embate entre
o governo federal e vários governadores, pois é urgente que exista
uma coordenação que gerencie a crise atual na tentativa de redução
dos impactos do novo coronavírus (COVID-19), preservando as
garantias constitucionais do povo brasileiro ao sistema da Seguridade
Social”, finaliza.

FONTE: <https://cutt.ly/Tf6xyUU>. Acesso em: 18 ago. 2020.

46
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Por meio da leitura anterior e tendo como parâmetro o que já vínhamos


abordando ao longo da seção, percebe-se o quanto a Seguridade Social é
importante e o quanto ela pode ser colocada à prova em momentos de grande
crise como a que estamos vivendo em nível nacional e internacional. É visível,
além do papel essencial desempenhado pelo sistema de saúde, o quanto o
sistema de assistência social, nesse cenário, é crucial para as pessoas que vivem
em situação de vulnerabilidade social.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Procuramos resgatar elementos para se pensar de que modo foram
constituídos os direitos humanos em nível internacional e como isso teve
desdobramentos na realidade brasileira. Nessa ocasião, trouxemos à tona
marcos históricos importantes, como a Carta Internacional de Direitos do
Homem, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como demais fontes
relevantes ao estudo dos direitos humanos. Essa digressão possibilitou que você,
aluno, tivesse contato com os primórdios da constituição dos direitos humanos,
sensibilizando-o para a sua importância e o quanto eles têm sido exitosos nos
diferentes contextos e territórios.

Trouxemos as trajetórias e os fundamentos da política social, para tanto,


resgatamos os mais importantes como: o poder exercido pelo liberalismo com
a proposta do mercado livre e a defesa do Estado Mínimo; o Welfare State ou
Estado de Bem-Estar social e os primeiros passos em direção à proteção social
após a Segunda Guerra Mundial e o papel crucial da classe trabalhadora na
conquista de direitos. Mostramos também como se deram as primeiras investidas
de introdução legal de direitos na realidade brasileira. Para isso, resgatamos o
momento histórico de redemocratização do país, bem como apresentamos a
importância da elaboração da Constituição Cidadã de 1988, na qual pela primeira
vez se aventou a tratar da questão dos direitos sociais com a introdução da
Seguridade Social.

Por fim, apresentamos a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), a


Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e o Sistema Único de Assistência
Social (SUAS), ilustrando como se dá a organização das políticas sociais em nível
de assistência social no Brasil.

47
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

REFERÊNCIAS
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48
Capítulo 1 TRAJETÓRIA DAS POLÍTICAS SOCIAIS

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49
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

YAZBEK, M. C. Estado e políticas sociais. Praia Vermelha, Rio de janeiro, UFRJ,


v. 18, n. 1, 2008.

50
C APÍTULO 2
TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Apresentar os diferentes tipos de políticas sociais.

 Compreender como são constituídas as diferentes políticas sociais e quais são


suas atribuições.

 Fazer conhecer as políticas setoriais enquanto nova estratégia de concretização


das políticas sociais.

 Refletir a interface entre as políticas sociais e as demais políticas, expondo as


reais possibilidades de sua articulação.

 Problematizar a viabilidade de concretização da intersetorialidade na execução


das políticas sociais.
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

52
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
As políticas sociais estão aí para aplacar a desigualdade que assola o
país. Por meio delas, tem sido possível a concretização da justiça social e,
consequentemente, a garantia de direitos sociais desprezados ao longo da
constituição da sociedade brasileira.

Antes da aprovação da Constituição Federal de 1988, denominada


de Constituição Cidadã, não havia um modelo que assegurasse os direitos
fundamentais. O que havia até então eram ações pontuais de caráter privatista
e assistencialista, que nada tinham de conexão com a efetivação dos direitos de
cidadania.

Com a Constituição Cidadã e a consequente criação do modelo de


seguridade social, iniciou-se um processo de construção de direitos e de tentativa
de apaziguamento da desigualdade social que assola o país desde o seu
descobrimento.

A criação de políticas sociais foi o modo encontrado para colocar em marcha


a operacionalização e a garantia de direitos, a qual vem sendo aprofundada desde
então com proposta de participação social e de diálogo entre os diferentes setores
que compõem a sociedade.

O trabalho intersetorial compõe as propostas de políticas sociais, pois se


acredita ser fundamental o diálogo entre as políticas, de modo a produzir uma
mobilização mais abrangente e mais enriquecedora em direção da construção de
uma sociedade mais equânime.

No intuito de apontar questões que estão relacionadas à constituição das


políticas sociais e à garantia de direitos, traremos para reflexão o modelo se
seguridade social que vigora no Brasil, composto pelo tripé: assistência social,
saúde e previdência social. Assim, discorreremos as características das políticas
sociais setoriais, de seguridade social e de promoção social (trabalho, renda,
educação, desenvolvimento agrário e cultura).

53
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

2 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O


DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E
SOCIAL
A questão social e a desigualdade são constitutivas da sociedade
capitalista. Trata-se de algo estrutural que perpassa nossa sociedade, a qual se
desenvolve em função da divisão em classes e do acúmulo de riquezas, que leva
a concentração da maior parte nas mãos de poucos indivíduos, havendo uma
distribuição desigual entre todos (YASBEK, 2018).

As políticas públicas e sociais foram criadas para dar soluções a essa


desigualdade estrutural, porém, com a predominância do capital financeiro que
hoje salta aos olhos, os pactos sociais estabelecidos entre capital e trabalho,
desde tempos remotos com o Estado de bem-estar social, foram se esvaecendo.
Tem havido o desmonte das políticas sociais, podendo-se afirmar até mesmo
estar ocorrendo um ataque contra elas. O desemprego, a precarização do
trabalho e a redução dos salários evidenciam a nova caracterização do capital e a
desconstrução da proteção social (YAZBEK, 2018).

O alto grau de informalização do trabalho no Brasil, associado


às políticas de “ativação” para um mercado laboral precário e
flexível, que não garante a autossustentação do trabalhador,
como prevê o receituário neoliberal, submete a classe
que vive do seu próprio trabalho a condições aviltantes de
assalariamento e de cidadania (PIEDADE; PEREIRA, 2016, p.
53).

Atualmente, no Brasil, verifica-se um ataque descomunal às políticas de


seguridade social como uma das estratégias levadas a cabo pelo capital financeiro
para abocanhar o fundo público. Tal fato tem um marco específico que pode ser
vinculado ao recente golpe parlamentar, jurídico e midiático concretizado em 2018
(YAZBEK, 2018).

A situação é de tal modo grave que há aqueles que acreditam que “estamos
passando de uma proteção social de baixa intensidade e abrangência para uma
situação preocupante de crescente desproteção pública” (PIEDADE; PEREIRA,
2016, p. 66).

54
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Leia o texto a seguir. Nele podemos perceber como, por meio


da PEC 241 (também denominada de PEC do Fim do Mundo), os
direitos têm sido escancaradamente vilipendiados.

A PEC 241 (teto de gastos) ou como degradar


a educação em política de governo

Ano 2016 NUM 262


Maria Paula Dallari Bucci (SP)
Professora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

Com a “PEC do teto dos gastos públicos” (Proposta de Emenda


Constitucional 241/2016), os direitos sociais no Brasil, e de modo
especial a educação, estão em risco. Para evitar uma leitura
equivocada, veja a sua Exposição de Motivos.
“O atual quadro constitucional e legal também faz com que a
despesa pública seja procíclica, ou seja, a despesa tende a crescer
quando a economia cresce e vice-versa. [...] A esse respeito, cabe
mencionar a vinculação do volume de recursos destinados à saúde
e educação a um percentual da receita. [...] é essencial alterarmos
a regra de fixação do gasto mínimo em algumas áreas. Isso porque
a Constituição estabelece que as despesas com saúde e educação
devem ter um piso, fixado como proporção da receita fiscal. É preciso
alterar esse sistema, [...]. Esse tipo de vinculação cria problemas
fiscais e é fonte de ineficiência na aplicação de recursos públicos”
(grifos nossos).
A proposta do governo atual, se implementada, vai congelar os
gastos públicos no Brasil pelos próximos 20 anos, isto é, até 2036,
ou seja, se nada se alterar na ordem constitucional vigente, pelos
próximos cinco mandatos presidenciais! No que respeita às despesas
com saúde e educação, o Art. 104 do ADCT passará a limitar as
aplicações mínimas de recursos às vigentes no exercício anterior,
acrescidas da variação da inflação. Isso significa que se a economia
vier a se recuperar – justificativa e objetivo da PEC –, mesmo que o
PIB volte a crescer, os recursos destinados a essas áreas prioritárias
permanecerão estagnados.
A menos, e a própria Exposição de Motivos o ressalva, que o
Congresso decida alocar recursos adicionais a essas áreas:
“Note-se que estamos tratando aqui de limite mínimo de gastos,
o que não impede a sociedade, por meio de seus representantes,
de definir despesa mais elevada para saúde e educação; desde que

55
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

consistentes com o limite total de gastos. [...] Uma vez aprovada a


nova regra, caberá à sociedade, por meio de seus representantes
no parlamento, alocar os recursos entre os diversos programas
públicos, respeitado o teto de gastos. [...]”.
Portanto, os Deputados e Senadores é que poderão, mediante
sua discricionariedade política, contemplar a educação e a saúde
com recursos adicionais. Sujeitos, sem dúvida, ao juízo de sua
conveniência local e partidária, o que é próprio da dinâmica
do Congresso. Sem desmerecer a importância dos debates
parlamentares, observamos que poucos temas ilustram tão bem
a razão de ser da base constitucional dos direitos fundamentais,
como “normas negativas de competência” (Robert Alexy, Teoria dos
Direitos Fundamentais), exatamente para retirar a sua disciplina do
alcance de maiorias parlamentares ocasionais.
Embora não nos agrade a distinção entre políticas de Estado
e de governo, visto que entendemos que, em regra, as políticas
nascem “de governo” e se convertem em “de Estado” à medida
que se consolidam seus mecanismos de institucionalização, esse
será um raro exemplo em sentido inverso. A política educacional
de Estado (analisada mais à frente), cuja estruturação no Brasil
representa esforços de continuidade e coordenação que datam
pelo menos da edição da Constituição de 1988, está ameaçada de
ser “desidratada”, isto é, esvaziada das garantias indispensáveis a
sua construção institucional, para ser entregue a decisões políticas
de momento. O pretexto é a economia de recursos, mas isso não
está assegurado, uma vez que se o PIB voltar a crescer, o que é
esperado, o montante à disposição do Congresso aumentará.
É possível que o Artigo 104 não consiga superar os
questionamentos sobre sua manifesta inconstitucionalidade. A
supressão do mecanismo de vinculação de receitas no campo
educacional implica rasgar uma tradição constitucional que tem mais
de 80 anos no Brasil e só as ditaduras desrespeitaram. Essa tradição
data da Constituição de 1934, cujo Artigo 156 dispôs: “A União e os
Municípios aplicarão nunca menos de 10%, e os Estados e o Distrito
Federal nunca menos de 20%, da renda resultante dos impostos
na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos”.
Suprimida pela ditadura do Estado Novo, em 1937, a disposição
foi reintroduzida pela Constituição de 1946 (Artigo 169). Mais uma
vez revogada pela Carta autoritária de 1967-1969, a vinculação
novamente retornou, em pleno regime militar, com a Emenda Calmon,
de 1983 (EC 24, que elevou os percentuais para 13% para a União
e 25% para Estados, Municípios e DF). Portanto, pela unidade de
propósitos, a PEC 241, nessa matéria, se iguala à obra das cartas

56
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

ditatoriais de 1937 e 1967-1969!


Com isso, colocam-se em questão duas afirmações de senso
comum. A primeira, de que a educação “precisa de salvação”. A
segunda, de que o orçamento no país “é engessado” e precisa de
“flexibilidade”. Na nossa opinião, nenhuma das duas é exata e, pior,
colocadas no caldo de que “o país está à beira do abismo” prestam-
se a amparar medidas irracionais e um “jogo para a plateia” de
investidores, cujo efeito será desarranjar alguns avanços importantes
nas políticas sociais do país. A educação no Brasil precisa de
continuidade, de persistência de esforços na direção definida pelo
Plano Nacional de Educação, para que os resultados que começam
a se esboçar, graças à ação coordenada de uma infinidade de entes
levada a cabo nos últimos anos, não seja objeto de retrocessos. Para
isso é necessário que a evolução orçamentária seja previsível, sem
choques ou “milagres”. As correções necessárias, assim como as
respostas às crises, têm que ser dadas nos marcos da racionalidade.
Sem isso, é retórica vazia falar em confiança, mote da propalada
recuperação da economia.
Como há muita desinformação sobre como se desdobram em
medidas e atos concretos as políticas para a efetivação do direito
à educação, vale a pena examinar a questão por esse ângulo.
Iniciamos destacando a reforma constitucional para estabelecer
mecanismos de articulação governamental. É o caso da Emenda
Constitucional (EC) 53, de 2006, que criou o Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), em substituição
ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Fundamental
(FUNDEF), que se extinguia, pelo decurso do prazo fixado na EC
14, de 1996. Avançando sobre as virtudes da iniciativa anterior
(em especial, uma repartição mais clara das competências de
União, Estados e Municípios em matéria educacional), o FUNDEB
representou uma grande ampliação de seu escopo. Primeiro, porque
passou a abranger toda a educação básica, envolvendo, além da
educação fundamental (hoje, 1º a 9º anos), também o Ensino Médio
– ampliação posteriormente consagrada com a EC 59, de 2010, que
estabeleceu como educação básica obrigatória gratuita aquela de 4
a 17 anos, em sintonia com o que fazem os países desenvolvidos.
A diferença entre o FUNDEB e o FUNDEF abriga um aspecto
muito importante, o reforço financeiro do programa, com a alocação
de 4 bilhões de reais da União (Art. 60, VII do ADCT), o que
representa cerca de 10 vezes o valor anual aplicado pela União no
programa anterior.
A maior parte desses recursos está reservada para o
pagamento, por Estados e Municípios, do salário dos professores em

57
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

efetivo exercício (no mínimo 60% dos fundos, Art. 60, XII do ADCT).
Essa medida, combinada com a regulamentação do piso salarial
dos profissionais do magistério, toca no coração do que deve ser
qualquer medida de sucesso nesta área, a valorização do professor.
Para que se possa avaliar o que representou, em termos de esforço
político e social, a aprovação do piso salarial, basta dizer que embora
constasse do texto original da Constituição de 1988, ele só veio a
ser regulamentado vinte anos depois, com a Lei nº 11.738, de 2008.
Contestado por alguns governantes, foi finalmente confirmado pelo
Supremo Tribunal Federal, em 2011 (ADI nº 4.167).
Uma vez pacificada a questão jurídica, a evolução dos valores do
piso salarial foi de R$ 1.024,00, em 2010, para R$ 2.135,00, em 2016,
quantia reajustada anualmente. Embora relativamente modesta,
se comparada a carreiras que exigem formação semelhante, a
garantia de seu pagamento (que ainda não é efetiva em diversos
Municípios do país) é um pilar sobre o qual se assenta uma política
de Estado na educação, assim como se faz nas experiências bem-
sucedidas pelo mundo todo. Não há política educacional vitoriosa,
em nenhum lugar, se não se consegue atrair para o magistério os
melhores profissionais e fomentar a qualificação dos professores ao
longo de suas carreiras. Economizar nesse quesito não produzirá a
elevação da produtividade que se espera dos jovens brasileiros para
o desenvolvimento do país nas próximas décadas.
Quanto às expectativas para o futuro próximo, merece destaque
a importância que passou a ser conferida ao planejamento, com o
Plano Nacional da Educação (PNE). Também previsto na redação
constitucional original, após a experiência inicial do PNE 2001 (Lei
nº 10.172), teve sua disciplina aprimorada pela EC 59, que passou a
exigir a colaboração federativa, atrelada aos fins da universalização
e garantia de qualidade da educação básica (Art. 212, § 3º da CF).
Além disso, a Constituição passou a prever expressamente que o
PNE teria sua execução assegurada pela garantia de recursos
proporcional à riqueza do país.
“Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de
duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de
educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos,
metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção
e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e
modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das
diferentes esferas federativas que conduzam a:
[…]
VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos
em educação como proporção do produto interno bruto”.

58
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Essa disposição foi regulamentada pela Lei nº 13.005, de 2014,


que aprovou o PNE para o período de dez anos seguintes. Importante
observar que a tramitação do PNE consumiu quatro longos anos,
durante os quais foram examinadas mais de 3 mil emendas e
realizadas incontáveis audiências públicas, com a participação
de parlamentares, dirigentes governamentais de várias esferas e
representantes da sociedade civil. Ao aprovar a Meta 20 (“ampliar
o investimento público em educação pública de forma a atingir, no
mínimo, o patamar de 7% do PIB do País no 5º ano de vigência desta
Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% do PIB ao final do decênio”)
não estava o Congresso Nacional vaticinando sobre possibilidades,
mas dando forma e força jurídica a uma meta pactuada socialmente,
de modo a prover de sustentação política as providências necessárias
para a sua realização. Por essa razão, não é dado a um governo
improvisado desconstruir essa edificação, reservando aos políticos
do futuro decisões descasadas desse processo profundamente
assentado sobre as bases do solo constitucional.
O propósito da exposição até aqui foi ilustrar como os direitos
sociais, no caminho de sua efetivação, dependem de processos
que vão sendo construídos a partir das diretrizes constitucionais. O
direito à educação, tomado como exemplo, não se esgota na sua
enunciação constitucional, mas reclama a produção e funcionamento
de políticas públicas, isto é, programas de ação governamental que
traduzem escolhas, selecionam prioridades e definem a alocação
de meios necessária. Também estão ilustrados os vários processos
jurídicos subjacentes à institucionalização das políticas: a visão
que orienta a escolha de prioridades, que se inicia com o processo
eleitoral; a aprovação das Emendas Constitucionais e leis que a
regulamentam, como expressões do processo legislativo; a alocação
de recursos, manifestação do processo orçamentário, e neste caso
até mesmo o processo judicial, decisão última sobre a validade dos
elementos que compõem a política.
Políticas como essa levam anos a consolidar-se e a continuidade
(em outras palavras, a coordenação das ações no tempo), às vezes
ao longo de vários governos, é indispensável para que os resultados
sejam colhidos. Isso vem ocorrendo, conforme se pode ver no
Relatório Estatístico do Censo Educacional de 2013:
“Os dados do Censo Escolar 2013 reforçam a tendência de
adequação na distribuição das matrículas da educação básica, por
modalidades e etapas de ensino, que vem sendo observada desde
2007, refletindo o amadurecimento das ações e políticas públicas
implementadas nos últimos anos. […] [houve] acomodação do
sistema educacional, em especial na modalidade regular do Ensino

59
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Fundamental, com histórico de retenção e, consequentemente, altos


índices de distorção idade-série. […] vale destacar a ampliação da
oferta de educação infantil, em especial na creche, voltada para o
atendimento das crianças com até três anos de idade, que apresentou
crescimento da ordem de 7,5%. Por outro lado, a reorganização da
pré-escola, que atende crianças de quatro e cinco anos, teve, com
a implantação do Ensino Fundamental de nove anos, parte do seu
público-alvo transferido para o 1º ano do Ensino Fundamental, o qual
passou a receber as crianças com seis anos de idade. Em 2013,
registra-se, ainda, que o contingente de alunos no 1º ano do Ensino
Fundamental de nove anos de duração já se aproxima do tamanho
da coorte de seis anos”.
Para os menos familiarizados, isso significa a correção de um
problema histórico. Depois da universalização do acesso a essa
etapa do ensino, que foi alcançada no início dos anos 2000, restava
enfrentar a defasagem idade-série, isto é, o fato de ter crianças mais
velhas que a idade ideal para cada etapa escolar, associada a altos
índices de evasão nas etapas seguintes.
“Outro destaque percebido no Censo Escolar 2013 foi a
confirmação da trajetória de expansão da matrícula na educação
profissional, que em 2007 era de 780.162 e atingiu, em 2013,
1.441.051 matrículas, crescimento de 84,1% no período. [...].
Outro aspecto que tem impacto na distribuição e no contingente
de alunos na educação básica é o comportamento dos indicadores
de rendimento escolar. Com mais alunos sendo aprovados e
promovidos às séries subsequentes, aumenta o número de
habilitados a ingressar nas próximas etapas de escolarização. Os
especialistas chamam esse movimento de fluxo escolar.
Historicamente, o sistema educacional brasileiro foi
pouco eficiente em sua capacidade de produzir aprovados e,
consequentemente, concluintes na idade correta. No entanto,
a tendência atual mostra aumento no número de alunos que
conseguem ultrapassar os anos iniciais do Ensino Fundamental. Daí
a queda na matrícula e a ampliação da demanda para os anos finais
dessa etapa de ensino”.
Como se pode ver, ao longo das últimas décadas houve uma
sucessão de iniciativas, voltadas a aprimorar e cumprir o pacto
traçado na Constituição de 1988. Essa institucionalidade, que começa
a produzir resultados, representa uma evolução, fruto do exercício
da democracia representativa e da participação. Cada medida
dessas teve papel ativo do Congresso, dos entes governamentais
e da sociedade civil interessados. Nesse sentido, imaginar que um
governo de frágil legitimidade possa pretender “simplificar” essa

60
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

estrutura, para tornar mais “flexível” o orçamento e que isso seria


uma medida de racionalidade é no mínimo iludir-se.

FONTE: <https://cutt.ly/yf6xIxR>. Acesso em: 18 ago. 2020.

Percebem-se claramente as consequências do avanço do capital financeiro


e o resultante desmantelamento das políticas sociais, bem como o rebatimento
disso nas diversas dimensões da vida humana, social, econômica e cultural. É o
que a leitura anterior nos mostra.

Vive�se um momento histórico, em que não existe possibilidade concreta


das políticas sociais, particularmente aquelas voltadas à minimização da pobreza,
não serem inflexionadas pelas contrarreformas em curso. Não existe possibilidade
histórica, por exemplo, de os Programas de Transferência de Renda, do SUS, do
SUAS, da Educação em todos os seus níveis, dos programas habitacionais, entre
outros, deixarem de sofrer os impactos da Proposta de Emenda Constitucional
(PEC) do congelamento dos gastos, como não existe possibilidade do campo dos
serviços sociais deixar de sofrer as consequências da lei de terceirização irrestrita,
e da classe que vive do trabalho não sofrer os impactos da reforma trabalhista e
da reforma da previdência (YAZBEK, 2018).

Com a ascensão do neoliberalismo e a predominância do capital financeiro,


o que vemos é uma luta cotidiana em busca da defesa e da construção de
direitos num dos piores cenários já vivenciados, de modo que estamos falando
de uma batalha travada para a construção de direitos em tempos completamente
desfavoráveis (YAZBEK, 2018).

A inflexão do capital vinculado ao trabalho para o capital financeiro trouxe


muitas mudanças. O domínio do capital financeiro hoje é evidente em nível
mundial e a propriedade privada dos meios de produção ganha novos contornos.

[...] as formas mais concentradas do capital – capital financeiro


predominantemente industrial ou capital de investimento
financeiro “puro” – beneficiam-se, então, de um campo de
operações e de um espaço de dominação que se estende
sobre grande parte do planeta, ou mesmo a totalidade se
estimarmos que a integração da China ao capitalismo mundial
está perto de acontecer (CHESNAIS; 2001, p. 8).

A despeito de todos esses contra-ataques do capital financeiro e da


política neoliberal, temos politicas sociais que foram criadas para dar conta da
desigualdade social e da pobreza que assola o contexto nacional.

61
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

2.1 POLÍTICAS FOCALIZADAS/


RESIDUAIS VERSUS POLÍTICAS
UNIVERSAIS
A seguridade gera um compromisso entre gerações, em que os adultos
atuais pagam os benefícios da geração de seus pais e criam uma dívida para
a geração de seus filhos. Nesse modelo, podemos falar de uma cidadania
universal, já que os benefícios são assegurados como direitos sociais,
de forma universalizada a todos aqueles que necessitem deles (FLEURY;
OUVERNEY, 2008).

Nesse sentido, contrapondo-se à perspectiva neoliberal, de defesa do


Estado mínimo e do desmonte das políticas públicas, temos a proposta do acesso
universal e a concretização da justiça social por meio da defesa do direito de
cidadania. Assim, Lobato e Giovanella (2008), ao discorrerem sobre o direito à
saúde e suas políticas, nos advertem que a defesa da universalidade sobrepõe-
se assim às medidas difundidas nas reformas neoliberais de focar a intervenção
governamental na atenção à saúde somente nos grupos muito pobres. Essa
focalização segmenta a cobertura e empobrece a atenção à saúde, porque cria
desigualdades no acesso – e sistemas construídos para todos, e acessados por
todos, têm mais chance de serem equitativos. Trata-se de uma grande armadilha
imaginar que as políticas focalizadas sejam capazes, com sua seleção, de
alcançar a todos os cidadãos que necessitam ter seus direitos garantidos.

Ao contrário do que se costuma afirmar, os efeitos redistributivos do gasto


público dependem da sua capacidade de universalização e não do seu grau de
focalização. A focalização ‘perfeita’, sem riscos de oferecer cobertura aos não
pobres produz por si mesma um mecanismo de exclusão. Orientar os gastos
sociais para os mais pobres não só corre o risco de deixar de fora uma parcela
dos ‘antigos’ pobres (os considerados miseráveis), como também de não incluir
os ‘novos’ pobres, aqueles que foram excluídos do mercado de trabalho. Este
é o problema da focalização de programas com base unicamente em linhas de
pobreza calculadas por critérios monetários, deixando de fora muitas famílias que
estão acima da linha, mas que permanecem em condições de vulnerabilidade
social. É comprovada a rotatividade em torno da linha de pobreza, causada por
qualquer episódio de perda de emprego, doença ou invalidez (SOARES, 2008).

Contrariamente a políticas focalizadas, o que o Brasil necessita é de políticas


universais que alcancem a todos, assegurando os seus direitos de cidadania e
cumprindo a proposta da Constituição de 1988, que propõe existência digna,
justiça social e garantia de direitos.

62
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Por fim, cabe ressaltar que na Constituição de 1988, ao lado das políticas
públicas universais e gratuitas de seguridade social, também subsistem os
sistemas privados de saúde, conhecidos como “planos de saúde privados” e de
previdência social, conhecidos como “aposentadorias privadas”, “aposentadorias
contratadas em banco” etc. O sistema privado é lícito, guia-se por legislações
próprias, visto que atua em conjunto com o sistema público de seguridade social,
conforme possibilita a Constituição Cidadã de 1988, porém, apesar das notáveis
conquistas do SUS, do INSS etc., há um “imaginário” de que seria possível
resolver a situação do público ao afastar as políticas de Estado e dar lugar
completo ao mercado. Essa ideia equivocada de privatização do público, fazendo
o Estado ceder espaço ao mercado é situação que causa polêmicas e grandes
debates até os dias atuais.

1 Observe a charge a seguir e escreva um parágrafo a respeito do


que ela nos faz refletir.

FONTE: <https://cutt.ly/jf6xJCo>. Acesso em: 18 ago. 2020.

R.: _______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
______________________________________________.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS VERSUS


INICIATIVAS PRIVADAS
É importante nos atentarmos para algo importante, que é quanto ao caráter
da política: pública ou privada. De acordo com Fleury e Ouverney (2008), no
atual marco institucional brasileiro, a provisão de ações e serviços de saúde é
organizada em bases públicas, e a iniciativa privada atua de forma complementar,
fixa marcos institucionais (leis, processos decisórios, critérios de acesso, formas
de distribuição e utilização de recursos, composição de atores etc.) muito
diferentes de um sistema de base de mercado, implicando distintas distribuições
de oportunidades e restrições.

No modelo neoliberal o foco é na privatização daquilo que deveria ser de


direito de todos. A ideia dessa perspectiva é terceirizar funções que caberiam ao
Estado a esferas privadas. A atuação do Estado torna-se assim pontual em casos
de extrema gravidade, destituída de qualquer compromisso com o bem-estar
geral da população enquanto direito garantido constitucionalmente e tido como
universal.

Esses postulados neoliberais na área social são, básica e sinteticamente,


os seguintes: o bem-estar social pertence ao âmbito do privado (suas fontes
‘naturais’ são a família, a comunidade e os serviços privados). Dessa forma, o
Estado só deve intervir quando surge a necessidade de aliviar a pobreza absoluta
e de produzir os serviços que o setor privado não pode ou não quer fazê-lo.
Propõe-se, portanto, um Estado de beneficência pública ou assistencialista, no
lugar de um Estado de bem-estar social. Os direitos sociais e a obrigação da
sociedade de garanti-los por meio da ação estatal, bem como a universalidade, a
igualdade e a gratuidade dos serviços sociais, são abolidos no ideário neoliberal.
As estratégias para reduzir a ação estatal no terreno do bem-estar social são: o
corte do gasto social, eliminando programas e reduzindo benefícios; a focalização
do gasto, ou seja, sua canalização para os chamados grupos indigentes, os quais
devem ‘comprovar’ sua pobreza; a privatização da produção de serviços e a
descentralização dos serviços públicos para o nível local (SOARES, 2008).

O público e o universal, instituídos pela Constituição Federal de 1988 em


nível de seguridade social, têm sido driblados e vilipendiados com frequência,
haja vista a própria resignação contemporânea de que as políticas sociais são,
por excelência, direcionadas aos pobres e aos despossuídos.

Já é lugar comum o reconhecimento – e até uma aceitação mal-disfarçada


– de que o Sistema Único de Saúde, o SUS, no Brasil, embora concebido
constitucionalmente como um sistema universal, é na prática um sistema para os
pobres, ou seja, focalizado. De forma semelhante, pouco a pouco ganha foros de
64
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

unanimidade a noção de que política social é, por excelência, algum tipo de ação
voltada para os excluídos (os pobres) e, por definição, focalizada (VIANNA, 2011).

Aí temos o exemplo do SUS, porém, isso acontece com a maioria das


políticas sociais, as quais carregam o estereótipo de esmola devido a anos de
práticas assistencialistas e clientelistas concretizadas no Brasil. A política social
como direito ainda é um ideal a se concretizar, não apenas no que diz respeito a
sua execução, mas antes de tudo, no que concerne ao modo como ela tem sido
percebida pela sociedade como um todo.

Apesar de o SUS possuir dificuldades inerentes a sua existência (“filas”,


demora no atendimento, falta de medicamentos etc.), trata-se de conquista que
não pode retroceder. Se outrora só sobrevivia quem possuía carteira de trabalho
assinada ou quem tinha condições de arcar com altos custos em saúde, hoje o
papel da assistência, da saúde e da previdência social, derivado da Constituição
de 1988, mostra que não se pode conceber Estado sem seguridade social.

2.3 POLÍTICAS SETORIAIS E


POLÍTICAS TRANSVERSAIS
O esquema a seguir apresenta a composição da política social brasileira,
constituída por políticas setoriais e transversais.

FIGURA 1 – POLÍTICAS SETORIAIS E TRANSVERSAIS

FONTE: Adaptada de Fleury e Ouverney (2008)

65
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Segundo Fleury e Ouverney (2008), pelo fato de possuírem ações que estão
estruturadas por esferas específicas, as políticas de proteção e de promoção
social são tidas como políticas setoriais.

O conceito mais difundido de política de saúde, e internacionalmente


adotado, enfatiza seu caráter de estratégia oficial organizado em ações setoriais a
serem desempenhadas de acordo com normas legalmente construídas, tendo por
objetivo maior a qualidade de vida da população (FLEURY; OUVERNEY, 2008).

A seguir, apresentaremos um exemplo, em nível de políticas de saúde, de


políticas setoriais.

QUADRO 1 – POLÍTICAS SETORIAIS: OBJETIVOS E VALORES

FONTE: Fleury e Ouverney (2008, p. 20)

Se, por um lado, é fundamental conhecer as realidades na sua concretude


e não idealmente, as políticas setoriais interagindo diretamente com a realidade
e sendo por ela influenciadas, por outro lado, é necessário estar atento ao fato
de que as politicas podem impactar e ser impactadas por outras esferas, como
econômica, política ou cultural (FLEURY; OUVERNEY, 2008). Nessa direção,
“ainda que nos ajudem a recortar uma realidade concreta, por meio de uma
definição de seus limites, pensar a dinâmica de uma política por seus objetivos
e realidades tende a ser arbitrário e desconhece a complexidade dos problemas
sociais” (FLEURY; OUVERNEY, 2008, p. 23).

Há duas questões importantes: de um lado, o fato de se tomar os objetivos


específicos de uma política para delimitá-la, de outro lado, a necessária atenção
à complexidade da realidade, que comporta diferentes setores e aspectos e que
deve dialogar com os pontos específicos de cada política.
66
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

3 POLÍTICAS SETORIAIS
As políticas sociais devem ter claros os seus objetivos e delimitar a sua esfera
de atuação, porém sem deixar de manter o diálogo com as diferentes políticas e
atores sociais. Como havíamos afirmado, a necessária delimitação dos objetivos
de uma política não pode fazer com que ela se feche em si mesma e deixe de
dialogar com a complexidade da vida social. Nesse sentido, de acordo com
Monnerat e Souza (2011, p. 41), “observa-se que o modelo descentralizado, sob
o qual operam as políticas sociais, em especial as de saúde e assistência social,
recoloca a necessidade de sinergia intersetorial para enfrentar a complexidade
dos problemas sociais”.

3.1 POLÍTICAS SETORIAIS NO


ÂMBITO DA PROTEÇÃO SOCIAL
(SEGURIDADE SOCIAL)
Tratam-se de políticas que visam proteger o cidadão contra riscos
socioeconômicos, os quais podem expô-lo a condições de vulnerabilidade. Aí são
contempladas políticas de saúde, assistência social e previdência, consideradas
políticas clássicas no que diz respeito à proteção social, de modo que estão
contidas na Constituição Cidadã de 1988, na qual se traz à tona o modelo de
Seguridade Social (FLEURY; OUVERNEY, 2008).

FIGURA 2 – SEGURIDADE SOCIAL

FONTE: <https://cutt.ly/Lf6x0LG>. Acesso em: 18 ago. 2020.

67
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Conforme apontam Fattorelli e Ávila (2012), se compararmos a destinação de


orçamento, de um lado, para a dívida pública e, de outro lado, para a Seguridade
Social, veremos a brutal discrepância. Os autores identificaram que em 2012 a
dívida pública, no formato de juros e amortizações, abocanhou a maior fatia do
Orçamento Geral da União, equivalente a 47,19%. Por sua vez, a seguridade
social ficou com míseros 18,22%, sendo 3,98% para a saúde e 2,55% para a
Assistência Social.

Caro acadêmico, a partir da discussão da desproteção social,


reflita com relação à charge a seguir:

FIGURA 3 – DESPROTEÇÃO SOCIAL

FONTE: <https://cutt.ly/1f6x7iv>. Acesso em: 18 ago. 2020

Isso nos mostra quais são as prioridades que constituem a realidade


brasileira, de modo que ocorre uma inversão perversa, em que o fundo público é
convertido em incentivo ao capital (PIEDADE; PEREIRA, 2016).

Não há dúvidas de que a implementação do modelo de seguridade social


pela Constituição de 1988 foi um grande avanço, porém, no que concerne ao
modelo de seguridade social brasileiro há de se colocar sua limitação vinculada
ao fato de estar condicionado ao mercado de trabalho. Essa é a realidade
que impera hoje no Brasil, visto que somente a saúde absorveu o princípio da
universalidade. Por sua vez, a previdência e a assistência ficaram restritas a
segmentos, sendo que a previdência está reservada apenas aos contribuintes e
a assistência está direcionada aos indivíduos em situação de pobreza extrema

68
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

ou até mesmo em situação de indigência. Apesar de seu avanço constitucional,


vemos que a seguridade social não teve competência para garantir proteção
social aos trabalhadores pobres (BOSCHETTI, 2005).

O modelo de Seguridade Social brasileiro tem como parâmetro histórico o


Plano Beveridge, da Inglaterra, que data de 1942. Foi por meio dele que pela
primeira vez na história institui-se o modelo que tem como pilar a condição de
cidadania e a garantia dos direitos sociais pelo Estado (FLEURY; OUVERNEY,
2008).

Quando falamos em modelo de Seguridade Social estamos tratando dos


seguintes aspectos: proteção social; justiça social; mínimo vital, universalidade;
mecanismo redistributivo; políticas sociais; correção de desigualdades.

A proteção social assume a modalidade de seguridade social, designando


um conjunto de políticas públicas que, inspiradas em um princípio de justiça
social, garantem a todos os cidadãos o direito a um mínimo vital, socialmente
estabelecido. O caráter igualitário do modelo está baseado na garantia de um
padrão mínimo de benefícios, de forma universalizada, independentemente da
existência de contribuições anteriores. O acesso aos benefícios sociais depende
unicamente da necessidade dos indivíduos, ou seja, o acesso à escola porque
é preciso ser educado, o acesso ao sistema de saúde porque há uma demanda
sanitária. Ao desvincular os benefícios das contribuições, é estabelecido um
mecanismo de redistribuição por intermédio das políticas sociais, que têm como
objetivo corrigir as desigualdades geradas no mercado (FLEURY; OUVERNEY,
2008).

Por meio da proposta de seguridade social, o objetivo tem sido o de


assegurar a todos os cidadãos brasileiros o acesso a bens e serviços essenciais
que garantam uma vida digna, ancorada no princípio da justiça social e buscando
amenizar a desigualdade social, que tem sido constitutiva da nossa sociedade.

3.1.1 Assistência Social


Uma guinada importante ocorreu com a Constituição de 1988 quando do
estabelecimento da assistência social como parte não contributiva da seguridade
social. A Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) foi definidora de mudanças
fundamentais, de modo a publicizar as demandas dos cidadãos, os quais deixaram
de ser vistos como assistidos ou favorecidos e passaram a ser entendidos como
usuários ou beneficiários (MONNERAT; SOUZA, 2011).

69
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

A assistência social, ainda que tardiamente, foi tida enquanto direito social
por meio da Lei Orgânica da Assistência Social, de 1993. Juntamente à saúde e
à previdência social, ela compõe a seguridade social. Nesse sentido, com relação
à assistência social, entende-se que a institucionalização do Sistema Único de
Assistência Social (SUAS) pode ser tido como um grande passo no percurso de
elaboração das políticas sociais no Brasil (BOSCHETTI, 2005).

O SUAS, além de operacionalizar os princípios da Política Nacional de


Assistência Social (PNAS), também concretiza os princípios e diretrizes da Lei
Orgânica da Assistência Social (LOAS). Ademais, trata-se de um sistema que
busca fazer com que a política de assistência social dialogue com as demais
políticas de proteção social, visto que esta é algo que extrapola a esfera da
assistência social e não pode se resumir a ela (BOSCHETTI, 2005).

Sua efetivação como um sistema que busca consolidar uma política


integrante da seguridade social pressupõe a integração e articulação da
assistência social à seguridade social. Dessa forma, a concepção de assistência
social e sua materialidade em forma de proteção social básica e especial (de
média e alta complexidade) requer inserir estas modalidades de proteção social
ao conjunto das proteções previstas pela seguridade social, ou seja, a assistência
social não pode ser entendida como uma política exclusiva de proteção social,
mas articular seus serviços e benefícios aos direitos assegurados pelas demais
políticas sociais, a fim de estabelecer, no âmbito da seguridade social, um amplo
sistema de proteção social (BOSCHETTI, 2005).

Todas essas políticas que constituem a seguridade social, cada uma a seu
modo e de acordo com suas especificidades, tem como princípios norteadores
(propostos pela Constituição Federal de 1988, no Artigo 194): universalidade
na cobertura; uniformidade e equivalência dos benefícios; seletividade e
distributividade nos benefícios; irredutibilidade do valor dos benefícios; equidade
no custeio; diversidade do financiamento; caráter democrático e descentralizado
da administração (BOSCHETTI, 2005).

3.1.2 Previdência Social


Atualmente constituindo um dos pilares da seguridade social, a previdência
social brasileira tem sua origem nas Caixas de Aposentadorias e pensões (CAPs),
criadas em 1923 pela Lei Eloy Chaves e, posteriormente, em 1930, transformadas
nos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs) (YAZBEK, 2018). Veja a seguir o
quadro elaborado por Escorel e Teixeira (2008), com o levantamento histórico de
órgãos previdenciários no Brasil.

70
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

QUADRO 2 – ÓRGÃOS PREVIDENCIÁRIOS NO BRASIL


1923 Caixas de Aposentadorias e Pensões para ferroviários
1926 Funcionavam 33 Caixas organizadas por empresa
1930 Funcionavam 47 Caixas organizadas por empresa, cobrindo 140 mil segura-
dos
1931 Instituto da Previdência para funcionários da União (regime próprio)
1932 Funcionavam 140 Caixas organizadas por empresa, cobrindo 190 mil segu-
rados ativos, dez mil aposentados e nove mil pensionistas
1933 Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Marítimos (IAPM)
1934 Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários (IAPB)
Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Comerciários (IAPC)
1936 Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários (IAPI)
1938 Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Transportadores de Cargas (IAP-
TC)
Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Estivadores (IAPE)
Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Servidores do Estado (Ipase)
1945 Três milhões de segurados ativos, 159 mil aposentados, 170 mil dependen-
tes
1948 Seis IAPs e trinta CAPs
Iapetec – fusão IAPE e IAPTC
1960 Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Ferroviários e Empregados em
Serviços Públicos (Iapfesp) – unificação das trinta CAPs de ferroviários re-
manescentes – abrangendo cinco milhões de segurados, entre os quais qua-
tro milhões de contribuintes ativos (7,3% da população brasileira)
FONTE: Adaptado de Escorel e Teixeira (2008)

Ao longo da história da criação da previdência social, não só no Brasil, mas


na América Latina como um todo, ela tem sido constantemente alvo de reformas
neoliberais, tendo sido sempre bode expiatório de acordos travados entre nossos
países com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que levava a maior parte
dessas nações a serem incapazes de manter seus sistemas previdenciários
baseados na solidariedade intergeracional e de natureza coletiva, tornando-os
sistemas privados, poupança que alimenta os interesses do capital financeiro
(SOARES, 2008).

Atualmente, a previdência social tem sido alvo de mudanças drásticas, que


são consideradas por estudiosos como a destituição de direitos há muito tempo
conquistados pelos trabalhadores. Com a PEC55, popularmente denominada de
PEC do Fim do Mundo, foi concretizada a reforma da previdência no Brasil.

71
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

FIGURA 4 – PREVIDÊNCIA

FONTE: <https://cutt.ly/Xf6co0N>. Acesso em: 18 ago. 2020.

Os impactos da reforma da Previdência na


desigualdade, segundo economistas de esquerda

Em reta final, Senado aprova texto que altera aposentadoria dos


setores público e privado. Pontos complicados, como inclusão de
Estados e municípios, serão tratados em PEC paralela.
O Senado Federal aprovou nesta terça-feira em primeiro
turno a reforma da Previdência. Por 56 votos a 19, os senadores
referendaram um Projeto de Emenda à Constituição (PEC) que prevê
uma série de mudanças no sistema de aposentadorias e de pensões
do setor público e privado. O relatório do senador Tasso Jereissati
(PSDB) manteve o conteúdo principal aprovado por deputados no
início de agosto para garantir sua promulgação imediatamente depois
da votação em segundo turno na Casa. A condição para a aprovação
do texto-base foi a criação da chamada PEC Paralela, que abriga
pontos divergentes que saíram da PEC principal.
O ponto mais importante que ainda segue em discussão na
PEC Paralela é a inclusão de Estados e municípios nas regras
estabelecidas pela União. Outro ponto a ser debatido nesta proposta
é a criação de uma seguridade social para as crianças, proposta
pelos deputados Tábata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES)
e incluída por Jereissati no texto.

72
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Seja como for, uma das mais ambiciosas reformas prometida


por Jair Bolsonaro e ansiada pelos investidores do mercado
financeiro está a apenas uma votação – prevista para acontecer
até 15 de outubro – para virar lei. O texto aprovado nesta terça tem
uma modificação relevante a respeito das pensões: ao contrário do
que determinou a Câmara, uma viúva não poderá receber menos
de um salário mínimo, hoje em 998 reais. Com isso, a economia
aos cofres públicos será de aproximadamente 800 bilhões de reais
em dez anos, ao invés dos mais de 1 trilhão que o Governo de Jair
Bolsonaro previa ao enviar a proposta original ao Parlamento.
A oposição ao Planalto passou meses fazendo campanha
contra a reforma e acusando as mudanças de prejudicarem
preferencialmente os mais pobres. Até que ponto tem razão em
suas críticas? Para entender o quadro, o EL PAÍS conversou com
quatro economistas do campo progressista que estão engajados no
debate sobre o projeto da reforma da Previdência: Nelson Barbosa,
ex-ministro da Fazenda do Governo Dilma Rousseff e professor da
FGV e da UnB; Marcelo Medeiros, especialista em desigualdade e
pesquisador do IPEA; Nelson Marconi, coordenador do programa de
Governo de Ciro Gomes e professor da FGV; e Eduardo Fagnani,
professor do Instituto de Economia da Unicamp.
Os quatro possuem opiniões distintas sobre a reforma e fazem
diferentes graus de críticas a ela, mas coincidem em dizer que os
pontos considerados mais problemáticos foram retirados e os
direitos mais básicos foram mantidos. As mudanças no Benefício
de Prestação Continuada (BPC) e na aposentadoria rural foram
deixadas de lado, enquanto que permaneceu o piso de um salário
mínimo de aposentadoria. Isso significa que tanto os trabalhadores
rurais como aqueles trabalhadores urbanos que ganham um salário
mínimo – 63% de todos os aposentados do regime geral – foram
preservados. De mais problemático, do ponto de vista da distribuição
dos sacrifícios, está a concessão feita a categorias como policiais
federais, por exemplo. Também está pendente a reforma para os
militares.
Além disso, as mudanças nas regras do abono salarial, um
14º salário pago pelo Estado a trabalhadores que recebem até
dois salários mínimos, foram deixadas de lado pelos senadores. Já
o plano de implementar um regime de capitalização, em que cada
trabalhador passa a ter uma conta individual, foi retirado do texto-
base ainda na Câmara. Por fim, o tempo de contribuição mínimo
para se aposentar continua sendo de 15 anos, tanto para mulheres
como para homens – no caso destes últimos, os que entram no
sistema agora terão que contribuir um mínimo de 20 anos. Apesar da

73
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

campanha contrária de parlamentares à esquerda, os economistas


consultados também concordam com a extinção da aposentadoria
por tempo de contribuição, mantendo apenas o regime de idade
mínima – os dois modelos coexistem atualmente.
Como pano de fundo está a explosão do gasto do Governo
Federal com aposentadorias do INSS, servidores federais e
militares. Dos mais de 767 bilhões de reais previstos em despesas
previdenciárias em 2019, mais de 300 bilhões são recursos do
Tesouro Nacional – o chamado déficit – enquanto o restante é
proveniente da contribuição de trabalhadores e empregadores. Em
2008, esse déficit era de 77 bilhões. O envelhecimento da população
somado a antigos privilégios do funcionalismo estão entre os fatores
que causaram a explosão das despesas, coincidindo nos últimos
anos com a crise econômica, desemprego e queda na arrecadação.

Quem mais contribui para a economia gerada

As lideranças da esquerda vêm argumentando que de cada 100


reais de sacrifício, ou seja, que saem do bolso dos contribuintes,
mais de 80 reais serão cobrados de quem ganha até 2.000 reais. As
principais queixas dizem respeito às mudanças aplicadas ao regime
geral do INSS, responsável pelo benefício dado ao setor privado –
isto é, a maioria da população.
Entre as alterações que atingem a maior faixa de
trabalhadores estão o fim da aposentadoria por tempo de contribuição
e o estabelecimento de uma idade mínima para todos, de 65 anos
para homens e 62 para mulheres; a mudança na base de cálculo da
aposentadoria, que passa a considerar todos os salários ao invés
dos 80% maiores, como acontece hoje; e a necessidade de que
mulheres contribuam por 35 anos e homens 40 para que consigam
aposentadoria integral, cinco anos a mais que atualmente, afetando
aqueles que ganham entre 1,5 e 2 salários mínimos.
A afirmação de lideranças progressistas de que o grosso da
economia virá dos trabalhadores que ganham até dois salários
mínimos pode ser considerada uma meia-verdade. “Qualquer
economia grande que você queira fazer vai ter que afetar a massa
das pessoas de renda mais baixa. É a massa dos beneficiários”,
explica Medeiros. Barbosa segue na mesma linha: “No agregado
a maior economia vem do regime geral do INSS porque é o maior
programa, mas o correto é medir o impacto per capita da reforma.
Quando você olha para o impacto em cada pessoa, então a maior
economia é no setor público”, afirma. Segundo os cálculos feitos
pelo economista Carlos Góes e publicados na Folha de S. Paulo,

74
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

aposentados com até dois salários mínimos contribuirão, cada um,


com 11.519 reais ao longo de 10 anos para a economia gerada
com a reforma da previdência. Já os aposentados do setor público
contribuirão com 75.694 reais.
Contudo, Marconi chama atenção para o fato de que, mesmo
o ajuste per capita sendo maior para quem ganha mais, qualquer
impacto na renda de quem ganha menos é muito mais sentido,
isto é, o real que o mais pobre economiza impacta mais a sua vida
que o real economizado pelo mais rico. “Está correto colocar idade
mínima e manter o tempo de contribuição mínimo em 15 anos. O
problema é que você já não vai receber o valor da aposentadoria
integral com esse tempo mínimo, mas sim 60%, e a base de cálculo
da aposentadoria também muda e passa a considerar todas as
remunerações”, explica. Outros economistas que se especializaram
na questão previdenciária vêm apontando, contudo, que a maioria
das aposentadorias integrais já corresponde a um salário mínimo,
que é o valor do piso do INSS. Marconi rebate: “Ainda assim há
um número considerável de pessoas que ganham acima disso. Só
em 2017, 290.000 pessoas se aposentaram ganhando entre 1 e 2
salários”.
O resultado, explicam tanto Marconi como Medeiros, é que
mais pessoas passarão a ganhar o piso de um salário mínimo. “O
custo mais alto é para quem está ganhando acima de 1,5 salário.
Para essas pessoas a perda vai ser mais forte”, afirma Medeiros.
A afirmação parece coincidir com os cálculos publicados por Góes:
se a economia per capita gerada com quem ganha até dois salários
é consideravelmente menor, a poupança com aqueles que ganham
logo acima disso, isto é, mais de dois salários mínimos, salta para
60.463 reais por pessoa.

Idade mínima e tempo de contribuição

Aumentará então a desigualdade social? “Quando a renda


é muito concentrada, você vai combater a desigualdade mudando
os benefícios dos mais ricos, coisa que não é muito assunto da
previdência”, explica Medeiros. “A pergunta que deve ser feita
é: em que medida essa reforma vai ser paga por gente de renda
mais baixa? Nesse sentido, a reforma possui aspectos progressivos
e outros regressivos”, aponta. Entre os pontos que ele considera
igualitário estão a manutenção do piso de um salário mínimo e
a implementação da idade mínima, fortemente combatida pela
esquerda, de 65 anos para homens e 62 para mulheres. Hoje,
apenas os que possuem salários mais altos e emprego estável ao

75
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

longo da vida conseguem se aposentar com mais de 30 anos de


contribuição e idade indefinida, enquanto os mais pobres – a maioria
dos beneficiários do INSS – já se aposentam por idade.
Entre outras mudanças consideradas progressivas estão as
alíquotas de contribuição previdenciária. Os servidores públicos
contratados através de concurso público até 2012 deverão pagar,
antes e depois da aposentadoria, alíquotas que variam de 7,5% a
22%, ao invés dos atuais 11% para todas as faixas salariais. Já no
regime geral as alíquotas vão variar de 7,5% a 14%, ao invés dos
atuais 8% a 11%. “As alíquotas progressivas são boa notícia, mas
são menos progressivas do que parecem. Isso porque as alíquotas
mais altas pagas à Previdência implicam descontos mais altos no
Imposto de Renda, que é calculado sobre a renda bruta menos
as contribuições previdenciárias”, explica Medeiros. “Acaba que
o Imposto de Renda passa a financiar uma parte da Previdência”.
Nelson Barbosa acredita que a reforma avança no caminho
correto e corrige várias distorções, mas ele acredita que outras estão
sendo criadas. Uma delas tem a ver com o tempo de contribuição.
De acordo com as novas regras aprovadas pela Câmara, os
trabalhadores que atingirem a idade mínima e se aposentarem com o
mínimo de 15 anos de contribuição receberão 60% da média de suas
remunerações ao longo da vida. Para conseguir o valor integral, isto
é, os 100% da média de salários que ganhou ao longo da vida, será
preciso trabalhar o mínimo de 35 (mulheres) e 40 anos (homens).
“A nova regra diz que você ganha 2% por cada ano adicional de
trabalho. Por essa regra os homens chegariam com 100% aos 35
anos, não 40. Faltou uma negociação mais sofisticada, porque você
está considerando 15 anos para o acesso à aposentadoria e 20 anos
para o cálculo. Isso vai gerar contestação judicial lá na frente”. O
economista também defende um sistema de bônus para as pessoas
que queiram e possam trabalhar mais. “O tempo para receber o valor
integral deve permanecer em 35 anos. Depois disso, você ganharia
um adicional. Isso estimula as pessoas que podem e querem
trabalhar 37 ou 40 anos”.

O que a esquerda poderia ter proposto

Além de todas as questões expostas, a esquerda poderia ter


proposto alternativas à reforma apresentada? Marconi defende o
projeto apresentado por Ciro Gomes no ano passado, baseado em
três pilares: uma renda mínima universal de um salário mínimo para
idosos; um sistema solidário de repartição, como o que funciona
hoje, com uma idade mínima a ser reajustada automaticamente de

76
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

tempos em tempos e um teto do INSS pouco menor – entre 4.500


e 5.000 reais –; e um sistema de capitalização público bancado
por trabalhadores e empregadores. “Tem também a questão da
acumulação de aposentadorias em cargos, colocaríamos um limite
para isso, e reveríamos isenções para o Simples Nacional, ruralistas
[...]”, afirma.
Já Barbosa considera que a esquerda errou em combater a
idade mínima. Ele também defendia as mudanças no abono salarial,
muito impopulares. O Senado acabou mantendo o benefício para
pessoas que ganham até 2.000 reais, ao invés do teto de 1.364,43
reais aprovado anteriormente pelos deputados. “É um benefício
criado na época da ditadura, quando o salário mínimo valia bem
menos e ainda não havia seguro-desemprego, BPC ou Bolsa
Família. É preferível usar parte desse dinheiro do abono para criar
novos empregos. O problema é que existe uma desconfiança e nada
garante que o Governo usaria para isso”, argumenta.
Assim, “ao invés de defender uma realidade que não existe
mais”, o campo progressista deveria abrir novos caminhos e inserir
novos temas no debate. Um deles diz respeito a uma renda mínima
universal para idosos. Ao chegar a determinada idade, todos teriam
direito a ganhar um benefício mínimo, que deveria ser enquadrado
como assistência social. Apesar da complexidade e dos limites fiscais
atuais, Barbosa acredita se tratar de uma solução permanente e que
resolveria de uma vez qualquer debate sobre o BPC e aposentadoria
rural. “Então significa que vou dar um benefício para o Lemann
[bilionário dono da Ambev]? Não. Se uma pessoa de alta renda tem
acesso a esse benefício, a gente compensa pelo Imposto de Renda,
que deve ser mais progressivo. No mundo da inteligência artificial,
um sistema integrado de controle e coordenação dos benefícios está
ao alcance do governo”, explica. Outra possibilidade, acrescenta,
seria estender esse benefício para crianças de zero a 15 anos, nos
moldes da proposta de Tabata Amaral e Filipe Rigoni.
Para que a reforma fosse mais progressiva, Marcelo Medeiros
sugere alterar a estrutura de desconto no valor da aposentadoria.
“Com a reforma, ela é basicamente linear. Todo mundo se
aposenta com 60% do salário e depois adiciona 2% por ano a mais
contribuindo, mas essa estrutura é regressiva porque aqueles que
contribuirão mais tempo são também aqueles que possuem renda
mais alta. Então, na prática, eles não vão chegar a perder todos
os 40% do salário”, explica. Uma possibilidade é que as alíquotas
fossem diferenciadas, ou seja, de acordo com o que cada um venha
a receber de aposentadoria e com um desconto menor sobre o
primeiro salário mínimo, segundo explica. “Teria que ver se é viável.

77
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Não fiz os cálculos e não sei quanto custaria”, admite.


Já Fagnani recorda que o regime geral passou por alterações
nos últimos anos que desestimulam a aposentadoria precoce.
Apesar de também ser a favor de uma idade mínima obrigatória
para todos, diz que os problemas do setor privado são mais pontuais
e que os principais já foram equacionados. Também lembra que o
Governo Lula realizou uma reforma do setor público em 2003 que
soluciona seus problemas fiscais em longo prazo. Mais crítico à
reforma enviada pelo Governo Bolsonaro, o professor da Unicamp
acaba de lançar o livro Previdência: o debate desonesto. “O pessoal
trata a Previdência como uma entidade única, um sistema único.
São realidades e especificidades muito marcadas. Você não pode
usar o argumento do sujeito que entrou no serviço público em
1980 e se aposentou com paridade e integralidade para fazer uma
reforma que visa combater privilégios em que a maior economia vem
do regime geral”. Ele é a favor de tratar cada problema e distorção
separadamente, ao invés de colocar tudo em um grande pacote
de reforma. “Isso é algo intencionalmente feito para confundir”,
argumenta.

Distorções e o que ficou de lado

Entre os aspectos mais negativos e regressivos da reforma,


Medeiros, Barbosa e Marconi apontam para os benefícios aprovados
para policiais federais e rodoviários. As regras mais brandas para
essas categorias foram patrocinadas pelo Governo Bolsonaro
durante a votação dos destaques na Câmara, mas contou também
com o apoio dos deputados da esquerda. “Eles têm rendas mais
altas, vão poder se aposentar muito mais cedo e isso tem um custo
bastante alto”, afirma Medeiros.
Além disso, os quatro economistas concordam que as
maiores fontes de despesas estão na Previdência dos militares. O
Governo enviou a reforma separadamente com a reestruturação da
carreira. Na prática, pouco será economizado com eles. “O problema
é que estão reformando o que já vinha sendo reformado nos últimos
anos, mas estão deixando de fora o que nunca foi reformado. Do
ponto de vista dos privilégios, o problema dos militares é muito
maior”, afirma Fagnani.
O professor da Unicamp defende, além disso, um empenho
maior do Governo Federal para reformar os sistemas de pensão
públicos dos Estados e municípios. Suas despesas previdenciárias
crescem acima da média, mas ficaram de fora da reforma. O senado
voltou a incluí-los na PEC paralela. Caso não seja aprovada, deverão

78
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

se adequar por conta própria. “Alguns se adequaram às normas de


2003 e outros não. Há questões de paridade e integralidade que são
um escândalo”, afirma.
Como atacar o atual desequilíbrio fiscal? Além de reformas
pontuais na Previdência que admite fazer, Fagnani levanta dois
temas nos quais a esquerda costuma sempre insistir: uma reforma
tributária progressiva que atinja as rendas mais altas e o fim dos
benefícios fiscais dados a empresas. Significa atacar o problema não
só pela via da despesa, mas sobretudo pela via da arrecadação. “É
como se a solução tivesse que sair do andar de baixo sempre, não
do de cima”.

FONTE: <https://cutt.ly/rf6cmeQ>. Acesso em: 18 ago. 2020.

1 Após ler com atenção o texto anterior que fala dos impactos da
reforma da Previdência, elenque quais são as mudanças e as
suas consequências.

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3.1.3 Saúde
No Brasil, a saúde começa a ser entendida como um direito de todos
os cidadãos e um dever do Estado a partir da Constituição de 1988 e após a
implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), que se inicia em 1990, logo em
seguida à promulgação da Lei Orgânica da Saúde, Lei nº 8.080/1990. Esta virá

79
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

a ser complementada pela Lei nº 8.142/1990 (NORONHA; LIMA; MACHADO,


2008).

Nessa ocasião, inicia-se a construção de um modelo público e universal


no que se refere às ações e serviços em saúde, que tem como norte princípios
com validade em todo o território nacional. Esse modelo de saúde toma por base
uma perspectiva da saúde como direito de cidadania e como dever do estado, de
modo a agregar em seu modus operandi a democratização e o compartilhamento
do processo decisório e da gestão do sistema de saúde (NORONHA; LIMA;
MACHADO, 2008). O SUS se guiará pelos seguintes princípios: universalização,
equidade e integralidade, conforme é possível apreciar a seguir.

Princípios do Sistema Único de Saúde (SUS)

Universalização: a saúde é um direito de cidadania de


todas as pessoas e cabe ao Estado assegurar este direito, sendo
que o acesso às ações e serviços deve ser garantido a todas as
pessoas, independentemente de sexo, raça, ocupação ou outras
características sociais ou pessoais.
Equidade: o objetivo desse princípio é diminuir desigualdades.
Apesar de todas as pessoas possuírem direito aos serviços, as
pessoas não são iguais e, por isso, têm necessidades distintas. Em
outras palavras, equidade significa tratar desigualmente os desiguais,
investindo mais onde a carência é maior.
Integralidade: este princípio considera as pessoas como
um todo, atendendo a todas as suas necessidades. Para isso, é
importante a integração de ações, incluindo a promoção da saúde,
a prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação. Juntamente,
o princípio de integralidade pressupõe a articulação da saúde com
outras políticas públicas, para assegurar uma atuação intersetorial
entre as diferentes áreas que tenham repercussão na saúde e
qualidade de vida dos indivíduos.

FONTE: <https://cutt.ly/Bf6cR1W>. Acesso em: 18 ago. 2020.

A proposta é que todos tenham acesso à saúde independente da contribuição.


A saúde deve ser universal e os atendimentos pretendem ser de qualidade,

80
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

devendo considerar as diferenças culturais e regionais existentes num país da


dimensão do Brasil. Qualquer cidadão brasileiro tem direito ao Cartão Nacional
de Saúde.

Na Constituição Federal de 1988, a Saúde orienta-se, sobretudo, por meio


dos Artigos 196 a 199. Nestes, estão presentes os princípios, bem como as
diretrizes e atribuições do SUS. Ademais, é possível afirmar que o SUS iniciou
sua implementação no ano de 1990, por meio da aprovação da Lei Orgânica da
Saúde, Lei nº 8.080, a qual estabelece a sua regulamentação (VIANA; BAPTISTA,
2008).

FIGURA 5 – CARTÃO SUS

FONTE: <https://cutt.ly/8f6cIkh>. Acesso em: 18 ago. 2020.

3.2 POLÍTICAS SETORIAIS NO


ÂMBITO DA PROMOÇÃO SOCIAL
As políticas de promoção social, como trabalho, renda, educação,
desenvolvimento agrário, cultura, estão direcionadas para a criação de
possibilidades voltadas para o desenvolvimento dos cidadãos ao longo de seu
percurso pessoal e profissional (FLEURY; OUVERNEY, 2008).

Consulte os links sugeridos e pesquise cada uma das políticas/


planos.

• Trabalho e renda:
https://cutt.ly/Uf6cAYB.

81
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

• Educação:
https://cutt.ly/Af6cA2o.

https://cutt.ly/Uf6cSF8.

• Desenvolvimento agrário:
https://cutt.ly/1f6cDyH.

• Cultura:
https://cutt.ly/Of6cDvX.

3.3 OUTRAS POLÍTICAS SETORIAIS


Classificadas como outras políticas setoriais, tem-se, ainda, a habitação e o
urbanismo e o saneamento básico.

Consulte os links sugeridos e pesquise cada uma das políticas/


planos.

• Habitação e urbanismo:
https://cutt.ly/Fge7mD7.

• Saneamento básico:
https://cutt.ly/zge7Q0g.

3.4 POLÍTICAS TRANSVERSAIS


Existem também as políticas transversais. Elas são assim denominadas por
abarcarem distintas perspectivas de políticas, tanto as de proteção quanto as de
promoção social. A sua elaboração tem acontecido tomando como parâmetro
demandas e objetivos de segmentos específicos da população, como idosos,
crianças e população negra (FLEURY; OUVERNEY, 2008).

82
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

FIGURA 6 – SISTEMA DE DIREITOS

FONTE: <https://cutt.ly/Cge5CFo>. Acesso em: 18 ago. 2020.

Consulte os links sugeridos e pesquise cada uma das políticas/


planos.

• Igualdade de gênero:
https://cutt.ly/Uge51pl.

• Igualdade racial:
https://cutt.ly/5ge514a.

• Crianças e adolescentes:
https://cutt.ly/bge50HN.

• Juventude:
https://cutt.ly/Yge52ci.

• Idosos:
https://cutt.ly/Pge523Q.

83
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

4 A RELAÇÃO ENTRE AS POLÍTICAS


SOCIAIS E AS DEMAIS POLÍTICAS
PÚBLICAS
No conjunto de esferas que constituem a Seguridade Social, a assistência
social é considerada como a que tem maior consciência quanto ao imprescindível
estabelecimento de estratégias direcionadas para a ação intersetorial. Tal fato é
confirmado ao se consultar a elaboração da própria política de assistência social
(MONNERAT; SOUZA, 2011).

4.1 INTERSETORIALIDADE
A intersetorialidade nada mais é do que o trabalho articulado entre políticas
públicas. Isso se concretiza mediante a elaboração de ações, em parceria,
voltadas para a proteção social. Nisso, estão presentes uma atuação que
pressupõe integração, o que vai de encontro com a antiga prática assistencialista
e clientelista que desde sempre esfacelou a atenção às demandas da população.
A ideia presente na proposta da intersetorialidade é a de irmanar distintos setores
sociais em torno de propósitos coletivos, que dizem respeito a todos. Assim, a
intersetorialidade tem relação com a superação das particularidades de cada
política, de modo a fortalecer cada uma delas. Ao abarcar diferentes políticas
colocando-as em diálogo, a intersetorialidade caminha na direção da integralidade
do cuidado (YAZBEK, 2010).

FIGURA 7 – INTEGRALIDADE

FONTE: <https://cutt.ly/Uge56Tq>. Acesso em: 18 ago. 2020.

84
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

A junção de diferentes experiências coloca a possibilidade do melhor


enfrentamento de questões complexas. Trata-se de um novo formato de gestão
em políticas públicas que está fortemente vinculado ao embate com eventos
concretos (YAZBEK, 2010).

Atuar intersetorialmente não é um trabalho fácil. Envolve questões, como


comunicação, negociação e conflitos. Até se chegar a uma ação concreta, passa-
se, primeiro, por essas questões. Estamos falando igualmente de uma atuação
em rede (YASBEK, 2010).

Historicamente, o que tem ocorrido com relação às políticas públicas é o seu


desenvolvimento de modo setorial e sem articulação umas com as outras, o que
de alguma forma tem relação com o modo de gestão levado a cabo a respeito das
políticas públicas, que é de centralização e hierarquização (YAZBEK, 2010).

Um exemplo paradigmático de intersetorialidade é o Programa Bolsa Família.


Este, criado em 2003, pode ser visto como uma forma de integrar políticas de
combate às vulnerabilidades relacionadas à pobreza, ao acesso à educação e ao
trabalho infantil (YAZBEK, 2010).

O Programa Bolsa Família (PBF) traz expressa a preocupação em dar um


passo adiante no enfrentamento da fragmentação da intervenção do Estado
na área social. Isso porque, além da descentralização e do controle social, o
desenho do PBF é fortemente pautado na intersetorialidade. Até hoje nenhum
outro programa social foi tão dependente da articulação intersetorial e, portanto,
das capacidades institucionais e de diálogo político entre os entes da federação
e os diferentes setores responsáveis pelo desenvolvimento das políticas sociais
(MONNERAT; SOUZA, 2011).

1 Leia a notícia a seguir e identifique ao longo dela o trecho que trata


da intersetorialidade com relação ao Programa Bolsa Família.

Setas realiza 3° Seminário Intersetorial do Programa Bolsa Família

85
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Com o objetivo de aprimorar a gestão do Programa Bolsa


Família, técnicos e gestores do Programa Bolsa Família se reúnem
nos dias 4 e 5 de junho a partir das 8 horas, no auditório da
Associação Tocantinense de Municípios (ATM), em Palmas, para o 3º
Seminário Estadual Intersetorial do PBF (Programa Bolsa Família).
O Seminário é uma realização da Secretaria do Trabalho e
Assistência Social (Setas) em parceria com a Secretaria Estadual
de Saúde e Secretaria Estadual de Educação e Cultura, e contará
com a participação dos gestores e técnicos estaduais e municipais
que compartilham com a gestão do programa, viabilizando o
fortalecimento da intersetorialidade nas áreas da Assistência Social,
Educação e Saúde.
De acordo com a coordenadora do Programa Bolsa Família,
Terezinha de Jesus Milhan, “as áreas de Assistência Social,
Educação e Saúde são responsáveis pela articulação, coordenação
e garantia da execução do Programa no Tocantins de maneira a
observar os critérios necessários para que as famílias recebam não
só o benefício financeiro, mas principalmente tenham acesso aos
direitos sociais garantidos pela Constituição Federal”.
Participam do Seminário: Secretários Estaduais e municipais, de
Assistência Social, Educação e Saúde; Técnicos responsáveis pelo
acompanhamento das condicionalidades nas áreas de Educação e
Saúde, gestão do PBF das três áreas e Técnicos de Referência dos
CRAS (Centros de Referência da Assistência Social).

FONTE: <https://cutt.ly/age6VjO>. Acesso em: 24 ago. 2020.

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86
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Na assistência social, o debate em torno da intersetorialidade se


estabeleceu, de fato, a partir da IV Conferência Nacional de Assistência
Social, que ocorreu em 2003, tornando-se a base das reflexões na seara
da assistência social (MONNERAT; SOUZA, 2011).

No ano de 2004, é criado o Ministério do Desenvolvimento


Social (MDS), que tem investido na (re)construção da política de
assistência social com base, sobretudo, na formulação de programas
com desenho intersetorial. A criação do MDS confere um novo
estatuto à política de assistência, com reforço da perspectiva de
profissionalização da área. Isso significa que, pela primeira vez na
história da constituição da seguridade no país, há um movimento
concreto para romper com o legado clientelista e assistencialista que
marca esta área.
Ainda em 2004, o MDS tornou pública a versão final da Política
Nacional de Assistência Social (PNAS), em que se destaca a criação
do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). A PNAS apresenta
a intersetorialidade como requisito fundamental para a garantia dos
direitos de cidadania, e, para efeito da operacionalização do SUAS,
está previsto que as ações no campo da assistência social devem
ocorrer em sintonia e articulação com outras políticas públicas
(BRASIL, 2004).
O SUAS tem como principais pressupostos a territorialidade, a
descentralização e a intersetorialidade. Entende-se que o paradigma
desse sistema articula a descentralização com a intersetorialidade,
uma vez que o objetivo visado é promover a inclusão social ou
melhorar a qualidade de vida, resolvendo os problemas concretos
que incidem sobre a população de um dado território (SIMÕES,
2009).

FONTE: MONNERAT, G. L.; SOUZA, R. G. Da Seguridade


Social à intersetorialidade: reflexões sobre a integração das políticas
sociais no Brasil. R. Katál., Florianópolis, v. 14, n. 1, p. 41-49, jan./
jun. 2011.

87
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

As políticas sociais têm sido estruturadas, atualmente, tendo como eixo o


processo socioeconômico, político e cultural de determinada população inserida
no seu território. Por meio dessa perspectiva inovadora, a política social passa
a ter atuação mediante uma configuração em rede, de modo a ultrapassar tanto
as classificações formais (tais como políticas de proteção e promoção) como
também as delimitações político-administrativas (municipal, estadual e federal), o
que pode ser verificado nos processos de regionalização (FLEURY; OUVERNEY,
2008).

O empecilho para a implantação, de fato, de um sistema de proteção social


no Brasil, tem relação estreita com a dificuldade de integrar políticas e atuar de
forma articulada numa rede de proteção social (MONNERAT; SOUZA, 2011).

As questões da vida moderna são complexas, de modo que atuar de forma


distanciada não parece ser a maneira mais adequada, visto que existem questões
que ultrapassam a competência de um único setor em resolvê-las. É necessário o
envolvimento de diferentes atores sociais (MONNERAT; SOUZA, 2011).

Estamos falando novamente da necessária integração entre as políticas.


Outro exemplo clássico de intersetorialidade e de integração é a Estratégia Saúde
da Família. A promoção da saúde proposta pelo novo modelo de atenção traz à
luz a questão dos determinantes e condicionantes do processo saúde-doença. O
fato é que a mobilização em torno da promoção da saúde demanda a participação
de diferentes atores sociais (MONNERAT; SOUZA, 2011; JUNQUEIRA, 2004).

Segundo o próprio Ministério da Saúde, a equipe de saúde da família tem


como uma de suas atribuições atuar de forma intersetorial, por meio de parcerias
estabelecidas com diferentes segmentos sociais e institucionais, de forma a
intervir em situações que transcendem a especificidade do setor saúde, com
efeitos determinantes sobre as condições de vida e saúde dos indivíduos, famílias
e comunidade (MONNERAT; SOUZA, 2011).

A intersetorialidade é inovadora em termos de gestão, visto que ao mesmo


tempo em que realiza a integração de distintas políticas setoriais, articula diferentes
organizações sociais fomentando as redes sociais. A dinâmica de uma gestão,
que tem na intersetorialidade e na rede um norteador para a maior efetividade na
gestão das politicas sociais, demanda mudanças profundas (JUNQUEIRA, 2004).

88
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Caro acadêmico, leia o relato de experiência de uma ação em


intersetorialidade e reflita a iniciativa e os seus desdobramentos.

O Programa Saúde na Escola (PSE) foi instituído pelo Decreto


Presidencial nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007. Ele resulta do
trabalho integrado entre o Ministério da Saúde e o Ministério da
Educação, com a finalidade de ampliar ações específicas de saúde
aos escolares da rede pública de ensino. Estudantes do Curso
Médico da Universidade do Oeste Paulista, UNOESTE, são inseridos
desde o termo 1 da graduação, em sete ESFs, nos municípios de
Presidente Prudente e Álvares Machado. Os facilitadores utilizam
metodologias ativas, como a problematização, para estimular a
criação de Planos de Ação, relacionados às necessidades de saúde
da comunidade. Um dos Planos de Ação criados pelos estudantes
médicos esteve relacionado ao Princípio da Intersetorialidade.
Facilitadores procuraram a Coordenadora da Secretaria da Educação
do município de Presidente Prudente para organizar uma ação de
Promoção à Saúde envolvendo os setores Saúde e Educação.
A Coordenadora lembrou que a escola tem como missão
principal desenvolver processos de ensino e aprendizagem,
desempenhando um papel fundamental para a formação e atuação
das pessoas em todas as áreas da vida social. Em conjunto com
outros espaços sociais, a escola cumpre um importante papel na
formação dos escolares, com relação à percepção e à construção
da cidadania, além do acesso às políticas públicas. Dessa maneira,
ela pode se tornar um local para ações de promoção à saúde para
crianças, adolescentes e jovens adultos.
A partir dessa conversa houve um incremento na parceria
Academia-Serviço, já existente entre a Secretaria de Saúde de
Presidente Prudente e a UNOESTE, que foi ampliada para a
Secretaria de Educação do município.
A partir da parceria estabelecida entre a UNOESTE e as duas
Secretarias, os acadêmicos do Curso Médico começaram a realizar
ações de Educação em Saúde nas escolas municipais de Presidente
Prudente e Álvares Machado. Facilitadores utilizaram o Arco de
Maguerez para estimular reflexão na ação. Nas reflexões, registradas
nos portifólios formativos, os estudantes entenderam que o trabalho de
promoção à saúde com os escolares, com professores e funcionários,
precisa ter como ponto de partida “o que eles sabem” e “o que eles
podem fazer”, desenvolvendo em cada um a

89
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

capacidade de interpretar o cotidiano e atuar de


modo a incorporar atitudes e/ou comportamentos
adequados para a melhoria da qualidade de
vida dessas pessoas.
Facilitadores consideraram que, nesse processo, os alicerces
são as “forças” de cada um, no desenvolvimento da autonomia
e de competências para o exercício pleno da cidadania. Dessa
maneira, dos profissionais de saúde e de educação espera-se que,
no desempenho das suas funções, eles assumam uma atitude
permanente de empoderamento dos escolares, professores e
servidores das escolas, a partir da utilização da Política Nacional da
Promoção à Saúde. Os participantes consideraram como positiva a
ação de criação de ambientes saudáveis executada no território da
ESF Humberto Salvador, em Presidente Prudente, SP.

FONTE: <https://cutt.ly/mgttKDc>. Acesso em: 24 ago. 2020.

A perspectiva do trabalho em rede está relacionada à ideia de um entrelaçado


de relações, em que os indivíduos constituiriam os nós. Essa metáfora revela o
necessário vínculo entre as instituições sociais que têm os atores sociais como
mediadores (JUNQUEIRA, 2004).

Leia a notícia a seguir que trata, no contexto atual da pandemia


da COVID-19, da importância do trabalho intersetorial e em rede.
Aproveitamos para destacar que no mundo acadêmico, na área
da saúde, o campo de estudos da população e sua relação com
o SUS, a disseminação de doenças e relação com os fatores
sociais, econômicos, entre outros, é a epidemiologia. Um estudo
epidemiológico deverá, assim, considerar diversos fatores inseridos
na sociedade.

Só a saúde resolve? A urgência de ações intersetoriais na


crise da Covid-19

Os variados efeitos da crise da Covid-19 já têm sido sentidos


no mundo inteiro. Embora a saúde seja a sua face mais visível,
o enfrentamento da doença coloca em evidência outras áreas
também afetadas. Ao observar os impactos dos últimos meses, já

90
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

temos visto problemas de naturezas variadas, como o aumento


do desemprego e da pobreza, aumento de violência doméstica,
problemas de moradia pela inviabilidade de pagamento de aluguel,
crescimento da insegurança alimentar, potencial aumento das
desigualdades educacionais, entre outros.
Enquanto os Estados têm avançado no enfrentamento da face
sanitária da doença, provendo serviços de saúde emergenciais, e
na sua face econômica, com políticas anticíclicas e de distribuição
de renda emergencial, ainda há poucos avanços em outras áreas
também bastante sensíveis frente à crise. Isso se torna mais grave
em contextos de alta desigualdade e muita vulnerabilidade, como
o brasileiro. Já há diversas evidências de que a crise sanitária
afeta de forma desigual (e mais incidente) grupos populacionais
tradicionalmente mais vulneráveis – como os mais pobres, as
mulheres, os negros e os que moram em situação precária.
Além de estarem sujeitos a maiores taxas de mortalidade, suas
vulnerabilidades são ainda mais exacerbadas pelos múltiplos
problemas decorrentes da crise. Para esta multiplicidade de
problemas, há poucas soluções sendo propostas.
Quais são as soluções, por exemplo, para lidar com a população
em situação de rua que está fisicamente exposta à doença, não
tem materiais de higiene, não pode fazer isolamento e não tem
documentos para acessar a renda mínima emergencial? Ou como
tratar da população que vive em condições habitacionais precárias,
como cortiços e favelas, com alta densidade populacional e que
não pode fazer distanciamento ou acessar água limpa para lavar
as mãos? Como resolver o problema da população de baixa renda
que precisa continuar trabalhando durante a crise e não tem onde
deixar suas crianças (estas últimas, inclusive, precisando de apoio e
estrutura para as aulas on-line)?
Estes são apenas alguns exemplos que mostram a complexidade
da crise atual e a multiplicidade e interdependência dos problemas a
ela relacionados, os quais não podem ser resolvidos apenas com
intervenções das áreas de saúde e economia.
A compreensão dos diversos efeitos da crise não é clara, assim
como não são simples as soluções. Cada problema gerado possui
diferentes fatores causais e possibilidades de soluções, muitas
vezes contraditórios. Isso caracteriza o que tratamos na literatura
como problemas perversos (termo cunhado em inglês como wicked
problem). Estes problemas são aqueles que possuem definições
dinâmicas, muitas causas, inter-relação com outros problemas e falta
de consenso quanto às soluções apropriadas.
Problemas perversos demandam soluções complexas,

91
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

inter-relacionadas e de natureza intersetorial. Pensar em


intersetorialidade é compreender que a lógica verticalizada e
setorial, característica da administração pública, não resolve
problemas que são multidimensionais, como é o caso da pobreza
e da vulnerabilidade, por exemplo. Ao olhar integralmente para
questões que são multifacetadas, a intervenção deve deixar de ser
fragmentada, tornando-se horizontal e sinérgica. Neste contexto de
pandemia, no qual existe um ciclo relacional de problemas, é urgente
evidenciarmos respostas intersetoriais e não isoladas.
No entanto, assim como outras emergências, a crise da
Covid-19 exacerba dificuldades estruturais na sociedade e na
administração pública, e a baixa capacidade de promover políticas
complexas e intersetoriais tem sido apontada, há alguns anos,
como um dos grandes nós da administração pública no Brasil e
no mundo. Governos constroem soluções simples, setorializadas
e pontuais para enfrentar problemas cuja natureza dependeria de
intervenções múltiplas e interdependentes.
Para problemas de pobreza, distribuímos renda. Para
problemas de aprendizado, construímos escolas. Para problemas
de insegurança alimentar, fornecemos cesta básica. No entanto,
as soluções setoriais e específicas apenas enxugam o gelo e não
conseguem enfrentar a natureza original dos problemas perversos. Ao
tratar estes problemas de forma setorial, comprometemos o alcance
de efetividade e de eficiência nas respostas. Comprometemos a
efetividade na medida em que as soluções simples não geram
impacto nem resolvem o problema na sua integralidade. Geramos
ineficiência pelo aumento de gastos em políticas que não conseguem
obter resultados e pela sobreposição de soluções repartidas em
secretarias e órgãos governamentais distintos. O enfrentamento a
problemas complexos requer, portanto, que os governos construam
soluções que integrem diferentes secretarias e políticas. Requer
uma articulação entre setores governamentais que, tradicionalmente,
trabalham sozinhos.
Frente à crise atual, cabe aos governos, acima de tudo,
pensar em políticas articuladas, que envolvam diferentes setores,
apresentem soluções integradas e capazes de lidar com múltiplos
fatores e causas. Os gabinetes emergenciais de enfrentamento à
crise, adotados por diversos municípios e governos estaduais, são
um bom exemplo de intersetorialidade frente à emergência. Eles
articulam diferentes órgãos governamentais que são prioritários
neste momento e concentram suas decisões conjuntas no gabinete
governamental. Isso possibilita construir propostas de soluções
rápidas e articuladas, aumentando a chance de sua integralidade.

92
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

No entanto, não adianta apenas promover a integração no alto


escalão. A integração acontece, de fato, no nível da rua, onde os
profissionais da linha de frente dos serviços encontram as situações
complexas e precisam fazer encaminhamentos articulados –
caso eles existam. Os profissionais que atendem à população em
situação de rua, por exemplo, precisam ser capazes de dar soluções
emergenciais relativas à renda, à documentação, à higiene, ao
acolhimento emergencial, e, claro, à saúde.
No que tange à intersetorialidade na execução dos serviços,
infelizmente, ainda não temos visto grandes avanços perante a crise.
Em uma pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos da Burocracia
(NEB-FGV) com profissionais da linha de frente das áreas de
assistência e saúde, perguntamos aos profissionais em que medida
eles estavam realizando ações articuladas com outros setores.
Apenas 40% deles afirmaram que fazem algum tipo de articulação –
e em geral ela depende das decisões individuais destes profissionais.
Ao mesmo tempo, gestores de diferentes serviços da ponta têm nos
reportado que são cada vez mais demandados por informações
de outros setores. Uma diretora de escola e profissionais de uma
Unidade Básica de Saúde nos contaram que recebem dezenas de
telefonemas por dia de pais e mães pedindo informações sobre a
renda mínima emergencial. Frente ao desespero e à falta de contato
com os serviços de assistência, as famílias acabam procurando
aqueles profissionais com quem interagem cotidianamente.
Principalmente em momentos de emergência, estes trabalhadores
que estão na linha de frente e suas respectivas áreas deveriam ser
capazes de repassar informações de outros serviços para facilitar a
vida dos cidadãos mais afetados.
Assim, trazer o debate da intersetorialidade no atual contexto é
reforçar a importância das medidas e políticas emergenciais estarem
relacionadas entre si. É necessário que sejam desenvolvidos
modelos que integrem a gestão governamental e alterem estruturas
e práticas institucionais, enfrentando as resistências que surgem
com estas mudanças. Ao ter como objetivo comum o enfrentamento
à pandemia e aos efeitos por ela gerados, as diferentes áreas devem
identificar conjuntamente os resultados esperados, de modo que
as intervenções sejam articuladas e pactuadas do alto escalão ao
profissional da linha de frente. Algumas propostas concretas, neste
sentido, são:
• Investir nos gabinetes emergenciais de crise e ampliar seu
escopo de atuação, de modo que nele sejam envolvidas outras áreas
além da saúde, incluindo os setores econômico, social, ambiental,
de educação, entre outros. A efetividade destes gabinetes depende

93
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

de terem legitimidade e apoio político; de terem acesso à informação


rápida e assertiva e de gerarem soluções concretas para serem
implementadas rapidamente.
• Elaborar planos de ação com metas que sejam
compartilhadas e compactuadas entre diferentes setores e atividades
integradas que incentivem o trabalho articulado e conectem
diferentes áreas da administração pública.
• Priorizar a população vulnerável, que sofre o impacto
da pandemia de maneira desigual, estabelecendo prioridades
no atendimento e levando em conta as especificidades destas
pessoas. Deste modo, a intersetorialidade nas ações e nos serviços
emergenciais deve ser construída de tal modo que os trabalhadores
da linha de frente busquem a equidade na atenção integral.
• Viabilizar e incentivar a articulação intersetorial
pelos profissionais da linha de frente, por meio de fluxos de
encaminhamentos definidos e repasse de informações sobre os
serviços de emergência.
• Criar centrais únicas de informações sobre serviços
emergenciais, tanto telefônicas como pela internet, nas quais
profissionais da prefeitura ficam concentrados em informar diferentes
serviços e fazer encaminhamentos integrados, numa espécie de
“hub” de emergência.

O cenário atual coloca em evidência os desafios que


a intersetorialidade traz consigo. Superá-los agora significa
estabelecer novos arranjos que podem, inclusive, ser continuados
nas circunstâncias pós-pandemia, servindo como um aprendizado
de como diversos setores podem se complementar. Foi justamente
dentro do setor da saúde que a intersetorialidade se fortaleceu como
conceito há décadas atrás, inserida na discussão de saúde como
qualidade de vida. Assim, a integralidade no atendimento promovida
pelos trabalhadores da linha de frente precisa ser construída com
o consenso de que existem determinantes sociais e que estes
ultrapassam a competência de um só setor ou departamento.

FONTE: <https://cutt.ly/dgtyPhe>. Acesso em: 24 ago. 2020.

94
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

4.2 REGIONALIZAÇÃO
Para a constituição de políticas sociais é mister que se considere as
desigualdades sociais e regionais, ou seja, ao se falar de políticas sociais não
se pode deixar de lado políticas de desenvolvimento regional, dada a extrema
desigualdade por região no Brasil. Nessa direção, fala-se da necessidade de
políticas de desenvolvimento regional articuladas ao padrão de desenvolvimento
nacional, que possam fazer frente aos enormes desequilíbrios regionais,
históricos, que permanecem na vida nacional hodierna (GIMENEZ, 2017).

Já desde tempos remotos, na era Vargas e na gestão de Kubitschek, havia


um nível maior de informação sobre as diferenças regionais, indicando que “o
acelerado processo de industrialização tendia a acentuar os desequilíbrios
regionais” (GIMENEZ, 2017, p. 8). Nessa direção, o necessário planejamento
econômico focado no desenvolvimento percebeu como fundamental a
incorporação da questão regional, devido às profundas assimetrias entre as
regiões do país (GIMENEZ, 2017).

Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=UVab41Zn7Yc


e assista ao clip da música “A cidade”, de Chico Science & Nação
Zumbi. A partir do clip e da letra da música, reflita com seus colegas
sobre a sua relação com a questão do território.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

O sol nasce e ilumina as pedras evoluídas


Que cresceram com a força de pedreiros suicidas
Cavaleiros circulam vigiando as pessoas
Não importa se são ruins, nem importa se são boas
E a cidade se apresenta centro das ambições
Para mendigos ou ricos e outras armações
Coletivos, automóveis, motos e metrôs
Trabalhadores, patrões, policiais, camelôs
A cidade não para, a cidade só cresce
O de cima sobe e o de baixo desce
A cidade não para, a cidade só cresce
O de cima sobe e o de baixo desce
A cidade se encontra prostituída
Por aqueles que a usaram em busca de saída
Ilusora de pessoas de outros lugares
A cidade, sua fama vai além dos mares
No meio da esperteza internacional
A cidade até que não está tão mal
E a situação sempre mais ou menos
Sempre uns com mais e outros com menos
A cidade não para, a cidade só cresce
O de cima sobe e o de baixo desce
A cidade não para, a cidade só cresce
O de cima sobe e o de baixo desce
Eu vou fazer uma embolada, um samba, um maracatu
Tudo bem envenenado, bom pra mim e bom pra tu
Pra gente sair da lama e enfrentar os urubus
Eu vou fazer uma embolada, um samba, um maracatu
Tudo bem envenenado, bom pra mim e bom pra tu
Pra gente sair da lama e enfrentar os urubus
Num dia de sol, Recife acordou
Com a mesma fedentina do dia anterior
A cidade não para, a cidade só cresce
O de cima sobe e o de baixo desce
A cidade não para, a cidade só cresce
O de cima sobe e o de baixo desce
(Letra: Chico Science)

Estar atentos ao território e as suas singularidades é fundamental para


a constituição e a efetividade das políticas públicas, de um modo geral, e das

96
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

políticas de assistência social, de forma particular. Assim, Koga (2005) alerta para
a importância de realizar a aproximação entre a política de assistência social
à complexa performance da realidade. Tal empreitada pode ser concretizada
mediante “a disposição de informações territorializadas”, de modo a “indicar
metas e objetivos também mais concretos da própria política” (KOGA, 2005, p.
18). Nessa direção, cinco agrupamentos de municípios foram constituídos com a
finalidade de atuar, tomando como foco o território.

QUADRO 3 – CLASSIFICAÇÃO DE MUNICÍPIOS

FONTE: Adaptado de PNAS (2004 apud KOGA, 2005)

Esse quadro, apesar do seu foco no território como forma de viabilizar


a concretude das políticas sociais aproximando-as da realidade palpável dos
territórios, nos coloca frente à dimensão das metrópoles, que podem comportar
no seu interior distintos territórios e diferentes realidades. Quanto a isso, Koga
(2005) afirma que a análise do país trouxe a visão das condições de vida das
populações a partir desses agrupamentos, demonstrando de saída a discrepância
desafiadora para a política de assistência social: 20% da população brasileira vive
em municípios pequenos, com menos de 20.000 habitantes, e estes municípios
são cerca de quatro mil, enquanto que outros 20% da população vive nas
metrópoles, cuja população ultrapassa 900.000 habitantes, embora elas sejam
apenas 16 cidades com esta superdimensão. Isso nos indica alguns problemas:
como elaborar políticas sociais com grandezas de população em contextos tão
diferenciados? É possível utilizar os mesmos critérios para municípios pequenos
e metrópoles? Cada metrópole representa um território homogêneo?

Há de se considerar, portanto, as dimensões do território. A realidade


social e os contextos se mostram ainda mais complexos se levarmos em conta
a diversidade territorial que pode ser captada dentro de um mesmo território de
superdimensões.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Prezado acadêmico, percorra a sua cidade e observe como está


disposto o território. Você consegue perceber diferenças abismais
entre um bairro e outro? Identifica algum tipo de desigualdade social
no espaço percorrido? Compartilhe com os colegas de curso suas
impressões.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Prezado acadêmico, procuramos resgatar nesse capítulo a importância da
questão social para lidar com as desigualdades próprias da sociedade capitalista.
Nessa empreitada, estão presentes reflexões sobre a divisão da sociedade em
classes sociais e a desigual distribuição da riqueza. Assim, trouxemos o debate
das políticas sociais, mostrando como elas são importantes para lidar com essa
desigualdade, que é estrutural.

Apontamos para o impacto do capital financeiro sobre a questão social,


podendo arruinar projetos que visam à coletividade. O desmonte das políticas
sociais tem sido uma prática na realidade brasileira, conduzindo à desproteção
social.

Opondo-se à perspectiva de defesa do Estado mínimo e de sucateamento


das políticas públicas, mostramos haver a proposta do acesso universal às
políticas sociais, bem como a concretização da justiça social.

Apontamos para o equívoco de se pensar que as políticas focalizadas


tenham competência, com sua seletividade, de chegar a todos os cidadãos, de
modo que os seus direitos sejam asseverados. Ao contrário, temos urgência de
políticas universais que consigam fazer valer a justiça social para todos.

A Constituição Federal é apontada como grande mola propulsora responsável


pela criação de políticas sociais, por meio da seguridade social. O SUAS e o SUS
são exemplos de concretização social de políticas sociais.

Colocamos você, aluno, em contato com as duas frentes das políticas sociais:
de seguridade social (assistência social, saúde e previdência) e de promoção
social (trabalho, renda, educação, desenvolvimento agrário e cultura).

98
Capítulo 2 TIPOS DE POLÍTICAS SOCIAIS

Mostramos, ainda, como a intersetorialidade é fundamental para a


constituição e a efetivação dessas políticas sociais, por sua capacidade de colocar
em contato e em diálogo diferentes setores, de modo a fortalecê-los.

Por fim, destacamos como a efetivação das políticas sociais, ainda que venha
ocorrendo, mantém-se como um ideal, não se concretizando na sua completude
devido às constantes investidas das políticas neoliberais no intuito de enfraquecer
a mobilização em torno da questão social.

99
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

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101
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

102
C APÍTULO 3

GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Explanar o papel dos municípios na gestão das políticas sociais.

 Compreender como a gestão em políticas sociais deve ser conduzida, tendo


por base as diretrizes nacionais oficiais.

 Compreender a abordagem do Planejamento, Monitoramento e Avaliação de


Políticas Sociais no Brasil.

 Explanar como é operado o financiamento das políticas sociais.

 Abordar conceitos e casos que implicam na direção, gestão e financiamento de


políticas sociais.

 Apontar como o planejamento, o monitoramento e a avaliação em políticas


sociais pode ocorrer de modo a contemplar a participação dos diferentes atores
sociais, num movimento de corresponsabilização que implica toda a população.
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

104
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Prezado acadêmico! Quando falamos em políticas sociais estamos tratando
de questões como: proteção social; vigilância social e defesa de direitos
socioassistenciais.

Os direitos de cidadania que não se concretizam na realidade dos sujeitos


vêm a ser assegurados mediante a criação de políticas sociais direcionadas
para os cidadãos e as suas demandas mais fundamentais. Essas demandas
são diversas e os públicos a que elas se dirigem são igualmente diversificados:
crianças, adultos, idosos, pessoas com deficiência, mulheres e famílias no seu
conjunto.

Para que essas políticas sejam levadas adiante, elas necessitam de respaldo
e de investimento por parte do poder público. As demandas sociais precisam
ser ouvidas por aqueles que detêm o poder de implementar leis e políticas.
A sociedade civil também se mostra atuante no sentido de pressionar o poder
público nessa direção.

Também é importante que haja avaliação e monitoramento das políticas


sociais concomitantemente ao seu funcionamento, para que assim possam
ser detectadas as suas fragilidades e os seus pontos fortes. A monitoração e
a avaliação da construção é feita em conjunto com a participação, de um lado,
daqueles que colocam em prática as políticas e, de outro lado, os gestores,
diálogo importante para que ocorra um feedback com relação ao que é necessário
melhorar e o que foi exitoso e pode ser replicado.

Além disso, o financiamento é o grande propiciador da execução das


políticas e da sua continuidade. Os repasses, convênios e contratos fazem parte
de um rol de possibilidades no que diz respeito ao investimento e ao incentivo
aos programas e políticas. Estas, necessárias para assegurar aos cidadãos o
acesso a bens e serviços básicos e que constituem uma parte da construção de
um modelo de proteção social de sucesso permanente.

Assim, convidamos você, prezado acadêmico, a conhecer melhor e se


aprofundar nas questões relativas às políticas sociais no âmbito do funcionamento
dos programas e políticas, do seu monitoramento e avaliação e do seu
financiamento pelo poder público.

105
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

2 GESTÃO DO SUAS
A gestão do SUAS ocorre por meio de secretarias, comissões, conselhos e
fundos. Como é possível perceber por meio da imagem a seguir, enquanto órgãos
gestores, temos: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à fome e
Secretarias estaduais e municipais. Como instâncias de negociação e pactuação:
a Comissão Intergestora Tripartite e a Comissão Intergestora Bipartite. Como
instâncias de deliberação e controle social: o Conselho Nacional, os Conselhos
Estaduais e os Conselhos Municipais. Como instâncias de financiamento: o
Fundo Nacional, os Fundos Estaduais e os Fundos Municipais (BRASIL, 2005)

FIGURA 1 – FUNCIONAMENTO DO SUAS

FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/3665592/>. Acesso em: 26 ago. 2020.

2.1 GESTÃO COMPARTILHADA


O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é constituído por quatro
esferas de gestão: a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios. O
Artigo 12 do NOB-SUAS dispõe sobre a responsabilidade dos Entes (União,
Estados, municípios e Distrito Federal). Trata-se de um processo de gestão que

106
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

ocorre de forma descentralizada, no qual há participação de outras instâncias, as


denominadas Comissões Intergestores. Estas se resumem a espaços em que as
demandas de gestores da união, dos estados e dos municípios são articuladas
e expressas, de modo que sejam vistas como espaços de negociação e de
pactuação (BRASIL, 2015).

2.1.1 O papel da União


A responsabilidade da União é com relação a questões, como formulação,
apoio, articulação e coordenação de ações (BRASIL, 2015).

Vale destacar a importância do Art. 13 do NOB-SUAS. Nele são elencadas


as responsabilidades da União, a qual, em última instância, tem como papel
principal o repasse financeiro aos Estados, DF e Municípios, nos moldes
constitucionais (Art. 195, § 10 da CRFB), para que estes consigam dar vazão ao
Bolsa Família e demais programas. Exemplos visíveis disso são os programas de
assistência social que o atual Governo busca emplacar, como se fosse um novo
“bolsa família”. Importante igualmente lembrar que a competência da União em
matéria de assistência social se insere no LOAS (Lei nº 8.742/93), Artigo 12, de
observância obrigatória na gestão.

2.1.2 O papel do estado


A responsabilidade do estado é de gerir a assistência social no alcance de
seu âmbito de competência, sendo que suas responsabilidades de atuação foram
estabelecidas pela Norma Operacional Básica (NOB-SUAS) (BRASIL, 2015).
Importante fazer menção ao Artigo 15 do NOB-SUAS, o qual traz especificamente
as responsabilidades dos estados. Igualmente importante é o Art. 13 do LOAS
(Lei nº 8.742/93), que traz as competências dos estados.

2.1.3 O papel do município e do Distrito


Federal
No que concerne aos municípios e ao Distrito Federal, a habilitação ao SUAS
passa por três níveis, denominados inicial, básico e pleno:

A gestão inicial fica por conta dos municípios que atendam


a requisitos mínimos, como a existência e funcionamento de

107
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

conselho, fundo e planos municipais de assistência social,


além da execução das ações da Proteção Social Básica com
recursos próprios. No nível básico, o município assume, com
autonomia, a gestão da proteção social básica. No nível pleno,
ele passa à gestão total das ações socioassistenciais (BRASIL,
2015).

Atualmente, os municípios, mais do que nunca, têm tido uma atuação de


grande relevância. Lembrando o seu papel ímpar nos dias recentes, em que
a eles compete a tarefa principal, a linha de frente, de assistência social e de
saúde. Igualmente relevante mencionar aqui o Artigo 17 do NOB-SUAS, o qual
traz as responsabilidades municipais em matéria assistencial. Ademais, cabe
fazer menção aos Artigos 14 e 15 do LOAS (Lei nº 8.742/93), que elencam as
competências distritais e municipais.

2.2 VIGILÂNCIA SOCIOASSISTENCIAL


Ao se pensar em proteção social urge desfazermos o equívoco de pensar
que a atenção assistencial só ocorre após a instalação do problema, ou seja, o
histórico caminhar mirando ações emergenciais, usualmente conferidas à seara
da assistência social. Ao contrário, proteção social demanda o desenvolvimento
de ações preventivas. Nessa direção, no caso específico do Brasil, a assistência
social desempenha três papéis, que inclusive são apresentados na PNAS-2004, os
quais são: proteção social; vigilância social e defesa de direitos socioassistenciais
(SPOSATI, 2009). Portanto, a assistência social não pode ficar restrita à proteção
social, ela deve focar igualmente na vigilância social e na defesa de direitos
socioassistenciais (SPOSATI, 2009; PAZ, 2005).

De um lado, é necessário ter informação de onde se localizam e a quantidade


dos sujeitos que demandam por proteção. De outro lado, é preciso saber qual
o potencial da rede existente para prover tais necessidades. Operando dessa
forma é possível ter uma visão mais ampla, que é imprescindível na definição das
responsabilidades das esferas de governo (SPOSATI, 2009).

Sobre a Vigilância Socioassistencial, leia o texto a seguir da


página da Secretaria Especial do Desenvolvimento Social.

A Vigilância Socioassistencial tem como objetivo a produção,


a sistematização, a análise e a disseminação de informações
territorializadas:

108
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

I – das situações de vulnerabilidade e risco que incidem sobre


famílias e indivíduos e dos eventos de violação de direitos em
determinados territórios;
II – do tipo, volume e padrões de qualidade dos serviços ofertados
pela rede Socioassistencial.

A adequação entre as necessidades da população e a oferta


dos serviços, vistos na perspectiva do território, deve ser um tema
sob permanente análise da área de Vigilância. Essa visão de
totalidade é fundamental para a definição de responsabilidade e para
o planejamento das ações, integrando necessidades e ofertas.
A Vigilância Socioassistencial constitui-se também como uma
área de gestão da informação, dedicada a apoiar as atividades
de planejamento, de supervisão e de execução dos serviços
socioassistenciais por meio do provimento de dados, indicadores
e análises, e deve estar estruturada e ativa em nível municipal,
estadual e federal.

FONTE: <https://cutt.ly/wgsxzUg>. Acesso em: 26 ago. 2020.

2.3 PACTO DE APRIMORAMENTO DO


SUAS
Trata-se de um instrumento que visa, como o mesmo nome diz, aprimorar a
gestão, de modo a aperfeiçoar a gestão descentralizada do SUAS. Nessa melhora
estão inclusos, no âmbito socioassistencial, projetos, serviços, programas e
benefícios (BRASIL, 2015).

Ao consultarmos o link da página da Secretaria Especial do


Desenvolvimento Social, temos as seguintes informações sobre o
Pacto de Aprimoramento do Suas:

A Norma Operacional Básica do Suas (NOB-SUAS) estabelece


que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem
elaborar o Pacto de Aprimoramento do Suas, contendo:

109
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

• ações de estruturação e aperfeiçoamento do SUAS;


• planejamento e acompanhamento da gestão, organização
e execução dos serviços, programas, projetos e benefícios
socioassistenciais.

O Pacto é o instrumento pelo qual são estabelecidas as metas


e as prioridades nacionais no âmbito do SUAS, e se constitui como
mecanismo de aprimoramento do Sistema como um todo.
A periodicidade de elaboração do Pacto é quadrienal, com
acompanhamento e revisão anual das prioridades e metas
estabelecidas. O SUAS conta com o Pacto de Aprimoramento
da Gestão Municipal e com o Pacto de Aprimoramento da Gestão
Estadual.
A Comissão Intergestores Tripartite (CIT) definiu na sua 124ª
reunião ordinária as Prioridades e Metas para a gestão municipal
para o quadriênio 2014/2017. Quanto às Prioridades e Metas para a
gestão estadual, o atual Pacto estabelecido encontra-se em período
de transição, sua revisão foi realizada em outubro de 2013 com
validade até 2015, quando deverá ser elaborado um novo Pacto de
Aprimoramento com validade de quatro anos.
Conforme o Artigo 24 da NOB-SUAS 2012, o Pacto de
Aprimoramento do SUAS compreende:

I – definição de indicadores;
II – definição de níveis de gestão;
III – fixação de prioridades e metas de aprimoramento da gestão,
dos serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais do
SUAS;
IV – planejamento para o alcance de metas de aprimoramento
da gestão, dos serviços, programas, projetos e benefícios
socioassistenciais do SUAS;
V – apoio entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, para o alcance das metas pactuadas; e
VI – adoção de mecanismos de acompanhamento e avaliação.

O Pacto de Aprimoramento da Gestão do SUAS representa


o compromisso entre o MDS e os órgãos gestores da assistência
social dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, que tem
como objetivo o fortalecimento desses órgãos para o pleno exercício
da gestão do SUAS, do Bolsa Família e do Cadastro Único para
Programas Sociais, no seu âmbito de competência.
O acompanhamento e a avaliação do Pacto têm por objetivo

110
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

observar o cumprimento de seu conteúdo e a efetivação dos


compromissos assumidos entre os entes para a melhoria contínua
da gestão, dos serviços, programas, projetos e benefícios
socioassistenciais, visando a sua adequação gradativa aos padrões
estabelecidos pelo SUAS.

FONTE: <https://cutt.ly/OgsxOLo>. Acesso em: 26 ago. 2020.

2.4 COMISSÕES INTERGESTORES


As comissões Intergestores são instâncias de pactuação, no que diz respeito
ao processo de gestão do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Essas
comissões se dividem em Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e Comissões
Intergestores Bipartite (CIB) (BRASIL, 2015). A CIT é tripartite por ser composta
por União, Estados, Municípios e DF. Este é um misto, inserindo-se entre os dois
últimos. Já a CIB é bipartite por ser constituída por Estados e Municípios. Tais
informações encontram-se no NOB-SUAS, Artigos 129 e 130.

Conforme o que consta no link da página da Secretaria Especial


do Desenvolvimento Social, temos as seguintes informações sobre
as Comissões Intergestores:

O processo de gestão do Sistema Único da Assistência


Social (SUAS) conta com instâncias de pactuação: a Comissão
Intergestores Tripartite (CIT) e as Comissões Intergestores Bipartite
(CIB). A CIT é um espaço de articulação e expressão das demandas
dos gestores federais, estaduais e municipais. Ela negocia e pactua
aspectos operacionais da gestão do SUAS e, para isso, mantém
contato permanente com a CIB, de modo a garantir a troca de
informações sobre o processo de descentralização.
A CIT é constituída pelas três esferas que compõem o SUAS:
a União, representada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS); os estados e Distrito Federal, representados
pelo Fórum Nacional de Secretários de Estado de Assistência Social
(Fonseas); e os municípios, representados pelo Colegiado Nacional
de Gestores Municipais de Assistência Social (Congemas). Entre as
principais funções da CIT estão:

111
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

• pactuar estratégias para implantação e operacionalização;


• estabelecer acordos sobre questões operacionais da implantação
dos serviços, programas, projetos e benefícios;
• atuar como fórum de pactuação de instrumentos, parâmetros,
mecanismos de implementação e regulamentação;
• pactuar os critérios e procedimentos de transferência de recursos
para cofinanciamentos; entre muitas outras.

A CIB consiste na instância estadual destinada à interlocução


de gestores, constituída por representantes do estado, indicados
pela Secretaria Estadual de Assistência Social ou congênere e por
representantes dos municípios, indicados pelo Colegiado Estadual
de Gestores Municipais de Assistência Social (Coegemas), que
representam os interesses e as necessidades do estado, referentes
à assistência social.
A CIB, como instância na qual se concretiza a gestão
compartilhada do SUAS em âmbito estadual, deve pactuar a
operacionalização da gestão e organização do sistema, definindo
estratégias para implementar e operacionalizar a oferta de serviços e
benefícios em âmbito estadual.

Representantes das três instâncias do SUAS na CIT:


Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(MDS). O MDS é o órgão da União responsável pela coordenação
do SUAS. Na CIT, está representado pela Secretaria Nacional de
Assistência Social (SNAS).

Fonseas
O Fórum Nacional de Secretários de Estado de Assistência
Social (Fonseas) é formado pelos gestores estaduais e do Distrito
Federal de assistência social. É um importante mecanismo na gestão
colegiada da Política Nacional de Assistência Social, pois tem como
objetivo o fortalecimento da participação dos estados na definição
dessa política pública.

Congemas
O Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência
Social (Congemas) representa os municípios brasileiros junto ao
Governo Federal e aos governos estaduais. Seu objetivo é fortalecer
a representação municipal nos conselhos, comissões e colegiados
de assistência social em todo o Brasil.

FONTE: <https://cutt.ly/Rgsx0wV>. Acesso em: 26 ago. 2020.

112
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

2.5 SISTEMAS DE INFORMAÇÃO DA


REDE SUAS
A Rede SUAS, ou também conhecido como Sistema Nacional de Informação
do Sistema Único de Assistência Social, possui a atribuição de prover as
demandas de comunicação no que diz respeito ao SUAS, bem como no que
concerne ao acesso a dados referentes à implementação da Política Nacional de
Assistência Social (PNAS) (BRASIL, 2015).

Leia o texto a seguir, extraído da página da Secretaria Especial


do Desenvolvimento Social, Sistemas de Informação da Rede Suas:

A Rede SUAS é um instrumento de gestão, organizando a


produção, o armazenamento, o processamento e a disseminação
dos dados.
Com isso, dá suporte à operação, ao financiamento e ao controle
social do SUAS e garante transparência à gestão da informação.
A Rede SUAS é composta por ferramentas que realizam registro e
divulgação de dados sobre recursos repassados; acompanhamento
e processamento de informações sobre programas, serviços e
benefícios socioassistenciais; gerenciamento de convênios; suporte
à gestão orçamentária; entre outras ações relacionadas à gestão da
informação do SUAS.

FONTE: <https://cutt.ly/fgscpDZ>. Acesso em: 26 ago. 2020.

2.6 GESTÃO DO TRABALHO


A Gestão do Trabalho é o campo que cuida de aspectos vinculados ao
trabalho social e aos trabalhadores atuantes na política de assistência social.
Trata-se de uma das esferas de gestão do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS). A gestão do trabalho envolve, no âmbito da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, questões, como planejamento, organização
e execução de ações voltadas ao reconhecimento do trabalhador, bem como à
organização do processo de trabalho institucional (BRASIL, 2015).

113
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Leia o texto a seguir, extraído da página da Secretaria Especial


do Desenvolvimento Social, a respeito da gestão do Trabalho:

A Gestão do Trabalho é um eixo estratégico e imprescindível


à qualidade da prestação de serviços, programas, projetos,
benefícios e transferência de renda no âmbito do SUAS. O trabalho
na assistência social possui uma importante dimensão relacional
e seus trabalhadores são os principais mediadores entre o direito
socioassistencial e os usuários da política.
Portanto, a valorização dos trabalhadores, a estruturação de
condições institucionais de trabalho e implementação sistemática
de ações de formação e capacitação potencializam a efetivação e a
qualidade do SUAS.
A Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS
(NOB-RH/SUAS), a Norma Operacional Básica do SUAS (NOB-
SUAS) e a Lei Orgânica de Assistência Social, regulamentam
a Gestão do Trabalho no âmbito do SUAS e estabelecem seus
princípios e diretrizes.

FONTE: <https://cutt.ly/MgscEU0>. Acesso em: 26 ago. 2020.

3 PARTICIPAÇÃO SOCIAL
A participação social é uma inovação em temos de políticas sociais e foi
instituída a partir da Constituição Cidadã. Essa participação ocorre de diferentes
maneiras: conselhos, conferências, consultas públicas, ouvidorias etc. (BRASIL,
2015). Sobre estes, falaremos com mais detalhes nos próximos itens deste
capítulo.

Vale fazer referência à recente Lei nº 13.460/2017, que dispõe sobre


participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos serviços públicos da
administração pública. Nesta lei estão estabelecidas as maneiras pelas quais o
cidadão pode buscar direitos (como é o caso da Ouvidoria, por exemplo), bem
como estão dispostos os deveres da Administração Pública, o que é aplicável no
âmbito da assistência social.

114
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

Observe a charge a seguir e reflita o papel da democracia e da


participação social na atualidade.

FIGURA 2 – CHARGE DEMOCRACIA

FONTE: <https://cutt.ly/mgscPsi>. Acesso em: 26 ago. 2020.

3.1 CONSELHO NACIONAL DE


ASSISTÊNCIA SOCIAL (CNAS)
Instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), em 1993, o
Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) tem como incumbência a
promoção do controle social da política pública de assistência social, bem como
a contribuição para o seu constante aperfeiçoamento, levando em conta as
demandas da população brasileira (BRASIL, 2015).

Leia o texto a seguir, extraído da página da Secretaria Especial


do Desenvolvimento Social, com relação ao Conselho Nacional de
Assistência Social (CNAS).

Algumas das principais competências [do CNAS] são aprovar a


Política Nacional de Assistência Social (PNAS), regular a prestação
de serviços públicos e privados de assistência social, zelar pela
efetivação do sistema descentralizado e participativo de assistência
social e convocar ordinariamente a Conferência Nacional de
Assistência Social.

115
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

O CNAS é composto por 18 membros, sendo nove


representantes governamentais e nove da sociedade civil. O órgão
é sempre presidido por um de seus integrantes, eleito pelos próprios
membros do Conselho, com mandato de um ano e possibilidade
de estendê-lo por mais um. Na gestão 2010/2012, ele é presidido
pelo representante da sociedade civil Carlos Eduardo Ferrari, da
Federação Nacional das Associações para Valorização das Pessoas
com Deficiência (Fenavape).
Em sua estrutura, o CNAS conta com quatro Comissões
Temáticas: de Política da Assistência Social; de Normas da
Assistência Social; de Financiamento e Orçamento da Assistência
Social; e de Conselhos da Assistência Social.

FONTE: <https://cutt.ly/zgscDek>. Acesso em: 26 ago. 2020.

3.2 CONFERÊNCIAS DE ASSISTÊNCIA


SOCIAL
Consideradas como instâncias, cujas funções são, de um lado, a avaliação
da política de assistência social e, de outro lado, a delimitação das diretrizes para
o melhoramento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), as conferências
de assistência social são, em última instância, espaços de cunho deliberativo que
possibilitam, com relação à Política de Assistência Social, o debate, a avaliação
e a proposição de novas diretrizes, concretizando e expandindo os direitos
socioassistenciais dos usuários (BRASIL, 2015).

Observe, a seguir, as funções das Conferências de Assistência


Social.

A realização de uma Conferência não é algo isolado, mas parte


de um processo amplo de diálogo e democratização da gestão
pública. Por esta razão, a participação popular e, principalmente, a
presença dos usuários é fundamental.
As conferências são realizadas em três instâncias: municipal,
estadual e nacional. Na etapa municipal, podem participar todos os
sujeitos envolvidos na Assistência Social e pessoas interessadas nas
questões relativas a essa Política. Já nas Conferências estaduais,

116
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

participam os delegados, eleitos nas Conferências municipais.


Na Conferência Nacional, participam os delegados eleitos nas
conferências estaduais.
Desde sua criação, o CNAS já realizou Conferências Nacionais
com os seguintes temas:

I Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no


período de 20 a 23 de novembro de 1995, com o tema geral: “A
Assistência Social como um direito do cidadão e dever do Estado”.
II Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 9 a 12 de dezembro de 1997, com o tema geral: “O
Sistema Descentralizado e Participativo da Assistência Social -
Construindo a Inclusão - Universalizando Direitos”.
III Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 4 a 7 de dezembro de 2001, com o tema geral: “Política
de Assistência Social: uma trajetória de avanços e desafios”.
IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 7 a 10 de dezembro de 2003, com o tema geral:
“Assistência Social como Política de Inclusão: uma nova agenda
para a Cidadania - LOAS 10 anos”.
V Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 5 a 8 de dezembro de 2005, com o tema geral: “SUAS
– Plano 10: Estratégias e Metas para Implementação da Política
Nacional de Assistência Social”.
VI Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 14 a 17 de dezembro de 2007, com o tema geral:
“Compromissos e Responsabilidades para Assegurar Proteção
Social pelo Sistema Único da Assistência Social - SUAS”.
VII Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 30 de novembro a 3 de dezembro de 2009, com o
tema geral: “Participação e Controle Social no SUAS”.
VIII Conferência Nacional de Assistência Social, realizada
no período de 7 a 10 de dezembro de 2011, com o tema geral:
“Avançando na consolidação do Sistema Único da Assistência Social
(SUAS) com a valorização dos trabalhadores e a qualificação da
gestão, dos serviços, programas, projetos e benefícios”.
IX Conferência Nacional de Assistência Social, realizada no
período de 16 a 19 de dezembro de 2013, com o tema geral: “A
Gestão e o Financiamento na efetivação do SUAS”.

FONTE: <https://cutt.ly/jgscGPk>. Acesso em: 26 ago. 2020.

117
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

3.3 CONSULTAS PÚBLICAS


No que diz respeito às consultas públicas é importante salientar que se trata
de instrumento que visa uma perspectiva democrática, em prol de uma edificação
conjunta, em que os esforços do governo e da sociedade civil se juntem a fim
de construir as políticas públicas. Ocorre que, ao se caminhar na perspectiva da
colaboração, as políticas socioassistenciais e seus respectivos serviços podem
ser aperfeiçoados (BRASIL, 2015).

3.4 OUVIDORIA
Instrumento à disposição de todo e qualquer cidadão, a ouvidoria se presta
a reclamações críticas, denúncias, ou até mesmo para sugestões e elogios. Ela
acolhe todas as demandas dos usuários, analisando-as e dirigindo-as ao setor
responsável. A ouvidoria só entende por finalizada uma demanda a partir do
momento em que a solicitação do cidadão seja devidamente respondida. Por ter
contato com diferentes necessidades dos usuários, a ouvidoria tem condições
igualmente de sugerir aos gestores modificações que resultem em melhoras nos
processos de prestação de serviço (BRASIL, 2015). Adicionalmente, interessante
notar que o ouvidor-geral, no cargo central da ouvidoria respectiva, deve ser
pessoa correlata à comunidade, e, por isso, deve ter um perfil de escuta, de
sensibilidade e de celeridade no atendimento das demandas.

É importante, nesse momento, mencionar a recente Lei nº 13.460/2017,


que dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos
serviços públicos da administração pública. Lá há regras expressas a respeito das
ouvidorias.

4 SISTEMAS DE PLANEJAMENTO,
MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE
POLÍTICAS SOCIAIS
Para que se concretizem as metas presentes na Política Nacional de
Assistência Social é imperativo que haja um avanço em relação à constituição
de um sistema potente de informação em nível nacional e na sua integração em
relação às bases de dados existentes nas três esferas de governo.

118
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

Além disso, é urgente a efetivação de políticas de monitoramento e avaliação,


as quais têm como função medir e melhorar os projetos já em execução, de modo
a contribuir igualmente para um planejamento futuro. Tanto a informação como o
monitoramento e a avaliação devem ser enxergados como práticas permanentes
e que se comprometem com o percurso da política de assistência ao longo de sua
realização e não após a sua finalização (BRASIL, 2015).

4.1 OS SERVIÇOS E PROGRAMAS


SOCIAIS
Conforme observamos na figura a seguir, quando falamos em serviços
e programas sociais, não podemos deixar de fazer referência ao que lhes dá
respaldo: a seguridade social brasileira. Trata-se, assim, de um sistema não
contributivo e em um dos seus eixos há a assistência social, que, por sua vez, nos
conduz ao SUAS e, consequentemente, à proteção social e defesa de direitos
fundamentais. Os programas e serviços estão aí para garantir esses direitos
fundamentais.

FIGURA 3 – SISTEMA NÃO CONTRIBUTIVO BRASILEIRO

FONTE: <https://cutt.ly/zgscMRw>. Acesso em: 26 ago. 2020.

119
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Há, nesse sentido, um rol de serviços ofertados pela Política de Assistência


Social com vistas a assegurar ao cidadão seus direitos de cidadania em ocasiões
em que estes encontram-se ameaçados por contingências da vida. Contingências
que podem estar relacionadas à idade, a questões familiares, ao desemprego, à
violência, à quebra de vínculos familiares ou desastres naturais (BRASIL, 2015).

A ideia é oferecer subsídios para o fortalecimento das famílias e o incentivo


a sua autonomia, ofertando-lhes apoio no sentido de superação de situações
adversas e na direção do acesso aos seus direitos sociais fundamentais.
Igualmente possibilita o fortalecimento da comunidade, no sentido da mobilização
e do empoderamento, bem como lhe fornece benefícios em contextos de
adversidade (BRASIL, 2015).

Ademais, trabalham intersetorialmente com as demais políticas públicas, de


modo que as demandas dos sujeitos, que podem ser diversas e relacionadas a
outras políticas, possam ser contempladas (BRASIL, 2015).

Atualmente, os serviços e programas constantes no Ministério de


Desenvolvimento Social são os seguintes:

• Proteção e Atenção Integral à Família (PAIF)

Ofertado em todos os Centros de Referência da Assistência Social (CRAS),


o serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) visa fornecer apoio
às famílias, realizando a prevenção do rompimento de vínculos, bem como a
promoção do acesso a direitos fundamentais (BRASIL, 2015).

No PAIF, mediante a promoção de espaços de escuta e de compartilhamento


de vivências, são realizados trabalhos sociais com as famílias de forma a incentivar
tanto as suas potencialidades quanto as potencialidades da comunidade.

São atendidas famílias em contexto de vulnerabilidade social, beneficiários


de programas de transferência de renda e benefícios assistenciais, bem como
pessoas com deficiência ou idosas que estejam passando por momentos de
fragilidade. São ofertados pelo PAIF serviços como:

Atendimento às famílias, visitas domiciliares, orientações e


encaminhamento a outros serviços e políticas do Governo
Federal. O serviço também apoia ações comunitárias, por meio
de palestras, campanhas e eventos, ajudando a comunidade
na construção de soluções para o enfrentamento de problemas
comuns, como nos casos de falta de acessibilidade, violência
no bairro, trabalho infantil, falta de transporte, baixa qualidade
na oferta de serviços, ausência de espaços de lazer, cultural,
entre outros (BRASIL, 2015).

120
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

• Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos


(PAEFI)

Direcionado a famílias e indivíduos que já foram vítimas de violação de


direitos ou que já se encontram em situação de risco social, encontrando-se
em vulnerabilidade social. Nesse sentido, é ofertado o apoio necessário para
a solução de tais situações, promovendo direitos e fortalecendo os vínculos
familiares e sociais. Tal serviço é disponibilizado nos Centros de Referência
Especializado de Assistência Social (CREAS) (BRASIL, 2015).

O trabalho desenvolvido envolve diferentes profissionais, como assistentes


sociais, psicólogos e advogados.

Entre as atividades, estão a identificação das necessidades


das pessoas que buscam ou são encaminhadas ao
CREAS; atenção especializada; orientação sobre direitos;
encaminhamento para outros serviços da Assistência Social e
de outras políticas, como saúde, educação, trabalho e renda,
habitação; orientação jurídica; acesso à documentação, entre
outros (BRASIL, 2015).

Por meio da regionalização, o CREAS regional proporciona cobertura a


populações de municípios com até 20.000 habitantes (BRASIL, 2015).

Leia a notícia a seguir que reflete a vulnerabilidade social das


famílias do município de Campinas e como a situação da pandemia
da COVID-19 revelou mais profundamente a desigualdade social e o
desamparo das famílias.

Número de famílias de Campinas atendidas em programas


sociais cresce 496% na pandemia: ‘Expôs invisíveis’

Em entrevista ao G1, Eliane Jocelaine conta os desafios


provocados pelo novo coronavírus, a visibilidade que a crise trouxe à
assistência social e aborda a representatividade que é ser a primeira
secretária negra do governo municipal.

A crise econômica provocada pela pandemia do novo


coronavírus lançou à situação de vulnerabilidade social milhares
de famílias em Campinas (SP). De acordo com a secretária de
Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos,

121
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Eliane Jocelaine Pereira, houve crescimento de pelo menos 496%


no número de atendidos por alguns dos programas sociais, seja de
transferência de renda ou auxílio alimentar. Enquanto a prefeitura
tinha 32 mil cadastrados no início de 2020, dados preliminares
mostram que 191 mil famílias já recorreram a alguma ação vinculada
à pasta.
“A maior demanda foi por ajuda para obter o auxílio emergencial,
mas também outros benefícios do município, principalmente com
alimentação, primeira necessidade. Saltamos para 191 mil famílias
atendidas, mas o número ainda pode ser maior. A crise expôs esses
invisíveis, que é como os chamamos. Pessoas que tinham renda e
essa renda acabou prejudicada”, explica Eliane.
Ao G1, a titular da pasta, servidora de carreira da prefeitura e
primeira mulher negra no alto escalão da administração em Campinas,
conta como o trabalho vinculado à assistência social ganhou maior
visibilidade diante da crise e os desafios para a manutenção desses
atendimentos, além de abordar a luta antirracismo que se espalhou
pelo mundo nas últimas semanas.

A pasta que a senhora comanda envolve direitos


fundamentais e houve um aumento grande pela assistência
social durante a pandemia. Já é possível mensurar esse
impacto?
Eliane Jocelaine: Não fizemos ainda uma análise diagnóstica de
números, não teve tempo para fazer essa trabalho pela necessidade
de responder às ações que chegam para nós, mas tem algumas
dimensões diante do trabalho que já realizamos. Na situação de
normalidade, nós temos regiões muito vulneráveis na cidade, como
a Noroeste, Sul e Sudoeste. Nossos CRAS [Centro de Referência
da Assistência Social], que são territorializados, atendem, em
média, 800 famílias em cada equipamento. Só que saltamos nosso
atendimento, tanto pela necessidade de orientação, já que nosso
trabalho também é de cidadania, educativo, como de ajuda para a
obtenção dos benefícios.
A maior demanda foi por ajuda para obter o auxílio emergencial,
mas também outros benefícios do município, principalmente com
alimentação, primeira necessidade. No começo do ano tínhamos
cadastradas na prefeitura 32 mil famílias em situação de pobreza ou
extrema pobreza. Saltamos para 191 mil famílias atendidas, mas o
número ainda pode ser maior. A crise expôs esses invisíveis, que
é como os chamamos. Pessoas que tinham renda e essa renda
acabou prejudicada. Não estavam nessa política, mas no momento
precisam.

122
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

Por conta dessa demanda, tivemos de reajustar nossos serviços,


manter os serviços em porta aberta, e ficar atentos também a todas
as outras demandas que recebemos, como violência doméstica
e pessoas em situação de rua, por exemplo, que assumimos a
distribuição de alimentos que antes era feita por voluntários.
A questão da segurança alimentar, com o Cartão Nutrir, está
chegando a pessoas do recorte de extrema pobreza que não tinham
nenhum benefício. O Banco de Alimentos atende muitos desses
invisíveis, já que alimentação é a primeira necessidade, básica. Por
isso criamos estratégias para descentralizar a entrega de alimentos,
com mais pontos de distribuição. Já arrecadamos e distribuímos 90
toneladas de alimentos, e sabemos que a recuperação da economia
não vai ser tão rápida, e precisamos manter esse atendimento.

Quais os principais desafios que a secretaria tem enfrentado


com a crise?
O déficit de recursos agravado pela situação econômica. É bom
frisar que a assistência social, assim como o SUS, é uma política
social que tem como necessidade o partilhamento de recursos.
Temos feito requisições junto ao Ministério da Cidadania, que
precisa responder a essa questão, mas precisamos que o governo
federal não atue apenas agora, com recursos extraordinários, mas
também com recursos ordinários, pois há uma continuidade desses
problemas e precisamos de mais adesões, ampliações.

Quanto é esse valor necessário de aporte do governo


federal?
Para que pudéssemos recompor equipes, dar conta de atender
àquilo que já existe, seria necessária uma recomposição de R$
12 milhões por ano. O governo federal liberou R$ 2 bilhões para
municípios e estados, mas é uma ajuda de três meses, e nós teremos
consequências perdurando. Seria necessário pelo menos mais R$ 2
bilhões, para todo o Brasil, para que possamos fazer um serviço de
longo prazo, para quando esse isolamento acabar.

A senhora acredita que a crise trouxe visibilidade à pasta


que comanda?
Sim, era muito invisibilizada, era uma visão que assistência
social tem como recorte apenas a pobreza ou extrema pobreza. Não
trabalhamos com vulnerabilidade apenas em razão da renda, tem a
violência, imigração e refúgio, questão etária, diversas situações que
são passíveis de ocorrer em qualquer classe social, para qualquer
nível econômico, independente da cor, do gênero.

123
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Talvez o único efeito positivo da crise seja a reflexão de


nosso país aos problemas estruturais, estruturantes, que
qualquer um está sujeito e que somos iguais em uma pandemia.
A secretaria recebeu uma luz imensa, e o trabalho apareceu
para a população, serviu para mostrar que temos unidades que
estão aqui para atender essas pessoas. [...] e é preciso consolidar
esse olhar [às políticas de assistência social].

Sobre visibilidade, a senhora é a primeira mulher negra da


história de Campinas titular de uma secretaria no governo, e isso
sendo servidora de carreira. Como avalia essa oportunidade?
Primeiro, é preciso destacar o fato de eu ter tido, como mulher,
oportunidade de ocupar um espaço de decisão [está no posto
desde 2017]. A questão do gênero precisa ser exaltada, um motivo
de comemoração, mas é um desafio, é preciso responder. É muito
importante que essa categoria seja vista, fico feliz de demonstrar
a capacidade das mulheres de lidarem com situações complexas,
com decisões rápidas, em uma pasta de muitas políticas públicas
e que dialogam diretamente com a pandemia. É muito importante
a representatividade de gênero, como temos em Campinas, na
Educação [Solange Villon Kohn Pelicer, titular da pasta] e na Saúde,
com a Andrea [Andrea Von Zuben, diretora do Devisa], por exemplo,
e sobre a mulher negra, fico muito agradecida. Nosso prefeito fez um
ato político, mas um ato político que é exigido das pessoas brancas.
É preciso dar espaço e voz para que as pessoas negras falem por
elas mesmas, para os seus pares e para todos. É a oportunidade
de expressão de nossas dificuldades, das nossas necessidades, e
serve para mostrar que podem sim, estar em cargos de decisão, e
respondam à complexidade de estar em uma pauta não só do povo e
da comunidade negra.
O país precisa de mais secretários ou secretárias negros, mais
jornalistas, mais políticos. É preciso que as pessoas contratem,
deem mais oportunidades, não apenas ganhe visibilidade nas
manifestações ou redes sociais.
Sou servidora, neste ano faço 22 anos de prefeitura, e vejo
como é importante ter uma oportunidade dentro de uma carreira,
de conseguir se destacar. O fato de eu ascender dentro de uma
estrutura pública, onde passei por vários cargos, mostra que não
sou um número, que não fui escolhida por minha cor, mas minha cor
representa muito dentro da minha história.

Sobre a representativa de raça, a senhora abordou durante


uma transmissão on-line da prefeitura a importância da luta

124
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

antirracismo, principalmente após os atos que ganharam o


mundo com a morte de George Floyd, nos Estados Unidos. O
que acha que falta para que a discussão sobre o tema perdure
ou avance na sociedade?
Eu penso que esses atos pelo George Floyd tomaram essa
importância porque, talvez, tenha acontecido nos Estados Unidos.
Temos isso cotidianamente no nosso país, e isso não é visto como
uma questão necessária de ser encampada. Esse é um complexo
que nós temos, invisibilizando atos e manifestações políticas
negras. Tivemos e temos ativistas negros, temos resistência desde
a formação do nosso país, e precisam importar um movimento para
se instalar em nosso país. O Brasil precisa ter consciência de raça,
precisa ler escritores e escritoras negros, compreender sua história
e assumir que o Brasil é um país racista. Apesar disso, o movimento
é positivo, ele invoca que as pessoas precisam se mobilizar de
alguma forma, principalmente as pessoas brancas, mas precisamos
incorporar isso na nossa sociedade, para demarcar uma ruptura com
o sistema escravocrata.

FONTE: <https://cutt.ly/lgsviEJ>. Acesso em: 26 ago. 2020.

• População em Situação de Rua

Direcionado à população em situação de rua, que podem ser jovens, adultos


e famílias, esse serviço tem como foco as pessoas que têm a rua como local
de moradia, sempre procurando respeitar as suas escolhas. Busca proporcionar
atenção e acompanhamento a essas pessoas, dispensando a elas atividades que
fortaleçam os vínculos sociais e familiares, dando a oportunidade de elaboração
de novos projetos de vida (BRASIL, 2015).

Importante mencionar a existência da Política Nacional para a População em


Situação de Rua (PNPR), instituída pelo Decreto nº 7.053, de 23 de dezembro de
2009. No Decreto, há várias disposições, cabendo destaque às seguintes:

• Há o objetivo de contagem oficial da população de situação de rua, o


que conta com diversos percalços, mas é relevante para dados oficiais
(exemplo: total de contagem do número de infectados da COVID-19
poderia ser, quiçá, muito maior se houvesse uma contabilização de
pessoas em situação de rua vulneráveis) – Art. 7º, III.
• A nomenclatura “população em situação de rua” foi pensada numa

125
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

perspectiva de prevenção, sendo objeto de cuidados por parte do


legislador. Isso porque deve-se evitar o uso de expressões tão comuns,
como “mendigos de rua”, “pedintes de rua”, “ciganos”, entre outros
tantos que depreciam a figura das populações de rua, que contam com
diferentes históricos e motivos para estar em situação de vulnerabilidade.
Conforme Art. 1º, par. único:

Considera-se população em situação de rua o grupo populacional


heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares
interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular,
e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de
moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as
unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória
(BRASIL, 2009).

• É proibida a remoção compulsória das populações em situação de rua.


Exemplo: é ilegal e viola direitos esguichar jatos de água para fazer com
que pessoas saiam das ruas. Por isso, a atuação da assistência social é
essencial para propor [e não impor] alternativas e escolhas àqueles que
se encontram em situação de rua.
• A Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República
instituirá o Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos para a
População em Situação de Rua, destinado a promover e defender seus
direitos (Art. 15).

São dispensados atendimentos individuais e em grupo, bem como


são realizados encaminhamentos quando necessário aos demais serviços
socioassistenciais e às demais políticas públicas. Tudo isso com o intuito de
incentivar a autonomia, proporcionar a inserção social e dispensar proteção a
vítimas de violência (BRASIL, 2015).

São serviços que ocorrem no Centro Especializado para População


em Situação de Rua (Centro Pop) e que buscam igualmente dar acesso à
documentação civil, bem como proporcionar espaço de guarda de pertences
pessoais (BRASIL, 2015).

Os profissionais envolvidos nesta empreitada são de diversas áreas, os


quais buscam elaborar e desenvolver atividades voltadas para as necessidades
do usuário, orientação sobre seus direitos, atividades de convívio e socialização,
incentivo à convivência familiar e comunitária, e, quando necessário,
encaminhamento para a rede de serviços (BRASIL, 2015).

126
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

1 Observe, reflita e redija um parágrafo sobre suas conclusões com


relação à tirinha a seguir:

FONTE: <https://cutt.ly/mgdRQHf>. Acesso em: 26 ago. 2020.

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
___________________________________________________.

• Convivência e Fortalecimento de Vínculos

Oferecido de forma complementar ao PAIF e ao PAEFI, o serviço de


Convivência e fortalecimento de vínculos é uma ferramenta de Proteção Social
Básica do SUAS e possui um cunho preventivo. O referido serviço oferta atividades
(artísticas, culturais, de lazer e esportivas) grupais, conforme a idade dos sujeitos.
O intuito é propor desafios que estimulem os usuários na (re)construção das suas
trajetórias de vida, no âmbito individual, coletivo ou familiar (BRASIL, 2015).

Esse serviço é disponibilizado no Centro de Referência da Assistência Social


(CRAS), bem como nos Centros de Convivência. Está disponível para diferentes
sujeitos e demandas:

127
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Podem participar crianças, jovens e adultos; pessoas com deficiência;


pessoas que sofreram violência, vítimas de trabalho infantil, jovens e crianças fora
da escola, jovens que cumprem medidas socioeducativas, idosos sem amparo
da família e da comunidade ou sem acesso a serviços sociais, além de outras
pessoas inseridas no Cadastro Único (BRASIL, 2015).

• Equipe Volante

Direcionada à atenção e à disponibilização de serviços de assistência social


a famílias que habitam em locais de difícil acesso, a Equipe Volante compõe a
equipe do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). São considerados
locais de difícil acesso as áreas rurais, as comunidades indígenas, os quilombolas,
as calhas de rios, os assentamentos, entre outros (BRASIL, 2015).

Na medida em que se realiza a busca ativa de tais famílias, as equipes


concretizam o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF), bem
como demais serviços de Proteção Social Básica, os quais deverão ser ajustados
conforme o contexto local específico.

Além desse trabalho, essas equipes buscam incluir essas famílias, atualizar
o seu cadastro no Cadastro Único, efetuar encaminhamentos indispensáveis para
o acesso à renda, encaminhamentos para demais serviços da Assistência Social
e de outras políticas. A movimentação dessas equipes até os locais é feita por
meio de carros ou das lanchas da Assistência Social (BRASIL, 2015).

• Abordagem Social

Trata-se, neste caso, de trabalho executado por equipe de educadores


sociais. Estes realizarão o reconhecimento de indivíduos e de famílias que estejam
em condição de risco pessoal e social em espaços públicos. São exemplos disso:
trabalho infantil, exploração sexual de crianças e adolescentes, situação de
rua, uso abusivo de crack e outras drogas. A ideia é abordar essas pessoas em
espaços públicos e disponibilizar a elas serviços direcionados as suas demandas
urgentes, de modo a assegurar seus direitos de cidadania, inserindo-as na rede
de serviços socioassistenciais, bem como nas demais políticas públicas (BRASIL,
2015).

Esse serviço pode ser fornecido em diferentes locais, como no Centro de


Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), em Unidade Específica
Referenciada ao CREAS ou no Centro Especializado para População em Situação
de Rua (Centro Pop.) (BRASIL, 2015).

128
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

• Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência,


Idosas e suas Famílias

Esse serviço é voltado para sujeitos com deficiência ou para sujeitos idosos
com algum nível de dependência e que sofreram violações de seus direitos, que
agravaram a sua dependência e comprometeram o desenvolvimento da sua
autonomia (BRASIL, 2015). Vale especial menção ao benefício de prestação
de assistência social, previsto no LOAS, conhecido justamente como “benefício
LOAS” por guardar o nome da lei que o rege. Os assistentes sociais podem dar
informações gerais a respeito dos requisitos necessários para a realização do
requerimento no INSS por parte da pessoa em situação de vulnerabilidade e com
renda inferior ao previsto em lei.

O objetivo é diminuir a exclusão social desses sujeitos, dispensando a eles


autonomia e melhor qualidade de vida, bem como auxiliar na suplantação das
violações de direitos. Nessa direção, é desenvolvido o trabalho social, o qual é
efetuado por uma equipe diversa, constituída por assistentes sociais, psicólogos
e terapeutas ocupacionais. As ações desenvolvidas estão focadas na promoção
da defesa de direitos; no estímulo ao convívio familiar e comunitário e no incentivo
à organização da vida cotidiana. Também são realizados encaminhamentos,
quando necessário, para a rede de serviços.

Normalmente, esses serviços são ofertados em Centro-Dia, no Centro


de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e em unidade
referenciada ao CREAS e/ou no domicílio do usuário (BRASIL, 2015).

Leia a notícia com relação ao junho violeta e à violação de


direitos dos idosos em tempos de pandemia da COVID-19.

Junho violeta: proteção e segurança da pessoa idosa

O DF tem 303.017 pessoas com 60 anos ou mais, 10,5% da


população. Mês é dedicado à discussão sobre os cuidados com esse
público.
O mês de junho é violeta com o objetivo de alertar para a
proteção e segurança da pessoa idosa. No Distrito Federal, são
mais de 300 mil pessoas com 60 anos ou mais – 10,5% de todos os
habitantes. Neste ano, em cenário de pandemia de coronavírus, a
atenção precisa ser multiplicada: dados do Disque 100 e da Polícia
Civil apontam crescimento de casos de violações de direitos. Por

129
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

isso, o GDF faz campanha para alertar sobre esse problema e


divulgar canais de denúncia.
“Em tempos de pandemia, a preocupação com os idosos é
redobrada. Precisamos protegê-los do risco de contaminação pelo
coronavírus e, ao mesmo tempo, prevenir e combater as violações de
direitos”, afirma a secretária de Justiça e Cidadania (Sejus), Marcela
Passamani. A pasta é responsável pela promoção dos direitos dos
idosos – recebe e encaminha denúncias, acompanha vítimas e cria
políticas públicas de prevenção, acolhimento e proteção.
Os dados apontam o problema. Do início de março ao começo
de junho, o Disque 100 recebeu 474 casos de violações de direitos
da pessoa idosa no DF. Nesse período, o número de casos chegou à
metade das denúncias de todo o ano passado, que fechou com 989
denúncias. Nesse sentido, a Polícia Civil registrou aumento de 49%
no número de ocorrências de crimes contra idosos – comparados os
cinco primeiros meses de 2020 e 2019.

FONTE: <https://cutt.ly/rgfZFFl>. Acesso em: 26 ago. 2020.

• Serviços de Acolhimento

Tratam-se de serviços especializados que dispensam acolhimento e proteção


tanto a indivíduos apartados de suas famílias quanto de famílias separadas
provisoriamente de sua comunidade. Ambos em situações, como abandono e
violação de direitos. São moradias provisórias que acolhem os indivíduos até que
consigam retornar a sua família/comunidade de origem (BRASIL, 2015).

Os públicos aos quais se dirigem são os seguintes: Crianças e Adolescentes;


Adultos e Famílias; Pessoas Idosas; Pessoas com Deficiência; Mulheres em
Situação de Violência; Situação de Calamidades e Emergência (BRASIL, 2015).
Para cada um desses públicos existem leis e estatutos específicos. No caso de
crianças e adolescentes, tem-se o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
relativamente aos idosos, tem-se o Estatuto do Idoso e, por último, no que
concerne às mulheres em situação de violência, tem-se a Lei Maria da Penha.

130
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

1 Observe a charge a seguir e descreva em um parágrafo o que ela


reflete.

FONTE: <https://cutt.ly/lgfXIWG>. Acesso em: 26 ago. 2020.

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
___________________________________________________.

2 Observe a charge a seguir e reflita o seu conteúdo. Descreva em


poucas linhas o que ela quer dizer.

FONTE: <https://cutt.ly/HgfXP8S>. Acesso em: 26 ago. 2020.

131
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
___________________________________________________.

• Medidas Socioeducativas

A medida socioeducativa se dirige ao adolescente que teve autoria de ato


infracional, sendo determinado judicialmente que ele cumpra tal medida, que visa
auxiliar pedagogicamente para que esse adolescente tenha acesso a direitos e
para que ele opere uma mudança de valores pessoais e sociais. Tais medidas,
conforme preconizado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), podem
ser efetivadas de diferentes formas: em liberdade, em meio aberto ou, com
privação de liberdade, sob internação (BRASIL, 2015).

Segundo o ECA e a Lei do SINASE (que rege a execução das medidas


socioeducativas), tais medidas deverão ter caráter de brevidade, excepcionalidade
e legalidade, podendo ser desde remissão (espécie de “perdão” dado pelo
Ministério Público ou pelo Juízo), advertência, obrigação de reparação de dano,
prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e, na
pior das hipóteses e somente nos casos previstos no Art. 122 do ECA (violência
e grave ameaça, flagrante delito etc.), a privação de liberdade pela via da
internação. Cabe frisar que as medidas socioeducativas apenas se aplicam aos
adolescentes, ou seja, maiores de 12 anos. Às crianças – pessoas de até 12 anos
incompletos – não se aplicam medidas socioeducativas, mas medidas protetivas,
que possam abranger todo o seio familiar.

Leia a seguir as diferentes formas de serem efetivadas as


medidas socioeducativas.

O Centro de Referência Especializado de Assistência Social


(CREAS) oferece o serviço de proteção social a adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida (LA)
e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC). A finalidade é
132
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

prover atenção socioassistencial e acompanhamento a adolescentes


e jovens encaminhados pela Vara de Infância e Juventude ou, na
ausência desta, pela Vara Civil correspondente ou Juiz Singular.
Também cabe ao CREAS fazer o acompanhamento do adolescente,
contribuindo no trabalho de responsabilização do ato infracional
praticado.
O Serviço de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto possui
interface com o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo –
SINASE, devendo, assim, compor o Plano Municipal de Atendimento
Socioeducativo. O Plano tem como objetivo organizar a rede de
atendimento socioeducativo e aprimorar e monitorar a atuação dos
responsáveis pelo atendimento a adolescentes em conflito com a lei.

Liberdade Assistida
O adolescente em medida de Liberdade Assistida é
encaminhado ao CREAS, onde será acompanhado e orientado.
A Liberdade Assistida pressupõe certa restrição de direitos e um
acompanhamento sistemático do adolescente, mas sem impor o
afastamento de seu convívio familiar e comunitário. Essa medida é
fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo ser prorrogada,
revogada ou substituída caso a Justiça determine.

Prestação de Serviços à Comunidade


De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a
prestação de serviços à comunidade consiste na realização de
atividades gratuitas de interesse geral, por período não superior a
seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e
outros estabelecimentos, bem como em programas comunitários
governamentais.
As tarefas são atribuídas conforme aptidões do adolescente,
devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas
semanais, aos sábados, domingos e feriados, ou em dias úteis, de
modo a não prejudicar a frequência escolar ou jornada normal de
trabalho. O cumprimento da medida socioeducativa de PSC não
pode dar margem à exploração do trabalho do adolescente.

Acompanhamento
Encaminhado pela Vara de Infância e Juventude ou, na ausência
desta, pela Vara Civil correspondente ou Juiz Singular, o adolescente
é recebido pelo Creas e orientado sobre as medidas aplicadas pelo
juiz. Ele também é informado e encaminhado, caso seja necessário,
a outros serviços da assistência social e a outras políticas públicas.

133
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Esse acompanhamento é informado por meio de relatórios à


Justiça. O juiz determina a continuidade ou o fim da medida aplicada.
Em caso de descumprimento, o juiz pode determinar inclusive a
privação de liberdade.
O acompanhamento ao adolescente é estabelecido de acordo
com os prazos legais: no mínimo seis meses para a medida de
Liberdade Assistida e inferior a seis meses para a medida de
Prestação de Serviços à Comunidade.

FONTE: <https://cutt.ly/ngfXHhZ>. Acesso em: 26 ago. 2020.

• Calamidade Pública

No caso específico das calamidades públicas, existe o Serviço de Proteção


em Calamidades Públicas e Emergências. Trata-se de serviço de proteção especial
do SUAS com vistas à superação de contextos de Calamidade Pública (BRASIL,
2015). Presente no Artigo 65 da Lei de Responsabilidade Fiscal, LC n° 101/2000,
a calamidade pública diz respeito a desastres que impõem o estabelecimento de
situação jurídica especial, possibilitando o atendimento às demandas provisórias
de interesse público por parte do Estado.

O serviço está previsto na Resolução CNAS nº 109, de 11


de novembro de 2009, que aprova a Tipificação Nacional de
Serviços Socioassistenciais e é regulamentado pela Portaria
MDS nº 90, de 3 de setembro de 2013. O objetivo do serviço
é assegurar provisões de ambiente físico, recursos materiais,
recursos humanos e trabalho social. Todas essas provisões
devem ser empregadas na manutenção de abrigos temporários
como estratégia de resposta a esses eventos.
Todos os estados, Distrito Federal e municípios são elegíveis. O
aceite do serviço pode ser feito tanto antes como posteriormente
à ocorrência de algum desastre. É importante ressaltar que
mesmo que o aceite seja feito de forma antecipada, o repasse
de recurso só ocorre depois de preenchidos os requisitos
elencados na portaria MDS nº 90/2013 (BRASIL, 2015).

• BPC na Escola

A garantia de acesso e permanência na escola é a meta que movimenta o


Programa BPC na Escola, que tem como público-alvo crianças e adolescentes
com deficiência em idade entre zero e 18 anos. Essa dinâmica se dá mediante
ações intersetoriais, bem como por meio da participação da União, dos
estados, dos municípios e do Distrito Federal. Além disso, trata-se de uma ação
interministerial, visto que envolve diferentes ministérios: Desenvolvimento Social;
Educação; Saúde; Secretaria de Diretos Humanos (BRASIL, 2015).
134
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

A empreitada é identificar quais são os obstáculos dificultadores do acesso


e da permanência de crianças e adolescentes com deficiência na escola. Nessa
direção, é importante fazer referência à Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei nº 9.394/96, Artigo 4º, inciso III, segundo o qual:

O dever do Estado com educação escolar pública será


efetivado mediante a garantia de atendimento educacional
especializado gratuito aos educandos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades
ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e
modalidades, preferencialmente na rede regular de ensino
(BRASIL, 1996).

A partir dessa identificação, realizar a efetivação de ações intersetoriais, que


englobem políticas de diferentes áreas: Assistência Social; Educação; Saúde;
Direitos Humanos. Para reconhecer esses obstáculos são aplicados instrumentos,
como questionários, ao longo de visitas domiciliares. Após, “é realizado o
acompanhamento dos beneficiários e de suas famílias pelos técnicos dos
Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), e das ações intersetoriais
desenvolvidas pelos grupos gestores do Programa” (BRASIL, 2015).

• BPC Trabalho

Já o programa BPC Trabalho busca a promoção do protagonismo e da


participação social “dos beneficiários com deficiência do Benefício de Prestação
Continuada da Assistência Social (BPC), por meio da superação de barreiras,
fortalecimento da autonomia, acesso à rede socioassistencial, à qualificação
profissional e ao mundo do trabalho” (BRASIL, 2015).

A ideia do BPC Trabalho é atender preferencialmente os beneficiários com


idade entre 16 e 45 anos, que desejam trabalhar e, no entanto, deparam-se com
barreiras para adquirir formação profissional e qualificação necessárias para o
ingresso no mercado de trabalho. Com o intuito de ajudar com relação a esse
acesso, promoveram-se modificações na legislação relativa ao BPC. Assim, a
partir de 2011, houve a seguinte alteração: o beneficiário com deficiência que
se inserisse no mercado de trabalho teria seu benefício suspendido, porém, não
cancelado, enquanto permanecesse a atividade remunerada. Já com relação ao
caso de Contrato de Aprendizagem Profissional, haveria alternativa do beneficiário
do BPC realizar o acúmulo do salário de aprendiz juntamente ao do benefício por
um período de até dois anos (BRASIL, 2015).

• Acessuas Trabalho

O Acessuas Trabalho é um programa que busca promover o acesso ao

135
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

mundo do trabalho. Esse programa enseja a autonomia das famílias usuárias


da Política de Assistência Social, por meio da inserção ao mundo do trabalho
(BRASIL, 2015).

Trata-se de um conjunto de ações que busca articular políticas públicas,


assim como mobilizar, encaminhar e acompanhar pessoas em situação de
vulnerabilidade social a fim de que elas tenham acesso a oportunidades
relacionadas ao mercado de trabalho.

Na verdade, é uma tentativa de Inclusão Produtiva, que compreende


questões como:

Qualificação técnico-profissional; intermediação pública


de mão de obra; apoio ao microempreendedor individual
e à economia solidária; acesso a direitos sociais relativos
ao trabalho (formalização do trabalho); articulação com
comerciantes e empresários locais para mapeamento e
fomento de oportunidades, entre outros (BRASIL, 2015).

São atendidas por esse programa populações urbanas e rurais em situação


de vulnerabilidade social com idade entre 14 e 59 anos, havendo prioridade
para aqueles que já são usuários de programas de transferência de renda,
especialmente os seguintes grupos:

• Pessoas com deficiência.


• Jovens do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos.
• Pessoas inscritas no CADÚNICO.
• Adolescentes e jovens no sistema socioeducativo e egressos.
• Famílias com presença de trabalho infantil.
• Famílias com pessoas em situação de privação de liberdade.
• Famílias com crianças em situação de acolhimento provisório.
• População em situação de rua.
• Adolescentes e jovens no serviço de acolhimento e egressos.
• Indivíduos e famílias moradoras em territórios de risco em decorrência
do tráfico de drogas.
• Indivíduos egressos do sistema penal.
• Beneficiários do Programa Bolsa Família.
• Pessoas retiradas do trabalho escravo.
• Mulheres vítimas de violência.
• Jovens negros em territórios do Plano Juventude Viva.
• Adolescentes vítimas de exploração sexual.
• Povos e comunidades tradicionais.
• Público de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBTT).
• Entre outros, para atender especificidades territoriais e regionais
(BRASIL, 2015).
136
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

• Ação Estratégica do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

Iniciado em 1996, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI)


contou com o respaldo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), com
vistas à luta contra o trabalho infantil. Aos poucos esse programa foi alcançando
o país como um todo, num intenso esforço do Estado brasileiro para implementar
políticas públicas direcionadas ao combate do trabalho infantil. Com o passar do
tempo foram agregados outros programas ao PETI (BRASIL, 2015):

Em 2011, o PETI foi instituído pela Lei Orgânica de Assistência


Social (LOAS) como um programa de caráter intersetorial,
integrante da Política Nacional de Assistência Social, que
compreende: transferências de renda; trabalho social com
famílias e oferta de serviços socioeducativos para crianças e
adolescentes que se encontram em situação de trabalho.

Iniciou-se um debate, em 2013, a respeito de um novo formato para o PETI,


tendo em vista o avanço com relação à estruturação, de um lado, do Sistema
Único de Assistência Social (SUAS) e, de outro lado, da política de prevenção e
erradicação do trabalho infantil. Ademais, identificava-se mediante censo realizado
pelo IBGE em 2010 um novo arranjo do trabalho infantil no Brasil. Assim, a ideia
é buscar uma nova estrutura deste programa que busca acelerar as ações de
prevenção e erradicação do trabalho infantil (BRASIL, 2015).

1 Observe a tirinha a seguir e discuta com seus colegas o que ela


nos faz refletir.

FONTE: <https://cutt.ly/DgfXM1H>. Acesso em: 26 ago. 2020.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

R.: ____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
________________________________________________.

4.2 PLANEJAMENTO,
MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE
SERVIÇOS E PROGRAMAS SOCIAIS
Antes de iniciarmos esta seção é importante esclarecer que existe uma
diferença entre o controle e a avaliação/monitoramento. O que ocorre é que
normalmente há um equívoco quando se faz referência a esses conceitos. No
controle, tem-se como foco a legalidade dos atos da administração pública. Já
na avaliação e monitoramento o foco reside na qualidade da gestão (VAITSMAN,
2009).

FIGURA 4 – CONTROLE E AVALIAÇÃO/MONITORAMENTO: DIFERENÇAS

FONTE: Adaptada de Vaitsman (2009)

138
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

Aqui estamos falando, portanto, da qualidade da gestão. Esse monitoramento


e avaliação devem ocorrer concomitantemente à gestão, não após o seu término,
como normalmente se imagina.

FIGURA 5 – ASPECTOS DO MONITORAMENTO

FONTE: <https://cutt.ly/sgfCRmz>. Acesso em: 26 ago. 2020.

Observe o quadro e o texto a seguir que mostram o caminho de


desenvolvimento das políticas sociais.

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QUADRO 1 – CAMINHO DE DESENVOLVIMENTO DAS POLÍTICAS SOCIAIS


Âmbito Tarefas

Organização • Determinar atividades ou executar

• Dividir o trabalho

• Agrupar tarefas e dispor sua organização

• Delegar autoridade na estrutura organizacional

• Criar divisões administrativas

• Definir o grau de descentralização da gestão do programa

• Estabelecer relações materiais e pessoais orientadas ao êxito dos objeti-


vos

• Definir perfil do gerente do projeto


Direção • Guiar e supervisionar o pessoal

• Dotar os cargos criados pela estrutura

• Sincronizar a ação individual

• Recrutar e selecionar pessoal

• Motivar o pessoal

• Comprometer-se com os objetivos de impacto

• Coordenar a comunicação com os usuários

• Adotar práticas inovadoras de gestão


Programação • Estabelecer a sequência lógica de realização das atividades

• Utilizar ferramentas de programação (carta/cronograma de ativida-


des, entre outros)

• Construir matriz de programação

• Definir objetivos de produto e atividade

• Fornecer oportunamente insumos ao processo produtivo

• Cumprir o calendário de trabalho

• Reformular o programa em caso de externalidades negativas

• Definir o monitoramento e a linha de base para a avaliação

140
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

Monitoramento • Realizar acompanhamento da gestão

• Contrastar efeitos e resultados do programa com as metas

• Detectar desvios

• Impulsionar ações corretivas

• Manter sistema preventivo de informação

• Registrar o nível de prestação dos serviços

• Analisar o grau de eficácia da focalização

• Analisar a eficiência no alcance dos produtos

• Avaliar a eficácia no alcance dos produtos

• Contrastar eficiência no manejo dos recursos

• Reprogramar se for necessário


Avaliação • Identificar os resultados líquidos esperados do programa

• Organizar o projeto de acordo com a magnitude da mudança obtida

• Determinar o impacto obtido pelo programa


FONTE: Adaptado de Cepal (1997)

Para o desempenho das diversas funções e tarefas mencionadas nos


cinco âmbitos (organização, direção, programação, monitoramento e avaliação),
são requeridas dos gerentes ou coordenadores de programas e projetos certas
habilidades e competências, dentre as quais destacamos as seguintes:

• atuar com perspectiva estratégica;


• conhecer e buscar inovações;
• capacidade para manejar complexidade;
• promover articulação social, coordenação, consensos e alianças;
• capacidade para gerar compromissos e confiança;
• exercício de liderança tanto com relação à equipe como para fora do pro-
jeto/programa;
• desenvolvimento de ética de compromisso;
• capacidade de comunicação;
• competência técnica: conhecimentos específicos para análise rigorosa e
sis- temática dos aspectos fundamentais do contexto e das intervenções
(FILGUEIRAS, 2009, p. 140).

141
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

FIGURA 6 – POLÍTICAS PÚBLICAS: MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO

FONTE: <https://cutt.ly/cgg43ZU>. Acesso em: 26 ago. 2020.

FIGURA 7 – COFINANCIAMENTO DA UNIÃO

FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/3665592/>. Acesso em: 26 ago. 2020.

142
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

5 FINANCIAMENTO DAS POLÍTICAS


SOCIAIS
O modo de financiamento das políticas proposto pelo SUAS deu grande
passo em direção ao melhor funcionamento e concretização. A PNAS coloca
como meta um novo formato de gestão, em que ocorre o diálogo entre gestão,
financiamento e controle social (TAVARES, 2009).

A ideia reside em ultrapassar o modo costumeiramente utilizado para colocar


em prática o financiamento, voltado para atuações centralizadas, fragmentárias,
clientelistas, além disso ancorada em formatos de repasse de recursos colocados
em prática sob a lógica per capita, a qual, na sua maior parte, não conseguia dar
respaldo às necessidades específicas, compõe esse desafio (TAVARES, 2009).

Um empecilho sempre se fez presente com relação à política de assistência


social: a não articulação entre gestão (a forma de operar) e financiamento (a forma
de financiar), de modo a haver uma lacuna a ser resolvida nesse sentido, ou seja,
a realidade é que o desalinhamento entre a gestão e o financiamento torna-se um
grande obstáculo à concretização exitosa das políticas sociais (TAVARES, 2009).

Leia com atenção as diretrizes estabelecidas pela PNAS para o


financiamento da assistência social.

Considerando que uma das grandes preocupações nessa área


é de que o financiamento expresse o modelo de gestão proposto
pelo SUAS, seguem as principais diretrizes estabelecidas pela PNAS
para que o financiamento da assistência social se dê forma exitosa:

• tendo como base o território;


• considerando o porte dos municípios;
• de acordo com a complexidade dos serviços, concebidos de
maneira hierarquizada e complementar;
• com repasses regulares e automáticos para os serviços
ultrapassando o modelo convenial para esse tipo de provisão da
política;
• com o estabelecimento dos pisos de proteção que correspondam
ao nível de complexidade da atenção a ser operada;
• com cofinanciamento, representando a corresponsabilidade que
deve haver entre as esferas de governo na provisão da assistência

143
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

social como política pública;


• com correspondência nos instrumentos de planejamento público
(PPA, LDO e Loas), com destaque para o PPA que, por seu papel
de guia programático para as ações do poder público, pode traduzir,
segundo a PNAS, “a síntese dos esforços de planejamento de
toda a administração para contemplar os princípios e concepções
do SUAS”;
• efetuando projeções para a universalização da cobertura;
• garantindo revisão da regulação e novas normatizações;
• a partir de novas diretrizes para a gestão dos benefícios
preconizados pela Loas;
• com protocolos intersetoriais com Saúde e Educação para a
transição dos serviços afetos a essas áreas ainda operados e
financiados pela assistência social;
• com definição de responsabilidades e papéis das entidades
sociais (TAVARES, 2009).

Na PNAS, relativamente ao financiamento, indica-se que, nas três esferas


de governo, os fundos de assistência social “representam a instância de
financiamento do Sistema Descentralizado e Participativo da Assistência Social
operacionalizado pela via do SUAS” (TAVARES, 2009, p. 232).

Indispensável trazer à tona que, igualmente nas três esferas de governo, o


financiamento da Política de Assistência Social tem de considerar o diagnóstico
socioterritorial (regional, municipal, intramunicipal), o qual deve orientar de um
lado o planejamento de ações e, de outro, ofertar os equipamentos necessários
ao orçamento. Este, por sua vez, deve expressar a unidade do sistema – ou
seja, com base nos diferentes níveis de complexidade das proteções a serem
afiançadas e com a consideração do nível de gestão quando do cofinanciamento
aos municípios −, mas traduzindo as diversidades e as especificidades locais e
regionais (TAVARES, 2009).

144
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

FIGURA 8 – FINANCIAMENTO DO SUAS

FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/10371664/>. Acesso em: 26 ago. 2020.

É mediante os repasses fundo a fundo que é operacionalizado o financiamento


da união para a Assistência Social. A dinâmica é a seguinte: o repasse ocorre
diretamente do Fundo Nacional de Assistência Social aos Fundos de Assistência
Social dos municípios, dos estados e do Distrito Federal. Além disso, no que
concerne ao financiamento, o SUAS estrutura a partir das seguintes modalidades:
serviços; programas, projetos, benefícios (BRASIL, 2015).

Relativamente aos serviços, tratam-se de atividades continuadas que têm


como foco a melhor qualidade de vida da população. Para tal, ocorrem ações
direcionadas para as demandas basilares dos indivíduos, sempre levando em
conta os objetivos e as diretrizes da PNAS, a qual prevê um “ordenamento em
rede de acordo com os níveis de proteção: básica e especial, de média e alta
complexidade” (BRASIL, 2015).

Já os programas não são ações continuadas. Tratam-se de ações integradas


e complementares que possuem metas, prazos e áreas de abrangência
delimitados, de modo a estimular e a melhorar os benefícios e os serviços
assistenciais (BRASIL, 2015).

Os projetos, por sua vez, destinam-se aos indivíduos em situação de pobreza


e são considerados pela PNAS/2004 como fazendo parte do nível de proteção
básica. Tratam-se de investimentos econômicos e sociais que ensejam auxiliar

145
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

técnica e financeiramente iniciativas que buscam garantir capacidade produtiva e


de gestão, visando à melhoria com relação às condições de subsistência de um
modo geral, assim como a melhoria na qualidade de vida (BRASIL, 2015).

No que diz respeito aos benefícios, como o Benefício de Prestação


Continuada (BPC), é um benefício que compõe o nível de proteção social básica.
Trata-se de repasse de um salário mínimo mensal ao idoso (com 65 anos ou mais)
e à pessoa com deficiência, os quais necessitam comprovar serem desprovidos
de meios para o sustento de suas famílias ou para serem sustentados pela família
(BRASIL, 2015).

Existem também os benefícios denominados Eventuais. Estes visam o


pagamento relacionado a questões como: auxílio por natalidade; morte; para
atender necessidades advindas de situações de vulnerabilidade provisória.
As prioridades desse benefício são: crianças, famílias, idosos, pessoas com
deficiência, gestantes, calamidade pública.

Por último e não menos importante, temos os programas de Transferência


de Renda. Estes são programas de repasse direto de recursos dos fundos
de assistência social aos beneficiários, oferecendo-lhes o acesso à renda,
combatendo diferentes formas de privação de direitos, como a fome, a pobreza,
entre outras responsáveis por situações de vulnerabilidade social. A proposta
é gerar aos indivíduos e famílias possibilidades de emancipação, de exercício
de autonomia (BRASIL, 2015). Recentemente, o atual ministro da Economia
anunciou o “Renda Brasil”. Trata-se de um novo programa de renda mínima criado
pelo governo federal com a finalidade de dar continuidade ao auxílio emergencial
criado para o enfrentamento da pandemia da COVID-19. Segundo os seus
idealizadores, trata-se de um novo Bolsa Família, porém, há críticas à tentativa de
implantação do programa, o qual é enxergado com fins eleitoreiros e não é visto
como uma medida mais eficaz que o bolsa família, não possuindo justificativas
para sua implementação.

146
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

QUADRO 2 – PROTEÇÃO SOCIAL / PISO / SERVIÇO


PROTEÇÃO PISO SERVIÇO
SOCIAL
Básica Básico fixo (PBF) Serviço de Proteção e Atendimento Integral à
Família (PAIF)
Variável (PBV) Serviço de Convivência e Fortalecimento de
Vínculos (SCFV)
Equipes Volantes
Manutenção de Lanchas da Assistência
Social
Especial Média Fixo de Média Complexidade Serviço de Proteção e Atendimento
Complexidade (PFMC) Especializado a Família e Indivíduos (PAEFI)
Serviço de proteção social a adolescentes
em cumprimento de medidas
socioeducativas de liberdade assistida (LA)
e de prestação de serviços à comunidade
(PSC)
Serviço Especializado para Pessoas em
Situação de Rua
Serviço Especializado em Abordagem Social
Serviço de Proteção Social Especial em
Centro-Dia de Referência para pessoas com
deficiência em situação de dependência e
suas famílias
Transição de Média Serviço de Proteção Social Especial para
Complexidade pessoas com deficiência, idosas e suas
famílias
Variável de Média Serviço Socioeducativo Programa de
Complexidade Erradicação de Trabalho Infantil (PETI)

Alta Complexidade Piso Fixo de Alta Serviço de Acolhimento Institucional para


Complexidade (PAC I) Crianças e Adolescentes
Serviço de Acolhimento ao Público Geral
Piso Fixo de Alta Serviço de Acolhimento Institucional para
Complexidade (PAC II) Pessoas em Situação de Rua
Serviço de Acolhimento Institucional para
Jovens e Adultos com Deficiência e em
situação de dependência
Piso Variável de Alta Serviço de Proteção Social Especial em
Complexidade (PVAC) situações de calamidades públicas e
emergências

147
SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

Programas Programa Nacional de Pessoas economicamente ativas que


Promoção do Acesso necessitam de mediação do acesso ao
ao Mundo do Trabalho mundo do trabalho
(Acessuas)
Capacitação dos Trabalhadores do SUAS
Trabalhadores do SUAS
(CapacitaSUAS)

Gestão Índice de Gestão Estados e municípios


Descentralizada do SUAS
(IGD-SUAS)
Índice de Gestão Estados e municípios
Descentralizada do Programa
Bolsa Família (IGD-PBF)
FONTE: A autora

4.1 PISOS
O piso é uma forma de estruturar os serviços dispensados a determinado
público-alvo. O valor de repasse às esferas estaduais e municípios tem seu
cálculo realizado por meio de critérios para a oferta dos serviços. Tomando
como parâmetro tais critérios, calculam-se os pisos, de modo que os municípios
recebem recursos para efetivar os serviços (BRASIL, 2015).

Ocorre, assim, uma agregação dos serviços a pisos distintos, conforme


mostra o quadro anterior.

5.2 REPASSES FUNDO A FUNDO


O repasse de recursos relativos à efetivação da Política Nacional de
Assistência Social (PNAS) se dá mediante a transferência regular e automática do
tipo fundo a fundo ou mediante a celebração de convênios e contratos de repasse
(BRASIL, 2015).

No modelo fundo a fundo, os pagamentos efetivados são aqueles que


acontecem pelo repasse mediante descentralização de recursos diretamente do
Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) para fundos do estado, do município
e do Distrito Federal, de maneira regular e automática (BRASIL, 2015).

Essa forma de pagamento vincula-se ao cofinanciamento de serviços de


ação continuada. De acordo com o Decreto nº 5.085/04, ações continuadas
são aquelas de assistência social, que são financiadas pelo Fundo Nacional

148
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

de Assistência Social (FNAS) e que têm por objetivo atender periodicamente


e de forma sucessiva: famílias, crianças, adolescentes, idosos, pessoas com
deficiência. Possui o intuito também de realizar ações vinculadas aos programas
de Erradicação do Trabalho Infantil, bem como o combate à violência contra
crianças e adolescentes (BRASIL, 2015).

5.3 CONVÊNIOS E CONTRATOS


O que são os convênios? Tratam-se de acordos que regulamentarão o
deslocamento de recursos financeiros da União para os demais entes federados
(estados, municípios, Distrito Federal). Isso ocorrerá de modo que, de um lado,
haja um órgão representativo da Administração Pública Federal (nesta situação,
tem-se o FNAS) e, de outro lado, um órgão representativo da Administração
Pública Estadual, Distrital ou Municipal. Será desse modo que o diálogo e,
portanto, a transferência de recursos, se concretizará (BRASIL, 2015).

Na ocasião de realizar a proposta de um convênio, o Distrito Federal, estado


ou município deverá expor um Plano de Trabalho com argumentos que justifiquem
a celebração do convênio. Por exemplo, deverá descrever o objeto a ser efetuado;
relatar as metas a serem alcançadas; exibir as fases de execução; expor o plano
de emprego dos recursos; o cronograma de despesas etc. Nos dias de hoje, a
celebração de convênios está sendo regulamentada pelo Decreto nº 6.170/07 e
pela Portaria Interministerial nº 507/2011 (BRASIL, 2015).

No caso dos contratos de repasse, tratam-se de instrumentos que tornam


possíveis a transferência de recursos financeiros mediante instituições ou
agentes financeiros públicos federais, os quais funcionam como representantes
da União. Por ser equivalente ao convênio, o contrato de repasse é igualmente
regulamentado pelo Decreto nº 6.170/2007 e pela Portaria Interministerial nº
507/2011 e suas alterações (BRASIL, 2015).

Nas duas situações, de convênio e de contrato, os recursos somente poderão


ser utilizados a partir do momento que se comprove que serão destinados para
despesas previstas no Plano de Trabalho (BRASIL, 2015).

Para tornar mais claras as modalidades de objetos possíveis de serem


adquiridos, definiram-se, por meio do Fundo Nacional de Assistência Social,
padronizações com relação ao que é viável (BRASIL, 2015). Eis algumas
definições a seguir:

I - Construção de Centros de Referência em Assistência Social (CRAS).

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

II - Construção de Centros de Referência Especializada em Assistência Social


(CREAS).
III - Aquisição de Veículo de Transporte Adaptado para Pessoa com Dificuldade
de Locomoção.
IV - Aquisição de kits de equipamentos para o funcionamento dos CRAS.
V - Aquisição de kits de equipamentos para o funcionamento dos CREAS.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Nesse capítulo você teve a oportunidade de entrar em contato com questões
e reflexões caras às políticas sociais. Foi possível entender como funciona a
gestão das políticas sociais no que diz respeito aos diferentes entes federados
(União, estados, municípios e Distrito Federal).

Buscamos compreender a importância do Planejamento, Monitoramento


e Avaliação de Políticas Sociais no Brasil. Evidenciamos a importância de que
eles ocorram concomitantemente à execução das políticas e não após a sua
finalização, como equivocadamente se aventa.

Tratamos da gestão e apresentamos os participantes nesse processo:


secretarias, comissões, conselhos e fundos. Trouxemos, nesse sentido, as
pactuações necessárias, bem como a participação social por meio do controle
social.

Com relação à gestão, ao financiamento e à avaliação das políticas,


identificamos como ocorre a participação dos entes federados (a União, o Distrito
Federal, os estados e os municípios), indicando tratar-se de um processo que
ocorre de forma descentralizada, com atuação de outras instâncias, porém de
forma articulada, com pactuação e negociação.

Conseguimos refletir a necessidade de desfazer o equívoco de lidar com a


atenção assistencial somente quando a situação-problema está instalada, sendo
urgente trabalhar de modo preventivo e na direção da promoção de autonomia e
empoderamento dos cidadãos.

Apresentamos o rol de serviços oferecidos pela Política Nacional de


Assistência Social, com a finalidade de garantir direitos, principalmente
em situações de grandes contingências, que podem estar relacionadas ao
desemprego, à violência e à quebra de vínculos familiares. O intuito é ofertar
subsídios para o fortalecimento de indivíduos, famílias e comunidades, mediante
o acesso aos seus direitos sociais fundamentais.

150
Capítulo 3 GESTÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS

REFERÊNCIAS
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Secretaria Especial do Desenvolvimento Social, 2015. Disponível em: http://mds.
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Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de
Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7053.htm.
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BRASIL. Política Nacional de Assistência Social PNAS/2004. Brasília:


Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; Secretaria Nacional de
Assistência Social, 2005.

BRASIL. Decreto nº 5.085, de 19 de maio de 2004. Define as ações


continuadas de assistência social. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5085.htm. Acesso em: 31 ago. 2020.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes


e bases da educação nacional. Disponível em: http://www.presidencia.gov.br/
ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso em: 28 jul. 2020.

BRASIL. Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização


da Assistência Social e dá outras providências. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8742compilado.htm. Acesso em: 31 ago. 2020.

CEPAL. División de Desarrollo Social. Gestión de programas sociales. In:


ALCALDÍA DE MEDELLÍN. Gestión social. Medellín: Alcaldía, 1997.

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SoCiEDADE E PoLÍTiCAS SoCiAiS

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desafios. In: Concepção e gestão da proteção social não contributiva no
Brasil. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
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