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AS HUMANIDADES NOS CURSOS DE GRADUAÇÃO EM

ENGENHARIA: A VISÃO DAS COMISSÕES DE ESPECIALISTAS


DO EXAME NACIONAL DE CURSOS

Mário de Sousa Araújo Filho


E-mail: mario@cct.ufpb.br

Departamento de Engenharia Elétrica do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Federal da


Paraíba
Fax: (083)310-1418
Av. Aprígio Veloso, 882 – Bodocongó
CEP 58109-970 – Campina Grande, PB

RESUMO

O Exame Nacional de Cursos (ENC) vem sendo aplicado desde 1996 como um dos
instrumentos de aferição da qualidade dos Cursos de Graduação do país.
As diretrizes do Exame, definidas por comissões de professores especialistas
(Comissões de Curso), estabelecem: objetivos do ENC para o curso, perfil desejado do
graduando, competências, habilidades e conteúdos que o formando deve ter desenvolvido
e/ou adquirido ao longo de sua vida acadêmica, formato da prova que teste as expectativas
delineadas.
A aplicação do ENC, baseada nessas diretrizes, tem contribuído para a reflexão
sobre os perfis profissionais a construir e quanto ao currículo/projeto pedagógico capaz de
desenvolver as competências e habilidades coerentes com o perfil definido.
Este trabalho focaliza, a partir da visão das Comissões de Curso, a valorização
conferida à formação humanística do Engenheiro.
Considerando os objetivos específicos do ENC, os perfis profissionais apontados
para os graduandos das engenharias (Civil, Química, Elétrica, Mecânica), e as habilidades
a serem testadas, objetiva-se:
a) identificar atitudes e competências adquiridas e/ou desenvolvidas através de
estudos e atividades nas áreas de Humanidades e de formação geral, consideradas
relevantes para o profissional de Engenharia das citadas habilitações;
b) correlacionar tais atitudes e competências aos projetos pedagógicos desses
cursos, para atender às habilidades e perfis delineados para os graduandos.

1. INTRODUÇÃO.

A avaliação da universidade é um processo da maior importância para o


planejamento e a (re)orientação de políticas para a educação superior nos vários níveis de
decisão. Os subsídios obtidos são indispensáveis ao desenvolvimento coerente de ações
desde o plano federal até às instituições onde se realizam as atividades acadêmicas.
Abrangendo o ensino de graduação, o Exame Nacional de Cursos (ENC), que ficou
conhecido como Provão, é um dos mecanismos do Sistema Nacional de Avaliação do
Ensino Superior.
Outros instrumentos de avaliação fundamentam-se na Análise das Condições de
Oferta dos Cursos de Graduação (visita das comissões de especialistas da SESu/MEC), nos
resultados do PAIUB (Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras),
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coordenado pela SESu (Secretaria de Educação Superior), e na avaliação dos cursos de
pós-graduação, promovida pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de
Nível Superior).
Além dessas ações institucionalizadas a partir do plano federal, multiplicam-se
iniciativas de avaliação em instituições de ensino superior de todo o país, e que incluem
auto-avaliação, avaliação externa, avaliação dos docentes pelos discentes, etc.
No âmbito da avaliação do ensino superior, o Exame Nacional de Cursos é o
instrumento que tem obtido maior repercussão no ambiente acadêmico e na sociedade. Em
larga medida, isso se deve à divulgação pública dos conceitos obtidos pelos cursos,
conferindo transparência aos resultados da avaliação e possibilitando análises comparativas
de desempenho entre escolas, instituições, estados, regiões, etc, relativas a cada
modalidade de curso avaliado.
O processo que envolve o Provão, entretanto, não se limita à divulgação dos
conceitos atribuídos aos cursos, seja no exame propriamente dito, seja quanto à titulação e
regime de trabalho do corpo docente. A implantação do ENC vem ensejando a reflexão
quanto ao perfil e habilidades desejadas para o profissional de cada cursos avaliado.
Integradas por professores universitários das várias regiões do país e encarregadas
da definição das diretrizes do ENC, as Comissões de Curso [1] trabalham, para cada curso
específico, na definição dos objetivos do ENC, do perfil e das habilidades requeridas do
graduando, dos conteúdos a serem avaliados e do formato da prova capaz de testar as
expectativas delineadas.
Embora o Provão, enquanto instrumento de avaliação da qualidade dos cursos,
continue sendo objeto de polêmica, o mesmo não ocorre quanto aos perfis profissionais e
às habilidades, competências e atitudes desejáveis aos graduandos, tal como têm sido
formuladas pelas Comissões de Curso.
Tais proposições, amplamente divulgadas junto à comunidade acadêmica, vêm
sendo acatadas como referencial para construções e reformulações curriculares, e, mais
amplamente, na elaboração de projetos pedagógicos de vários cursos.
As indicações das Comissões de Curso têm tido, no contexto da discussão das
novas diretrizes curriculares para os cursos de graduação, papel relevante como elementos
de subsídio à melhoria da organização didático-pedagógica dos cursos, no sentido da
formação dos profissionais exigidos pela sociedade moderna.
Daí a motivação para verificar em que medida a formação humanística e geral do
Engenheiro vem sendo considerada nas proposições das Comissões do ENC para os cursos
de Engenharia.
O presente trabalho atém-se ao processo do ENC em Engenharia Civil, Engenharia
Química, Engenharia Elétrica e Engenharia Mecânica, as quatro modalidades de
engenharia abrangidas pelo Provão de 1996 a 1999. Mais precisamente, o trabalho
focaliza, a partir da visão das Comissões de Curso para o ENC’99, a valorização conferida
à formação humanística e geral do Engenheiro.
O objetivo central é identificar as atitudes e competências adquiridas e/ou
desenvolvidas através de estudos e atividades de formação humanística e geral,
consideradas relevantes para o profissional de Engenharia das quatro habilitações citadas.
Pretende-se também estabelecer correlações com os projetos pedagógicos dos
cursos, que contribuem para o atendimento às habilidades e perfis delineados para os
graduandos nas engenharias Civil, Química, Elétrica e Mecânica.
Abordam-se ainda os resultados disponíveis do questionário-pesquisa
socioeconômico e cultural aplicado aos formandos no ENC’98, pertinentes aos objetivos
do presente trabalho.

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2. A FORMAÇÃO HUMANÍSTICA E GERAL DO ENGENHEIRO E AS
COMISSÕES DO ENC

O perfil do profissional de Engenharia do século XXI transcende o do projetista,


operador ou usuário das novas tecnologias, devendo ser capaz de ter visão crítica e
consciência das questões humanísticas, sociais, políticas, econômicas, éticas e ambientais
envolvidas na sua ação profissional.
Ao tratar do Perfil do Egresso, o Anteprojeto de Resolução [2] que estabelece as
Diretrizes Curriculares para os Cursos de Engenharia considera, em seu artigo 1o, que “os
Currículos dos Cursos de Engenharia deverão dar condições a seus egressos para
adquirir um perfil profissional compreendendo uma sólida formação técnico-científica e
profissional geral que o capacite a absorver e desenvolver novas tecnologias, estimulando
a sua atuação crítica e criativa na identificação e resolução de problemas, considerando
seus aspectos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais, com visão ética e
humanística em atendimento às demandas da sociedade”.

2.1 Os objetivos do ENC para as engenharias

A definição dos objetivos do Exame Nacional de Cursos nas quatro habilitações de


Engenharia avaliadas de 96 a 99, deixam patente a preocupação com questões que
transcendam o conhecimento puramente técnico.
Entre os objetivos do ENC em Engenharia Química [3], afirma-se que o Exame
nessa área deverá contribuir para “o processo de avaliação das IES que mantêm os cursos
de Engenharia Química, por meio da verificação: do conhecimento fundamental e aplicado
ministrado aos graduandos; de sua capacidade para enfrentar problemas e apresentar
soluções técnicas adequadas ao contexto sócio-econômico-ambiental”.
Em Engenharia Civil, um dos objetivos definidos [4] para o ENC é “verificar em
que medida o ensino de graduação ministrado nessas instituições (que ministram cursos de
Engenharia Civil) está possibilitando a formação de profissionais conscientes do seu papel
como agentes de transformação social”.
O ENC em Engenharia Elétrica, de acordo com a Comissão do Curso tem, como
um dos seus objetivos [5], o de “contribuir para a avaliação da qualidade dos cursos de
graduação em Engenharia Elétrica, observando as habilidades dos graduandos nas diversas
áreas específicas e sua visão sobre questões humanísticas, éticas e ambientais”. Outro
objetivo é “fomentar a melhoria e a modernização dos cursos de Engenharia Elétrica,
visando à formação de um engenheiro para o futuro”.
Na área de Engenharia Mecânica, um dos objetivos [6] do ENC é “fornecer
elementos de orientação para a formação de profissionais para o século vinte e um”.
Já a partir do estabelecimento dos objetivos para o Exame Nacional de Cursos nas
engenharias, sinaliza-se para aspectos não-circunscritos aos conteúdos profissionalizantes
ou específicos dos cursos, evidenciando:
a) a necessidade de que o profissional de Engenharia seja capaz de adequar soluções
técnicas aos contextos social, econômico e ambiental;
b) a preocupação com o papel social do engenheiro e com a contribuição do ensino de
graduação para a “formação de profissionais conscientes do seu papel como agentes de
transformação social”;
c) a importância de que o profissional de Engenharia tenha visão sobre questões
humanísticas, éticas e ambientais.

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Essas preocupações vão se manifestar também, e com maior clareza, nos perfis
profissionais definidos pelas Comissões de Curso para os graduandos em Engenharia Civil,
Engenharia Química, Engenharia Elétrica e Engenharia Mecânica.
2.2 Os perfis profissionais requeridos

Os perfis delineados pelas Comissões de Curso do ENC para os graduandos das


quatro engenharias avaliadas constam das referências [3], [4], [5] e [6]. Desses perfis
emergem, nitidamente, características cuja aquisição e desenvolvimento, pelos alunos,
exigem bem mais do que oferecem as matérias e disciplinas específicas dos cursos de
Engenharia.
Naturalmente, todos os perfis delineados para os profissionais de Engenharia
incluem a exigência de sólida formação básica e profissional geral na área de atuação.
Neste trabalho, no entanto, o interesse é destacar os aspectos que vão além das
especificidades técnico-científicas profissionais, em particular os relacionadas ao
conhecimento humanístico.
Em Engenharia Civil, um dos componentes do perfil adotado como referência para
o profissional da área estabelece que o mesmo deverá ter: “domínio das técnicas básicas de
gerenciamento e administração dos recursos humanos e materiais utilizados no exercício
da profissão”.
Salienta-se ainda, para o profissional de Engenharia Civil, a “capacidade para o
trabalho em equipes multidisciplinares”, o “senso ético-profissional, associado à
responsabilidade social” e uma “formação abrangente que lhe possibilite sensibilidade
para as questões humanísticas, sociais e ambientais”.
A Comissão de Curso do ENC em Engenharia Química enfatiza que o profissional
da área deverá ter “características básicas como senso ético-profissional, motivação para
atitudes empreendedoras e consciência do seu papel como agente de transformação social
e de sua responsabilidade para com o meio ambiente”.
Para o profissional de Engenharia Química, destacam-se ainda como elementos do
perfil delineado: “formação interdisciplinar”, “capacidade de trabalhar em equipe”,
“flexibilidade para empreender mudanças”, “capacidade de expressão em língua
portuguesa”, “senso econômico-financeiro”, entre outros.
Em Engenharia Elétrica, o perfil proposto pelo ENC inclui: “sólida formação básica
e profissional geral, incluindo os aspectos humanísticos, sociais, éticos e ambientais”;
“capacidade de análise de problemas e síntese de soluções integrando conhecimentos
multidisciplinares”; “capacidade de elaboração de projetos e proposição de soluções
técnica e economicamente competitivas”; “capacidade de comunicação e liderança para
trabalho em equipes multidisciplinares”.
Do profissional de Engenharia Mecânica exige-se, de acordo com a Comissão do
Curso, um perfil que inclua: “visão sistêmica e multidisciplinar”; “espírito empreendedor,
com capacidade de trabalhar em equipe”; “formação humanística e visão holística”;
“postura ética e de cidadania, atento para a questão ambiental”; “capacidade de expressão
oral, escrita e conhecimento de língua estrangeira”; “capacidade de administrar recursos
(materiais, pessoas etc), e visão gerencial”.
As características aqui destacadas e apontadas pelas Comissões de Curso para os
profissionais das engenharias Civil, Química, Elétrica e Mecânica, como importantes nos
perfis profissionais delineados, são sumarizadas a seguir:
a) capacidade de trabalhar em equipes, inclusive nas multidisciplinares;
b) sensibilidade e a responsabilidade para com o meio ambiente;
c) domínio de técnicas básicas de gerenciamento e administração de recursos
humanos e materiais;

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d) capacidade de comunicação, inclusive em língua portuguesa;
e) senso e postura ético-profissional;
f) atitude e espírito empreendedor.
Estão presentes ainda referências a responsabilidade social, liderança, formação
humanística, cidadania, inter e multidisciplinaridade, visão sistêmica/holística.
Os perfis profissionais formulados pelas Comissões de Curso estão em sintonia
com o Perfil do Egresso [2] constante das Diretrizes Curriculares para os Cursos de
Graduação em Engenharia (Anteprojeto de Resolução).

2.3 As habilidades desejáveis

A partir dos objetivos do ENC definidos por uma determinada Comissão de Curso e
do perfil profissional de referência delineado, são estabelecidas as habilidades desejáveis
ao graduando. O Exame deverá verificar se o mesmo desenvolveu essas habilidades no
decorrer do seu curso de graduação.
Evidentemente, nem todos os aspectos do perfil, associado aos objetivos do ENC
em uma dada área, traduzem-se em habilidades passíveis de ser testadas através de uma
prova escrita. E daí porque o conjunto de habilidades elencadas em [3], [4], [5] e [6], e
consideradas desejáveis, respectivamente, para os graduandos das engenharias Química,
Civil, Elétrica e Mecânica, esteja longe de contemplar a amplitude e abrangência do perfil
profissional delineado, principalmente no que se refere a valores, atitudes e competências
não estritamente do campo técnico-científico da área em exame.
Em Engenharia Civil, uma das habilidades [4] a serem testadas é a capacidade de
“síntese, aliada à capacidade de compreensão e expressão em língua portuguesa”. Uma
outra habilidade trata da competência para o “gerenciamento e operação de sistemas de
Engenharia”.
Para o ENC em Engenharia Química consta, entre as habilidades [3] a serem
verificadas, a capacidade de “analisar criticamente aspectos técnicos, científicos e
econômicos de um problema e apresentar soluções adequadas”. E ainda a capacidade de
“organizar idéias e comunicá-las”, além de “buscar e obter informações”.
Entre as habilidades [5] a serem avaliadas pelo ENC em Engenharia Elétrica
também está a capacidade de comunicação.
Na área de Engenharia Mecânica, salienta-se entre as habilidades [6] relacionadas a
“capacidade de selecionar materiais, métodos e processos, levando em conta os aspectos
éticos, sociais e ambientais”. Requer-se também a “capacidade de planejamento e análise
de custo e benefício, com visão gerencial que habilite (o profissional) a fazer análise de
cenário”.
Em resumo, as habilidades “mensuráveis” dentre as relativas à formação
humanística e geral, definidas pelas Comissões de Curso para o ENC nas quatro
habilitações de Engenharia até agora submetidas ao Provão, envolvem principalmente:
a) comunicação e expressão;
b) gerenciamento/administração;
c) planejamento/análise econômica;
d) visão crítica e abrangente dos múltiplos aspectos envolvidos em um problema.

2.4 Os conteúdos a serem avaliados

Os conteúdos verificados pelo ENC são definidos pela Comissão de cada curso e se
constituem no programa do Exame. As questões do Provão devem ser capazes de

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testar/avaliar habilidades dentro dos conteúdos estabelecidos e amplamente divulgados
junto às instituições e graduandos.
Nas engenharias, a referência adotada para a definição dos conteúdos foi a
Resolução 48/76, do antigo Conselho Federal de Educação (CFE), ainda em vigor. Isso é
perceptível, principalmente com relação às matérias de formação básica e de formação
geral.
As discussões em andamento sobre as novas diretrizes curriculares para os cursos
de graduação, bem como a visão particular das comissões, tiveram, naturalmente, alguma
influência na escolha dos conteúdos, em particular nas matérias de formação profissional
específica.
Em Engenharia Civil [4], Elétrica [5] e Mecânica [6], os conteúdos de caráter geral
explicitados abrangem as Ciências Humanas e Sociais, Economia, Administração e
Ciências do Ambiente, as chamadas matérias de formação geral, de acordo com a
legislação em vigor relativa aos currículos dos cursos de Engenharia.
É interessante verificar que o ENC em Engenharia Química [3] não contempla
esses conteúdos de formação geral, atendo-se aos assuntos mais diretamente relacionados à
área de Engenharia Química.

3. O QUESTIONÁRIO-PESQUISA APLICADOS AOS GRADUANDOS DAS


ENGENHARIAS

Um questionário socioeconômico e cultural é aplicados aos graduandos de todos os


cursos avaliados pelo ENC, com o objetivo de obter informações sobre características
pessoais e expectativas futuras dos formandos, infra-estrutura de apoio ao curso
(bibliotecas, laboratórios, salas de aula, etc), desempenho dos professores, entre vários
outros aspectos. Essa é a parte do questionário-pesquisa comum às diversas áreas
avaliadas.
Além disso, há questões voltadas para temas específicos de interesse de cada curso,
o que diferencia os questionários aplicados, possibilitando o recolhimento de informações
e opiniões dos formandos quanto ao tratamento dispensado a esses temas ao longo do
curso.
Tem sido alto (superior a 90%) o percentual de respostas ao questionário-pesquisa,
o que o torna um levantamento bastante confiável e representativo do pensamento dos
graduandos de todos os cursos avaliados a respeito dos vários aspectos pesquisados.
No formato múltipla-escolha, os resultados obtidos são trabalhados estatisticamente
e fornecem perfis dos graduandos e dos cursos, em nível nacional e por instituição,
possibilitando estudos e comparações. Esses resultados são encaminhados às coordenações
dos cursos, constando de um “Relatório da Instituição”, e podem constituir-se em um bom
subsídio ao planejamento acadêmico-institucional.
Nos questionários aplicados aos graduandos das engenharias Civil [7], Química [8]
e Elétrica [9] em 1998, solicita-se indicar a abordagem dada, no curso, a alguns tópicos
específicos, entre os quais destacamos os três tópicos Ética, Qualidade e Ecologia/Meio
Ambiente, de interesse para o que se aborda no presente trabalho. Os percentuais a seguir
tratam de médias nacionais para cada curso, podendo haver bastante diferenciação entre
regiões e tipo de instituição (dependência administrativa federal, estadual, municipal ou
privada).
A partir das informações fornecidas pelos graduandos, verifica-se que:
a) entre os três temas acima referidos, Ecologia/Meio Ambiente é o assunto que mais tem
sido abordado, vindo em seguida Qualidade e, por último, Ética.

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b) Ecologia/Meio Ambiente foi tema central de uma ou mais disciplinas para 58,4% dos
graduandos de Engenharia Química, 41,7% dos graduandos em Engenharia Civil e
55,4% dos graduandos em Engenharia Elétrica;
c) O tema Qualidade foi estudado em várias disciplinas do curso para 32,1% dos
graduandos em Engenharia Química, em Engenharia Civil (para 44,5%) e em
Engenharia Elétrica (para 29,5%);
d) O tema Ética foi tratado superficialmente em uma disciplina para 29,7% dos
graduandos em Engenharia Química, em Engenharia Civil (para 32,4%) e em
Engenharia Elétrica (para 34,3%). Entretanto, o assunto não foi localizado em nenhum
momento para 20,9% dos graduandos em Engenharia Química, em Engenharia Civil
(para 11,4%) e em Engenharia Elétrica (para 18,2%). O tema Ética foi abordado
apenas em atividades extra-classe (palestras, conferências etc) para 22% dos
graduandos em Engenharia Química, Engenharia Civil (18,5%) e Engenharia Elétrica
(17,7%).
Observa-se que apenas o tema Ecologia/Meio Ambiente atinge percentuais
superiores a 60% nas três engenharias, dos que afirmam que o tema foi estudado em várias
disciplinas durante o curso e que foi tema central de uma ou mais disciplinas.
Ainda é relativamente baixa a atenção conferida ao tema da Qualidade e muito
pouca a importância com que se trata o tema da Ética.
Para uma apreciação mais completa da presença de assuntos desse tipo nos cursos
de graduação em Engenharia e da importância que se lhes confere, seria útil a inclusão de
novos temas em pesquisas de amplitude nacional, a exemplo da pesquisa realizada pelo
INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) por ocasião do Provão.

4. CONCLUSÕES

A consciência da necessidade de que os engenheiros tenham, além de uma sólida


formação técnico-científica e profissional geral, formação humanística e conhecimentos de
áreas não eminentemente técnicas, está bem presente no trabalho das Comissões do Exame
Nacional de Cursos para as engenharias.
Os perfis profissionais delineados vão ao encontro das diretrizes curriculares
propostas para os cursos de Engenharia, a serem estabelecidas pelo Conselho Nacional de
Educação (CNE), e que também contemplam preocupações com a formação humanística e
geral desses profissionais.
Entretanto, essa formação para além do conhecimento específico das engenharias
não se resolve apenas com a inclusão, imprescindível em alguns casos, de novas
disciplinas que atendam à temática. Há evidências de que as próprias disciplinas
atualmente existentes (Administração, Economia, Sociologia etc), ministradas para os
estudantes dos cursos de Engenharia, necessitam de reformulações programáticas e
metodológicas no sentido da sua atualização e modernização, tendo como referência o
perfil profissional desejado do profissional de Engenharia.
O Anteprojeto de Resolução que estabelece as diretrizes curriculares para os cursos
de Engenharia [2], a ser discutido e aprovado pelo CNE, registra, no artigo 3o, que “cada
curso de Engenharia deve possuir um projeto pedagógico que demonstre claramente como
o conjunto das atividades desenvolvidas garantirão o perfil desejado de seu egresso e o
desenvolvimento das competências e habilidades esperadas”.
No artigo 6o, o Anteprojeto estabelece que “deverão ser estimuladas atividades
complementares tais como trabalhos de iniciação científica, projetos multidisciplinares,
visitas técnicas, trabalhos em equipe, desenvolvimento de protótipos, monitorias,

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participações em empresas júnior e outras atividades empreendedoras. Nestas atividades
procurar-se-á desenvolver posturas de cooperação, comunicação e liderança”.
Será, portanto, na execução do projeto pedagógico do curso, e não apenas da sua
grade curricular, que serão viabilizadas as atividades e procedimentos pedagógicos capazes
de contribuir, sinergicamente, para a aquisição do perfil profissional delineado para os
egressos dos cursos de Engenharia. E, dentro desse perfil, os aspectos relacionados à
formação humanística e de caráter geral.
Nesse contexto, as chamadas atividades complementares crescem em importância,
consolidando a concepção moderna de currículo que vai além da grade de disciplinas,
incorporando vivências, experiências, auto-aprendizado e atividades acadêmicas que não
se restrinjam à sala de aula. Aspectos do perfil profissional que envolvam atitudes e
valores dificilmente poderão ser estimulados e desenvolvidos apenas através dos processos
tradicionais de ensino-aprendizagem.
Daí porque, certamente, a proposta em discussão de diretrizes curriculares para as
engenharias estabeleça, no artigo 4o do Anteprojeto de Resolução, que “as estruturas
deverão ser organizadas de forma a permitir que haja disponibilidade de tempo para a
consolidação dos conhecimentos adquiridos e para as atividades complementares,
objetivando uma progressiva autonomia intelectual do aluno”. E mais: “enfatiza-se a
necessidade de se reduzir o tempo em sala de aula, favorecendo o trabalho individual e em
grupo dos estudantes”.
Finalmente, é importante assinalar a necessidade de que os docentes do curso,
quaisquer que sejam as disciplinas que ministrem, estejam imbuídos do propósito de dar
concretude, na sala de aula ou fora dela, ao projeto pedagógico enquanto proposta de
trabalho coletivamente assumida, em sua construção e execução.
Na prática, esse compromisso significa procurar criar e desenvolver, no âmbito do
trabalho docente, mecanismos, atividades e espaços pedagógicos que contemplem o perfil
profissional a perseguir, buscando a formação plena do futuro engenheiro, tanto no plano
técnico-científico quanto no plano da cidadania, para a qual a formação humanística é
componente imprescindível.

5. REFERÊNCIAS

[1] BRASIL, “Portaria 963, de 15/08/97”, in Diário Oficial da União, de 19/08/97.


[2] SESu/MEC, “Anteprojeto de Resolução” – Diretrizes Curriculares para os Cursos de
Engenharia, no “site” www.mec.gov.br/sesu, versão em 05/05/99.
[3] BRASIL, “Portaria 338, de 04/03/99”, in Diário Oficial da União, de 05/03/99, relativa
ao ENC em Engenharia Química.
[4] BRASIL, “Portaria 345, de 04/03/99”, in Diário Oficial da União, de 05/03/99, relativa
ao ENC em Engenharia Civil.
[5] BRASIL, “Portaria 338, de 04/03/99”, in Diário Oficial da União, de 05/03/99, relativa
ao ENC em Engenharia Elétrica.
[6] BRASIL, “Portaria 127, de 1o/02/99”, in Diário Oficial da União, de 02/02/99, relativa
ao ENC em Engenharia Mecânica.
[7] INEP/MEC – Exame Nacional de Cursos 1998: Anexo do Relatório-Síntese –
Engenharia Civil – Provas e Questionário. Brasília, 1998.
[8] INEP/MEC – Exame Nacional de Cursos 1998: Anexo do Relatório-Síntese –
Engenharia Química – Provas e Questionário. Brasília, 1998.
[9] INEP/MEC – Exame Nacional de Cursos 1998: Anexo do Relatório-Síntese –
Engenharia Elétrica – Provas e Questionário. Brasília, 1998.

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