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Acórdão nº83/91

A. e B., foram acusados dos crimes de pesca ilegal no rio Tâmega, bem como de terem
capturado nessa atividade três peixes de uma espécie relativamente à qual vigorava
temporariamente a proibição de pesca (época de defeso).
Os arguidos haviam sido detidos em flagrante delito, por dois guardas florestais.

Na sentença, considera-se que os dois arguidos praticaram um crime de pesca proibida


previsto no artigo 29º/f), e artigo 6º do Decreto nº 44 623, de 10 de Outubro de 1962.
Pode ler-se na decisão em análise:

Entendo porém que a Constituição da República ao definir como princípios de justiça a


igualdade e a proporcionalidade das medidas penais revogou o referido parágrafo do artigo
67º, na medida em que tem por imperativo a aplicabilidade da pena máxima.

Desta decisão interpôs recurso para o Tribunal Constitucional o representante do Ministério


Público, ao abrigo do artigo 280º/nº 1/a) da Constituição.
Ministério Público:

 O princípio da adequação das reações criminais à gravidade dos factos ilícitos não é
violado pela norma constante da parte final do artigo 67º do Decreto nº 44 623, na
parte em que determina que, no caso de pesca em época de defeso, quando concorra
a circunstância agravante de o facto haver sido praticado de noite, devem ser
aplicados os máximos das penas

Tribunal Constitucional

O juiz do tribunal de primeira instância considerou que a norma contida na parte final do
artigo 67º do Decreto n.º 44 623, diploma anterior à Constituição de 1976, fora revogado por
esta Constituição “ao definir como princípios de justiça a igualdade e a proporcionalidade das
medidas penais”.
O artigo 293º da Constituição estabelece que “o direito ordinário anterior à entrada em vigor
da Constituição mantém-se, desde que não seja contrário à Constituição ou aos princípios nela
consignados”.
A contrariedade do direito ordinário anterior à nova Constituição implica o desaparecimento
daquele da Ordem Jurídica, ainda que possa discutir-se se se trata de um fenómeno de
revogação ou de caducidade.
Seja como for, tal desconformidade de qualificar-se como inconstitucionalidade
superveniente.

As condutas criminosas apuradas nos autos são puníveis por legislação avulsa que remonta aos
anos de 1959 e 1962.

Na decisão recorrida sustentou-se que seria contrária à Constituição a cominação de uma pena
criminal fixa, atentos os princípios de igualdade e de proporcionalidade que são definidos
constitucionalmente como princípios de justiça.
Julga-se que tal juízo de inconstitucionalidade material é infundado, ao menos em termos
absolutos.

Comentando o artigo 29º da Constituição indicam Gomes Canotilho e Vital Moreira como
princípios constitucionais básicos em matéria de punição criminal e de aplicação de medidas
de segurança os seguintes:
 Só a lei é competente para definir crimes e respetivas penas — princípio da legalidade
 A lei deve especificar suficientemente os factos que constituem o tipo legal de crime
bem como tipificar as penas — princípio da tipicidade
 A lei não pode criminalizar factos passados nem punir mais severamente crimes
anteriormente praticados — princípio da não retroatividade

A diferenciação nos critérios de determinação dos tipos e das reações criminais tem de ser
feita por aplicação do princípio da proporcionalidade, nomeadamente entre a gravidade da
sanção penal e o grau de garantia, princípio que implica, combinado com outros princípios
relevantes, que o limite máximo da sanção penal aplicável tenha de constar de lei formal.

Não se nega, em tese geral, que os princípios da igualdade e da proporcionalidade possam


implicar o juízo de que a cominação de penas criminais fixas quanto a certo crime por uma
concreta norma jurídica seja tida como materialmente inconstitucional.
Sentido de penas fixas:

 Num sentido mais forte - a expressão pena fixa é utilizada para caracterizar uma pena
prevista na lei quanto a certo crime, a qual tem de ser aplicada pelo juiz rigidamente,
desde que se venha a provar que o arguido agiu ilícita e culposamente

 Num sentido mais fraco - pena fixa quando a norma estatuidora da sanção estabelece
uma pena determinada, não graduável em princípio pelo juiz, mas não exclui que este
último possa recorrer a institutos de natureza geral, como os da atenuação especial da
pena ou da dispensa da pena, para adequar a sanção à personalidade do agente e às
circunstâncias apuradas quanto à infração

Os princípios constitucionais relativos à aplicação da lei criminal e aos limites das penas e das
medidas de segurança constam basicamente dos artigos 29º e 30º CRP.

Figueiredo Dias - Só o que, de todo o modo, não será possível é que a proibição vá tão longe
que impeça a proporcionalidade entre a pena e a infração, quando esta seja de pequena
gravidade. Aí estaria a ultrapassar-se o limite máximo permitido pela culpa, em homenagem a
razões de pura prevenção geral negativa ou de intimidação o que seria, além do mais,
duplamente inconstitucional por violação do princípio da culpa e por violação do princípio da
proporcionalidade das sanções no direito penal.

Nesta linha de pensamento, não se crê que possa afirmar-se que a cominação desta pena fixa
concreta, quando surja uma circunstância agravante específica, viole intoleravelmente os
princípios da culpa ou da proporcionalidade das sanções à gravidade das infrações.
Por um lado, não pode falar-se de violação do princípio da igualdade, na medida em que a
norma desaplicada considera manifestamente um grau de culpa que normalmente se verifica
no comum dos casos de pesca ilegal noturna no período de defeso, sendo certo que
acentuado.

Princípio da igualdade
A norma sancionatória, devidamente interpretada no contexto sistemático do Direito Penal,
não conduz a resultados arbitrários, nem implica necessariamente uma igualdade de
tratamento perante situações diversas de agentes com acentuadas diferenças de grau de
culpabilidade.
Na verdade, como se viu, não pode sustentar-se que a norma proíba de forma absoluta que o
juiz estabeleça uma diferenciação na aplicação de sanções quanto a arguidos em situações
materialmente diferentes, dando assim acolhimento à ideia de diversificação, em detrimento
de uma ideia de tratamento uniforme encarada, em princípio, pelo legislador.

Princípio da proporcionalidade
O estabelecimento de uma pena tendencialmente fixa nestes casos não pode considerar-se
que viole o princípio da proporcionalidade, o qual postula, no domínio do Direito Penal, que a
gravidade das sanções deve ser proporcional à gravidade das infrações.
A melhor interpretação da norma desaplicada não acarreta um resultado que possa qualificar-
se como manifesta violação do princípio da proporcionalidade, visto que o juiz dispõe sempre,
como se viu da possibilidade de recorrer a institutos de natureza geral como o de atenuação
especial da pena e o da dispensa de pena, evitando que se atinjam em concreto resultados
intoleráveis ou gravemente chocantes.
Acresce que a pena cominada para o comum dos casos se afigura como razoavelmente
proporcionada ao conjunto de comportamentos recondutíveis a este específico tipo criminal,
no comum dos casos da vida.
Reafirma-se, assim, que tal pena tendencialmente fixa não ofende o princípio da
proporcionalidade da sanção à gravidade da infração.
Uma pena fixa viola ou não o princípio da proporcionalidade?

1. Adequação ou idoneidade

Verificação se os meios são adequados para a prossecução dos fins.


As medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio para
a prossecução dos fins visados.
É necessário saber se um certo meio é idóneo ou apto para a realização de um certo fim.
O meio é a pena de prisão. Neste caso o meio é idóneo para atingir o fim.

2. Necessidade ou meio menos restritivo

Estado tem de optar pelo meio menos lesivo.

3. Proporcionalidade em sentido estrito

Não poderão adotar-se medidas excessivas e desproporcionadas para alcançar os fins


pretendidos.
É necessário ponderar os bens em causa e verificar se a relação entre os bens é justa,
adequada e razoável.
Tribunal entende que a pena se afigura razoavelmente proporcionada ao conjunto de
comportamentos recondutíveis a este específico tipo criminal.

Decisão
Conclui-se que não se mostram violados pela norma em análise os princípios constitucionais
de igualdade e de proporcionalidade das sanções criminais.

Acórdão TC 2004 – Ao contrário do que diz este acórdão (91), o Tribunal no acórdão de 2004
vem dizer que há inconstitucionalidade por violação do princípio da proporcionalidade porque
Tribunal entende que há outras maneiras de fazer cumprir o objetivo.
Há outros meios menos restritivos que é permitir que a pena se adeque à culpa, para que a
pena seja proporcional ao ilícito.
As penas fixas violam o princípio da proporcionalidade.

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